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UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ

Judá Midiã de Toledo Borges Santos

Variações no uso de pronomes relativos


na fala de pessoas escolarizadas e reflexões
sobre o ensino

Taubaté - SP
2016
Judá Midiã de Toledo Borges Santos

Variações no uso de pronomes relativos


na fala de pessoas escolarizadas e reflexões
sobre o ensino

Trabalho de Graduação apresentado como


requisito parcial para a graduação em Letras,
pela Universidade de Taubaté.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Aparecida


Garcia Lopes Rossi

Taubaté - SP
2016
Ficha Catalográfica elaborada pelo
SIBi – Sistema integrado de Bibliotecas – UNITAU

S237v Santos, Judá Midiã de Toledo Borges


Variações no uso de pronomes relativos na fala de
pessoas escolarizadas e reflexões sobre o ensino.
/Judá Mídiã de Toledo Borges Santos. - 2016.
38f. : il.

Monografia (graduação) - Universidade de


Taubaté, Departamento de Ciências Sociais e
Letras, 2016.
Orientação: Profª Drª. Maria Aparecida Garcia
Lopes- Rossi, Departamento de Ciências Sociais e
Letras.

1. Pronome relativo. 2. Variação. 3. Norma padrão.


4. Ensino de Língua Portuguesa. I. Título
Judá Midiã de Toledo Borges Santos

Variações no uso de pronomes relativos


na fala de pessoas escolarizadas e reflexões sobre o ensino

Trabalho de Graduação apresentado como


requisito parcial para a graduação em Letras,
pela Universidade de Taubaté.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Aparecida


Garcia Lopes Rossi

Data: _____ / _____ / ______

Resultado: ___________________

BANCA EXAMINADORA

Professora Dra.: Maria Aparecida Garcia Lopes-Rossi

Assinatura: ____________________________________

Professora Ma.: Renata Aparecida de Freitas

Assinatura: ____________________________________

Professora Dra.: Eveline M. Tápias Oliveira

Assinatura: ____________________________________
Ao meu querido avô, Lúcio de Toledo (in
memorian), por me incentivar aos estudos desde
que eu era criança, e por acreditar que, por meio
dos estudos, eu alcançaria todos os meus
objetivos.
AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Profa. Dra. Maria Aparecida Garcia Lopes Rossi, por ter
aceitado orientar-me no desenvolvimento deste trabalho, ter acreditado em mim e,
principalmente, por ter sido tão dedicada e prestativa comigo. Uma das maiores
motivações para acreditar na melhoria do ensino no Brasil. Desejo ser merecedora
de todo seu esforço e dedicação.
À minha mestra e grande amiga, Profa. Ma. Renata Aparecida de Freitas, por
tudo que me ensinou e ensina. Obrigada por cada momento de conhecimento
compartilhado, e por me ensinar com tanta ternura.
À minha mestra, Profa. Dra. Eveline M. Tápias Oliveira, por me ensinar com
total dedicação e paciência.
Aos meus professores, que também contribuíram para que eu tivesse uma
formação sólida e íntegra: Dra. Vera L. Batalha de S. Renda, por ter-me orientado
com afinco durante minha atuação no Pibid (Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação à Docência); Dra. Márcia Maria Dias Reis Pacheco; Ma. Diese Nancy Urias
de Morais; Ma. Andreia Alda de O. F. Valério; Ma. Thaís Travassos; Me. Luzimar G.
Gouvêa; Me. Silvio Luiz da Costa; Ma. Cristiane Moreira Cobra; Dra. Isabelita
Crosariol e Me. Silvio dos Santos.
À Capes, por ter-me concedido uma bolsa do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid).
Ao Programa Escola da Família, por ter-me concedido bolsa integral no curso
de Letras.
Ao Colégio Basic de Taubaté e toda sua equipe, onde aprendi muito, no
âmbito pessoal e profissional. Em especial, ao diretor Silvio Antônio de Oliveira, à
coordenadora pedagógica Maria Signorete da Costa e aos professores Diva Garcia
Gobo, Cristina Máximo Dias e Mayky Lauton.
À Escola de Aplicação Dr. Alfredo José Balbi (Colégio Unitau), por me permitir
colocar em prática os conhecimentos adquiridos na graduação. Em especial, à
professora Ma. Renata Aparecida de Freitas, que me orientou em todo o processo
desse estágio.
Agradeço a minha mãe, Ana Cristina de Toledo, pelo amor incondicional e
incentivo. Jamais me esquecerei de todas as vezes que a senhora abdicou de seus
sonhos para se dedicar a mim e aos meus irmãos. Ao meu pai, Wanderlei, e aos
meus irmãos, por sempre acreditarem que eu conseguiria chegar até aqui. Eu os
amo imensuravelmente.
Aos meus sogros, Gleide e Jolival. Obrigada pelo carinho.
Ao meu esposo, Klaus Silva dos Santos, pela paciência, por cuidar de mim
com tanto amor, por ser meu grande companheiro e melhor amigo, e,
principalmente, por ser meu maior incentivador aos estudos. Amo-te
irrevogavelmente.
Aos meus amigos de curso, pois todos, de maneira direta ou indireta,
contribuíram para o meu percurso. Em especial aos meus amigos Eliana, Aline,
Beatriz, Isabelle, João e Augusto. Obrigada por trilharem esse caminho de mãos
dadas comigo.
Por fim, e, acima de tudo, agradeço a Deus.
Uma das práticas pedagógicas indispensáveis para
o ensino/aprendizagem da expressão culta é
precisamente despertar a consciência dos alunos
para a variação linguística, a fim de que eles
percebam os pontos críticos que distanciam a
variedade que eles aprenderam em casa das
variedades cultas, e possam trabalhar
sistematicamente, ao longo da escolaridade básica,
para dominar estas últimas.
(FARACO, 2015, p. 27)
RESUMO

Esta pesquisa apresenta como tema as variações no uso de pronomes relativos na


fala de pessoas escolarizadas, com base em dados atuais retirados da grande
imprensa. O problema que motivou essa pesquisa é a dificuldade no ensino dos
pronomes relativos de acordo com a norma padrão por causa da variação linguística
existente na língua falada. O objetivo geral desta pesquisa é o estudo das variações
no uso de pronomes relativos na fala de pessoas escolarizadas, visando ao ensino
da língua portuguesa. Especificamente, os objetivos são: 1) Fazer um levantamento
das variações no uso de pronomes relativos, na fala de pessoas escolarizadas
produzida na grande imprensa; 2) Tecer considerações sobre o ensino desse tópico
gramatical a partir das variações observadas. Há duas vertentes para a justificativa
deste trabalho. A primeira refere-se à ampliação do meu conhecimento sobre a
variação linguística dos pronomes relativos na língua portuguesa do Brasil, sobre a
discussão a respeito do ensino da norma padrão e recursos (meios ou modos) para
melhor trabalhar com esse assunto em sala de aula. A segunda justificativa
relaciona-se à contribuição para os professores que vierem a ter contato com essa
pesquisa, pois o trabalho lhes proporcionará dados atualizados sobre o uso desses
pronomes pela grande imprensa. Esta pesquisa se fundamenta teoricamente nos
principais conceitos sobre sociolinguística e variação linguística; no conceito de
norma padrão; na abordagem da gramática normativa sobre os pronomes relativos;
em um estudo sociolinguístico sobre os pronomes relativos no português do Brasil; e
na proposta atual da Linguística Aplicada para o ensino da norma padrão. O corpus
desta pesquisa constitui-se de 20 contextos em que um pronome relativo
acompanhado de preposição, o pronome relativo “cujo” ou o pronome relativo “onde”
deveria aparecer. Foi coletado por meio de gravações de programas de televisão e
rádio (jornalismo, programas de entrevistas e de debates), cujos participantes são
pessoas com nível de escolaridade superior. Todas as gravações foram realizadas
no segundo semestre do ano de 2016. Os resultados mostraram que a norma
padrão é usada em apenas 30% das ocorrências coletadas; “que” como pronome
relativo genérico, com vazio de preposição, é a estratégia popular mais frequente
(50%); “onde” e “aonde” são usados inadequadamente em 20% dos casos. Conclui-
se que o ensino do pronome relativo de acordo com a norma padrão é necessário,
mas precisa ser feito a partir da observação de todo esse quadro de variação da
língua falada para que o aluno perceba as diferenças entre a norma padrão e as
variantes populares.

Palavras chaves: Pronome relativo. Variação linguística. Norma padrão. Ensino de


língua portuguesa.
RESUMEN

Este trabajo presenta como tema las variaciones del uso de los pronombres relativos
en el habla de personas escolarizadas, basado en datos actuales retirados de la
prensa. El problema que motivó esta investigación es la dificultad en la enseñanza
de los pronombres relativos de acuerdo con la norma estándar de la lengua
portuguesa debido a la variación lingüística existente en el lenguaje hablado. El
objetivo general de esta investigación es el estudio de las variaciones en el uso de
los pronombres relativos en el habla de personas escolarizadas, dirigidas a la
enseñanza de la lengua portuguesa. En concreto, los objetivos son: 1) hacer un
estudio de las variaciones en el uso de los pronombres relativos, en el habla de
personas escolarizadas producidas en la prensa; 2) tejer consideraciones sobre la
enseñanza de este tópico gramatical desde las variaciones observadas. Hay dos
justificativas para esta investigación. La primera se refiere a la ampliación de mi
conocimiento sobre la variación lingüística de los pronombres relativos en portugués
de Brasil, sobre la discusión a respeto de la enseñanza de la norma estándar y los
recursos (medios o formas) para mejor trabajar con ese tema en clase. La segunda
razón está relacionada a la contribución a los profesores que vengan a tener
contacto con esta investigación, pues este trabajo les proporcionará datos
actualizados sobre el uso de eses pronombres por la prensa. Esta investigación se
basa teóricamente en los principales conceptos sobre sociolingüística y variación
lingüística; en el concepto de norma estándar; en el abordaje de la gramática
normativa de los pronombres relativos; en un estudio sociolingüístico sobre los
pronombres relativos en portugués de Brasil; y en la propuesta actual de la
Lingüística Aplicada a la enseñanza de norma estándar. El corpus de esta
investigación está formado por 20 contextos en que un pronombre relativo
acompañado de preposición, el pronombre relativo “cujo” o el pronombre relativo
“onde” debería aparecer. Fue recogido por medio de grabaciones de programas de
televisión y radio (periodismo, programas de entrevistas y programas de debates),
cuyos membros son personas con educación terciaria. Todas las grabaciones fueran
realizadas en la segunda mitad del año de 2016. Los resultados mostraron que la
norma estándar es utilizada en apenas 30% de los datos colectados; “que” como
pronombre relativo genérico, como vacio de preposición, es el uso más frecuente
(50%); “onde” e “aonde” se usan de forma inapropiada en el 20% de los casos. Se
concluye que la enseñanza de lo pronombre relativo de acuerdo con la norma
estándar se hace necesaria, pero hay que hacerlo a partir de la observación de todo
ese cambio en el contexto de la lengua hablada para que el aluno perciba las
diferencias entre la norma estándar y las variaciones populares.

ETIQUETAS: Pronombre relativo. Variación lingüística. Norma padrón. Enseñanza


de la lengua portuguesa.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
CAPÍTULO 1: VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E NORMA PADRÃO
1.1 A língua é um conjunto de variantes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.2 O ensino da norma padrão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
CAPÍTULO 2: PRONOME RELATIVO: NORMA PADRÃO E
VARIAÇÃO LINGUÍSTICA
2.1 O que é gramática normativa? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.2 O que diz a gramática normativa sobre os pronomes relativos? . . . . . . . . . .21
2.3 A variação linguística dos pronomes relativos no Português do Brasil. . .24
CAPÍTULO 3: PRONOMES RELATIVOS E SUAS VARIANTES NA FALA DE
PESSOAS ESCOLARIZADAS
3.1 O corpus da pesquisa. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
3.2 Análise do corpus da pesquisa. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.3 Algumas considerações sobre o ensino de pronomes relativos . . . . . . . . . . .34
CONCLUSÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
REFERÊNCIAS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
10

INTRODUÇÃO

O tema da presente pesquisa são as variações no uso de pronomes relativos


na fala de pessoas escolarizadas, com base em dados atuais retirados da grande
imprensa. O problema que motivou essa pesquisa é a dificuldade no ensino dos
pronomes relativos de acordo com a norma padrão. A pesquisa pioneira sobre o
tema desenvolvida por Tarallo (1983, apud TARALLO, 1985) demonstrou grande
variação sociolinguística existente no português falado no Brasil. As formas padrão
do pronome relativo estão praticamente restritas à escrita formal. Pode-se, assim,
relacionar a dificuldade dos alunos diante da aprendizagem da norma culta ao fato
de esses usarem formas populares dos pronomes relativos, ouvirem no dia a dia
apenas formas populares e, assim, não terem acesso à norma padrão desses
pronomes.
De acordo com Faraco (2015), é preciso que a escola seja uma experiência
sociocognitiva para os alunos no sentido de eles poderem vivenciar práticas
socioculturais de leitura, escrita e fala e poderem dominar as variedades linguísticas
características dessas práticas. Em grande parte dessas práticas é necessário o
domínio de variedades linguísticas da norma padrão.
O docente deve, dessa maneira, perceber a necessidade de mudança no
processo de ensino de língua portuguesa, devendo encontrar um método eficiente
para que a aprendizagem da norma seja garantida a todos os alunos, principalmente
àqueles que não estão familiarizados com o uso da norma padrão. Contudo, o
ensino da norma padrão não deve descartar as variáveis utilizadas pelos alunos,
mas contribuir com a reflexão sobre as variedades linguísticas e a adequação do
uso nas diversas circunstâncias.
Como afirma Faraco (2015, p. 27):
Uma das práticas pedagógicas indispensáveis para o ensino/aprendizagem
da expressão culta é precisamente despertar a consciência dos alunos para
a variação linguística, a fim de que eles percebam os pontos críticos que
distanciam a variedade que eles aprenderam em casa das variedades
cultas, e possam trabalhar sistematicamente, ao longo da escolaridade
básica, para dominar estas últimas.

O objetivo geral desta pesquisa é o estudo das variações no uso de pronomes


relativos na fala de pessoas escolarizadas, visando ao ensino da língua portuguesa.
Especificamente, os objetivos são: 1) Fazer um levantamento das variações no uso
11

de pronomes relativos, na fala de pessoas escolarizadas produzida na grande


imprensa; 2) Tecer considerações sobre o ensino desse tópico gramatical a partir
das variações observadas.
As perguntas que esta pesquisa pretende resolver são: 1) Quais são as
variações no uso de pronomes relativos, na fala de pessoas escolarizadas produzida
na grande imprensa atualmente?; 2) O que se pode sugerir sobre o ensino desse
tópico gramatical a partir das variações observadas?
Esta pesquisa parte de duas hipóteses: A primeira é que mesmo os falantes
escolarizados, no caso repórteres ou convidados de programas televisivos e
rediofônicos de debate ou jornalísticos, não usam unicamente as formas padrão de
pronomes relativos, ou seja, também fazem uso de formas populares desse
pronome. A segunda é que é possível utilizar os dados dessa pesquisa na
elaboração de exercícios para que os alunos reflitam sobre a variação
sociolinguística dos pronomes relativos e pratiquem a norma padrão.
Há duas vertentes para a justificativa deste trabalho. A primeira refere-se à
ampliação do meu conhecimento sobre a variação linguística dos pronomes relativos
na língua portuguesa do Brasil, sobre a discussão a respeito do ensino da norma
padrão e recursos (meios ou modos) para melhor trabalhar com esse assunto em
sala de aula. A segunda justificativa relaciona-se à contribuição para os professores
que vierem a ter contato com essa pesquisa, pois o trabalho lhes proporcionará
dados atualizados sobre o uso desses pronomes pela grande imprensa. E, apesar
de haver várias pesquisas referentes a esse tema, esta surge para reforçar o que as
pesquisas anteriores a essa já mostraram e mostra, numa situação mais atual do
idioma, a utilização desses pronomes. Sendo assim, o presente trabalho
proporcionará uma quantidade de exemplos atuais que podem ser utilizados em sala
de aula, servindo para a reflexão e atualização dos professores de Língua
Portuguesa sobre o assunto e para minha própria formação docente.
Esta pesquisa se fundamenta teoricamente nos principais conceitos sobre
sociolinguística e variação linguística; no conceito de norma padrão; na abordagem
da gramática normativa sobre os pronomes relativos; em um estudo sociolinguístico
sobre os pronomes relativos no português do Brasil; e na proposta atual da
Linguística Aplicada para o ensino da norma padrão.
O corpus desta pesquisa constitui-se de 20 contextos em que um pronome
relativo acompanhado de preposição, o pronome relativo “cujo/cuja/cujos/cujas” com
12

ou sem preposição ou o pronome relativo “onde” deveria aparecer. Foi coletado por
meio de gravações de programas de televisão e rádio (jornalismo, programas de
entrevistas e de debates). Os participantes desses programas são pessoas com
nível de escolaridade superior. Todas as gravações foram realizadas no segundo
semestre do ano de 2016. Na apresentação dos dados, no capítulo três, as datas e
os nomes dos programas de televisão e de rádio fontes dos dados serão
explicitados.
Os pronomes relativos na função de sujeito e de objeto direto não são
acompanhados por preposição e são expressos apenas por “que” ou “o/a qual; os/as
quais”. Como será comentado no capítulo 2, esses casos não oferecem dificuldade
para o uso da norma padrão. Portanto, não serão objeto de estudo nesta pesquisa.
Os casos de pronomes relativos coletados nos programas de televisão e de rádio
são aqueles que ocupam função sintática que exigem preposição, bem como os
pronomes relativos “cujo/cuja/cujos/cujas” com ou sem preposição e o pronome
relativo “onde”. De acordo com estudos sociolinguísticos comentados no capítulo 2,
esses são os pronomes relativos que apresentam variações no português brasileiro
falado. São, pois, os dados que interessam para esta pesquisa e que foram
coletados das gravações, tanto nas ocorrências de acordo com a norma padrão
quanto nas ocorrências em formas populares.
Este trabalho de graduação divide-se em três capítulos. O primeiro capítulo
apresenta conceitos sobre a variação linguística e a norma padrão, bem como a
discussão feita por alguns autores sobre o problema do ensino de língua portuguesa
e a dúvida a respeito de qual variedade da língua ensinar. O segundo capítulo
aborda as características da gramática normativa e suas prescrições sobre o uso
dos pronomes relativos, além de resultados de estudo sociolinguístico sobre o uso
desses pronomes no português do Brasil. O terceiro capítulo apresenta os dados
desta pesquisa sobre o uso de pronomes relativos coletados de falantes
escolarizados, a partir de gravações de programas de televisão e de rádio. Esse
capítulo é finalizado com considerações sobre o ensino da norma padrão referente a
esse tópico.
Este trabalho de graduação finaliza-se com as conclusões e referências.
13

CAPÍTULO 1
VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E NORMA PADRÃO

O presente capítulo trata da variação da língua e da norma padrão. A língua é


apresentada como sendo um conjunto de variantes composto por formas padrão e
por variantes populares. O ensino da norma padrão é comentado com relação ao
problema do ensino de língua portuguesa diante da variação linguística.

1.1 A língua é um conjunto de variantes

O termo “língua portuguesa” é ambíguo e se aplica a diferentes formas dessa


língua, as quais os falantes da língua podem distinguir claramente. A exemplo:
podemos perceber a diferença entre a fala de um português de Portugal e a fala de
um brasileiro de Belo Horizonte, ou mesmo a diferença entre a língua escrita e a
língua falada de uma mesma região do país a que a língua corresponde, como
explica Perini (1996). As formas da língua regidas pela gramática normativa são as
correspondentes à língua padrão, usada em situações mais formais, principalmente
na escrita. Além dessas, há muitas outras formas usadas em situações coloquiais. O
autor explica que nem o padrão nem as formas coloquiais são totalmente
homogêneos.
As diversas formas de variedades linguísticas (variantes), na fala, são
empregadas de acordo com as situações específicas, ou seja, qualquer pessoa
pode modificar sua maneira de falar de acordo com quem ela fala (o modo como
alguém conversa com um amigo não é mesmo que se emprega em uma entrevista
de emprego, e assim por diante). Cada variante se aplica a uma situação específica
e, na maioria das vezes, não pode ser substituída por outras sem causar estranheza
ou mesmo impossibilitar a comunicação. Sendo assim, essas variações são próprias
para cada situação de comunicação (ensaio científico, discurso de formatura,
conversa com os amigos, reunião de trabalho, etc.), de acordo com Perini (1996).
Segundo Castilho (1988), há um conceito amplo (conhecido como um
conceito de coesão textual), e um conceito estrito que governa a língua, referente
aos usos e aspirações da classe social mais abastada. No sentido amplo, a norma
refere-se à necessidade do grupo social de defender a sua forma de comunicação
14

das modificações (variações) que podem surgir com o passar do tempo devido a
vários fatores. No sentido restrito, a norma destina-se aos usos e ações do grupo
sócio cultural de nível mais elevado, devido a razões políticas, econômicas e
culturais.
Para Castilho (1988), não há português certo ou errado, mas modalidades de
prestígio e modalidades desprestigiadas, as quais correspondem ao meio em que
está inserido o indivíduo. A norma culta é modelo de língua desde a época colonial,
e é praticada pela classe social de prestígio. O aprendizado da norma culta da
língua traz benefícios como aumento de vocabulário e articulação das palavras para
quem a aprende, contudo a escola não deve ignorar as variantes linguísticas, como
explica o autor. O indivíduo deve aprender a norma culta além do português que já
fala, para que assim possa usar uma ou outra maneira de acordo com as
circunstâncias.
Todas as línguas variam de acordo com o nível de contato entre os seus
falantes. Significa, então, que um mesmo idioma tem suas variações linguísticas,
sejam essas regionais ou culturais. (CAMACHO, 1988). Há quatro modalidades
particulares de variação na língua, segundo esse autor.
Primeiramente há a variação histórica, a qual resulta na modificação da
língua ao longo dos séculos e em ajustes da norma padrão. Essas variantes antigas
são identificadas atualmente em descrições sobre a história da língua ou em obras
literárias passadas, tornando-se menos importantes do que as da atualidade e
consideradas obsoletas. Em segundo, existe a variação geográfica, dependendo da
região na qual está inserido o falante (dentro de uma mesma nação), o modo de
pronúncia, estrutura sintática e vocabulário apresentam suas peculiaridades
(regionalismo). Em terceiro, há a variação social, que ocorre como consequência da
variação da língua utilizada e determinada pelos indivíduos de um mesmo meio
social e cultural da sociedade. Por último, existe a variação estilística, sobre a qual o
autor esclarece que não há forma homogênea de se falar mesmo dentro de um
mesmo contexto social e regional da língua, ou seja, o estilo linguístico será adotado
conforme a situação exigir. Por exemplo, um advogado não manterá um diálogo com
seus amigos da mesma maneira que manterá uma conversa com um de seus
clientes (em âmbito profissional).
Portanto, os vários autores que abordam o assunto “variação linguística”
concordam que todas as línguas apresentam variações em diferentes aspectos.
15

1.2 O ensino da norma padrão

Diante da variedade linguística, coloca-se o problema do ensino de língua


portuguesa. Que variedade da língua ensinar?
“Qualquer indivíduo normal que entre na escola para ser alfabetizado em sua
língua materna já é senhor de sua língua, na modalidade oral própria a sua
comunidade de fala.” (MATTOS e SILVA, 2004, p.27). Com isso a autora quer dizer
que a escola não ensina “a Língua Portuguesa” porque a Língua Portuguesa não é
homogênea. Algumas variantes dessa língua a criança já domina. A escola vai
ensinar a variante padrão (culta) da língua.
O Professor deve sentir gosto por ensinar a língua materna, de modo que seu
ensino não aconteça por mera obrigação. O processo de ensino da língua materna
culta deve ampliar a capacidade linguística do falante nativo, sem, contudo, ignorar
ou se sobrepor às variantes da língua utilizadas pelos diferentes grupos de falantes.
Essas variantes (naturais a determinados grupos) são fenômenos históricos, típicos
de cada grupo de falantes. A escola tradicional visa levar o aluno a dominar a língua
padrão, o que consequentemente, salvo exceções, não causa muito estranhamento
apenas àqueles que pertencem a classes socioculturais nas quais esse padrão é
usado (MATTOS e SILVA, 2004).
Ainda de acordo com Mattos e Silva (2004), o ensino da língua, desde o início
da alfabetização do aluno, é direcionado para a “língua de cultura”, que, mais do que
a norma culta, é a língua que se refere somente à cultura letrada das classes
dominantes. A escola tradicionalmente vem ignorando as variantes linguísticas
(reflexo das diferenças que constituem a sociedade brasileira). Dessa forma, o
ensino da língua padrão nas escolas tende a fracassar, pois o ensino da língua deve
considerar a língua num todo. A forma padrão deve ser ensinada com o intuito de
esclarecer ao aluno que é preciso aprendê-la não para que essa se sobreponha a
sua maneira de falar, mas para que seja utilizada em situações mais formais. Sendo
assim, o ensino deve deixar claro que é preciso saber mais sobre a língua padrão,
que é necessário conhecê-la para saber como utilizá-la de acordo com cada
necessidade de comunicação.
Segundo Perini (1996), o objetivo maior do ensino de língua portuguesa na
escola é fazer com que os alunos leiam e escrevam bem. Dentro dessa expectativa,
o autor questiona se o ensino de gramática pode contribuir ou não para o
16

desenvolvimento dessas duas habilidades. Ainda na concepção do autor, o estudo


de gramática no primeiro e segundo graus não proporciona ao aluno o máximo do
ensino de língua portuguesa. Para ele, o ensino não pode ser apenas transmissão
de conhecimento, mas deve desenvolver nos alunos habilidades intelectuais que
lhes permitam fazer observações, raciocinar e chegar a conclusões sobre o que está
sendo estudado. Ou seja, o ensino deve proporcionar ao aluno um pensamento
autônomo a respeito daquilo que está sendo estudado.
Para o autor, é preciso saber ler bem para que se consiga boa compreensão
ao se estudar gramática, sendo assim, para o autor, o estudo de gramática no
primeiro e segundo graus não leva à boa escrita e à boa leitura, mas o caminho
reverso, a boa leitura e a boa escrita contribuem para o bom entendimento de
gramática. Contudo, o autor não inutiliza o estudo da gramática, pois entende que
essa tem uma função indispensável na construção intelectual do aluno, que pode ser
analisada em três componentes do ensino cognitivo:
a) Componente de aplicação imediata: conhecimentos válidos à vida profissional ou
diária dos alunos;
b) Componente “cultural”: conhecimentos praticamente sem função à vida prática,
entretanto que são considerados essenciais de serem adquiridos;
c) Componente de formação de habilidades: visa desenvolver nos alunos
competências intelectuais de observação e raciocínio.
Perini (1996) defende que a gramática é uma ciência social que sofreu maior
desenvolvimento ao longo do tempo e que constitui o que há de mais básico nos
acontecimentos sociais: a linguagem. Sendo assim, o autor reforça que o
conhecimento da língua em geral, sobretudo a gramática, é essencial no ensino do
primeiro e segundo graus pela mesma justificativa de se ensinar aos alunos
conteúdos de química, biologia, história ou astronomia.
De acordo com Scherre (2005), a gramática normativa é, geralmente, produto
dos conjuntos sociais mais abastados. A Autora esclarece que, ao ensinar a
gramática normativa, o professor de português não está ensinando língua materna,
mas a norma culta que a rege. A questão que a autora ressalta é que se ensina
gramática normativa garantindo que está se ensinando língua materna, como se a
variante padrão da língua fosse a única representante da língua. Segundo Scherre
(2005), o que pode ser ensinado e aprendido é a norma culta ou a gramática
17

normativa de uma determinada língua, de uma segunda língua, língua estrangeira


ou mesmo de um dialeto.
Conforme explica Duarte (2012), o ensino da gramática, mais do que
meramente proporcionar ao aluno que este leia e escreva melhor, é um meio que
permite a ele inserir-se socialmente. A autora defende que, no primeiro ciclo do
Ensino Fundamental, o ensino de gramática não deve ser priorizado para dar lugar à
escrita do aluno e à expressão oral, na qual a criança poderia, por exemplo, recitar
um poema ou contar uma história que leu. Cita, ainda, que o ensino de gramática só
deve acontecer, de fato, a partir do segundo ciclo do Ensino Fundamental.
No que diz respeito à escrita, Duarte (2012) defende que esta deve ser tão
estimulada quanto a prática da expressão oral nos primeiros anos do Ensino Básico.
O aluno deve ser estimulado a escrever sobre o que vem aprendendo em outras
matérias, ou descrever um amigo ou lugar, sem que, contudo, este estímulo venha
intitulado como “Dia de redação”. De acordo com a autora, o ato de escrever não
deve ser visto como uma atividade separada das outras atividades escolares, mas
como parte fundamental das aulas. A autora garante que, com a prática de leitura e
de escrita no primeiro ciclo do Ensino Fundamental, o aluno naturalmente melhorará
sua escrita, percebendo e corrigindo seus erros ortográficos, erros de concordância
(nominal e verbal) entre outras questões linguísticas. O professor deve observar
esses aspectos e promover atividades de reescrita que levarão o aluno à boa
escrita.
Segundo Duarte (2012), o momento propício para se ensinar gramática é a
partir do segundo ciclo do Ensino Fundamental, o que inclui também o Ensino
Médio, séries essas nas quais os alunos poderão refletir sobre a gramática de
sincronias passadas. A gramática de sincronias passadas refere-se àquela
encontrada em textos antigos de literatura clássica, como, por exemplo, nos textos
clássicos de Machado de Assis. Como a autora esclarece, para que o aluno absorva
o conhecimento que a escola quer transmitir a ele, precisa compreender aquilo que
é lido. Sendo assim, se o professor o expõe a leitura de textos com conteúdo
gramatical de sincronias passadas e apresenta a ele essas formas gramaticais
praticamente extintas na gramática contemporânea, contribui para que ele amplie
seus conhecimentos linguísticos. Dessa maneira o aluno poderá compreender aquilo
que lê. Segunda a autora, essa é uma maneira de estudar formas mais antigas da
gramática da língua “sem excesso de metalinguagem, como um exercício de viagem
18

ao passado” (p.50). Dessa forma, o aluno poderá observar as mudanças sofridas


pela linguagem ao longo do tempo.
De acordo com a autora, é imprescindível que o professor deixe claro para os
alunos que entre essas mudanças ou variações da língua não existe uma que seja
melhor que a outra, senão que existem variações, que serão empregadas de acordo
com cada necessidade de comunicação ou época. Contudo, para que essa
exposição do aluno às variações ou modificações da língua seja suficiente para
mostrar-lhe tais diferenças, é conveniente que o professor demonstre isso a ele
apenas no segundo ciclo do Ensino Fundamental.
Por fim, a autora sugere que o professor faça considerações sobre as
diferenças entre o que se fala e o que se deve escrever na modalidade padrão da
língua. Isso é importante para que o aluno perceba a distância entre essas
modalidades e as variantes linguísticas adequadas para cada uma delas.
19

CAPÍTULO 2
PRONOME RELATIVO: NORMA PADRÃO E VARIAÇÃO
LINGUÍSTICA

Neste capítulo, são apresentadas as regras da norma padrão para o uso dos
pronomes relativos e os resultados do estudo sociolinguístico de Tarallo (1983 apud
TARALLO, 1985). Inicialmente é descrito o que vem a ser a gramática normativa,
bem como suas origens, e como nos é apresentada atualmente. Na sequência,
apresenta-se o que os gramáticos Cunha e Cintra (1985) e Bechara (2009) explicam
sobre o uso dos pronomes relativos de acordo com a gramática normativa. Por fim, é
demonstrada a variação no uso dos pronomes relativos no Português do Brasil.

2.1 O que é gramática normativa?

De acordo com Vieira (2016), a gramática normativa tem suas origens


filosóficas nos estudos linguísticos da filosofia grega clássica, tornando-se referência
tradicional desde os gramáticos alexandrinos até os gramáticos normativos
brasileiros contemporâneos. Os alexandrinos defendiam a língua, a literatura
clássica grega e o estilo de poetas e prosadores renomados como sendo modelo de
norma padrão para língua entre os séculos III e II a. C. Nesse período os principais
gramáticos alexandrinos eram: Aristarco, Dionísio, Apolônio e Herodiano.
Ainda segundo Vieira (2016), é importante ressaltar que a língua grega
tomada como modelo já havia sofrido mutações nos últimos séculos. Apesar de os
alexandrinos perceberem que a língua que tanto defendiam como sendo correta não
se identificava com nenhum dialeto grego utilizado naquela época, na busca por
manterem intacta a língua modelo, esses filósofos gramáticos gregos cometeram
dois erros substanciais: “a distorção das relações entre a fala e a escrita; e a
assunção da visão negativa da mudança linguística, considerada prejudicial à
pureza do idioma grego” (p.23). Dessa maneira, os alexandrinos trouxeram como
tradição a ideia de gramática normativa com base num preconceito linguístico e na
má compreensão sobre o que realmente é a língua. Assim sendo, transmitiram para
os gramáticos modernos essa ideologia da correção linguística, a qual permanece
até os dias atuais e que pode ser observada nas gramáticas brasileiras.
20

De acordo com Vieira (2016), os gramáticos normativos brasileiros


contemporâneos mais influentes são: Eduardo Carlos Pereira, Firmino Costa, Said
Ali, Napoleão Mendes de Almeida, Rocha Lima, Artur de Almeida Torres, Gladstone
Chaves de Melo, Domingos Paschoal Cegalla, Evanildo Bechara, Cunha e Cintra. As
gramáticas normativas brasileiras desses autores vêm com a tradição greco-romana,
as quais, em estrutura e conteúdo, seguem fielmente o padrão das gramáticas
normativas criadas pelos romanos, copiadas dos gregos. Tanto que tal padrão pode
ser observado no fato de Dionísio (filósofo gramático do século I a. C.) ter grande
influência na definição de classes gramaticais da atualidade. Ele dividia essas
classes de palavras em oito (nome, verbo, particípio, artigo, pronome, preposição,
advérbio e conjunção), chamando-as de “Partes do discurso”, enquanto que os
gramáticos atuais chamam essas partes da gramática de “Classes de palavras”. Na
contemporaneidade, essas oito classes de palavras permanecem sendo acrescidas
de duas (interjeição e numeral) na gramática normativa brasileira. Os gramáticos
normativos portugueses e brasileiros mantiveram a tradição gramatical Greco-
romana.
As gramáticas normativas as gramáticas têm recebido críticas nas últimas
décadas, principalmente porque:
 Buscam construir e ensinar um padrão linguístico ideal a partir da
prescrição de supostas formas corretas e legítimas;
 veem as variedades linguísticas dominantes na sociedade como
superiores às de menos prestígio;
 confundem gramática, norma e língua, entendendo-as como objetos
autônomos, homogêneos, e estáticos, independentes de seus usuários e a
serviço da expressão do pensamento;
 privilegiam a escrita literária pregressa em detrimento de outras
esferas de uso da língua;
 tomam a frase como unidade máxima de análise e consideram
imanente o seu sentido;
 utilizam um aparato categorial, conceitual e terminológico comum, fixo
e estanque, a despeito de lacunas e contradições. (VIEIRA, 2016, p. 22)

Segundo Vieira (2016), embora as gramáticas normativas dos autores


brasileiros reconheçam que há diferenças entre o português do Brasil e o português
de Portugal, é interessante ressaltar que elas não consideram a realidade linguística
brasileira nas regras prescritas. Elas apresentam um padrão de gramatização
lusitana. Sendo assim, a gramática brasileira acaba por não estabelecer diferenças
entre o português do Brasil e o de Portugal, principalmente no que se refere às
21

grandes diferenças entre o português falado no Brasil e o idealizado nas gramáticas


lusitanas.
De acordo com as palavras de Vieira (2006, p.31):
As gramáticas tradicionais luso-brasileiras sustentam a ideologia da língua
correta e do monolinguismo, não só por seu forte cunho normativo, mas
também pela imprecisão ou indefinição do conceito de norma que os
conduz [...] Tal norma é vista como “a única norma”, como a “A Língua”,
representada de modo homogêneo , sem variação, ou mesmo a partir de
uma imagem heterogênea, mas com usos devidamente hierarquizados.

2.2. O que diz a gramática normativa sobre os pronomes relativos?

De acordo com Cunha e Cintra (1985) e Bechara (2009), os pronomes


relativos são assim classificados por normalmente se referirem a um termo citado
anteriormente (seu antecedente). Esses pronomes apresentam formas variáveis e
invariáveis, sendo aplicadas de acordo com o termo a que se quer fazer a
referência. São eles: que, quem, qual, o qual (a qual, os quais, as quais), quanto
(quanta, quantos, quantas), onde, cujo. Que e o qual se referem a pessoas ou
coisas e são sinônimos. Os termos a que os pronomes relativos se referem são
chamados “antecedentes” e podem ser: um substantivo; um pronome, um adjetivo;
um advérbio ou uma oração.
Ainda conforme os autores, os pronomes relativos desempenham uma função
sintática na oração relativa, classificada pela Nomenclatura Gramatical Brasileira
(NGB) como oração subordinada adjetiva. Podem ter função de sujeito, objeto
direto, objeto indireto, predicativo, adjunto adnominal, complemento nominal, adjunto
adverbial, ou agente da passiva. Os exemplos a seguir são de Cunha e Cintra (1985,
p.335-336). São eles:

1. Sujeito:
Quero ver do alto o horizonte,
Que foge sempre de mim.
(O. Mariano, TVP, II, 434.)

2. Objeto Direto:
_ Já não se lembra da picardia que me fez?
(A. Ribeiro, M, 67.)

3. Objeto Indireto:
Eu aguardava com uma ansiedade medonha esta cheia de que tanto se
falava.
(J. Lins do Rego, ME, 58.)

4. Predicativo:
22

Não conheço quem fui no que hoje sou.


(F. Pessoa, OP, 91.)

5. Adjunto adnominal:
Há pessoas cuja aversão e desprezo honram mais que os seus louvores de
amizade.
(Marquês de Maricá, M, 223)
[cuja=adjunto adnominal de aversão e desprezo, mas em concordância
apenas com o primeiro substantivo, o mais próximo].

6. Complemento nominal:
Lembra-me de que deixara toda a minha vida ao acaso e que não pusera ao
estudo e ao trabalho com a força de que era capaz.
(L. Barreto, REIC, 287.)

7. Adjunto adverbial:
Entrava-se de barco pelo corredor da velha casa de cômodos onde eu
morava.
(M. Quintana, P, 92.)

8. Agente da passiva:
_ Sim, sua adorável pupila, a quem amo, a quem idolatro e por quem sou
correspondido com igual ardor!
(A. Azevedo)

Em alguns casos, o pronome relativo o qual (e flexões) pode substituir o uso


de que, sobretudo quando o pronome relativo está distante de seu antecedente e
seu uso possa causar dúvida sobre a qual termo o relativo se refere. O exemplo a
seguir é de Bechara (2009, p.199).

O guia da turma, o qual nos veio visitar hoje, prometeu-nos voltar depois
(com o emprego de que o sentido ficaria ambíguo).

Segundo explica Bechara (2009), na maioria das vezes, o pronome relativo o


qual (e flexões) substitui o uso do pronome relativo que, principalmente quando a
estrutura da oração exige preposição ou locução prepositiva de mais de duas
sílabas antes do pronome relativo. “O movimento rítmico da frase e a necessidade
expressiva exigem, nestes casos, um vocábulo tônico (como o qual) em lugar de um
átono (como que)” (Bechara, 2009, p.200).

“... até o induzirem a mandá-lo sair da corte, ao que (o a que) D. Pedro


atalhou com retirar-se antes que lhe ordenassem” [AH. 2, 91].

Conforme explica Cunha e Cintra (1985, p.342), os pronomes indefinidos


tudo, todos(as), ainda que ocultos na sentença, antecedem o pronome relativo
Quanto, que devido ao uso desses pronomes também é considerado indefinido.
Exemplo:
23

Em tudo quanto olhei fiquei em parte.


(F. Pessoa, OP, 231)

Entre quantos te rodeiam,


Tu não enxergas teus pais.
(Gonçalves Dias, PCP, 385)

O autor ainda explica que o pronome onde, que, na maioria das vezes, tem
função de adjunto adverbial de lugar, é considerado por alguns gramáticos advérbio
relativo. Um exemplo dado por Cunha e Cintra (1985, p.342) é:

Sob o mar sem borrasca, onde enfim se descansa.


(A. Nobre, S, 90.)

Bechara (2009) explica que onde pode ser sinônimo de em que.


De acordo com Cunha e Cintra (1985, p.338), em orações adjetivas
explicativas cujo antecedente é um substantivo, o pronome que pode ser substituído
por o qual ou suas flexões, como no exemplo:

Sei que estou plagiando nosso famoso cronista, o qual, certa vez, deu-lhe
na telha fazer essa comunicação ao jornal e aos leitores.
(C. Drummond de Andrade, CB, 57.)

Ainda segundo Cunha e Cintra (1985, 341), cujo é, ao mesmo tempo, um


pronome relativo e um possessivo. É usado como pronome adjetivo, concordando
em gênero e número com aquilo que é possuído. Um exemplo dado pelo autor é:

Convento d’águas do Mar, ó verde Convento,


Cuja Abadessa secular é a Lua
E cujo Padre-capelão é o Vento
(A. Nobre, S, 28.)

Contudo há possibilidade de uso do pronome relativo sem que esse precise


se referir a um termo antecedente, como é o caso dos pronomes quem e onde, que
podem ter seu uso observado nos seguintes exemplos dados por Cunha e Cintra
(1985, p. 336-337):
Quem tem amor, e tem calma,
Tem calma. . . Não tem amor. . .
(A Tavares, PC, 81)

Passeias onde não ando,


Andas sem eu te encontrar.
(F. Pessoa, QGP, n° 47)
24

Bechara (2009, p.201) faz um comentário sobre o uso do pronome relativo na


linguagem coloquial ou popular, afirmando que “Na linguagem coloquial e na
linguagem popular pode aparecer o pronome relativo despido de qualquer função
sintática, como simples transpositor oracional.”. O exemplo do autor é o seguinte:
Ali vai o homem que eu falei com ele.

Essa variação popular a que o autor se refere já foi estudada com base na
sociolinguística. Isso será detalhado a seguir.

2.3. A variação linguística dos pronomes relativos no Português do Brasil

Um estudo pioneiro sobre os pronomes relativos na língua falada do Brasil foi


realizado por Tarallo (1983 apud LOPES-ROSSI, 2006), com falantes da cidade de
São Paulo, de várias faixas etárias e vários níveis de escolaridade. Esse estudo
mostrou que a variação no uso dos pronomes relativos acontece de formas variadas
de acordo com o grau de dificuldade atribuído ao uso de cada um desses pronomes.
A dificuldade é maior se o pronome relativo for precedido de preposição, necessitar
de concordância nominal no pronome ou se for o pronome “cujo”. O uso mais fácil,
portanto, ocorre com o emprego dos pronomes relativos QUE ou QUEM em função
sintática que não exige preposição, como quando esses pronomes relativos
exercerem função de sujeito ou objeto direto da frase.
De acordo com Tarallo (1983 apud LOPES-ROSSI, 2006), há alguns aspectos
sociolinguísticos que influenciam a variação no uso dos pronomes relativos, tais
como nível de escolaridade dos falantes, nível de formalidade da fala e idade. Os
dados a seguir, no entanto, resumem as conclusões do autor, sem especificar as
variantes sociolinguísticas e mostram que, de modo geral, todos os sujeitos da
pesquisa produzem as seguintes variantes em contextos sintáticos em que se
poderia produzir um pronome relativo:
[padrão] = Eu tenho uma amiga que é ótima.
Aquele amigo de quem você gosta muito é ótimo.

[pronome lembrete] = Aquele amigo que você gosta muito dele é ótimo.

[ vazio] = Aquele amigo que você gosta muito [ ] é ótimo.


(O autor chamou essa variante também de "cortadora")
(LOPES-ROSSI, 2006, p. 9)
25

Alguns exemplos de variantes populares do pronome relativo apresentados


por Tarallo (1983 apud LOPES-ROSSI, 2006, p. 9), nas várias funções sintáticas
são:
SUJEITO: Você acredita que um dia teve uma mulher que ela queria que a
gente entrevistasse ela pelo interfone.

OBJ. DIR.: Aí esse rapaz aí que eu conheci ele, ele estava lá na festa
também.

OBJ. IND.: O André, que eu gosto dele, é mais bonito.

OBLÍQUO: E um deles foi esse fulano aí, que eu nunca tive aula com ele.
(Nessa categoria de OBLÍQUO encontram-se todos os tipos de pronomes
relativos com preposição que não sejam referentes a objeto indireto)

GENITIVO: Tem uns lá que eu não saio da casa deles.

Em resumo, o autor chegou aos seguintes resultados sobre o uso de


pronomes relativos na fala, para as cinco funções sintáticas:

Tabela 1: Variantes do pronome relativo


SUJ OD OI OBL GEN
padrão 89,7% 97,4% 3,9% 7,4% 5,9%
Pronome
10,3% 2,6% 21,1% 10,4% 52,9%
lembrete
Vazio / / 75,0% 82,2% 41,2%
total (n.) 992 384 76 231 17
Fonte: Tarallo (1983 apud LOPES-ROSSI, 2006, p. 9)

Essas variantes linguísticas para o pronome relativo serão tomadas como


referência para coleta e análise de dados para esta pesquisa.
26

CAPÍTULO 3
PRONOMES RELATIVOS E SUAS VARIANTES NA FALA DE
PESSOAS ESCOLARIZADAS

Neste capítulo são registrados e comentados dados atuais sobre o uso de


pronomes relativos e suas variantes na fala de pessoas escolarizadas, bem como
são apresentadas considerações sobre o ensino desse tópico gramatical. Assim são
realizados os objetivos específicos dessa pesquisa: 1) Fazer um levantamento das
variações no uso de pronomes relativos, na fala de pessoas escolarizadas produzida
na grande imprensa; 2) Tecer considerações sobre o ensino desse tópico gramatical
a partir das variações observadas.

3.1 O corpus da pesquisa

Os pronomes relativos na função de sujeito e de objeto direto não são


acompanhados por preposição e são expressos apenas por “que” ou “o/a qual; os/as
quais” ou “onde”. Como comentado no capítulo 2, esses casos não oferecem
dificuldade porque sempre são usados de acordo com a norma padrão, portanto,
não são objeto de estudo nesta pesquisa. Um exemplo dessas construções de
pronomes relativos é: “É uma festa que acontecia no verão do Hemisfério Norte.”
(Em Pauta, Globo News, 02/11/2016). Na estrutura da oração adjetiva (oração
relativa), o pronome relativo “que” desempenha a função de sujeito, como se pode
observar preenchendo essa função com seu referente “uma festa”: “É uma festa
[que uma festa acontecia no verão do Hemisfério Norte].”. Na função de sujeito, não
aparece preposição, portanto, essa construção sintática é produzida na língua falada
da mesma forma que exige a gramática normativa.
Os casos de pronomes relativos coletados nos programas de televisão, que
constituem o corpus desta pesquisa, são aqueles que ocupam função sintática que
exige preposição, bem como os pronomes relativos “cujo/cuja/cujos/cujas” com ou
sem preposição e o pronome relativo “onde”. Esses casos apresentam variação
como já mencionado no capítulo 2.
Os 20 contextos de pronome relativo e suas variantes foram coletados dos
programas de televisão Jornal das 10, Conta Corrente, Em Pauta, Painel, todos da
27

Globo News, e de um programa da rádio Metropolitana de Taubaté, no segundo


semestre de 2016. São programas jornalísticos e de entrevistas, cujos participantes
gravados são pessoas com nível de escolaridade superior. Não era pertinente para
esta pesquisa registrar os nomes dos participantes desses programas, nem o tempo
de gravação de cada um. Interessa apenas registrar, nos programas gravados, os
contextos sintáticos em que deveria aparecer um pronome relativo “que/o qual”
acompanhado de preposição, “cujo” ou “onde”. É interessante observar que esses
contextos sintáticos não ocorrem com muita frequência na língua falada.
Os dados desta pesquisa foram transcritos com a pontuação típica da escrita,
a partir da entonação do falante, para facilitar a leitura e compreensão do contexto
linguístico. Na seção a seguir, esses dados são apresentados com uma numeração
sequencial e com a indicação das datas e dos nomes dos programas televisivos de
onde foram coletados.

3.2 Análise do corpus da pesquisa

Os dados a seguir foram agrupados de acordo com o pronome relativo padrão


que o contexto linguístico exige. Após cada dado, segue a estrutura da oração
adjetiva (oração relativa), preenchida com o referente do pronome relativo a fim de
evidenciar a preposição que deve acompanhar o pronome relativo. No caso de o
dado ser uma variante linguística popular, segue a correção da frase de acordo com
a norma padrão.

(1) Vamos inaugurar o SAMU, O SAMU regional, que também Tautabé faz
parte. (Rádio Metropolitana – 03/11/16)
Estrutura da oração adjetiva: que também Taubaté faz parte [do SAMU
regional].
A preposição “de” (de+o=do) aparece na função sintática que o referente do
pronome relativo ocupa. Isso significa que essa preposição precisa anteceder o
pronome relativo numa construção de acordo com a norma padrão, sem a repetição
desse referente, como em:
28

Norma padrão: que também Taubaté faz parte [do SAMU regional].

[de que também Taubaté faz parte].


[do qual também Taubaté faz parte].

(2) Taubaté foi a cidade que mais investiu porque justamente nós temos a
sede e aonde vão ficar os médicos. (Metropolitana, 03/11/2016)
Estrutura da oração adjetiva: aonde vão ficar os médicos [na sede]
O pronome relativo “onde” está contraído com a preposição “a”, mas se
observa que a preposição correta é “em” se o pronome relativo for “que” ou “qual”,
pois “os médicos vão ficar na sede” (em+a=na). Como o pronome relativo ocupa a
função sintática de adjunto adverbial de lugar, pode ser apenas “onde”.
Norma padrão: [onde vão ficar os médicos]
[em que vão ficar os médicos]
[na qual vão ficar os médicos]
O mesmo caso ocorre no exemplo a seguir:

(3) Ele contou à polícia que teria que voltar para a capital paulista, aonde
ele mora. (Rádio Metropolitana, 16/11/2016).
Característica da oração adjetiva: aonde ele mora [na capital paulista].
(em + a = na)
Norma padrão: onde [ele mora]
na qual [ele mora]

(4) Eu acho que essa é uma coisa que o Brasil precisa prestar atenção
desde já. (Jornal 10, Globo News, 09/11/2016)
Estrutura da oração adjetiva: que o Brasil precisa prestar atenção desde já
[na coisa]. (na = em + a)
Norma padrão: [em que o Brasil precisa prestar atenção desde já].
[na qual o Brasil precisa prestar atenção desde já].

(5) A Medida Provisória é um mecanismo legislativo muito forte, em que o


governo estabelece um fato consumado e que os deputados vão ter que
trabalhar, tentar alterar esse fato consumado. (Globo News, 27/09, 2016).
29

Estrutura da oração adjetiva: que os deputados vão ter que trabalhar [com o
fato consumado].
Norma padrão: [com que os deputados vão ter que trabalhar].
[com o qual os deputados vão ter que trabalhar].

(6) Dada a situação emergencial absurda, que nós chegamos no Brasil, eu


vejo esse desenho dessa política pública que está sendo proposta
como última chance para os alunos. (Entre Aspas, Globo News, 18/09/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que nós chegamos no Brasil [a uma
situação emergencial absurda].
Norma padrão: [a que nós chegamos no Brasil].

(7) Aí eu diria que um personagem que nós não conversamos até agora
chama-se Sérgio Moro. (Painel, Globo News, 18/09/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que nós não conversamos até agora [sobre
ele (um personagem)...].
Norma padrão: [sobre o qual nós não conversamos até agora chama-se
Sérgio Moro].
[ sobre quem nós não conversamos até agora chama-se
Sérgio Moro].

(8) Nós temos um sistema de crise em curso, que cada ator faz o que quer
ao arrepio da lei. (Painel, Globo News, 18/09/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que cada ator faz o que quer [no sistema de
crise em curso]. (em + o = no)
Norma padrão: no qual cada ator faz o que quer...].
em que cada ator faz o que quer...].

(9) Os policiais fizeram a abordagem nele, onde foi encontrado quantidade


de maconha e também de cocaína.
Estrutura da oração adjetiva: onde foi encontrado quantidade de maconha e
também de cocaína [com ele].
Norma padrão: [com quem foi encontrado quantidade de maconha e também
de cocaína].
30

com o qual [foi encontrado...]

(10) Depois de um ano muito difícil, onde a agricultura foi prejudicada por
vários problemas climáticos, os alimentos estão dando um alívio aí pro seu
bolso. (Conta corrente – Globo News – 09/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: onde a agricultura foi prejudicada por vários
problemas climáticos [durante/em um ano muito difícil].
Norma padrão: [durante o qual a agricultura foi prejudicada por vários
problemas climáticos].
[no qual a agricultura...]
[quando a agricultura...]

(11) [...] São estados que seguramente o Trump vai ganhar.


(Jornal 10, Globo News, 08/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que seguramente o Trump vai ganhar [nesses
estados]. (em + esses = nesses)
Norma padrão: [em que seguramente o Trump vai ganhar].
[nos quais seguramente o Trump vai ganhar].

(12) Geneton é essa pessoa que, assim, todo o Brasil tinha essa admiração.
(Jornal das 10, Globo News, 02/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que todo o Brasil tinha essa admiração [por ele]
Norma padrão: [por quem todo o Brasil tinha essa admiração].
[pelo qual todo o Brasil tem admiração]

(13) Quando o cara chega à frente ali do cargo que ele concorreu...
(Jovem Pan, 22/11/2016)
Característica da oração adjetiva: que ele concorreu [ao cargo].
Norma padrão: [ao qual ele concorreu].

A ocorrência a seguir é de um contexto sintático em que deveria aparecer o


pronome relativo “cujo”. Como já comentado no capítulo 2, esse é, ao mesmo
tempo, um pronome relativo e um possessivo (CUNHA E CINTRA, 1985, 341) e
“exprime que o antecedente é possuidor do ser indicado pelo substantivo a que se
31

refere” (BECHARA, 2009, p. 172). É usado como pronome adjetivo, concordando


em gênero e número com aquilo que é possuído. “Cujo, cuja, cujos e cujas” sempre
exprimem ideia de posse, de relação, sendo seu antecedente o “possuidor” e o
substantivo que o segue a “coisa possuída”. Exerce a função sintática de adjunto
adnominal.
(14) Fazendo um bom uso da Educação artística, retomando a Educação
Física, que, na minha opinião, é um equívoco a retirada... (Entre Aspas, Globo
News, 18/09/2016).
Estrutura da oração adjetiva: que a retirada [da Educação Física/dela, na
minha opinião, é um equívoco]. Observa-se que o antecedente do pronome
relativo (“da Educação Física”), se inserido na oração adjetiva, exerce a
função de adjunto adnominal. Assim, a expressão de posse – nesse exemplo
não tão evidente –, talvez mais evidente a expressão de uma relação entre os
dois termos, exige o seguinte:
Norma padrão: retomando a Educação Física, [cuja retirada, na minha
opinião, é um equívoco].

As ocorrências a seguir se encaixam no uso correto dos pronomes relativos,


de acordo com o que rege a gramática normativa.

(15) Ontem à noite ela não falou que era o momento em que ela deveria ter
falado. (Jornal 10, Globo News, 09/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: em que ela deveria ter falado [naquele
momento].
no qual ela deveria ter falado [naquele
momento].

(16) Em que medida, uma vez presidente, o Trump vai ter que, de alguma
maneira, se entender com o partido dele, com o partido Republicano, com o
qual ele criou uma série de traumas ao longo da campanha.
(Jornal 10, Globo News, 09/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: com o qual ele criou uma série de traumas [com
o partido Republicano].
32

(17) É uma festa em que as pessoas entram em contato, a ideia deles é que
os mortos vêm encontrar as famílias. (Em Pauta, Globo News, 02/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: em que as pessoas entram em contato [na
festa].
na qual as pessoas entram em contato [na
festa].

(18) Os economistas fazem uma conta em que só isso não dá para o


começo, não dá pro gasto. (Jornal 10, Globo News, 08/11/2016).
Estrutura da oração adjetiva: em que só isso não dá para o começo [na conta
dos economistas].

(19) A única alteração estrutural foi na Medida Provisória 339, de 2006, que
foi do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica), em que a sociedade cível conseguiu alterar o sistema de fundos.
(Entre Aspas, Globo News, 18/09/2016).
Estrutura da oração adjetiva: em que a sociedade cível conseguiu alterar o
sistema de fundos [na Medida Provisória 339].
na qual a sociedade cível conseguiu alterar o
sistema de fundos [na Medida Provisória 339].

(20) Os EUA vão se retrair [...] em várias áreas do mundo, [...] vão se retrair
na Síria, onde ele não tem interesse no resultado da Guerra Síria.
(Jornal 10, Globo News, 09/11/2016).
“Onde” está correto. Também pode ser substituído por “em que” ou “na qual”.
Estrutura da oração adjetiva: onde ele não tem interesse no resultado da
Guerra Síria [na Síria].
em que ele não tem interesse na Guerra Síria
[na Síria].
na qual ele não tem interesse na Guerra Síria
[na Síria].

Das 20 ocorrências de pronomes relativos aqui registradas, 6 fazem o uso


correto do pronome relativo de acordo com o que rege a gramática normativa.
33

Em 1 das 14 ocorrências em que se constatou o uso informal do pronome


relativo ocorre a troca do relativo “cujo” pelo “que”. Sendo o antecedente do relativo
um termo cuja ideia é de posse, o pronome relativo a se usar nessa sentença é
“cujo”, que deverá concordar em gênero e número com aquilo que é possuído.
Em 2 das 14 ocorrências em que se constatou o uso incorreto do pronome
relativo houve o uso de “aonde” em vez de “onde”. Nessas sentenças, o uso correto
do pronome relativo é “onde”, também pode ser utilizado “no qual” ou “em que”.
Em 2 das ocorrências em que o relativo a ser utilizado deveria ser “com” ou
“durante”, usou-se o pronome relativo “onde” (de uso exclusivo para quando se quer
indicar um lugar).
Em 9 das 14 ocorrências em que o uso do pronome relativo se deu de forma
coloquial, houve a falta do emprego de preposição antes do pronome relativo, como,
por exemplo, as preposições “em (na/s, no/s)”, “de (da/s, do/s)”, “por (pelo/a)”,
“sobre”, “com” e “durante”. Logo, em 50% dos casos, a forma coloquial do pronome
relativo se deu em função do apagamento da preposição. Tarallo (1983 apud
LOPES-ROSSI, 2006, p. 9) também notou que essa variante popular é a mais
comum nos contextos sintáticos em que o pronome relativo deve vir antecedido por
preposição.
Em resumo, os dados coletados mostram o seguinte:
Tabela 2: Variantes do pronome relativo na fala de pessoas escolarizadas, em 2016
Variantes Nº % Exemplo

Padrão 6 30% É uma festa em que as pessoas entram em


contato, a ideia...
Vazio de 9 45% Quando o cara chega à frente ali do cargo
preposição que ele concorreu...
AONDE em vez Ele contou à polícia que teria que voltar para a
de 2 10%
capital paulista, aonde ele mora.
Populares

ONDE
ONDE em vez de Depois de um ano muito difícil, onde a
outro pron. 2 10% agricultura foi prejudicada por vários
Relativo problemas climáticos...
Fazendo um bom uso da Educação artística,
QUE em vez de 1 5% retomando a Educação Física, que, na minha
CUJO
opinião, é um equívoco a retirada...
total (nº) 20 100%
Fonte: dados desta pesquisa

Assim, os dados apresentados neste capítulo realizam o primeiro objetivo


específico desta pesquisa: fazer um levantamento das variações no uso de
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pronomes relativos precedidos por preposição, na fala de pessoas escolarizadas


produzida na grande imprensa. Mostram que a norma padrão é usada em apenas
30% das ocorrências coletadas; “que” como pronome relativo genérico, com vazio
de preposição ou em lugar de “cujo” é a estratégia popular mais frequente (50%).
“Onde” e “aonde” inadequados somam 20%.

3.3. Algumas considerações sobre o ensino de pronomes relativos

A fundamentação teórica utilizada nesta pesquisa e os dados coletados da


fala de pessoas escolarizadas mostraram questões relevantes ao ensino dos
pronomes relativos. De acordo com a fundamentação teórica, a norma padrão da
língua portuguesa deve, sim, ser ensinada. Portanto, o pronome relativo deve ser
ensinado de acordo com o que rege a gramática normativa. No entanto, os dados
coletados mostraram que a variação sociolinguística é recorrente na fala de pessoas
escolarizadas, nos meios de comunicação. Crianças, adolescentes e jovens adultos
ouvem esses meios de comunicação e os têm como referência de língua falada por
pessoas escolarizadas, que usam uma variedade de língua um pouco mais formal,
com um vocabulário sofisticado. Contudo, o uso dos pronomes relativos na fala
dessas pessoas escolarizadas é predominantemente popular. Em 70% das 20
ocorrências aqui registradas, deu-se alguma variante popular. Isto mostra que, de
fato, o ensino da norma padrão, no que diz respeito aos pronomes relativos, não é
uma tarefa fácil na escola, em função do uso padrão desses pronomes não ser
muito ouvido no dia a dia das pessoas. Sendo assim, é imprescindível ressaltar que
a norma padrão é mais usada no português brasileiro na modalidade escrita, por
isso existe a necessidade de a escola trabalhar a diferença entre as variantes
populares e a norma padrão.
Sendo assim, reiterando a fundamentação teórica citada por vários autores, é
preciso que o professor mostre para o aluno a forma popular referente ao uso dos
pronomes relativos e peça-lhe que a compare com a norma padrão. Perceber a
variação linguística desse tópico gramatical é um exercício de análise linguística
muito importante. É necessário que o professor esclareça ao aluno casos mais
difíceis do uso desses pronomes, que são aqueles precedidos de preposição, “cujo”
ou “onde”. No caso dos pronomes relativos precedidos de preposição, o aluno
precisa entender como essa preposição surge. Para isso, o professor precisa fazer,
35

junto com o aluno, o exercício de análise linguística mostrado neste capítulo, ou


seja, precisa inserir na oração adjetiva o referente do pronome relativo para que o
aluno perceba onde “nasce” a preposição que precisa preceder o pronome relativo.
No caso do pronome relativo “cujo”, o aluno precisa perceber a relação de posse
existente no contexto. Dessa forma, o professor atuará de acordo com o que propõe
Duarte (2012), sobre a necessidade de reflexão sobre as variantes linguísticas do
português do Brasil, no estudo da norma padrão.
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CONCLUSÃO

Esta pesquisa partiu de duas hipóteses: que mesmo os falantes


escolarizados, no caso repórteres ou convidados de programas televisivos de
debate, jornalísticos e programas de rádio, não usam unicamente as formas padrão
de pronomes relativos, ou seja, também fazem uso de formas populares desse
pronome; que é possível utilizar os dados dessa pesquisa na elaboração de
exercícios para que os alunos reflitam sobre a variação sociolinguística dos
pronomes relativos e pratiquem a norma padrão. Sendo assim, é imprescindível
ressaltar que a norma padrão é mais usada no português brasileiro na modalidade
escrita, por isso existe a necessidade de a escola trabalhar a diferença entre as
variantes populares e a norma padrão.
Os dados apresentados no capítulo 3 realizam o primeiro objetivo específico
desta pesquisa: fazer um levantamento das variações no uso de pronomes relativos,
na fala de pessoas escolarizadas produzida na grande imprensa, e confirmaram a
hipótese inicial. Nos 20 contextos de fala que constituíram o corpus desta pesquisa,
a norma padrão foi usada em apenas 30% das ocorrências coletadas; “que” como
pronome relativo genérico, com vazio de preposição, é a estratégia popular mais
frequente (50%); “onde” e “aonde” são usados inadequadamente em 20% dos
casos. Observa-se, portanto, que 70% dos casos são de uso popular de pronome
relativo. Pode-se concluir que as pessoas, de modo geral, ouvem muito pouco o
pronome relativo de acordo com a norma padrão.
Esses programas gravados são os mais formais que se encontram na mídia
televisiva ou de rádio. Em outros mais populares, mais informais, que não foram
objeto de estudo desta pesquisa, o uso de pronomes relativos de acordo com a
gramática normativa deve ser até mais restrito. A esse respeito, fica a sugestão para
uma pesquisa futura. Disso se conclui que o uso da norma padrão de pronomes
relativos não parece ser adquirido normalmente no uso falado da língua pelo pouco
contato com essa estrutura gramatical.
Esta pesquisa também confirmou a segunda hipótese, pois mostrou no
capítulo 3 que é possível usar as variantes populares na elaboração de exercícios
para que os alunos reflitam sobre a variação sociolinguística dos pronomes relativos,
percebam onde “nasce” a preposição, percebam a relação de posse e pratiquem a
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norma padrão. Conclui-se que o ensino do pronome relativo de acordo com a norma
padrão é necessário, mas precisa ser feito a partir da observação de todo esse
quadro de variação da língua falada para que o aluno perceba as diferenças entre a
norma padrão e as variantes populares.
Dessa forma também se atingiu o segundo objetivo específico desta
pesquisa, relativo a considerações sobre o ensino desse tópico gramatical a partir
das variações observadas. Concluo defendendo, a partir da fundamentação teórica e
dos dados analisados nesta pesquisa, que, se não houver essa análise comparativa
e reflexão linguística das variantes com a norma padrão, o professor não terá
sucesso no ensino do uso dos pronomes relativos, tampouco o aluno conseguirá
aprendê-los.
Os dados desta pesquisa podem ser usados pelo professor de língua
portuguesa em sala de aula e ficam também como exemplo de coleta de dados da
língua falada que o professor pode fazer com seus alunos, num exercício de reflexão
e pesquisa sobre a língua portuguesa atual.
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REFERÊNCIAS

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Fronteira, 2009.

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proposta curricular de língua portuguesa para o 1° e 2° graus: Coletânea de textos
vol. 1. São Paulo: SE/ CENP, 1988. p. 29-41.

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materna. In: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Coordenadoria de Estudos e
Normas Pedagógicas. Subsídios à Proposta Curricular de Língua Portuguesa para o
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2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

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por que, quando e como? Matraga, Rio de Janeiro, v.19 n.30, jan./jun. 2012.

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uso da linguagem. Taubaté: Universidade de Taubaté, 2006. (Não publicado)

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linguística, mídia e preconceito. São Paulo: Parábola Editorial, 2005. p. 93-112.

TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística. São Paulo: Ática, 1985.

TARALLO, Fernando. (Org.). Fotografias Sociolingüísticas. Campinas: Pontes/


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ZILLES, A. M. S. (Org.); FARACO, C. A. (Org.). Pedagogia da variação lingüística:


língua, diversidade e ensino. 1. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2015. v. 1. 320p.
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