Вы находитесь на странице: 1из 257

Universidade Federal de Minas

Gerais
Escola de Engenharia

Departamento de Engenharia
Hidráulica e Recursos Hídricos

ENGENHARIA DE RECURSOS
HÍDRICOS

Mauro Naghettini
Belo Horizonte
1999
ii

Para meu pai, Nilo Naghettini, com muita saudade.


iii

Índice
Introdução à Problemática dos Recursos Hídricos............................................................1

Parte 1 - Engenharia Hidrológica....................................................................................13


Fundamentos e Aplicações da Hidrologia........................................................14
Bacia Hidrográfica ...........................................................................................19
Hidrometeorologia............................................................................................24
Métodos Estatísticos Elementares.....................................................................36
Fluviometria......................................................................................................43
Infiltração..........................................................................................................57
Água Subterrânea..............................................................................................62
Vazões de Enchentes.........................................................................................73
Análise de Chuvas Intensas...............................................................................92
Propagação de Cheias em Rios e Reservatórios................................................98
Bibliografia Adicional Recomendada..............................................................110
Exercícios Propostos.......................................................................................111

Parte 2 - Engenharia de Recursos Hídricos...................................................................118


Reservatórios...................................................................................................119
Barragens.........................................................................................................139
Extravasores, Comportas e Dispositivos de Saída...........................................156
Cheias de Projeto de Vertedores......................................................................170
Controle de Cheias...........................................................................................186
Irrigação...........................................................................................................202
Navegação Fluvial...........................................................................................215

Parte 3 - Princípios de Gestão e Legislação de Recursos Hídricos...............................229


Princípios de Gestão de Recursos Hídricos.....................................................230
Legislação Específica de Recursos Hídricos...................................................240
iv

Solicito aos leitores dessas notas de aula a gentileza de enviarem as suas


correções, sugestões e comentários para os endereços abaixo indicados. Antecipo
meus agradecimentos.

Mauro Naghettini
EEUFMG-EHR
Avenida Contorno 842, 8o andar
30110-060 Belo Horizonte, MG

Tel. : (031) 238.1002


Fax : (031) 238.1001
Internet : naghet@netunos.lcc.ufmg.br
1

INTRODUÇÃO À PROBLEMÁTICA DOS RECURSOS HÍDRICOS

1. Caracterização da Água como Recurso

A água e o Sol são indissociáveis e imprescindíveis para a existência de vida na


Terra. As plantas verdes captam a energia solar e a utilizam no processo de fotossíntese,
o qual transforma a água, o dióxido de carbono e os sais minerais em compostos
orgânicos indispensáveis aos seres vivos, tanto como fonte de energia, como para a
constituição e renovação de suas células. Ainda como consequência do processo de
fotossíntese, a liberação de oxigênio livre para a atmosfera permite a respiração aeróbia
e, finalmente, a vida animal. Contrariamente às plantas verdes, os animais não têm
capacidade de produzir compostos orgânicos a partir de um ambiente inorgânico e,
consequentemente, nutrem-se de plantas e outros animais, formando-se as cadeias
alimentares. A água é a substância que existe em maior quantidade nos seres vivos.
Representa cerca de setenta por cento do peso do corpo humano, podendo chegar a mais
de noventa por cento em alguns animais. Além de ser parte constituinte dos tecidos, a
água é o solvente que transporta as substâncias intervenientes nos processos
fisiológicos. A falta de água provoca a debilidade e até a morte dos seres vivos.
Avalia-se o volume de água na Terra em 1380.1015 m3, distribuído
aproximadamente da seguinte forma : oceanos com 96,6%, continentes com 3,4 % e a
atmosfera com 0,013%. Esse volume, mantido constante desde a formação da Terra há 5
bilhões de anos, constitui a chamada hidrosfera, dentro da qual a água circula
continuamente, sob a ação da energia solar e da força gravitacional; a essa circulação
contínua de água pelos reservatórios da hidrosfera dá-se o nome de ciclo hidrológico.
De forma sintética, o ciclo hidrológico é a sequência de fenômenos pelos quais a água,
após evaporar-se dos oceanos, lagos, rios e superfície terrestre, precipita-se como chuva,
neve ou gelo, escoa por sobre o terreno, infiltra-se no subsolo, escoa pelos aquíferos, é
absorvida pelas raízes das plantas, retornando à atmosfera, seja por transpiração ou
evaporação direta. Além de essencial à manutenção da vida na Terra, a água em
circulação no ciclo hidrológico pode ser captada pelo homem e utilizada para diversas
finalidades, as quais englobam desde formas primitivas de transporte até atividades
econômicas de vulto, como a geração de energia elétrica. Esses fatos caracterizam a
água como um recurso natural e renovável pelos processos do ciclo hidrológico.

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


2

Devido às diferentes condições geomorfológicas e climatológicas, a água distribui-


se de forma irregular, tanto no tempo como no espaço. Podem ser muito elevadas as
variações sazonais e interanuais das vazões de um curso d'água, fazendo com que
quanto mais variável for o regime hidrológico, menor é a disponibilidade dos recursos
hídricos naturais. As distribuições espacial e temporal da precipitação, a velocidade e a
direção dominantes de deslocamento das tormentas sobre a bacia, as variações
temporais e espaciais das perdas por intercepção, evapotranspiração e infiltração, bem
como as condições de armazenamento da umidade do solo, são exemplos do grande
número de fatores interdependentes que podem influir na variabilidade das vazões de
um curso d'água. Essa variabilidade, sendo bastante complexa, faz com que as vazões
de um curso d'água, bem como outras variáveis hidrológicas, sejam consideradas
variáveis aleatórias. Em consequência, pode-se dizer que os recursos hídricos, embora
renováveis, são móveis, pois escoam pelos rios e aquíferos, e de natureza aleatória.
O homem aprendeu a intervir no ciclo hidrológico, por meio de obras e instalações,
de modo a captar água e transferí-la espacialmente, de um local para outro, ou
temporalmente, de anos ou estações chuvosas para períodos secos (alterações do regime
hidrológico através da regularização de vazões), com o objetivo de conferir-lhe
condições quantitativa e economicamente adequadas de uso. Tais obras e instalações
consistem em sistemas de captação e distribuição de águas superficiais e subterrâneas,
barragens e canais de irrigação, entre outros. Por outro lado, existem os chamados
eventos extremos, cheias e estiagens prolongadas, os quais produzem sérios prejuízos
econômicos e sociais; a esse respeito, as ações do homem devem presumir a
coexistência inexorável da sociedade humana com os riscos de cheias e estiagens
extremas e concorrer para mitigar os efeitos danosos de sua ocorrência.
A intervenção humana no ciclo hidrológico se dá não somente em termos da
quantidade, como também em termos da qualidade da água. Os cursos e corpos d'água
têm capacidade de assimilar esgotos/resíduos e autodepurarem-se; essa capacidade,
entretanto, é limitada. Sabe-se que a concentração de poluentes em um curso d'água é
inversamente proporcional à vazão de diluição, fato que caracteriza a
indissociabilidade dos atributos de quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Por
outro lado, a erosão hídrica provoca a perda de solos férteis e a deposição de
sedimentos em zonas de menor velocidade de escoamento, assoreando leitos fluviais,
reservatórios e obstruindo sistemas de drenagem. A ocupação e o manejo adequado do

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


3

solo, bem como o tratamento prévio de efluentes domésticos e industriais são fatores
fundamentais para a conservação dos recursos hídricos.

2. Evolução Histórica da Utilização dos Recursos Hídricos

O homem primitivo reconheceu desde logo a sua dependência da água :


primeiramente, para lhe matar a sede e, depois, para utilizá-la na manufatura de
produtos, utensílios e construções que lhe eram essenciais. As sociedades primitivas
estabeleceram-se preferencialmente às margens dos rios, pois essas lhes facultavam
fácil acesso à água, alimentos e até defesa natural. Além disso, os rios proporcionavam
vias de acesso a novos territórios a explorar.
As civilizações mais adiantadas da antiguidade floresceram nas planícies dos
grandes rios : Amarelo, Tigre, Eufrates e Nilo. Nessas sociedades, a água era
amplamente usada para a irrigação, constituindo a produção agrícola o principal fator de
desenvolvimento. Outras civilizações, sediadas em regiões de menor abundância
hídrica, também basearam o seu desenvolvimento no uso da água, porém à custa de
esforços monumentais. É o caso dos qanats no Irã, galerias de cerca de 0,70 m de
largura e 1,00 m de altura, com desenvolvimento que atinge 70 km, utilizados desde o
século V AC para captar água subterrânea. O comprimento total dos qanats do Irã
excede a distância da Terra à Lua e a vazão por eles captada continua na atualidade a ser
de 700 m3/s. O trabalho envolvido em sua construção é comparável ao das pirâmides do
Egito, porém sem a evidência e o esplendor dessas, por tratarem-se de obras
subterrâneas.
Há muito que se constroem barragens para controlar cheias e criar, por deposição
de sedimentos, solos mais aptos para a agricultura; a primeira barragem de que se tem
notícia é a de El-Kafara, no Egito, construída há cerca de 4800 anos. Na antiguidade
também se construiam diques, para controle das inundações, bem como canais,
aquedutos, túneis e galerias para transporte de água. Também eram utilizadas as
máquinas de elevação de água, como o parafuso de Arquimedes, as rodas d'água, as
noras e os sarilhos.
Nos séculos X e XI, expandiu-se a utilização da roda d´água para o esmagamento
de frutas e sementes, apiloamento de fibras, tecidos, minérios e e metais, bem como
para o acionamento dos foles de fornalhas. Nos séculos XIX e XX, com o
desenvolvimento científico e tecnológico, o homem passou a dispor de materiais,

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


4

equipamentos e técnicas que lhe permitiram construir sistemas mais eficazes para a
utilização e controle de grandes vazões. A construção metálica, primeiramente de ferro
fundido e depois de aço, permitiu obter equipamentos hidráulicos eficientes e condutos
de grandes diâmetros capazes de resistir a pressões elevadas. As turbinas hidráulicas e
as bombas centrífugas vulgarizaram-se a partir da primeira metade do século XX,
determinando a grande expansão da produção de energia elétrica e o consequente
desenvolvimento industrial. O concreto armado, difundido no início do presente século,
veio facilitar a construção de estruturas hidráulicas.

Evolução do Uso de Recursos Hídricos

5000
Consumo(quilômetros
cúbicos por ano)

4000

3000

2000

1000

0
1900 1920 1940 1960 1980 2000
Ano

Uso Domestico Uso Industrial


Uso Agricola Uso Total

No mundo moderno, a água está presente em múltiplas atividades humanas e, dessa


forma, é utilizada para finalidades diversas, entre as quais destacam-se o abastecimento
público e doméstico, os usos agrícola e industrial e a produção de energia elétrica. Até
passado recente, as necessidades de água cresceram gradualmente, acompanhando o
lento crescimento populacional. A expansão urbanística, a industrialização, a agricultura
e a pecuária intensivas e ainda a produção de energia elétrica, as quais encontram-se
estreitamente ligadas à elevação do nível de vida e ao crescimento populacional
vertiginoso do século XX, passaram a exigir crescentes quantidades de água. A Figura 1
mostra o crescimento do consumo mundial de água entre 1900 e 1999; observe que o
consumo de água aumentou em cerca de 10 vezes, ao passo que a população mundial
apenas quadruplicou.

Figura 1 - Evolução do Uso de Recursos Hídricos no Século XX (Fonte : Water


Resources - Environmental Planning, Management and Development, Biswas A., 1996)

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


5

Além das grandes quantidades exigidas, algumas utilizações prejudicam fortemente


a qualidade da água que, se restituída ao meio natural sem tratamento prévio, impede o
seu uso, além de ser nociva ao próprio ambiente. Esse é o caso da poluição provocada
pelos usos domésticos, público e industrial, bem como pelos adubos e pesticidas
intensamente usados na agricultura atual. As dificuldades crescentes de satisfação das
necessidades de água, em consequência das elevadas quantidades exigidas e também da
alteração da qualidade de água resultante de seus usos, são motivos de inquietação das
sociedades modernas por indicarem um quadro insustentável em termos prospectivos.
Com a finalidade de diminuir os volumes de água captada, têm sido adotadas novas
tecnologias industriais, exigindo menores quantidades de água e cargas menos
poluidoras, e tem-se procedido à reutilização e reciclagem da água. Também na
irrigação, têm-se desenvolvido técnicas que requerem menores quantidades de água.
Além dos problemas associados à satisfação das necessidades de água, põem-se
aqueles relacionados ao controle do excesso de água, que pode causar níveis freáticos
prejudicialmente elevados, inundações, erosão dos solos e assoreamento dos leitos dos
cursos d'água.
Na resolução dos variados problemas decorrentes da utilização de recursos hídricos,
surgem frequentemente interesses antagônicos. Tome-se, como exemplo, o caso de um
reservatório destinado ao fornecimento de água para a produção de energia hidrelétrica
e irrigação de culturas agrícolas, bem como ao amortecimento de cheias a jusante. Para
um mesmo volume de reservação, quanto maior for a parcela destinada ao
amortecimento de cheias, menor será o volume disponível para regularizar as vazões e,
consequentemente, menor será o volume utilizável para a produção de energia e para a
irrigação. Além disso, as vazões fornecidas pelo reservatório para uso agrícola não se
distribuem no tempo de forma compatível com a distribuição temporal do valor
monetário da produção hidrelétrica.
As crescentes necessidades de água, a limitação dos recursos hídricos, os conflitos
entre múltiplos usos e usuários e os prejuízos causados pelo excesso de água exigem
que a gestão de recursos hídricos, compreendendo as ações de planejamento e
administração, se faça em termos racionais e otimizados, devendo integrar-se nas
políticas nacionais e regionais de desenvolvimento econômico e social. Assim, governos
e instituições têm-se preocupado com os aspectos científicos e educacionais, associados
à gestão de recursos hídricos, bem como com as estruturas institucionais para sua
efetiva implementação a níveis nacional, estadual e regional. A concretização dos

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


6

objetivos da gestão de recursos hídricos passa pela adesão das comunidades a esses
objetivos e aos princípios a eles subjacentes, o que torna imprescindível a
conscientização de lideranças, técnicos e população em geral para os problemas de
utilização da água.

3. Classificação dos Usos da Água

A água pode ter os seguintes usos :


♦ Geração de energia elétrica
♦ Abastecimento doméstico
♦ Abastecimento industrial
♦ Irrigação de culturas agrícolas
♦ Navegação
♦ Piscicultura
♦ Pesca
♦ Assimilação e afastamento de esgotos

Entre as utilizações acima distinguem-se os chamados usos consuntivos e não-


consuntivos da água.

3.1 Usos Consuntivos da Água

Os usos consuntivos são aqueles em que ocorrem "perdas" entre o volume de água
captado e o volume que retorna ao curso d'água ou sistema natural. Apresenta-se abaixo
uma breve caracterização dos principais usos consuntivos da água.

Abastecimento Urbano
Todos os usos gerados em cidades, vilas e pequenos núcleos urbanos para fins de
abastecimento doméstico, comercial, público e industrial são considerados usos
urbanos. A demanda urbana é constituída pela demanda doméstica, acrescida de outras,
praticamente indissociáveis dessa por referirem-se às atividades que dão origem ao
núcleo urbano, quais sejam a indústria, o comércio e a prestação de serviços públicos e
privados. A demanda urbana de água é definida mediante a determinação da população

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


7

abastecível e a adoção de quotas per capita. A população deve ser estimada por estudos
demográficos, enquanto a quota per capita é função dos níveis de desenvolvimento
social e das condições sanitárias desejáveis; em geral, os consumos específicos de água
crescem com o nível de vida e com o tamanho do núcleo urbano.

Abastecimento Rural
O abastecimento doméstico nas áreas rurais é pouco significativo, sendo as demandas
dispersas e de pequena monta. Após o cálculo da população abastecível, é usual
adotarem-se quotas per capita, em geral bem menores do que as usadas para núcleos
urbanos. Outros usos, como a dessendatação de animais, poderão ser de importância em
regiões áridas ou semi-áridas.

Abastecimento Industrial
Existem vários tipos de uso da água nos processos industriais : refrigeração e geração de
vapor, incorporação ao produto, higiene e limpeza. As demandas industriais dependem
de coeficientes de uso e de perdas de cada tipo, de cada ramo industrial e da tecnologia
empregada. A Tabela 1 sumariza os consumos industriais específicos médios de água,
considerando alguns ramos da indústria e seu produto.

Tabela 1 - Consumos industriais específicos médios de água (Fonte : Sistemas Urbanos


de Ägua, Dacach N. G., 1975)

Tipo de Indústria Consumo Específico Médio


Laminação de Aço 85 m3 / ton de aço
Refino de Petróleo 290 m3 / barril refinado
Indústria Textil 1000 m3 / ton de tecido
Couros-Curtume 55 m3 / ton de couro
Papel 250 m3 / ton de papel
Saboarias 2 m3 / ton de sabão
Usinas de Açúcar 75 m3 / ton de açúcar
Fábricas de Conservas 20 m3 / ton de conserva
Laticínios 2 m3 / ton de produto
Cervejarias 20 m3 / m3 de cerveja
Lavanderias 100 m3 / ton de roupa
Matadouros 3 m3 / animal abatido

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


8

Irrigação
A irrigação artificial de culturas agrícolas é empregada para suprir as deficiências
pluviais, proporcionando teor de umidade no solo suficiente para promover o
crescimento das plantas e levá-las à maturidade. Representa o uso consuntivo de maior
importância face às perdas por evapotranspiração, as quais podem chegar a 90% do
volume de água aduzido ao perímetro irrigável.

Aquicultura - piscicultura, ranicultura, outras.


A demanda de água para a aquicultura é, em geral, de pequena expressão, sendo mais
importantes os requisitos de qualidade da água para o desenvolvimento da atividade.

3.2 Usos Não-Consuntivos da Água

Os usos não-consuntivos são aqueles em que não há "perdas" entre o volume de


água captado e o volume que retorna ao curso d'água ou sistema natural. Apresenta-se
abaixo uma breve caracterização dos principais usos não-consuntivos da água.

Geração de Energia Elétrica


É o principal uso não-consuntivo da água. Em geral, as grandes usinas hidrelétricas
dispõem de reservatórios para a regularização de vazões, os quais implicam em
alteração do regime dos cursos d'água, em perdas significativas por evaporação através
de seu espelho d'água, em alterações da qualidade das águas e do equilíbrio dos
ecosistemas aquáticos.

Navegação Fluvial
Para que sejam atingidas as condições de navegação comercial em cursos d'água, é
preciso que sejam mantidas vazões que garantam o calado mínimo exigido pelas
embarcações. Em condições naturais, os cursos d'água são navegáveis somente durante
certa época do ano. Através de obras de melhoramento fluvial e regularização de
vazões, pode-se alargar os períodos em as condições de navegabilidade estejam
asseguradas. Embora se possa melhorar as condições de navegabilidade mediante a
criação de reservatórios, as barragens podem representar obstáculos à navegação caso
não sejam construídas as eclusas para a transposição de níveis.

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


9

Recreação e Harmonia Paisagística


A água é um dos elementos mais importantes na promoção da qualidade de vida,
particularmente através de atividades recreativas, esportes náuticos, navegação e pesca
recreativas. O requisito fundamental para essas atividades é a qualidade da água,
assegurada pela proteção dos cursos e corpos d'água e combate às fontes poluidoras.

Pesca
O desenvolvimento da pesca em reservatórios artificiais pode propiciar excelente fonte
de proteínas para as populações interiores. As demandas de água estão relacionadas a
requisitos de qualidade.

Diluição, Assimilação e Afastamento de Esgotos e Resíduos Líquidos


As demandas para diluição, assimilação e afastamento de esgotos urbanos, industriais,
resíduos de atividades agrícolas, como agrotóxicos e fertilizantes, estão relacionadas às
cargas poluidoras, às classes de qualidade estabelecidas para os cursos e corpos d'água,
assim como à capacidade dos mesmos se autodepurarem. Embora não sejam uma
demanda consuntiva, esse uso pode resultar em padrões de qualidade que limitam o uso
dos recursos hídricos.

Usos Ecológicos
Os usos ecológicos estão associados à manutenção de padrões adequados de qualidade
das águas para a conservação da fauna e da flora, com a manutenção de ambientes
propícios às atividades humanas e à preservação da harmonia paisagística. Requer a
proteção dos recursos hídricos contra a ação de agentes poluidores.

4. Condicionantes para Uso dos Recursos Hídricos

Existem algumas especifidades que determinam condicionantes para a utilização


racional dos recursos hídricos e, em decorrência, devem ser consideradas ao se efetivar
o balanço entre as disponibilidades e as demandas; algumas delas encontram-se
caracterizadas a seguir.

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


10

4.1 Controle do Regime Hidrológico

Águas Superficiais
O regime das águas superficiais é variável, apresentando importantes variações
interanuais e sazonais. A regularização de vazões, através da criação de reservatórios de
acumulação, é uma das formas usadas para desenvolver o potencial hídrico de uma
bacia hidrográfica.

Águas Subterrâneas
Os aquíferos devem ser utilizados racionalmente, mediante o controle permanente dos
níveis de suas águas e das vazões extraídas, evitando assim a sua exaustão.

Controle de Cheias
As cheias são fenômenos naturais que estão na origem da formação das planícies
aluvionares, marginais aos cursos d'água, as quais são inundadas periodicamente. Essas
inundações restringem o uso desses terrenos para fins urbanos e/ou agrícolas, razão pela
qual o homem procura exercer algum controle sobre as cheias e minimizar os prejuízos
por elas causados.

Controle de Estiagens
Particularmente em climas semi-áridos, ocorrem períodos extensos sem nenhuma
chuva, o que tem obrigado o homem a construir açudes e reservatórios de acumulação.
Mesmo em regiões mais úmidas, a variabilidade sazonal das disponibilidades e o
aumento das demandas exigem a regularização das vazões, sem o que os riscos de
insuficiência tornar-se-iam muito altos.

4.2 Controle da Poluição

A poluição das águas e dos aquíferos é provocada pelo lançamento de efluentes


urbanos, industriais e resíduos de atividades agrícolas. O tratamento prévio desses
efluentes é indispensável para o controle da poluição e conservação dos recursos
hídricos.

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


11

4.3 Controle da Erosão

A água é agente de mudanças na configuração topográfica da superfície terrestre


através dos processos erosivos. As ações humanas de desmatamento do solo rural, para
fins agrícolas, ou de desnudamento do solo, para fins urbanos, aceleram os processos
erosivos, alterando danosamente o equilíbrio dos recursos água-solo. As medidas de
controle visam evitar a aceleração dos processos erosivos.

5. Gestão de Recursos Hídricos

A gestão de recursos hídricos refere-se ao conjunto de procedimentos através dos


quais se pretende equacionar e resolver as questões de escassez relativa dos recursos
hídricos; compreende ações integradas de planejamento e administração.
O planejamento de recursos hídricos visa avaliar prospectivamente as demandas e
disponibilidades desses recursos e alocá-los entre múltiplos usos e usuários, de forma a
obter os máximos benefícios econômicos e sociais, com os menores impactos
ambientais e dentro de um cenário de sustentabilidade.
A administração de recursos hídricos é o conjunto de ações necessárias para
tornar efetivo o que foi planejado, com os devidos suportes técnicos, jurídicos e
administrativos.

6. Engenharia de Recursos Hídricos

O aproveitamento e a conservação dos recursos hidricos são tarefas que requerem


concepção, planejamento, administração, projeto, construção e operação de meios para
o controle e a utilização racionais das águas. Envolve não só a atuação de engenheiros
civis, como também a de outros profissionais como advogados, economistas, químicos,
biólogos, sociólogos e geógrafos. À Engenharia de Recursos Hídricos corresponde o
conjunto de conhecimentos e técnicas de engenharia utilizado para planejar, projetar e
operar sistemas de recursos hídricos destinados a controlar e regular a água para
satisfazer a uma diversificada gama de propósitos.
De forma ampla, pode-se agrupar os problemas relacionados à engenharia de
recursos hídricos nos seguintes blocos : (a) Controle do Excesso de Água, (b)

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


12

Conservacão da Quantidade de Água e (c) Conservacão da Qualidade de Água. Os dois


primeiros blocos envolvem principalmente as especialidades de engenharia hidrológica
e engenharia hidráulica, enquanto o terceiro bloco refere-se primordialmente à
engenharia ambiental. O objetivo dessas notas de aula é o de sumarizar os fundamentos
de engenharia necessários à solução dos problemas relacionados ao controle do excesso
e à conservação da quantidade de água. Aos leitores interessados em outros tópicos da
engenharia de recursos hídricos sugere-se consultar a bibliografia adicional
recomendada. Essas notas de aula dividem-se em três partes : (a) Parte I - Engenharia
Hidrológica, (b) Parte II : Engenharia de Recursos Hídricos e (c) Parte III : Princípios
de Gestão e Legislação de Recursos Hídricos.

7. Bibliografia Adicional Recomendada

♦ Engenharia de Recursos Hídricos. Linsley R. K. & J. B. Franzini, trad. Port. de L.


A. Pastorino. Editora McGraw-Hill do Brasil, 798 p., 1978.
♦ Curso : Introdução à Gestão de Recursos Hídricos (apostila). Secretaria de
Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da
Amazonia Legal. Belo Horizonte 18-22/08/1997.
♦ Hydrosystems - Engineering & Management. Mays L. W. & Y. Tung. McGraw-
Hill, Inc., 530 p., 1992.
♦ Water Resources - Environmental Planning, Management and Development.
Biswas A., McGraw-Hill, Inc., 737 p., 1996.

Engenharia de Recursos Hídricos - Notas de Aula Mauro Naghettini


Notas de Aula de Engenharia de Recursos
Hídricos

Parte 1

Engenharia Hidrológica
14

1. - FUNDAMENTOS E APLICAÇÕES DA HIDROLOGIA

1.1 - HIDROLOGIA X ENGENHARIA HIDROLOGICA

Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circulação e distribuição,
suas propriedades físico-químicas e suas reações com o meio ambiente e a vida sobre a
Terra.
Engenharia Hidrológica refere-se à parte da Hidrologia que trata das questões relativas ao
planejamento, projeto e operação de obras de engenharia para controle e uso da água.

Interfaces: Matemática , Probabilidade e Estatística , Hidraúlica , Meteorologia, Geologia ,


Geomorfologia , Geografia , Economia , etc.

1.2 - O CICLO HIDROLÓGICO

Ev
ETP

Zona Int
Aerada

Inf
Ev
Ev
Es
Inf
Ess
Zona saturada
Eb
Substrato
Impermeável

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


15

1.3 - BREVE HISTÓRICO

As primeiras obras hidráulicas datam da pré-história construídas à base de elementos


puramente intuitivos. A concepção atual do CICLO HIDROLÓGICO teve evolução lenta ;

Gregos e Romanos:
• Sabiam que os oceanos são a fonte básica da água no globo terrestre
• Não aceitavam a idéia de que a precipitação pode igualar ou exceder o escoamento
• Teorias absurdas para justificar a existência de rios e fontes
• Obras: Aquedutos

"Pont du Gard"

Ponte sobre o rio Gardon, construida pelos


romanos em 20 AC, nas proximidades da
cidade de Nîmes, França. O andar superior
de arcos era também um prolongamento de
um aqueduto de cerca de 50 km de extensão
e apenas 17 m de desnível, destinado ao
abastecimento da antiga fortaleza romana de
"Nemausus".

Egípcios:
• 4000 A.C. : barragem no rio Nilo para irrigação
• 3000 A.C. : canal entre Cairo e Suez

Mesopotâmia:
• cidades tinham barreiras para proteção contra cheias.

Chineses:
• obras de irrigação e de proteção contra cheias.

Marcus Vitruvius Pollio (100 A.C.) em “De Architectura Libri Decem” foi o primeiro a
reconhecer o papel da precipitação no ciclo hidrológico, aproximadamente conforme a
concepção atual.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


16

"Nora" - esquema de funcionamento da "nora", mecanismo


descrito por Marcus Vitruvius Polio (“ De Architectura Libri
Decem”) para retirar água de poços e rios.

Leonardo da Vinci ( fim do sec. XV ) : entendimento correto do ciclo hidrológico, embora


sem nenhuma quantificação de qualquer das variáveis do ciclo.

Século XVIII : Pierre Perrault : instrumentos rudimentares e 3 anos de observações ⇒


vazão média do rio Sena = 1/6 precipitação; Mariotte : medições de vazões no rio Sena
pelo processo área-velocidade; Halley : estimou a evaporação do Mar Mediterrâneo.

Século XVIII : tubo de Pitot, teorema de Bernoulli, fórmula de Chézy.

Século XIX : lei de Darcy, fórmula de Dupuit.

Século XX : desenvolvimento da Hidrologia Científica.

Brasil : recente ( impulso a partir da construção de grandes barragens ).

1.4 - O BALANÇO HÍDRICO

A - Ciclo Simplificado

Sem Sub-ciclos

P − Q = dS
P dt

S : armazenamento
A

Superfície impermeável fechada, com exceção do ponto A

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


17

B - Ciclo Completo em uma Região

QQ
11 Es

Ss
Ts

Eg
Tg Q2
I

Rg

Sg
G1

G2

rocha

P − Q − G − E − T = ∆S

1.5 - DADOS HIDROLÓGICOS

Os dados hidrológicos são necessários para quantificar a precipitação, o escoamento


superficial, a evaporação, a umidade do solo, a transpiração, a infiltração, a qualidade da
água e outras variáveis componentes dos sistemas hidrológicos.

Fonte de dados no Brasil: ANA (programa Hidroweb em www.ana.gov.br), CEMIG,


CPRM, COPASA, SUDENE, INMET e outros.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


18

1.6 - UNIDADES DE MEDIDA

Vazões (águas superficiais) : l /s , m3 / s

Vazões (água subterrânea) : l / min, l / h , m 3/ dia

Volumes : m 3, 10 6 m 3, mm, (m 3 / s) . mês

Altura de Chuva : mm, cm

Intensidade de Chuva : mm / h

Evaporação e Transpiração : mm, cm

1.7 - HIDROLOGIA NA ENGENHARIA

Relacionada com o projeto e a operação de estruturas hidráulicas

- Qual deve ser a vazão de enchente para o projeto de um vertedor de uma barragem? Para
um bueiro de uma estrada? Para a drenagem pluvial de uma cidade?

- Qual é a capacidade (volume) necessária para assegurar água para um projeto de


irrigação? Ou para o abastecimento de uma cidade durante as estiagens?

- Que efeito terão os reservatórios, diques e outras obras no controle das cheias de um rio?

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


19

2. - BACIA HIDROGRÁFICA

2.1 - FATORES QUE INFLUEM NO ESCOAMENTO SUPERFICIAL

Climáticos: Fisiográficos:
Tipo da Precipitação Área de Drenagem
Intensidade da Chuva Uso da Terra
Duração da Chuva Cobertura Vegetal
Distribuição da Chuva s/ Região Tipo de Solo
Direção do Deslocamento do Temporal Forma e Drenagem
Chuva Antecedente Distribuição do Relevo
Umidade do Solo Antecedente Altitude Média
Evaporação Comprimento do Rio Principal
Transpiração Declividade da Bacia
Outros Reservatórios Naturais/Artificiais

2.2 - ÁREA DE DRENAGEM

Limites de uma bacia hidrográfica

Princípio : O escoamento superficial se dá perpendicularmente às curvas de nível e o


Divisor de Águas é uma linha ortogonal a essas curvas, partindo-se da seção transversal em
questão ( posto fluviométrico) até o ponto mais alto da bacia.

310

405 +

+ 390

+ 410

414 +

+ 461

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


20

Se o solo da bacia é muito impermeável, os limites são os divisores de água topográficos.


Se o solo é permeável, a bacia real pode diferir um pouco da bacia topográfica.

Bacia Bacia
Topográfica Real

Na prática, são usados os


limites topográficos.

camada impermeável
Camada impermeável

2.2.A - EFEITO DA ÁREA NAS VAZÕES MÁXIMAS

QBP QBG
 Duas bacias sujeitas à mesma chuva >
ABP ABG
bacia grande  maior tempo de resposta
maior armazenamento

QBP Q
 Duas bacias sujeitas a chuvas diferentes >>> BG
ABP ABG

distribuição espacial de uma chuva curta e intensa cobrem uma


pequena área, diminuindo a região de influência.

 Q máx = c . A m c , m  regressão ( m < 1 )

2.2.B - EFEITO DA ÁREA NAS VAZÕES MÍNIMAS

Grandes bacias mantém mais a vazão durante os períodos de estiagem.

2.2.C - EFEITO DA ÁREA NAS VAZÕES MÉDIAS

m
1
Q = c1 ⋅ A

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


21

2.3 - USO DA TERRA (agricultura, estradas, urbanização)

Intercepção, Erosão, ETP

2.4 - COBERTURA VEGETAL

área com cobertura


K1 = coeficiente de vegetação =
área total

Intercepção, Erosão, ETP, Inundações

2.5 - TIPO DE SOLO

Solo permeável  maior capacidade de infiltração


menor escoamento superficial

2.6 - COMPRIMENTO DO RIO PRINCIPAL - L ( km )

L = L1 . s

L1 = comprimento medido no mapa


s = coef. de sinuosidade 1,04≤ s≤1,25

2.7 - DECLIVIDADE DO RIO PRINCIPAL - d ( m / km , m / m )

Altitude
(m) A

d = D
L D
A

Distância da Nascente (km)

2.8 - DECLIVIDADE DA BACIA - I

∆ ⋅ Lc
I= ∆ = diferença de cota entre as curvas de nível ( constante )
A
L c = comprimento total das curvas de nível na bacia
A = área de drenagem

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


22

2.9 - DENSIDADE DE DRENAGEM - Dd

Lt
Dd = L t = extensão total dos cursos d’água existentes na bacia
A
A = área de drenagem

Quanto maior Dd , mais rápido é o escoamento ( sujeito a inundações )

2.10 - FORMA DA BACIA

Influi sobre a proporção em que a água chega ao rio principal.


Coeficiente de Forma ( C f ) → C f = A2
L
[ ≥ 1 : arredondada ; < 1 : alongada ]

0,28 ⋅ P
Coeficiente de Compacidade ( Cc ) → C c =
A
[ 1 : circular; >> 1 : alongada ]

2.11 - RELEVO - CURVA HIPSOMÉTRICA - ALTITUDE MÉDIA

150
140
130
100 110 120

Altitude ( m ) Área ( km 2 ) Peso - wi Acumulado - ∑ wi


> 150 A1 w1 = A1 / A w1
140 - 150 A2 w2 = A2 / A w1 + w2
130 - 140 A3 w3 w1 + w2 + w3
120 - 130 A4 w4 w1 + w2 + w3 + w4
110 - 120 A5 w5 w1 + ... + w5
100 - 110 A6 w6 w1 + ... + w6
< 100 A7 w7 w1 + ... + w7 = 1 ou 100
A 1

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


23

Σ wi

100%
Altitude Média - Hm

Hm =
∑ Ai ⋅ H i
A 50%

100 110 120 130 140 150


Altitude Mediana Altitude

Interpretação

1 - Declividade forte nas baixas altitudes

∑ wi

 Vale de planície sujeito


a inundações

Altitude

2 - Declividade pequena e uniforme

∑ wi

 Vale encaixado

Altitude

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


24

3. - HIDROMETEOROLOGIA

3.1- INTRODUÇÃO

39
Umidade sobre
100 o Continente
Precipitação 385
Continental Precipitação
Marítima
61
Evaporação e
Evapotranspiração 424
Continentais Evaporação
Marítima

38
Escoamento
Superficial

1
Escoamento
Subterrâneo

Variáveis do ciclo hidrológico normalmente medidas : precipitação, evaporação e descarga.

Variáveis do ciclo e fatores intervenientes eventualmente medidos : ETP, temperatura do ar


e da água, temperatura máxima e mínima, direção e velocidade do vento, intensidade e
duração da radiação solar.

3.2 - SERVIÇO HIDROMETEOROLÓGICO NO BRASIL

Responsabilidade: ANA/CPRM e INMET


Serviços: Hidrometeorológico, hidrométrico, e qualidade da água

Outros: CEMIG e outros.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


25

3.3 PRECIPITAÇÃO

Definição : Precipitação é a descarga d’água (líquida ou sólida) proveniente da


condensação do vapor d’água contido na atmosfera.

Principais formas : Chuva ( gotas de 0,5 a 3 mm de diâmetro)


Chuvisco ( gotas de 0,1 a 0,5 mm)
Granizo ( gelo compactado)
Neve ( cristais de gelo)
Orvalho

Formação da chuva : Frontal


Convectiva
Orográfica

Medida da Precipitação : Se faz mediante observações puntuais, através de aparelhos


chamados pluviômetros e pluviógrafos.

3.3.1 INSTRUMENTOS

A - PLUVIÔMETRO

Princípio : medida volumétrica da água recolhida sobre uma superfície horizontal de área
determinada.
Unidade : milímetros (mm) de tal forma que 1mm = 1 litro/m2 ( para isso, a superfície
coletora e o volume obtido pela proveta graduada devem ser compatíveis).
Tipos : vários. No Brasil usa-se o tipo "Ville de Paris".

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


26

1,5 m

2h

Características : - Área de captação : 400 cm2


- Instalado a 1,5 m de altura do solo ( padronização brasileira)
- Provetas de 7 e 25 mm com graduação em 0,2 mm
- Precisão : 0,1 mm
- Observações às 7h da manhã contabilizadas para o dia anterior

Erros Possíveis : - Defeito de fabricação ( tamanho da superfície do coletor ) : ± 0,5 %


- Evaporação da água recolhida : − 1 %
- Vento pode chegar até 20 %
- Árvores, construções, etc.

B - PLUVIÓGRAFO

Princípio : - É o mesmo do Pluviômetro com registro contínuo, permitindo portanto medir


a intensidade da precipitação
- Mecanismo de relojoaria mais registro gráfico, com a devida calibragem.

Tipos : - Sifão - Báscula - Massa

Pluviógrafo I.H. é do tipo de massa com sifão para descarregar a cada 10mm.

suporte da
haste da pena estribo do suporte da
haste da pena
massa de
mínima

haste da pena

mesa

massa de limitador de
máxima balança

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


27

Pluviógrafo 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 1 2 3 4 5 6 7
Us.Biogás hora 10
9
colocado em 8
05/01/97 7
às 07 horas 6
5
retirado em
06/01/97 4
às 07 horas 3
2
Operador 1
CEMIG 0
mm -1

Hora Precipitação (mm) Hora Precipitação (mm) Hora Precipitação (mm)


7-8 0 15-16 3,0 23-24 0,6
8-9 0 16-17 0 24-1 0,4
9-10 0,4 17-18 1,4 1-2 2,3
10-11 0,2 18-19 5,2 2-3 0,5
11-12 1,5 19-20 2,8 3-4 0,4
12-13 3,1 20-21 0,4 4-5 1,4
13-14 6,0 21-22 3,4 5-6 5,4
14-15 5,0 22-23 3,0 6-7 1,0

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


28

3.3.2 - VARIAÇÃO ESPACIAL DA PRECIPITAÇÃO

Geralmente, a precipitação cresce com a altitude. Em muitos casos, pode-se dizer que a
chuva decresce de montante para jusante em uma bacia hidrográfica. Para diversos tipos de
estudos hidrológicos, é necessária a determinação da chuva média na bacia.

Chuva Média - Métodos

( intervalo de tempo : totais de chuva mensais e anuais )

Média Aritmética P3

P1 + P2 + P3
Pm =
3
P1
P2

Método de Thiessen

Área total = A

A1
p1 = P3 A3
A

A2
p2 =
A
P1 P2
A A1 A2
p3 = 3
A

Pm = p1 . P1 + p2 . P2 + p3 . P3

Método das Isoietas

P Área Peso ( pi )
> 1500 A1 A1 / A
1400 - 1500 A2 A2 /A
1300 - 1400 A3 A3 /A
1200 - 1300 A4 A4 /A
< 1200 A5 A5 / A
A

1400 1500
Pm = Σ pi . Pi 1200 1300

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


29

3.3.3 - PREENCHIMENTO DE DADOS FALTOSOS EM UM POSTO

Métodos

1- Correlação com posto vizinho ( Regressão Linear Simples)


2- Método das 3 estações mais próximas

1 M M M 
Px =  x ⋅ P1 + x ⋅ P2 + x ⋅ P3 
3  M1 M2 M3 

onde Mi são as Médias de Longo Termo ( MLT) dos diversos postos.

3.3.4 - VERIFICAÇÃO DA HOMOGENEIDADE DE DADOS DE CHUVA

Razões da não homogeneidade de dados de chuva :

- crescimento da vegetação próxima


- desmatamento nas proximidades
- mudança na sistemática das observações
- incoerência da proveta com o coletor, etc.

Método : curva de dupla acumulação ("dupla massa") de TOTAIS ANUAIS

P1 + P2 + P3 + P4
Padrão Regional : P =
4

Σ P4 63 β
62
(ano a ano)
64

65 Pa : valor acumulado corrigido


66 P0 : valor acumulado a corrigir

67 Correção :
68 α
tgα
69
Pa = ⋅ P0
tgβ
Σ P (ano a ano)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


30

3.4 - EVAPORAÇÃO E TRANSPIRAÇÃO

3.4.1 - INTRODUÇÃO

A evaporação das superfícies líquidas e a evapotranspiração (evaporação da água das


camadas superficiais do solo, da água armazenada pela intercepção e da água que retorna à
atmosfera sob o processo da transpiração ) representam conjuntamente um processo muito
importante do ciclo hidrológico.

Numa escala continental, cerca de 75 % da precipitação anual total retorna à atmosfera por
evaporação e transpiração (Linsley et al., 1975).

Geralmente, faz-se a distinção entre a ETP potencial e a ETP real . A ETP potencial é
definida como uma perda d’água da bacia, entendendo-se que, a todo instante, o solo pode
fornecer a água necessária as plantas. Sob condições máximas do teor de umidade do solo a
ETP potencial pode ser igual à evaporação de superfícies líquidas. Por outro lado,
diferenças muito significativas podem existir entre a ETP real e a ETP potencial
particularmente durante os períodos secos ou em regiões áridas.

3.4.2 - EVAPORAÇÃO

Resultado da Radiação Solar + Turbulência + Umidade Contida No Ar

Fatores intervenientes : - temperatura do ar e da água


- umidade relativa do ar
- vento
- radiação solar
- pressão atmosférica

Umidade Relativa do Ar - U

Definição : O grau de umidade relativa do ar atmosférico é a relação entre a quantidade de


vapor d’água presente no ar e a quantidade de vapor se este ar estivesse completamente
saturado de umidade. Unidade : %. As quantidades acima são expressas em pressão de
vapor (mm de Hg ou mb). A umidade do ar pode ser medida através dos psicrômetros.
t
Fórmula Psicrométrica : e = est’ − Ap ( t − t’ )
t'
e → p.v. parcial a t oC (mm de Hg)
est’ → p.v. saturante a t oC (mm de Hg)
Ap → constante psicrométrica ≅ 65 x 10 -5 c/ vent. forçada
~~
~~~
Psicrômetro : entramos com t e t’ nas tabelas psicrométricas e
V vento > obtemos U em % .
2,5 m/s

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


31

3.4.3 - EVAPORIMETRIA

A evaporação aumenta com : - a temperatura do ar e da água


- a velocidade do vento
- a radiação solar
- a diminuição da umidade relativa do ar
- a diminuição da pressão

A evaporação pode ser medida através de 2 tipos de aparelhos : os atmômetros e os tanques


evaporimétricos. Unidade : mm.

Tanques Evaporimétricos : são recipientes achatados, em forma de bandeja, de seção


quadrada ou circular, enterrados ou não, com água no seu interior e instalados próximos à
massa d’água cuja intensidade de evaporação se quer medir ( ou flutuando sobre a própria
massa d’água ). No local, deve-se medir também a temperatura, a velocidade e direção do
vento, a umidade relativa e a precipitação.

O tanque mais usado é o classe A do U.S. Weather Bureau.

Descrição :
122 cm

micrômetro
5cm

Poço Estrado de
25,4cm
tranquilizador madeira

15 cm

Instalação : Obs : para cálculo da


evaporação em reservatórios,
em função de sua maior
tanque
inércia, deve-se corrigir a
evaporação medida no tanque
Planta → por um fator inferior a 1. No
tanque classe A : k = 0,7 a
pluviômetro
0,8.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


32

3.4.4 - EVAPOTRANSPIRAÇÃO ( E T P )

A evapotranspiração é a grosso modo, a quantidade de água exigida pelas culturas para


levá-las à maturidade. Esta quantidade de água fica armazenada nos tecidos da planta ou é
convertida em vapor, retornando à atmosfera onde ela se reintegra ao ciclo hidrológico.

Fatores que afetam a ETP : a radiação solar, o vento, a umidade relativa, a pressão
atmosférica, as características do solo e diversos fatores
vegetativos.

Fatores Vegetativos ( Transpiração ) :

O tipo, a coloração, a densidade e o período de crescimento da planta afetam, a exposição, a


distribuição e a refletividade da radiação solar, bem como a turbulência do ar.
Inversamente, estes elementos afetam a abertura dos estômatos das diversas plantas de
formas diferentes, alterando a transmissão da água de seus sistemas radiculares até as
folhas. Além disso, as plantas têm períodos de crescimento diferentes, variando portanto
suas exigências sazonais de água.

Características do Solo ( Evaporação do Solo ) :

Quando a camada superficial do solo está úmida, a evaporação é regida pelas condições
atmosféricas. Quando ela se torna seca, a evaporação diminui rapidamente e começa a ser
governada pelas propriedades do solo como : a umidade relativa do ar no solo, a
composição, textura, granulometria e umidade presente neste solo e sua condutividade
hidráulica.

Métodos para a avaliação da ETP :

• Evapotranspirômetros (ETP potencial) ou Lisímetros (ETP real)


• Balanço Hídrico a nível da bacia (ETP real)
• Correção dos dados de tanques evaporimétricos (ETP potencial)
• Métodos teóricos (ETP potencial)

 Evapotranspirômetros e Lisímetros

A evapotranspiração potencial pode ser medida através de aparelhos denominados


evapotranspirômetros, cujo princípio de funcionamento encontra-se esquematizado na
figura a seguir. Com relação a essa figura, se P representa a precipitação (ou o volume de
irrigação expresso em altura equivalente) tal que o teor de umidade do solo seja mantido à
sua capacidade máxima (capacidade de campo), então é válida a expressão
ETPpot = P − S

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


33

onde S representa o volume medido de água drenada por gravidade. Sem a aplicação de
chuva artificial, isto é se o teor de umidade do solo puder se deplecionar livremente até
mesmo abaixo do ponto de murchamento permanente, o evapotranspirômetro (ou
lisímetro, no caso presente) irá medir a evapotranspiração real ou efetiva.

Capacidade
de Campo

 Correção dos dados de tanques evaporimétricos

Muitas pesquisas ( exterior ) foram realizadas na tentativa de se estimar a ETP potencial


a partir da correção dos dados do tanque evaporimétrico classe A . Exemplo :

Exemplo : No Canadá  cultura : trigo, coeficiente = 0,66


cultura : beterraba, coeficiente = 0,54

 Métodos Teóricos

A deficiência de dados básicos e as dificuldades para medições de campo, levaram


muitos pesquisadores a estabelecer equações teóricas visando estimar a ETPpotencial a
partir de dados climatológicos e meteorológicos disponíveis. Equações mais conhecidas :
Hedke, Lowry-Johnson, Blaney-Criddle, Thornthwaite, Penman, Penman-Monteith,
Hargreaves e Turc. (ver “Handbook of Hydrology “ - Maidment, ed.).
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
34

Equação de Penman :

Penman (1948) combinou as equações de transferência de energia e de massa no


desenvolvimento de sua fórmula para o cálculo da evaporação de um corpo d’água. A
fórmula de Penman pode ser expressa da seguinte forma :
α En + Ea
E= (1)
α +1
onde E é a intensidade de evaporação em cm/dia, Ea representa a intensidade de evaporação
em cm/dia devida às trocas de massa, En a intensidade de evaporação em cm/dia devida à
transferência de energia e α é um fator de ponderação. O termo En pode ser avaliado por
Qn
En = (2)
ρHv
onde Qn simboliza a radiação solar líquida, medida por aparelhos chamados radiômetros e
expressa em cal/cm2/dia, ρ é a massa específica da água em g/cm3 e Hv é o calor latente de
vaporização em cal/g. O termo Ea pode ser calculado pela expressão

 100 − U 
E a =(0,013 + 0,00016v 2 )es   (3)
 100 
na qual, v2 é a velocidade do vento medida a 2 metros acima da superfície e expressa em
km/dia, es é a pressão de vapor de saturação em milibares, à temperatura do ar T °C, e U é a
umidade relativa do ar. O fator de ponderação α é uma função da temperatura do ar T (°C) e
dado por

α=
(0,00815T + 0,8912)
7
(4)
0,66

Exemplo : Calcular a intensidade de evaporação pela fórmula de Penman para as seguintes


condições atmosféricas : temperatura do ar T=28°C, radiação solar líquida Qn=670
cal/cm2/dia, velocidade do vento v2=180 km/dia e umidade relativa do ar U=82%.

Solução :
-cálculo da pressão de vapor de saturação es

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


35

PRESSAODE VAPOR DE SATURACAO(milibares)

120

100

80

E
60

40

e
20

0
10
To 30
T 50
0 20 40
TEMPERATURA (graus Celsius)

Com T=28°C no gráfico ⇒ es=37,38 mb


-cálculo de Ea
Equação (3) ⇒ Ea=0,284 cm/dia
-cálculo de Hv
supondo que a temperatura da água é a mesma do ar, Hv=597,3-0,564T = 581,51 cal/g
-cálculo de En
Equação (2) com ρ=1g/cm3 ⇒ En=1,152 cm/dia
-cálculo de α
Equação (4) ⇒ α=3,337
-cálculo de E
Equação (1) ⇒ E=0,952 cm/dia ou 9,52 mm/dia

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


36

4. - MÉTODOS ESTATÍSTICOS ELEMENTARES

4.1 - INTRODUÇÃO

Variáveis aleatórias são aquelas governadas pela chance, não podendo ser previstas com
certeza, mas somente em termos probabilísticos. A maioria das variáveis hidrológicas são
aleatórias. As variáveis aleatórias podem ser discretas ou contínuas.

Discretas : só podem assumir valores inteiros.


Ex.: número de dias chuvosos em um ano

Contínuas : podem assumir qualquer valor numérico real em um intervalo.


Ex. : vazões médias diárias de um rio em uma determinado seção fluvial

m no de ocorrências de determinado evento


Frequência relativa : f = =
N no total de ocorrências

f p
se N → ∞ FUNÇÃO DENSIDADE
ou ∆x → 0 DE PROBABILIDADE
população com
p = lim f
N →∞
HISTOGRAMA

∆x x x
intervalo de classe

Frequência acumulada : Σ f ( soma acumulada para cada intervalo de classe )

F=Σf 0≤ P ≤1
se N → ∞ P
ou ∆x → 0
1 1
população com

P= ∫ p ⋅ dx
−∞
FUNÇÃO ACUMULADA
0≤ F ≤1 DE PROBABILIDADE

∆x X X

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


37

Exemplo de Distribuição de Probabilidade : Distribuição NORMAL ou de GAUSS

p P
1

x

−→

0,5

x x

FX ( x ) = Ρ ( X ≤ x ) =
1
x
− 12 ( ) dx
x−µ 2
média = moda = mediana
σ 2π −∞
∫e σ

condição de simetria
Função Densidade de Probabilidade Normal Função Acumulada da Distribuição Normal

4.2 - ALGUMAS DEFINIÇÕES

Uma variável hidrológica ou meteorológica pode ser representado por uma variável
aleatória. Na maioria dos problemas de inferencia estatística, supõe-se que uma AMOSTRA
de observações da variável em estudo possui uma distribuição de freqüência análoga à função
densidade de probabilidade da POPULAÇÃO [p(x)].A integração da função densidade de
probabilidade p(x) [ou f(x)] define a função acumulada de probabilidade ou função de
repartição P(x) [ou F(x)] da variável
x
F (x ) = P(x ≤ X ) = ∫ f (x ) ⋅ dx
−∞

1

→
Freq f(x) P(x ≤ X)

0 x 0 0 X x

Densidade de Probabilidade Função Repartição

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


38

A função de repartição F(x) de uma variável aleatória contínua fornece para qualquer x , a
probabilidade de que X seja menor ou igual a x e [1 - F(x)] indica a probabilidade de
que X seja maior do que x. Inversamente, a partir de F(x) pode-se obter o valor de X
correspondente.

4.2.1 - PARÂMETROS ESTATÍSTICOS

As distribuições de probabilidade podem ser descritas pelos seus parâmetros (e.g.: µ e σ


para a distribuição normal), os quais são funções das características de tendência central,
variabilidade e assimetria, entre outras.

4.2.1.1 - CARACTERÍSTICAS DE TENDÊNCIA CENTRAL


Média : População  µ = E( X )= ∫ x f X ( x )dx Amostra  x = Σx
−∞
N

Moda : valor de x que possui a máxima probabilidade ou dp/dx = 0 e d2p/dx2 < 0

Mediana : valor de x para o qual as probabilidades de ocorrência de valores


superiores e inferiores são as mesmas e iguais a 50 %.

4.2.1.2 - CARACTERÍSTICAS DE VARIABILIDADE

2

∞ 
Desvio-Padrão da População : σ = Var( X )= ∫−∞x f X (x )dx− −∫∞ x f X (x )dx
2

Σ( x − x )
2
N  Σx 2 
Desvio-Padrão da Amostra : S = =  − x 2 
N −1 N −1 N 

Coeficiente de Variação : C v =
σ S

µ x

f (x) σ=1

σ=3

0 X=x-µ

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


39

4.2.1.2 - CARACTERÍSTICAS DE ASSIMETRIA

f f f
γ=0 γ>0 γ<0

Média = Moda = Mediana x Moda ≠ Mediana ≠ Média x Média ≠ Mediana ≠ Moda x

Distribuição Simétrica Distribuições Assimétricas

µ3
Coeficiente de Assimetria da População : γ = com µ 3 =E( X − µ )3
E( X − µ )
2

N2  Σx 3 Σx 2 
Coeficiente de Assimetria da Amostra : g = ⋅  −3 ⋅ x + 2 x 
(N − 1)(N − 2)  N N 

Se a população pudesse ser completamente amostrada, a distribuição da variável aleatória


seria totalmente conhecida pelos seus parâmetros. Os parâmetros das distribuições são
funções das medidas populacionais de posição, escala e forma da variável aleatória.

µ - média da população ( associada ao parâmetro de posição de uma distribuição)


σ - desvio padrão da população ( associado ao parâmetro de escala de uma distribuição)
γ - coeficiente de assimetria da população ( associado ao parâmetro de forma de uma
distribuição)

Na prática, a população não é totalmente conhecida e as conclusões quanto às


características distributivas devem ser extraídas a partir da amostra.

Exemplo : Série xi : x1 , x2 , x3 , ... , xn ⇒ Estimadores:


n

∑x i
1 n
Média: x = 1 Desvio Padrão : Sx = ∑ ( x i − x )2
n n −1 1

n
n
⋅ ∑ ( xi − x )
3
Coeficiente de Assimetria : g =
(n − 1)(n − 2) 1

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


40

4.3 - REGRESSÃO E CORRELAÇÃO

Algumas variáveis podem ser DEPENDENTES entre si e, entretanto, não serem ligadas por
uma relação funcional ou determinística (exemplo de uma relação funcional : variação da
quantidade de calor fornecida com a elevação da temperatura de um corpo de massa m e
calor específico c ou Q = m.c.∆t) . No primeiro caso, as variáveis podem estar associadas
por uma relação correlativa e diz-se que elas são ESTOCASTICAMENTE dependentes.
Exemplo: o escoamento de uma bacia depende estocasticamente de inúmeras variáveis, tais
como precipitação, temperatura, umidade do solo, cobertura vegetal, relevo, geologia, etc..
Uma relação funcional ou determinística, tal como Q = f ( P, T, H, γ, R,G ), é impossível.

A teoria da regressão e correlação visa determinar a melhor RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA


entre as variáveis e estabelecer qual é o GRAU dessa dependência estocástica. Utilização das
técnicas de regressão e correlação em hidrologia :

- curva-chave Q = a . ( H - Ho )n a=? n=?


- extensão de séries
- previsão hidrológica
- regionalização hidrológica

Sejam duas variáveis aleatórias X e Y , das quais conhecemos suas amostras de


tamanhos n e m respectivamente :

X x 1 x 2 x3 ... xn Obs: As ocorrências x i , y i são


simultâneas ou tomadas
Y y1 y2 y3 . . . yn . . . ym no mesmo intervalo de tempo

Existem 2 problemas diferentes a analisar:

1o ) Problema Estatístico ou da CORRELAÇÃO


Qual é o grau da dependência estocástica entre x e y ? ou
Qual é o coeficiente de correlação R entre x e y ?

2o ) Problema Geométrico ou da REGRESSÃO


Qual é a melhor relação entre x e y ? ou
Qual é o lugar geométrico dos pontos ( xi , yi ) que tornam mínimos os desvios entre os
pontos observados e estimados ( yi - yestimado ) ?

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


41

Y Y → variável dependente ou explicada


Y = a.X + b
X → variável independente ou explicativa
( yi - yestim )
)
ou ( yi - yi ) Y = a X + b → Modelo da regressão
(R.L. Simples)
X
o
1 Problema : R = ?
2o Problema : a = ? b=?

Observações relativas ao coeficiente de correlação R

−1 ≤ R ≤ 1 Y Y

R = 0 → não existe correlação R>0 R<0


R=1 a relação é funcional
R=−1
X X
Requisitos estatísticos necessários para a corrrelação e regressão :

1 - os desvios da variável dependente Y em relação à reta de regressão ( para cada x ) são


normalmente distribuídos e sua variância é constante ao longo de X. (var. hidrológicas)
2 - os valores de X são conhecidos sem erros significativos. ( ± )
3 - os valores de Y são autocorrelacionados. Dependem do ∆t.
4 - as duas variáveis são homogêneas. OK

Modelos de Regressão :

Linear : Y = a . X + b
Simples
Não Linear : Y = a . X b

Linear : Y = a . X + b . Z + c . T + ...
Múltipla
Não Linear : Y = a . X m . Z n . T p

Seqüência para a Regressão Simples :


1- agrupar as 2 amostras convenientemente,
2- existe sentido físico ?
3- plotar os pontos ( x , y )
4- escolher o modelo de regressão, ou seja a forma da equação
5- resolver matematicamente o problema
6- verificar se os resultados estão de acordo com os princípios físicos

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


42

Modelo a ser estudado: REGRESSÃO LINEAR SIMPLES

Y = a.X + b a=? b=? R=?

Resolução : zi = yi − (axi + b)

Para evitar que zi > 0 e zi < 0 distorça a medida dos desvios , eleva-se ao quadrado :

zi 2 = [ yi − ( a xi + b )] 2

Para n pontos zi :
n n
Z = ∑ z i = ∑ [ yi − (a ⋅ xi + b )]
2 2

i =1 i =1

Z é uma função de a e b .

Quando Z passar por um ponto de mínimo (soma dos quadrados dos desvios é mínima ), os
coeficientes a e b, nesse ponto, serão os que definem a reta que melhor se ajusta.

∂Z ∂Z
Portanto, condição de mínimo : =0 e =0
∂a ∂b

Resolvendo o sistema de duas equações e duas incógnitas,

n ⋅ ∑ x i ⋅ y i − Σx i ⋅ Σy i Σy i ⋅ Σx i − Σx i ⋅ ∑ x i ⋅ y i
2

a= e b=
n ⋅ Σxi − (Σxi ) n ⋅ Σxi − (Σxi )
2 2 2 2

Cálculo do coeficiente de correlação R

Y
variância explicada
yˆ i R2 =
variância total
y Coef. de Determinação
Σ( yˆ i − y )
2
2
R =
Σ( y i − y )
2
yi

X R = ± R2
n∑ xi y i − (∑ xi )(∑ y i )
Coef.de Correlação R=
 i
( ) [
n∑ x 2 − ∑ x 2  n y 2 − ( y )2
i  ∑ i ∑ i ]
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
43

Obs: O coef. de correlação R é igual tanto para Y = a .X + b como para X = c.Y + d

Obs: Se a regressão fosse X = c.Y + d , teríamos :

n ⋅ ∑ x ⋅ y − Σx ⋅ Σy Σx ⋅ Σy 2 − Σy ⋅ ∑ x ⋅ y
c= e d=
n ⋅ Σy 2 − (Σy )
2

n ⋅ Σy − (Σy )
2 2

Transformação de Variáveis

Q = a . H n → log nos 2 membros da equação H

log Q = log a + n . log H

z m t

ou z = m + n.t → Regressão Linear Simples Q

5. - F L U V I O M E T R I A

5.1 - INTRODUÇÃO

Princípio : As séries de vazões são obtidas indiretamente.

10

RN2 8

6
haot
C
4

RN1 0
0 1000 2000 3000 4000

Q
Descarga

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


44

Medições de Cotas Medições de Descargas

Cotas Linimétricas (7 e 17 h) Medições Simultâneas


ou de Cotas e Descargas [ hi , Qi ]
Cotas Linigráficas (contínuas)

Cotas Médias Diárias - Estação _______ Ano ___


Cota
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
--- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- ---
--- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- ---

curva chave
Med
Max
Min Descarga

Descargas

5.2 - POSTO FLUVIOMÉTRICO

seção de controle
Requisitos :
PF
• permitir as observações dos níveis
seção de medição
d’água em qualquer época do ano;
• permitir condições favoráveis para a
PI realização de medições de descargas;
• permitir a boa definição da curva
linígrafo
chave.
observador
seção das réguas

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


45

Para isso, é preciso que :


• a estação localize-se em trecho reto e sem obstáculos;
• a seção de medição seja mais ou menos simétrica, com taludes de declividade
acentuada;
• a seção de medição apresente distribuição regular de velocidades;
• a velocidade média na seção seja superior a 0,3 m/s;
• as características físicas do trecho a jusante da seção das réguas assegurem a
estabilidade da relação cota-descarga (curva chave);
• haja acesso fácil, rápido e permanente ao local; e
• exista no local um morador que possa efetuar as leituras de cotas de forma
permanente e consciente.

O conjunto das estações fluviométricas/fluviográficas de uma região constitui a rede


fluviométrica.

5.3 - MEDIÇÕES DE COTAS OU NÍVEIS D’ÁGUA

Cotas Linimétricas :

• duas leituras às 7 e 17 horas;


4
• a cota média diária é a média
RN2 : 3,659 m
aritmética das cotas de 7 e 17
h = 2,22 3 3 horas;
• as réguas linimétricas são niveladas
2 2 periodicamente, partindo-se das
cotas dos RN’s;
1 1 • é usual estabelecer-se a cota
altimétrica do zero das réguas, a
RN1 : 0,328 m
partir de amarração a um RN
0
altimétrico próximo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


46

Cotas Linigráficas :

Linigrama

Linígrafo de Flutuador : permite o


Tanque
de Polia registro gráfico contínuo da variação
descarga
de cotas. Esse registro é chamado
linigrama, a partir do qual se obtem
Contrapeso
as cotas médias diárias, além das
cotas máximas e mínimas para
Flutuador
durações inferiores ao dia.

Tomada d’água
Válvula

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


47

5.4 - MEDIÇÕES DE DESCARGAS

Métodos :
• vertedores ou calhas medidoras ;

diluição de traçadores químicos ou radiativos  Q=q  ; e


C

 c 
• área-velocidade.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


48

Princípio do Método Área-Velocidade :

Largura : 0 ≤ x ≤ L Profundidade : 0 ≤ y ≤ p(x)


L
Área da seção de medição : A=∫ p( x )dx
0

L p(x )
1 1
Velocidade média na seção de medição : V =
L ∫0 ∫ p(x )v(x, y )dxdy
0

Descarga na seção de medição : Q= AV


Na prática :
• selecionam-se verticais espaçadas de distâncias conhecidas;
• medições puntuais de velocidade são efetuadas através de molinetes posicionados em
pontos escolhidos ao longo da profundidade de cada vertical;
• determina-se a velocidade média em cada vertical, a qual é suposta ser representativa
de um setor de área da seção transversal;

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


49

• determina-se a descarga do setor de seção, multiplicando-se sua velocidade média pela


área do setor; e
• determina-se a descarga da seção transversal somando-se todas as descargas setoriais.

guincho fluviométrico

conta-giros
A medição pode ser feita a vau,
cabo fluviométrico a barco, a balsa, com carro
aéreo ou sobre pontes.
molinete

lastro

O molinete permite a medição da velocidade


em qualquer ponto da vertical. É usual medir-
V0,2 0,2p
se as velocidades a 20 e a 80% da
0,8p profundidade, Nesse caso, a velocidade média
p
V0,8 na vertical é tomada como a média aritmética
de V0,2 e V0,8. Quando a profundidade é
pequena, a velocidade média é tomada igual à
velocidade puntual V0,6.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


50

Cálculo da Descarga na Seção Transversal :


D2
D1

PI 1 2 3 ... i- i i+1 ... n PF


l1 l2 1 l i-1 li

...
V2 , p2

V3 , p3

Di Vi , pi

l +l
Área no setor i : Ai = pi  i −1 i  m2
 2 
V + Vi ,0,8
Velocidade média no setor i : Vi = i ,0, 2 m/s
2

Descarga no setor i : qi = Ai Vi m3/s

n
Descarga total na seção : Q=∑ qi m3/s
i =1

5.5 - C U R V A CHAVE

Depois de algum tempo de operação do posto, quando já se tem um número razoável de


medições de descarga (e as leituras de cotas no momento em que elas foram feitas ),
devidamente espaçadas no tempo e ao longo da amplitude de variação das cotas, é
necessário definir a relação COTA - DESCARGA ou CURVA CHAVE ou ainda CURVA DE
CALIBRAGEM, necessária para a transformação das leituras de nível d’água (cotas) feitas
pelo observador (ou do linígrafo) em descargas. A curva chave depende do controle do
posto fluviométrico.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


51

Controle : Conjunto de características físicas ( leito, configuração, forma, etc.) do trecho a


jusante do posto, que governa a relação cota - descarga ou curva-chave.

natural : cachoeira ou trecho de corredeiras ( controle da prof. crítica )


Controle
artificial : vertedouro, ponte ou outra estrutura

Na ausência dos dois, o controle pode ser o canal a jusante ou simplesmente a resistência à
vazão exercida pelo trecho de jusante. Exemplos :

Q=C L ( H − P) 3 2
= C L h3 2

h
H

Q≈C A I h
Q
h

Controle de Seção Controle de Canal

Na maioria dos casos, não existe um controle único e bem definido.Existe sim uma série de
seções de controle variando com a cota.

controle de canal
para vazões altas

controle para
vazões baixas
controle para
vazões médias

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


52

Em função do tipo de controle do posto e da declividade do trecho em que se encontra,


podemos ter 3 tipos de curvas de calibragem :
10

6
Cota

(a) Curva Chave Estável e Unívoca


4

0
0 1000 2000 3000 4000
Descarga

10

ramo para cotas em deplecao


8

6
Cota

ramo para cotas em elevacao

4 (b) Curva Chave não Unívoca (laço)

0
0 1000 2000 3000 4000
Descarga
10

8 1965-1978

6 1950-1965
Cota

1978-1995
(c) Curva Chave Instável
4

0
0 1000 2000 3000 4000
Descarga

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


53

As curvas estáveis e unívocas (tipo a) são aquelas de postos situados em trechos de rio de
morfologia pouco variável,de mesma declividade da linha d’água tanto nas cheias como nas
estiagens e controle de profundidade crítica ( cachoeira, corredeira, etc.).

Definição preliminar da Curva-Chave de um posto fluviométrico :

1- Em papel milimetrado, plotam-se as cotas em ordenadas e as vazões em abcissas

2- Tenta-se ajustar “a sentimento “ e graficamente uma curva ( ou um conjunto de


curvas em concordância ) parabólica aos pontos;
OU
ajusta-se pelo processo dos mínimos quadrados ( regressão ) curvas dos tipos :

Q = a .(H - Ho) n , onde Ho → cota para Q = 0

Q=a + b.H + c.H2

3- Como podem existir cotas observadas acima e abaixo do intervalo definido da


curva, esta deve ser extrapolada até estes extremos, utilizando-se as equações
definidas no item 2 ou através de outros processos, como o de Stevens com base
nas condutâncias A Rh ou ARh2/3 (consultar bibliografia adicional recomendada ).

4 - Definida a Curva-Chave, transforma-se a série de cotas médias diárias


observadas (ou obtidas pela redução de linigramas) em série de vazões médias
diárias. Daí, obtem-se as vazões médias MENSAIS , as médias ANUAIS , as MÁXIMAS
e MÍNIMAS necessárias para a análise hidrológica.

Ajustamento de curvas teóricas para a definição da curva chave :

1- Q = a . ( H - Ho) n , sendo Ho a cota para a qual Q = 0


 não é fácil determinar na prática.

O ajustamento pode ser feito por iteração de Ho , resolvendo-se ( para cada iteração)
o sistema por mínimos quadrados ou graficamente ( em papel log x log ) somando-
se ou subtraindo-se Ho às cotas até linearizar os pontos ( cota ± Ho , Q ).

2- Q=a + b.H + c.H2

a = ?, b = ?, c = ? , o processo é semelhante ao da regressão linear simples.Aqui,


trata-se de REGRESSÃO NÃO LINEAR SIMPLES .

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


54

Hi Qi

H1 Q1
H2 Q2
. . n observações simultâneas de H e Q
. .
. .
Hn Qn

H
n
Z = ∑ zi
2
(
z i = Qˆ i − Qi
2
) ; i =1

( Hi ,Qi) condição ∂Z/∂a=0 sistema de


Hi de ∂Z/∂b=0  3 equações e
mínimo. ∂Z/∂c=0 3 incógnitas
$
zi = Qi − Qi
Resolução do sistema  a,b,c

Q
Q̂i Qi

Neste caso, o sistema n .a + b.Σ Hi + c.Σ Hi2 = Σ Qi (I)


a ser resolvido , é a .Σ Hi + bΣ Hi2 + c.Σ Hi3 = Σ Qi Hi ( II )
a .Σ Hi2 + b.Σ Hi3 + c.Σ Hi4 = Σ Qi Hi2 ( III )

5.6 - MANIPULAÇÃO DE DADOS HIDROLÓGICOS ( VAZÕES )

Dados de Vazões : Boletins Fluviométricos


Geralmente são publicadas as séries de vazões, as fichas descritivas e as seções
transversais de medição dos postos fluviométricos. As séries apresentam : vazões médias
diárias ( 7 e 17 ou linigrama ), médias mensais, médias, máximas e mínimas anuais.

Variação das Vazões


As vazões variam durante a hora, o dia, o mês, o ano e de um ano para outro. Essas
variações devem-se à fatores como :
- as diferentes intensidade e volumes da precipitação,
- a direção da evolução e desenvolvimento da tormenta na bacia,
- o teor de umidade presente no solo,
- a evaporação e fatores associados como temperatura, vento,etc.,
- a forma da bacia e sua cobertura vegetal,
- a geologia superficial.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


55

De um modo geral, pode-se dizer que :


a) Uma bacia permeável, tendo uma grande capacidade de infiltração, acumula águas
subterrâneas, possuindo um pico atrasado em relação ao início da chuva. Em bacias
impermeáveis ( por exemplo bacias urbanas), o pico está mais próximo do início da chuva
devido ao rápido escoamento superficial.
b) Para as pequenas bacias, chuvas muito intensas provocam enchentes, enquanto que
para grandes bacias, as enchentes ocorrem quando há precipitações de menor intensidade,
porém de grande duração.

O conhecimento da variação das vazões no tempo e no espaço, é necessário para o


planejamento racional dos recursos hídricos.

5.6.1 - UTILIDADE DOS DADOS DE VAZÕES MÉDIAS DIÁRIAS E MENSAIS

Mensais: aplicações em estudos de regularização de vazões por reservatórios, isto é, a


determinação dos volumes necessários à garantia do suprimento constante de
água nos períodos chuvoso e sêco, para diversas finalidades como irrigação,
abastecimento urbano, produção de energia elétrica, etc.

Diárias: aplicações em navegação, previsão de inundações, dimensionamentos de


vertedouros e outras estruturas hidráulicas.

5.6.2 - FLUVIOGRAMA

Consiste em plotar os dados de vazão em função do tempo, permitindo uma boa


visualização dos picos de vazão e dos períodos de cheia e estiagem. Os fluviogramas
podem ser construídos com dados de vazões médias diárias ou médias mensais, em que a
escala de vazões pode ser logarítmica ou aritmética.

1000
ESTAÇÃO CHUVOSA ESTAÇÃO SECA
Vazões
Médias
Diárias
(m3/s)
Recessão do fluviograma
Q = Q0 exp (-K t )
100 K : inclinação da recessão
Q0
Q

t dias
10
OUT NOV DEZ JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


56

5.6.3 - CURVA DE PERMANÊNCIA

Consiste na ordenação dos dados de vazões médias diárias, ao longo de um período de


observação, em intervalos de classe, indicando a porcentagem do tempo em que uma
determinada vazão foi igualada ou superada naquele período de observação.

INTERVALO DE FREQUÊNCIA FREQUÊNCIA FREQUÊNCIA PORCENTAGEM


CLASSE ( * ) ABSOLUTA RELATIVA ACUMULADA DO TEMPO
143 - 126 1 0,01 0,01 1 %
126 - 109 0 0,00 0,01 1%
109 - 93 2 0,02 0,03 3%
93 - 76 3 0,03 0,06 6%
76 - 59 9 0,09 0,15 15 %
59 - 42 10 0,10 0,25 25 %
42 - 25 25 0,26 0,51 51 %
25 - 8,6 46 0,48 1,00 100 %
NIC= número de intervalos de classe
k = amplitude do intervalo de classe : k=(Qmax - Qmin)/NIC

Q
Exemplo de Aplicação da Curva de Permanência (m3/s)
Uma indústria deseja se instalar próxima a um
curso d’água e lançar o seu efluente no mesmo. Q1
Feito o estudo de autodepuração e necessitando
de uma vazão de diluição Q1 , qual é a
porcentagem do tempo em que a vazão do curso
d’água será igual ou superior a esse valor? 0 50 100
Porcentagem Acumulada

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


57

6. - I N F I L T R A Ç Ã O

Definição : Infiltração é o fenômeno da penetração da água no solo através de sua


superfície. É um elemento muito importante do ciclo hidrológico. Em
condição de muita umidade, a maior parte da precipitação continental se
infiltra.
Solo: O solo é constítuido de grãos, água, ar e vapor d’água.

O movimento da água no solo é governado por 3 tipos de força :


agregado
estrutural - molecular: os grãos são recobertos por uma finíssima camada
d’água (higroscópica) mantida por forças moleculares. Não
pode ser considerada ativa do ponto de vista hidrológico.

poros - capilar : resultado da tensão superficial, a água é mantida no


solo contra a ação da gravidade. Depende do diâmetro dos
poros e portanto das características do tipo de solo.
poros
- gravitacional: movimento da água nos canalículos de maior
diâmetro devido a ação da gravidade.

A grosso modo, o terreno pode ser dividido em 3 zonas de umidade principais:

Infiltração Zona de Aeração : a infiltração se dá nesta região.


Uma parte dos interstícios é ocupada pela água e o
resto por ar. Esta proporção varia com a recarga
através da precipitação.
Zona de Aeração
Franja Capilar : os poros capilares estão preenchidos
com água e os poros maiores encontram-se em sua
maioria vazios. A pressão é próxima da pressão
Franja Capilar atmosférica.

Zona Saturada : aquífero subterrâneo propriamente


Zona Saturada dito. Todos os poros estão preenchidos com água. A
superfície de um aquífero livre apresentaria pressão
igual à atmosférica nessa região.

Movimento da Umidade no Solo : A infiltração é o movimento da água através da


superfície do solo para o seu interior, diferente da percolação que é o movimento da água
através do solo. Quando chove, a água tem um movimento descendente através dos
canalículos maiores, enquanto os poros menores absorvem água por capilaridade. Esta
absorção acontece mesmo com a água em movimento descendente, portanto diminuindo a
quantidade de água gravitacional que passa para as camadas inferiores do solo. Este
aumento da resistência ao escoamento gravitacional provoca a diminuição da capacidade de
infiltração, na medida em que a chuva continua. Pela mesma razão, a capacidade de
infiltração no início de uma chuva é menor se os poros capilares já estiverem sido
preenchidos numa chuva ocorrida poucas horas antes.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


58

6.1 - ALGUMAS DEFINIÇÕES

Capacidade de Infiltração ( f )

É a quantidade máxima de água que um solo, sob uma dada condição, pode absorver na
unidade de tempo por unidade de área horizontal. Só se verifica quando a intensidade da
precipitação excede a capacidade do solo em absorver água.

Teor de Umidade do Solo

É a quantidade de água presente no solo por ação da capilaridade. Se o solo, no início da


precipitação, já apresenta uma certa umidade, ele terá uma capacidade de infiltração
menor do que se estivesse seco. Os agrônomos referem-se à máxima quantidade de água
retida por capilaridade como CAPACIDADE DE CAMPO.

Variação da capacidade de infiltração f


Precipitacao, Infiltracao e Escoamento Superficial (mm/h)

Precipitação

Infiltração

Escoamento
Superficial

Tempo desde o inicio da chuva (h)

Obs 1 - No início da chuva, a capacidade de infiltração é fo , diminuindo até um valor


constante fc , a medida que o solo vai se tornando saturado. Este valor limite é definido pela
permeabilidade do sub-solo.

Obs 2 - Só se pode falar em capacidade de infiltração, se a intensidade da chuva for maior


que a infiltração num instante qualquer.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


59

Outras variações
Capacidade de Infiltracao (mm/h)

Capacidade de Infiltracao (mm/h)


Textura grosseira Solo com Cobertura
Solo arenoso Vegetal

Textura fina Solo Desnudado


Solo argiloso

Tempo desde o inicio da chuva (h) Tempo desde o inicio da chuva (h)
Capacidade de Infiltracao (mm/h)
Capacidade de Infiltracao (mm/h)

Solo Cultivado

Solo Abandonado Solo Seco

Solo Saturado

Tempo desde o inicio da chuva (h) Tempo desde o inicio da chuva (h)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


60

Determinação Direta da Capacidade de Infiltração

Princípio : Pode ser feita através de aparelhos denominados INFILTRÔMETROS. Esses são
tubos cilíndricos curtos, de chapa metálica, com diâmetros variando de 200 a 900 mm,
cravados verticalmente no solo, de modo a restar uma pequena altura livre sobre
este.Durante todo o tempo da experiência, mantem-se sobre o solo, uma camada de água de
5 a 10 mm de espessura, medindo-se os volumes adicionados a cada intervalo de tempo. A
capacidade de infiltração média neste intervalo de tempo, é o volume adicionado dividido
pela seção transversal do tubo.Causas de erros :
- ausência do efeito de compactação produzida pela água de chuva,
- fuga do ar retido para a área externa do tubo,
- deformação da estrutura do solo com a cravação dos tubos.

6.2 - CÁLCULO DA CAPACIDADE DE INFILTRAÇÃO PUNTUAL

A - Método de Horton ( 1930 )

f0 fo depende do grau de umidade do


solo (mm/h)
Capacidade de Infiltracao ( mm/h )

Fórmula de Horton
fc valor aproximadamente constante
para o qual tende a capacidade de
infiltração, dependente das
fp = fc + ( f0 - fc ) exp ( -k t ) características de permeabilidade
do solo (mm/h)

k é uma constante empírica (h-1)

fc f0 − fc
F= fc t − [exp(− kt ) − 1]
k

Tempo (horas)

B - Método de Philip ( 1957 )

b
f =a+ onde a e b são parâmetros relacionados com o grau de umidade
2 t
do solo e a permeabilidade.
Integrando a equação acima, teríamos a curva da infiltração acumulada F com o tempo,ou

F = a.t + b t

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


61

Indice de Infiltração φ

Os dados necessários para se obter uma curva de capacidade de infiltração válida em uma
região ou bacia são de difícil obtenção. Nessas circunstâncias, o indíce de infiltração φ ,
embora muito simplista, é uma alternativa para se estimar a infiltração a partir da análise
dos hidrogramas de enchentes e precipitações que as causaram. Esse índice é definido
como o valor constante a ser subtraído das intensidades variáveis de chuva de forma a
obter o volume de escoamento superficial observado. De posse da distribuição temporal da
precipitação e do volume observado (ou altura equivalente) de escoamento superficial,
calcula-se o índice φ através do processo de tentativa-erro, tal como exemplificado a seguir.

Exemplo : Uma precipitação de duração 6 horas teve a seguinte distribuição temporal :


Tempo (h) 0-1 1-2 2-3 3-4 4-5 5-6
Intensidade de 4 16 13 2 11 4
Chuva (mm/h)

Se o volume observado de escoamento superficial foi S=20 mm, calcule o índice φ.

Solução : A altura total de chuva foi de 50 mm, o que significa que a altura equivalente do
volume de infiltração foi de 50-20=30 mm. Supondo-se que o índice φ esteja compreendido
entre 5 e 10 mm/h, a solução iterativa faz-se através da seguinte equação :
(i1-2 - φ)×∆t + (i2-3 - φ)×∆t + (i4-5 - φ)×∆t = S ou
(16-φ)×1+(13-φ)×1+(11-φ)×1 = 20 ⇒ φ = 6,667 mm/h, encontrando-se portanto no
intervalo entre 5 e 10 mm/h, como inicialmente suposto. Caso essa suposição estivesse
incorreta, o valor calculado estaria fora do intervalo e se procederia a uma nova tentativa.
Agora, faça um gráfico da variação temporal das intensidades de precipitação para o
exemplo acima. Você irá verificar que temos 20 mm acima do índice φ, correspondentes ao
escoamento superficial, e 30 mm abaixo, esses relativos ao volume de infiltração.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


62

7. - ÁGUA SUBTERRÂNEA

7.1 - INTRODUÇÃO

Distribuição e Movimento da Água na Terra

Designação Velocidade de Movimento % Volume Total


Atmosfera centenas de km por dia 0,001
Água Superficial dezenas de km por dia 0,019
Água Subterrânea metros por ano 4,120
Gelos e Glaciares metros por dia 1,650
Oceanos 93,960

A água subterrânea representa 66 % de toda a água doce e 99 % de toda a água


doce não gelada existente no planeta.

7.2 - A ÁGUA NO SOLO

7.2.1 - O solo como meio de movimento e retenção de água

Um solo pode ser definido como um conjunto heterogêneo de fragmentos de matéria


inorgânica de várias dimensões e diferente composição mineralógica, bem como de matéria
orgânica , ar e água. A fração mineral de maiores dimensões corresponde ao ‘esqueleto’.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


63

Entre as partículas maiores existem grãos como argilas, óxidos de ferro e produtos de
decomposição orgânica. Este arranjo chama-se ESTRUTURA DO SOLO e cada elemento
constituinte é o AGREGADO ESTRUTURAL. A TEXTURA do solo está relacionada com a
distribuição das dimensões das partículas ( curva granulométrica ).

- vazios estruturais
VAZIOS OU POROS DO SOLO
( ar + água ) - vazios texturais

Ligação entre os poros ↔ ESTRUTURA

vazio
estrutural

agregado
estrutural Granuloso Prismático Em Blocos

vazio textural Achatada

Volume dos Poros V


Porosidade ( n ) : n = = P
Volume Total da Amostra VT

ÁGUA VP = 0,3 m3

AREIA
SATURADA
3
AREIA VT = 1,0 m
SECA

0,3
n= = 0,3
1,0

Valores de n para alguns tipos de solo :

Areia uniforme , solta 0,46 ou 46%


Areia não uniforme , solta 0,40
Areia uniforme compactada 0,34
Areia não uniforme compactada 0,30
Argila 0,50
Argila com alto teor de mat. orgânica 0,75

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


64

A porosidade representa a quantidade máxima de água que um solo saturado pode conter.
Entretanto, somente parte desta água está disponível para abastecer um poço subterrâneo.

- capilares ( φc ) → água mantida pela tensão superficial


poros - supercapilares ( φ > φc ) → forças gravitacionais
- subcapilares ( φ < φc ) → forças de adesão

volume dos poros gravitacionais VG


Porosidade Efetiva : ne = =
volume total do solo VT

vol. poros cap. e sub. VC


Retenção Específica ou Capacidade de Campo = = nr =
volume total do solo VT

Argila : n = 50 , ne = 2 , nr = 48
n = ne + nr
Areia : n = 30 , ne = 26 , nr = 4

7.2.2 - Distribuição Vertical da Água Subsuperficial

Zona do Solo
Zona de
Aeração Zona Intermediária

Franja Capilar

Zona de Água Subterranea


Saturação

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


65

a) Zona do Solo [Profundidade = Função ( solo, raízes, vegetação)]

água higroscópica água capilar água gravitacional

↑ ↑ ↑ ↑ ↑
PV = 0 CH PMP CC ( nr ) SATURAÇÃO
COMPLETA (n)
Teor de Umidade

CH: coef. higroscópico = umidade máxima que um solo inicialmente seco pode absorver
com umidade relativa = 50 %.

PMP: ponto de murchamento permanente = teor de umidade abaixo do qual ocorre


definhamento permanente das plantas
(amostras submetidas a uma sucção de 15 atm ).

CC: capacidade de campo = quantidade de água presa ao solo depois que a água
gravitacional tenha sido drenada ( amostras submetidas a
uma sucção de 0,1 a 0,3 atm ).

b) Zona Intermediária ( profundidade de 0 a centenas de metros )


Região de conexão entre a água do solo e a zona saturada.
Forças capilares e higroscópicas. Água retida ≈ capacidade de campo

c) Zona Capilar ( profundidade varia com a textura do solo )


A água é retirada da zona de saturação completa por capilaridade.
O teor de umidade varia de 75 a 100 % da saturação completa.

d) Zona Saturada
A água preenche todos os poros da zona saturada

7.3 - AQUÍFEROS

Na zona de saturação, as questões são (i) qual é a quantidade de água presente? (ii) qual é a
quantidade que pode ser removida com segurança? (iii) como se dá o escoamento da água?

Aquífero → formação geológica que contém água e que a transmite de um ponto a


outro em quantidades suficientes para permitir sua utilização econômica.
( formações com porosidade efetiva alta como por exemplo a areia )
Aquífugo → formação geológica que não contém nem transmite água.
( por exemplo um maciço granítico )
Aquícludo → formação geológica que contém água, mas que não a transmite por possuir
alta retenção específica, não possibilitando sua extração.
( por exemplo formações com alto teor de argila)
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
66

recarga

poço artesiano não jorrante


superfície piezométrica
poço artesiano jorrante

poço freático

aquífero freático

aquífero
confinado

7.4 - RELAÇÃO ENTRE ÁGUA SUBTERRÂNEA E ÁGUA SUPERFICIAL

a) Cheias

NF original
Escoamento
direto

Escoamento base
impermeável

Escoamento NF original
Direto

t impermeável

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


67

b) Estiagens

Rios Perenes Rios Intermitentes

NF

NF

impermeável

impermeável

7.5 - ESCOAMENTO EM MEIOS POROSOS SATURADOS

2 2
p1 v1 p v
∆h + + z1 = 2 + 2 + z 2 + ∆h
γ 2g γ 2g
p1
vi ≈ 0 ∆h → perda de carga
γ
p2
Lei de Darcy ( 1856 ) :
γ
v = velocidade aparente de infiltração
L
z1 v ∝ ∆h e v ∝ 1
v L

área A z2 Se k é a cte de proporcionalidade :


∆h dh e dh
v=k =k Q=k⋅A
L dL dL

DATUM onde: dh/dL → gradiente hidráulico


k → coef. de permeabilidade

Validade da Lei de Darcy :


V ⋅ d 50
somente para escoamentos laminares 1 < Re = < 10 , os quais ocorrem na maioria
v
dos escoamentos na zona saturada.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


68

Coeficiente de Permeabilidade ou Condutividade Hidráulica - k

Q
k= → dimensões : LT -1
dh
A
dl

Refere-se à facilidade que um fluido irá passar pelo meio poroso. Depende do meio e do fluido.

k=f(µ,γ,d) A.D.
γ C : adimensional
k = C⋅d2 ⋅
µ

meio fluido

k1 = C d2 = permeabilidade intríseca ou específica do meio


( expressa em Darcy = 0,987 x 10-8 cm2 )

laboratório : Permeâmetros de carga constante e variável


Medidas de k
campo : “Auger Hole “ e ensaios de bombeamento

∆h

q⋅l
k=
q
L A ⋅ ∆h

Área A

7.6 - EQUAÇÕES GERAIS DO ESCOAMENTO

Forma Geral de Darcy : v = k ⋅ ∂h


∂S

∂s : distância ao longo da direção média do fluxo

Meio Anisotrópico : v x = k x ∂h , ∂h , ∂h
vy = k y vz = k z
∂x ∂y ∂z

Meio Isotrópico : v x = k ∂h ,
∂h , ∂h
vy = k vz = k
∂x ∂y ∂z

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


69

 ∂ (ρv x ) ∂ (ρv y ) ∂ (ρv z )  ∂ρ


Pela aplicação da Equação da Continuidade −  + + =
 ∂x ∂y ∂z  ∂t
a um fluido incompressível [ ∂ ρ / ∂ t = 0 ] , chega-se a :

Fluxo Permanente :
∂ 2h ∂ 2h ∂ 2h ( Recarga = Descarga )
+ + =0
∂x 2 ∂y 2 ∂z 2

Fluxo Não Permanente :


∂ 2h ∂ 2h ∂ 2h S ∂h
+ 2 + 2 = ⋅
∂x 2
∂y ∂z k ⋅ b ∂t

S→ coeficiente de armazenamento do aquífero ( volume de água libertado por uma


coluna vertical do aquífero, de seção unitária, quando a altura piezométrica
decresce de 1 unidade ).
b → espessura do aquífero
T = k . b → transmissividade do aquífero

7.7 - APROVEITAMENTO DA ÁGUA SUBTERRÂNEA

Representando 99 % de toda água doce não gelada da Terra, é uma importante reserva
hídrica para as diversas utilizações. O aproveitamento da água subterrânea se dá através de
poços ( hidráulica dos poços ).

Considerações iniciais sobre o escoamento nos aquíferos

a) Escoamento em um aquífero confinado horizontal de espessura constante

Equação unidirecional : ∂ 2h = 0
2

Superfície
Piezométrica ∂x
h h
Solução : h = C1 . x + C2
h = 0 e x = 0 → C2 = 0
v
b
Lei de Darcy : → ∂h = v e
∂x k
x
v⋅x
h=
k

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


70

b) Escoamento em um aquífero não confinado

A solução analítica da equação geral ( Laplace ) não


é possível. Hipóteses de Dupuit :
α • para pequenos declives do NF , as linhas de
NF real
fluxo em direção aos poços são
aproximadamente horizontais
h0 ( ∂ h / ∂ S = sen α passa a ∂ h / ∂ x = tg α )
h
NFcalc • o fluxo é horizontal e uniforme ao longo de toda
hL
a S.T. com velocidade horizontal e constante
x x=0 com a profundidade
(
• q = k h 2 − ho 2
2x
)
7.7.1 - FLUXO RADIAL PERMANENTE PARA UM POÇO

a) Aquífero Confinado de Espessura Constante e Extensão Indefinida


( o poço penetra totalmente )
Q= A.v ; A = 2π r b

SP antes
SP
antes SP
Hipótese de Dupuit : v = k ⋅ dH
dH Q dr
depois
dr
dH
Q = 2πr ⋅ r ⋅ b ⋅ k ⋅
dr
v H2
H1 b
2R1 2π ⋅ k ⋅ b dr
⇒ dH =
R2
Q r

Integrando entre ( H1 , R1 ) e ( H2 , R2 ) :

2π ⋅ k ⋅ b(H 2 − H 1 )
H R2
2π ⋅ k ⋅ b 2 dr
∫ dH = ∫ → Q= Equação de Thiem
Q H1 R1
r ln(R2 / R1 )

A equação de Thiem também permite a determinação da permeabilidade média do aquífero


k , a partir de 2 poços de observação 1 e 2 , com bombeamento de Q constante, ou seja
Q r
k= ln 2
2π ⋅ b(h2 − h1 ) r1
Nesse caso,o tempo deve ser suficientemente longo para se aproximar do fluxo permanente.
Os 2 poços devem estar próximos do poço de bombeamento ( em torno de 1000 R1 ).

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


71

b) Aquífero Não Confinado

SP antes Aceita a hipótese principal de Dupuit,


dH Q
SP ou seja a curvatura das linhas de fluxo
depois é nula.
dr

v h2 Q=
(
π ⋅ k h2 2 − h12 )
h1
R 
2R1 ln 2 
 R1 
R2

Da mesma forma que anteriormente : k =


Q ⋅ ln ( )
R2
R1

(
π h2 2 − h1 2 )

7.7.2 - POÇOS EM REGIME NÃO PERMANENTE

N o caso do regime permanente, considera-se que o aquífero está sendo alimentado por uma
vazão igual à que dele se extrai. Na maior parte dos casos reais não é isso o que ocorre : a
medida que se extrai um volume d’água de um poço, cria-se ao seu redor um cone de
depressão que aumenta com o tempo. O volume agora é variável, podendo eventualmente
atingir um estado em que as variações de nível são tão pequenas que o regime pode ser
considerado como permanente.
Poço em Regime
Equação Diferencial para regime não permanente : Permanente
∂ 2 h 1 ∂h S ∂h
+ = ⋅ Lago
∂r 2 r ∂r T ∂t
S → coeficiente de armazenamento
T → Transmissibilidade
t → tempo desde o início do bombeamento

Baseado na analogia por condução do calor, Theiss obteve a solução para h = ho ( antes do
bombeamento ) e h → ho quando r → ∞.


Q e −u
ho − h = ∫ du Equação do Desequilíbrio de Theiss
4π ⋅ T r 2 ⋅S
u
4⋅T ⋅t

r 2s
com : Q → vazão constante no poço e u =
T ⋅t

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


72

∞ e −u u2 u3 u4
W (u ) = ∫r 2 ⋅s du = −0,5772 − ln u + u − + + + ⋅⋅⋅
T ⋅t u 2 ⋅ 2! 3 ⋅ 3! 4 ⋅ 4!

Função do Poço Tabelada

RESOLUÇÃO
1- Método da Superposição de Theiss

log w log( h-ho) u arbitrário → W (u) → curva padrão


curva padrão
W(u) P (h - ho) → rebaixamentos em vários
piezômetros à distância r
do poço.
curva do poço
( h - ho ) × ( r2 / t ) → curva do poço

r2/t log r2/t


Ponto P : T = Q ⋅ w u
( ) e
u log u 4π (h − ho )
u
S = 4T ⋅ 2
r /t
2- Método Simplificado de Jacob

Para um tempo t longo : W (u) ≈ − 0,5772 − ln u

Equação de Theiss → (h − ho ) = 0,183 Q log 2,25 ⋅ T ⋅ t 


 (Simplificação de Jacob)
T  S r2 
∆(h − ho )
Logo: = f (Q, T )
∆ log t

h-h0 0,183 ⋅ Q
(m) T=
∆h10
∆h10=(h-h0)
to → t para depleção nula
t
1 ciclo S = 2,25 ⋅ T ⋅ o2
log r

t0 103 104 log t (seg)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


73

8. - V A Z Õ E S D E E N C H E N T E S

8.1 - INTRODUÇÃO

As enchentes de um curso d’água, de magnitude e data de ocorrência aleatórias, provocam


inundações, prejuízos, perdas de vidas e representam um grande risco para estruturas
hidráulicas ali situadas. O estudo das vazões de enchentes é necessário para o
dimensionamento de vertedouros de barragens, canais, bueiros, galerias de drenagem, seção
de vazão de pontes, alturas de diques, determinação do volume de controle de cheias em
barragens, bem como o planejamento da ocupação de planícies de inundação.

8.2 - HIDROGRAMA DE CHEIA

O escoamento superficial em uma bacia durante uma enchente, coloca em evidência as


fases mais importantes do processo, concentrado em um curto período de algumas horas ou
dias. De maneira muito simplificada, o mecanismo de formação do hidrograma de cheia
pode ser resumido da seguinte forma :
t (h)
Chuva P uniforme
sobre toda a bacia A3 i
(mm/h)

A2
qi

A1
Q
qi (m3/s)

X
Área Total : A
t1 t2 t3 t4 ... t (h)

• As áreas A1 , A2 , A3 são delimitadas por linhas isócronas e correspondem a


superfícies que concentram o escoamento em X, em tempos iguais t1 , t2 , t3 .
• Considere uma superfície elementar, de vazão específica qi , num intervalo de tempo
ti, nas superfícies isócronas, de modo que qi = ii - fi , sendo ii a intensidade média da
chuva sobre a superfície elementar e fi o conjunto das perdas por infiltração,
evaporação e intercepção, no intervalo ti .
• qi é a “chuva efetiva “ sobre a superfície elementar no intervalo ti.

No intervalo t1 : vazão média no ponto X: Q1 = q1 . A1


No intervalo t2 : vazão média no ponto X: Q2 = q2 . A1 + q1 . A2
No intervalo t3 : vazão média no ponto X: Q3 = q3 . A1 + q2 . A2 + q1. A3
No intervalo t4 : vazão média no ponto X: Q4 = q3. A2 + q2 . A3
No intervalo t5 : vazão média no ponto X: Q5 = q3 . A3
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
74

No instante t3 , o escoamento provem da totalidade da bacia e acontece o pico da enchente;


um estado de equilíbrio se estabelece na bacia. O tempo necessário para se chegar a este
ponto é o TEMPO DE CONCENTRAÇÃO da bacia. Neste ponto, se a chuva continua, o pico
do hidrograma fica estacionário.

8.3 - COMPONENTES DE UM HIDROGRAMA DE CHEIA

t (h)
fp = fc + ( f0 - fc ) e-kt
i Ves : volume do escoamento superfícial
(mm/h) φ Vh : volume do escoamento subsuperficial
ts te : duração da chuva efetiva
tr : tempo de resposta
te Ves ts : tempo de subida
Q tr tb : tempo de base
cg
(m3/s) tc : tempo de concentração
Vh

Escoamento Base

t (h)
tb

tc

Para se fazer a separação dos componentes do volume de um hidrograma, existem diversos


métodos empíricos que vão desde a consideração de escoamento-base constante até a
separação através da plotagem em papel semi-log (tempo em abcissa e log Q em
ordenada, observando-se os pontos de “quebra“ das retas de recessão dos escoamento base e
sub-superficial (ou hipodérmico). Estes pontos determinam Ves , Vh e o volume do
escoamento base.

8.4 - MÉTODOS PARA A DETERMINAÇÃO DAS VAZÕES DE CHEIA DE PROJETO

Podem ser classificados em 5 grupos principais:


a) Fórmulas Empíricas
b) Método “Racional”
c) Método do Hidrograma Unitário
d) Métodos Estatísticos
e) Simulação hidrológica por modelos conceituais de precipitações máximas obtidas por
métodos hidrometeorológicos.

A escolha do método depende de vários fatores :


• objetivo a ser alcançado ( pode-se ter como fim não só a vazão máxima de projeto, mas
também o hidrograma de projeto )
• os dados disponíveis
• a importância do projeto e suas consequências
• a superfície e as características da bacia.
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
75

D.M.Gray ( em “Manuel dos Principes d’Hydrologie“ ) recomenda os seguintes métodos,


de acordo com a área de drenagem da bacia :
ÁREA ( km2 ) MÉTODO (S)
< 2,6 Método Racional
< 260 Método Racional, H.U. , métodos estatísticos
260 → 5200 H.U. , métodos estatísticos
> 5200 Métodos estatísticos, simulação

8.5 - FÓRMULAS EMPÍRICAS (em desuso)

Tentam estabelecer uma relação entre a vazão de pico e características físicas da bacia e/ou
fatores climáticos.Algumas principais:

a) Fórmula de Creager

0, 936 A −0 , 048
 A  onde : A= área da bacia ( km2)
Q = 1,30 ⋅ k  
 2,59 
k= depende das características fisiográficas
da bacia
Q= vazão máxima em m3/s

b) Fórmula de Fuller

Q = 0,013 K.A0,8 ( 1 + a.logT ) ( 1 + 2,66 A- 0,3 )

onde : Q = vazão máxima em m3/s de T anos de recorrência


A = área em km2
T = tempo de retorno em anos
K = coeficiente que depende das características da bacia
a = coeficiente ( a = 0,8 para os rios do leste dos E.U.A. )

* Tempo de Retorno : é o intervalo médio de anos, dentro do qual, um evento hidrológico


(por exemplo uma cheia de magnitude Q0) é igualado ou superado em média uma vez, em
um ano qualquer. Se P é a probabilidade desse evento ocorrer ou ser superado em um ano
qualquer, tem-se a relação T = 1 / P.

8.6 - Método “Racional “ [ Mulvaney ( Irlanda ) em 1847 ]

c⋅i ⋅ A
Q=
3,6

onde : Q = vazão de pico em m3/s


i = intensidade média da precipitação sobre toda a área drenada, de duração igual ao
tempo de concentração. ( mm/h )
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
76

A = área em km2
c = coeficiente de escoamento, definido como a relação entre o pico de vazão por unidade
de área e a intensidade média da chuva i .

A - Aplicação : Bacias de área menor que 5 km2 , principalmente para projetos de drenagem
pluvial. Por ser muito simplista, deve ser usado com precaução.
i tc
2
B - Princípio : Para uma área de 3,6 km , tem-se:
perdas

i Q=c.i

t
C - Escolha do coeficiente de escoamento c

Varia com a natureza da superfície da bacia, com sua declividade, com o armazenamento
em depressão, com o grau de saturação e com a intensidade da precipitação.

C1 - Valores de c para áreas urbanas :

Tipo de Área c
Plana ( ≤ 2 % ), residencial com 30 % de área impermeável 0,40
Declividade média ( 2 - 7 % ), residencial, 50 % área imp. 0,65
Declividade média, centro comercial, 70 % área impermeável 0,80

C2 - Valores de c para áreas rurais : ( c = 1 − Σ c’ )

Topografia c’
Plana , 0,2 a 0,6 m/km 0,30
Moderada , 3 a 4 m/km 0,20
Montanhoso , 30 a 50 m/km 0,10

Solo c’
Argila compacta , impermeável 0,10
Combinação de silte e argila 0,20
Silte-Arenoso não muito compactado 0,40

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


77

Cobertura Vegetal c’
Terrenos cultivados 0,10
Densa 0,20

D - Estimativa do Tempo de Concentração tc

−0 , 385
Fórmula de Kirpich : 0.77 F
t c = 0,0195 ⋅ L ⋅ 
L

onde : tc = tempo de concentração (min)


L = distância máxima do percurso da água (m)
F = diferença de altitude entre o ponto mais afastado da bacia e o exutório (m)

Obs.: existem diversas outras expressões empíricas para cálculo do tempo de concentração
(detalhes em Freitas, A J., "Tempo de Concentração", A E Sudecap, 1984)

E - Limitações do Método “Racional”

• fornece somente a vazão de pico,


• não fornece o hidrograma,
• não leva em conta o armazenamento temporário da bacia,
• coeficiente c é suposto constante no tempo e no espaço,
• a relação chuva - vazão é suposta linear,
• a chuva é suposta homogênea sobre toda a bacia e constante no tempo.

F - Sequência para o Método “Racional”

a ) Definição do tempo de recorrência T ( drenagem pluvial de 10 a 25 anos )


b ) Determinação do tempo de concentração tc
c ) Determinação da intensidade de chuva de T anos de retorno e de duração igual a tc
d ) Determinação do coeficiente c
e ) Q = c ⋅i ⋅ A
3,6

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


78

8.7 - MÉTODO DO HIDROGRAMA UNITÁRIO ( L.K. Sherman em 1932 )

A teoria baseia-se na hipótese de que uma vez que as características físicas da bacia não se
alterem, precipitações semelhantes produzirão hidrogramas semelhantes. O hidrograma
unitário ( H.U.) seria o hidrograma tipíco para a bacia. É chamado unitário porque suas
ordenadas estão divididas por 1 mm (1 cm ou 1 pol) de precipitação efetiva.

A - Aspectos Teóricos

Uma chuva homogênea cobrindo a totalidade de uma bacia, de intensidade efetiva constante
i0, de duração τ tal que a altura de precipitação (τ.i0) seja igual a uma unidade
pluviométrica, produz um hidrograma de forma e de vazões características, quando a sua
duração é suficientemente pequena ( τ < tc ). Esta precipitação é chamada “unitária”, de
duração τ, e o hidrograma resultante é o “hidrograma unitário”, de duração τ.

i Q
chuva unitária de H. U.
intensidade io

i0 Q0

t0 t t0 t

2Q0
2i0
chuva
de intensidade
2io
i Q

t0 t t0 t

i Q
chuva de
duração 2τ e
intensidade io
i0 Q0

τ τ

t0 t t0 t0+τ t

Observa-se portanto as propriedades de superposição e linearidade do hidrograma unitário.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


79

Se uma chuva homogênea de intensidade io durasse indefinidamente, a enchente produzida


tenderia a um máximo ( CURVA EM S ), a partir do momento em que a duração da chuva
ultrapassasse o tempo de concentração.

i Q
chuva de
duração nτ e Curva
intensidade io
em S
i0 Q0

τ τ

t0 ...... t t0 t0+τ ... ... t

n . τ > tc

A diferença entre duas curvas em S defasadas de τ , fornece o hidrograma unitário.

O H.U. teoricamente tem uma forma única para uma dada bacia, e pode ser visto como um
impulso unitário em um sistema linear.A duração da chuva unitária, segundo Linsley, deve
ser escolhida entre 1/2 e 1/3 do tempo de resposta da bacia.

B – Roteiro de cálculo do H.U. para uma chuva isolada simples:


t (h)
ROTEIRO :
i
P 1-Escolhe-se uma ou várias chuvas isoladas de
mm/h duração unitária e os hidrogramas observados
Pef
correspondentes.
2-Faz-se a separação do volume de escoamento
d superficial. (linha AB obtida pela separação empírica
do escoamento base)
Q 3-Calcula-se o volume de escoamento superficial Ves
m3/s
em m3 . ( área da curva acima de AB )
Ves 4-Calcula-se o volume da precipitação total sobre a
yi bacia em m3, ou seja :
Vp = P (mm) x 10-3 x A ( km2) x 106
B 5-Calcula-se o coeficiente médio de escoamento
superficial (C).
A HU Ves
y'i C=
VP
d t (h) 6-Calcula-se a chuva efetiva Pef = C. P

yi  m3 / s 
7-Calcula-se as ordenadas do H.U. yi′ =  
Pef  mm 
(observar que as ordenadas devem ser separadas entre si pela duração d )
8-Obtidos diversos H.U.'s para vários eventos, calcula-se a curva em S para cada um deles e
obtem-se a curva em S média. Essa, defasada de uma duração unitária e subtraída de si mesma,
fornecerá o H.U. médio. Esse procedimento pode ser usado para se obter o H.U. para chuvas
unitárias de outras durações.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


80

C - Cálculo do Hidrograma de Projeto a partir do H.U.

Tendo-se obtido as ordenadas de H.U. para uma dada duração, o cálculo do hidrograma de
projeto pode ser assim resumido :
a) Determina-se a chuva de projeto : - pelo método probabilístico ou
( ± em torno de 10d de duração ) - pela curva IDF local ou
- pelo cálculo hidrometeorológico
b) Distribui-se a chuva de projeto em períodos unitários, utilizando-se para isso, por
exemplo, os eventos observados típicos ou os hietogramas de projeto
c) Calcula-se a chuva efetiva através do índice φ médio.
d) Faz-se a convolução do H.U., multiplicando-se suas ordenadas, devidamente defasadas
para os períodos unitários, pela chuva efetiva; obtem-se, assim, o hidrograma de
projeto.

D - Limitações do Método do H.U.

- as precipitações devem ser homogêneas


- a área da bacia deve estar toda coberta pela precipitação
- as características físicas do ponto de vista do escoamento devem ser as mesmas

Recomenda-se o método do H.U. para bacias de até cerca de 5000 km2 .

8.8 - HIDROGRAMA UNITÁRIO SINTÉTICO ( H.U.S. )

Freqüentemente, em hidrologia, defronta-se com o problema da falta de dados, o que nos


impede a determinação de H.U. para aquela bacia. Nesse caso, pode-se recorrer aos
hidrogramas unitários sintéticos, os quais se prestam a aplicações em projetos de pequenas
obras hidráulicas. Exemplo: H.U.S. de Snyder ( estudo feito para a região dos Montes
Apalaches, nos EUA )
tp+(tr)/2

tp
1cm

L
× CG tr qp
La

Ct tp 2,76 ⋅ C p ⋅ A tp
⋅ ( L ⋅ La )
0 ,3
tp = tr = qr = t = 3+
1,33 5,5 tp 8

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


81

onde:
tp - tempo de resposta em horas
Ct - coeficiente entre 0,8 e 2,2. Exemplo: bacias montanhosas : Ct = 1,20
bacias em sopé de montanhas : Ct = 0,74
bacias em vales : Ct = 0,35
L - comprimento do curso principal em km,
La - distância do ponto do rio principal mais próximo do centro geométrico da bacia até a
sua saída em km,
tr - duração da precipitação efetiva em horas,
qp - vazão de pico do H.U.S. em (m3/s)/cm de chuva efetiva,
Cp - coeficiente entre 0,56 e 0,69 , característico da bacia ( de modo geral diminui com a
densidade de vegetação ),
A - área de drenagem em km2 ,
t - tempo base em dias.

Exercício 1 : Determinar o H.U. de 6 horas para uma bacia de 2.236 km2 a partir das
observações tabeladas abaixo.
Precipitação Observada:
Hora P ( mm )
0- 6 66,4
6 - 12 12,1
12 - 18 3,6
18 - 24 0,0
Total = 82,1 mm
Vazões Observadas :
H.U.

3
Hora Q (m3/s ) Qbase ( m3/s ) Q − Qbase (m /s) ( Q − Qbase ) ÷ Pef
0 120 120 0 0
6 132 120 12 1,6
12 141 121 20 2,5
18 161 121 40 5,1
24 162 122 40 5,1
30 205 122 83 10,5
36 204 123 81 10,3
42 201 123 78 9,9
48 214 124 90 11,4
54 186 124 62 7,9
60 173 125 48 6,1
66 173 125 48 6,1
72 163 125 38 4,8
78 158 126 32 4,1
84 158 126 32 4,1
90 150 127 23 2,9
96 142 127 15 1,9
102 145 128 17 2,2
108 144 128 16 2,0
114 149 129 20 2,5
120 142 129 13 1,6
126 139 130 9 1,1
132 130 130 0 0
Σ = 817 103,55

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


82

Cálculo do Ves : Σ ( Q − Q base ) x 6 horas x 3600 seg. = 17,6472 x 106 m3

Ves
Cálculo da Pef : Pef = (m) → mm
A

17,6472 × 10 6
Pef = = 0,00789m = 7,89mm
2.236,0 × 10 6

Exercício 2 - Suponha que o H.U. para uma chuva de 2 horas seja o da tabela abaixo.
Calcule a área de drenagem da bacia.

t(h) 2 4 6 8 10 12 14 16 18
3
m /s.mm 1 5 27 20 15 9 3 2 1

Solução :

Σ y'i = 83 m3/s ⇒ Ves = 83×2×3600 = 597600 m3


Para o H.U. ⇒ Pef = 1mm

Ves −3 Ves −3
Pef = 10 ⇒ A= 10 ∴ A = 597,6 km 2
Como A 1

Exercício 3 - O H.U. de 2 horas para uma dada bacia é o do exercício 2. Calcule o


hidrograma correspondente à chuva de projeto, tabelada abaixo, se o índice φ médio é 2,5
mm/h e se o escoamento base é constante e igual a 5 m3/s.

Chuva de Projeto :
Intervalo i Tempo (horas) P(mm) Pef (mm)
1 2 10 5
2 4 20 15
3 6 15 10
4 8 5 0

Solução :
t HU HU×
×Pef (i=1) HU×
×Pef (i=2) HU×
×Pef (i=3) Qbase Q (m3/s)
2 1 5×1 -- -- 5 10
4 5 5×5 15×1 -- 5 45
6 27 5×27 15×5 10×1 5 225
8 20 5×20 15×27 10×5 5 560
10 15 5×15 15×20 10×27 5 650
12 9 5×9 15×15 10×20 5 475
14 3 5×3 15×9 10×15 5 305
16 2 5×2 15×3 10×9 5 150
18 1 5×1 15×2 10×3 5 70
20 -- -- 15×1 10×2 5 40
22 -- -- -- 10×1 5 15

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


83

8.9 - MÉTODOS ESTATÍSTICOS

8.9.1.- PRINCIPAIS DISTRIBUIÇÕES DE VARIÁVEIS ALEATÓRIAS


CONTÍNUAS UTILIZADAS EM HIDROLOGIA

A - Normal ( simétrica , parâmetros : µ e σ )

1
1 − ( x− µ )2 / σ 2
f (x ) = ⋅e 2 −∞ < x < ∞
σ 2π
z2
x−µ
z
1 −
com : z = ⇒ f (z ) = ⋅e 2 ⇒ Φ(z ) = ∫ f (z ) dz
σ 2π −∞

variável central reduzida Distribuição Normal N ( 0,1 )

0.5 1 1
0.4

f( z) Φ ( z) 0.5
0.2

0 0 0 0
0 0
4 z 4 4 z 4

B - Log-Normal ( assimétrica , parâmetros : µy e σY, sendo Y=log10 X ou Y=ln X)

É a distribuição normal dos logaritmos de X ou de (X-a )


Gráfico-exemplo para o caso µ Y =0,75 e σ2Y =0,25 :

0.5
0.4

f( x)
0.2

0 0
5 10
0.01 x 10

C - Gumbel ( assimétrica , parâmetros : a e b )

F (x) = exp. [ - e - ( x - a ) / b ] , com x ≥ a e b>0

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


84

a = µ − 0,5772 b e 6
b= ⋅σ
π
Gráfico-exemplo para o caso α=2 e β= 30 :

0.85

0.5
f( x)

0 0
30 35
28 x 35

D - Log-Gumbel ou Fréchet ( assimétrica, parâmetros : aY e bY, Y=log10 X ou ln X)

É a distribuição de Gumbel do logaritmos de X

E - Pearson III ( assimétrica, parâmetros : a, b e c)

b −1
1  x−c  x−c
f X ( x )=   exp − 
a Γ(b ) a   a 

2
µ =c + ab σ 2 =a 2 b e γ Y =
b

F - Log - Pearson III ( assimétrica, parâmetros a, b e c aplicados a Y=log10 X ou ln X)

É a distribuição de Pearson III do logaritmos de X.


Gráfico-exemplo para o caso a=0,2, b=2,5 e c=0,5 :

0.8

0.5
f( x)

0 0
5 10
1 x 10
O emprego dessas distribuições em Hidrologia varia de acordo com a variável em estudo :

- Normal : aplica-se a vazões médias e totais de chuvas anuais.


- Log - Normal : vazões médias e totais de chuvas anuais e mensais, vazões máximas
anuais, vazões máximas mensais.
- Gumbel : vazões máximas anuais e mensais, chuvas diárias máximas anuais e mensais
- Outras : vazões máximas e chuvas diárias máximas anuais.
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
85

8.9.2 - DEFINIÇÕES

A - Tempo de Retorno - T

Definição : É o intervalo de tempo médio em anos em que um evento hidrológico


(exemplo: a descarga de 500 m3/s ) será igualado ou superado uma vez, em um
ano qualquer.
Se F é a probabilidade anual de que x ≤ 500 então T ( x ≥ 500) = 1
1− F

B - Séries de Descargas

Os dados de descarga média diária são geralmente apresentados em ordem cronológica.


Esses dados originais representam a série de duração completa. A experiência mostra que a
maioria desses dados originais não têm significado prático na análise de eventos extremos,
porque não são representativos das situações críticas (e. g.: enchentes) que ocorrem em
espaços de tempo curto. Para esse tipo de análise, extraem-se da série de duração completa
duas outras séries de dados :
- a série de duração parcial que é aquela composta de valores maiores que um certo valor
base Qo , e
- a série de valores extremos que é aquela composta do maior valor de descarga ocorrido
em um ano hidrológico, para os n anos da amostra. É chamada também de série de
máximos anuais.

Máximos Anuais Vazão limiar para a


Q construção da série de
m3/s duração parcial
Q0

1969/1970 1970/71 1971/72

8.9.3 - ANÁLISE DE FREQUENCIA DE EVENTOS MÁXIMOS ANUAIS

A análise convencional de frequência de uma variável aleatória, da qual se conhece uma


amostra e a distribuição de probabilidades da população de onde a amostra foi retirada,
consiste em estimar os parâmetros populacionais a partir dos dados observados e, em
seguida, estimar os quantis XT para o tempo de retorno desejado. Usualmente, utiliza-se
para isso o método dos momentos, no qual as características amostrais como média,
variância e coeficiente de assimetria são igualadas às correspondentes características
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
86

populacionais. Como essas são funções dos parâmetros da distribuicão, as estimativas


desses podem ser obtidas a partir das características amostrais mencionadas. No caso de
fenômenos hidrológicos, principalmente os referentes a eventos máximos, a distribuição de
probabilidades da população não é conhecida; tem-se somente uma amostra de dados
observados. Esse fato leva à proposição de modelos probabilísticos, ou sejam distribuições
teóricas de probabilidade, às quais, em função de suas características de assimetria e de
existência de limites inferiores ou superiores no domínio de definição da variável aleatória,
se atribuem propriedades de modelarem fenômenos hidrológicos.

A - AJUSTAMENTO GRÁFICO

• coleta-se a série de máximos anuais; se o tamanho da amostra é n, então a série será


constituida por n elementos;
• classifica-se a série em ordem decrescente; por exemplo, se mi representa o número de
ordem, então m1=1 corresponde ao maior valor da série e mn=n corresponde ao menor;
• calcula-se para cada vazão ordenada Qi a probabilidade empírica P(Q≤Qi ), também
chamada de posição de plotagem, através da fórmula de Weibull :
mi
P(Qi )=1 − ; mi =1,2,..., n
n +1
• por definição, o tempo de retorno empírico de cada vazão é dado por
1
T (Qi )=
1 − P(Qi )
• analogamente ao processo de construção de um papel em escala logarítica, podem ser
construídos também papeis de probabilidade, correspondente a uma dada função de
probabilidades acumuladas. O processo consiste em intercambiar a imagem e o domínio
da função, alterando uma escala linear, de forma a que o gráfico da expressão analítica
da respectiva função, na escala transformada, seja uma reta. Os principais papeis de
probabilidade existentes são os correspondentes às distribuições normal, log-normal e
Gumbel . O passo seguinte consiste em lançar em um papel de probabilidade apropriado
os pontos P(Qi ) ou T(Qi ) em abcissas e Qi em ordenadas;
• em seguida, ajusta-se “a sentimento” uma reta (ou curva se o papel de probabilidade não
corresponde à função analítica desejada) aos pontos [Qi , P(Qi )];
• finalmente, extrapola-se a reta (ou curva) para o tempo de retorno desejado.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


87

B - AJUSTAMENTO ANALÍTICO PELO MÉTODO DOS FATORES DE FREQUÊNCIA

O método dos fatores de freqüência é uma generalização do cálculo da curva quantis (QT) x
tempo de retorno T. A proposição é que a curva quantis x tempo de retorno de qualquer
distribuição pode ser colocada na forma

x T =µ + K T σ
D
(7.26)

onde µ e σ são a média e o desvio-padrão populacionais e KT D é o fator de frequência, que


depende da distribuição D, em questão, e do tempo de retorno T. Estimando-se os
momentos populacionais pelos amostrais, tem-se
n n

∑ Xi ∑ (X − X)
2
i
i =1
xˆT = X + K T S X ,com X = eS X = i =1
D

n n

Método dos Fatores de Freqüência para a Log-Normal 2 parâmetros


• faz-se a transformação de variáveis Yi = ln(Qi ) ou log(Qi );
• calcula-se Y eSY ;

• YT =Y + K T SY onde KT
N N
representa o fator de freqüência da distribuição normal e é
igual ao quantil da variável central reduzida Z~N(0,1), correspondente a T.

• calculado YT , a vazão QT , de tempo de retorno T, é QT =10 YT ou QT =exp(YT ) ,

dependendo da transformação de variável utilizada.


• alguns valores de KT N :
T (anos) KT N
2 0
10 1,282
50 2,054
100 2,326
500 2,879

Método dos Fatores de Freqüência para Gumbel


• QT =Q + K T S Q ;
G

• KTG varia com o tempo de retorno T e o tamanho da amostra n. Os valores do fator de


frequência encontram-se na Tabela a seguir.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


88

Tabela - Fatores para a Distribuição de Gumbel.


n T=5 T=10 T=15 T=20 T=25 T=50 T=75 T=100 T=1000
15 0,967 1,703 2,117 2,410 2,632 3,321 3,721 4,005 6,265
20 0,919 1,625 2,023 2,302 2,517 3,179 3,563 3,836 6,006
25 0,888 1,575 1,963 2,235 2,444 3,088 3,463 3,729 5,842
30 0,866 1,541 1,922 2,188 2,393 3,026 3,393 3,653 5,727
35 0,851 1,516 1,891 2,152 2,354 2,979 3,341 3,598
40 0,838 1,495 1,866 2,126 2,326 2,943 3,301 3,554 5,576
45 0,829 1,478 1,847 2,104 2,303 2,913 3,268 3,520
50 0,820 1,466 1,831 2,086 2,283 2,889 3,241 3,491 5,478
55 0,813 1,455 1,818 2,071 2,267 2,869 3,219 3,467
60 0,807 1,446 1,806 2,059 2,253 2,852 3,200 3,446
65 0,801 1,437 1,796 2,048 2,241 2,837 3,183 3,429
70 0,797 1,430 1,788 2,038 2,230 2,824 3,169 3,413 5,359
75 0,792 1,423 1,780 2,029 2,220 2,812 3,155 3,400
80 0,788 1,417 1,773 2,020 2,212 2,802 3,145 3,387
85 0,785 1,413 1,767 2,013 2,205 2,793 3,135 3,376
90 0,782 1,409 1,762 2,007 2,198 2,785 3,125 3,367
95 0,780 1,405 1,757 2,002 2,193 2,777 3,116 3,357
100 0,779 1,401 1,752 1,998 2,187 2,770 3,109 3,349 5,261
∞ 0,719 1,305 1,635 1,866 2,044 2,592 2,911 3,137 4,936

Método dos Fatores de Freqüência para Log-Pearson III


• faz-se a transformação de variáveis Yi = ln(Qi ) ou log(Qi );

• calculam-se Y e SY ;

• YT = Y + KT LP SY , onde KT LP é o fator de frequência correspondente a T;

• se o coeficiente de assimetria amostral gY estiver compreendido entre -1 e 1, KT LP pode


ser calculado em função de KT N pela transformação de Wilson-Hilferty, dada por

2  gY  gY 
3

K LP
T = 
 T K N
−  + 1 − 1 
gY  6  6  

• se gY >1 ou gY <-1, recomenda-se a consulta às tabelas existentes na bibliografia


complementar citada;
• calculado YT , a vazão QT , de tempo de retorno T, é QT =10 YT ou QT =exp(YT ) ,

dependendo da transformação de variável utilizada.

Um exemplo de aplicação do método dos fatores de frequência a várias distribuicões de


probabilidade acha-se descrito no exercício a seguir.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


89

Exercício - Exemplo de aplicação do método dos fatores de freqüência para as vazões


médias diárias máximas anuais (naturais e reconstituídas), em m3/s, do Rio São Francisco,
afluentes ao reservatório de Tres Marias.

Ano Vazões (m3/s) Vazões em m Pos. Plotagem % T. Retorno


Hidrológico ordem 100[1-m/(n+1)] anos
decrecente
39 3745 7121 1 97,87 47,00
40 2650 5379 2 95,74 23,50
41 3202 4776 3 93,62 15,67
42 2840 4646 4 91,49 11,75
43 4059 4634 5 89,36 9,40
44 3551 4379 6 87,23 7,83
45 3625 4144 7 85,11 6,71
46 3949 4059 8 82,98 5,87
47 3254 4014 9 80,85 5,22
48 2686 3949 10 78,72 4,70
49 4776 3919 11 76,60 4,27
50 2322 3793 12 74,47 3,92
51 2900 3769 13 72,34 3,62
52 3769 3759 14 70,21 3,36
53 1434 3745 15 68,09 3,13
54 1846 3710 16 65,96 2,94
55 2766 3625 17 63,83 2,76
56 2548 3551 18 61,70 2,61
57 3330 3430 19 59,57 2,47
58 2422 3427 20 57,45 2,35
59 1823 3330 21 55,32 2,24
60 2410 3265 22 53,19 2,14
61 3919 3254 23 51,06 2,04
62 2556 3208 24 48,94 1,96
63 4379 3202 25 46,81 1,88
64 3793 2926 26 44,68 1,81
65 4144 2930 27 42,55 1,74
66 4634 2840 28 40,43 1,68
67 3427 2766 29 38,30 1,62
68 3265 2760 30 36,17 1,57
69 2596 2686 31 34,04 1,52
70 2234 2650 32 31,91 1,47
71 1153 2596 33 29,79 1,42
72 4014 2567 34 27,66 1,38
73 2567 2556 35 25,53 1,34
74 2760 2548 36 23,40 1,31
75 2926 2422 37 21,28 1,27
76 2200 2410 38 19,15 1,24
77 3430 2345 39 17,02 1,21
78 3759 2322 40 14,89 1,18
79 5379 2234 41 12,77 1,15
80 3710 2200 42 10,64 1,12
81 2345 1846 43 8,51 1,09
82 4646 1823 44 6,38 1,07
83 7121 1434 45 4,26 1,04
84 3208 1153 46 2,13 1,02

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


90

Características Amostrais :

Média das Vazões : 3262,43 Média dos Logaritmos Base 10 das Vazões : 3,490497
Desvio-Padrão das Vazões : 1073,55 Desvio-Padrão dos Log. das Vazões : 0,146020
Coeficiente de Assimetria das Vazões : 0,964 Coef. Assim Log. Vazões : -0,456038

Curvas QuantisXTempo de Retorno pelo Método dos Fatores de Frequência :

T (anos) Log-Normal Gumbel Log-Pearson III


2 3094 3173
5 4152
10 4761 4849 4667
20 5521
25 5735
50 6172 6390 5674
75 6771
100 6763 7041 6041
500 8145 6797
1000 8773 9285 7101

Gráfico :

10000
Log-Normal
Descargas Medias Diarias Maximas Anuais (m3/s)

Log-Pearson III
Gumbel
8000

6000

4000

2000

1 10 100 1000
Periodo de Retorno (anos)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


91

C - ESCOLHA DA DISTRIBUIÇÃO

Não existe um critério objetivo que permita a escolha da distribuição teórica a adotar.
Deve-se fazer os ajustamentos a diversas distribuições e escolher aquela cujos resultados
pareçam melhores, em função principalmente:
- do exame do valor do coeficiente de assimetria de Q e log Q,
- da inspeção visual, em papel de probabilidade, da aderência dos pontos à curva teórica,
- da aderência estatística à amostra ( testes do χ2 e de Kolmogorov-Smirnov), e
- da freqüência de uso de uma certa distribuição na região em estudo.

D - ESCOLHA DO PERÍODO DE RETORNO PARA A CHEIA DE PROJETO

A probabilidade de uma cheia ocorrer ou ser ultrapassada num ano qualquer é ( 1/T ) e a
de não ocorrer é F = 1 - ( 1/T ). A probabilidade ou o RISCO de ocorrer pelo menos uma
cheia que se iguale ou exceda aquela de tempo de retorno T num intervalo de tempo de n
anos é J = 1 - F n . Dessa forma, pode-se determinar qual é o período de retorno a ser
utilizado no projeto de uma obra hidráulica, sabendo-se a sua VIDA ÚTIL PROVÁVEL e
escolhendo-se o RISCO admissível de falha.

RISCO VIDA ÚTIL


1 10 25 50
0,01 100 910 2440 5260
0,10 10 95 238 460
0,25 4 35 87 175
0,50 2 15 37 72
0,75 1,3 8 18 37
0,99 1,01 2,7 6 11

Exercício : Na construção da UHE Nova Ponte, cuja duração foi de 5 anos, o Rio Araguari foi
desviado por dois túneis escavados em rocha. Qual foi o período de retorno da cheia de projeto
desses túneis, admitindo-se um risco de 10% para a proteção do canteiro de obras ?

Solução :
duração da obra : n=5 anos

ensecadeiras risco : R (x) = 0,10


T (x) = ?
5
 1 
R( x )=1 − 1 −  =0,10∴T ( x )=47,6 ≈ 50anos
 T (x )

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


92

Tabela - Tempos de Retorno para o Projeto de Estruturas Hidráulicas

Estrutura Hidráulica Tempo de Retorno (anos)


Bueiros Rodoviários
- tráfego baixo 5-10
- tráfego intermediário 10-25
- tráfego alto 50-100
Pontes Rodoviárias
- estradas secundárias 10-50
- estradas principais 50-100
Drenagem Urbana
- galerias de pequenas cidades 2-25
- galerias de grandes cidades 25-50
- canalização de córeegos 50-100
Diques e Muros de Contenção
- área rural 2-50
- área urbana 50-200
Barragens
- sem risco de perda de vidas humanas 200-1000
- com risco 10000

9. - ANÁLISE DE CHUVAS INTENSAS

9.1.- INTRODUÇÃO

A análise de chuvas intensas refere-se ao estudo da variação conjunta da intensidade, da


duração e da frequência (ou tempo de retorno) de eventos chuvosos intensos de duração
igual ou inferior a 24 horas, geralmente relacionados a precipitações convectivas de grande
intensidade. De fato, um gráfico entre as intensidades (mm/h) e as durações (minutos ou
horas) de precipitações intensas, registradas por pluviógrafos, revela que quanto mais
intensa é a chuva, menor é a sua duração. Por outro lado, quanto maior é a intensidade da
chuva, maior é o período de retorno a ela associado. A relação conjunta intensidade-
duração-frequência (ou tempo de retorno) é conhecida como curva IDF e é estimada com
base em dados pluviográficos existentes no local de interesse ou em locais próximos. As
curvas idf são requisitos básicos para projetos de pequenas obras hidráulicas como sistemas
de drenagem, galerias pluviais e bueiros, entre outras.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


93

9.2 - VARIAÇÃO DA INTENSIDADE COM A DURAÇÃO

A análise de pluviogramas permite determinar as alturas (mm) e as intensidades médias


(mm/h) de precipitação, para qualquer intervalo de tempo entre 5 minutos e 24 horas, a
partir de qualquer origem na escala de tempos. Tendo-se selecionado um dado evento de
precipitação, pode-se construir um gráfico entre as máximas intensidades médias no
intervalo de tempo, denotadas por i, e as durações correspondentes, representadas por t, de
forma que as durações maiores não necessariamente incluam as menores. A variação típica
de i em função de t encontra-se ilustrada no gráfico abaixo. Observa-se nesse gráfico que a
máxima intensidade média varia inversamente com o intervalo de tempo em que ocorreu.

120

80 Variação típica da intensidade


i (mm/h)

com a duração da chuva


40

0
0 400 800 1200
t (min)

9.3 - VARIAÇÃO DA INTENSIDADE COM A FREQUÊNCIA

Para se verificar a variação da intensidade de chuva com a frequência (ou tempo de


retorno), é necessário ajustar uma distribuição de probabilidades aos valores máximos
anuais de intensidade para uma dada duração. Por exemplo, fixada a duração t=10 minutos,
faz-se a análise de todos os pluviogramas disponíveis de modo a obter as máximas
intensidades anuais das precipitações de duração igual a 10 minutos. Em seguida, ajusta-se
uma distribuição de probabilidades a esses valores máximos anuais; a esse respeito, é
corrente o uso da distribuição de Gumbel, ajustada pelo método dos fatores de frequência .
Esse mesmo procedimento é então repetido para outras durações de interesse, de forma a
constituir uma família de curvas, tal como mostrado na figura abaixo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


94

400

300

Variação da
i (mm/h)

200 T=100
intensidade da chuva
com a duração e
T=50
frequência
100 T=25

T=10
T=2

0
0 40 80 120 160
t (min)

9.4 - CURVA IDF


A família de curvas, ilustrada na figura acima, pode ser sintetizada em uma equação única
da forma

A aT b
i= =
(t + c )d (t + c ) d
onde i é a intensidade em mm/h, t é a duração da chuva em minutos, T é o tempo de retorno
em anos, a, b, c e d são parâmetros a serem estimados com base nos dados pluviográficos
de cada local. A estimação dos parâmetros a, b, c e d faz-se através do uso de
transformação logarítmica de variáveis e das técnicas de regressão linear simples. Por
exemplo, tomando-se os logaritmos em ambos os membros da primeira parte da equação da
intensidade de chuva, segue-se que
logi=log A−d log(t + c )
Observe que os parâmetros log A e d são os coeficientes de regressão linear entre as
variáveis log i e log (t+c). O parâmetro c é uma constante a ser obtida pelo método
tentativa-erro, a qual, somada às durações, lineariza a relação entre i e t+c em coordenadas
logarítmicas. Conhecidos A, c e d, e de volta à equação original, toma-se os logaritmos
novamente para se obter
log A=loga+blogT
Na sequência, as técnicas de regressão linear simples são empregadas mais uma vez para se
determinar os coeficientes angular log a e linear b da reta que relaciona log A e log T. A

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


95

título de exemplo, a tabela abaixo apresenta os valores de a, b, c e d estimados para as


cidades de Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro.

Tabela - Coeficientes das curvas IDF para algumas cidades brasileiras.


Localidade a b c d Autor
Curitiba 5950 0,217 26 1,15 Parigot de Souza, P. V.
São Paulo 3462,7 0,172 22 1,025 Wilken, P. S.
Rio de Janeiro 1239 0,150 20 0,74 Alcântara, U.

À medida que as áreas urbanas crescem, englobando outros municípios de menor porte e
transformando-se em regiões metropolitanas, as curvas IDF puntuais deixam de ser
representativas da variação espacial das intensidades de precipitação. Esse é um fato
particularmente verdadeiro em áreas montanhosas e sujeitas a forte influência orográfica
sobre as precipitações, como é o caso dos 5852 km2 englobados pelos limites da Região
Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Para o caso da RMBH, Guimarães Pinheiro
(1997) realizou estudo, no qual propõe-se a seguinte equação do tipo IDF de abrangência
regional :

0 , 5360
iT ,t , j =0,76542t −0,7059 Panual µ T ,t ;T ≤ 200anos;10 min ≤ t ≤ 24 h

onde :
iT ,t , j é a estimativa de chuva (mm/h ou mm/min), de duração t (h ou min), no local j,

associada ao período de retorno T (anos);


Panual é a precipitação anual (mm) na localidade j dentro da RMBH, a qual pode ser obtida a
partir do mapa isoietal da figura que se segue; e
µ T,t representa os quantis adimensionais de frequência, de validade regional, associado à
duração t e ao período de retorno T, conforme a tabela que se segue.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


96

Tabela - Quantis adimensionais de frequência para diversas durações de precipitação e


tempos de retorno.
T (anos) 1,05 1,25 2 10 20 50 100 200 500 1000

t
10 min 0,691 0,828 1,013 1,428 1,586 1,791 1,945 2,098 2,300 2,452
15 min 0,695 0,830 1,013 1,422 1,578 1,780 1,932 2,083 2,282 2,432
30 min 0,707 0,836 1,013 1,406 1,557 1,751 1,897 2,043 2,235 2,380
45 min 0,690 0,827 1,013 1,430 1,589 1,795 1,949 2,103 2,305 2,459
1h 0,679 0,821 1,014 1,445 1,610 1,823 1,983 2,143 2,353 2,512
2h 0,683 0,823 1,014 1,439 1,602 1,813 1,970 2,128 2,335 2,492
3h 0,679 0,821 1,014 1,445 1,610 1,823 1,983 2,143 2,353 2,512
4h 0,688 0,826 1,013 1,432 1,591 1,798 1,953 2,108 2,311 2,465
8h 0,674 0,818 1,014 1,451 1,618 1,834 1,996 2,157 2,370 2,531
14 h 0,636 0,797 1,016 1,503 1,690 1,931 2,112 2,292 2,530 2,710
24 h 0,603 0,779 1,017 1,550 1,754 2,017 2,215 2,412 2,672 2,868

Observe que a inclusão da precipitação anual na equação regional de chuvas intensas


cumpre o objetivo de sintetizar a influência de dois fatores sobre as intensidades máximas
de chuva. O primeiro deles refere-se às diferenças espaciais de umidade disponível para a
origem e continuidade das ocorrências de precipitações intensas, indiretamente
quantificadas pela variação dos totais anuais de chuva dentro da RMBH. O segundo,
inerente ao próprio traçado e à conformação espacial do mapa isoietal, reflete as
influências orográficas sobre a intensificação dos eventos de precipitação.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


97

Figura - Isoietas de precipitações totais anuais médias sobre a RMBH.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


98

10. - PROPAGAÇÃO DE CHEIAS EM RIOS E RESERVATÓRIOS

10.1 - INTRODUÇÃO

Ao se propagarem para jusante, as ondas de cheias estão sujeitas a dois tipos de


influências extremas e distintas: uma devida à translação pelo chamado ‘escoamento
uniformemente progressivo’ e outra devida à atenuação por armazenamento. Um
escoamento uniformemente progressivo refere-se ao movimento de uma onda de cheia para
jusante, sem alteração de sua forma original; esse tipo de escoamento ocorre somente em
canais prismáticos, sob condições ideais de univocidade de cotas e descargas em todos os
trechos do rio. O efeito de atenuação refere-se à modificação da forma da onda devida ao
armazenamento de seu volume no trecho fluvial. Em canais naturais, a propagação de uma
onda de cheia acha-se, provavelmente, sob uma situação intermediária entre as duas
condições acima citadas; a prevalência de uma ou de outra depende do caso em particular.
Ressalve-se, entretanto, que a existência de um afluente importante no trecho fluvial em
questão pode complicar e tornar inválida a argumentação acima.
O efeito de atenuação pode ser ilustrado pela ação de um reservatório criado por uma
barragem com órgãos de descarga projetados para uma determinada defluência máxima. As
defluências estão relacionadas ao armazenamento e, portanto, aos níveis do reservatório
formado pela barragem. O armazenamento no reservatório irá aumentar enquanto as
afluências superarem as defluências, o que se acha ilustrados na Figura 1 abaixo.

Q Armazenamento
V
Vt=Vt-1 + (afluência-defluência)

No tempo tp, a afluência iguala


a defluência, o armazenamento
e a defluência são máximos.

tp t tp t

Figura 1 : Efeito de Atenuação

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


99

O armazenamento originado em um trecho fluvial pelo escoamento uniformemente


progressivo de uma onda de cheia, ou efeito de translação pura, é completamente diferente
e acha-se ilustrado na Figura 2. Nesse caso, os níveis d´água e os armazenamentos do
trecho fluvial variam não só com as defluências, como com as afluências também. Durante
a ascensão do hidrograma afluente de cheia, o armazenamento aumenta rapidamente em
relação às defluências, ao passo que, durante a recessão, ele decresce proporcionalmente. O
armazenamento será máximo quando a afluência igualar a defluência. Nesse ponto, a onda
de cheia estará no centro do trecho fluvial.

Q
Armazenamento
V
Vt=Vt-1 + (afluência-defluência)

No tempo tp, a afluência iguala


a defluência, o armazenamento
e a defluência são máximos.

tp t tp t

Figura 2 : Efeito de Translação

Os sistemas fluviais são caracterizados comumente por uma alternância de trechos largos
com muito armazenamento, seguidos de trechos estreitos em rápidos, cujos efeitos
agregados se assemelham ao de atenuação. Entretanto, existem trechos fluviais em que as
seções transversais e a declividade de fundo são praticamente uniformes. Nesses, deve-se
esperar um efeito de atenuação pequeno ou quase nulo, prevalecendo o efeito de translação.

10.2 - CONCEITOS BÁSICOS

Todos os métodos de propagação de ondas de cheia em rios baseiam-se na equação da


continuidade, ou seja, em um dado intervalo de tempo, o volume defluente do trecho

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


100

fluvial é igual ao volume afluente mais ou menos a variação do armazenamento do sistema.


Formalmente,

∆V ou D = A − ∆V 10.1
Qd = Qa −
∆t ∆t

onde :

Qa = A = vazão afluente média durante o intervalo de propagação ∆t

Qd = D = vazão defluente média durante o intervalo de propagação ∆t

∆V = variação do armazenamento do sistema durante o intervalo de propagação ∆t

Uma modificação freqüente da equação 10.1 é

∆t (D1 + D2 ) ∆t ( A1 + A2 )
= − (V2 − V1 ) 10.2
2 2

onde os subscritos indicam o início e o fim do intervalo de tempo ∆t . A premissa de que a


descarga média é igual à média aritmética das descargas do início e do fim do intervalo de
tempo pode ser justificada se ∆t é menor ou igual ao tempo de trajeto da onda de cheia no
trecho e se nenhuma alteração brusca do hidrograma afluente ocorre durante o intervalo de
propagação. Por existirem duas incógnitas, a saber D2 e V2, a solução iterativa para a
equação 10.2 pressupõe a obtenção de uma segunda expressão para o volume em termos
de alguma variável auxiliar de uso prático; obtida essa segunda expressão, resolve-se a
equação 10.2 para D2 . Do realismo da expressão entre o volume e a variável auxiliar
depende a precisão do método de propagação de cheias em rios.

Com relação à Figura 3, suponha que o trajeto de uma onda de cheia por um trecho fluvial
possa ser discretizado em sucessivas posições 1, 2, 3, ... . Entre essas, pode-se distinguir os
elementos prismáticos de armazenamento, os quais podem ser facilmente relacionados às
defluências do trecho. Também pode-se distinguir os elementos de armazenamento de
cunha, superpostos aos elementos prismáticos. Devido à grande variação das formas dos

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


101

elementos de cunha, é mais difícil relacioná-los às defluências ou a outras variáveis


auxiliares.

cunha

NA

cunha prisma
4

3
prisma
2
Leito fluvial
1

Figura 3 - Representação esquemática dos armazenamentos prismáticos e de cunha.

O armazenamento em um trecho fluvial pode ser determinado por medida direta através de
mapas e seções tranversais. Entretanto, o processo da medida direta necessita de dados de
campo que dificilmente se acham disponíveis. O mais usual é o cálculo do volume de
armazenamento através de hidrogramas observados. Em qualquer instante, o volume
armazenado é igual à diferença acumulada entre a afluência e a defluência.

10.3 - A PROPAGAÇÃO DE CHEIAS EM RIOS

O método mais simples, porém talvez o menos realista, de propagação de cheias em rios
expressa o volume do trecho fluvial somente em função da defluência. Nesse caso, um
gráfico entre o volume de armazenamento e a defluência se mostraria como um "loop"
irregular, ao invés de uma relação unívoca; a irregularidade desse "loop" reflete a influência
do armazenamento de cunha. Uma abordagem mais elaborada, introduzida por McCarthy,
em 1938, e conhecida como o método de Muskingum, expressa o volume de
armazenamento em função da média ponderada da defluência e da afluência no intervalo de
tempo. Em termos formais,
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
102

V = K [x A + (1 − x ) D] 10.3

onde :
K = inclinação da relação volume×(descargas ponderadas), com dimensão de tempo
x = constante adimensional de ponderação entre afluência e defluência.

As premissas inerentes ao método de Muskingum são :


• A linha d'água é uniforme e suave entre os limites de montante e jusante do trecho;
• As cotas e as descargas são unívocas nos limites do trecho; e
• K e x são constantes ao longo da variação das descargas, durante a onda de cheia.

O fator adimensional x deve ser calibrado, com base nos hidrogramas afluente e
defluente observados, de forma que o volume de armazenamento, correspondente a um
dado nível d'água ou cota, seja o mesmo tanto no ramo de ascensão como no ramo de
recessão do hidrograma de cheia. Para o caso das vazões de vertimento de um reservatório,
x deve ser nulo porque os níveis d'água, e conseqüentemente os volumes armazenados pelo
reservatório, são definidos unicamente pelas defluências. Teoricamente, para escoamentos
uniformemente progressivos, ou de translação pura, o valor de x deve ser igual a 0,5;
lembre-se que, nesse caso, a descarga afluente de pico deve permanecer inalterada. Para
efeitos mistos de translação e atenuação, típico do escoamento em trechos fluviais naturais,
o valor de x deve ser positivo e menor ou igual a 0,5. Desse modo, o valor de x deve ser
tomado entre os limites de 0 e 0,5, com um valor intermediário freqüente de 0,25 para a
maioria dos trechos fluviais.

O fator K tem dimensões de tempo e representa a inclinação da relação entre o


armazenamento e as descargas ponderadas pelo valor calibrado de x, a qual em muitos
casos aproxima-se de uma reta. O fator K representa o tempo necessário para que o centro
de massa da onda de cheia atravesse o trecho fluvial; observe que K apenas aproxima o
tempo entre os picos dos hidrogramas afluente e defluente. Discretizando a equação 10.3 e

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


103

substituindo-a na equação 10.2, obtem-se a equação de propagação do método de


Muskingum, ou seja
D2 = C 0 A2 + C1 A1 + C 2 D1 10.4

onde :
K x − 0,5 ∆t
C0 = −
K − K x + 0,5∆t

K x + 0,5 ∆t
C1 =
K − K x + 0,5 ∆t

K − K x − 0,5 ∆t
C2 =
K − K x + 0,5 ∆t

10.3.1 - SELEÇÃO DO INTERVALO DE PROPAGAÇÃO ∆t

O intervalo de propagação ∆t, nos limites do qual as afluências e defluências são


discretizadas, deve ser maior do que 2Kx de forma a evitar valores negativos para C0.
Entretanto, em alguns trechos fluviais, um valor de ∆t maior do que 2Kx é demasiado
longo para permitir a adequada definição do hidrograma. Para esses, a calibragem de x deve
ser efetuada através de n sub-trechos de tempo de trajeto Ks=∆t tal que nKs seja igual ao
valor de K para todo o trecho. O valor de x que melhor reproduzir o hidrograma defluente
deverá então ser usado para os sub-trechos subseqüentes.

10.3.2 - CÁLCULO DO VOLUME DE ARMAZENAMENTO

O volume de armazenamento é calculado através da equação 10.2 reescrita e dos


hidrogramas afluente e defluente observados, ou seja

∆t ( A1 + A2 ) ∆t (D1 + D2 )
V2 = V1 + − 10.5
2 2

O início do cálculo iterativo deve ter lugar em um instante quando a afluência e a


defluência tiverem valores aproximadamente iguais, ou seja quando ambas tiverem seus
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
104

valores próximos do escoamento base. As iterações seguintes devem prosseguir até a última
descarga do hidrograma defluente.

10.3.2 - ESTIMATIVA DE x

O valor do fator de ponderação x pode ser estimado pelo processo tentativa-erro. Assume-se

um valor inicial para x e calculam-se as descargas ponderadas através de [x A + (1 − x ) D].


Em seguida, faz-se um gráfico entre essas descargas ponderadas e o armazenamento tal
como calculado pela equação 10.5. Se o valor de x estiver correto, o "loop" do
armazenamento deverá estar suficientemente estreito para poder ser aproximado por uma
linha reta. Um exemplo de aplicação desse processo tentativa-erro encontra-se ilustrado no
item 10.3.4. O valor de x oscila entre os limites de 0 para um armazenamento do tipo
reservatório a 0,5, para translação pura.

10.3.3 - ESTIMATIVA DE K

O coeficiente K tem dimensões de tempo e representa a inclinação da relação linear entre o


armazenamento e as descargas ponderadas por x, tal como descrito no item 10.3.2, ou seja :

∆V
K=
∆[xA + (1 − x) D ] 10.6

O intervalo de tempo representado por K é equivalente ao tempo necessário para uma onda
de descarga elementar atravessar o trecho fluvial. Na ausência de dados de descargas, o
valor de K para canais naturais pode ser aproximado pelo quociente entre o comprimento do
trecho e a velocidade média do escoamento, multiplicada por um fator de correção C, o qual
varia com a forma do canal :

Forma Aproximada do Canal Natural Fator de Correção C

Largo, predominantemente retangular 1,67

Largo, parabólico 1,44

Triangular 1,33

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


105

10.3.4 - EXEMPLO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO DE MUSKINGUM

A tabela 1 refere-se a dois hidrogramas observados simultaneamente nas seções de


montante e jusante de um trecho fluvial. Essa tabela também apresenta a sequência de
cálculos para a identificação dos fatores K e x do método de Muskigum : (i) a coluna 4
contem os volumes de armazenamentos tal como calculados pela equação 10.5; (ii) a coluna
5 as descargas ponderadas por x=0,3 ; (iii) a coluna 6 com ponderação x=0,2; e (iv) a coluna
7 com x=0,1. A figura 4 mostra que a ponderação por x=0,1 é a mais indicada para esse
caso, evidenciando a prevalência do efeito de atenuação sobre o efeito de translação. O fator
K, para x=0,1, é a inclinação da relação linear entre os volumes de armazenamento e as
descargas ponderadas, ou seja K=2 dias. Esse valor indica que o centro de massa da onda de
cheia atravessa o trecho fluvial em dois dias.

Tabela 1 : Exemplo de aplicação do Método de Muskingum


1 2 3 4 5 6 7
Tempo (dia) A (m3/s) D (m3/s) V (m3/s.dia) x=0,3 x=0,2 x=0,1
0 352 352 0
1 587 382.7 102.2 443.9 423.5 403
2 1353 571.4 595.2 805.9 727.7 649.6
3 2725 1090.2 1803.4 1580.6 1417.2 1253.7
4 4408.5 2020.6 3814.7 2737 2498.2 2259.4
5 5987 3264.7 6369.8 4081.4 3809.2 3536.9
6 6704 4541.8 8812.1 5190.5 4974.2 4758
7 6951 5114.1 10611.6 5945.2 5801.5 5657.8
8 6839 6124.2 11687.5 6338.6 6267.2 6195.7
9 6207 6352.6 11972.1 6308.9 6323.5 6338
10 5346 6177 11483.8 5927.7 6010.8 6093.9
11 4560 5713.2 10491.7 5367.2 5482.6 5597.9
12 3861.5 5120.7 9285.5 4742.9 4868.9 4994.8
13 3007 4461.7 7928.5 4025.3 4170.8 4316.2
14 2357.5 3744.5 6507.7 3328.4 3467.1 3605.8
15 1779 3066 5170.7 2679.9 2808.6 2937.3
16 1405 2457.7 4000.8 2141.9 2247.2 2352.4
17 1123 1963.2 3054.4 1711.1 1795.2 1879.2
18 952.5 1575.6 2322.7 1388.7 1451.1 1513.4
19 730 1275.7 1738.2 1112 1166.6 1221.1
20 605 1022.1 1256.8 897 938.7 980.4
21 514 828.9 890.8 734.4 765.9 797.4
22 422 680 604.35 602.6 628.4 654.2
23 352 558.7 372 496.6 517.36 538.03
24 352 468.8 210.25 433.8 445.44 457.12
25 352 418 118.25 398.2 404.8 411.4

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


106

x=0,3

14000

12000

10000
V (m3/s.dia)
8000

6000

4000

2000

0
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000

x.A+(1-x).D (m3/s)

x=0,2

14000

12000

10000
V (m3/s.dia)

8000

6000

4000

2000

0
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000

x.A+(1-x).D (m3/s)

x=0,1

14000

12000

10000
(m3/s.dia)

8000

6000
V

4000

2000

0
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000

x.A+(1-x).D (m 3/s)

Figura 4 : Estimativa do fator x

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


107

Exercício : Utilize os parâmetros x=0,1 e K=2 dias, determinados no exemplo de aplicação,


para propagar o hidrograma de vazões afluentes da Tabela 2. Faça também um gráfico dos
hidrogramas das seções de montante e jusante.

Tabela 2 : Hidrograma observado na seção de montante do trecho fluvial

Tempo A Tempo A Tempo A Tempo A


(dia) (m3/s) (dia) (m3/s) (dia) (m3/s) (dia) (m3/s)
0 200 6 9000 12 2100 18 250
1 780 7 8200 13 1600 19 210
2 3100 8 7000 14 1200 20 180
3 5980 9 5500 15 800 21 160
4 8330 10 4000 16 400 22 150
5 10800 11 3050 17 300 23 145

10.4 - A PROPAGAÇÃO DE CHEIAS EM RESERVATÓRIOS

O armazenamento em um reservatório está relacionado somente à descarga defluente, como


esquematicamente ilustrado na Figura 1. Nesse caso, a equação 10.2 pode ser rearranjada
para permitir o cálculo iterativo do hidrograma de vazões defluentes :

V1 V
A1 + A2 + 2 − D1 = 2 2 + D2 10.7
∆t ∆t

Para uma solução iterativa dessa equação, na qual os termos do primeiro membro são
conhecidos e os do segundo membro são incógnitas, torna-se necessária uma segunda
equação relacionando volumes e defluências. Um exemplo dessa relação pode ser obtido a
partir da equação de descarga de um vertedor de soleira livre

Q = c l h3 2 10.8

onde :
Q = D = descarga defluente em m3/s
c = coeficiente de descarga (1,6 < c < 2,3)
l = largura do vertedor em m
h = nível d'água acima da crista do vertedor em m.
Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini
108

Como h está univocamente relacionado ao armazenamento do reservatório, através da curva


cota×volume, é possível alterar a equação 10.7 para expressar diretamente as vazões
defluentes em função dos volumes. Por questão de conveniência para o cálculo iterativo, é

usual se estabelecerem as relações auxiliares (i) V × D e (ii) (2 V + D) × D e se


∆t ∆t
prosseguir com as seguintes etapas sequenciais :

• Assuma um valor inicial para D em t=0, como por exemplo D0=A0;


• Com D0 na tabela (ou gráfico) da relação (i), obtem-se V0/∆t;
V1 V
• Aplicando-se a equação 10.7, obtem-se 2 + D1 = A0 + A1 + 2 0 − D0 ;
∆t ∆t
• Com 2V1/∆t+D1 na tabela (ou gráfico) da relação (ii), obtem-se D1;
• Repetir desde a primeira etapa para todas as ordenadas do hidrograma afluente.

10.4.1 - EXEMPLO DE APLICAÇÃO

Considerando os dados abaixo, efetuar a propagação do hidrograma afluente através de um


reservatório de vertedor de soleira livre e de NA máximo normal de operação situado na
cota 500 m. Dados adicionais : a largura e o coeficiente de descarga do vertedor são
respectivamente 200 m e 2,215.

Curva Cota-Volume :
Cota (m) Volume (106 m3) Cota (m) Volume (106 m3)
0 0 501 890
100 20 501,5 938
200 100 502 988
500 800 502,5 1043
500,5 845 503 1100

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


109

Hidrograma Afluente :
t (h) A (m3/s) t (h) A (m3/s) t (h) A (m3/s)
0 200 40 3240 80 1720
10 960 50 2860 90 1340
20 1720 60 2480 100 960
30 2480 70 2100 --- ---

Solução :

a) calcular as tabelas das relações auxiliares (i) e (ii) a partir da cota do NA máximo
normal de operação 500 m :

h (m) D (m3/s) V (106 m3) V/∆t (m3/s) 2V/∆t +D (m3/s)


h=H-500 D=clh1,5 *
0 0 0 0 0
0,5 156 45 1250 2656
1,0 443 90 2500 5443
1,5 814 138 3833,3 8480
2,0 1253 188 5222,2 11697,4
2,5 1751 243 6750 13743
3,0 2302 300 8333,3 18968,6
*∆t=36000 s

b) Tabela de Propagação

t A Ai-1+Ai V/∆t 2V/∆t+D D


(h) (m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s)
0 200 --- --- --- 200
10 960 1160 1441,64 3843,28 278,26
20 1720 2680 1782,50 5966,76 506,98
30 2480 4200 2729,93 9152,88 905,81
40 3240 5720 4123,80 13061,79 1585,16
50 2860 6100 6241,22 16997,29 2094,11
60 2480 5340 7840,85 18927,60 2297,68
70 2100 4580 8320,89 18924,10 2297,31
80 1720 3820 8319,82 18162,34 2216,99
90 1340 3060 8089,02 17021,06 2096,65
100 960 2300 7743,22 15689,78 1956,27

Exemplo de cálculo da tabela de propagação :


• t=0 ⇒ D0=A0 ou D0=200 m3/s
• com D0=200 ⇒ interpolação linear na tabela auxiliar (i) ⇒ V0/∆t= 1441,64 na segunda linha da 4a coluna
• equação 10.7 ⇒ D1+ 2V1/∆t=A0+A1+2 V0/∆t-D0 =1160+2×1441,64-200= 3843,28 na segunda linha da 5a
coluna
• com D1+ 2V1/∆t=3843,28 ⇒ interpolação linear na tabela auxiliar (ii) ⇒ D1=278,26 na segunda linha da
6a coluna.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


110

c) Gráfico dos Hidrogramas Afuente e Defluente

Propagação de Cheia em Reservatório

3500
3000
Descargas (m3/s)

2500
2000 Afluência
1500 Defluência
1000
500
0
0 20 40 60 80 100 120
Tempo (h)

Exercício : Solucionar o exemplo de aplicação para o caso da largura do vertedor ser 230 m
e seu coeficiente de descarga 1,95.

11. Bibliografia Adicional Recomendada para Engenharia Hidrológica

♦ Hidrologia : Ciência e Aplicação. Tucci, C. E. M. (ed.) , EDUSP-ABRH, 943 p., 1993.


♦ Hydrology for Engineers. Linsley, R. K., M. A Kohler & J. L. H. Paulhus, McGraw-
Hill, Inc., 482 p., 1975.
♦ Applied Hydrology. Chow V. T., D. R. Maidment & L. W. Mays, McGraw-Hill, Inc.,
572 p., 1988.
♦ Handbook of Hydrology. Maidment D. R. (ed.), McGraw-Hill, Inc., 1019 p., 1993.
♦ Manuel des Principes d'Hydrologie. Gray D. M., Secrétariat du Comité National
Canadien, Décenie Hydrologique Internationale, Ottawa, 948 p., 1972.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


111

Engenharia Hidrológica : Exercícios Propostos

Exercício 1 - Verificar a homogeneidade da série de totais anuais de chuva da estação


pluviométrica P2 através da curva de acumulação dupla e corrigir os valores heterogêneos.
As estações P1 a P4 são próximas e situadas numa região meteorologicamente homogênea.

Ano P1 - mm P2 - mm P3 - mm P4 - mm
1970 1300 1400 1200 1100
1969 1500 1700 1450 1400
1968 1550 1710 1500 1420
1967 1100 1250 1050 980
1966 1300 1450 1180 1050
1965 1050 1200 980 910
1964 1350 1800 1250 1100
1963 1480 1900 1400 1300
1962 1550 2100 1420 1350
1961 910 1300 860 800
1960 1200 1700 1000 1000

Exercício 2 - A bacia hidrográfica da figura a seguir é monitorada pelas estações


pluviométricas P1, P2, P3 e P4. Dados os valores das precipitações médias anuais em cada
estação, calcular :
a) a precipitação média anual equivalente sôbre a bacia, empregando o método dos
polígonos de Thiessen;
b) a vazão média anual em m3/s na seção de referência A, sabendo que a evapotranspiração
anual vale 480 mm.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


112

P1

Escala : 1:1.000.000

P2 P3

P1 : 875 mm
P2 : 1360 mm
P3 : 1080 mm
P4 : 1510 mm

P4

Exercício 3 - A figura abaixo mostra a seção de medição de uma estação fluviométrica. As


profundidades e as medições puntuais de velocidades, tomadas nas diversas verticais a 20 e
80 ou 60 % das respectivas profundidades, estão indicadas na figura. Calcular a vazão total,
a área molhada, a velocidade e a profundidade médias na seção.
verticais
distancias (m)

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
1.50 1.50 1.20 1.40 1.00 1.40 2.00 2.50 3.00

0
.178 .11 0
.17 .321
.485
.271 .412 .500 .150
1.00
0.62
.257
1.40
.214

1.60 .390
1.75
velocidades puntuais (m/s)
.397
.380

2.85 profundidades (m)


2.86
2.95

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


113

Exercício 4 - Dadas as séries de totais anuais de precipitação (em mm) observadas na


estação pluviométrica X e as descargas médias anuais (em m3/s) no posto fluviométrico Y,
calcular a equação de regressão linear simples entre as duas séries de observações. Plotar
em papel milimetrado as observações e a reta de regressão. Estimar os coeficientes de
correlação e determinação.
Ano 1955 1956 1957 1958 1959 1960 1961 1962 1963 1964
Chuva 1800 1300 2000 1800 1100 1400 900 1000 1200 1900
Vazão 250 120 280 260 130 150 90 95 110 250

Exercício 5 - Em um determinado posto fluviométrico foram realizadas as medições de


descarga listadas abaixo. Pede-se :
a) Plotar os pares (Hi ,Qi ) em papel milimetrado.
b) Ajustar pelo método dos mínimos quadrados uma curva do tipo Q=a+bH+cH2.
c) Plotar a curva obtida no gráfico do item (a).
Medição # Leitura da Régua H (m) Descarga medida Q (m3/s)
1 0.49 15.9
2 0.78 23.1
3 0.88 29.8
4 1.03 31.8
5 1.20 40.2
6 1.28 46.2
7 1.34 49.8
8 1.36 54.5
9 1.51 61.0
10 1.55 71.0
11 1.76 82.5
12 1.86 93.2
13 1.92 105.1
14 2.10 113.4

Exercício 6 - A equação de chuvas intensas da cidade de Curitiba é dada por :

5950 T 0.217
i=
( t + 26) 1.15 , sendo i em mm/h, t em min e T em anos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


114

Plotar as curvas altura-duração-frequência e intensidade-duração-frequência para os


períodos de recorrência de 2, 5, 10 e 50 anos e intervalos de duração de 10 minutos a 2
horas. Calcular a altura de chuva de 20 anos de recorrência e 1 hora de duração.

Exercício 7 - Empregando o método racional, calcular a vazão de dimensionamento de


período de recorrência 10 anos de um bueiro na seção indicada na figura abaixo.

Area : A=45 ha
A Ocupacao e uso do solo

20 % floresta, C= 0.20
70% pastagens, C= 0.45
10% varzea, C= 0.15

Obs. : Usar a formula de Kirpich para Tempo de


Concentracao

B
830 80
Perfil Longitudinal do Curso d'Agua A C h u v a d e P r o je t o
C u rv as A ltur a -D u ra ca o -F re q ue nc ia

825 60 T=50 anos

) T=25 anos
m
Altitude (m )

m
( T=10 anos
a
820 v
u 40
h
C
e
d
a
r
tu
l
A
815 20

B
810 0
0 400 800 1200 0 20 40 60
Distancia da secao (m) Duracao (min)

Exercício 8 - Conhecido o hietograma de chuva horária precipitada uniformemente sôbre


uma bacia hidrográfica de área de 500 km2, empregar a fórmula de capacidade de infiltração
de Horton para calcular :
a) a chuva efetiva

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


115

b) o coeficiente de escoamento superficial


c) o índice φ
d) o volume de escoamento superficial em m3

Intervalo de tempo (horas) 0-1 1-2 2-3 3-4 4-5 5-6


Altura de Chuva (mm) 38.7 33.4 25.0 16.3 12.5 11.8

Parâmetros da fórmula de Horton : f0 = 22.0 mm/h , fc = 11.1 mm/h , k = 0.32.

Exercício 9 - Após um evento chuvoso de 3 horas de duração sôbre uma bacia de área de
2231 km2, foram observadas as descargas (em m3/s) listadas na tabela abaixo. Calcule o
hidrograma unitário, supondo que o escoamento base foi constante e igual a 600 m3/s.
Hora Dia 1 Dia 2 Dia 3 Hora Dia 1 Dia 2 Dia 3
3 600 4600 1700 15 8000 2700 900
6 650 4000 1500 18 7000 2400 800
9 6000 3500 1300 21 6100 2100 700
12 9500 3100 1100 24 5300 1900 600

Exercício 10 - Conhecido o hidrograma unitário de uma bacia, calcular o hidrograma de


escoamento total resultante da chuva efetiva dada abaixo. Considerar o intervalo de
discretização de 1 hora e o escoamento básico constante de 3.00 m3/s.

5 30

4
Altura de Chuva Efetiva (mm)
Vazao unitaria (m3/s.mm)

20
3

10

0 0

0 4 8 12 16 0 1 2 3
Tempo (horas) Tempo (horas)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


116

Exercício 11 - Se a função densidade de probabilidade de uma variável aleatória X é dada


por f (x) = c(1-x2 ), -1 ≤ x ≤ 1 e c constante,
a) calcular o valor de c
b) determine a função de probabilidade acumulada de X.

Exercício 12 - A função densidade de probabilidade da distribuição exponencial é

1  x
f ( x) = exp  −  ,
 θ
0≤ x<∞
θ
X

a) prove que se trata de fato de uma função densidade de probabilidade


b) prove que o valor esperado de X é θ
c) prove que a variância de X é θ2.

Exercício 13 - A concentração média diária de um certo poluente, em um determinado


trecho de rio, segue uma distribuição exponencial. A média amostral da concentração diária
é 2 mg/m3.
a) qual é a probabilidade de que a concentração do poluente exceda 6 mg/m3 em um dia
qualquer ?
b) qual é a probabilidade de que a concentração exceda 6mg/m3 no máximo uma vez nos
próximos 3 dias ?
c) se a concentração é normalmente distribuída com a mesma média e variância da
exponencial, recalcalcule o item a. (Obs. : é necessário utilizar uma tabela da função
acumulada de probabilidades da distribuição normal para resolver essa questão; consulte
um livro-texto de estatística).

Exercício 14 - Na tabela a seguir estão listadas as descargas médias diárias máximas anuais
observadas em um determinado posto fluviométrico.
a) Ajuste uma distribuição de probabilidades log-normal à amostra pelo método dos fatores
de frequência, plote os pontos e a reta de ajuste em papel apropriado e determine as vazões

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


117

que serão igualadas ou excedidas em um ano qualquer, em média uma vez a cada 10, 50,
100 e 500 anos.
b) Suponha que se tenha que construir uma ponte no local, cujo tabuleiro deve ter cota
mínima suficiente para permitir a passagem da cheia centenária. A equação da curva chave
desse posto é Q=10+40.h+15.h2, onde Q representa a vazão em m3/s e h é a leitura da régua
linimétrica em m. Determine a cota altimétrica mínima do tabuleiro da ponte.
Dados adicionais :

• cota do RN em relação às réguas : 6.321 m


• cota altimétrica do RN : 725.329 m
• fatores de frequência da distribuição normal :
T (anos) 2 10 50 100 500
k 0 1.282 2.054 2.326 2.879

Descargas Máximas Anuais :


Ano Q (m3/s) Ano Q (m3/s)
45 810 57 933
46 724 58 355
47 288 59 339
48 462 60 660
49 919 61 511
50 810 62 349
51 469 63 501
52 390 64 630
53 588 65 442
54 271 66 328
55 500 67 568
56 460 68 730

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


Notas de Aula de Engenharia de
Recursos Hídricos

Parte 2

Engenharia de Recursos Hídricos


119

1. - RESERVATÓRIOS

1.1 - INTRODUÇÃO

Na maioria dos casos, os sistemas de abastecimento de água, irrigação ou energia


hidrelétrica, que contassem somente com as vazões naturais dos cursos d'água, não
poderiam ser capazes de atender as suas demandas, de forma segura, ou de forma
eficiente e ou de forma economicamente viável.

Durante as estiagens ou nos períodos de recessão prolongada dos fluviogramas, os


cursos d'água possuem pequena vazão. Na estação chuvosa, após episódios importantes
de precipitação, os cursos d'água recuperam os seus níveis e suas vazões podem
aumentar a ponto de provocar enchentes e inundações.

Q Q3 > Q
impossível

Q
Q2 < Q

Q1 < Qmin (fio d'água)

Meses

V2
Deflúvio
Acumulado

V1 Q2

Meses

NA

Depleção Vert. Depleção

NAmxn

Meses

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


120

Um RESERVATÓRIO DE ACUMULAÇÃO tem por objetivo reter o excesso de água,


do período chuvoso, para usá-lo no período seco, com o objetivo de atender uma certa
demanda do sistema de aproveitamento de recursos hídricos. Além desse objetivo, um
reservatório de acumulação também pode servir ao propósito de atenuar os efeitos de
uma enchente a jusante.Em sistemas de abastecimento d'água e irrigação, existem os
RESERVATÓRIOS DE DISTRIBUIÇÃO, cujo objetivo é o de regular a demanda
variável ao longo de um dia. Esses reservatórios fornecem às ETA's, ou às estações de
recalque, a possibilidade de um funcionamento relativamente uniforme, liberando a
água armazenada durante os picos de demanda. Em ambos os casos e independemente
de seu tamanho, um reservatório funciona como um REGULADOR das vazões
afluentes dos cursos d'água, no primeiro caso, ou das variações das demandas, no
segundo caso.

1.2 - CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DOS RESERVATÓRIOS

1.2.1 - CAPACIDADE DE ARMAZENAMENTO

A capacidade de armazenamento dos reservatórios, construídos em terrenos naturais, é


calculada a partir de levantamentos topográficos.

A curva cota-área é traçada calculando-se as áreas limitadas pelas curvas de nível.

715 Altitude
(m)
710
710

705 705

700 2 4
Área (km , ha, 10 m )
2

A curva cota-volume é o resultado da integração da curva cota-área ao longo das curvas


de nível. Por exemplo, se ∆V representa o incremento de volume entre duas curvas de
nível (obtido pelo produto da média de suas áreas pela diferença de altitude ou cota
correspondente) e V0 denota o volume inicial, então :
V710 = V0 +∆V700-705+ ∆V705-710

715
Altitude
710 (m)

705 710
∆V700-705
700
705
V0 3 6 3
Volume (hm ou 10 m )

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


121

1.2.2 - ZONAS DE ARMAZENAMENTO DE UM RESERVATÓRIO DE ACUMULAÇÃO

NA max NA max

NA mxn NA mxn

VU
VU

NA min NA min

VM VM

extravasor não-controlado extravasor controlado

NA Máximo Normal de Operação (NA mxn) : cota máxima até a qual as águas se
elevam, nas condições normais de projeto. Corresponde à cota da crista vertente, no
caso de extravasor não controlado ou de crista livre, ou à cota da borda superior das
comportas, no caso de extravasor controlado.

NA Mínimo Normal de Operação (NA min) : cota mínima até a qual as águas
abaixam, em condições normais de operação. Corresponde à cota do conduto de saída
mais baixo da barragem ou à cota mínima capaz de permitir as melhores condições
operacionais de equipamentos como turbinas, de forma a evitar arrastamento de ar ou
formação de vórtices na tomada d'água.

Volume Útil : volume armazenado entre o NA mxn e o NA min.

Volume Morto : volume armazenado abaixo do NA min, destinado a acomodar a carga


de sedimentos afluentes ao reservatório, durante a sua vida útil.

Sobrearmazenamento devido à Cheia de Projeto do Extravasor : volume acima do


NA mxn, devido à sobrelevação causada pelo amortecimento da cheia de projeto pelo
reservatório. Corresponde ao NA máximo maximorum (NA max). O
sobrearmazenamento não é aproveitado, pois persiste somente durante a cheia.

Borda Livre : Diferença de cotas entre o coroamento da barragem e o NA máximo


maximorum, suficientemente grande para conter a arrebentação de ondas devidas ao
vento.

Armazenamento nas Margens : quando o reservatório se enche, a água infiltra-se pelo


solo permeável das margens, permitindo um escoamento em sentido contrário quando o
NA decresce. Esse armazenamento temporário depende das condições de geologia
superficial e, em alguns casos, pode ser significativo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


122

1.2.3 - REMANSO EM RESERVATÓRIOS DE ACUMULAÇÃO

A suposição de que a linha d'água é horizontal é válida apenas para reservatórios


pequenos e profundos; nesses casos, a velocidade do escoamento e o gradiente da linha
d'água são muito atenuados. Em reservatórios rasos e estreitos, o NA pode se afastar
significativamente de uma linha horizontal.

A curva formada pelo NA,


correspondente ao volume da cunha
NA acima do plano horizontal, é chamada
Escalas Fluviométricas CURVA DE REMANSO. Essa pode ser
determinada para diversos valores de
descargas afluentes, a partir da solução
Q3 das equações do ESCOAMENTO
GRADUALMENTE VARIADO [e.g. :
Q2 método "Standard Step" - software
"River Analysis System" do Hydrologic
Q1 Engineering Center (HEC-RAS)]. A
linha d'água varia em função das
afluências e defluências.
Distância a montante do eixo da barragem

A curva de remanso é importante em projetos de reservatórios para fins de


desapropriação de áreas ribeirinhas sujeitas a inundação. Qualquer construção deve
se localizar acima da linha d'água correspondente à passagem da cheia de projeto.

1.3 - PRODUÇÃO DOS RESERVATÓRIOS

A produção de um reservatório é o volume de água que ele pode fornecer em um


determinado intervalo de tempo. Esse intervalo varia de 1 dia, no caso de reservatórios
de distribuição, a 1 ou vários anos, no caso de reservatórios de acumulação. A produção
de um reservatório varia em função das vazões afluentes e defluentes, bem como da
cronologia de suas ocorrências. Em um caso extremo, se as vazões fossem constantes,
não haveria necessidade de reservatórios; à medida que aumenta a variabilidade das
vazões, aumenta também a capacidade de armazenamento de um reservatório.

Questões importantes:
• qual é a demanda a ser atendida ou a vazão a ser regularizada ?
• qual deve ser a capacidade (volume útil) de um reservatório, destinado a atender
uma demanda especificada (ou regularizar uma vazão especificada), com pequeno
risco de falha?

1.3.1 - RESERVATÓRIO DE DISTRIBUIÇÃO

Nesse caso, trata-se de determinar a capacidade de um reservatório destinado a atender


às flutuações da demanda, em um dado intervalo de tempo. A solução desse problema
resulta da aplicação da equação da continuidade às afluências e defluências.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


123

Exemplo :

Determinar a capacidade de um reservatório de distribuição de um sistema de


abastecimento urbano, cujas demandas horárias para o dia de maior consumo
encontram-se relacionadas na tabela a seguir. A vazão de bombeamento para o
reservatório deve ser constante.

Operação do Reservatório :

Se D < Qb ⇒ Qs = D
Qb
V Se D > Qb ⇒ Qs = Qb + (D-Qb)
Qs
Suprido pelo reservatório
D

Hora Demanda (10m3/h) Vazão Bombeada Volume fornecido pelo


(10m3/h) Reservatório (10m3)
1 1960 3750 = 90000/24 - (1960<3750)
2 1720 3750 -
3 1610 3750 -
4 1540 3750 -
5 1610 3750 -
6 1910 3750 -
7 2290 3750 -
8 3410 3750 -
9 4420 3750 670=4420-3750
10 4720 3750 970
11 4800 3750 1050
12 4720 3750 970
13 4650 3750 900
14 4570 3750 820
15 4570 3750 820
16 4540 3750 790
17 4610 3750 860
18 4810 3750 1060
19 5070 3750 1320
20 5270 3750 1510
21 5210 3750 1460
22 4990 3750 1240
23 4390 3750 640
24 2620 3750 -
Soma 90000 90000 15080

6000

5000
4000
Q (10m3/s)

Demanda
3000
Vazao Bombeada
2000

1000

0
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23
Tempo (h)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


124

1.3.2 - RESERVATÓRIO DE ACUMULAÇÃO

A determinação da CAPACIDADE ou VOLUME ÚTIL de um reservatório de


acumulação geralmente se faz através da simulação de sua operação (balanço hídrico)
ao longo de:
• um período crítico, ou período de estiagem prolongada, determinando-se o volume
necessário para atender a demanda, sem risco de falha durante o período; ou
• todo o período histórico disponível, determinando-se a cada ano o volume
necessário para atender a demanda e, em seguida, o máximo entre os volumes
anuais.

O quociente entre a primeira estimativa do volume provável do reservatório e a vazão


média afluente em um dado intervalo de tempo determina se a simulação deve ser feita
com dados diários, semanais ou mensais; em grandes reservatórios, geralmente são
utilizadas as vazões naturais médias mensais.

1.3.2.1 - Balanço Hídrico

Precipitação Direta
[ Afluências + Precipitação ]

Afluências -

[ Evaporação + Demanda +
Evaporação Defluências + Vazão
Demanda Ecológica + Percolação ]

=
∆ Volume / ∆ t
Defluências + Vazão
Ecológica + Percolação

1.3.2.2 - Determinação do Volume Útil pelo Método Tabular (ex. de Linsley e Franzini)

A tabela a seguir apresenta os seguintes dados para uma seção onde se vai construir uma
barragem: vazões médias mensais, evaporação mensal medida em um tanque classe A,
os totais mensais de precipitação e as demandas mensais previstas. As vazões naturais
até o máximo de 125000 m3/mês devem ser liberadas para jusante. Supondo que a área a
ser inundada pelo reservatório é de 4 km2, qual deve ser o volume útil para atender as
demandas durante esse período crítico?

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


125

Mês Afluência Evapora- Precipi- Demanda Vazão Volume Volume Afluência Reserva-
103/mês ção tação 103/mês Liberada Evaporado Precipitado Coriigida tório
mm mm 103/mês 103/mês 103/mês 103/mês 103/mês
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Jan 2600 90 86,3 49 125 252 345 2568 0


Fev 5430 130 90 49 125 364 360 5301 0
Mar 37 150 11,3 98 37 420 45 -375 473
Abr 12 160 15 160 12 448 60 -388 548
Mai 6 140 3,8 172 6 392 15 -377 549
Jun 4 120 0 172 4 336 0 -336 508
Jul 1 80 0 160 1 224 0 -224 384
Ago 0 45 0 148 0 126 0 -126 274
Set 0 20 0 98 0 56 0 -56 154
Out 0 25 7,5 49 0 70 30 -40 89
Nov 0 30 15 37 0 84 60 -24 61
Dez 4 60 86,3 37 4 168 345 177 0
Σ 8094 1050 420 1229 314 2940 1260 6100 3040
2 6 -3 2 6 -3
Col. 7 = Col. 3 × 4 km × 10 × 10 × 0,77 Col. 8 = Col. 4 × 4 km × 10 × 10
Col. 9 = Col. 2 - Col. 6 - Col. 7 + Col. 8 Col. 10 = Col. 9 + Col. 5 somente se Col. 9 < 0
VOLUME ÚTIL = 3040.103 m3

Em alguns casos, a capacidade ou volume útil de um reservatório é imposta pelas


condições locais de topografia ou por aspectos geotécnicos. Nesses casos, dado o
volume do reservatório, imposto pelas condições locais, são calculadas as VAZÕES
POSSÍVEIS. A produção pode ser calculada por

PRODUÇÃO = VOLUME ÚTIL + AFLUÊNCIAS DO PERÍODO CRÍTICO

No exemplo acima, de Março a Novembro há um deficit de 1946.103 m3. Supondo que


o volume útil fosse pré-estabelecido em 2540. 103 m3, a sua produção seria 2540-
1946=594. 103 m3 nos 9 meses de estiagem, ou seja 66. 103 m3/mês.

1.3.2.3 - Determinação do Volume Útil pelo Método Gráfico (Diagrama de Rippl, 1883)

Consiste no gráfico dos volumes acumulados ao longo do período crítico em análise, ou


ao longo do período histórico disponível. O gráfico assim formado é conhecido como
diagrama de Rippl (ou "de massas"). Esse diagrama tem, em ordenadas, os valores
cronologicamente acumulados das vazões médias diárias, ou semanais ou mensais, e,
em abscissas, os respectivos intervalos de tempo considerados. Caso sejam usadas as
vazões afluentes médias mensais, as leituras no eixo das ordenadas terão como unidade
m3/s.mês. Ao contrário, se as vazões afluentes médias mensais forem transformadas em
volumes mensais, preliminarmente ao traçado do gráfico, as leituras no eixo das
ordenadas terão como unidade 103 m3 ou 106 m3. Antes da construção do diagrama de
Rippl, as vazões afluentes devem ser corrigidas somando-se os totais de precipitação e
subtraindo-se os de evaporação, ambos calculados sobre a área a ser inundada pelo
reservatório, para o mesmo intervalo de tempo sobre o qual foram obtidas as afluências
médias.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


126

2500
7
DEFLUVIOS ACUMULADOS (hm3 ou m3/s.mes)

6
2000
V2

5
1500

D2 (plurianual)
4

1000 3

V1
2 D1

500 1

0
0 20 40 60
MESES

observações :
a) declividade de 0 a 7 → vazão afluente média no período
b) a diferença de ordenadas é o volume escoado no período considerado
c) a tangente em qualquer ponto representa a vazão afluente no ∆t considerado
d) a vazão regularizada D1 (ou D2) é representada pela reta que passa pela origem e
com coeficiente angular D1 (ou D2)
e) Q min < D < Q med
f) trecho 0-1 → reservatório cheio e extravasando
g) trecho 1-2 → reservatório deplecionando (com insuficiente recuperação no período)
h) Ponto 2 → reservatório com acumulação mínima
i) trecho 2-3 → reservatório enchendo
j) Ponto 3 → reservatório cheio

As distâncias verticais V1 e V2 na figura representam os volumes necessários para


garantir a demanda D2 nos períodos de operação correspondentes. Durante todo o
período crítico, o VOLUME ÚTIL necessário para regularizar D2 será o maior
dentre os dois, ou seja V2.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


127

A determinação do volume útil através do Diagrama de Rippl pode ser feita por 2
modos de regularização: ANUAL ou PLURIANUAL, de acordo com a demanda D.
• anual: o reservatório volta a encher a cada estação chuvosa e o volume útil é o
maior dentre os déficits anuais de armazenamento (eg : D1 na figura)
• plurianual: o reservatório pode exigir um intervalo de tempo maior do que o ano
para voltar ao NA máximo normal de operação. (eg : D2 na figura)

Desvantagens ;
• a demanda é considerada constante (pode ser adaptado para demandas variáveis)
• as afluências precisam ser corrigidas a priori, levando-se em conta a evaporação e a
precipitação
• não permite a estimação do risco de falha no atendimento da demanda.

1.4 - VOLUME MORTO E ASSOREAMENTO DE RESERVATÓRIOS

Os rios transportam matéria sólida em SUSPENSÃO e ARRASTAMENTO. As


partículas em suspensão tendem a se depositar no fundo do rio.As correntes
ascendentes, devidas à turbulência do escoamento, contrariam a tendência de deposição.
Entretanto, em um reservatório, a velocidade e a turbulência do escoamento são muito
reduzidas. Em conseqüência, as partículas de maior diâmetro, transportadas em
suspensão, e a maior parte daquelas transportadas por arrastamento depositam-se
na entrada do reservatório, formando um DELTA. As partículas de menor diâmetro,
transportadas em suspensão, depositam-se mais a jusante, ou transpõem a barragem
através de seus dispositivos de saída, como vertedores, turbinas, válvulas de fundo,
entre outros.

Afluências com
Sedimentos

Água relativamente limpa

Delta

DESCARGA SÓLIDA TOTAL = DESCARGA EM SUSPENSÃO + DESCARGA DE FUNDO

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


128

A descarga sólida em suspensão é medida através de amostradores de sedimento em


suspensão, como os padronizados pelo United States Geological Survey e conhecidos
pelas denominações USDH48 ou USDH49. Esses amostradores são recipientes
metálicos, no interior dos quais se aloja uma garrafa de vidro destinada a armazenar a
amostra da mistura água-sedimento. O amostrador possui em sua extremidade um bocal
através do qual a mistura água-sedimento é coletada sem pertubar o campo de
velocidades em seu entorno. Posteriormente, em laboratório, a parte sólida é separada e
pesada, devendo-se obter também sua curva granulométrica. Dividindo-se a massa dos
sólidos, pelo volume total da amostra água-sedimento, obtém-se a concentração de
sólidos em suspensão, geralmente expressa em g/l. As amostras são coletadas em várias
verticais da seção fluvial, de forma que se possa obter a concentração do sedimento em
suspensão e sua respectiva curva granulométrica, naquela seção e naquele instante
(detalhes em "Hidrosedimentologia Prática", de N. O. Carvalho, editado por CPRM e
Eletrobrás, 1994). A correlação entre as concentrações e as descargas líquidas
observadas, ou entre as descargas sólidas em suspensão e as descargas líquidas, permite
o cálculo da descarga sólida em suspensão média diária, ou seja :

Qss (ton/dia) = Concentração (g/l) × Q (m3/s) × 86,4

Existem também amostradores de descarga sólida de fundo (ou arrastamento), porém


não são de uso tão freqüente quanto os de suspensão. Para avaliações preliminares,
geralmente, arbitra-se a DESCARGA SÓLIDA DE FUNDO MÉDIA como um
percentual, em torno de 5 a 25%, com um valor mais usual de 10%, da descarga sólida
em suspensão média, ou seja :

DESCARGA SÓLIDA TOTAL ≈ 1,10 × DESCARGA SÓLIDA EM SUSPENSÃO

1.4.1 - VIDA ÚTIL DE RESERVATÓRIOS

O fim de todos os reservatórios é o de se assorearem. Se o volume anual de sedimentos


afluentes ao reservatório for muito grande, quando comparado à sua capacidade, a
VIDA ÚTIL do empreendimento será curta. A vida útil de um reservatório é aqui
entendida como o período de tempo, ao fim do qual, o reservatório deixa de funcionar
tal como projetado; um exemplo disso seria o eventual assoreamento das tomadas
d'água pelos sedimentos afluentes. O projeto de um reservatório deve contemplar a
determinação de sua vida útil, para que a viabilidade econômica de sua construção possa
ser verificada. O assoreamento dos reservatórios depende:
• do volume anual de sedimentos afluentes
• do peso específico dos sedimentos depositados
• da porcentagem dos sedimentos afluentes que fica retida dentro do
reservatório (eficiência de retenção ou "trap efficiency")

O peso específico das partículas sólidas depositadas varia com a idade dos depósitos e
com sua granulometria. Os pesos específicos de amostras secas de sedimentos retirados
de reservatórios variam de 640 a 1750 kg/m3, com um valor médio de 960 kg/m3 para
sedimentos recentes e 1280 kg/m3 para sedimentos antigos. Lane e Koelzer propõem a
expressão wt = w1 + K ln t , onde w1 é peso específico inicial (kg/m3), wt é o peso
específico (kg/m3) t anos depois e K é um coeficiente de consolidação que varia com a
depleção do reservatório e a granulometria do sedimento (para depleções pouco
significativas K≈0,25 para argila, K≈0,10 para silte e K≈0,0 para areia).

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


129

A eficiência de retenção decresce com o tempo, à medida que a capacidade do


reservatório é reduzida pelo assoreamento. Brune propõe uma curva relacionando a
eficiência de retenção com o quociente (capacidade do reservatório) / (vazão anual
afluente). A curva de Brune foi elaborada com base em dados observados em
reservatórios e bacias de decantação parcialmente assoreados.

100
Sedi ment o Ret i do ( %)

80

curva mediana

60

40

curvas envoltorias

20

0
0.001 0.010 0.100 1.000 10.000
Capacidade / Defluvio Anual

Para que um reservatório fique totalmente assoreado, pode ser necessário um tempo
bastante longo. Na prática, a vida útil de um reservatório termina quando o volume
assoreado impede o seu funcionamento normal.

Exemplo: Utilizando a curva de Brune, calcular a vida útil provável de um reservatório


de capacidade 36 hm3; supor uma afluência líquida média anual de 72 hm3 e afluência
sólida total anual de 200000 ton de sedimentos. Admitir que o peso específico médio do
sedimento é de 1,2 ton/m3 e que a vida útil do reservatório terminará quando 80% de
sua capacidade original já estiver assoreada.

Capacidade Quociente Eficiência de Volume de Diferença na Número de


Hm3 capacidade Retenção Sedimentos Capacidade Anos para
afluencia % Retidos Hm3 Assorear
(∆V=7,2 hm3)
Vol. Média Ton Dam3
2 Ind. Inc.
1 3 4 5 6 7 8=7÷6
36 0,5 96,0 -- -- -- -- --
28,8 0,4 95,5 95,7 191400 159,5 7,2 45
21,6 0,3 95,0 95,2 190400 158,7 7,2 45
14,4 0,2 93,0 94,0 188000 156,7 7,2 46
7,2 0,1 87,0 90,0 180000 150,0 7,2 48
Total -- -- -- -- -- -- 184

Vida Útil = 184 anos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


130

1.4.2 - CONTROLE DO ASSOREAMENTO EM RESERVATÓRIOS

A estratégia mais empregada para contemplar o problema de assoreamento de um


reservatório é o de destinar uma parte de seu volume - o volume morto, para acomodar a
carga de sedimentos afluente durante a sua vida útil. As tomadas para aproveitamento
da água armazenada deverão se localizar acima da cota correspondente ao volume
morto. Essa medida não reduz a acumulação de sedimentos; de fato, essa estratégia
apenas adia a data em que a utilização do reservatório irá se tornar impraticável. Além
disso, os sedimentos se depositam ao longo de todo o reservatório de forma muito
complexa e não somente e simplesmente abaixo da cota correspondente ao volume
morto.

O assoreamento não pode ser evitado, mas pode ser retardado por meio de outras
medidas, tais como:
• melhores técnicas de conservação do solo na bacia de drenagem, entre as quais
podem ser citadas o reflorestamento, o cultivo e a aração em curvas de nível e a
construção de pequenas barragens de retenção nas ravinas.
• incorporação à barragem de órgãos de descarga parcial dos sedimentos depositados
ou em suspensão, como por exemplo válvulas de fundo, condutos e comportas
instaladas em diferentes cotas, abaixo do NA máximo normal de operação.

1.5 - ONDAS NOS RESERVATÓRIOS - AÇÃO DOS VENTOS

NA max
As barragens, principalmente as
de terra, necessitam ter uma
h
h0 BORDA LIVRE, acima do NA
de sobrelevação da cheia de
projeto, para conter a
ARREBENTAÇÃO DAS
ONDAS DEVIDAS À AÇÃO
DO VENTO.
1, 06
Fórmula de Saville et al. (1962) : h0 = 0,005Vv F 0, 47

onde: h0 = altura significativa de onda de vento em m; Vv = velocidade do vento a 7,6 m


acima do NA em km/h; e F = "fetch"ou extensão da superfície da água sobre a qual e
em cuja direção o vento atua, em km. (Fonte: Saville T., E. W. McClendon & A L. Cochran;
"Freeboard allowances for waters in inland reservoirs", ASCE Journal of Waterways and Harbours
Division, 1962)

Fetch para um Reservatório Regular :

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


131

Fetch para um Reservatório Irregular :

d3
d4
d1
d2

d5 n

θ5 ∑d
i =1
i cos θ i
d6 F= n

∑ cosθ
i =1
i
d7
ilha

d8
d9

Velocidade do Vento :

A fórmula de Saville et al.(1962) baseou-se em dados experimentais de velocidade do


vento a 7,6 m acima da superfície da água, denotada por Vv. Como os dados
normalmente disponíveis são de velocidade do vento ao nível do solo, denotada por Vs,
os autores ainda propõem fatores de correção, para diferentes valores do fetch F,
conforme a tabela a seguir.

Fetch (km) 0,805 1,609 3,219 6,437 9,656 12,874


Vv/Vs 1,08 1,13 1,21 1,28 1,31 1,31

Geralmente obtem-se os valores de projeto após análise de frequência dos valores


máximos anuais de Vs ou, em estudos expeditos, arbitra-se valores de projeto entre 50 e
100 km/h.

Cálculo Aproximado da Borda Livre h :

Barragens de Terra ou Enrocamento: h = 1,4 h0

Barragens de Concreto: h = 1,50 h0

1.6 - SELEÇÃO DO LOCAL PARA A CONSTRUÇÃO DE RESERVATÓRIOS

• Seção apropriada que proporcione boas condições de fundação e de custo.


• O custo do terreno a ser inundado pelo reservatório, incluindo a reconstrução de
cidades e estradas, não deve ser alto.
• O aproveitamento deve proporcionar o volume economicamente adequado.
• Um reservatório profundo é melhor do que um raso, devido ao menor custo dos
terrenos por capacidade unitária e menores perdas por evaporação.
• Bacias com grande produção de sedimentos devem ser evitadas.
• A qualidade das águas armazenadas devem satisfazer os fins visados.
• O impacto ambiental deve ser baixo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


132

Exercicios Propostos

Exercício 1 - Durante o mês de Julho de 1981, a afluência média ao reservatório de


Três Marias foi de 430 m3/s. No mesmo período, a CEMIG operou o reservatório
liberando para jusante uma vazão de 250 m3/s para atendimento à navegação, sendo que
a geração de energia elétrica consumiu uma vazão adicional de 500 m3/s. A precipitação
mensal na região foi de apenas 5 mm, enquanto a média histórica de evaporação da
superfície do lago vale 110 mm. Sabendo que no início do mês o NA do reservatório era
567,03 m, calcular o NA no fim do mês, dada a relação cota-área-volume a seguir.
Despreze as perdas por infiltração e calcule a precipitação efetiva (precipitação-
evaporação) sôbre o lago com base no NA de 567,03 m. Fazer interpolação linear na
relação cota-área-volume.

Reservatório de Três Marias - Relação Cota-Área-Volume

NA (m) Volume ( 109 m3 ) Área do reservatório (km2)


565,00 12,729 912
565,50 13,126 933
566,00 13,527 953
566,50 13,929 974
567,00 14,331 995
567,50 14,733 1018
568,00 15,135 1040

Exercício 2 - Estuda-se a possibilidade de ampliação do sistema de abastecimento de água de


uma cidade localizada às margens de um rio. Esse projeto de ampliação prevê a construção de
uma barragem para regularização de vazões, a qual complementará o sistema existente
composto por uma estação de bombeamento e por uma canal. O sistema atual tem capacidade de
atender a uma demanda de 4 m3/s. Para evitar problemas ambientais e de escassez relativa dos
recursos hídricos, deverá ser mantida a jusante do local da barragem uma vazão constante (Qj)
igual a 2,5 vezes a vazão natural (Qn) mínima local (Figura 1).

cidade

estação de
Qn bombeamento
canal

Qj
descarregador de fundo

Figura 1 - Esquema de ampliação do sistema de abastecimento da cidade

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


133

Quando da análise da localização dos postos, verificou-se que não existem dados fluviométricos
e pluviométricos no interior da bacia A, em estudo. Entretanto, esses dados existem para uma
outra bacia B, cujas características climáticas e geomorfológicas são semelhantes às da bacia A.
A área de drenagem da bacia B é duas vezes maior que a área da bacia A . O hidrograma de
vazões naturais da bacia B está apresentado na Figura 2.

100
90
Vazões Naturais (m3/s)

80
70
60
50 Bacia B
40
30 Média =
20 40 m3/s
10
0
0 20 40 60
Tempo

Figura 2 - Hidrograma representativo da bacia B

Nessa fase de estudos, foram feitas as seguintes hipóteses :


• O sistema deverá atender à demanda máxima do ano 2030, a qual será de 6 m3/s;
• As perdas por evaporação e infiltração podem ser desprezadas;
• O canal na situação atual escoa em regime permanente e uniforme;
• O canal na situação futura (ano 2030) também deverá escoar em regime permanente e
uniforme;
• Após os estudos econômicos das diferentes alternativas possíveis para a situação futura,
optou-se pela solução de manter a mesma geometria do canal (seção e declividade), mas
revestindo o seu fundo e suas laterais em concreto. Dessa forma, o coeficiente de
rugosidade de Manning passará a ser 2/3 do valor atual.

Pergunta-se :
a) com a construção da barragem, o rio terá condições de atender à demanda máxima do ano
2030 e à vazão a ser mantida para jusante (Qj)? Justifique sua resposta.
b) haverá risco do canal transbordar quando ele estiver escoando a demanda máxima prevista
para o ano 2030, dado que a solução recomendada mantem a mesma seção e declividade da
situação atual? Justifique sua resposta.

Dados adicionais :

S
Fórmula de Manning : Q = A R 2 3 onde Q é a vazão, n é o coeficiente de rugosidade, A é
n
a área molhada, R é o raio hidráulico e S é a declividade do fundo do canal, em unidades
métricas.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


134

Exercício 3 - O diagrama de Rippl, a seguir, refere-se aos 5 anos mais críticos de


vazões médias mensais afluentes a um local onde deverá ser construída uma barragem
para regularizar uma vazão de 88 m3/s, com o objetivo de manter um calado mínimo
para a navegação a jusante. A área de drenagem da bacia hidrográfica em questão é de
9500 km2 e a vida útil prevista para a obra é de 50 anos. Admitindo-se uma eficiência de
retenção constante e igual a 100% e dada a curva cota-volume do reservatório (figura
anexa), pede-se :
a) fixar o NA mínimo de operação;
b) fixar o NA máximo normal de operação;
c) fixar a cota da soleira do vertedouro;
d) fixar o NA máximo maximorum; e
e) fixar a cota da crista da barragem.

Dados adicionais :
- contribuição específica de sedimentos : qs = 421 m3 / km2 .ano
- vertedouro com 5 vãos de 7m de largura cada

- escolher altura das comportas entre 8 e 9 m


- coeficiente de descarga do vertedouro c=2,10
- vazão defluente máxima de projeto Q max = 1720 m3 /s
- altura total para arrebentação de ondas de vento + borda livre = 1,50 m

Diagrama de Rippl

6000
3/s)

5000
uladas(m

4000
ensaisAcum

3000
escargasM

2000
D

1000

0
10 30 50
20 40 60
Mes

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


135

Curva Cota-Volume do Reservatorio

610

600
etrica(m)

590
otaAltim

580
C

570

560

550

0 1000 2000 3000 4000


Volume (10^6 m3)

Exercício 4 - Pede-se calcular a curva de possibilidades de regularização (capacidade


útil em abcissas versus vazão regularizada em ordenadas) de um reservatório a ser
projetado em um local (área de drenagem de 2680 km2), cujas vazões médias mensais
estão listadas na tabela 1. As tabelas 2 e 3 apresentam respectivamente os totais mensais
de evaporação em tanque classe A e os de precipitação, observados em estações
próximas ao local. O futuro reservatório no NA máximo de operação inundará uma área
de 47 km2 e está situado em uma região onde o fator de transformação {evaporação de
lago / evaporação de tanque classe A } é 0.75. O exercício deve ser resolvido
graficamente através do diagrama de Rippl para vazões regularizadas de 50%, 60%,
70%, 80%, 90% e 100% da vazão média afluente efetiva do período.
Tabela 1 - vazões médias mensais (m3/s)
Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
66 53,9 45,0 70,5 36,8 28,4 23,7 20,7 19,9 18,7 23,2 22,8 64,6
67 88,7 74,7 73,7 48,4 33,0 38,6 25,2 20,1 23,1 25,7 44,8 47,1
68 67,0 32,4 43,7 33,7 22,0 19,7 18,8 18,3 15,8 20,6 14,8 21,9
69 23,5 23,9 21,5 27,0 12,3 17,1 11,3 12,2 10,5 20,8 46,5 29,8
70 106 142 65,3 40,2 32,5 28,2 24,7 21,2 33,6 26,3 24,8 30,9

Tabela 2 - Totais mensais de evaporação em tanque classe A (mm)


Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
66 147 119 151 119 93,5 93,2 115 138 152 147 155 131
67 142 137 137 110 112 96,9 120 163 157 154 130 119
68 155 125 159 123 114 106 125 148 174 187 153 178
69 182 140 146 135 119 113 124 162 179 154 152 163
70 152 116 153 121 121 109 111 160 152 177 161 184

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


136

Tabela 3 - Totais mensais de precipitação (mm)


Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
66 320 210 180 95 28 0 0 15 58 108 162 292
67 358 175 157 108 15 5 0 0 22 151 125 210
68 252 221 110 87 41 0 0 2 43 109 121 184
69 129 229 181 27 5 2 0 0 28 98 179 285
70 215 185 189 15 48 25 2 9 58 77 205 198

Exercício 5 - Calcular a vida útil do reservatório da UHE Tres Marias, cujo eixo no Rio
São Francisco drena uma área de 50600 km2, a partir dos dados obtidos nos quatro
postos sedimentométricos situados a montante e indicados no esquema a seguir :

UHE Tres Marias

Rio Borrachudo

3
1 Rio Paraopeba
2
Rio Indaia'
N

S
Rio S. Francisco
Rio Para'

Tabela 1 - Características dos postos sedimentométricos.

Posto # Local Área de Drenagem (km2) Período de Dados


1 Porto das Andorinhas 13300 72/73 a 84/85
2 Porto Pará 11300 72/73 a 84/85
3 Porto Mesquita 10300 78/79 a 84/85
4 Porto Indaiá 2260 77/78 a 84/85

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


137

A Tabela 2 a seguir fornece o resumo anual dos dados de sedimento em suspensão,


observados em cada um dos postos sedimentométricos :

Tabela 2 - Resumo anual das observações de sedimento em suspensão.


Posto → P. Mesquita Porto Pará P. Andorinhas Porto Indaiá
Ano Hidrológico ↓ Q ss anual (ton) Q ss anual (ton) Q ss anual (ton) Q ss anual (ton)

72/73 660340 2377206


73/74 481061 1849069
74/75 380851 1932049
75/76 276067 1553950
76/77 551249 1987860
77/78 415390 1759777 1479576
78/79 12789552 1782514 2389786 2643367
79/80 3532896 1037092 1997515 1969697
80/81 2125645 455241 1371913 923892
81/82 3437810 1233890 3746731 4236224
82/83 5780379 1875978 6626405 3917988
83/84 1991148 725889 2280740 726450
84/85 6264206 1776196 3208082 1063382

O fator de correção {[descarga sólida de fundo e em suspensão] / [descarga sólida em


suspensão]} pode ser adotado como 1,12. A composição média do sedimento total,
calculada a partir da análise granulométrica das amostras coletadas, é apresentada a
seguir na Tabela 3. Observe que os pesos específicos em ton/m3 da areia, silte e argila
são respectivamente 1,55; 1,20 e 0,416.

Tabela 3 - Composição média do sedimento total.


Posto Areia ( % ) Silte ( % ) Argila ( % )
Porto Mesquita 14,7 64,5 20,8
Porto Pará 12,3 43,6 44,1
Porto Andorinhas 4,7 52,1 43,2
Porto Indaiá 9,7 54,4 35,9

A descarga média de longo período afluente a Tres Marias é 732 m3/s e o volume total
do reservatório no NA máximo normal de operação (cota 568 m) é de 19252 . 106 m3.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


138

Sabendo-se que o reservatório deixará de funcionar conforme projetado quando 50% de


seu volume total estiver assoreado, pede-se calcular a sua vida útil sem levar em
consideração a compactação do sedimento depositado. Informação adicional : curva da
eficiência de retenção de Brune.

100
Sedi ment o Ret i do ( %)

80

curva mediana

60

40

curvas envoltorias

20

0
0.001 0.010 0.100 1.000 10.000
Capacidade / Defluvio Anual

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


139

2. - BARRAGENS

A primeira barragem da qual se tem notícia foi construída no rio Nilo, por volta de 4000
AC. Segundo o historiador Heródoto, atribui-se, a construção dessa barragem, a Menes,
unificador dos reinos do alto e baixo Nilo e rei da primeira dinastia egípcia. A
barragem, denominada El Kafara, era de pedra bruta e se localizava em Kosheish, a 20
km a montante da antiga cidade planejada de Mênfis, para protegê-la das inundações de
alguns afluentes do rio Nilo. A barragem mais antiga, ainda em operação, é a de
Almanza, localizada na província espanhola de Albacete. Essa barragem, em forma de
arco, foi construída em alvenaria de pedra bruta, tendo iniciada a sua operação em 1384
e reformada em 1736.

A ruptura e/ou a operação indevida de uma barragem podem causar inundações


catastróficas a jusante, com perdas de vidas humanas e grandes prejuízos econômicos.
Por isso, as recomendações para projeto, operação e manutenção de barragens são
geralmente padronizadas e as respectivas concessões para os aproveitamentos de
recursos hídricos, com reservatórios, devem ser emitidas por órgãos governamentais,
tais com a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Os projetos de aproveitamento de recursos hídricos, para os quais prevê-se a construção


de uma barragem, envolvem diferentes áreas da engenharia e passam por várias fases.
Por exemplo, no caso de uma grande usina hidrelétrica, o projeto envolve as seguintes
etapas:
• Inventário do potencial hidrelétrico, na escala da bacia ou regional;
• Estudo de viabilidade de um determinado local já inventariado;
• Projeto básico; e
• Projeto executivo.

Entre os estudos típicos necessários, podem ser citados os seguintes:

• Estudos topográficos: levantamento plani-altimétrico em escalas de 1:2000 a


1:10000, com curvas de nível de 2 a 5 m;
• Estudos hidrológicos: fluviometria, hidrometeorologia, sedimentometria, enchentes;
• Estudos geotécnicos: sondagens para fundações, pesquisa de jazidas de pedra e
cascalho para a construção da barragem, ensaios de carga;
• Estudos hidráulicos: arranjo ("lay-out"), desvio do rio para a construção da
barragem, túneis, vertedor, tomada d'água, escadas de peixe, modelos reduzidos;
• Estudos eletro-mecânicos: turbinas, acionamento de comportas, gerador;
• Estudos econômicos: previsão de mercado, priorização;
• Estudos jurídicos: desapropriação de terrenos e propriedades;
• Estudos de impacto ambiental; e
• Estudos diversos: relocação de cidades, estradas, pontes, construção da vila de
operadores.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


140

2.1 - TIPOS DE BARRAGENS

As barragens classificam-se, por sua função estrutural, ou por sua forma ou ainda pelo
tipo de material empregado em sua construção, em :
• BARRAGENS DE GRAVIDADE
• BARRAGENS EM ARCO
• BARRAGENS DE CONTRAFORTES; e
• BARRAGENS DE TERRA.

Os 3 primeiros tipos são geralmente construídos em concreto. Em uma barragem de


gravidade, sua estabilidade depende de seu peso próprio. As barragens em arco, pela
ação estrutural de sua forma em planta, transmitem às ombreiras a maior parte dos
esforços a que estão submetidas. Nas barragens de contrafortes, esses são dispostos em
distâncias regulares apoiando lajes planas ou curvas. As barragens de terra referem-se
àquelas construídas em terra e/ou enrocamento, dispondo de recursos para controlar a
percolação das águas que se infiltram através do maciço.

Tipo Material de Construção Seção Transversal Típica Vista em Planta

G concreto ou alvenaria
de pedra bruta

A concreto

C concreto

T terra e/ou rocha

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


141

Em uma mesma barragem, pode-se ter mais de um tipo de estrutura. As barragens em


curva podem associar a ação de seu peso próprio, típica das barragens de gravidade,
com a ação do arco para assegurar sua estabilidade. As barragens extensas possuem em
geral uma parte central em concreto, na qual localizam-se os extravasores e as tomadas
d'água, sendo complementadas nos flancos por barragens de terra e/ou enrocamento.

A seleção do tipo de barragem mais adequado para uma determinada seção fluvial é um
problema de viabilidade técnica e de custo. A solução técnica depende principalmente
da topografia, clima e geologia locais. O custo relativo dos vários tipos de barragens
depende principalmente da disponibilidade dos materiais de construção na área próxima
ao local e da acessibilidade para seu transporte.

Define-se a ALTURA DE UMA BARRAGEM como a diferença entre a cota de sua


crista (ou coroamento) e a cota mais baixa da vala escavada para as fundações. Por
vezes, a altura de uma barragem é definida de outras maneiras como, por exemplo, a
altura acima do antigo leito do rio.

2.2 - FORÇAS ATUANTES EM BARRAGENS

As principais forças atuantes sobre uma barragem são: a gravidade (peso próprio da
barragem), o empuxo hidrostático e a força devida à pressão ascensional exercida pelo
escoamento da água pela sua base. Os esforços resultantes são transmitidos ao terreno
sobre o qual se assenta a barragem, o qual reage com tensões iguais e contrárias.

O peso da barragem é o produto de seu volume pelo peso específico. Sua


linha de ação passa pelo centro de gravidade da seção.
As forças hidrostáticas podem atuar tanto nos paramentos de montante
como de jusante. A componente horizontal Hh é a força exercida na
projeção da face da barragem em um plano vertical, tendo como valor
unitário γh2/2, onde h é a profundidade e γ o peso específico da água. A
linha de ação dessa componente passa a h/3 da base.
Hv A componente vertical é o peso da
coluna d'água sobre a face da barragem e
sua linha de ação passa pelo centro de
Hh P gravidade dessa coluna.
hv A água, sob pressão, percola sob a base
da barragem, criando pressões
ascensionais. Admite-se que seu valor
hh
varia linearmente entre os valores
máximos da pressão hidrostática a
montante e a jusante. A resultante é
Pa Pa=γt(h1+h2)/2, onde t é a largura da
R base, h1 e h2 são alturas hidrostáticas no
calcanhar e no pé da barragem,
respectivamente. Sua linha de ação passa
pelo centro geométrico do diagrama
trapezoidal de pressões.
As camadas de subsolo subjacentes às barragens devem ser capazes de suportar os
esforços transmitidos às fundações, com e sem influência da água. Rupturas de
barragens podem ocorrer em decorrência da ruptura das camadas subjacentes do
subsolo. Ao vetor resultante das forças atuantes, opõe-se a reação R.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


142

2.3 - BARRAGENS DE GRAVIDADE

Essas barragens podem romper (i) por escorregamento ao longo de um plano


horizontal; (ii) por rotação em torno do pé da seção; ou (iii) por ruptura do material.
Nos projetos estruturais das barragens de gravidade, as tensões de trabalho usuais são de
cerca de 40 kg/cm2 para compressão e 0 kg/cm2 para tração. Em geral, os esforços de
tração são anulados quando se mantém a resultante R dentro do terço médio da base.

Algumas barragens de gravidade :

Friant

EUA (USBR)

Grande Dixenxe

Suiça (GD)

Vão central de barragem


de Jaguara

Brasil (CEMIG)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


143

A cota da crista de uma barragem de gravidade corresponde ao NA máximo normal de


operação, acrescido da sobrelevação devida à propagação da cheia de projeto e da
máxima altura para a arrebentação de ondas de vento. As larguras dos topos das
barragens de gravidade variam de cerca de 0,15 vezes a sua altura, até a largura
necessária a uma rodovia.

Detalhes Construtivos :

• Concretagem: as barragens são concretadas por partes, cujas dimensões dependem


do tamanho da obra. Essas partes formam blocos cuja largura máxima pode chegar a
15 m e de altura máxima de 1,5m. Os blocos são concretados alternadamente, e não
justapostos, para que a cura possa se processar de forma adequada. Devem ser
constantemente regados para evitar a secagem rápida pelo vento. As juntas entre os
blocos devem ser feitas com saliências e reentrâncias, além de preenchidas com
emulsão asfáltica para evitar sua aderência. Na face de montante, as juntas de
vedação são feitas com guarnições de cobre. É usual deixarem-se vãos livres no
interior do maciço para fins de galerias de inspeção.
• Fundações : não se deve lançar concreto nas escavações destinadas às fundações,
antes de se ter atingido a rocha sã. Todas as cavidades e falhas da camada subjacente
devem ser vedadas com injeções de concreto ou argamassa fina de cimento, a alta
pressão. Costuma-se construir, junto ao calcanhar da barragem, uma cortina de
vedação (estacas-prancha), para diminuir a percolação e as pressões ascensionais.
• Desvio do Rio : antes de ser iniciada a construção da barragem, o rio precisa ser
desviado de seu curso natural. O desvio pode ser feito em duas fases, como na
Figura A, ou, se as condições topográficas e geológicas assim o permitirem, através
de um ou mais túneis escavados em rocha ou canais de desvio, como na Figura B.
1a fase 2a fase

Escoamento ensecadeira
pelo leito do rio Escoamento
(A) pelos condutos de
descarga

Trecho pronto
obra da barragem
ensecadeira

ensecadeiras A vazão de desvio deve ser


determinada por análise de
freqüência das vazões máximas
anuais, admitindo-se um risco
Local da (B) razoável de ocorrência de pelo
obra menos um valor superior durante a
construção da obra. Em geral, a
vazão de desvio é tomada como a
vazão de tempo de retorno entre 25 e
Desvio em túnel 50 anos. A construção da parte
inferior da barragem deve ser
programada para a estação seca.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


144

2.4 - BARRAGENS EM ARCO

As barragens em arco apresentam curvatura em planta e transferem, por ação do próprio


arco, a maior parte do empuxo da água às ombreiras. Os esforços assim gerados exigem
que as vertentes do vale sejam capazes de resisti-los. São construídas em concreto e,
comparativamente aos outros tipos, as barragens em arco apresentam poucos casos de
ruptura. As mesmas forças atuantes nas barragens de gravidade também atuam nas
barragens em arco, diferindo apenas em sua importância relativa. Devido a sua base
estreita, as pressões ascensionais em uma barragem em arco são menos importantes.
Podendo ser muito altas e delgadas, as barragens em arco são recomendadas para vales
estreitos e rochosos.

Algumas barragens em arco :

Monticello

EUA (USBR)

Fragma

Itália (ENEL)

Funil

Brasil (Furnas)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


145

Detalhes Construtivos :

• Concretagem : o concreto deve ser lançado do mesmo modo que o descrito para as
barragens de gravidade. Os blocos, entretanto, tem altura de cerca de 3 m, podendo
chegar a 6 m nas camadas superiores de menor espessura. As juntas entre os blocos
devem ser radiais e longitudinais, com guarnições de vedação.
• Fundações : as escavações para as fundações e nas vertentes do vale devem atingir
a rocha sã. As superfícies de apoio nas vertentes devem ser perpendiculares ao eixo
do arco. Fendas e cavidades devem ser preenchidas com argamassa fina de cimento.

Detalhe da construção da barragem "Caldeirão", em Portugal (EDP).

2.5 - BARRAGENS DE CONTRAFORTES

Uma barragem de contrafortes consiste em uma placa inclinada que transmite o empuxo
da água a uma série de contrafortes perpendiculares ao eixo da barragem. Os tipos mais
comuns são os de laje plana e os de arcos múltiplos. No primeiro caso, a barragem é
constituída de lajes planas de concreto armado e, no segundo, de superfícies em arco,
também de concreto armado, as quais permitem uma maior distância entre os
contrafortes, pela ação estrutural dos arcos. As barragens de contrafortes gastam
entre1/3 a 1/2 do concreto necessário para a construção de uma barragem de gravidade
de mesma altura. Entretanto, gastam muito mais formas e aço.

Estão sujeitas às mesmas forças atuantes nas barragens


de gravidade. A não ser que haja um "radier", as
pressões ascensionais podem ser desprezadas. A
laje plana inclinação do paramento de montante, em geral de 45 °,
contraforte aumenta o valor da componente vertical do empuxo. A
altura das barragens de contrafortes pode ser
aumentada pelo prolongamento das lajes e dos
contrafortes. O seu peso próprio, sendo menor, permite
sua construção em terrenos que não suportariam uma
parede radier barragem de gravidade. Se esse for permeável,
interceptora
recomenda-se uma cortina de vedação até a rocha.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


146

Algumas barragens de contrafortes :

Manicouagan-5

Canadá (Hydro-Québec).

Tahoe

EUA (USBR)

Bartlett

EUA (USBR)

Detalhes Construtivos :

A primeira etapa na construção de barragens de contrafortes é a remoção das camadas


superiores do solo até encontrar terreno firme; aí, escava-se uma trincheira para embutir
a cortina impermeável de vedação. A concretagem dos contrafortes e das lajes de
vedação é feita em lances de 4 m, devendo a construção dos contrafortes estar mais
adiantada em relação à dos elementos de vedação. Todas as juntas de construção devem
ser dentadas. Como as barragens de contrafortes consomem muito menos concreto do
que suas equivalentes de gravidade, o tempo de construção é menor e o problema do
desvio do rio menos grave.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


147

2.6 - BARRAGENS DE TERRA

As barragens de terra utilizam material natural, com um mínimo de beneficiamento, e


podem ser construídas com equipamentos simples. Essas barragens competem em custo
com suas equivalentes de concreto. Ao contrário das barragens de gravidade que exigem
fundações em rocha sã, as de terra adaptam-se bem sobre diversos tipos de terreno.

Algumas barragens de terra:

Nova Ponte

Brasil (CEMIG)

Euclides da Cunha

Brasil (CESP)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


148

Três Marias

Brasil (CEMIG)

Tipos de Barragens de Terra :

As barragens de terra mais antigas são simples aterros homogêneos, sem nenhum
zoneamento do material empregado em sua construção. Uma variante é representada
pelos diques simples zonados, os quais dispõem de uma zona central constituída de
material selecionado relativamente impermeável, seguida de zonas de transição dos dois
lados, para garantia de estabilidade. O objetivo de se criar um núcleo relativamente
impermeável é o de diminuir a velocidade de percolação da água pelo interior do
maciço e, assim, impedir a erosão tubular regressiva a partir do paramento de jusante. É
usual utilizar-se uma mistura de argila, areia e pedregulhos finos para a composição do
núcleo. As zonas externas podem ser de material mais permeável, de granulometria
suficiente para garantir a estabilidade do maciço. Os outros tipos de barragens de terra
são semelhantes aos anteriores, diferindo para os casos em que a barragem se assenta
sobre terreno permeável ou impermeável.

1: 2,5 silte 1:2

areia-silte pedregulho
- areia

Dique Simples Zonado

1:2 0. 1:2
argila
silte silte
transiçào transiçào

camada permeável
Terreno impermeável

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


149

Barragem com Núcleo Prolongado até o Terreno Impermeável

1 : 2,5

1:3 pedregulho
- areia 1:4

argila
Terreno permeável
Cortina de vedação de
concreto

Barragem de Terra em Solo Permeável

Outros Tipos de Barragens de Terra :

Aterro Hidráulico : utiliza a água como meio de transporte do material até a seção em
que será usado. O material é lançado através de tubos perfurados; os de maior
granulometria depositam-se logo após a descarga e os finos são carreados para um
represamento sobre o núcleo central. O resultado é um aterro zonado com um núcleo
relativamente impermeável.

tubulação

Aterro hidráulico Aterro hidráulico

Lançado a seco Lançado a seco

núcleo

Attero Semi-Hidráulico : o material é lançado de caminhões basculantes. Em seguida,


os finos são transportados e separados até o núcleo, com o auxílio de água.

Projeto de Barragens de Terra :

O projeto de uma barragem de terra consiste em dimensionar um aterro de baixa


permeabilidade, que satisfaça a finalidade visada, e que possa ser executado com os
materiais disponíveis, a um custo baixo. O material para o aterro deve provir de locais
próximos (área de empréstimo), devido ao elevado custo de seu transporte. A
quantidade de material varia com o quadrado da altura da barragem; sendo assim, as
barragens de terra muito altas são raras. A estabilidade do aterro e do terreno sobre o
qual a barragem se assenta são problemas de mecânica dos solos, associados ao controle
adequado da infiltração da água e das pressões de percolação.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


150

Altura das Barragens de Terra :

A altura de uma barragem de terra é a distância vertical entre o terreno que a recebe e a
superfície d'água do reservatório, considerada a sobrelevação devida à propagação da
cheia de projeto e a borda livre de segurança.

Largura do Coroamento :

A largura do coroamento deve ser suficiente para fazer com que a superfície freática
superior mantenha-se no interior do maciço, com o NA do reservatório em seu
máximo. O United States Bureau of Reclamation recomenda a seguinte fórmula
empírica:
H
L= +3
5
onde L é largura do coroamento (m) e H é a altura da barragem (m).

Percolação :

Nenhuma barragem de terra é impermeável, sempre havendo a percolação da água


através e sob o aterro. Se, em um dado ponto no interior do maciço, a percolação
exceder a resistência ao deslocamento das partículas de solo, essas entram em
movimento. Em conseqüência, inicia-se um escoamento das partículas de menor
diâmetro, geralmente a partir da região imediatamente a jusante do pé do aterro; a esse
processo dá-se o nome de erosão tubular regressiva ou "piping".

A percolação pode ser reduzida através de uma base muito larga, ou por uma cobertura
relativamente impermeável a montante, ou por um núcleo de argila, ou por um
diafragma de concreto, ou, ainda, por um filtro de areia no interior do maciço. A
percolação sob o aterro pode ser reduzida por meio de um tapete impermeável a
montante ou por um conjunto de estacas de concreto como prolongamentos do núcleo.
Com alguma freqüência, podem ser utilizados os filtros de pé, constituídos de brita e
pedregulho grosso, para os quais convergem as águas percoladas, sendo, em seguida,
drenadas para algum ponto onde possam ser lançadas sem causar danos.

O volume das águas percoladas é calculado por uma rede de fluxo, a qual consiste no
diagrama das linhas de igual carga hidráulica, ou linhas equipotenciais, e das linhas de
fluxo ou de corrente, as quais devem ser aproximadamenteperpendiculares entre si.
Essas linhas são traçadas de tal forma que a vazão entre cada par de linhas de fluxo seja
constante e que a perda de carga entre duas equipotenciais seja a mesma, formando,
dessa forma, uma série de pequenos quadrados, tal como ilustrado na figura abaixo.

Linha equipotencial

Linha de fluxo

brita

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


151

A forma de uma rede de fluxo pode ser determinada de vários modos:


• Modelo reduzido em areia, usando-se corante para o traçado das linha de fluxo;
• Analogia entre a lei de Darcy e a lei de Ohm, usando-se um papel condutor de
eletricidade, no qual se registram as linhas equipotenciais entre os eletrodos;
∂2h ∂2h
• Resolução numérica da equação de Laplace, ou seja 2 + 2 = 0
∂x ∂y
• Graficamente, com esboços a mão livre, ajustes e correções gradativas.

Proteção dos Taludes :

O talude de montante de uma barragem de terra deve ser protegido contra a ação
erosiva de ondas por uma camada de rip-rap ou de concreto. O talude de jusante, por
estar sujeito à erosão pela chuva, deve ser recoberto por grama.

2.7 - PLANTAS TÍPICAS DE UMA BARRAGEM

Exemplo da barragem "Picote", em Portugal (EDP) :

Vista aérea :

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


152

Planta:

Vista do vertedor:

VISTA DE JUSANTE

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


153

AS 10 MAIORES BARRAGENS DO MUNDO (Fonte : Water Power & Dam Construction, 1982)

EM ALTURA
Ordem Nome País Altura (m)
1 Rogun Rússia 335
2 Nurek Rússia 300
3 Grande Dixence Suiça 285
4 Inguri Rússia 272
5 Boruca Costa Rica 267
6 Vaiont Itália 262
7 Chicoasen México 261
8 Tehri Índia 261
9 Kishau Índia 253
10 Sayano-Shushensk Rússia 245

EM VOLUME DE BARRAGEM
Ordem Nome País Volume (103 m3)
1 Syncrude Tailings Canadá 540000
2 Chapetón Argentina 296200
3 Pati Argentina 238180
4 New Cornelia EUA 209500
5 Tarbela Paquistão 153000
6 Fort Peck EUA 96050
7 Lower Usuma Nigéria 93000
8 Cipasang Indonésia 90000
9 Ataturk Turquia 84500
10 Guri Venezuela 77971

EM VOLUME DE RESERVATÓRIO
Ordem Nome País Volume (106 m3)
1 Bratsk Rússia 169270
2 Assuan Egito 168900
3 Kariba Zimbabwe/Zâmbia 160368
4 Akosombo Gana 148000
5 Daniel Johnson Canadá 141852
6 Guri Venezuela 138000
7 Krasnoyarsk Rússia 73300
8 Bennett Canadá 70309
9 Zeya Rússia 68400
10 Cabora Bassa Moçambique 63000

EM GERAÇÃO DE ENERGIA HIDRELÉTRICA


Ordem Nome País Potência - Fase Final
(MW)
1 Itaipu Brasil-Paraguai 12600
2 Grand Coulee EUA 10830
3 Guri Venezuela 10300
4 Tucuruí Brasil 8000
5 Sayano-Shushensk Rússia 6400
6 Corpus Argentina-Paraguai 6000
7 Krasnoyarsk Rússia 6000
8 La Grande 2 Canadá 5328
9 Churchill Falls Canadá 5225
10 Tarbela Paquistão 4678

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


154

Exercício Propostos

Exercício 1 - A crista de uma barragem está na cota 500 m, com 0,65 m de borda livre
acima do NA máximo-maximorum, o qual engloba a sobrelevação devida à propagação
da cheia de projeto. O vertedor dessa barragem tem 5 vãos de 7m de largura e 9m de
altura e o seu coeficiente de descarga é c=2,10. Sabendo que a descarga máxima
defluente é 2101 m3/s, pergunta-se :
a) qual é a cota do NA máximo normal de operação?
b) na estação chuvosa do ano hidrológico de 1977/78, a operação prevista para a
segunda quinzena de Dezembro era a de alocar um volume de espera, correspondente a
um NA 5 metros acima da soleira do vertedor. Qual era o NA em 16 de Dezembro de
1977 ?

Exercício 2 - Dados os croquis das seções fluviais abaixo, indique o(s) tipo(s) de
barragem, dentre gravidade, contraforte, arco ou terra-enrocamento, apropriado(s) a
cada caso. Justifique sucintamente a sua escolha.

(a) vale extenso

crista

rocha rocha

depósito aluvionar profundo

(b) vale relativamente extenso

crista

rocha
rocha

aluvião pouco profundo

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


155

(c) vale estreito e íngreme

crista

rocha

aluvião

(d) vale extenso

crista

rocha aluvião

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


156

3. - EXTRAVASORES, COMPORTAS E DISPOSITIVOS DE SAÍDA

Extravasores são estruturas necessárias para descarregar as cheias e evitar que a


barragem sofra danos ou se rompa. Comportas nas soleiras de alguns tipos de
extravasores, ou em conjunto com os condutos de descarga, possibilitam um controle da
saída de água, de forma a atender determinadas regras operativas do reservatório. Em
alguns casos, são necessários dispositivos para regular a retirada de água em canais e
condutos que partem do reservatório.

3.1 - EXTRAVASORES

Além de possibilitarem o controle do NA do reservatório abaixo de um valor máximo


pré-fixado, os extravasores são a segurança das barragens. Existem extravasores com e
sem comportas em suas soleiras; as comportas regulam as vazões defluentes. A
capacidade máxima do extravasor depende do hidrograma da cheia de projeto afluente e
do volume do reservatório. Existem vários tipos de extravasores.

3.1.1 - EXTRAVASOR-VERTEDOR (ou de crista livre)

Trata-se de uma seção de barragem projetada para permitir a passagem livre da água por
sobre sua crista. Diversos tipos de soleiras são empregados. No caso de grandes
barragens, o perfil deve ser tal que o escoamento se processe suavemente, com um
mínimo de turbulência, para que não haja descolamento da veia líquida e conseqüente
possibilidade de cavitação. O extravasor ideal deve ter a mesma forma da face inferior
da veia líquida que escoa por sobre um vertedor de soleira delgada em sua carga
máxima h (Figura a). Esse extravasor é chamado de soleira padrão (Figura b). Estudos
experimentais mostraram que algumas modificações efetuadas no parte de montante
tornam o vertedor em ogiva próximo do ideal (Figura c). As conseqüências de uma
carga hidráulica, ou seja, a de uma vazão superior à de projeto, encontram-se ilustradas
esquematicamente na Figura d.

>h
h h

Hd

(a) (b) (d)

a A vazão de um extravasor-vertedor é
x
dada por
R1

R2 1,85 0,85 Q = c l h3 2
x =2 yh
b
Q=vazão em m3/s
y a=0,175.h b= 0,282.h c=coeficiente de descarga (1,65<c<2,25)
R1=0,50.h R2=0,20.h l=largura do vertedor em m
(c) h=carga hidráulica em m

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


157

O coeficiente de descarga c
h´/Hd = 0
varia com o tipo de soleira,
= 1,5
possuindo valores maiores 2,2
para a soleira padrão, e = 2,0
também com o valor da carga
hidráulica. Geralmente, os 2,0
valores de c são determinados
através de ensaios em h´ = carga de projeto
modelos reduzidos, sob
diversas condições. 1,8

0 0,5 1 h/h'

Exemplo de uso de modelos reduzidos - Barragem de Bartlet, EUA (Laboratório de


Hidráulica do U. S. Bureau of Reclamation, Denver, EUA, cortesia de P. Burgy) :

Protótipo :

Modelo :

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


158

3.1.2 - EXTRAVASOR CANAL

No extravasor canal, a água escoa sobre a crista da soleira, sem jorrar, indo para um
canal aberto de grande declividade, algumas vezes denominado rápido. As lajes de
concreto armado têm espessura de 25 a 50 cm e tem encaixes com juntas de dilatação.

Recomenda-se a instalação de
Curvatura drenos para recolher a água de
suave infiltração e evitar o
aparecimento de pressões
ascensionais. Em geral, o canal
Lajes de concreto
com juntas de
tem largura constante, com
dilatação de 10 curvas suaves e declividade
em 10 m suficientemente grande para
evitar que a veia líquida se
Drenos em valetas de brita descole do fundo. Pode ser
construído dentro ou fora do
corpo da barragem.

3.1.3 - EXTRAVASOR LATERAL

Trata-se de um tipo de extravasor no qual as águas, após passarem sem jorrar sobre a
soleira, vão escoar em um canal lateral. É usado em vales estreitos onde não se dispõe
de comprimento suficiente para a construção de extravasores-vertedores ou do tipo
canal (ver o item 3.1.5).

3.1.4 - EXTRAVASOR TUBULAR

Barragem de terra - cota da crista 160m Nesse caso, a água escoa verticalmente por
200 um poço indo ter a um conduto horizontal
Canal de desvio 160 que a conduz através da própria barragem,
120 se essa for construída em concreto, ou
80
40 abaixo das fundações da barragem. É uma
40
solução muito usada onde não há espaço
80 para a construção de outros tipos de
120
160
extravasores. Não se recomenda passar a
200 galeria horizontal por dentro de uma
Tampão
barragem de terra. A galeria deve passar
pelo subsolo abaixo das fundações ou em
145 alguns casos pelas ombreiras.
Normalmente, em barragens de maior
porte, a entrada do extravasor possui
formas suaves e arredondadas, conhecida
como "tulipa". Em geral, o tubo vertical é
construido em concreto armado e o
horizontal é escavado em rocha. Para
impedir a entrada de corpos e detritos
flutuantes, usam-se grades de proteção.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


159

Em um extravasor tubular, existem 3 condições possíveis de escoamento :


(a) com pequenas cargas, o conduto não trabalha a seção plena e a vazão é proporcional
à carga sobre a soleira elevada ao expoente 3/2, ou seja Q α h3/2;
(b) aumentando-se a carga, configura-se um complexo estado de transição, durante o
qual o escoamento se processa ora como livre, ora como conduto forçado, a partir da
submersão parcial da entrada da tulipa, ou seja Q α (h’)1/2; e
(c) com a entrada da "tulipa" totalmente submersa, o escoamento se faz como conduto
forçado e, nesse caso, a vazão é proporcional à raiz quadrada da carga total sobre o
conduto de saída, ou seja Q α ht1/2.

h h' h"

ht=y+h"
y

(a) (b) (c)

Em um extravasor tubular, na terceira situação de


transição
escoamento quando o poço vertical estiver com sua
carga Q α ht 1/2 tomada submersa, um aumento substancial de ht irá
Q α h3/2 provocar somente um pequeno aumento da vazão. Esse
fato impõe um limite para a capacidade de tais
extravasores, os quais devem ser projetados com grande
Inflexão a
margem de segurança. Uma transição brusca entre o poço
partir da
y e a galeria de saída pode provocar cavitação. A
submersão
complexidade do escoamento em vertedores tubulares faz
da tomada
com que se tornem quase sempre necessário os ensaios em
modelo reduzido.
vazão

3.1.5 - EXTRAVASORES DE SERVIÇO E DE EMERGÊNCIA

Na maioria das barragens, há um só extravasor que cumpre a função de escoar toda e


qualquer vazão, até o limite de sua capacidade. Em alguns casos, torna-se mais
econômico dispor de mais de um extravasor: um de serviço, para as vazões de cheias
mais frequentes, e outro de emergência, para as grandes enchentes. Pode-se utilizar uma
garganta natural do terreno na periferia do reservatório, ou, quando isso não for
possível, pode-se construir uma estrutura especial para o extravasor de emergência.
Na estrutura mista de extravasores de serviço e
Vertedor de emergência, do exemplo ao lado, foi
anterior projetado um canal lateral, com rápido de
concreto, para escoar cheias até o tempo de
Vertedor
posterior
retorno de 50 anos sobre a primeira soleira,
Rápido de
concreto
indicada na figura como vertedor anterior. Os
excedentes das vazões de tempo de retorno
Calha maior extravasam sobre a segunda soleira, ou
natural vertedor posterior, e escoam até o rio por uma
depressão natural do terreno.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


160

3.2 - DISPOSITIVOS DE CONTROLE DA VAZÃO

Pode-se conseguir um volume adicional de armazenamento, acima da crista do vertedor,


instalando-se dispositivos para controle da vazão temporários (pranchões, stop-logs e
agulhas) ou móveis (comportas).

3.2.1 - PRANCHÕES

São pranchões metálicos ou de madeira apoiados em pinos verticais sobre a soleira do


vertedor. São removidos quando o NA atingir um nível pré-fixado. Podem ser colocados
ou removidos por um gancho suspenso a uma ponte rolante ou a um cabo teleférico e
podem ter alturas de 1,20 a 1,50 m. Alguns tipos são articulados à soleira do extravasor
e apoiados por escoras quando suspensos.

escora
Vedação de
borracha

Lado de
Jusante

3.2.2 - STOP-LOGS E AGULHAS

Os stop-logs são toras, pranchões ou


Pilares com encaixes vigas que, colocadas em posição
horizontal, vedam vãos entre pilares
sobre as soleiras dos vertedores. Os
stop-logs apoiam-se uns sobre os
outros e nos encaixes internos dos
pilares. Os pranchões são operados
com guincho ou mesmo manualmente
em estruturas de menor porte. Há
muita perda de água entre os
Stop - log pranchões e por essa razão são usados
como vedação em pequenas estruturas,
sem grande necessidade de
estanqueidade e para as quais as
remoções não sejam muito freqüentes.
São utilizados também para a
manutenção e reparo a seco de
soleira
equipamentos e comportas principais.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


161

As agulhas são pranchas apoiadas


Passarela
Agulhas inferiormente em chanfros abertos na
entre os soleira do extravasor e superiormente
pilares em uma passarela entre os pilares do
vão. São mais fáceis de serem retiradas
do que os stop-logs, porém mais difíceis
de serem colocadas em água corrente.
Por isso, são usadas como vedação de
emergência, nos casos em que não é
preciso remontá-las, antes de cessar o
escoamento.
Lado de montante

3.2.3 - COMPORTAS DE DESLOCAMENTO VERTICAL

São comportas planas, construídas em aço, que deslizam em guias verticais colocadas
em pilares sobre as soleiras dos extravasores. Suas dimensões são limitadas pelo atrito
nas guias devido ao empuxo e por isso são empregadas em pequenas estruturas. Uma
variante alternativa é a comporta Stoney, a qual possui roletes livres entre a comporta
e as guias. Outra variante é a comporta de rodízios, os quais, são fixos à comporta e
deslizam sobre trilhos a jusante das guias. As comportas de rodízios podem ser usadas
em grandes estruturas; nesse caso, devido à necessidade de muito espaço livre acima das
comportas para o seu erguimento, elas são geralmente feitas em duas seções horizontais,
erguendo e afastando a superior, antes de alçar a inferior.

3.2.4 - COMPORTAS SEGMENTO

Guincho
A comporta segmento é constituída de um
paramento em forma de um segmento
cilíndrico, montado em uma estrutura de aço, a
Passarela
cabo entre os qual gira em torno de um munhão colocado
pilares
próximo à face de jusante dos pilares, acima da
soleira do vertedor. O seu acionamento pode ser
munhão feito através de cabos presos à comporta e a
guinchos mecânicos ou manuais instalados em
uma passarela entre os vãos dos pilares. Tiras de
borracha fazem a vedação entre os pilares e a
comporta, bem como entre essa e a soleira.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


162

Em estruturas maiores, em geral faz-se


uso de acionamento hidráulico ou
pneumático. As dimensões dessas
comportas podem variar de 1 a 15
metros de altura e de 2 a 20 metros de
largura. São muito usadas e
apresentam as seguintes vantagens :
• O atrito concentra-se nos
munhões;
• Devido à ação do arco, o atrito é
muito menor do que o atuante
sobre as comportas planas; e
• A carga no guincho é menor e
constante.

Exemplos :

Barragem de Cedillo, Espanha. Barragem de Pinet, França.


(comportas construídas pela Societé Alstom; vistas de jusante)

3.2.5 - COMPORTAS CILINDRO

São cilindros, dispostos entre pilares, e que rolam


apoiados em um trilho inclinado e equipado com
cremalheira, na qual se alojam os dentes do perímetro
da estrutura cilíndrica. O acionamento é feito, em
geral, através de cabo ligado a um guincho. A altura
de vedação pode ser aumentada por um setor de
cilindro, fixado à comporta, de forma que a borda
inferior desse suplemento apoie-se na soleira. As
comportas cilindro adaptam-se a grandes vãos e
pequenas alturas. Como exemplo, cita-se o caso da
comporta-cilindro, instalada no rio Glommen,
Noruega, a qual tem 44,5 m de largura e 6,4 m de
altura de vedação.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


163

3.2.6 - COMPORTA MITRA

A comporta Mitra é muito empregada como porta de eclusa de navegação e compõe-se


de dois elementos basculantes com eixos de articulação verticais localizados nas
paredes da câmara da eclusa. Na posição fechada, os elementos basculantes apoiam suas
extremidades livres umas às outras. Na posição aberta, os tabuleiros basculantes se
alojam em ranhuras construídas nas paredes laterais da câmara. Exemplo:

Comporta mitra em implantação no sistema de


navegação McCleland-Montgomery Point (EUA).
Fabricação : Oregon Iron Works.

3.2.7 - COMPORTAS SETOR ESCAMOTEÁVEIS (Comportas Tambor)

Articulado e
Setor de cilindro ôco
São setores de cilindro que, quando se
vedado abaixam para abrir o vão, inserem-se em uma
vedado depressão estanque construída na soleira do
vertedor. Quando se permite a entrada de
água nessa depressão, a comporta, que é ôca,
é forçada a elevar-se por flutuação e fecha o
a vão (Fig. a).

Um outro tipo de comporta não possui a face


inferior e eleva-se somente pelo empuxo
exercido pela água (Fig. b).
vedado Articulado e
vedado As comportas desse tipo apresentam as
vantagens de adaptarem-se bem a grandes
vãos, bem como ao perfil da soleira padrão,
além de permitirem o funcionamento
automático.
b
Essas comportas não são recomendadas para
barragens pequenas devido ao tamanho da
depressão necessária para escamoteá-las.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


164

3.2.8 - COMPORTA TELHADO

A comporta telhado consiste em


duas folhas de aço, fixadas à
barragem por meio de
articulações estanques. Quando se
permite a entrada de água no vão,
força-se o erguimento das folhas.
É usada para aumentar o calado
para navegação. Em épocas de
cheias, o conjunto pode ser
escamoteado sem interferir nas
condições de navegabilidade.

3.3 - DISPOSITIVOS DE SAÍDA

Os dispositivos de saída são aqueles destinados a descarregar ou conduzir para


aproveitamento a água contida abaixo do NA máximo normal de operação.

3.3.1 - CONDUTOS DE DESCARGA

São condutos ou túneis que atravessam a barragem, se essa for construida em concreto,
ou as ombreiras da barragem, se essa for de terra ou enrocamento. A função dos
condutos de descarga é descarregar para jusante parte do volume acumulado abaixo da
crista da soleira de um eventual vertedor de superfície, quando esse existir.
Caso seja imprescindível que o conduto
L atravesse uma barragem de terra,
aro recomenda-se que ele possua aros
x salientes para evitar ou dificultar a
percolação ao longo da face externa do
Comporta vertical conduto. Em geral, recomenda-se que o
comprimento de percurso seja
aumentado, através dos aros, em pelo
Percurso das águas de menos 25% do comprimento do
percolação conduto, ou seja Nx>0,25L, onde N é o
número de aros e x seu comprimento.

Os dispositivos para descarga de fundo consistem em condutos de descarga com seções


de entrada localizadas próximas ao NA mínimo de operação; as grandes barragens
podem tê-los em diversos níveis. Os condutos podem ter seções circulares ou
retangulares, devem ser suficientemente lisos, sem saliências ou reentrâncias, de forma
a evitar a formação de depressões e consequente cavitação. A forma das seções de
entrada devem ser arredondadas. Douma (1942) propõe que a entrada seja elíptica para
condutos circulares, ou seja 4 x 2 + 44,4 y 2 = D 2 ; para condutos retangulares, a
expressão proposta é x 2 + 10,4 y 2 = A 2 , onde A é a largura ou a altura, dependendo do
lado que estiver sendo considerado (ver figura a seguir).

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


165

y
Descolamento da
veia líquida
x

Depressão e
possível cavitação

3.3.2 - TOMADAS D'ÁGUA

A não ser que façam parte integrante da barragem, devem ser previstas as tomadas
d'água nas entradas dos condutos de retirada de água do reservatório. Sua função é
permitir a retirada de água em qualquer nível dentro de uma faixa de variação pré-
fixada. Além disso, as tomadas d'água são usadas também para proteger a entrada do
conduto contra obstruções, ondas e correntes. Variam desde um simples bloco de
concreto, no qual se ancora a extremidade de um tubo, até as torres de tomada d'água, a
depender das finalidades e características do reservatório, bem como da capacidade
necessária.

3.3.2.1 - TOMADA D'ÁGUA SUBMERSA

Grade
São as mais econômicas e usadas em
Junta
pequenas obras. Como não interferem com a
flexível navegação, são recomendadas para captação
de água em rios. Sua principal desvantagem
FoFo
é a falta de acesso para reparos e
manutenção. Devem ser posicionadas em
pontos que, futuramente, não venham a ser
cobertos, por depósitos de sedimentos.

3.3.2.2 - TORRES DE TOMADA D´ÁGUA

Nos casos em que ocorre ou se permite grande variação dos níveis d'água, em geral
recomenda-se a utilização de tomadas d'água em forma de torre. Essas dispõem de
aberturas em várias cotas que permitem a regulação das vazões e possibilitam um certo
controle da qualidade da água a ser retirada. Em alguns reservatórios destinados a
abastecimento de água potável, as mudanças climáticas podem provocar alterações
bruscas na estratificação térmica vertical do lago e, conseqüentemente, na variação da
qualidade da água com a profundidade. Nesses casos, as torres de tomada d'água, com
aberturas em diversos níveis, podem possibilitar uma certa seleção da qualidade da água
a ser retirada do reservatório.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


166

As torres de tomada "com água", ilustradas


na figura ao lado, consistem em uma
câmara de concreto cheia de água até o NA
do reservatório, com um poço vertical no
seu interior ligado ao conduto de saída. No
interior do poço, em geral, são instaladas
comportas cilíndricas para regular as
Comporta
cilíndrica vazões de saída.
As torres de tomada "sem água", ao se
fecharem, não tem água em seu interior,
pois as aberturas são ligadas diretamente
ao conduto de saída. Cada abertura dispõe
de uma comporta ou válvula, permitindo
Conduto de saída
que a água seja retirada de qualquer nível
do reservatório; esse atributo constitui uma
vantagem das torres de tomada 'sem água".

3.3.3 - GRADES DE PROTEÇÃO

As entradas das tomadas d'água e dos condutos de descarga devem dispor de grades de
proteção contra detritos. Em geral, são barras de aço distanciadas entre si de 5 a 15 cm,
sobre as quais os detritos se depositam; esses são retirados das grades periodicamente.
Existem alguns tipos de grades que são carregadas eletricamente para dificultar a
entrada de peixes nos condutos.

3.3.4 - CONTROLE DAS ENTRADAS

A maioria das tomadas d'água e dos condutos de descarga dispõe de comportas ou


válvulas em suas entradas. Em estruturas onde a carga hidráulica é menor do que 30 m,
as comportas podem funcionar também como reguladores de vazão. Entretanto, para
cargas maiores, as comportas são usadas somente em situações de emergência ou para
inspeção e controle dos condutos. A resistência devida ao atrito gerado pela pressão
hidrostática, bem como o peso próprio da estrutura de vedação, determinam o tipo de
comporta e o mecanismo de erguimento recomendáveis. Em instalações com pouca
carga, podem ser previstas comportas planas de deslocamento vertical, operadas por
rosca sem fim, de acionamento manual. Para cargas moderadas, as mesmas comportas
planas podem ser usadas, porém com acionamento mecânico. Para cargas elevadas, ou
para grandes dimensões de comporta, comportas planas de construção especial, como
por exemplo as comportas de rodízios ou vagão, devem ser recomendadas.

3.3.5 - ADUFAS

As adufas são comportas planas de deslocamento vertical, instaladas no interior dos


condutos a jusante de sua entrada. Para cargas menores do que 20 m, as adufas são
usadas também para regular as vazões. Para cargas maiores, são empregadas geralmente
em posições extremas de abertura ou fechamento dos condutos. Nas barragens de

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


167

gravidade, o seu mecanismo de erguimento localiza-se, em geral, em galerias no interior


do maciço de concreto. Para condutos circulares de até 1,20 m de diâmetro e cargas
inferiores a 50 m, podem ser usados registros de gaveta. Para cargas mais elevadas e
maiores dimensões, outros tipos mais sofisticados de adufas e mecanismos de
erguimento devem ser previstos. Um desses tipos é a adufa com aro de continuidade,
ilustrada na figura abaixo, cuja característica principal é o aro que guarnece o perímetro
de uma abertura circular na folha da adufa, a qual, quando na posição aberta, permite a
passagem da água de forma a manter a continuidade do escoamento. Sob cargas muito
elevadas, as adufas não servem para regular a vazão devido à possibilidade de cavitação
quando parcialmente abertas.

3.3.6 - VÁLVULAS REGULADORAS PARA CARGAS ELEVADAS

3.3.6.1 - VÁLVULA DE AGULHA

A válvula de agulha é usada para regular vazões e, quando conveniente, para formar os
jatos para as turbinas de ação (bicos injetores de turbinas do tipo Pelton). Consiste em 3
câmaras cheias de água nas quais a pressão pode variar. Com referência à figura que se
segue, as câmaras A e C são interligadas de modo que a pressão, em cada uma delas,
seja a mesma. A válvula se abre com o aumento da pressão em B, abaixando-a em A e
C, de modo a forçar a agulha para a esquerda. Para fechar a válvula, conecta-se a
câmara B com a atmosfera, aumentando-se a pressão em A e C. O diâmetro de saída das
válvulas de agulha pode variar de 10 a 270 cm.

B C
Abas de fixação A

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


168

3.3.6.2 - VÁLVULA DISPERSORA OU DE JATO ÔCO ("Hollow jet valve")

Quando instaladas nas saídas dos condutos de descarga, as válvulas de agulha lançam
seus jatos com muita energia cinética, podendo provocar erosão a jusante. As válvulas
de jato divergente dissipam parte da energia, por meio da dispersão do escoamento
sobre uma grande área. Consiste em um cilindro fixo, envolto por outro cilindro móvel.
No cilindro fixo, adapta-se um cone com o vértice voltado para o lado de montante. A
vazão é regulada pelas aberturas do cilindro móvel. Os diâmetros para esse tipo de
válvula variam de 60 a 240 cm.

Cilindro móvel

Exemplo : Válvula de jato divergente da barragem de Reza Sha Kabir, no Irã.


(Societé Alstom).

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


169

3.3.7 - EXEMPLO DE DISPOSIÇÃO DE CONDUTOS DE DESCARGA

Barragem de Friant, no Rio San Joaquín, no estado americano da Califórnia (USBR).

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


170

4. CHEIAS DE PROJETO DE VERTEDORES

4.1 - Introdução

Vertedor (vertedouro): Estrutura de uma barragem que permite a descarga do excesso


de água que aflui ao reservatório. Indispensável para garantir a segurança da barragem,
não permitindo o seu galgamento devido à elevação do NA do reservatório.

Questões relativas ao projeto de vertedores :

a) Qual é o hidrograma de cheia afluente ao reservatório?


( hidrologia; complexidade : critérios de cálculo diferentes )

b) Considerando dimensões preliminares do vertedor, curvas características do


reservatório e o hidrograma de cheia afluente, determinar o hidrograma defluente
cujo valor máximo irá fornecer a capacidade do vertedor.
( hidrologia - hidráulica )

c) Verificar qual é o NA máximo maximorum atingido durante o amortecimento da


onda de cheia pelo reservatório.
( hidrologia )

d) Somar ações de ondas de vento críticas ao NA máximo maximorum e determinar a


borda-livre necessária e a cota da crista da barragem.
( hidrologia )

1
Q NA res
2  Crista
(m3/s) (m)
3  NA máx. max.
4  NA mxn
 NA normal
 NA mín.
Q1
5

H
NAmxn

H : sobrelevação máxima
Q1 : descarga vertida no NAmxn

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


171

4.2 - Características Gerais dos Vertedores (extraídas de "Manual de Inventário


Hidrelétrico de Bacias Hidrográficas", Eletrobrás-ANEEL)

Os vertedores podem ser classificados em de fundo e de superfície.

Os vertedores de fundo poderão ser do tipo de barragem móvel, galerias ou condutos


com válvulas dispersoras. Além destes tipos, existe um outro tipo de vertedor
denominado descarregador de fundo, o qual tem utilização provisória e cujo principal
objetivo é manter uma fluxo mínimo para jusante durante o período de enchimento do
reservatório. Vertedores de fundo somente deverão ser utilizados se condicionantes
requererem descargas a jusante, em situações que não possam ser atendidas por vertedor
de superfície.

Os vertedores de superfície poderão ser do tipo livre ou controlados por comportas.


Estes, por sua vez, poderão ser classificados em vertedores de ogiva alta, de ogiva baixa
ou de encosta.Os vertedores livres têm aplicação típica em usinas a fio d’água, cuja
barragem pode ter uma soleira vertente. Acarretam maior sobrelevação no reservatório.
Outros tipos de vertedor livre, tais como os do tipo tulipa e sifão, são pouco utilizados,
e, quando o são, normalmente a vazão de vertimento é pequena.Os vertedores
controlados por comportas são recomendados em aproveitamentos com reservatórios
deplecionáveis. Seções típicas :

Vertedor livre Vertedores Controlados

ogiva alta ogiva baixa encosta

A não ser em casos particulares, nos arranjos de estudos de inventário somente deverão
ser utilizados vertedores do tipo de superfície controlados por comportas segmento ou
vertedores livres de superfície (soleira vertente).
Deverão ser evitados vertedores de emergência fusível ou outros visando reduzir a
capacidade requerida dos vertedores principais. Não se recomenda, da mesma forma,
posicionar o vertedor entre as unidades da casa de força, ou sobre a mesma.
A escolha do tipo de vertedor e sua localização dependerá da concepção do arranjo
geral, do tipo de desvio e das características geológicas do local.

O vertedor de ogiva alta é composto por uma soleira vertente, de altura significativa,
controlada ou não por comportas do tipo segmento, e um dissipador de energia. É
utilizado, em geral, em aproveitamentos com barragens de altura média e serve como
estrutura de desvio — através de adufas colocadas em seu corpo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


172

O vertedor de ogiva baixa é composto por uma soleira vertente baixa, controlada ou não
por comportas do tipo segmento, e um dissipador de energia. É utilizado, em geral, em
aproveitamentos com barragens baixas e pode servir como estrutura de desvio do rio.

O vertedor de encosta é composto por uma pequena soleira vertente, seguida de uma
calha e um dissipador de energia. Pode ser controlado ou não por comportas do tipo
segmento. É utilizado, em geral, em aproveitamentos com barragens altas de aterro
fechando a totalidade da seção do vale e com desvio do rio por túneis ou galerias. São
colocados de forma a aproveitar ou não a existência de um meandro do rio.

O escoamento pelo vertedor possui uma energia muito elevada que deve ser dissipada de forma eficiente
no menor trecho possível, principalmente para evitar danos em estruturas do próprio aproveitamento. A
dificuldade na dissipação de energia, sob o ponto de vista hidráulico, depende da vazão específica —
vazão por metro de largura do vertedor — e uma forma de minimizá-la é aumentar a estrutura de
dissipação, ou ainda diminuir a altura das comportas, com o conseqüente aumento na largura. Existem
vários tipos de dissipadores de energia. A seleção deverá levar em conta principalmente o tipo de
vertedor, os parâmetros hidráulicos de projeto e as condições geológicas locais. É usual recomendar-se a
utilização de dissipadores do tipo bacia de dissipação ou salto de esqui.A bacia de dissipação é
recomendada em local com condições geológicas pouco favoráveis.O salto de esqui, onde a dissipação da
energia é feita por impacto do jato na bacia de amortecimento, exige material mais resistente na bacia
para minimizar a profundidade do poço de erosão no ponto de impacto do jato. Neste tipo de dissipador
pode-se amenizar o efeito do impacto do jato através da diminuição da vazão específica ou produzindo-se
uma boa dispersão e aeração do jato. Na bacia de dissipação (Figura abaixo) a determinação da
profundidade é iterativa e baseada no número de Froude na entrada dela, para a vazão de cheia centenária.
Arbitra-se, inicialmente, uma cota para o fundo da bacia de dissipação e verifica-se a adequação do valor
arbitrado, calculando a velocidade, a profundidade do escoamento e o número de Froude antes do ressalto
hidráulico, a profundidade do escoamento após o ressalto e, finalmente, a cota do fundo da bacia. Caso
este valor calculado difira do arbitrado inicialmente, os cálculos deverão ser refeitos até ser atingida a
precisão desejada. É aconselhável que o número de Froude fique entre 4,5 e 9,0, pois nesta faixa o
ressalto é estável, bem definido e menos sensível à variação do nível d’água de jusante (Chow, 1959).
Para aumentar o número de Froude para 4,5 pode-se, por exemplo, abaixar o fundo da bacia de dissipação
além do resultado pelo cálculo acima. Para diminuir o número de Froude para 9,0 pode-se, por exemplo,
estreitar a largura da bacia de dissipação, sempre que as condições econômicas o permitirem.

No caso de salto de esqui, a sua seção transversal é formada por uma curva circular, com raio de 3 vezes a
profundidade da lâmina de água, tangente à calha e terminando em um ângulo com a horizontal de 25,8°.
Admite-se a cota da soleira do salto de esqui acima do nível d’água máximo do canal de restituição para a
vazão centenária. A largura da estrutura dissipadora de energia é a mesma da calha, exceto no caso de se
desejar adequar bacia de dissipação com número de Froude superior a 9,0. A altura das muros laterais ao
longo do paramento de jusante e do salto de esqui deverá ser igual a 1,6 vezes a profundidade do
escoamento para compensar o emulsionamento da lâmina d’água. Na bacia de dissipação a altura é fixada
acima da profundidade a jusante do ressalto. Esses muros são do tipo a gravidade ou estão ancorados na
rocha, com espessura mínima de 1,0 m e com paramento externo com 0,5H:1V quando não engastados na
rocha.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


173

4.3 - Características Hidráulicas dos Vertedores

Vertedor de Superfície Não Controlado

Visando a melhor condução do fluxo até a bacia


de dissipação, evitar o aparecimento de
y subpressões ( < p atm ) na região da crista e
ha
velocidades de aproximação adequadas, estudos
H0 teóricos e experimentais conduziram ao perfil
h0 definido pela equação :
x y  x 
n

= −k   , onde
yc n Ho  Ho 
y  x 
= − k   Ho : altura de projeto,
P H0  H0  va : velocidade de aproximação
xc forma ha : carga cinética ( va2 / 2g )
arredondada va = Q / L ( P + ho )
k , n , xc , yc = f ( ha / Ho )
n ≈ 1,85
Ho = ho + ha, k ≈ 0,5

Descarga Máxima : Q = c . L . H03/2

Q : descarga através do vão do vertedor ( m3/s )


c : coeficiente de descarga ( adimensional entre 1,8 e 2,2 )
L : largura do vão do vertedor ( m )
H0 : carga total ( m )

O coeficiente c depende da inclinação do parâmento de montante, de Ho , das


profundidades de montante ( P ) e de jusante.

Vertedor de Superfície Controlado

para aberturas parciais :


H2 Q = c . L . ( H13/2 - H23/2 )
H1
para abertura total ( H2 = 0 ) :
Q = c . L . H13/2

comporta
segmento de
altura H1.
Q

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


174

Vertedor "Tulipa"

d
H x Perfil para evitar o descolamento da lâmina :
1,87
z  x
= 0,608 
z H  H

Descarga : Q = c . π . d . H3/2

1,90 < c < 2,10

Vertedor Submerso ( orifício )

Q = µ . F . 2gh
h
F : área do orifício
µ : depende da forma do orifício
(retangular : 0,4 ≤ µ ≤ 0,6)

4.4 - Ruptura de Barragens por Infuência de Cheias

atos de terrorismo e guerra


humanas erros de projeto e construção
falha na operação

Causas
ocorrência de cheias excepcionais
naturais
outras causas

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


Efeitos de Cheias Excepcionais

Reservatórios de pequenas dimensões Reservatórios de dimensões maiores

A cheia provoca elevações muito rápidas A evolução da cheia é mais lenta,


do NA do reservatório (de 1 a 2 m por havendo tempo para a tomada da decisão
hora). Se as comportas não são abertas ou quanto à abertura das comportas.
não funcionam a tempo, geralmente há o Entretanto, se houver uma cheia superior
galgamento da estrutura. Além disso, à de projeto, ocorrerá o galgamento
existe sempre o conflito entre causar ("overtopping") da estrutura e
cheias a jusante e a possibilidade de possibilidade de rompimento.
amortecê-las. Exemplo : barragem de
Euclides da Cunha, SP, 1977.

Efeitos do Galgamento da Barragem

Segundo o ICOLD ("International Congress of Large Dams"), o galgamento da estrutura


foi responsável por 35% dos rompimentos de barragens ocorridos entre 1900 e 1975.

Barragens de Concreto Barragens de Terra/Enrocamento

Podem suportar considerável Não suportam transbordamento devido à


transbordamento sem perda da erosão progressiva do maciço. A ruptura é
estabilidade. Quando rompem, entretanto, gradual, formando ondas de cheia de
o acidente é brusco e provoca uma onda menor porte e de evolução mais lenta.
de cheia "instantânea" a jusante. Em
pouco tempo, podem provocar enormes
perdas econômicas e acidentes fatais.

Prejuízos Causados pelo Rompimento de Barragens

Diretos Indiretos

Perdas de vidas humanas. Paralização das atividades econômicas no


Danos materiais na barragem. local e a jusante.
Danos materiais nas zonas inundadas. Perda de energia elétrica que seria gerada
na barragem rompida e em outras.
Danos físicos e/ou psicológicos aos
sobreviventes.
Página em Branco
176

Padrões de Segurança Desejáveis - Definição da Enchente de Projeto

-Inundação de terras férteis e cidades


Benefícios da Construção da Barragem × -Inundação de províncias minerais
(energia, irrigação, abastecimento, etc.) -Inundação de locais turísticos
-Risco às populações a jusante

O cotejo entre os benefícios econômicos da construção de uma barragem e o risco


imposto às populações e benfeitorias instaladas a jusante, implica na competição entre o
custo crescente de vertedores de dimensões cada vez maiores e a viabilidade econômica
do empreendimento. Essa competição poderia ser facilmente solucionada por análise
econômica de alternativas, caso fosse possível monetarizá-las integralmente e calcular,
com precisão, os riscos pertinentes.. Entretanto, devido à impossibilidade de
monetarizar vidas humanas, por exemplo, convencionou-se estabelecer padrões
desejáveis de segurança de barragens através de sua categorização nos itens risco e
dimensões (Tabelas 1, 2 e 3).

Tabela 1 - Risco (Comitê Brasileiro de Barragens - CBDB)


Risco Perdas de Vidas Perdas Econômicas
Baixo Nenhuma esperada. Nenhuma estrutura Mínima. Região não desenvolvida, estrutras e
permanente para habitação humana a cultivo ocasionais.
jusante.
Significativo Até cinco. Nenhum desenvolvimento Apreciável. Terras cultivadas. Presença de
urbano e não mais do que um pequeno indústrias e estruturas permanentes.
número de estruturas habitáveis.
Alto Mais do que cinco. Excessiva. Comunidades, indústrias e
agricultura extensa.

Tabela 2 - Dimensões (Comitê Brasileiro de Barragens - CBDB)


Categoria (prevalece o critério da maior categoria) Altura h (m) Armazenamento V (106 m3)
Pequena 5 < h < 15 0,05 < V < 1
Média 15 < h < 30 1 < V < 50
Grande h > 30 V > 50

Tabela 3 - Definição da Enchente de Projeto (Recomendação CBDB)


Risco Dimensões Enchente de Projeto
Baixo Pequena Hidrograma de tempo de retorno
50 a 100 anos.
Média Hidrograma de tempo de retorno
100 anos ou 1/2 EMP (Enchente
Máxima Provável).
Grande 1/2 EMP a 1 EMP.
Significativo Pequena Hidrograma de tempo de retorno
100 anos ou 1/2 EMP (Enchente
Máxima Provável).
Média 1/2 EMP a 1 EMP.
Grande 1 EMP.
Alto Pequena 1/2 EMP a 1 EMP.
Média 1 EMP.
Grande 1 EMP.

Hidrograma Hipotético de T=10000 anos


Vertedor de grandes barragens
Enchente Máxima Provável

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


177

4.5 - Métodos de Cálculo do Hidrograma Afluente da Enchente de Projeto

• Método Direto

Esse método consiste na análise de frequência de vazões máximas e/ou volumes


máximos, de determinada duração. Utiliza, portanto, somente os registros
fluviométricos e, para o caso de reservatórios de grande capacidade de amortecimento,
seu produto final é um hidrograma hipotético de tempo de retorno T anos.

• Método Indireto

Esse método utiliza, inicialmente, as observações meteorológicas e pluviométricas


disponíveis sobre uma dada região, para produzir a chamada chuva de projeto. Para o
caso de grandes barragens, a chuva de projeto é construída de forma a produzir a
"Precipitação Máxima Provável", ou simplesmente PMP. Devido à sua construção
puramente determinística, não existe nenhuma metodologia conhecida que permita
associar uma probabilidade de excedência às estimativas da PMP. Na sequência do
método indireto, utiliza-se alguma técnica de transformação chuva-vazão, como o
hidrograma unitário ou um modelo conceitual de simulação hidrológica, para a obtenção
da "Enchente Máxima Provável" (EMP) a partir da PMP.

• Evolução do Uso dos Métodos Direto e Indireto no Brasil

Frequência
Relativa (%)

Método Direto
30

20

10
Método Indireto

1960 69 70 1980

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


178

4.6 - Método Direto

Em se tratando de grandes barragens, com grande volume de reservatório, o método


direto consiste em construir um hidrograma hipotético, de tempo de retorno
supostamente igual a 10000 anos, através da análise de frequência dos registros
disponíveis de vazões médias, para diversas durações, máximas anuais. O método para
construção do hidrograma hipotético decamilenar, abaixo descrito, foi desenvolvido em
1975 por Leo Beard, do U. S. Army Hydrologic Engineering Center.
1. Selecione o hidrograma da maior cheia registrada no local da barragem ou em locais
hidrologicamente similares. Esse será o hidrograma típico.
2. Determine a curva de frequência das vazões médias (ou volumes) para as durações
1, 3, 5, ... n dias.
3. Determine os volumes das diversas durações para o tempo de retorno 10000 anos.
4. Altere o pico diário do hidrograma para o valor de projeto.
5. Procure no hidrograma típico o período que possui o maior volume para a duração
seguinte (3 ou 5 dias).
6. Calcule o volume decamilenar para a duração desejada e subtraia as ordenadas das
durações anteriores que já sofreram modificação.
7. Ajuste as outras ordenadas do período de forma a obter o volume decamilenar para a
duração em questão.
8. Retorne ao item 5 até a última duração considerada.
9. Verifique se os volumes resultantes são iguais aos decamilenares. Caso contrário,
repita as etapas de 4 a 8 usando o hidrograma resultante como novo hidrograma
típico.
Exemplo : Rio Grande na UHE de Furnas

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


179

C u rvas d e F req u ên cia d e V az õ es M ed ias d e D u ra ção


E s p ecific ad a M axim as An u ais - R ese rva tó rio d e
F u rn as

14000

12000

10000
Vazão Média (m3/s)

8000

6000

4000

2000

0
1 10 100 1000 10000
Te m p o d e R e to r n o (a n o s )

1 d ia 5 d ia s 1 0 d ia s 1 5 d ia s
3 0 d ia s 6 0 d ia s

Tabela 4 - Curvas de frequência de cheias para o reservatório de Furnas


Tempo de Q 1 dia Q 5 dias Q 10 dias Q 15 dias Q 30 dias Q 60 dias
Retorno (m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s)
(anos)
2 2767.418 2622.465 2426.695 2288.789 2015.362 1718.014
5 3727.691 3549.751 3269.683 3065.803 2662.263 2237.551
10 4454.109 4251.216 3907.378 3653.592 3151.625 2630.566
20 5180.527 4952.681 4545.074 4241.381 3640.987 3023.58
25 5414.382 5178.502 4750.366 4430.607 3798.526 3150.103
50 6140.8 5879.967 5388.061 5018.396 4287.888 3543.117
100 6867.218 6581.432 6025.757 5606.184 4777.25 3936.131
500 8553.909 8210.183 7506.439 6970.988 5913.513 4848.683
1000 9280.328 8911.648 8144.135 7558.776 6402.875 5241.697
2000 10006.75 9613.113 8781.83 8146.565 6892.237 5634.712
5000 10967.02 10540.4 9624.818 8923.58 7539.138 6154.249
10000 11693.44 11241.86 10262.51 9511.369 8028.5 6547.263

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


180

Cheia de 1947 e Hidrograma Hipotetico


Decamilenar - Reservatorio de Furnas

12000

10000

8000
Descarga (m3/s)

6000

4000

2000

0
0 10 20 30 40 50 60
Dias

Cheia de 1947 Hidrograma Decamilenar

Limitações do Método Direto :

• Erros nas séries de descargas, principalmente na leitura de cotas e na extrapolação


de curvas chaves.
• Estimativas ruins dos parâmetros das distribuições de probabilidades, com base em
séries muito curtas.
• Em uma cascata de reservatórios, qual combinação de hidrogramas de montante e da
área incremental deve ser usada?
• Qual distribuição de probabilidades deve ser utilizada?
• Inexistência de dados fluviométrico no local de interesse.
• Extrapolação até 10000 anos das curvas de frequência ajustadas com base em
amostras de 20 a 50 anos de registros.
• Qual é o verdadeiro tempo de retorno do hidrograma da cheia de projeto?

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


181

4.7 - Método Indireto

Chuva de Transformação Enchente


Projeto Chuva-Vazão de Projeto

• Análise de Chuvas • Método Racional • Vazões de Pico de


Intensas • Hidrograma Unitário Tempo de Retorno
• Modelação • Modelos de Igual ao da Chuva
Estocástica de Simulação de projeto
Precipitações Hidrológica (SSARR, • Hidrograma
• Precipitação SMAP, Stanford, • Enchente Máxima
Máxima Provável HSP-F, outros) Provável

4.7.1 - Precipitação Máxima Provável (PMP)

"Maior altura de precipitação para uma dada duração, meteorologicamente possível,


para uma dada bacia, numa certa época do ano, sem consideração de mudanças
climáticas." (Organização Meteorológica Mundial, OMM, 1973)

Etapas para a estimativa da PMP (meteorologista) :

• Análise climatológica
• Análise dos processos de formação das precipitações sobre a região em estudo.
• Análise de fontes de umidade, sistemas frontais, direção predominante de transporte
do ar úmido e barreiras orográficas.
• Análise das séries históricas de precipitações.
• Análise das séries históricas das temperaturas de ponto de orvalho.
• Traçado de mapas isoietais de eventos chuvosos críticos para diversas durações.
• Cálculo das massas de vapor d'água efetivamente precipitável ao longo de uma
coluna de ar atmosférico, em conformidade com as respectivas temperaturas
máximas de ponto de orvalho, persistentes por 12 horas, associadas a eventos
críticos e eventos hipotéticos.
• Maximização dos eventos críticos pela razão entre as massas de vapor d'água
efetivamente precipitável associadas a eventos críticos e eventos hipotéticos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


182

a) Modelo de Tempestade ("Thunderstorm Model", U.S. Weather Bureau, 1932)

Célula Geradora de Tempestade

P4, z4 Pi : níveis de pressão (Kpa)

V34 zi : altitudes (m)


P3, z3
V12 : velocidade uniforme de
entrada do ar úmido (m/s)

V34 : velocidade uniforme de


saída do ar úmido (m/s)
P
P2, z2
P : taxa de vapor d'água que deixa a
V12
célula sob a forma de
precipitação (kg/s)
P1, z1

K : perímetro da célula (m)

 ∆P 
P = KV12 W12 − 12 W34  , onde
 ∆P34 
 ∆P 
We = W12 − 12 W34  é a massa de vapor d’água efetivamente precipitável.
 ∆P34 
W12 é a massa de vapor d'água contida numa coluna de ar, em uma atmosfera saturada,
desde o nível P1 até P2, a qual é função das temperaturas do ponto de orvalho Td (° C) e
pressões nos níveis 1 e 2, sendo calculada pela seguinte expressão :
1 n−2 1 *
W12 = ∑ (
g i =1 2
)
ri + ri*+1 ∆P , onde

e * (Td )
*
r = 0,622 representa a razão de mistura de saturação, e* a pressão de vapor
p − e (Td )
*

saturante (mb) e p a pressão atmosférica (mb). As seguintes aproximações são válidas :


e * (Td ) = 101325 exp( N )

N = 13,3185TR − 1,976TR2 − 0,6445TR3 − 0,1299TR4


373,15
TR = 1 −
Td
Td pode ser medida a partir das leituras pscrométricas.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


183

b) Maximização de uma Precipitação Histórica

De acordo com o modelo de tempestade, se PH representa uma precipitação histórica,


crítica para uma dada duração, durante a qual a temperatura do ponto de orvalho
máxima persistente foi TdH , pode-se escrever que PH = KV12We (TdH , P0 ) , dependente
unicamente da temperatura do ponto de orvalho. Analogamente, se TdM representa a
máxima temperatura de ponto de orvalho, observada durante o período histórico de
leituras disponíveis ou estimada mediante análise de frequência, pode-se calcular a
Precipitação Máxima Provável - PMP, para a duração em questão, através da equação

PMP = f PH , onde
We (TdM , P0 )
f denota o fator ou razão de maximização, dada por f = .
We (TdH , P0 )

c) Etapas Práticas para Estimativa da PMP

• Escolhe-se uma duração crítica para a bacia em estudo.


• Determina-se os valores máximos históricos de precipitação, para a duração
escolhida, em cada posto da rede pluviométrica considerada.
• Faz-se a análise isoietal dos eventos históricos críticos.
• Determina-se a temperatura do ponto de orvalho máximo, persistente por 12 horas,
para o evento mais crítico (TdH).
• Determina-se a temperatura do ponto de orvalho, persistente por 12 horas, máxima
durante o período histórico das observações (TdM).
• Calcula-se a razão de maximização f.
• Estima-se a PMP multiplicando-se as isoietas do evento histórico crítico por f.
• Insere-se a PMP em uma sequência contendo os meses mais chuvosos de forma a
tornar a bacia "saturada", durante a fase de transformação chuva-vazão.

d) Exemplo do Rio São Francisco na UHE Formoso.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


184

4.7.2 - Transformação Chuva-Vazão e Estimativa da EMP.

a) Modelos Conceituais de Simulação Hidrológica Contínua

São modelos matemáticos em que os processos e armazenamentos do ciclo hidrológico


são descritos por equações, de base física e/ou empírica, associadas a parâmetros
calibráveis para cada bacia em estudo, de forma contínua ao longo de um dado
intervalo de tempo. As precipitações são encaminhadas a reservatórios fictícios
interconectados, considerados representativos dos mecanismos através dos quais a bacia
armazena e transporta água. Existem diversos modelos conceituais de simulação
hidrológica, entre os quais podem ser citados os seguintes: SSARR ("Streamflow
Synthesis and Reservoir Regulation", U. S. Army Corps of Engineers, NorthWest
Division, 1958; versão recente disponível através da URL http://www.nwd-
wc.usace.army.mil ), "Stanford Model" (Linsley, 1960), "Stanford Watershed Model IV"
(Linsley & Crawford, 1966), HSP-II ("Hydrocomp Simulation Program", Hydrocomp,
1969), HSP-F ("Hydrologic Simulation Program - Fortran", U. S. Enviromental
Protection Agency, 1980; versão 11 disponível através da URL
http://www.epa.gov/epa_ceam/wwwhtml/ceamhome.htm) e MSD-30 (plataforma Windows,
versão implementada pelo Departamento de Engenharia Hidráulica e Recursos Hídricos
da UFMG, para o modelo Rio Grande/Xinanjiang, em intervalo mensal; o programa
MSD-30 está disponível por meio da URL http://www.ehr.ufmg.br ).

b) O Modelo HSP-II

O modelo possui os módulos DATABASE, LANDS e CHANNEL. O módulo


DATABASE refere-se ao banco de dados pluviométricos, evaporimétricos,
fluviométricos, séries temporais e auxiliares. O módulo LANDS constitui a
transformação chuva-vazão, propriamente dita, sobre um segmento ("land segment")
considerado homogêneo do ponto de vista hidrológico. Uma bacia pode ser dividida em
vários segmentos, cada qual possuindo um conjunto próprio de 16 parâmetros
calibráveis e 4 de inicialização. O módulo CHANNEL refere-se à propagação das
vazões através da rede de drenagem; as propriedades dos trechos fluviais ("river
reaches") são modeladas por seções transversais típicas de forma, dimensões e

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


185

rugosidade representativas. Dados necessários : chuvas horárias, evaporação, descargas


diárias e algumas seções batimétricas.

Chuva LANDS LSRO CHANNEL


(mm) (mm/km2) (m3/s)

A calibração do modelo consiste em encontrar um conjunto de parâmetros, para cada


segmento e trecho fluvial, tal que as descargas simuladas em uma dada seção (ponto de
controle) reproduzam, com razoável grau de precisão, as descargas observadas no local,
durante um certo período considerado representativo das condições hidrológicas médias
e extremas.

c) Enchente Máxima Provável

• Sequência dos meses mais chuvosos para todos os segmentos em que a bacia foi
dividida.
• Inserção da PMP sobre cada segmento, dentro da sequência dos meses mais
chuvosos.
• Simulação hidrológica da PMP utilizando-se o modelo já previamente calibrado,
obtendo-se assim a EMP.
• Propagação da EMP através do reservatório, considerando-se dimensões
preliminares do vertedor e até que a sobrelevação esteja dentro de limites aceitáveis.

Exemplo : Rio São Francisco na UHE Formoso.

Limitações do Método Indireto :

• Erros de medição (precipitação, evaporação, descargas, ponto de orvalho).


• Calibração do modelo.
• O modelo, calibrado sob as condições do período histórico, reproduzirá
corretamente a tranformação chuva-vazão, sob as condições extremas da PMP?
• Não se pode associar uma probabilidade de excedência à PMP e, por conseqüência,
à EMP.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


186

5. CONTROLE DE CHEIAS

5.1 Generalidades

Uma enchente representa o escoamento superficial produzido em uma bacia submetida


a condições hidrometeorológicas especiais. A severidade dessas condições determina se
o volume da cheia pode ser contido nos limites do leito menor do curso dá'gua ou então
ocupar o leito maior ou a chamada planície de inundação.

A magnitude de uma cheia pode ser avaliada a curto prazo, tarefa que se denomina
previsão de vazões, ou a longo prazo denominando-se, nesse caso, pré-determinação
de vazões. A previsão a curto prazo estabelece não só o valor como também quando
ocorrerá a cheia. A previsão prescinde de sistemas de telemetria e comunicação, além
de um modelo chuva-vazão calibrado para a bacia em questão. Trata-se de um
instrumento valioso para a definição de regras operacionais para reservatórios, bem
como para a tomada de decisões quanto às providências emergenciais para a atenuação
dos danos provocados por enchentes. A pré-determinação a longo prazo quantifica a
probabilidade de excedência de uma determinada cheia, sem precisar a data de sua
ocorrência.

Comentários :
a) Após analisarem a série de 94 anos do posto fluviométrico de Hartford (EUA) até
1934, Hoyt & Langbein (1955) ajustaram uma distribuição de probabilidades à
amostra e concluíram que cotas iguais ou superiores a 32 pés seriam muito raras,
com tempo de retorno de 300 anos. Em 1936, a cota foi de 38 pés e em 1938 de 35
pés.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


187

b) O rio Itajaí em Blumenau, cuja série de 48 anos (1935 a 1982) não apresentava
nenhuma cota superior a 14 m, elevou-se em 1983 e 1984 a níveis superiores a 15
m.
c) "As magnitudes das cheias sempre aumentam com o tempo de retorno, mas
aumentam até um limite definido e não até o infinito" (Horton, 1930). Os
hidrometeorologistas desenvolveram estudos buscando definir a máxima
precipitação possível de ocorrer sobre uma dada área. A limitação de dados
conduziu esses estudos para a Precipitação Máxima Provável (PMP). Em 1941,
estimou-se a PMP para a bacia do rio Ohio, cujo valor foi ultrapassado pelo evento
hidrometeorológico associado à enchente de 1942.
d) "É um erro imaginar que a ocorrência seqüencial de grandes cheias significa que
essas estejam aumentando com o tempo ou que sejam conseqüência de modificações
substanciais na bacia. Essas modificações podem ter efeito sobre as enchentes de
freqüência média ou pequena, mas terão efeito pequeno sobre as enchentes raras."
(Tucci, 1987).

5.2 Medidas de Controle das Inundações

As medidas visando o controle das inundações são classificadas em estruturais e não


estruturais. As medidas estruturais são aquelas que modificam de alguma forma o
sistema fluvial, através de estruturas hidráulicas, objetivando atenuar os prejuízos
provocados pelas cheias. As medidas não-estruturais, por sua vez, são aquelas que
objetivam uma melhor convivência da população com os riscos de cheias, não
prescindindo de modificações estruturais do sistema fluvial.
Seria incorreto pensar que as ações humanas poderiam controlar totalmente as cheias;
sempre se visa atenuar os seus efeitos. Como exemplo, cita-se o o sistema de controle
de cheias da bacia do rio Pó, na Itália, o qual, em 1930, era um projeto de recursos
hídricos bem sucedido. Em 1951, as altas intensidades de precipitação e elevados níveis
de maré, causaram cerca de 100 mortes e a perda de mais de 30.000 cabeças de gado,
além de prejuízos para a agricultura.
O controle das inundações pode ser obtido por um conjunto de medidas estruturais e
não-estruturais. A pesquisa para a melhor combinação dessas ações constitui o objeto do
planejamento do controle de cheias e de seus efeitos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


188

O Caso dos Estados Unidos

1936: Foi aprovada uma lei, de abrangência nacional, sobre o controle de cheias. A
federação assumia a responsabilidade pelo programa de implantação de medidas
estruturais. Não era necessário verificar as relações benefício-custo para justificar a
proteção das áreas sujeitas a inundações. Como conseqüência, aceleraram-se a ocupação
e o desenvolvimento das planícies de inundação. De 1936 a 1966, foram gastos 7
bilhões de dólares em obras e serviços. Apesar disso, durante esse período, os prejuízos
causados por enchentes aumentaram até alcançar a cifra de 1 bilhão de dólares por ano.

1966: O governo norte-americano reconheceu que as medidas até então implementadas


não eram adequadas e criou um grupo de trabalho para estudar o assunto.

1973: Foi aprovada uma lei sobre proteção de cheias, enfatizando as medidas não
estruturais, entre as quais, podem ser citadas a exigência de seguro contra enchentes, a
regulamentação de uso da terra e proteção de novas estruturas, dentro do leito ocupado
pela cheia de tempo de retorno 100 anos.

1974: Foram incluídos na legislação sobre desenvolvimento de recursos hídricos,


artigos específicos sobre a proteção contra enchentes, prevendo medidas estruturais e
não-estruturais, bem como a distribuição de seus custos.

5.3 Medidas Estruturais

As medidas estruturais são obras de engenharia ou alterações físicas no sistema fluvial,


empreendidas pelo homem, que visam reduzir os danos provocados pelas enchentes.
Podem ser classificadas em extensivas ou intensivas. As medidas extensivas são
aquelas em que a ação humana se dá na bacia, procurando alterar a relação chuva-vazão.
Pode-se citar, como exemplo, a alteração da cobertura vegetal da bacia, objetivando
atenuar e retardar a vazão de pico, bem como controlar a erosão laminar na bacia. As
medidas intensivas, por outro lado, são aquelas em que a ação humana se dá diretamente
no sistema fluvial e podem ser de três tipos:

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


189

• Medidas intensivas que retardam o escoamento: reservatórios de acumulação e


retardamento.
• Medidas intensivas que aceleram o escoamento: construção de diques e muros de
contenção, corte de meandros, aumento da capacidade de descarga da seção fluvial.
• Medidas intensivas que desviam o escoamento: canais de desvio e leitos de alívio.

5.3.1 Medidas intensivas que retardam o escoamento

A função de um reservatório, destinado a atenuar cheias, é a de armazenar uma parcela


das vazões de enchentes de modo a minimizar a vazão de pico no local a ser protegido.

Em um caso ideal, o reservatório situaria-se


Volume
imediadatamente a montante da área a ser protegida e
sua operação visaria "eliminar"o pico da onda de
cheia. Isso seria possível descarregando-se para
jusante a vazão afluente, até que a defluência atinja a
capacidade de segurança do rio ou vazão de restrição
a jusante da barragem ( ponto S no hidrograma ao
lado). Qualquer vazão superior à de restrição
permaneceria armazenada até que a afluência seja
Tempo (dias) menor que a capacidade de segurança. Se o local a
ser protegido se localizar a 24 horas a jusante e se
A
Hidrograma das não houver afluentes no trecho incremental, o
Hidrograma C vazões naturais
Vazão Afluente
hidrograma afluente será amortecido pelo
24 h a jusante,
sem afluentes
armazenamento no canal. No primeiro caso, a
redução de pico será AB, enquanto que no segundo
será CD. Entretanto, se houver afluentes no trecho
entre o reservatório e o local a ser protegido, a
S B operação do reservatório deverá visar a redução de
D pico no local e não na saída do reservatório. Isso
poderia ser possível operando-se o reservatório de
modo a não permitir a coincidência temporal das
Vazão de restrição S vazões de pico do rio principal e dos afluentes.
= capacidade do rio

Tempo (dias)

Localização dos reservatórios para atenuação de cheias


A redução mais eficiente dos picos de cheia é aquela obtida por um reservatório situado
imediatamente a montante do local a ser protegido. Entretanto, esse local pode ser
impróprio para a construção de barragens (fundações, extensa inundação de terras
férteis, etc.). Havendo um local barrável mais conveniente em uma seção mais a
montante, o reservatório não teria controle sobre as vazões tributárias da área
incremental e, portanto, teria menor influência sobre a redução de picos. Linsley &
Franzini (1977) recomendam que para haver alguma eficiência na redução dos picos,

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


190

pelo menos 1/3 da área de drenagem deve estar controlada por um ou mais
reservatórios. Apesar de não se poder prescrever regras gerais, geralmente os estudos
econômicos favorecem diversos pequenos reservatórios, a despeito de sua menor
eficiência, em contraposição a um único reservatório de grande porte.

Capacidade dos reservatórios


A possibilidade de redução dos picos de cheia através de um reservatório cresce com o
aumento de sua capacidade porque uma maior parcela do hidrograma afluente pode ser
armazenada. A capacidade máxima necessária é a diferença, em volume, entre as
afluências e as defluências, considerada a vazão de restrição; esse volume aumenta com
a redução do pico, porém não de forma diretamente proporcional. Exercício: suponha
que o hidrograma afluente tenha forma triangular; nesse caso, prove que o volume
necessário para reduzir o pico da cheia é proporcional ao quadrado do valor da redução.
V1=(P1L1)/2 V2=(P2L2)/2
Q
L1 L2 PL
P1 Semelhança de triângulos ⇒ = ⇒ L1 = 1 2
Q1 L1 P1 P2 P2
P2
Q2 L2
P12 L2 V1 P12
V1 = ⇒ =
t 2 P2 V2 P22
A decisão quanto à construção de uma barragem, de determinado volume de reservação,
deve levar em conta outros fatores, além do mencionado acima. A análise econômica é
decisiva nessa questão; o diagrama abaixo exemplifica uma análise custo-benefício para
um reservatório de controle de cheias.
Redução do pico (m3/s)
Capacidade de Custo total e
armazenamento valor dos
(106 m3) prováveis
Y1Y2 : máxima relação benefícios
benefício/custo V* D (R$)
Y2
V : capacidade
correspondente a Y1Y2 C
V
V* : capacidade Y1
máxima possível,
correspondente à
relação benefício/custo B A
igual a 1.

Custo Unitário (R$/m3)


Curva A : custo unitário=f (capacidade)
Curva C : custo total = f (redução do pico)
Curva B : redução do pico=f (capacidade)

Curva D : benefícios prováveis= f (redução do pico)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


191

Operação de reservatórios
Na situação idealizada, descrita no início do item 5.3.1, a operação do reservatório
visaria unicamente a limitação da capacidade de jusante, para o caso de uma cheia
isolada. Se o volume da cheia tivesse excedido a capacidade de armazenamento do
reservatório, a operação não poderia ser tão simples. Além disso, se uma segunda cheia
ocorresse quando o reservatório estivesse cheio, o efeito poderia ser até o de piorar as
conseqüências dessa segunda cheia. A incerteza quanto às próximas vazões afluentes,
durante a ocorrência de uma cheia, assim como a necessidade de reservar uma parte do
volume para atenuar uma eventual segunda cheia, mostram que um reservatório não é
capaz de proporcionar uma eficiência completa. Uma medida indispensável ao
planejamento da operação de um reservatório é um sistema de previsão de vazões,
incluindo a instalação, na bacia de controle, de uma rede telemétrica de monitoramento
pluvio-fluviométrico, combinada a um modelo de previsão.

Tipos de Reservatórios
Um reservatório de acumulação dispõe de comportas e válvulas, as quais são operadas
conforme uma regra definida e de forma a permitir uma rápida depleção do nível d'água,
antes e/ou depois de uma cheia. Por outro lado, um reservatório de retardamento
dispõe de dispositivos permanentes de descarga, sem comportas, os quais regulam
automaticamente a vazão defluente, de acordo com o volume armazenado. A descarga
se dá por um grande extravasor ou por diversos condutos de descarga desprovidos de
comportas.

Esquema do reservatório de retardamento de Pinay, França.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


192

A defluência máxima de um reservatório de retardamento deve ser igual à vazão de


restrição a jusante. A capacidade de armazenamento do reservatório deve ser o volume
da cheia de projeto menos o volume liberado durante o amortecimento da enchente.
Esses reservatórios são recomendados para bacias relativamente pequenas, de modo a
evitar a sincronização das vazões de pico do rio principal com as dos afluentes, assim
como também para rios torrenciais, nos quais os hidrogramas de cheia têm um tempo de
subida tão curto que seria difícil operar válvulas e comportas a tempo.

5.3.2 Medidas intensivas que aceleram o escoamento

Um dos métodos mais antigos para o combate às inundações é o erguimento de uma


barreira longitudinal ao rio, capaz de evitar o transbordamento das águas, até a descarga
de projeto. Essas barreiras podem ser aterros (diques) ou construídas em concreto ou
alvenaria (muros de contenção).

Diques
Os diques marginais são barragens de terra, geralmente construídas com material
escavado das valas de empréstimo próximas ao rio. O material escavado é depositado
em camadas e compactado, de forma que o material menos permeável fique do lado em
contato com a água. Em geral, como o material apropriado para a construção de um
núcleo impermeável não está disponível na maioria dos casos, muitos diques são aterros
homogêneos. A seção transversal de um dique deve ajustar-se ao local e aos materiais
disponíveis. Os taludes devem ser pouco íngremes não só pela qualidade geralmente
baixa dos materiais disponíveis, com também por razões estéticas.
Devem ser protegidos contra a erosão através de grama e/ou enrocamento. Deve haver
uma vala de drenagem no sopé de jusante para recolher a água infiltrada através do
dique. Em geral, os diques possuem bases muito grandes, fato que restringe o seu uso
em áreas urbanas, devido ao custo de desapropriação e à falta de espaço. Seção típica :
3 a 7,5 m
Borda livre 0,6 a 1,5 m 4:1 a 7:1
Cheia de projeto
Berma de 6 a 9 m
3:1 a 5:1

Terreno natural drenagem


Vala de Empréstimo

Remoção prévia das camadas superiores do solo

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


193

Muros de Contenção
Os muros de contenção exigem menos espaço do que os diques. Em geral, são
construídos em concreto e projetados para suportar os empuxos hidrostáticos e pressões
ascensionais, considerado o nível d'água correspondente à cheia de projeto. Se o muro
for escorado por aterro, ele deverá funcionar como muro de arrimo quando o NA
abaixar. Seções transversais típicas:

Muro Simples em Balanço Muro "barragem de gravidade" Estrutura Celular com


Com Cortina de Estaca Enchimento de Terra

Laje Inclinada com Laje Vertical com Contraforte Balanço em T


Contraforte

Localização dos Diques e Muros de Contenção


Um sistema de diques (ou muros de contenção) é constituído pelos diques de uma dada
altura e pelo canal, entre os diques, capaz de escoar a vazão de projeto, permitindo uma
borda livre de proteção contra a ação das ondas. Dependendo da topografia local e das
características da área a ser protegida, vários arranjos do sistema de diques são
possíveis. Exemplos:

Dique anular com Dique marginal prosseguindo Dique marginal ao longo


desvio de ribeirão até cotas mais elevadas de trecho fluvial com meandros

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


194

Drenagem no Interior das Áreas Protegidas por um Sistema de Diques


Tem sido usadas as seguintes soluções para a drenagem da área protegida :
• As águas são levadas a um ponto mais baixo e bombeadas por sobre o dique (a).
• As águas são interceptadas por um canal ao longo do dique e dirigidas para algum
ponto a jusante, a partir do qual escoam por gravidade (b,c,d)
• Os afluentes, dentro da área, escoam por conduto forçado, cuja extremidade de
montante localize-se em uma cota que permita o escoamento por gravidade até o rio
principal (e).
• As águas se acumulam em uma bacia até que sua drenagem possa ser realizada por
gravidade (a).
A melhor solução depende da topografia local e das características do trecho fluvial.

Vala de drenagem
desvio
Bacia de acumulação

Esquema a Esquema b Esquema c

B
A
A
Vala de drenagem

Esquema d Esquema e

Melhoramentos da Calha Fluvial


Pode-se conseguir um aumento da capacidade de descarga da calha fluvial, e
conseqüente redução dos níveis d'água, através da remoção de mato, obstáculos e
bancos de areia, ou mesmo eliminando-se meandros através da retificação de alguns
trechos. As conseqüências seriam a diminuição da rugosidade hidráulica, o aumento do
raio hidráulico, devido à maior profundidade, e o aumento da declividade pelo
encurtamento do percurso das águas.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


195

5.3.3 Medidas intensivas que desviam o escoamento

Essas medidas são os canais de desvio e os leitos de alívio. Os leitos de alívio desviam o
escoamento, ou parte dele, para terrenos que possam ser inundados, aliviando assim o
rio principal. Uma das possibilidades de desvio é a construção de diques "fusíveis", ou
diques facilmente erodíveis, a partir de uma certa cota. A utilização dessas medidas é
limitada pela topografia e pela existência de terrenos de baixo valor ou desabitados.

5.4 Medidas Não Estruturais

As medidas estruturais, anteriormente descritas, não são e não poderiam ser projetadas
para proporcionar total proteção contra as enchentes. Isso exigiria a proteção contra a
"maior enchente possível", o que seria fisica e economicamente inviável. Além disso, as
medidas estruturais podem criar uma falsa sensação de segurança, acelerando a
ocupação e o desenvolvimento indevidos da planície de inundação. As medidas não
estruturais, em conjunto com as estruturais ou em alguns casos sem essas, podem
diminuir significativamente os prejuízos devidos às cheias, a um custo menor. Como
exemplo, cita-se o caso da cidade de Denver, no estado americano do Colorado, onde a
proteção por medidas estruturais de 1/4 da área inundável foi orçada em US$110
milhões; para proteger os 3/4 restantes por medidas não estruturais, o orçamento era
equivalente ao anterior.
As medidas não estruturais podem ser agrupadas em:
• Regulamentação do uso da terra, a partir das estimativas dos riscos de inundação
para as diferentes cotas, dentro da área a ser protegida.
• Proteção contra enchentes para prédios e benfeitorias localizadas nas várzeas de
inundação.
• Seguro contra enchentes, permitindo a indivíduos e empresas a devida cobertura
econômica por eventuais perdas ou prejuízos.
• Medidas de emergência, trabalho em geral planejado pela Defesa Civil, visando
reduzir as perdas durante as cheias; os sistemas de previsão e alerta podem ser aqui
incluídos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


196

5.4.1 Zoneamento das áreas sujeitas a inundações

O zoneamento é a definição de um conjunto de regras para a ocupação das áreas de


maior risco de inundação, objetivando a minimização futura de perdas materiais e
humanas, face às grandes cheias, assim como o desenvolvimento racional das áreas
ribeirinhas. No caso de áreas urbanas, a regulamentação do uso das várzeas de
inundação deve ser integrada à legislação municipal, através dos chamados planos
diretores de drenagem urbana. A regulamentação deve se apoiar em mapas com a
demarcação de sub-áreas com diferentes riscos de cheia e com os devidos critérios de
ocupação, esses relativos ao uso e aspectos construtivos.

Condições Técnicas do Zoneamento


O risco de ocorrência de inundação varia com a respectiva cota da várzea. O leito
menor do trecho fluvial corresponde à seção de escoamento em regime de estiagem ou
de níveis médios. O leito maior pode ter diferentes lances de acordo com a magnitude
da cheia, com a seção transversal considerada e com a topografia da várzea inundável.

4
4

3 1
2 2 3
1

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


197

3 ZR1 2 Zona de Passagem da Cheia 2 ZR2 3

ZR1 e ZR2 : zonas com restrições

1 Leito Menor 1

Definida a magnitude da cheia contra a qual se pretende proteger e para a qual se deseja
regulamentar a ocupação das áreas sujeitas a inundação, a próxima etapa é particionar a
planície ou leito maior nas seguintes zonas:
• Zona de Passagem da Cheia: parte da seção que trabalha hidraulicamente e
permite o escoamento da enchente. Qualquer construção nessa área reduzirá a área
de escoamento e provocará a elevação dos níveis de montante. Em termos de
planejamento urbano, deve-se manter essa área desobstruída.
• Zona com Restrições: área restante da superfície inundável, a qual deve sofrer
regulamentação quanto à sua ocupação. Embora essa parte da seção transversal
fique inundada durante a passagem da cheia de projeto, as pequenas profundidades e
baixas velocidades não contribuem significativamente para a drenagem da enchente.
• Zona de Baixo Risco: parte da seção transversal acima do nível da cheia de projeto,
a qual está associada a pequenas probabilidades de excedência, sendo ocupada em
anos muito excepcionais por pequenas lâminas d'água, com baixas velocidades; para
essa área, não haveria regulamentação quanto à sua ocupação.

A zona de passagem da cheia é delimitada através do cálculo de linha d'água para a


vazão de pico, essa, em geral, de tempo de retorno 100 anos. Para essa vazão, a cota a
partir da qual as obstruções provocam acréscimos de níveis ∆h, maiores ou iguais a um
certo valor de referência h*, é aquela que define a zona de passagem da cheia. O valor
h* é arbitrado de forma a representar convenientemente a relação desejável entre
benefícios e perdas, ao longo da planície de inundação a ser protegida.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


198

Regulamentação das Zonas de Inundação


Zona de Passagem da Cheia: não deve ser permitida nenhuma construção nova. As
autoridades regionais ou municipais deverão providenciar a gradativa relocação das
construções existentes.
Zona com Restrições: essa zona pode ser subdividida em sub-áreas, de forma que,
essencialmente, os seus usos principais sejam:
• Parques e atividades recreativas ou esportivas, cuja manutenção após as cheias seja
simples e de baixo custo.
• Habitação com mais de um piso, com o superior situado, no mínimo, no nível da
cheia de projeto e estruturalmente protegido contra enchentes.
• Industrial e comercial com áreas de estacionamento, carregamento e armazenamento
de equipamentos e maquinários facilmente removíveis ou não sujeitos a danos de
cheias; não deve-se permitir o armazenamento de produtos perecíveis ou tóxicos.
• Serviços básicos: linhas de transmissão, estradas e pontes.
Zona de Baixo Risco : apesar de não haver restrições quanto ao uso do solo, a Defesa
Civil deve cuidar de orientar e alertar a população para a eventual possibilidade de
cheias e quanto aos meios de se proteger das perdas delas decorrentes.

Regulamentação das Construções


A proteção das habitações é uma medida que depende das condições anteriores à
implantação do zoneamento, bem como da capacidade econômica de cada proprietário.
Com a implantação do plano de controle de cheias, as autoridades poderão permitir
algumas construções em áreas sujeitas a inundações, desde que os seguintes requisitos
sejam atendidos:
• Construção de pelo menos um piso com nível superior à cota da cheia de projeto.
• Uso de materiais resistentes à submersão.
• Proibição de armazenamento ou manipulação de materiais inflamáveis.
• Proteção de aterros e encostas contra a erosão (cobertura vegetal ou gabiões).
• As construções devem ser projetadas para resistir a empuxos hidrostáticos, com
porões estanques, vedação de aberturas (janelas e portas), válvulas em tubulações de
esgoto sanitário e proteção de equipamentos fixos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


199

Exercício Proposto - O desenho esquemático abaixo mostra a bacia de um determinado


rio em cujas margens localiza-se o perímetro urbano de uma cidade, conforme indicado.
As descargas desse rio são monitoradas nas estações fluviográficas situadas nas seções
A e B; as alturas horárias de precipitação são registradas no posto pluviográfico P. As
áreas de drenagem das estações fluviográficas localizadas em A e B são
respectivamente 156 e 190 km2 . Pretende-se construir uma barragem na seção A, cujo
volume de reservação deverá ser usado para as finalidades de irrigação e produção de
energia hidrelétrica. A barragem deverá ser do tipo gravidade com cerca de 15 m de
altura e equipada com vertedor de superfície não controlado com soleira na cota 632 m
(NA máximo normal de operação). Use os dados fornecidos nas tabelas que se seguem
para :
♦ Dimensionar o vertedor pelo critério da enchente máxima provável, tal que a vazão
máxima defluente não provoque uma elevação sobre o NA máximo normal de
operação superior a 2,5 m; e
♦ Calcular para a seção B a cota altimétrica máxima resultante da propagação do
hidrograma das defluências de projeto pelo trecho de rio entre A e B, verificar a
possibilidade de inundação parcial do perímetro urbano e, em caso positivo,
propor medidas para o controle de enchentes.

NA max

632

P VU

NA min

A
VM

B
Perímetro urbano

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


200

1) Dados flúvio-pluviométricos observados

Em Fevereiro de 1992, ocorreu um evento chuvoso de intensidade uniforme sobre a bacia a montante da
seção A; a jusante de A, a precipitação foi insignificante. A tabela 1 apresenta as alturas horárias de
precipitação, obtidas pela redução dos pluviogramas do posto P, durante esse evento chuvoso. A tabela 2
mostra as descargas horárias correspondentes, observadas nas estações A e B.

Tabela 1 - Alturas horárias de precipitação registradas no posto P em 14/2/92.


Hora 16-17 17-18 18-19 19-20 20-21 21-22
Chuva (mm) 17,5 12 3 2 1 1

Tabela 2 - Descargas horárias observadas nas seções A e B em 14 e 15/2/92 (m3/s)


Hora Posto A Posto B Hora Posto A Posto B
17 5 5 23 25 69
18 10 6 24 15 43
19 25 7 1 10 24
20 50 14 2 7 18
21 75 31 3 6 16
22 65 58 4 5 14

Recomenda-se considerar o escoamento-base no posto A como constante e igual a 5 m3/s, definir o


hidrograma unitário e calcular o índice φ em mm/h.

2) Precipitacão Máxima Provável

O tempo de concentração da bacia a montante de A foi estimado em 7 horas. Estudos meteorológicos


definiram a PMP para a duração crítica de 7 horas, fornecendo a altura total de chuva de 125 mm, a qual é
suposta uniforme sobre a bacia a montante de A. A desagregação desse total em alturas horárias foi feita
com base em eventos observados no posto P; o hietograma horário da PMP apresenta-se na tabela 3.

Tabela 3 - PMP sobre a bacia a montante de A (mm).


Hora 1 2 3 4 5 6 7
Chuva (mm) 18 24 27 20 12 12 12

Recomenda-se separar a chuva efetiva usando o índice φ anteriormente calculado, fazer a convolução do
HU para obter a EMP afluente ao reservatório. O escoamento-base do hidrograma total pode ser
considerado constante e igual a 10 m3/s.

3) Dados sobre a barragem e características do reservatório

Cota da crista : 635,50m


Cota do NA máximo normal de operação : 632 m
Altura máxima calculada para a arrebentação de ondas devidas ao vento : 0,50 m
Borda livre recomendada acima do NA máximo maximorum : 0,50 m
Coeficiente de descarga do vertedor : 2,0

Tabela 4 - Curva Cota-Volume do Reservatório


Cota Altimétrica (m) Volume (106 m3) Cota Altimétrica (m) Volume (106 m3)
620 0 630 5,00
621 0,1 631 6,00
622 0,25 632 7,25
623 0,45 632,5 7,875
624 0,80 633 8,50
625 1,25 633,5 9,125
626 1,80 634 9,75
627 2,45 634,5 10,50
628 3,20 635 11,25
629 4,05 636 13,00

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


201

Recomenda-se : a partir de um valor preliminar para a largura do vertedor, propagar a EMP afluente
pelo reservatório, usando o método de Puls (ver parte 1 - Engenharia Hidrológica). Em seguida, calcular
o hidrograma defluente e verificar se a altura máxima sobre a soleira encontra-se abaixo de 2,50 m.
Modificar a largura do vertedor até que se atinja a especificação.

4) Curva chave no posto B

Curva-Chave em B

7
Cota sobre o zero da régua (m)

0
0 100 200 300 400 500 600
Vazão (metros cúbicos por segundo)

As seções transversais do rio ao longo do trecho próximo ao perímetro urbano tem forma muito
semelhante à seção de controle do posto B. Os bairros da cidade que se estendem ao longo desse trecho
sofrem inundações se a cota linimétrica em B atingir valores iguais ou superiores a 3,20 m. A cota
altimétrica do zero das réguas é 616,230 m.

Recomenda-se usar os hidrogramas observados em A e B (tabela 2) para identificar os parâmetros do


método de propagação de Muskingum (ver parte 1 - Engenharia Hidrológica), utilizar esses parâmetros
para propagar o hidrograma defluente de projeto, com descarga inicial de 10 m3/s, verificar a descarga
máxima em B, obter as cotas linimétrica e altimétrica máximas na seção B.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


202

6. IRRIGAÇÃO*

6.1 Introdução

A irrigação é a aplicação de água ao solo onde e quando as alturas pluviométricas não


são suficientes para suprir as necessidades hídricas das plantas, proporcionando teor de
umidade suficiente para o crescimento das mesmas.

• Vantagens da irrigação
- maior produção por unidade de área;
- obtenção de mais de uma colheita por ano;
- obtenção de colheitas fora da época normal;
- quase que total independência das precipitações pluviométricas;

6.2 Quantidade de água necessária à irrigação (dotação de rega)

• Fatores que interferem na quantidade de água a ser aplicada:


- clima;
- tipo de cultura e seu desenvolvimento;
- natureza do solo;
- sistema de irrigação e preparo do terreno;
- habilidade do agricultor no manejo da água;
- perdas relativas à captação e à condução da água até o terreno a ser irrigado.

• Formas de expressão da quantidade de água a ser aplicada:


- quantidade de água necessária por ano ou período de irrigação (m³/ha ou mm de
altura de chuva);
- quantidade de água necessária em cada irrigação, dado o número e o turno de rega
– espaço entre uma e outra aplicação (m³/ha ou mm de altura de chuva);
- vazão contínua necessária (l/s.ha);
Obs.: 1 mm de altura de chuva = 10 m³/ha

• Determinação da quantidade de água necessária

Para calcular as necessidades de água para a irrigação (sem considerar as perdas


inerentes) num determinado período, há que se fazer o balanço hídrico na camada ativa
do solo e conhecer as variáveis que o integram. O balanço hídrico no período vegetativo
fornece o volume em m³, denotado por M, necessário para garantir o abastecimento de 1
ha de terreno cultivado através da seguinte relação:

M = ETP − P′ − ∆W ± G
onde: ETP : evapotranspiração potencial
P’ : fração da precipitação que se infiltra e que é utilizada pelas plantas durante o
período vegetativo;
∆W : variação do volume de água presente na camada ativa do solo entre o início e o
fim do período vegetativo; e
G : troca de umidade entre a zona saturada e a zona aerada.

*
Adaptado de seminário preparado e apresentado pelos alunos Leonardo Mitre Alvim de Castro e
Marcelo Garcia Miranda, 1998.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


203

• Evapotranspiração

O consumo de água do conjunto solo-planta corresponde à quantidade de água que


passa à atmosfera sob forma de vapor, pela evaporação do solo e transpiração das
plantas, mais a quantidade d’água que é incorporada à massa vegetal. Essa quantidade
retida pela planta (água de constituição) é desprezível em relação às outras duas
parcelas, e por isto se considera que a necessidade de água da planta é igual à água que
é transferida para atmosfera pela evaporação do solo e transpiração. O conjunto desses
dois fenômenos é denominado evapotranspiração da cultura.
A evapotranspiração potencial é quantidade de água consumida, em um determinado
intervalo de tempo, pela cultura em plena atividade vegetativa, livre de enfermidades,
em um solo cujo conteúdo de água do solo se encontra próximo à capacidade de campo.
A estimativa da evapotranspiração potencial é o ponto mais importante na realização do
balanço hídrico, pois depende de muitos fatores agro-meteorológicos de quantificação
relativamente difícil. O que mais se recomenda é que os dados das taxas de
evapotranspiração potencial ETP sejam obtidos a partir de informações coletadas nos
projetos de irrigação implantados na região, através de parcelas experimentais
cultivadas na zona, ou por meio de evapotranspirômetros instalados na área a irrigar. No
entanto, essas possibilidades ocorrem com pouca freqüência e quase sempre os valores
de ETP tem que ser estimados com base em métodos climatológicos empíricos ou a
partir de dados de evaporação de uma superfície de água livre.

• Métodos climatólogicos:
Os métodos climatológicos são fórmulas empíricas que relacionam a evapotranspiração
potencial (ETP) aos dados climáticos da região. As fórmulas existentes se diferenciam
entre si pelo número de variáveis climáticas consideradas.

 A fórmula de Blaney-Criddle é muito utilizada e é dada por:

ETP = k ⋅ p ⋅ (0,46 ⋅ T + 8,13)

onde: ETP : evapotranspiração potencial mensal da cultura (mm)


T : temperatura média mensal do ar (oC), obtido a partir dos dados registrados de
temperatura na região
p : porcentagem mensal de horas anuais de luz solar; valor tabelado em função do clima
da região
k : coeficiente da cultura; valor tabelado em função do tipo de cultura e da latitude da
zona irrigada

 Uma outra fórmula empírica de grande aplicação é o método de Thornthwaite:


1, 5
o 
Índice de calor mensal ( C): mi = 
Ti  o
5  onde:Ti: temperatura média mensal ( C)
 
12
Índice de calor anual (oC): A = ∑ mi
i =1
a
10 ⋅ Ti
ETP . Equador =   (mm ); a = 0,49 + (17900 ⋅ A − 77,1 ⋅ A 2 + 0,675 ⋅ A 3 ) ⋅ 10 −6
 A 

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


204

ETP .local = ETP . Equador ⋅ k (mm )


onde: k é um fator de correção, tabelado em função da latitude e do número de horas de
insolação/dia

 Outro modelo que vem sendo muito utilizado para determinar a evapotranspiração
potencial é o de Penman (ver parte I : Engenharia Hidrológica).

• Evaporação de uma superfície de água livre:


A medida da evaporação de uma superfície de água livre se realiza normalmente através
do tanque evaporimétrico classe A instalado na região.
A partir da evaporação medida no tanque e do coeficiente do tanque (kP), obtém-se a
evapotranspiração da cultura de referência (ETO). A evapotranspiração potencial da
cultura é obtida a partir da relação:
ETP = ETO ⋅ k C
onde: kC : coeficiente de cultivo, tabelado para cada tipo de cultura segundo a sua fase
de crescimento

• Balanço hídrico:
A seguir é apresentado um exemplo de balanço hídrico mensal para uma irrigação de
tomate, cujo ciclo vegetativo começa em abril e termina em agosto. A
evapotranspiração potencial mensal (ETP), determinada através do tanque classe A, é
conhecida, assim como a precipitação média mensal, e a sua fração utilizada pela planta
(P’). Considera-se que não existe dotação por capilaridade à zona radicular (G) e as
reservas de água (∆W) no princípio de cada mês são desprezíveis.

Mês ABR MAI JUN JUL AGO Total


1 Etanque (mm) 178 213 226 251 249 1117
2 kP 0,7 0,7 0,7 0,7 0,7 -
3 ETO (mm) = 1x2 125 149 158 176 174 782
4 kC 0,45 0,75 0,75 1,15 0,80 -
5 ETP (mm) = 3x4 56 112 119 202 139 628
6 P' (mm) 32 65 36 4 14 151
7 M (mm) = 5-6 24 47 83 198 125 477
8 M (m³/ha) 241 468 827 1981 1254 4770
9 M (mm/dia) 0,8 1,5 2,8 6,4 4,0 -

6.3 Volume de água a ser aplicado

O volume de água a ser aplicado ao solo não é exatamente a quantidade de água


necessária à planta, mas sim, este volume acrescido das perdas por evaporação,
percolação e escoamento superficial, variáveis de acordo com a eficiência de rega. O
volume aplicado é igual ao volume necessário dividido pela eficiência de rega, somado,
quando necessário, da água de lixiviação.

• Eficiência de rega:
Eficiência de rega é a relação entre o volume de água utilizado pela planta (somado às
perdas no solo) e o volume extraído da fonte de suprimento.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


205

Fatores que interferem na eficiência de rega:

natureza do solo: nos solos permeáveis podem ocorrer grandes perdas por percolação, o
que significa uma menor eficiência de rega;
espécie vegetal: considerar a profundidade e a distribuição do sistema radicular. Nas
plantas semeadas com menor espaçamento, a eficiência é maior que naquelas plantadas
em leiras ou fileiras. Plantas mais jovens apresentam menor eficiência pois o
desenvolvimento das raízes é menor, assim como a quantidade de água absorvida.
sistema de irrigação: os diversos tipos de irrigação apresentam diferentes eficiências de
rega;
habilidade do agricultor: o agricultor pode controlar fatores importantes que influenciam
na eficiência de rega: preparo do terreno, sistema de irrigação, a vazão, o volume e o
tempo de aplicação da água em cada rega.

• Água de lixiviação
Em zonas áridas e semi-áridas pode-se prever uma quantidade extra de água ao terreno
para drenar o excesso de sais, transportando-os para as camadas inferiores do solo não
alcançadas pelas raízes. Esse processo de lavagem dos sais do solo é conhecido como
lixiviação.

6.4 Água Disponível

É necessário que se conheça a quantidade de água disponível que o solo pode reter, até a
profundidade do sistema radicular. O processo de retenção de água pelo solo pode ser
mais facilmente entendido fazendo uma analogia com o reservatório abaixo:
Umidade de saturação

ÁGUA
GRAVITACIONAL

Drenagem
Capacidade de campo

ÁGUA
DISPONÍVEL

Ponto de murcha Absorção


pelas plantas
ÁGUA INATIVA

Após um evento chuvoso ou uma aplicação de rega, o reservatório enche até quase a
umidade de saturação. A água gravitacional, não sendo retida pelo solo, percola pela
ação da gravidade. A passagem da água gravitacional pelo solo depende do estado e tipo
de drenagem do solo, durando de 1 a 4 dias. Atingindo a capacidade de campo, a água
fica disponível para ser aproveitada pela planta até o ponto de murcha (ou murchamento
permanente). A água abaixo deste ponto não pode ser extraída pelas raízes, por isso é
denominada água inativa.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


206

A capacidade de água disponível de um solo é essa diferença entre a capacidade de


campo e o ponto de murcha (em % de peso), não sendo influenciada pela espécie
cultural ou pelo clima.

• Características do solo:
Umidade de saturação: é um ponto que raramente é atingido; ocorre quando os vazios
do solo estão totalmente preenchidos por água.
Capacidade de campo: quantidade máxima de água capilar que pode ser retida, contra a
força de gravidade, por um solo bem drenado. Uma vez atingido este ponto, o solo, na
ausência de vegetação e a partir de 30 cm de profundidade (onde há ausência de
evaporação), permanece com esta umidade praticamente constante por meses.
Ponto de murcha: representa a percentagem de umidade que o solo ainda conserva
quando as plantas mostram, pela primeira vez, sinais de murchamento permanente, não
conseguindo mais extrair água.

• Profundidade do sistema radicular:


Para cada tipo de cultura, a densidade do sistema radicular, em geral, aumenta conforme
avança a fase de crescimento vegetativo da planta, até alcançar uma profundidade
máxima no solo. No entanto, as raízes se distribuem de forma não uniforme no solo e se
concentram na sua grande maioria na metade superior. Para efeito de cálculo,
determina-se a profundidade efetiva do sistema radicular como sendo a profundidade do
sistema radicular, onde se concentra cerca de 80% das raízes da cultura.

• Déficit hídrico tolerável:


O que foi visto anteriormente é que em um projeto de irrigação prevê-se a reposição de
água toda vez que o seu nível no solo atingir o ponto de murcha. Entretanto, para o bom
desenvolvimento das plantas, é recomendável não deixar que o conteúdo de água no
solo irrigado alcance um certo limite, que é superior ao ponto de murcha, no qual as
plantas começam a ressentir o déficit hídrico.
A relação entre o conteúdo de umidade do solo nesse limite crítico e sua capacidade de
água disponível, se denomina déficit hídrico tolerável e é expresso em percentagem.

• Volume de água disponível:


O volume de água disponível em m³/ha de um determinado solo para uma determinada
espécie cultural é dado pela seguinte relação:

V =
(CC − PMP ) × d × p × Y × 10 4
100

onde: V : volume (m³/ha)


CC : capacidade de campo (% de peso de solo seco)
PMP : ponto de murcha (% de peso de solo seco)
d : densidade aparente do solo (g/cm³); é igual ao peso do volume de solo natural seco
em estufa, dividido pelo seu volume
p : profundidade efetiva do sistema radicular (m)
Y : déficit hídrico tolerável (%)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


207

6.5 Turno de rega

Turno de rega ou freqüência de irrigação (Tr) é a duração em dias entre sucessivas


irrigações. Obtém-se mediante a relação entre o volume de água disponível (V) e a
quantidade de água necessária (M):

V
Tr =
M

6.6 Sistemas de irrigação

6.6.1 Irrigação por aspersão

Consiste em fornecer água ao solo sob a forma de chuva artificial, por meio de
equipamento especial (conjunto moto-bomba, tubulações portáteis, aspersores e peças
acessórias).
Atualmente a irrigação por aspersão se constitui num dos métodos mais utilizados no
mundo. Destaca-se entre os demais por sua versatilidade, facilidade de manejo e por sua
possibilidade de aplicação a quase todo tipo de cultura, solo e topografia do terreno.
Para o funcionamento da irrigação por aspersão é necessária a existência de uma ampla
infra-estrutura de distribuição de água, que começa na fonte de abastecimento e termina
nos aspersores.

Sistemas convencionais

Constituídos por aspersores de baixa e média pressão, com espaçamento compreendido


entre 6 e 36 metros, instalados sobre tubos porta-aspersores acoplados a condutos sobre
pressão. São os mais empregados, já que em virtude de suas versatilidades são
geralmente os mais adequados para os múltiplos tipos de cultura, solos, topografias,
formas e tamanhos das áreas a irrigar, além de exigirem menores custos de implantação
e maiores flexibilidades de manejo.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


208

• Aspersores:
São dispositivos mecânicos que recebem a água sob pressão da rede e a distribui em
forma de chuva sobre a superfície do terreno. Sua função consiste em pulverizar o jato,
repartindo-o (ao girar) sobre uma superfície aproximadamente circular. O raio do
círculo molhado representa o alcance do aspersor.

• Distribuição dos aspersores:


Para se conseguir uma uniformidade adequada da irrigação, faz-se necessário superpor
as áreas molhadas pelos aspersores. Estes são, normalmente dispostos de três formas
distintas sobre as linhas laterais:
- Disposição quadrada: os aspersores ocupam os vértices de um quadrado;
- Disposição triangular: os aspersores ocupam os vértices de uma rede de
triângulos equiláteros;
- Disposição retangular: a distância entre aspersores em uma mesma linha lateral
é diferente da distância entre linhas, que é maior.
Do ponto de vista da superfície atendida e da uniformidade de irrigação, as disposições
quadradas e triangulares são mais favoráveis que a disposição retangular, em virtude de
suas simetrias geométricas. Entretanto, a disposição retangular é a mais empregada na
prática, devido à sua característica de minorar a interferência do vento sobre a
uniformidade de irrigação.

• Eficiência de rega:
O sistema de aspersão convencional apresenta perdas de água principalmente por
percolação e evaporação, resultando numa eficiência de rega variando de 60%, em
zonas semi-áridas, a 90%, quando a irrigação é feita a noite.

Sistemas não convencionais

• Canhão hidráulico:

Também conhecido como aspersor gigante, é um equipamento de irrigação que


funciona com pressões que variam desde 40 mca até mais de 100 mca, e cujo raio de
alcance varia de 30 a 100 metros. No Brasil, a sua maior utilização se dá no cultivo da
cana de açúcar. Na maioria dos casos o canhão hidráulico é utilizado de forma portátil,
instalado sobre linhas laterais, de maneira similar ao funcionamento de um sistema
convencional, sendo deslocado de uma posição a outra após a aplicação de cada
irrigação. Devido a elevada vazão necessária para abastecê-los, cada linha lateral é
equipada com apenas um canhão.
A irrigação através de canhão hidráulico apresenta um custo de implantação
relativamente baixo e necessita de pouca mão-de-obra. O uso desse sistema é limitado à
culturas cujas folhas são resistentes ao impacto das grandes gotas lançadas pelo aspersor
(cana de açúcar, milho). Deve ser evitado o seu emprego em solos argilosos devido às
grandes gotas que aumentam a sua compactação, prejudicando a capacidade de
infiltração.

• Pivô central:

O sistema pivô consiste fundamentalmente de uma tubulação metálica – onde estão


instalados os aspersores -, que giram continuamente ao redor de uma estrutura fixa. Os

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


209

aspersores, que são abastecidos pela tubulação metálica (ala do pivô), dão origem a uma
irrigação uniformemente distribuída sobre uma grande superfície circular.
A tubulação que recebe água sob pressão do dispositivo central, denominado ponto
pivô, se apoia em várias torres metálicas triangulares, montadas sobre grandes rodas
pneumáticas. As torres se movem continuamente, acionadas individualmente por
dispositivos elétricos ou hidráulicos, descrevendo circunferências concêntricas ao redor
do ponto pivô.
Dimensões: - comprimento da ala do pivô: inferior a 500 m;
- altura livre entre a ala do pivô e o terreno: 3,0 a 4,0 m;
- distância entre as torres do pivô: 30 a 50m;
Devido a variação da velocidade tangencial de deslocamento da ala do pivô, é
necessário que os aspersores possuam características hidráulicas diferentes para que
haja uma precipitação uniforme sobre a área circular.

Em virtude de sua utilização contínua, permite a aplicação de pequenas lâminas de


irrigação em curtos intervalos de tempo. Com isso, a umidade do solo estará sempre
próxima da capacidade de campo e as perdas por percolação serão mínimas. Outras
vantagens apresentadas são a economia de mão-de-obra e a economia de energia, pois
pode ser operado durante a noite, quando o custo energético é mínimo.
A irrigação por pivô central não é indicada para solos argilosos devido a suscetibilidade
destes ao encharcamento, dificultando a mobilidade das rodas do equipamento. A
presença de obstáculos (edificações, linhas elétricas, canais) nas grandes áreas irrigadas
pelo pivô impedem a sua livre circulação, limitando a sua utilização.

• Eficiência de rega:
Os sistemas de irrigação por aspersão não convencionais apresentam em geral, quando
analisadas as mesmas condições, eficiências de rega 5% superiores àquelas do sistema
convencional.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


210

6.6.2 Irrigação superficial

Esse sistema consiste em distribuir água na superfície do terreno, de modo a umedecer o


solo convenientemente e uniformemente até a profundidade do sistema radicular da
planta.A irrigação superficial apresenta a grande vantagem de não necessitar de
equipamentos especiais para o seu completo funcionamento. Em contrapartida, exige
sempre um grande movimento de terra no solo a ser irrigado e acarreta perdas
significativas por escoamento superficial e evaporação.

6.6.3 Irrigação por infiltração

Neste tipo de irrigação superficial, a água é distribuída em pequenos sulcos abertos


entre as fileiras das plantas, umedecendo o resto do terreno por infiltração.A irrigação
por infiltração não é recomendada para solos muito permeáveis, terrenos de topografia
muito irregular e solo muito superficial, onde não é prático o movimento de terra.

• Características dos sulcos de rega:

 o espaçamento depende, principalmente da distância entre as fileiras da planta:


- culturas com cerca de um metro de espaçamento (milho, batata): sulcos entre
todas as fileiras;
- plantas com espaçamento muito grande (pomares, cafezais): mais de um sulco
entre fileiras;
- pequeno espaçamento (hortaliças): um sulco para uma ou mais fileiras.
 a declividade está associada à natureza do solo e à quantidade de água a ser
aplicada em cada sulco:
- solo muito pesado e maior quantidade de água: declividade baixa (0,1 a 0,3%);
- menores vazões, com cuidado para evitar a erosão: maior declividade (1 a 1,5%).
 o comprimento deve ser o maior possível, desde que a água possa ser distribuída
mais ou menos uniformemente sem causar erosão e sem haver problemas de

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


211

drenagem. Varia de 50 m, em solos arenosos, até 300 m em solos com baixa


capacidade de infiltração.

• Vazão aplicada:
Inicialmente aplica-se em cada sulco a vazão máxima que não cause erosão, a fim de
que a água atinja o mais depressa possível a parte final do sulco, umedecendo-o
totalmente. Feito isso, a corrente líquida deve ser reduzida (vazão reduzida) o suficiente
para que o sulco se mantenha coberto por uma lâmina d’água em toda sua extensão e
com o mínimo de perda na sua parte final, até que o solo seja suprido de água.

• Variações da irrigação por infiltração:


- irrigação por corrugação
- irrigação por infiltração em terrenos inclinados
- irrigação por infiltração-inundação

• Eficiência de rega:
A irrigação por infiltração apresenta uma eficiência de rega baixa, próxima de 60%.

6.6.4 Irrigação por inundação

Transbordamento de canais em contorno (sem diques)

Consiste em deixar a água, derramada de canais em contorno e sem o uso de diques ou


outras modalidades para conter ou restringir o escoamento, escorrer sobre a superfície
do terreno, em forma de uma lâmina líquida, até alcançar o canal de contorno abaixo.
Em razão da pequena velocidade desta lâmina, o solo terá tempo de reter o volume
líquido necessário à planta.A irrigação por transbordamento sem diques é indicada para
irrigação de pastagens, capineiras e culturas de cobertura em terrenos irregulares e
íngremes. É um processo simples e barato que não requer preparo prévio do
terreno.Apresenta como desvantagens a exigência de mão-de-obra na distribuição de
água, e o fato de que esta não é muito uniforme quando as irregularidades do terreno são
grandes.

Escoamento superficial (diques em declive)

Neste sistema de irrigação por inundação, o terreno é dividido em parcelas estreitas e


compridas através de pequenos diques (10 a 15 cm de altura). A água, aduzida na
cabeceira do tabuleiro, escoa em forma de lâmina no sentido do declive, permitindo que
ela se infiltre no solo à medida que a lâmina avança. Após se aplicar o volume
necessário à cultura, a água é cortada e dirigida para outra parcela. A entrada da água
em cada parcela pode ser feita por meio de aberturas no próprio dique, ou através de
sifões e pequenas comportas de madeira. Apresenta um baixo custo inicial e uma grande
economia de mão-de-obra na distribuição de água. Para se utilizar este sistema é
necessário que o terreno seja relativamente plano, e o solo não seja excessivamente
permeável ou apresente baixa capacidade de infiltração. Além dessas limitações, exige
grandes vazões de alimentação e requer melhor preparo do terreno que os outros
sistemas de irrigação superficial.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


212

Submersão (diques em declive)

Consiste na inundação de um terreno previamente dividido em parcelas, por meio de


diques em curva de nível. Os tabuleiros ficam em nível no sentido do comprimento (ao
longo dos diques em nível) e com o desnível dado no sentido da largura. A água é retida
por uma ou mais passagens no topo dos diques. Para fechamento da área do tabuleiro,
são colocados diques perpendiculares àqueles localizados ao longo da curva de nível. A
dimensão recomendada para os tabuleiros é de 20 x 100 m. O principal uso desse
sistema de irrigação no Brasil e em outros países é no cultivo do arroz.A irrigação por
submersão exige um terreno suficientemente plano (menos de 1% de declividade), além
de um sistema de drenagem do terreno.

• Eficiência de rega:
O sistema de irrigação por inundação apresenta, em média, a maior perda de água
quando de seu funcionamento, o que lhe garante uma eficiência de rega em torno de
40%.

6.6.5 Irrigação subterrânea

Sistema de irrigação que consiste em aplicar água ao subsolo, pela formação de um


lençol d’água artificial ou pelo controle de um aqüífero natural, mantendo-o em um
nível piezométrico conveniente. A água é introduzida no solo através de canais (ou
drenos) abertos, sendo a profundidade do nível d’água controlada por meio de
comportas ou tábuas vertedouras.
Utilizado em condições muito especiais:
- terreno plano e de superfície bem regular;
- existência de uma camada permeável (areia, solo orgânico) imediatamente
abaixo da superfície do solo, a fim de permitir um rápido movimento lateral e
vertical da água;
- lençol d’água natural ou uma camada impermeável deve estar abaixo da camada
permeável, para evitar perdas excessivas de água por percolação.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


213

6.6.6 Irrigação por gotejamento

O gotejamento é um método de irrigação no qual a água é aplicada em gotas,


diretamente sobre a zona radicular da planta, sem necessidade de molhar toda superfície
do terreno. O suprimento de pequenas vazões às zonas radiculares é alcançado mediante
dispositivos denominados gotejadores, localizados junto aos pés das plantas.

Os gotejadores são abastecidos através de um sistema fixo de irrigação pressurizado,


composto por uma rede de distribuição, uma estação de bombeamento (quando
necessário) e um dispositivo de filtragem e controle da água aduzida. Os gotejadores são
instalados unidos a linhas de tubulações flexíveis (linhas laterais), estendidas sobre o
terreno, paralelamente às fileiras das plantas.As raízes das plantas se concentram e se
desenvolvem nos volumes de solo molhados ao redor do ou dos gotejadores,
denominados bulbos úmidos.

• Vantagens:
- não há a necessidade de se molhar toda a superfície do terreno;
- proporciona um maior desenvolvimento da cultura irrigada devido a dois
fatores: a umidade do solo se mantém pouco variável, próximo à capacidade de
campo, exigindo menos esforço para as plantas retirarem a água; maior aeração do
solo devido às pequenas vazões dos gotejadores;
- perdas de água por evaporação e percolação muito baixas – economia de água
em relação à aspersão de 20 a 30%;
- economia de mão-de-obra para adubação, pois os fertilizantes são misturados
com a água na cabeceira do sistema;

• Desvantagens:
- alto custo de implantação; por essa razão, atualmente é mais indicado para
irrigar culturas nobres ou economicamente rentáveis (fruteiras, hortaliças, flores);

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


214

- exige um processo de filtragem na adução de água para evitar entupimento dos


gotejadores;

• Eficiência de rega:
A irrigação por gotejamento é o sistema que apresenta uma das maiores eficiências de
rega, em torno de 90%, onde as maiores perdas de água ocorrem por percolação.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


215

7. NAVEGAÇÃO FLUVIAL*

7.1 INTRODUÇÃO

Relacionados ao meio onde se deseja navegar existem dois tipos de navegação: a


marítima e a interior. A navegação interior se desenvolve dentro dos continentes e inclui
a navegação lacustre, realizada em lagos, e a fluvial, realizada em rios e canais
interiores. É comum chamar a navegação interior apenas de fluvial. Esse trabalho
refere-se à navegação fluvial, aqui incluindo uma comparação entre os 3 principais
modais de transporte; rodoviário, ferroviário e fluvial.

7.2 BREVE HISTÓRICO

A navegação foi extremamente importante para o transporte nas épocas em que veículos
como carros, caminhões, aviões e trens ainda não existiam. As navegações consistiam
no meio de transporte mais rápido e barato, abriam portas ao comércio e exploração de
continentes, sendo parte da economia e cultura dos povos.Com o tempo a evolução da
engenharia mecânica, para a construção das máquinas, e a hidráulica, para adaptação e
construção e de vias navegáveis, fizeram com que a navegação fluvial se desenvolvesse.

A primeira obra hidráulica realizada tendo como função principal a navegação é o canal
entre o Rio Nilo e o Mar Vermelho, planejada por volta de 1300 a.C. e concluída por
volta de 500 a.C. Segundo historiadores, foi nessa obra que se fez a primeira utilização
de comportas para navegação.

Outra obra antiga é o Canal du Languedoc, na França, ligando o Oceano Atlântico ao


Mar Mediterrâneo. Este projeto data de 1666 e consiste de 113 comportas, muitos
aquedutos e um túnel com mais de 200 metros de comprimento.

Em 1755, na Inglaterra, o parlamento daquele país tornou navegável o ribeirão Sankey,


afluente do Rio Mersey, desde a ponte Sankey até St. Helens em Lancashire. Trata-se de
um canal, construído em 1761, com a construção de diversas comportas.

Muitos canais foram construídos na Europa no início do século XVI. Está época marcou
a era dos canais na Inglaterra, com construção de uma malha fluvial grande o suficiente
para colaborar com a Revolução Industrial ocorrida em seguida no país.

Mas foi nos Estados Unidos, durante o século XIX, que as obras foram mais
importantes e de grande porte, de forma a possibilitar o desenvolvimento do interior do
país. Este desenvolvimento foi causado principalmente pelo fato do território americano
ser muito extenso e o transporte por terra ser mais difícil. Nesta época, os Estados
Unidos ampliou sua malha fluvial de cerca de 160 km para mais de 6000 km
navegáveis. Este desenvolvimento só parou com a predominância das estradas de ferro
no meio do século XIX. Atualmente os Estados Unidos contam com mais de 40000 km
de vias navegáveis.

Dentre as principais obras realizadas nos Estados Unidos estão os canais de Illinois e
Michigan, ligando o Mississipi aos Grandes Lagos e o St. Lawrence Seaway, com
diversas eclusas, ligando o Atlântico Norte aos Grandes Lagos. Uma grande série de
*
Adaptado de seminário preparado e apresentado pelo aluno Vinícius Roman, 1998.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


216

barragens e eclusas, tornando navegável grande parte dos rios Mississipi, Illinois, Ohio,
Cumberland e Tennessee.

7.3. DEFINIÇÕES

Navegação fluvial compreende o transporte de passageiros ou carga, sobre a água de


rios e lagos, através de diversos tipos de barcos e navios. A navegação fluvial depende,
porém, da existência de canais e de sua capacidade de fluxo e dimensões. Da
insuficiência dos canais naturais surgiu a dependência, por parte da navegação, da
engenharia de recursos hídricos, para a adaptação dos sistemas fluviais naturais às
necessidades do homem.

Existem três tipos básicos de métodos para se conseguir rios navegáveis:


• canais abertos;
• barragens e eclusas; e
• canalização

Canais abertos são rios naturais, onde é escolhido o trecho onde é possível a navegação.

Barragens permitem a criação de corpos d'água onde se pode navegar; sua


complementação com as eclusas permite a transposição dos níveis d'água de montante e
jusante.

A canalização refere-se à abertura de um canal completamente artificial.

São condições para a possibilidade de navegação em canais abertos:


• vazão suficiente na maior parte do ano;
• seção com dimensões suficientes para suportar os diversos tipos de barcos;
• canal alinhado, com poucas curvas e não muito fechadas;
• pequeno desnível e baixas velocidades ao longo do canal;
• margens e fundo do canal compostos de materiais trabalháveis.

As barragens podem ser construídas visando tanto a habilitação de trechos não


navegáveis a montante como a regularização de vazões a jusante. Associadas às eclusas,
são obras muito importantes para a navegação. São condições para a construção de
barragens:
• condições precárias para canais abertos;
• pouco transporte de sedimentos;
• lugares apropriados para a construção dos barramentos.

As canalizações normalmente só são possíveis quando a construção de pequenos canais


possibilitem uma grande extensão navegável.

7.3.1. Canais Abertos

Os canais abertos podem ser naturais ou adaptados à navegação através de regularização


de vazão por meio de reservatórios, dragagem, contração, estabilização de margens,
corte de meandros e remoção de obstáculos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


217

Reservatórios não são economicamente viáveis tendo somente a navegação como


objetivo. Normalmente eles estão associados a aproveitamentos hidrelétricos ou
irrigação. Normalmente, do ponto de vista exclusivamente econômico, o que justifica
uma barragem de grande porte é a geração de energia elétrica. Entretanto, uma vez
projetada a barragem, a construção de eclusas para que as embarcações possam transpor
níveis torna-se vantajosa.

Dragagem é a remoção de material sólido dos canais navegáveis, possibilitando a


passagem das embarcações. Existem três tipos básicos de dragagem : "dipper", "ladder"
e "suction". "Dipper" (mergulhador) refere-se a um barco com escavadeira, usado
apenas para pequenas dragagens. "Ladder" (escada) refere-se a um cabo com diversos
tanques, os quais são submersos no canal e trazem o material a ser dragado para a
superfície; o material é despejado em uma esteira rolante que o conduz ao lugar onde
será disposto. "Suction" (sucção) refere-se a um tubo que é mergulhado no canal,
succionando água e material sólido para a superfície; a água escorre e o material é
disposto. A sucção não pode ser utilizada em locais onde se tenha grandes pedras e
matacões. Dois tipos de equipamento de sucção são comuns, o bocal com sucção à
vácuo, chamado "dustpan" e o que possui um rotor esférico na ponta, chamado
"cutterhead".

Contração é usada quando o canal natural possui margens com solos granulares e pouco
coesivos. A contração refere-se ao estreitamento e aprofundamento de seções fluviais,
sendo recomendada para trechos com margens (ou diques) relativamente permeáveis
com carreamento de grãos maiores ou impermeáveis com carreamento de finos. Existem
diversos tipos de materiais e técnicas para a construção de diques, como por exemplo o
"pile-clump dike", existente em rios como o Missouri, nos EUA.

Estabilização de margens é imprescindível para a navegação. As margens não podem


sofrer erosão, o que causaria a diminuição da profundidade dos canais, formando cortes
de feição triangular e bancos de sedimento nas curvas. A técnica mais comum é a
utilização de gabiões ou revestimento.

A retificação do canal natural às vezes se faz necessária, pois a navegação não pode ser
feita com curvas muito acentuadas. A erosão se torna progressiva na parte exterior e
forma bancos de sedimentos na parte interior das curvas. Somente a estabilização de
margens e os trabalhos de contração não são suficientes para se evitar a erosão em
curvas acentuadas.

Serviços de remoção de obstáculos, tais como troncos de árvores, rochas, entre outros,
são muito importante para o desenvolvimento da navegação, pois esses obstáculos
representam um risco para os cascos de barcos. Os métodos variam de acordo com as
condições locais, podendo ser usados guinchos, tratores, explosivos, etc.

7.3.2. Barragens

As barragens destinadas à navegação não se diferenciam das barragens usadas para


outros fins, exceto por possuírem um componente chamado eclusa. As eclusas são na
verdade um “elevador” para embarcações, de forma que essas possam transpor o
obstáculo de nível que a barragem representa.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


218

Reservatórios de regularização, como o formado pela barragem de Três Marias por


exemplo, também são importantes para a navegação, pois tem a função de regularizar as
defluências para que o trecho fluvial de jusante possa ser navegável.

As barragens destinadas à navegação podem ser fixas ou móveis. As barragens fixas são
as convencionais, citadas nos dois parágrafos anteriores. As grandes barragens fixas
proporcionam elevadas regularizações e, normalmente, maiores extensões para a
navegação.

Barragens móveis são paramentos colocados no fundo do canal, que podem ser
erguidos ou abaixados, através de um sistema de cavalo hidráulico, para permitir a
passagem do excedente de água.

7.3.3. Eclusas

Eclusa refere-se a um sistema hidráulico para que embarcações possam realizar


transposição de nível quando há uma barragem na hidrovia. Estudos e investigações
hidráulicas são necessárias para o posicionamento da eclusa no barramento,
determinação da elevação dos muros da eclusa, dimensionamento do sistema de
enchimento e esvaziamento da eclusa, projeto das estruturas de chegada na eclusa,
dimensionamento de comportas e fornecimento de água através das comportas.

A transposição de nível tem valores máximos com que se pode trabalhar. Nos Estados
Unidos, a maior eclusa construída é a John Day no rio Columbia, com cerca de 34 m de
desnível. O tamanho da eclusa em planta depende do tipo de embarcação que se espera
trafegar por ela. No sistema dos rios Mississipi, Ohio e Tennessee, elas medem 33,5 m
de largura por 183 m de comprimento.Estudos em modelos reduzidos tornam-se
necessários para transposições de mais de 12 m de altura.

A localização da eclusa é feita levando-se em conta 4 fatores : profundidade adequada


às embarcações que circulam na hidrovia, largura adequada, local sem correntes
perigosas, menor tempo possível para transposição.O fornecimento de água deve ser
suficiente para manter a navegação possível para toda a variação de níveis d'água.

Os fatores que influenciam a elevação são:


• quantidade de água requerida;
• variações no deslocamento das embarcações;
• esvaziamento, enchimento, concepção da hidrelétrica;
• evaporação;
• retorno de fluxo;
• quantidade de água disponível.

A altura das paredes depende da capacidade da hidrovia, da estrutura das comportas, o


período e a frequência com que o reservatório permanece cheio.

O sistema de enchimento e esvaziamento pode ser de dois tipos: a) as válvulas ficam no


sistema de comportas ou b) as válvulas ficam no fundo ou nas paredes da eclusa. O
sistema requer que :

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


219

• a velocidade de funcionamento seja tão rápida quanto possível;


• as alterações de fluxo não danifiquem a câmara das comportas, nem as estruturas de
aproximação;
• seja tão barato quanto possível, sem atrapalhar eficiência ou segurança.

A seguir tem um esquema de funcionamento de uma eclusa no rio Mississipi; nesse


caso, o esvaziamento e o enchimento são feitos pelo fundo da eclusa.

FONTE: NAVIGATION INFORMATION CONNECTION

7.4. COMPARAÇÃO ENTRE OS MODAIS DE TRANSPORTE

Os modais a serem considerados são os três principais no transporte de carga :


rodoviário, ferroviário e fluvial; o transporte aeroviário não é aqui discutido porque é
muito mais caro que os demais. O transporte sobre água é o que consome a menor
quantidade de energia por tonelada transportada se comparado com a consumida por
trens e caminhões. Segundo estudo feito nos Estados Unidos, com a mesma quantidade
de energia, uma balsa poderia transportar quase dez vezes mais carga que um caminhão.
Segue um gráfico comparativo de quantas milhas poderia ser transportada uma carga
com o uso de um galão de combustível.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


220

FONTE: ENVIRONMENTAL ADVANTAGES OF BARGE TRANSPORTATION - US MARITIME


ADMINISTRATION

Outro fator de comparação de modais é a emissão de poluentes, onde novamente o


transporte fluvial é mais vantajoso. Segue um quadro comparativo da emissão de
hidrocarbonetos, monóxido de carbono e óxido nitroso na atmosfera.

EMISSÃO DE POLUENTES
Poluentes (em libras) emitidos para transportar uma tonelada de carga por
1000 milhas (gráfico a seguir)
MODAL HIDROCARBONETOS MONÓXIDO DE ÓXIDO NITROSO
CARBONO
Fluvial 0,09 0,20 0,53
Ferroviário 0,46 0,64 1,83
Rodoviário 0,63 1,90 10,17

FONTE: ENVIRONMENTAL ADVANTAGES OF BARGE TRANSPORTATION - US MARITIME


ADMINISTRATION

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


221

Outra comparação interessante refere-se à capacidade de transporte. Foi levada em


consideração a seguinte capacidade de peso e volume:

CAPACIDADE DE CARGA
UNIDADE BALSA REBOQUE VAGÃO TREM CAMINHÃO
toneladas 1.500 22.500 100 10.000 25
galões 453.600 6.894.000 3.240 3.024.000 7.560
OBS: O REBOQUE LEVA EM MÉDIA 15 BALSAS E O TREM, 100 VAGÕES.

QUANTIDADE DE VEÍCULOS POR CARGA EQUIVALENTE


1 balsa 15 vagões 60 caminhões
1 reboque 2,25 trens 900 caminhões

COMPRIMENTO EQUIVALENTE
Veículo Quantidade Comprimento (milhas)
Balsa 15 0,25
Trem 2,25 2,75
Caminhão (com 150 pés de distância) 36
FONTE: ENVIRONMENTAL ADVANTAGES OF BARGE TRANSPORTATION - US MARITIME
ADMINISTRATION

A principal desvantagem da via fluvial, em relação às demais, é o custo de sua


implantação. Uma comparação difícil de ser feita é o custo de cada modal. O transporte
por balsa ou navio é mais barato, mas o custo de sua implantação dificilmente o é. A
acessibilidade por meio fluvial é restrita à existência de cursos d’água.

Geralmente, o que se observa, nas obras hídraulicas, é a exploração de mais de um fator


econômico, como barragens e eclusas, onde regulariza-se vazões, gera-se energia
hidrelétrica e presta-se a outras finalidades como navegação, irrigação e abastecimento.

7.5. EXEMPLOS

7.5.1. Estados Unidos

Os EUA foi quem mais desenvolveu a navegação interior, principalmente no que diz
respeito ao uso de barragens com eclusas. Segue abaixo uma tabela com as principais
hidrovias americanas.

PRINCIPAIS SISTEMAS DE NAVEGAÇÃO NOS EUA


COMP. NO DE ELEVAÇÃO (PÉS) DIST MÉD
RIO (MILHAS) BARRAGENS MÉDIA MAX MIN BARRAGENS
Alto Mississipi
(de Alton a 645 26 13,1 38,2 5,5 24,8
Mineapolis)
Ohio (do Cairo 981 29 15,1 37,0 7,0 34,1
a Pittsburgh)
Tennessee (de
Knoxville à foz) 648 10 54,0 72,0 9,5 64,8
St. Lawrence 190 4 36,8 47,9 4,0 12,6
Seaway
FONTE: WATER RESOURCES ENGINEERING

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


222

Segue abaixo a partição de queda da parte navegável do rio Mississipi em planta e corte.

FONTE: NAVIGATION INFORMATION CONECTION

FONTE: NAVIGATION INFORMATION CONECTION

7.5.2. Grã-Bretanha

As águas interiores da Grã-Bretanha são de grande importância para a navegação.


Quase todos os rios britânicos são de pequena extensão devido à sua área. Destacam-se
apenas o Tâmisa e o Severn, com mais de 300 km de extensão. Grande parte dos rios se
concentram na parte plana (Inglaterra), o que, aliado às maiores precipitações, tornam
navegáveis a maior parte dos cursos d’água.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


223

Na Inglaterra, as chuvas são freqüentes e os solos relativamente impermeáveis, gerando


muito escoamento superficial, tornando os rios numerosos e caudalosos. Nas áreas mais
acidentadas, região da Escócia, tem-se além do aproveitamento hidrelétrico, a
navegação.

Outra característica propícia à navegação é o fato dos rios ingleses desembocarem sob a
forma de grandes estuários, facilitando a navegação e interligando o interior do país ao
litoral e daí para o restante do planeta. Possui grandes portos de muita importância para
a economia do país, como Glasgow, Liverpool, Cardiff e Bristol.

Entre os rios da Escócia, destaca-se o Clyde, que deságua no Atlântico sob a forma de
estuário, onde citua-se a cidade de Glasgow. A cidade adaptou o leito do rio às suas
necessidades, o que gerou grande transporte de sedimentos e conseqüente acumulação
de bancos de areia. Foi importante passo para a navegação a freqüente dragagem do rio.

A Escócia possui também grandes e estreitos lagos, propícios à navegação. Dentre eles
destacam-se o lago Lomond com 71 km2 e o lago Ness.

7.5.3. Grandes Canais

Dentre as obras hídraulicas destinadas à navegação, os canais representam as de maior


porte. Segue abaixo um quadro com os principais canais mundiais e o histórico de
alguns deles.

PRINCIPAIS CANAIS DE NAVEGAÇÃO DO MUNDO


CANAIS LOCALIZAÇÃO INAUGURAÇ COMPRIMENT LARGURA PROFUNDIDAD
ÃO O (KM) MÍNIMA (M) E MÍNIMA (M)
São Lourenço EUA/Canadá 1959 293 68,6 8,2
Suez Egito 1869 166 60 11,7
Albert Bélgica 1939 129 16,2 5
Kiel Alemanha 1895 99 104 11
Afonso XIII Espanha 1926 85 9 -
Panamá Panamá 1914 80,5 91,5 12,5
Beaumont EUA 1916 72 61 9,6
Houston EUA 1914 69 91 10,4
Manchester Grã-Bretanha 1894 64 26 8
Welland Canadá 1933 43,4 58,5 8,2
Mar do Norte Holanda 1870 25 37 11
Chesapeake EUA 1927 23 76,2 8,3
Burges Bélgica 1907 10 - 8,5
Corinto Grécia 1893 6 22 8
FONTE: ALMANAQUE ABRIL 1988

O canal de Suez, no Egito, com obras iniciadas em 1859 e se prolongando por dez anos,
com custo de 17 milhões de libras esterlinas, liga o Mar Mediterrâneo ao Mar
Vermelho. O canal, com 166 km de extensão teve como principal função o tráfego de
grandes navios petroleiros.

O Canal do Panamá, construído pelos Estados Unidos para ligar os oceanos Atlântico e
Pacífico, desencadeou a independência do Panamá, antigo território colombiano.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


224

Durante dez anos 35500 homens trabalharam na construção do canal que custou aos
cofres americanos 371 milhões de dólares. O canal mede 81 km, com larguras de 90 a
350 m e profundidade de 12 a 30 m. Para resolver o problema de desnível entre as duas
extremidades, foram construídos três sistemas de comportas : Gatún, Pedro Miguel e
Miraflores.

No Brasil, são importantes as vias navegáveis os rios São Francisco e Tietê. Dentre
outras obras influentes nestas vias, está a represa de Três Marias, que regula a vazão a
jusante, possibilitando a navegação a partir daquele ponto. No rio Tietê existem várias
barragens com eclusas, possibilitando a transposição de nível por parte das
embarcações.

7.6. A HIDROVIA TIETÊ-PARANÁ

Aspectos físicos e econômicos

A área de macroinfluência econômica da Hidrovia Tietê-Paraná extrapola o Estado de


São Paulo, pois soma 76 milhões de hectares, cerca de 9% do território brasileiro,
incorporando quatro dos cinco maiores estados agrícolas do país. Esta extensa região,
com 50 milhões de habitantes ( 33% da população brasileira), produz mais de 50% do
PIB nacional. Fatos :

• 2.400 km de estirões navegáveis


• mais de 6.000 km de margens lacustres e fluviais
• banha cinco Estados brasileiros: São Paulo, Goiás, Paraná, Minas Gerais e Mato
Grosso do Sul
• mais de 220 municípios
• área de influência: 800.000 km2
• renda per capita: US$ 5,000
• 25 milhões de kW instalados
• 10 reservatórios
• 10 eclusas
• integra cinco países do Cone Sul: Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia
• Hidrovia do Mercosul: Rios Paraná, Tietê, Paraguai, Grande, Paranaíba e afluentes
(7.000 km)

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


225

Localização da Hidrovia Tietê-Paraná

Transporte

Atualmente a Hidrovia Tietê-Paraná transporta aproximadamente 5,7 milhões de


toneladas anuais, sendo 1,2 milhão de toneladas de cargas de longo curso, como farelo,
soja, grãos de ordem geral, fertilizantes e calcário agrícola. Com a maturação do trecho
em operação e a entrada da eclusa de Jupiá no sistema, além da sistematização da
multimodalidade, espera-se uma rápida expansão da carga movimentada. Assim,
projeta-se para o ano 2010 o início do processo de saturação da Hidrovia Tietê, ou 20
milhões de toneladas transportadas, sendo quase 25% deste total representado por carga
regional ou de menor percurso, como cana-de-açúcar e materiais de construção,
principalmente areia e cascalho.Nestas condições, a Hidrovia do Tietê terá atingido a
produção de transporte de aproximadamente 12 bilhões de toneladas.quilômetros úteis
(tku).
A fixação de indústrias nas margens da hidrovia fará surgir o que se convenciona
chamar de "carga cativa", mormente em virtude das agroindústrias que estão se
instalando na região lindeira, beneficiando-a grandemente do não uso do modal
rodoviário, o mais caro, em pelo menos uma das pontas de transporte. Neste trecho
paulista da hidrovia, as cargas mais importantes serão os grãos e derivados,
combustíveis, madeira, fertilizantes, calcário agrícola e materiais de construção como:
cimento, ferro, produtos cerâmicos, etc. Com a maturação do MERCOSUL e a
participação fluvial no sistema, adquirirá grande importância a carga geral unitizada em
"pallets" e "containers". As Hidrovias do Tietê e futuramente do Piracicaba comportam
comboios de 2.200 t ou 4.400 t de capacidade, operando a uma velocidade entre 12 e 14
km/h.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


226

A fixação de indústrias lindeiras.

A Hidrovia do Paraná foi projetada também para absorver cargas que tenham como
origem/destino os estados limítrofes e não só o estado de São Paulo. Assim sendo,
quando completa, terá uma capacidade potencial de 35 milhões de toneladas anuais, que
atingirão, em 15-20 anos, o total de 50 bilhões de toneladas. quilômetros úteis, somadas
às cargas dos rios Tietê e Piracicaba. No rio Paraná, as eclusas possuem maiores
dimensões, capazes de operar comboios de até 6.600 t no futuro. As cargas do rio
Paraná serão grãos transportados principalmente no sentido norte-sul, visando atender
às necessidades do Estado do Paraná, além da carga geral (MERCOSUL) e madeira
para abastecer as fábricas de papel e celulose.

A Hidrovia Tietê-Piracicaba em São Paulo irá dispor de três conjuntos de


entroncamentos multimodais de importância: Pederneiras, Conchas/Anhembi e Santa
Maria da Serra/Artemis (Piracicaba), o primeiro e o último conectados à ferrovia que se
destina à cidade de São Paulo e ao porto exportador de Santos. Ao longo do rio Paraná,
a hidrovia terá conexão ferroviária em Santa Fé do Sul/Aparecida do Taboado, Três
Lagoas, Presidente Epitácio, Panorama, Rosana, além de Cianorte e Guaíra no Estado
do Paraná. Ao longo do rio Tietê é grande a conexão rodoviária com a hidrovia,
permitindo muitos pontos de multimodalidade regional.
As conexões da Hidrovia Tietê-Paraná-Piracicaba para a exportação de produtos
primários e secundários estarão relacionadas principalmente aos portos de Santos,
Paranaguá, Sepetiba e São Francisco do Sul, podendo neste rol ser incluído, a médio
prazo, o terminal da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista), em Cubatão, operando
com carga de terceiros.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


227

A Hidrovia Tietê-Paraná e o Mercosul

O MERCOSUL, instituído em 01 de janeiro de 1995, tem uma concentração econômica


maior no sudeste, centro e sul do Brasil, Uruguai, Paraguai e nordeste-norte da
Argentina, com uma área de 500 milhões de hectares, onde é gerado 85% do Produto
Interno Bruto destes quatro países. Com uma população de 90 milhões de habitantes,
US$ 50.000 de produção por km2 e uma renda per capita de US$ 5.000. O
MERCOSUL absorve 13% das exportações e importações brasileiras.
A área de influência da bacia do rio Paraná, formada pelos rios Paraná, Tietê, Paraguai e
Uruguai, numa extensão de mais de 7.000 km , compõe o denominado MERCOSUL
HIDROVIÁRIO. Nesta hidrovia, que pode ser intitulada "HIDROVIA DO
MERCOSUL", o único ponto de descontinuidade, é a barragem de Itaipu, já que o
aproveitamento de Yaciretá (ARG/PAR) dispõe de eclusa e o futuro aproveitamento de
Corpus também contará com sistema de transposição.Atualmente, comboios de mais de
6.000 t com calados de até 2,0 m poderão atingir a região do rio Paraná, a jusante de
Itaipu, ponto de conexão do Brasil, Paraguai e Argentina.

Hidrovia do Mercosul

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


228

A transposição dos 120 m de desnível de Itaipu foi orçada em 1980 em US$ 900
milhões, constituída por um sistema de três eclusas em cascata, separadas por canais
intermediários.

Esquema de transposição de Itaipu

7.7. BIBLIOGRAFIA

LINSLEY & FRANZINI, Water Resources Engineering, cap.17, McGraw-Hill.

ANDREWS, Steven T., Transportation on Inland Rives, Special report: Locks, 1990.

U.S DEPARTMENT OF TRANSPORTATION, Environmental Advantages of Inland


Barge Transportation, 1994.

ENCICLOPÉDIA GEO, Editora Abril, vol. 3, pg. 1026-1031, São Paulo, 1977.

ENCICLOPÉDIA GEO, Editora Abril, vol. 5, pg. 1479-1487, São Paulo, 1977

URL da Navigation Information Connection na Internet:


http://www.mvr.usace.army.mil/novdata/nic.htm

URL da Companhia Energética de São Paulo na Internet:


http://www.cesp.com.br

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


Notas de Aula de Engenharia de
Recursos Hídricos

Parte 3

Princípios de Gestão de Recursos


Hídricos e Legislação Correlatas
230

1. Princípios de Gestão de Recursos Hídricos *

A água foi formalmente considerada um BEM ECONÔMICO, na Conferência


Internacional sobre a Água e o Meio Ambiente ocorrida em janeiro de 1992, em
DUBLIN, Irlanda bem como no capítulo 18 da Agenda 21. Considerando que sob
determinadas propriedades a água é um BEM MINERAL e que em certas condições da
natureza ela tambêm é um BEM ENERGÉTICO (potenciais hidráulicos), a gestão deste
BEM COMUM, SOCIAL e ESTRATÉGICO, indispensável à vida, deve ser tratada
pelo governo e sociedade com a mais alta prioridade. O uso múltiplo e integrado das
águas bem como a minimização dos impactos ambientais decorrentes, é um objetivo
que deve ser constantemente perseguido.
O gerenciamento de recursos hídricos pressupõe a existência de três instrumentos
fundamentais:

BASE TÉCNICA - BASE LEGAL - ORDENAMENTO INSTITUCIONAL

Isto posto, pode conceituar-se o gerenciamento de recursos hídricos como sendo um


processo dinâmico, ambientalmente sustentável, que, baseado numa adequada
administração da oferta das águas, trata da organização e compatibilização dos diversos
usos setoriais dos recursos hídricos, tendo por objetivo uma operação harmônica e
integrada das estruturas decorrentes, de forma a se obter o máximo benefício das
mesmas.

*
adaptado de "Atlas Hidrológico do Brasil", Versão 1.0, ANEEL/MME/SRH/IBAMA/MMA, 1998.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


231

1.1 As Bacias Hidrográficas Brasileiras

Pela complexidade dos problemas existentes ao se visualizar um contexto como o


referente às bacias brasileiras, tenta-se neste trabalho sintetizar as informações
disponiveis em diversas fontes sobre as varias feições existentes em cada região de
abrangência de nossas bacias hidrográficas.
A complexidade dos problemas existentes numa bacia hidrográfica são tão extensos e de
tal importância que se procura neste trabalho sintetizar as diversas áreas envolvidas no
conhecimento de uma bacia. São apresentados aqui os usos multiplos da água, suas
caracteristicas físicas, e suas áreas criticas visando fornecer elementos aos futuros
trabalhos de planejamento do uso integrado dos recursos hidricos do Brasil.

Bacia do Rio Amazonas


Características físicas
A bacia amazônica abrange uma área de drenagem da ordem de 6.112 .000 Km², ocupando cerca de 42 %
da superfície do território nacional.
A maior rede hidrográfica mundial é da Bacia Amazônica, com área de drenagem da ordem de 6 x 106
km² prolongando-se dos Andes até o Oceano Atlântico. Ocupa cerca de 42% da superfície brasileira,
estendendo-se além da fronteira da Venezuela à Bolívia.
Seu principal curso d'água é o rio Amazonas, que com extensão de 6.570 km, nasce em território peruano,
no riacho Lauricocha, originário da lagoa do Ninõ, nas geleiras da cordilheira de Santa Anna, cerca de
5.000m acima do nível do mar. O percurso inicial, da ordem de 45 Km, é realizado em quedas, no sentido
norte, formando as lagoas Santa Anna, Cablocacha, Nieveurco, Tinquincocha, Yanacocha e Patarcocha.
Após escoar no Lago Lauricocha, toma a denominação de Marañon, ainda no Andes, onde recebe
pequenas contribuições, e após atravessar o Pongo de Manseriché, segue aproximadamente a direção leste
até a foz, no Atlântico. Entra no Brasil na confluência com o rio Javari, somente a partir da confluência
com o rio Javari, próximo a Tabatinga, sendo, então, chamado de Solimões e, somente a partir da
confluência com o rio Negro, passa a ser denominado de Amazonas. Próximo a Manaus, bifurca-se com o
Paraná do Careiro, estimando-se aí uma largura da ordem de 1.500m e profundidade em torno de 35 m.
Entre a confluência do rio Negro e a região das ilhas, próximo a desembocadura, é conhecido por Baixo
Amazonas.
Em virtude de sua posição geográfica, praticamente paralela ao Equador, o regime do Amazonas é
influenciado pelos dois máximos de pluviosidade dos equinócios, sendo, por isso conhecido como regime
fluvial de duas cheias.
A bacia Amazônica está sujeita ao regime de interferência, portanto tem contribuintes dos hemisférios
Norte e Sul, coincidindo a cheia de um hemisfério com a vazante do outro.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


232

Bacia do Tocantins-Araguaia
Características físicas
A bacia hidrográfica do Tocantins-Araguaia localiza-se quase que integralmente entre os paralelos 2º e
18º e os meridianos de longitude oeste 46º e 56º. Sua configuração alongada no sentido longitudinal,
seguindo as diretrizes dos dois importantes eixos fluviais – o Tocantins e o Araguaia – que se unem no
extremo setentrional da Bacia, formando o baixo Tocantins, que desemboca no Rio Pará, pertencente ao
estuário do rio Amazonas.
A bacia do rio Tocantins possui uma vazão média anual de 10.900m3/s, volume médio anual de 344 Km3
e uma área de drenagem de 767.000Km2 , que representa 7,5% do território nacional; onde 83% da área
da bacia distribuem-se nos Estados de Tocantins e Goiás (58%), Mato Grosso (24%); Pará ( 13%) e
Maranhão (4%), além do Distrito Federal ( 1%). Limita-se com bacias de alguns do maiores rios do
Brasil, ou seja, ao Sul com a do Paraná, a Oeste, com a do Xingu e a leste, com a do São Francisco.
Grande parte de sua área está na região Centro Oeste, desde as nascentes do rios Araguaia e Tocantins até
sua confluência, na divisa dos estados de Goiás, Maranhão e Pará. Desse ponto para jusante a bacia
hidrográfica entra na região Norte e se restringe a apenas um corredor formado pelas áreas marginais do
rio Tocantins.

Bacia do Atlântico trechos Norte/Nordeste


A Bacia do Atlântico - Trecho Norte/Nordeste banha extensas áreas dos Estados do Amapá, Maranhão,
Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, e parte do Estado da Paraíba, Pernambuco, Pará e Alagoas. A mesma
está compreendida entre as latitudes 4º13’N a 10º80’S e longitudes 34º 83’a 53º 33’W. Inclui-se nesta
região o ponto mais oriental do País, Ponta do Seixas na Paraíba.
A Bacia do Atlântico - Trecho Norte/Nordeste, possui uma vazão média anual de 6.800 m3/s e uma área
de drenagem de 996.000 Km² composta por dois trecho: Norte e Nordeste.
O Trecho Norte corresponde a área de drenagem dos rios que deságuam ao norte da Bacia Amazônica,
incluindo a bacia do rio Oiapoque. A drenagem da bacia é representada por rios principais caudalosos e
perenes, que permanecem durante o ano com razoável vazão, se comparados aos da região semi-árida
nordestina.
O segundo trecho - Nordeste, corresponde a área de drenagem dos rios que deságuam no Atlântico, entre
a foz do rio Tocantins e a do rio São Francisco.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


233

Bacia do São Francisco


A área da bacia em estudo, abrange partes do território dos seguintes estados: Minas Gerais, Bahia,
Pernambuco e Alagoas. A mesma está compreendida entre as latitudes 7º 00´ e 21º 00´ S e longitudes 35º
00´ e 47º 40’ W.
A bacia do rio São Francisco possui uma vazão média anual de 3.360m3/s, volume médio anual
de106Km3 e uma área de drenagem de 631.000Km2 , que representa 7,5% do território nacional; onde
83% da área da bacia distribuem-se nos Estados de Minas Gerais e Bahia, 16% nos Estados de
Pernambuco, Alagoas e Sergipe , e o restante 1% no Estado de Goiás e Distrito Federal.
O rio São Francisco é o mais importante da bacia, com uma extensão de 2.700 Km, tem suas nascentes na
Serra da Canastra, em Minas Gerais.. Atravessando a longa depressão encravada entre o Planalto
Atlântico e as Chapadas do Brasil Central, segue a orientação sul-norte até aproximadamente a cidade de
Barra, dirigindo-se então para Nordeste até atingir a cidade de Cabrobó, quando inflete para Sudeste para
desembocar no Oceano Atlântico. A sua importância se deve não só pelo volume de água transportado
numa região semi-árida mas, principalmente, pela sua contribuição histórica e econômica na fixação das
populações ribeirinhas e na criação das cidades hoje plantadas ao longo do vale, bem como pelo potencial
hídrico passível de aproveitamento em futuros planos de irrigação dos excelentes solos situados à sua
margem. Geograficamente, o vale tem sido subdividido tradicionalmente em 4 regiões principais:
• O Alto São Francisco, desde suas nascentes até a cidade de Pirapora;
• O Médio São Francisco, de Pirapora até Remanso;
• O Submédio São Francisco, de Remanso até Paulo Afonso e
• O Baixo São Francisco, de Paulo Afonso até sua foz.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


234

Bacia dos Rios da Região do Atântico Sul trecho leste


A área da bacia do Atlântico – trecho Leste está localizada entre as latitudes 10º e 23º S e longitudes 37º e
46º W. Abrange partes dos territórios dos seguintes estados: São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Sergipe e os
territórios dos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo.
Esta bacia compreende a área de drenagem dos rios que deságuam no Atlântico, entre a foz do rio São
Francisco, ao norte, e a divisa entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo, ao sul. Possui uma vazão
média anual de 3.690m3/s, volume médio anual de117 Km3 em uma área de drenagem calculada em
569.000Km2.

Bacia do Rio Paraná


A bacia do rio Paraná localiza-se quase que integralmente entre os paralelos 2º e 18º e os meridianos de
longitude oeste 46º e 56º. Possui uma vazão média anual de 15.620 m3/s, volume médio anual de 495
Km3 e uma área de drenagem de1.237..000Km2 , formada por 8 sub- bacias.
A área da bacia, abrange os territórios dos Estados de Mato Grosso, Paraná, São Paulo e partes dos
territórios dos Estados de Minas Gerais e Goiás. Geograficamente limita-se com as seguintes bacias
hidrográficas brasileiras ;com a Bacia Amazônica, ao norte, Bacia do Tocantins-Araguaia , Bacia do Rio
São Francisco, a noroeste, Bacia do Atlântico Trecho Leste, a sudeste, com a Bacia do Uruguai, ao Sul.
Grande parte de sua área está na região sudeste do Brasil.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


235

Bacia do Rio Uruguai


A bacia do rio Uruguai abrange uma área de aproximadamente 384.000 km2, dos quais 176.000 km2
situam-se em território nacional, compreendendo 46.000Km2 do Estado de Santa Catarina e 130.000Km2
no Estado do rio Grande do Sul. Possui uma vazão média anual de 3.600m3/s, volume médio anual de 114
Km3.
Estendendo-se entre os Paralelos de 27º e 34º latitude Sul e os meridianos de 49º 30’ e 58º 15’ WGr, a
bacia do Uruguai, em sua porção nacional, encontra-se totalmente na região sul, é delimitada ao norte e
nordeste pela Serra Geral, ao sul pela fronteira com a República Oriental do Uruguai, a leste pela
Depressão Central Riograndense e a oeste pelo território argentino.

Para efeito de estudos, a bacia do Uruguai foi dividida em sub-bacias: Canoas, Pelotas, Forquilha,
Ligeiro, Peixe, Irani, Passo Fundo, Chapecó, da Várzea, Antas, Guarita, Itajaí, Piratini, Ibicuí, alto
Uruguai e Médio Uruguai.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


236

Bacia dos Rios do Atlântico Sul trecho Sudeste

A bacia do Atlântico Sul – Trecho Sudeste, com uma área de drenagem em território nacional de 224.000
Km2 , banha extensas áreas do Estado do Rio Grande do Sul e parte dos Estados de Santa Catarina, Paraná
e São Paulo. Está compreendida entre as longitudes 44º W a 54º W e latitude de 22º S a 32º S. Fazem
parte desta bacia, os rios Ribeira do Iguape, Itajaí, Mampituba, Jacuí, Taquari, Jaguarão (e seus
respectivos afluentes), lagoa dos Patos e lagoa Mirim. Para efeito de estudo e do gerenciamento dos
recursos hídricos esta bacia foi dividida em um conjunto de 10 sub-bacias enumeradas de 0 a 9. Sendo,
que a Sub-bacia 89 localiza-se fora do Território Nacional. A referida divisão facilita não só o
armazenamento e recuperação das informações hidrometerológicas, mas também o gerenciamento da
operação de coleta de tais dados e a própria referência geográfica dos cursos d’água nacionais.

1.2 A Rede Hidrográfica Monitorada Pela ANEEL


Quinto país do mundo em superfície, o Brasil possui uma rede hidrológica considerável, com 1874
estações Fluviométricas (estações Flu) e 2234 estações Pluviométricas (estações Plu). A dificuldade em
operar a rede é grande, sobretudo ao norte do Trópico de Capricórnio, devido às grandes distâncias a
serem percorridas e dificuldades de acesso às estações, sendo freqüente o uso de veículos com tração
dupla, barcos, voadeiras e aeronaves.
A operação consiste no observador coletar os dados pluviométricos diariamente (7 horas da manhã) e
dados fluviométricos duas vezes ao dia (7 e 17 horas), anotando os valores em uma caderneta.
Trimestralmente as estações Plu e Flu são visitadas e as cadernetas são recolhidas pela equipe de
operação da rede. Em algumas estações os observadores remetem através dos correios, as cadernetas com
os dados do mês. Nas visitas às estações Flu, também são realizadas medição de vazão (quando
especificadas). Recebidas as cadernetas em escritório, as informações são digitadas, consistidas e
enviadas à ANEEL, onde são incluídas às séries históricas e as disponibiliza aos usuários.Todo o processo
de coleta da informação até a disponibilização do dado ao usuário leva no mínimo 4 meses na chamada
operação convencional da rede.Esta operação inviabiliza a tomada de decisão, quando da ocorrência de
eventos hidrológicos críticos (cheias ou estiagens), pois as informações não são obtidas em tempo hábil.
A partir da década de 40, as informações dos níveis dos rios São Francisco e Paraíba do Sul eram
coletadas e transmitidas via telégrafo ao Rio de Janeiro, onde era feita a previsão dos níveis para algumas
localidades destas bacias. As informações da previsão eram então retransmitidas via telégrafo às
prefeituras destas localidades, que por sua vez colocavam cartazes nas portas informando a previsão.
Após inúmeras experiências com transmissão de dados hidrológicos por empresas do setor elétrico e
órgãos do governo, o antigo DNAEE (atual ANEEL) implementou em várias bacias hidrográficas, a
teletransmissão via telefone e rádio, e na Bacia Amazônica teletransmissão via satélite, afim de melhorar
sua gestão, utilizando o sistema ARGOS .A implementação de sensores automáticos de chuva e nível nas
estações nas décadas de 70 e 80 e o uso de telemetria, possibilitou acessar as informações hidrológicas
diariamente. As informações eram então transmitidas ao antigo DNAEE via telefone/rádio (sistema
automático) ou satélite (Bacia Amazônica), pré-consistidas e divulgadas à Defesa Civil, através de Telex
e posteriormente através de Fax, para a tomada de medidas não estruturais, como por exemplo o alerta e

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


237

retirada da população ribeirinha, e estruturais, como a construção de diques, operação de reservatórios e


outras, as quais foram decisões realizadas quando da iminência ou mesmo ocorrências de eventos críticos.
As estações equipadas com telemetria via telefone/rádio apresentavam problemas, principalmente na
época das cheias, pois em função das chuvas (relâmpagos) o sistema não comunicava satisfatoriamente.
Por este motivo foi implantado o sistema de rádio e telefonia via voz, onde o observador destas estações
divulgava para o centro de coleta de dados mais próximo (central), as informações em horários pré
determinados. Em situações críticas (período de chuvas intensas), as informações eram repassadas em
períodos menores, tendo acontecido vários eventos onde os observadores ficavam mais de 24 horas nas
estações monitorando os níveis dos rios e repassando as informações para a central. A manutenção dos
equipamentos com telemetria via telefone/rádio vem tornando-se inviável devido ao alto custo, e em
muitas vezes, até a indisponibilidade no mercado de novos equipamentos e peças de reposição.
Quanto à telemetria via satélite, esta se mostrou muito robusta. O problema que inicialmente ocorreu com
estes equipamentos era a autonomia de energia da estação, pois como os mesmos funcionavam com
pilhas não recarregáveis e não havia um sistema de alimentação de energia, as informações só eram
obtidas enquanto havia carga na bateria. Isto obrigava visitas as estações com uma periodicidade máxima
de 8 meses (tempo médio da carga da bateria) e como muitas destas estações estavam localizadas em
locais de difícil acesso, estas visitas nem sempre ocorriam neste intervalo. Com a implementação de
painéis solares e pilhas recarregáveis nas estações, as informações passaram a ter uma constância,
melhorando o monitoramento da bacia.Os resultados com transmissão de dados via satélite foram tão
significativos que, através de um convênio com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, foram
adquiridos em 1995, 200 Plataformas de Coletas de Dados - PCD's com sensores hidrometeorológicos e
transmissor nas freqüências do SCD1 e ARGOS para implementar a rede de coleta de dados com a
utilização do satélite brasileiro SCD1.O primeiro satélite brasileiro, o Satélite de Coleta de Dados número
1 - SCD1, foi colocado em órbita semi-equatorial baixa, em 17 de fevereiro de 1993, a uma altura média
de 750 km, circundando o globo terrestre a cada 103 minutos. Sua vida útil foi estimada em 6 meses, mas
encontra-se em funcionamento há mais de 4 anos.As PCD's transmitem informações para o SCD1 que por
sua vez retransmite-as para a antena de rastreamento no INPE em Cuiabá. Estas mensagens, após
recebidas, são enviadas para o Centro de Missão de Coleta de Dados - CMCD do INPE, em Cachoeira
Paulista. A ANEEL acessa as informações recebidas no CMCD através da rede de comunicação de dados
do Grupo de Trabalho Misto de Meteorologia - GTMM, via EMBRATEL, rede exclusiva a uma
velocidade de 64 kbps e via modem (micro a micro), através de BBS.

1.3 Disponibilidade Hídrica do Brasil (Fonte: ANEEL)

Bacias Hidrográficas Área de Vazão Vazão Precipitação Evaporação


Drenagem Média de Específica mm/ano mm/ano
9 2
10 km Longo de Longo
Período Período
3 2
m /s l/s/km
Bacia Amazônica 6.112.000 2.460 34,2 2.460 1.382
Bacia Amazônica * 3.900.000 120.000 30,8 2.220 1.250
Bacia do Tocantins 757.000 11.800 15.61 1.660 1.168
Bacia do Atlântico Norte 1.029 9.050 48,21 (N) 2.950 (N) 1.431 (N)
- Nordeste 5,71 (NE) 1.328 (NE) 1.150 (NE)
Bacia do São Francisco 634.000 2.850 4,51 916 774
Bacia do Atlântico Leste 242.000 680 2,81 895 806
Sub-Bacias 50 a 52
Bacia do Atlântico Leste 303.000 3.670 12,1 1.229 847
Sub-Bacias 53 a 59
Bacia do Paraná* ** 877.000 11.000 12.51 1.385 989
Bacia do Paraguai * *** 368.000 1.290 3,51 1.370 1.259
Bacia do Uruguai 178.000 4.150 23,3 1.567 832
Bacia do Atlântico 224.000 4.300 19,2 1.394 789
Sudeste
Produção Hídrica 8.512.000 257.790 24,0 1.954 1.195
Brasileira

* área em território brasileiro, ** até a foz do rio Iguaçu , *** até a foz do rio Apa

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


238

1.4 Potencial Hidrelétrico

As dimensões geográficas aliadas as condições hídricas favoráveis do território


brasileiro favoreceram o largo emprego deste potencial para a produção de energia,
levando a um maior investimento na implantação de hidrelétricas. Atualmente a
hidreletricidade é a base do suprimento energético do Brasil. Produzido por usinas de
grande porte, representa cerca de 95% do potencial energético do país, onde 35% destes
situam-se na região Amazônica, longe dos maiores centros consumidores (Sul e
Sudeste). O potencial hidrelétrico brasileiro, pode ser observado segundo os dados
abaixo apresentados (Fonte: ANEEL).

POTENCIAL HIDRELÉTRICO BRASILEIRO 1997

Estágio Potência (MW) Nº Registros


Inventário 49.286,07 490
Viabilidade 35.328,16 67
Projeto Básico 15.390,67 74
Construção 7.321,60 24
Operação 54.513,87 392
Desativado 8,82 12
Potencial Total Inventariado 161.849,19 1059
Individualizado 66.596,71 723
Remanescente 31.668,18 2339
Potencial Total Estimado 98.264,89 3062
Total Geral 260.114,08 4121

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


239

1.5 Bibliografia

A Experiência Brasileira na Teletransmissão de dados Hidrológicos Via Satélite - XII


Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, Vitória/ES, 1997
Ação Programada em Ciência e Tecnologia - Recursos Naturais Hídricos - III Plano
Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, Brasília/DF, 1982
Ação Regional do DNAEE na Área de Recursos Hídricos, DNAEE/DCRH, Brasília,
DF, 1984
A Energia Elétrica no Brasil da primeira lâmpada a Eletrobrás - Biblioteca do Exército
- Editora, Publicação 474 Coleção General Benício, Volume 154, 1977, Rio de
Janeiro, RJ
Diagnóstico da Utilização dos Recursos Hídricos da Bacia do São Francisco -
Relatório Síntese, DNAEE/DCRH, 1983
Geografia do Brasil, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,
Vol. 1, 1977, Rio de Janeiro, RJ
Geografia do Brasil, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,
Vol. 2, 1977, Rio de Janeiro, RJ
Geografia do Brasil, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,
Vol. 3, 1977, Rio de Janeiro, RJ
Geografia do Brasil, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,
Vol. 4, 1977, Rio de Janeiro, RJ
Geografia do Brasil, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE,
Vol. 5, 1977, Rio de Janeiro, RJ
Hidrelétrica Meio Ambiente e Desenvolvimento - Arnaldo Carlos Müller - Ed. Makron
Books, 1995, São Paulo, SP
Informação Hidrológica do DNAEE na Rede Mundial de COmputadores - - XII
Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, Vitória/ES, 1997

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


240

Panorama do Setor de Energia Elétrica no Brasil - Centro da Memória da Eletricidade


no Brasil - ELETROBRÁS, 1988, Rio de Janeiro, RJ
Projeto RADAMBRASIL, MME, Volumes 3, 6, 7, 8, 10, 12, 14, 15 e 17, Rio de Janeiro
RJ, 1982
Inventário das Estações Fluviométricas, DNAEE/CGRH, Brasília, DF, 1996
Inventário das Estações Pluviométricas, DNAEE/CGRH, Brasília, DF, 1996

2. Legislação Específica de Recursos Hídricos, promulgada até Março de 1998

LEGISLAÇÃO FEDERAL
LEI No 9.433, DE 08 DE JANEIRO DE 1997
Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,
regulamenta o inciso XIX do art.21 da Constituição Federal
e altera o art. 1o da Lei no 8.001, de 13 de março de 1990,
que modificou a Lei no 7.990, de 28 de dezembro de 1989.
DECRETO Nº 24.643, DE 10 DE JULHO DE 1934
Decreta o Código de Águas

LEGISLAÇÃO ESTADUAL

LEI Nº 5.965, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1997, DO ESTADO DE ALAGOAS


Dispõe Sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos.
Institui o Sistema Estadual de Gerenciamento Integrado de
Recursos Hídricos e dá Outras Providências.
LEI Nº 6.855, DE 12 DE MAIO DE 1995, DO ESTADO DA BAHIA
Dispõe sobre a Política, o Gerenciamento e o Plano Estadual
de Recursos Hídricos
LEI N° 11.996, DE 24 DE JULHO DE 1992, DO ESTADO DO CEARÁ
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos,
institui o Sistema Integrado de Gestão de Recursos Hídricos
- SIGERH e dá outras providências.
LEI Nº 512, DE 28 DE JULHO DE 1993, DO DISTRITO FEDERAL
Dispõe sobre a Política de Recursos Hídricos no Distrito
Federal, institui o Sistema de Gerenciamento integrado de
Recursos Hídricos- SGIRH - DF e dá outras providências.
LEI N.º 13.123, DE 16 DE JULHO DE 1997, DO ESTADO DE GOIÁS
Estabelece normas de orientação à Política Estadual de
Recursos Hídricos, bem como ao Sistema Integrado de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.
LEI Nº 7.052, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1997, DO ESTADO DO MARANHÃO
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos,
institui o Sistema de Gerenciamento Integrado de Recursos
Hídricos e dá outras providências.
LEI N° 6.945, DE 05 DE NOVEMBRO DE 1997, DO ESTADO DE MATO GROSSO
Dispõe sobre a Lei de Política Estadual de Recursos Hídricos,
institui o Sistema Estadual de Recursos Hídricos e dá outras
providências.
LEI Nº 11.504, DE 20 DE JUNHO DE 1994, DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos e dá
outras providências.
LEI N° 6.308, DE 02 DE JULHO DE 1996, DO ESTADO DA PARAÍBA
Institui a Política Estadual de Recursos Hídricos, suas
diretrizes e dá outras providências.
LEI N.º 11.426 DE 17 DE JANEIRO DE 1997, DO ESTADO DE PERNAMBUCO

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


241

Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos e o


Plano Estadual de Recursos Hídricos, institui e Sistema
Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos e dá
outras providências.
LEI Nº 6.908, DE 1 DE JULHO DE 1996, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos,
institui o Sistema Integradas de Gestão de Recursos Hídricos
- SIGERH e dá outras providências.

LEI Nº 10.350, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1994, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL


Institui o Sistema Estadual de Recursos Hídricos,
regulamentando o artigo 171 da Constituição do Estado do
Rio Grande do Sul.
LEI Nº 9.748 DE 30 DE NOVEMBRO DE 1994, DO ESTADO DE SANTA CATARINA.
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos e dá
outras providências.
LEI Nº 7.663, 30 DE DEZEMBRO DE 1991, DO ESTADO DE SÃO PAULO
Estabelece normas de orientação à Política Estadual de
Recursos Hídricos bem como ao Sistema Integrado de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.
LEI Nº 3.595, DE 19 DE JANEIRO DE 1995, DO ESTADO DE SERGIPE
Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos, e
institui o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos
Hídricos e dá outras providências.

2.1 O Código de Águas

DECRETO Nº 24.643, DE 10 DE JULHO DE 1934


Decreta o Código de Águas
* V. Decreto-lei nº 852, de 11-11-38
O Chefe do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, usando das
atribuições que lhe confere o artigo 1º do Decreto nº 19.398, de 11 de novembro de
1930; e:
Considerando que o uso das águas no Brasil tem-se regido até hoje por uma legislação
obsoleta, em desacordo com as necessidades e interesses da coletividade nacional;
Considerando que se torna necessário modificar esse estado de coisas, dotando o País de
uma legislação adequada que, de acordo com a tendência atual, permita ao poder
público controlar e incentivar o aproveitamento industrial das águas;
Considerando que, em particular, a energia hidráulica exige medidas que facilitem e
garantam seu aproveitamento racional;
Considerando que, com a reforma por que passaram os serviços afetos ao Ministério da
Agricultura, está o Governo aparelhado por seus órgãos competentes a ministrar
assistência técnica e material, indispensável à consecução de tais objetivos;

Resolve decretar o seguinte Código de Águas, cuja execução compete ao Ministério da


Agricultura e que vai assinado pelos ministros de Estado: CÓDIGO DE ÁGUAS
LIVRO I Águas em Geral e sua Propriedade LIVRO II Aproveitamento das Águas
LIVRO III Forças Hidráulicas, Regulamentação da Indústria Hidrelétrica.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


242

Excertos do Livro I :

LIVRO I Águas em geral e sua propriedade


TÍTULO I Águas, Álveo e Margens
CAPÍTULO I Águas Públicas
Artigo 1º - As águas públicas podem ser de uso comum ou dominicais.
Artigo 2º - São águas públicas de uso comum:
a) os mares territoriais, nos mesmos incluídos os golfos, baías, enseadas e portos;
b) as correntes, canais, lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis;
c) as correntes de que se façam estas águas;
d) as fontes e reservatório públicos;
e) as nascentes quando forem de tal modo consideráveis que, por si sós, constituam o "caput fluminis";
f) os braços de quaisquer correntes públicas, desde que os mesmos influam na navegabilidade ou
flutuabilidade.
§ 1º - Uma corrente navegável ou flutuável se diz feita por outra quando se torna navegável logo depois
de receber essa outra.
§ 2º - As correntes de que se fazem os lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis serão determinadas pelo
exame de peritos.
§ 3º - Não se compreendem na letra b deste artigo, os lagos ou lagoas situados em um só prédio particular
e por ele exclusivamente cercados, quando não sejam alimentados por alguma corrente de uso comum.
...

TÍTULO II Águas públicas em relação aos seus proprietários


CAPÍTULO ÚNICO
Art. 29º - As águas públicas de uso comum, bem como o seu álveo, pertencem:
I - À União:
a) quando marítimas;
b) quando situadas no Território do Acre, ou em qualquer outro território que a União venha a adquirir,
enquanto o mesmo não se constituir em Estado, ou for incorporado a algum Estado;
c) quando servem de limites da República com as nações vizinhas ou se estendam a território estrangeiro;
d) quando situadas na zona de 100 quilômetros contígua aos limites da República com estas nações;
e) quando sirvam de limites entre dois ou mais Estados;
f) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Estados.
II - Aos Estados:
a) quando sirvam de limites a dois ou mais Municípios;
b) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais Municípios.
III - Aos Municípios:
quando exclusivamente situados em seus territórios e sejam navegáveis ou flutuáveis ou façam outros
navegáveis e flutuáveis, respeitadas as restrições que possam ser impostas pela legislação dos Estados.
§ 1º - Fica limitado o domínio dos Estados e Municípios sobre quaisquer correntes, pela servidão que à
União se confere para o aproveitamento industrial das águas e da energia hidráulica, e para navegação.

Excertos do Livro II

LIVRO II Aproveitamento das Águas


TÍTULO I Águas comuns de todos
CAPÍTULO ÚNICO
Art. 34º - É assegurado o uso gratuito de qualquer corrente ou nascente de água, para as primeiras
necessidades da vida, se houver caminho público que a torne acessível.

...

TÍTULO II Aproveitamento de águas públicas


DISPOSIÇÃO PRELIMINAR
Art. 36º - É permitido a todos usar de quaisquer águas públicas conformando-se com os regulamentos
administrativos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


243

§ 1º - Quando este uso depender de derivação, será regulado nos termos do Capítulo IV, do Título II, do
Livro II, tendo em qualquer hipótese preferência a derivação para o abastecimento das populações.
§ 2º - O uso comum das águas pode ser gratuito ou retribuído, conforme as leis e regulamentos da
circunscrição administrativa a que pertencerem.

...

CAPÍTULO IV Derivação
Art. 43º - As águas públicas não podem ser derivadas para as aplicações da agricultura, da indústria e da
higiene, sem a existência de concessão administrativa, no caso de utilidade pública e, não se verificando
esta, de autorização administrativa, que será dispensada, todavia, na hipótese de derivações
insignificantes.
§ 1º - A autorização não confere, em hipótese alguma, delegação de poder pública ao seu titular.
§ 2º - Toda concessão ou autorização se fará por tempo fixo, e nunca excedente de trinta anos,
determinado-se também um prazo razoável, não só para serem iniciadas, como para serem concluídas, sob
pena de caducidade, as obras propostas pelo peticionário.
§ 3º - Ficará sem efeito a concessão, desde que, durante três anos consecutivos, se deixe de fazer o uso
privativo das águas.
Art. 44º - A concessão para o aproveitamento das águas que se destinem a um serviço público será feita
mediante concorrência pública, salvo os casos em que as leis ou regulamentos a dispensem.
Parágrafo único - No caso de renovação será preferido o concessionário anterior, em igualdade de
condições, apurada em concorrência.
Art. 45º - Em toda a concessão se estipulará, sempre, a cláusula de ressalva dos direitos de terceiros.
Art. 46º - A concessão não importa, nunca, a alienação parcial das águas públicas, que são inalienáveis,
mas no simples direito ao uso destas águas.
Art. 47º - O Código respeita os direitos adquiridos sobre estas águas, até a data de sua promulgação, por
título legítimo ou posse trintenária.
Parágrafo único - Estes direitos, porém, não podem ter maior amplitude do que os que o Código
estabelece, no caso de concessão.
Art. 48º - A concessão, como a autorização, deve ser feita sem prejuízo da navegação, salvo:
a) no caso de uso para as primeiras necessidades da vida;
b) no caso da lei especial que, atendendo a superior interesse público, o permita.
Parágrafo único - Além dos casos previstos nas letras a e b deste artigo, se o interesse público superior o
exigir, a navegação poderá ser preterida sempre que ela não sirva efetivamente ao comércio.
Art. 49º - As águas destinadas a um fim não poderão ser aplicadas a outro diverso, sem nova concessão.
Art. 50º - O uso da derivação é real; alienando-se o prédio ou o engenho a que ela serve, passa o mesmo
ao novo proprietário.
Art. 51º - Em regulamento administrativo se disporá:
a) sobre as condições de derivação, de modo a se conciliarem quanto possível os usos a que as águas se
prestam;
b) sobre as condições da navegação que sirva efetivamente ao comércio, para os efeitos do parágrafo
único do artigo 48º.
Art. 52º - Toda cessão total ou parcial da concessão ou autorização, toda mudança de concessionário ou
permissionário depende de consentimento da administração.

...

CAPÍTULO V Desobstrução
Art. 53º - Os utentes das águas públicas de uso comum ou os proprietários marginais são obrigados a se
abster de fatos que prejudiquem ou embaracem o regime e o curso das águas, e a navegação, exceto se
para tais fatos forem especialmente autorizados por alguma concessão.
Parágrafo único - Pela infração do disposto neste artigo, os contraventores, além das multas estabelecidas
nos regulamentos administrativos, são obrigados a remover os obstáculos produzidos. Na sua falta, a
remoção será feita à custa dos mesmos pela administração pública.
Art. 54º - Os proprietários marginais de águas públicas são obrigados a remover os obstáculos que tenham
origem nos seus prédios e sejam nocivos aos fins indicados no artigo precedente.
Parágrafo único - Se, intimados, os proprietários marginais não cumprirem a obrigação que lhes é imposta
pelo presente artigo, de igual forma serão passíveis das multas estabelecidas pelos regulamentos
administrativos, e à custa dos mesmos, a administração pública fará remoção dos obstáculos.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


244

Art. 55º - Se o obstáculo não tiver origem nos prédios marginais, sendo devido a acidentes ou à ação
natural das águas, havendo dono, será este obrigado a removê-lo, nos mesmos termos do artigo anterior;
se não houver dono conhecido, removê-lo-á a administração, à custa própria, a ela pertencendo qualquer
produto do mesmo proveniente.
Art. 56º - Os utentes ou proprietários marginais, afora as multas, serão compelidos a indenizar o dano que
causarem, pela inobservância do que fica exposto nos artigos anteriores.
Art. 57º - Na apreciação desses fatos, desses obstáculos, para as respectivas sanções, se devem ter em
conta os usos locais, a efetividade do embaraço ou prejuízo, principalmente com referência às águas
terrestres, de modo que sobre os utentes ou proprietários marginais, pela vastidão do País, nas zonas de
população escassa, de pequeno movimento, não venham a pesar ônus excessivos e sem real vantagem
para o interesse público.

...
CAPÍTULO VII Competência administrativa
Art. 61º - É da competência da União a legislação de que trata o art. 40º, em todos os seus incisos.
Parágrafo único - Essa competência não exclui a dos Estados para legislarem subsidiariamente sobre a
navegação ou flutuação dos rios, canais e lagos de seu território, desde que não estejam compreendidos
nos nºs I e II do art. 40º.
Art. 62º - As concessões ou autorizações para derivação que não se destine à produção de energia
hidrelétrica serão outorgadas pela União, pelos Estados ou pelos Municípios, conforme o seu domínio
sobre as águas a que se referir ou conforme os serviços públicos a que se destine a mesma derivação, de
acordo com os dispositivos deste Código e as leis especiais sobre os mesmos serviços.
Art. 63º - As concessões ou autorizações para derivação que se destine à produção de energia hidrelétrica,
serão outorgadas pela União, salvo nos casos de transferência de suas atribuições aos Estados, na forma e
com as limitações estabelecidas nos arts. 192º, 193º e 194º.
Art. 64º - Compete à União, aos Estados ou aos Municípios providenciar sobre a desobstrução nas águas
do seu domínio.
Parágrafo único - A competência da União se estende às águas de que trata o art. 40, nº II.

2.2 Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei Nº 9.433, De 8 De Janeiro De 1997 )

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
TÍTULO I
DA POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS
CAPÍTULO I
DOS FUNDAMENTOS
Art. 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:
I - a água é um bem de domínio público;
II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;
III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a
dessedentação de animais;
IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;
V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;
VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público,
dos usuários e das comunidades.
CAPÍTULO II
DOS OBJETIVOS
Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos:
I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade
adequados aos respectivos usos;
II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas
ao desenvolvimento sustentável;
III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso
inadequado dos recursos naturais.
CAPÍTULO III
DAS DIRETRIZES GERAIS DE AÇÃO

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


245

Art. 3º Constituem diretrizes gerais de ação para implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos:
I - a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade;
II - a adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas,
econômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País;
III - a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental;
IV - a articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os
planejamentos regional, estadual e nacional;
V - a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo;
VI - a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas costeiras.
Art. 4º A União articular-se-á com os Estados tendo em vista o gerenciamento dos recursos hídricos de
interesse comum.
CAPÍTULO IV
DOS INSTRUMENTOS
Art. 5º São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos:
I - os Planos de Recursos Hídricos;
II - o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água;
III - a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos;
IV - a cobrança pelo uso de recursos hídricos;
V - a compensação a municípios;
VI - o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos.
SEÇÃO I
DOS PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 6º Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a fundamentar e orientar a
implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos.
Art. 7º Os Planos de Recursos Hídricos são planos de longo prazo, com horizonte de planejamento
compatível com o período de implantação de seus programas e projetos e terão o seguinte conteúdo
mínimo:
I - diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos;
II - análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades produtivas e de
modificações dos padrões de ocupação do solo;
III - balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade,
com identificação de conflitos potenciais;
IV - metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos
hídricos disponíveis;
V - medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, para o
atendimento das metas previstas;
VI - responsabilidades para execução das medidas, programas e projetos;
VII - cronograma de execução e programação orçamentário-financeira associados às medidas, programas
e projetos;
VIII - prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos;
IX - diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos;
X - propostas para a criação de áreas sujeitas a restrição de uso, com vistas à proteção dos recursos
hídricos.
Art. 8º Os Planos de Recursos Hídricos serão elaborados por bacia hidrográfica, por Estado e para o País.
SEÇÃO II
DO ENQUADRAMENTO DOS CORPOS DE ÁGUA EM CLASSES, SEGUNDO OS USOS
PREPONDERANTES DA ÁGUA
Art. 9º O enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água, visa a:
I - assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas;
II - diminuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas permanentes.
Art. 10º. As classes de corpos de água serão estabelecidas pela legislação ambiental.
SEÇÃO III
DA OUTORGA DE DIREITOS DE USO DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 11º. O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como objetivos assegurar o
controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água.
Art. 12º. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:
I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive
abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;
II - extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


246

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com
o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;
IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;
V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de
água.
§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:
I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais,
distribuídos no meio rural;
II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;
III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.
§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará
subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do
art. 35º desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica.
Art. 13º. Toda outorga estará condicionada às prioridades de uso estabelecidas nos Planos de Recursos
Hídricos e respeitar a classe em que o corpo de água estiver enquadrado e a manutenção de condições
adequadas ao transporte aquaviário, quando for o caso.
Parágrafo único. A outorga de uso dos recursos hídricos deverá preservar o uso múltiplo destes.
Art. 14º. A outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder Executivo Federal, dos
Estados ou do Distrito Federal.
§ 1º O Poder Executivo Federal poderá delegar aos Estados e ao Distrito Federal competência para
conceder outorga de direito de uso de recurso hídrico de domínio da União.
§ 2º O Poder Executivo Federal articular-se-á previamente com o dos Estados e o do Distrito Federal
para a outorga de direitos de uso de recursos hídricos em bacias hidrográficas com águas de domínio
federal e estadual.
Art. 15º. A outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa parcial ou totalmente, em
definitivo ou por prazo determinado, nas seguintes circunstâncias:
I - não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga;
II - ausência de uso por três anos consecutivos;
III - necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes de
condições climáticas adversas;
IV - necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental;
V - necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de
fontes alternativas;
VI - necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do corpo de água.
Art. 16º. Toda outorga de direitos de uso de recursos hídricos far-se-á por prazo não excedente a trinta e
cinco anos, renovável.
Art. 17º. A outorga não confere delegação de poder público ao seu titular.
Parágrafo único. A outorga de direito de uso de recursos hídricos não desobriga o usuário da obtenção
da outorga de serviço público prevista nas Leis nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e nº 9.074, de 7 de
julho de 1995.
Art. 18º. A outorga não implica a alienação parcial das águas que são inalienáveis, mas o simples direito
de seu uso.
SEÇÃO IV
DA COBRANÇA DO USO DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 19º. A cobrança pelo uso de recursos hídricos objetiva:
I - reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor;
II - incentivar a racionalização do uso da água;
III - obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos
planos de recursos hídricos.
Art. 20º. Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga, nos termos do art. 12º desta Lei.
Parágrafo único. Isenções de pagamento pelo uso de recursos hídricos, ou descontos nos valores a pagar,
com qualquer finalidade, somente serão concedidos mediante o reembolso, pelo poder concedente, do
montante de recursos que deixarem de ser arrecadados.
Art. 21º. Na fixação dos valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos devem ser observados,
dentre outros:
I - nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime de variação;
II - nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume lançado e seu regime de
variação e as características físico-químicas, biológicas e de toxidade do afluente.
Art. 22º. Os valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos serão aplicados
prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados e serão utilizados:

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


247

I - no financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos Hídricos;
II - no pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos e entidades integrantes
do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
§ 1º A aplicação nas despesas previstas no inciso II deste artigo é limitada a sete e meio por cento do total
arrecadado.
§ 2º Os valores previstos no caput deste artigo poderão ser aplicados a fundo perdido em projetos e obras
que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a qualidade, a quantidade e o regime de vazão
de um corpo de água.
§ 3º Até quinze por cento dos valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos de
domínio da União poderão ser aplicados fora da bacia hidrográfica em que foram arrecadados, visando
exclusivamente a financiar projetos e obras no setor de recursos hídricos, em âmbito nacional.
Art. 23º. Os valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos de domínio da União serão
consignados no Orçamento Geral da União em fontes de recursos próprias, por bacia hidrográfica,
destinadas a instituições financeiras oficiais, para as aplicações previstas no artigo anterior.
SEÇÃO V
DA COMPENSAÇÃO A MUNICÍPIOS
Art. 24º. Poderão receber compensação financeira ou de outro tipo os Municípios que tenham áreas
inundadas por reservatórios ou sujeitas a restrições de uso do solo com finalidade de proteção de recursos
hídricos.
§ 1º A compensação financeira a Município visa a ressarcir suas comunidades da privação das rendas
futuras que os terrenos, inundados ou sujeitos a restrições de uso do solo, poderiam gerar.
§ 2º Legislação específica disporá sobre a compensação prevista neste artigo, fixando-lhe prazo e
condições de vigência.
§ 3º O disposto no caput deste artigo não se aplica:
I - às áreas de preservação permanente previstas nos arts. 2º e 3º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de
1965, alterada pela Lei nº 7.803, de 18 de julho de 1989;
II - aos aproveitamentos hidrelétricos.
SEÇÃO VI
DO SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 25º. O Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos é um sistema de coleta, tratamento,
armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua
gestão.
Parágrafo único. Os dados gerados pelos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos serão incorporados ao Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos.
Art. 26º. São princípios básicos para o funcionamento do Sistema de Informações sobre Recursos
Hídricos:
I- descentralização da obtenção e produção de dados e informações;
II - coordenação unificada do sistema;
III acesso aos dados e informações garantido à toda a sociedade.
Art 27º. São objetivos do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos:
I - reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação qualitativa e quantitativa
dos recursos hídricos no Brasil;
II - atualizar permanentemente as informações sobre disponibilidade e demanda de recursos hídricos em
todo o território nacional;
III - fornecer subsídios para a elaboração dos Planos de Recursos Hídricos.
CAPÍTULO V
DO RATEIO DE CUSTOS DAS OBRAS DE USO MÚLTIPLO, DE INTERESSE COMUM OU
COLETIVO
Art. 28º. As obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo, terão seus custos rateados por todos
os seus beneficiários diretos.
CAPÍTULO VI
DA AÇÃO DO PODER PÚBLICO
Art. 29º. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, compete ao Poder Executivo
Federal:
I - tomar as providências necessárias à implementação e ao funcionamento do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos;
II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e fiscalizar os usos, na sua esfera de
competência;
III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito nacional;
IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


248

Parágrafo único. O Poder Executivo Federal indicará, por decreto, a autoridade responsável pela
efetivação de outorgas de direito de uso dos recursos hídricos sob domínio da União.
Art. 30º. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, cabe aos Poderes Executivos
Estaduais e do Distrito Federal na sua esfera de competência:
I - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os seus usos;
II - realizar o controle técnico das obras de oferta hídrica;
III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito estadual e do
Distrito Federal;
IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.
Art. 31º. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, os Poderes Executivos do Distrito
Federal e dos municípios promoverão a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso,
ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos
hídricos.
TÍTULO II
DO SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS
CAPÍTULO I
DOS OBJETIVOS E DA COMPOSIÇÃO
Art. 32º. Fica criado o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com os seguintes
objetivos:
I - coordenar a gestão integrada das águas;
II - arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos;
III - implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos;
IV - planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos hídricos;
V - promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos.
Art. 33º. Integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos:
I - o Conselho Nacional de Recursos Hídricos;
II - os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal;
III - os Comitês de Bacia Hidrográfica;
IV - os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais e municipais, cujas competências se relacionem
com a gestão de recursos hídricos;
V - as Agências de Água.
CAPÍTULO II
DO CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 34º. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é composto por:
I - representantes dos Ministérios e Secretarias da Presidência da República com atuação no
gerenciamento ou no uso de recursos hídricos;
II - representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos;
III representantes dos usuários dos recursos hídricos;
IV - representantes das organizações civis de recursos hídricos.
Parágrafo único. O número de representantes do Poder Executivo Federal não poderá exceder à metade
mais um do total dos membros do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
Art. 35º. Compete ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos:
I - promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regional,
estaduais e dos setores usuários;
II - arbitrar, em última instância administrativa, os conflitos existentes entre Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos;
III - deliberar sobre os projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o
âmbito dos Estados em que serão implantados;
IV - deliberar sobre as questões que lhe tenham sido encaminhadas pelos Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos ou pelos Comitês de Bacia Hidrográfica;
V - analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos e à Política Nacional de
Recursos Hídricos;
VI - estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos, aplicação de seus instrumentos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos;
VII - aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica e estabelecer critérios gerais
para a elaboração de seus regimentos;
VIII - aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e encaminhá-lo ao Presidente da República, para
envio, na forma de projeto de lei, ao Congresso Nacional;

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


249

IX - acompanhar a execução do Plano Nacional de Recursos Hídricos e determinar as providências


necessárias ao cumprimento de suas metas;
X - estabelecer critérios gerais para a outorga de direitos de uso de recursos hídricos e para a cobrança por
seu uso.
Art. 36º. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos será gerido por:
I - um Presidente, que será o Ministro titular do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e
da Amazônia Legal;
II - um Secretário Executivo, que será o titular do órgão integrante da estrutura do Ministério do Meio
Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia a Legal responsável pela gestão dos recursos hídricos.
CAPÍTULO III
DOS COMITÊS DE BACIA HIDROGRÁFICA
Art. 37º. Os Comitês de Bacia Hidrográfica terão como área de atuação:
I - a totalidade de uma bacia hidrográfica;
II - sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da bacia, ou de tributário desse
tributário; ou
III - grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas.
Parágrafo único. A instituição de Comitês de Bacia Hidrográfica em rios de domínio da União será
efetivada por ato do Presidente da República.
Art. 38º. Compete aos Comitês de Bacia Hidrográfica, no âmbito de sua área de atuação:
I - promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação das entidades
intervenientes;
II - arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos;
III - aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia;
IV - acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e sugerir as providências necessárias
ao cumprimento de suas metas;
V - propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações,
derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de
outorga de direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes;
VI - estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem
cobrados;
VII - aprovar o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos
hídricos;
VIII - autorizar a aplicação, fora da respectiva bacia hidrográfica, dos recursos arrecadados com a
cobrança pelo uso dos recursos hídricos, em montantes que excedam o previsto no § 3º do art. 22º desta
Lei;
IX - estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou
coletivo.
Parágrafo único. Das decisões dos Comitês de Bacia Hidrográfica caberá recurso ao Conselho Nacional
ou aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo com sua esfera de competência.
Art. 39º. Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por representantes:
I - da União;
II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que parcialmente, em suas
respectivas áreas de atuação;
III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação;
IV - dos usuários das águas de sua área de atuação;
V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.
§ 1º O número de representantes de cada setor mencionado neste artigo, bem como os critérios para sua
indicação, serão estabelecidos nos regimentos dos comitês, limitada a representação dos poderes
executivos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios à metade do total de membros.
§ 2º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias de rios fronteiriços e transfronteiriços de gestão
compartilhada, a representação da União deverá incluir um representante do Ministério das Relações
Exteriores.
§ 3º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias cujos territórios abranjam terras indígenas devem ser
incluídos representantes:
I - da Fundação Nacional do Índio - FUNAI, como parte da representação da União;
II - das comunidades indígenas ali residentes ou com interesses na bacia.
§ 4º A participação da União nos Comitês de Bacia Hidrográfica com área de atuação restrita a bacias de
rios sob domínio estadual dar-se-á na forma estabelecida nos respectivos regimentos.
Art. 40º. Os Comitês de Bacia Hidrográfica serão dirigidos por um Presidente e um Secretário, eleitos
dentre seus membros.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


250

CAPÍTULO IV
DAS AGÊNCIAS DE ÁGUA
Art 41º. As Agências de Água exercerão a função de secretaria executiva do respectivo ou respectivos
Comitês de Bacia Hidrográfica.
Art. 42º. As Agências de Água terão a mesma área de atuação de um ou mais Comitês de Bacia
Hidrográfica.
Parágrafo único. A criação das Agências de Água será autorizada pelo Conselho Nacional de Recursos
Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos mediante solicitação de um ou mais Comitês
de Bacia Hidrográfica.
Art. 43º. A criação de uma Agência de Água é condicionada ao atendimento dos seguintes requisitos:
I - prévia existência do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica;
II - viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em sua área de atuação.
Art. 44º. Compete às Agências de Água, no âmbito de sua área de atuação:
I - manter balanço atualizado da disponibilidade de recursos hídricos em sua área de atuação;
II - manter o cadastro de usuários de recursos hídricos;
III - efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos hídricos;
IV - analisar e emitir pareceres sobre os projetos e obras a serem financiados com recursos gerados pela
cobrança pelo uso de Recursos Hídricos e encaminhá-los à instituição financeira responsável pela
administração desses recursos;
V - acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos
hídricos em sua área de atuação;
VI - gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos em sua área de atuação;
VII - celebrar convênios e contratar financiamentos e serviços para a execução de suas competências;
VIII - elaborar a sua proposta orçamentária e submetê-la à apreciação do respectivo ou respectivos
Comitês de Bacia Hidrográfica;
IX - promover os estudos necessários para a gestão dos recursos hídricos em sua área de atuação;
X - elaborar o Plano de Recursos Hídricos para apreciação do respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica;
XI - propor ao respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica:
a) o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso, para encaminhamento ao respectivo Conselho
Nacional ou Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo com o domínio destes;
b) os valores a serem cobrados pelo uso de recursos hídricos;
c) o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos;
d) o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo.
CAPÍTULO V
DA SECRETARIA EXECUTIVA DO CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 45º. A Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos será exercida pelo órgão
integrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal
responsável pela gestão dos recursos hídricos.
Art. 46º. Compete à Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos:
I - prestar apoio administrativo, técnico e financeiro ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos;
II - coordenar a elaboração do Plano Nacional de Recursos Hídricos e encaminhá-lo à aprovação do
Conselho Nacional de Recursos Hídricos;
III - instruir os expedientes provenientes dos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos e dos Comitês de
Bacia Hidrográfica;
IV - coordenar o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos;
V - elaborar seu programa de trabalho e respectiva proposta orçamentária anual e submetê-los à
aprovação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
CAPÍTULO VI
DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 47º. São consideradas, para os efeitos desta Lei, organizações civis de recursos hídricos:
I - consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas;
II - associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos hídricos;
III - organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área de recursos hídricos;
IV - organizações não-govemamentais com objetivos de defesa de interesses difusos e coletivos da
sociedade;
V - outras organizações reconhecidas pelo Conselho Nacional ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos
Hídricos.
Art. 48º. Para integrar o Sistema Nacional de Recursos Hídricos, as organizações civis de recursos
hídricos devem ser legalmente constituídas.
TÍTULO III

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


251

DAS INFRAÇÕES E PENALIDADES


Art. 49º. Constitui infração das normas de utilização de recursos hídricos superficiais ou subterrâneos:
I - derivar ou utilizar recursos hídricos para qualquer finalidade, sem a respectiva outorga de direito de
uso;
II - iniciar a implantação ou implantar empreendimento relacionado com a derivação ou a utilização de
recursos hídricos, superficiais ou subterrâneos, que implique alterações no regime, quantidade ou
qualidade dos mesmos, sem autorização dos órgãos ou entidades competentes;
III - deixar expirar o prazo de validade das outorgas sem solicitar a devida prorrogação ou revalidação;
IV - utilizar-se dos recursos hídricos ou executar obras ou serviços relacionados com os mesmos em
desacordo com as condições estabelecidas na outorga;
V - perfurar poços para extração de água subterrânea ou operá-los sem a devida autorização;
VI - fraudar as medições dos volumes de água utilizados ou declarar valores diferentes dos medidos;
VII - infringir normas estabelecidas no regulamento desta Lei e nos regulamentos administrativos,
compreendendo instruções e procedimentos fixados pelos órgãos ou entidades competentes;
VIII - obstar ou dificultar a ação fiscalizadora das autoridades competentes no exercício de suas funções.
Art. 50º. Por infração de qualquer disposição legal ou regulamentar referentes à execução de obras e
serviços hidráulicos, derivação ou utilização de recursos hídricos de domínio ou administração da União,
ou pelo não atendimento das solicitações feitas, o infrator, a critério da autoridade competente, ficará
sujeito às seguintes penalidades, independentemente de sua ordem de enumeração:
I - advertência por escrito, na qual serão estabelecidos prazos para correção das irregularidades;
II - multa, simples ou diária, proporcional à gravidade da infração, de R$ 100,00 (cem reais) a R$
1O.OOO,OO (dez mil reais);
III - embargo provisório, por prazo determinado, para execução de serviços e obras necessárias ao efetivo
cumprimento das condições de outorga ou para o cumprimento de normas referentes ao uso, controle,
conservação e proteção dos recursos hídricos;
IV - embargo definitivo, com revogação da outorga, se for o caso, para repor incontinenti, no seu antigo
estado, os recursos hídricos, leitos e margens, nos termos dos arts. 58º e 59º do Código de Águas ou
tamponar os poços de extração de água subterrânea.
§ 1º Sempre que da infração cometida resultar prejuízo a serviço público de abastecimento de água, riscos
à saúde ou à vida, perecimento de bens ou animais, ou prejuízos de qualquer natureza a terceiros, a multa
a ser aplicada nunca será inferior à metade do valor máximo cominado em abstrato.
§ 2º No caso dos incisos III e IV, independentemente da pena de muita, serão cobradas do infrator as
despesas em que incorrer a Administração para tomar efetivas as medidas previstas nos citados incisos, na
forma dos arts. 36º, 53º, 56º e 58º do Código de Águas, sem prejuízo de responder pela indenização dos
danos a que der causa.
§ 3º Da aplicação das sanções previstas neste título caberá recurso à autoridade administrativa
competente, nos termos do regulamento.
§ 4º Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
TÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS
Art 51º. Os consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas mencionados no art. 47º
poderão receber delegação do Conselho Nacional ou dos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, por
prazo determinado, para o exercício de funções de competência das Agências de Água, enquanto esses
organismos não estiverem constituídos.
Art. 52º. Enquanto não estiver aprovado e regulamentado o Plano Nacional de Recursos Hídricos, a
utilização dos potenciais hidráulicos para fins de geração de energia elétrica continuará subordinada à
disciplina da legislação setorial específica.
Art 53º. O Poder Executivo, no prazo de cento e vinte dias a partir da publicação desta Lei, encaminhará
ao Congresso Nacional projeto de lei dispondo sobre a criação das Agências de Água.
Art. 54º. O art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. Iº .............................................. .......................................................
III - quatro inteiros e quatro décimos por cento à Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio
Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal;
IV - três inteiros e seis décimos por cento ao Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica -
DNAEE, do Ministério de Minas e Energia;
V - dois por cento ao Ministério da Ciência e Tecnologia.
§ 4º A cota destinada à Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos
Hídricos e da Amazônia Legal será empregada na implementação da Política Nacional de Recursos
Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e na gestão da rede
hidrometeorológica nacional.

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini


252

§ 5º A cota destinada ao DNAEE será empregada na operação e expansão de sua rede


hidrometeorológica, no estudo dos recursos hídricos e em serviços relacionados ao aproveitamento da
energia hidráulica."
Parágrafo único. Os novos percentuais definidos no caput deste artigo entrarão em vigor no prazo de
cento e oitenta dias contados a partir da data de publicação desta Lei.
Art. 55º. O Poder Executivo Federal regulamentará esta Lei no prazo de cento e oitenta dias, contados da
data de sua publicação.
Art. 56º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 57º. Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 8 de janeiro de 1997, 176º da Independência e 109º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Engenharia de Recursos Hídricos – Notas de Aula Mauro Naghettini

Вам также может понравиться