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I - INTRODUÇÃO
Após uma longa evolução, as neurociências afirmam-se, hoje em dia, como o estudo do
sistema nervoso, das suas composições moleculares e bioquímicas, assim como, das
diferentes manifestações deste sistema, através das nossas actividades intelectuais, tais
como, a linguagem, o reconhecimento das formas, a resolução de problemas e a
planificação das acções. Esta definição remete-nos para a interdisciplinaridade que envolve
as neurociências, resultando da interacção de diversas áreas do saber ou disciplinas
científicas como, por exemplo, a neurobiologia, a neurofisiologia, a neuropsicologia, a
neurofarmacologia (neuropsicofarmacologia). Tanto do ponto de vista histórico como
teórico não se pode deixar de considerar, também, as contribuições da cibernética. Por sua
vez, os conhecimentos originados pela investigação em Neurociências aplicam-se a
diversas áreas científicas (medicina, psicologia, informática, robótica, …).
Se, portanto, se consideram as ciências cognitivas como o estudo da inteligência desde as
suas manifestações mais elaboradas e altamente simbólicas até ao substrato biológico dessa
inteligência, é evidente que uma parte fundamental dessa compreensão dos nossos
processos intelectuais envolve o estudo do sistema nervoso que as sustenta. Os fenómenos
cognitivos são tão tributários dos mecanismos do cérebro, quanto o é a informação
fornecida por um computador em relação aos circuitos electrónicos que o formam. O
objecto das neurociências mantém-se o de descrever, explicar e modelizar os mecanismos
neuronais elementares que sustentam qualquer acto cognitivo, perceptivo ou motor. Há,
portanto, uma intersecção necessária entre modelos cognitivos e modelos neurológicos:
para compreender o cérebro, é tão necessário conhecer o tipo de operações que ele realiza,
como os seus desempenhos.
Passemos, então, à abordagem das metodologias usadas para o estudo das relações entre
cérebro e comportamento. Em primeiro lugar, há que definir os objectivos que nos
propomos atingir. Por exemplo, pode ter-se como propósito saber como o cérebro processa
um determinado tipo de informação, ou medir o efeito de uma lesão, ou avaliar um
determinado tipo de técnica de reabilitação cognitiva. Posta a questão que pretende
explorar, o investigador cria um modelo experimental que se adapte à obtenção dos
resultados que permitam esclarecer a sua hipótese. A experimentação no campo das
funções cognitivas pode designar-se por “não invasiva” pois nunca pode existir lesão
produzida, nem o uso de substâncias com efeito farmacológico. O que acontece na maioria
dos laboratórios de pesquisa do mundo é recorrer a doentes que procuram tratamento e
onde os achados da observação permitem fazer inferências sobre a função cerebral. Em
termos gerais, o investigador recorre à comparação dos desempenhos de amostras idênticas
de pessoas com e sem lesão cerebral.
Para estudar doentes lesionados cerebrais os modernos métodos de visualização das lesões
cerebrais como a tomografia axial computadorizada (TAC) ou a ressonância magnética
nuclear (RMN) mostram com clareza a região do cérebro afectada pela lesão. Em centros
mais sofisticados o recurso à tomografia de emissão de positrões (PET) permite pôr em
evidência a actividade metabólica do cérebro em indivíduos normais e comparar com o que
acontece em pessoas com lesão cerebral quando executam uma determinada tarefa. O
SPECT (tomografia computorizada de emissão de fotões), por sua vez, permite pôr em
evidência o fluxo sanguíneo cerebral.
O doente representa, assim, um modelo experimental produzido pela Natureza. Quando se
verifica que num número razoável de observações se encontra um desvio da normalidade
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constantemente relacionável com uma determinada localização da lesão cerebral, o
investigador pode concluir que essa área do cérebro tem um papel importante no
desempenho da função em estudo.
No âmbito da disciplina de Neurociências III vamos interessar-nos, sobretudo, por uma das
áreas que contribuem para as Neurociências: a Neuropsicologia Clínica. A
Neuropsicologia preocupa-se com o estudo da relação entre a actividade cerebral,
sobretudo a do córtex, e os processos psíquicos complexos. A Neuropsicologia Clínica é a
componente prática da Neuropsicologia, uma vez que transporta os conhecimentos obtidos
na investigação neuropsicológica para os domínios da avaliação, diagnóstico e tratamento
das patologias do sistema nervoso central.
Como já foi referido estas intervenções seriam feitas com o objectivo de libertar os
espíritos responsáveis pela loucura ou pelas dores de cabeça (cefaleias), mas é possível,
também, que se destinassem a tratar doenças como a epilepsia. Este último caso, será
menos provável se tivermos em conta que o número de casos operados é muito superior à
taxa de prevalência desta doença. De qualquer forma, pode aceitar-se a ideia de que
haveria a intenção de intervir na actividade mental manipulando o conteúdo do crânio.
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1906). Neste há referência a alguns casos de lesões dos hemisférios cerebrais sendo
reconhecida a sua relação com algumas alterações funcionais como, por exemplo, a
motricidade do lado oposto do corpo e aspectos da coordenação visuomotora. O seu autor
parece ter sido um médico que acompanhou os exércitos egípcios nas suas batalhas, no
qual também revela grande pragmatismo na forma como classifica os males do corpo: “os
que consigo curar, os que consigo conter e os que não são para tratar”.
No que respeita ao mundo árabe estão descritos alguns esquemas anatómicos que revelam
um conhecimento avançado da medicina, sobretudo, no que respeita à função nervosa.
Aristóteles (384-322 A.C.) divergiu dos seus contemporâneos e afirmava que o coração era
o órgão do pensamento, das percepções e do sentimento, enquanto o cérebro seria
importante para a manutenção da temperatura corporal, agindo como um agente
refrigerador. Aristóteles generalizou uma noção bastante antiga em todas as civilizações,
de que a sede das emoções seria o coração. Hoje, ainda somos influenciados por esta
noção, quando nos referimos ao símbolo do amor como sendo um coração, quando
dizemos que estamos de "coração partido" ou de "coração pesado", que gostamos de algo
"do coração". Isto, provavelmente, deve-se ao facto de a activação do sistema nervoso
autónomo simpático, que ocorre na expressão das emoções, alterar de forma evidente a
frequência e intensidade dos batimentos cardíacos.
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Durante muitos séculos, falou-se em três ventrículos cerebrais, sendo os ventrículos
laterais considerados em conjunto. Só no período do Renascimento, surgem outras
representações. Leonardo Da Vinci (1472-1519), que tinha o hábito da dissecação, mostra
nos seus desenhos os ventrículos laterais separados e não como um ventrículo único. Da
Vinci acreditava que as sensações deveriam localizar-se no ventrículo médio (III
ventrículo) porque para suas imediações converge uma grande quantidade dos nervos
cranianos. No entanto, estas diferenças na representação anatómica não deram origem a
uma nova interpretação funcional.
No séc. XVII, Descartes (1596-1650) propõe modelos fisiológicos da função cerebral, mas
ainda centrado na teoria ventricular. Escolheu o corpo pineal (epífise) não propriamente
como a sede da alma (psique), mas como o local da sua actividade. A pineal foi escolhida
por ser um órgão único, ao contrário das outras estruturas cerebrais, que são bilaterais.
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Figs.5 e 6: Representações esquemáticas dos “órgãos frenológicos”.
Uma das principais preocupações de Gall foi provar que havia uma completa aderência
entre o cérebro, as suas membranas envolventes e a calote craniana, para assim validar,
enquanto medida do próprio cérebro, a configuração exterior da cabeça. Isso foi
conseguido com base em inúmeros estudos anatómicos de valor. A observação de doentes
permitiu-lhe, ainda, concluir que, quando existe uma actividade cognitiva, qualquer coisa
acontece em regiões específicas do cérebro. Embora muito carentes de rigor experimental,
estas observações e conclusões a que deram origem, são hoje reforçadas pelas técnicas de
imagem cerebral.
A frenologia constituiu uma verdadeira revolução nos conceitos até então defendidos e
ensinados. Granjeou uma grande popularidade junto da opinião pública ficando a ser
conhecida por “teoria das bossas”. Era habitual nos serões dos salões elegantes fazerem-se
medidas das cabeças recorrendo a compassos construídos para o efeito. Caiu-se no exagero
e na falta de rigor científico, não por parte de Gall e dos seus colaboradores, mas por parte
de todos os que consideraram a frenologia “uma ciência fácil” transformando-a, muitas
vezes, num espectáculo.
O grande valor da frenologia foi o de abrir caminho para a atribuição de funções
psicológicas a regiões específicas do cérebro, afastando a teoria ventricular e, sobretudo,
abrindo portas para novas questões que, ainda hoje, estão no centro da neurociência
cognitiva.
Mais tarde, ainda em França, Paul Broca (1824-1880), um jovem médico, conhecido pelo
seu interesse em antropologia e pelo estudo realizado aos crânios trepanados da América
do Sul, de que já falámos atrás, trabalhou com outro investigador (Boulliaud), no sentido
de desenvolver um novo modelo experimental, baseando-se no estudo de doentes com
lesões cerebrais localizadas.
Partindo dos pressupostos teóricos da frenologia construiu a seguinte hipótese: se um
determinado órgão frenológico fosse lesado perdia-se a função pela qual era responsável.
Não foi Broca o primeiro a ter a ideia de estudar estes doentes, mas o facto de trabalhar
num dos grandes hospitais da época (Hospital de Salpêtrière, em Paris), trouxe-lhe
vantagens neste estudo. Broca procurou doentes portadores de lesão cerebral e esperou que
falecessem para, então, poder estudar os respectivos cérebros.
O primeiro dos doentes estudados chamava-se Leborgne e tinha a linguagem oral limitada
ao vocábulo tan. A inspecção da face externa do cérebro, como era normal fazer-se na
altura, revelou uma lesão na região frontal esquerda (no pé da 3ª circunvolução), o que
estava de acordo com os modelos que eram propostos na época pela frenologia. Depois de
ter estudado um segundo doente com sintomas idênticos e uma lesão cerebral
sobreponível, Broca passou a afirmar que a linguagem articulada se localizava na 3ª
circunvolução frontal.
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Fig.7: Área de Broca
A fim de consolidar esta constatação continuou a estudar este tema, recorrendo à mesma
metodologia, concluindo que todos os casos estudados por si tinham lesões no hemisfério
esquerdo, o que o levou a afirmar, em 1865, “Falamos com o hemisfério esquerdo”. Desta
forma, Broca ficou conhecido como o pai do conceito de dominância cerebral.
Contudo, e embora raramente seja referido, há a salientar que, já em 1836, Marc Dax
(1770-1837), tinha apresentado na Academia de Medicina, um trabalho em que referia ter
observado que os doentes que perdiam a capacidade de falar eram aqueles que ficavam
paralisados do lado direito do corpo e que quando a paralisia surgia do lado esquerdo não
se constatavam défices na linguagem.
Com estas investigações nasce uma nova escola, designada por associacionista a qual
defende a existência de centros localizados e vias de ligação entre eles.
Há que salientar, aqui, o contributo de Sigmund Freud (1856-1939) no seu livro sobre a
afasia. Não devemos esquecer que Freud, antes de ser psicanalista, era neurologista. A
teoria psicanalítica que mais tarde viria a desenvolver reflecte em muitos pontos estas
funções fundamentalmente neuronais da função psíquica. Os estudos actuais sobre
consciência são de certa forma reveladores da pertinência de algumas ideias de Freud.
A escola alemã tem também a sua repercussão em França. Pierre Marie (1853-1940), neste
período de viragem do século, publicou trabalhos nos quais pretendia anular por completo
a teoria de Broca, defendendo que a verdadeira afasia era a que tinha sido descrita por
Wernicke e que o que Broca tinha descrito não era mais do que a soma desta afasia com
uma perturbação do comportamento motor a que deu o nome de “anartria”. A viragem do
século fica, assim, caracterizada, por discussões no seio da comunidade científica.
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Há que salientar que, ao mesmo tempo que se desenvolvia a teoria das localizações
cerebrais, duas outras correntes ganhavam relevância e opunham-se à primeira: a teoria
holística da função cerebral defendida por Lashley (1890-1958), que afirmava que a perda
funcional era fundamentalmente quantitativa e não qualitativa, ou seja, dependia da
quantidade de cérebro perdida e não do local da lesão, e a escola de Gestalt. Esta última
vem defender que os fenómenos psicológicos constituem um conjunto autónomo,
indivisível e articulado na sua configuração, organização e lei interna. A teoria foi criada
pelos psicólogos alemães Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Köhler (1887-1967) e
Kurt Koffka (1886-1940), nos princípios do século XX e funda-se na ideia de que o todo é
mais do que a simples soma de suas partes.
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in Animals and Man” onde incorporou os ensinamentos da escola alemã nos modernos
achados da experimentação animal, bem como, os resultados das suas próprias pesquisas
realizadas em doentes com lesões cerebrais estudados com os mais modernos meios
disponíveis na altura.
O progresso registado desde então nas técnicas de exploração funcional do cérebro, nas
técnicas de avaliação e de experimentação animal, bem como, o desenvolvimento da
psicologia cognitiva permitiram-nos ter, hoje, um vasto leque de conhecimentos sobre os
quais nos iremos debruçar nesta disciplina de Neurociências III.
a) Neuropsicólogo
De acordo com entidades como a American Board of Clinical Neuropsychology, a
International Neuropsychological Society, e a Divisão 40 da American Psychological
Association um Neuropsicólogo é, e passamos a citar, “um Psicólogo que aplica os
princípios de avaliação e intervenção baseados em estudos científicos do comportamento
humano, nomeadamente, no modo como este se relaciona com o funcionamento normal e
patológico do SNC. É um licenciado em Psicologia Clínica/Saúde que provê serviços de
diagnóstico e intervenção, tendo comprovada competência na aplicação destes princípios
visando o bem-estar humano.
b) Neuropsicologia
Neuropsicologia é a área da Psicologia que aborda as relações existentes entre a Dinâmica
Encefálica e as diversas facetas do Comportamento Humano. Estrutura-se, do ponto de
vista metodológico, em Experimental, Clínica e Clínico-Experimental. È uma disciplina
composta, na medida em que, se situa na confluência de diversas áreas de estudo –
neurologia e psicologia, neuroanatomia e neurofisiologia, neuroquímica e
neuropsicofarmacologia. No que toca às faixas etárias, a Neuropsicologia organiza-se em:
Pediátrica e do Adulto (incluindo uma área, bastante específica, que abrange a população
idosa constituindo-se em Neuropsicologia Geriátrica). A vertente Clínica compõem-se do
Diagnóstico, Reestruturação, Reabilitação e Reintegração (3 Rs). É uma área de trabalho
que privilegia, de modo constante, a multi e interdisciplinaridade e promove uma filosofia
de Actuação Transclínica, isto é, a participação activa dos elementos que fazem parte do
ambiente do paciente na recuperação do mesmo.
c) Paciente /Utente
A pessoa, família ou grupo (incluindo organizações ou comunidades), que solicitam e
recebem intervenção neuropsicológica.
d) Avaliação Neuropsicológica
A Avaliação Neuropsicológica concretiza-se em consulta e entrevista neuropsicológica e a
administração de provas específicas. No acto clínico estão previstas as seguintes situações:
diagnóstico diferencial entre síndromes psicogénicos e neurogénicos; diagnóstico
diferencial de possíveis etiologias da disfunção cerebral; avaliação de funções preservadas
e comprometidas após uma lesão cerebral; estabelecimento de medidas neuro-
comportamentais para monitorizar a evolução da doença cerebral; comparação de
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resultados pré e pós intervenção farmacológica, cirúrgica, ou neuropsicológica; avaliação
das funções nervosas complexas para a formulação de estratégias de reabilitação.
e) Estimulação Neuropsicológica
Métodos e técnicas aplicados em contexto clínico visando a reactivação de redes
neuronais, ou a activação de novas redes, a fim de recuperar ou melhorar o funcionamento
neurocognitivo comprometido pela lesão cerebral.
f) Reabilitação Neuropsicológica
Programa integrado directamente sobre os efeitos da lesão incluindo treino cerebral,
capacidades sociais, treino para a autonomia de vida e todos os procedimentos dirigidos
para a integração social e adaptação funcional do paciente com lesão ou disfunção cerebral
II - PATOLOGIA CEREBRAL
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Um dos objectivos da disciplina de Neurociências III é permitir a obtenção de
conhecimentos sobre os efeitos da lesão cerebral, e correlativa disfunção cerebral, nos
diferentes aspectos da cognição e do comportamento.
Importa, pois, discutir os conceitos de lesão e disfunção cerebral e fazer referência às suas
múltiplas formas. O modo como a doença se instala e evolui, ou como afecta as estruturas
elementares do encéfalo, influencia o perfil de disfunção cognitiva ou comportamental
registado na observação dos doentes.
Daqui, resultam variantes que têm implicações no diagnóstico realizado a partir das
avaliações, na prescrição de intervenções terapêuticas, assim como, no contributo que cada
avaliação dá para o saber total sobre a forma como o cérebro produz as actividades
cognitivas e o comportamento.
Entende-se por disfunção cerebral toda a condição em que o cérebro perde parte da sua
função normal. Em geral, diz-se haver lesão ou alteração orgânica quando esta perda é
definitiva e se acompanha de alterações visíveis na morfologia do cérebro.
Quando a perda é transitória e potencialmente reversível é comum utilizar-se a designação
alteração funcional por oposição a alteração orgânica ou lesão.
Relembre-se que, na perspectiva das neurociências da cognição e do comportamento, todas
as alterações têm um substrato biológico que interessa compreender. Este substrato não
tem de ser obrigatoriamente lesional, pode ser funcional (ex.: quadro depressivo;
encefalopatia metabólica).
Mas, centremo-nos nas lesões em que existe morte celular; vamos definir três conceitos
fundamentais:
- Lesão focal: o processo patológico que afecta o cérebro diz respeito a uma região
circunscrita; assim, os sinais clínicos resultantes desta lesão (sinais focais) correspondem à
perda da função que era garantida por aquela área cerebral.
- Lesão polifocal: corresponde ao somatório de várias lesões focais; a disfunção resultante
permite identificar as diversas áreas cerebrais afectadas.
- Lesão difusa: corresponde ao sofrimento de toda a função cerebral, não sendo possível
identificar uma ou mais áreas circunscritas de lesão.
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2) a oclusão ocorre no próprio lugar onde se formou a placa de ateroma (trombose).
Privadas do aporte de sangue, as células nervosas morrem muito rapidamente pois, como já
ficou dito atrás, não têm reservas de glicose e dependem, por isso mesmo, do aporte do
sangue não só deste nutriente, mas também, de oxigénio.
As artérias têm territórios bem definidos e, tal como acontece com os rios em período de
seca, os tecidos que fazem parte desses territórios entram em sofrimento quando o fluxo do
sangue é interrompido (isquémia). Quando se prolonga para além da resistência das
células, estas morrem (necrose).
No caso de obstrução de uma das grandes artérias do pescoço, a circulação pode manter-se
recorrendo ao circuito alternativo das artérias comunicantes, o que justifica a ausência de
sintomas em muitos doentes.
Para além destes grandes troncos arteriais responsáveis pela irrigação do córtex cerebral
existe um outro sistema de irrigação da profundidade dos hemisférios cerebrais. Os vasos
que constituem este sistema originam-se nas três artérias principais, já referidas, e são
artérias finas terminais (artérias perfurantes) que, como não se anastomosam na
terminação, quando há uma oclusão – ou trombose – formam-se áreas de lesão profunda e
de pequenas dimensões (acidentes lacunares).
O grupo de doentes com lesões isquémicas, seja de grandes territórios seja de territórios
pequenos alimentados pelas artérias perfurantes, é o mais numeroso na prática clínica,
sendo também, o que é mais frequentemente utilizado como material de estudo.
Quando um doente tem um acidente vascular isquémico isso significa que padece de uma
doença que provocou a alteração das paredes das artérias e, por isso, quando surge o
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primeiro acidente já muitas artérias estão lesadas. Consequentemente, outros acidentes
semelhantes vão acontecer noutros pontos dando origem a um quadro designado por
multienfartes, culminando um pouco mais tarde num processo demencial (demência por
multienfartes).
Estes quadros são, em geral, muito graves, mas quando os doentes sobrevivem levantam
questões um pouco diferentes das que são postas pelas embolias e pelas tromboses.
Enquanto que nas tromboses o tecido dependente da artéria deixa de ser vascularizado, no
caso das hemorragias o sangue infiltra-se através dos tecidos comprimindo-os mas,
eventualmente, sem lhes provocar lesão definitiva.
O sangue que sai da artéria pode ter dois destinos diferentes, consoante o local onde se deu
a ruptura: se o vaso for superficial pode misturar-se com o liquido cefalo-raquidiano
(hemorragia meníngea); caso o vaso seja profundo o sangue infiltra-se no tecido cerebral
(hematoma intracerebral). Um hematoma é uma massa de sangue que consoante o
tamanho distorce e/ou empurra, em maior ou menor grau, as estruturas encefálicas dentro
da caixa craniana.
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Fig.17: Hemorragia meníngea Fig.18: Hematoma intracerebral
Avancemos para um fenómeno que, embora descrito há muitos anos, ainda hoje é difícil de
compreender na sua totalidade e complexidade: a Diaschisis.
Este fenómeno consiste na perda transitória de uma função relacionada com uma
determinada área do cérebro não lesada quando se regista uma lesão de instalação aguda
num ponto distante. Assim, à perda de função resultante da lesão somam-se os sinais de
disfunção de uma área não lesada.
A explicação actual para este fenómeno é a seguinte: uma determinada região do cérebro
(A) tem ligações estreitas com outra região (B) dependendo, em parte, dela. Quando uma
lesão aguda destrói o território B a região A entra em disfunção por falta da informação
(impulsos nervosos) provenientes da região B. Passado algum tempo, a região retoma o
funcionamento porque estabelece relações de apoio com outras regiões do cérebro. É por
esta razão que, nos casos de patologia vascular cerebral, é comum verificar-se uma
recuperação rápida dos sinais clínicos nos primeiros dias a seguir à instalação dos
sintomas.
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Em geral, a consequência de um TCE é a ocorrência de lesões múltiplas no encéfalo.
Relembre-se que este está encerrado dentro do crânio, que é uma estrutura dura. O crânio
protege o encéfalo de pequenos embates, mas quando a força aplicada é muito intensa,
acaba por se transmitir ao seu interior e afectar o cérebro e restantes estruturas encefálicas.
Além disso, a tábua craniana (osso) é irregular, apresentando diversos acidentes
anatómicos que podem lesar o tecido ou parênquima cerebral quando este oscila dentro do
crânio. Isto significa que o encéfalo pode ser afectado, mesmo que a ferida não penetre
dentro do crânio.
Muitas lesões são causadas por um impacto precedido de uma aceleração súbita, como
acontece com uma pancada forte na cabeça, ou então, por uma desaceleração repentina,
como ocorre quando a cabeça se encontra em movimento e bate contra um objecto fixo. O
cérebro pode ficar afectado tanto no ponto do impacto como no pólo oposto. As lesões por
aceleração-desaceleração, também se denominam coup contrecoup (do francês golpe-
contragolpe). Mais concretamente, quando é aplicada uma força no exterior da caixa
craniana, como no caso de um embate frontal contra o pára-brisas de um automóvel, a
primeira área cerebral a sofrer lesão é o lobo frontal. Mas não se fica por aí: o encéfalo
ressalta dentro do crânio, faz ricochete, e vem bater na região posterior do crânio
provocando lesões occipitais. Neste movimento de vai-vem o encéfalo vai sofrendo outras
lesões provocadas pelas irregularidades do osso da caixa craniana. Por exemplo, a parede
da órbita (olho) produz lesões na face interna do lobo temporal. Consequentemente, apesar
do embate ter sido frontal, o doente apresenta sinais e sintomas que nos indicam disfunção
dessa região cerebral.
As lesões dos pólos frontais e dos pólos temporais, quer das suas faces externas, quer das
faces internas, são de extrema importância, já que, se relacionam com processos de
memória, tomada de decisões e planificação, comportamento social e, em geral, com a
adaptação do ser humano.
A danificação pré-frontal bilateral impede uma apresentação emocional normal e, de
forma não menos importante, provoca anormalidades no comportamento social.
Um subconjunto de subsistemas neurais está associado aos comportamentos de
planificação e de decisão "pessoais e sociais". Estes sistemas estão relacionados com um
aspecto da razão que, habitualmente, designamos por racionalidade.
António Damásio
Um traumatismo grave na cabeça pode produzir um rompimento ou uma ruptura de nervos,
de vasos sanguíneos e de tecidos no cérebro e à volta dele. As vias nervosas podem ficar
interrompidas e pode ocorrer uma hemorragia e/ou um edema graves.
O sangue, a tumefacção e a acumulação de líquido (edema) têm um efeito semelhante ao
causado por uma massa que cresce dentro do crânio e, uma vez que este não pode
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expandir-se, o aumento da pressão pode danificar ou destruir o tecido cerebral. Devido à
posição do cérebro dentro do crânio, a pressão tende a empurrá-lo para baixo, isto é, para o
orifício que o faz comunicar com a parte inferior (tronco cerebral), uma situação que se
conhece como herniação. As herniações podem implicar um risco de morte porque o
tronco cerebral controla funções tão vitais como a frequência cardíaca e a frequência
respiratória.
Outra consequência dos TCE que importa abordar, são os hematomas. Como vimos, os
vasos sanguíneos intracranianos podem ser lesionados, causando rupturas e consequente
saída de sangue. Este pode acumular-se em várias localizações, dando origem a vários
tipos de hematomas: intracerebral, epidural e subdural.
O hematoma intracerebral é uma hemorragia que ocorre dentro do tecido cerebral, ou
seja, é uma hemorragia intra-axial, já que se dá dentro e não fora do parênquima cerebral.
Estes doentes têm sintomas que correspondem às funções controladas pela área cerebral
destruída pelo sangue. Outros sintomas incluem aumento da pressão intracraniana devido à
massa de sangue que pressiona o encéfalo.
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deterioração difusa da função cerebral pode afectar a memória e o sono e conduzir a um
estado de confusão e de coma.
Num primeiro momento é fundamental avaliar o grau de consciência da pessoa que sofreu
o TCE e monitorizar a sua evolução. Com esse objectivo desenvolveu-se uma escala
simples, amplamente utilizada: a Escala de Coma de Glasgow. Trata-se de uma escala
neurológica que revelou ser um método confiável e objectivo para registar o nível de
consciência, para avaliação inicial e contínua após um traumatismo craniano. É de grande
utilidade na previsão de eventuais sequelas. Inicialmente usada para avaliar o nível de
consciência depois de um TCE, esta escala é, actualmente, aplicada a diferentes situações.
Um grupo de pesquisadores ingleses (do Department of Neurosurgery, University
Glasgow and Department of Community Health Sciences, University of Edinburg),
liderados pela Dra. Sharon Thornhill, conduziram um estudo, publicado em 2000, que
tentava determinar a frequência de invalidez em jovens e adultos, admitidos em hospitais
da Inglaterra com TCE, e estimava a taxa de incidência de invalidez após 1 ano do trauma.
Concluíram que, após 1 ano, o trauma grave estava mais associado a taxas de mortalidade
ou vida vegetativa, do que a taxas de boa recuperação. Pelo contrário, a incapacidade tardia
não foi associada a traumas graves, mas aconteceu em cerca da metade dos pacientes com
trauma leve e moderado. A maioria dos sobreviventes de TCE grave é inválida, mas cerca
de metade dos pacientes com trauma leve e metade daqueles com trauma moderado são
igualmente inválidos.
A taxa de dependência de cuidados aconteceu em aproximadamente 45% dos
sobreviventes de TCE graves, 30% nos casos de TCE moderados e 28% nos de TCE leves.
Apesar da maioria das sequelas serem do estado mental, os serviços mais procurados foram
os de fisioterapia. No final da pesquisa, os autores chegaram à conclusão de que o número
de inválidos em consequência de TCE classificados como leves, é muito grande, e que a
classificação desses traumas pela escala de Glasgow como leves pode ser inapropriada em
muitas situações.
Alguns indivíduos com TCE, mesmo de grau leve, apresentam a designada síndrome pós-
concussão, ou síndrome pós-concussional. Esta inclui uma variedade de sintomas, tais
como, dores de cabeça, vertigens, cansaço, irritabilidade, redução da capacidade de
concentração e de raciocínio, alterações da memória, insónia, tolerância reduzida ao stress
e à excitação, desencadeada por emoções ou pelo uso de álcool, sendo que estes se mantêm
durante um período de tempo considerável após o traumatismo. Os exames
complementares de diagnóstico podem fornecer evidências objectivas que justificam os
sintomas, mas frequentemente, nada surge nestes exames.
A avaliação dos efeitos do TCE no ajustamento pessoal e social e do impacto na família e
na comunidade levou investigadores a desenvolverem outras escalas e testes
estandardizados para exame e documentação desses problemas.
Os tumores do encéfalo são, também, causadores de sinais e sintomas que podem ser
avaliados em neuropsicologia.
Um tumor cerebral benigno é uma massa anormal, mas não cancerosa, de tecido cerebral.
Um tumor cerebral maligno é qualquer cancro no cérebro com capacidade para invadir e
destruir tecido adjacente ou um cancro que se espalhou (que criou metástases) pelo cérebro
vindo de outro lugar do corpo através da corrente sanguínea.
Os tumores cerebrais são classificados de acordo com uma escala em graus: de baixo grau
(grau I) a alto grau (grau IV). O grau do tumor está relacionado com o aspecto das células
sob observação microscópica. As células de tumores de alto grau têm um aspecto mais
anómalo e tendem a crescer mais depressa do que as células de tumores de baixo grau.
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Os tumores gerados no próprio tecido cerebral são conhecidos como tumores primários
do cérebro. Os tumores cerebrais primários são classificados de acordo com o tipo de
células ou com a parte do encéfalo onde tiveram origem. Os tumores cerebrais primários
mais comuns são os gliomas, que têm início nas células gliais (ex: Astrocitoma;
Oligodendroglioma).
Um cancro que se difunde para o encéfalo, a partir de outra parte do corpo, é diferente do
tumor cerebral primário. Quando as células cancerígenas se disseminam para o encéfalo, a
partir de outro órgão (ex.: pulmão ou mama), o tumor passa a receber a designação de
tumor secundário ou tumor metastizado. Os tumores cerebrais secundários são muito
mais comuns do que os tumores primários.
Os sintomas aparecem quando o tecido cerebral é destruído ou quando a pressão no
cérebro aumenta; tais circunstâncias podem ocorrer, quer o tumor cerebral seja benigno,
quer seja maligno. No entanto, quando o tumor cerebral é uma metástase proveniente de
um cancro distante, o doente pode também ter sintomas relacionados com esse cancro. Por
exemplo, o cancro do pulmão pode causar tosse com muco sanguinolento ou o cancro da
mama pode produzir um nódulo na mama.
Os sintomas de um tumor cerebral dependem do seu tamanho, do seu crescimento e da sua
localização. Os tumores em determinadas partes do cérebro podem alcançar um tamanho
considerável antes de os sintomas se manifestarem; pelo contrário, noutras partes do
cérebro, mesmo um tumor pequeno pode ter efeitos devastadores.
Alguns tumores do cérebro causam convulsões. Estas, no caso de tumores cerebrais
benignos, de meningeomas e de cancros de evolução lenta, como os astrocitomas, são mais
frequentes do que nos cancros de evolução rápida, como o glioblastoma multiforme.
Um tumor pode ser a causa de fraqueza ou paralisia de um braço, uma perna, ou um lado
do corpo; pode afectar a capacidade de sentir calor, frio, pressão, um contacto ligeiro ou
uma picada de um objecto pontiagudo. Os tumores podem, também, afectar a visão e o
sentido do olfacto. A pressão no cérebro pode causar alterações na personalidade e pode
fazer com que a pessoa sinta sonolência, confusão e dificuldade de raciocinar. Estes
sintomas são muito graves e requerem atenção médica imediata.
Quem estuda as alterações do comportamento com base nestes casos deve manter uma
relação estreita com o neurocirurgião, no sentido de conhecer com precisão o que se
passou no acto cirúrgico, já que, a ferida operatória pode ser, ela própria, causadora de
sinais ou sintomas que importa avaliar e interpretar. Daí que o doente deva ser avaliado
antes e depois da cirurgia.
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− Factores neuroquímicos, que incluem a falta de substâncias utilizadas pelas células
nervosas para transmitir os impulsos nervosos (neurotransmissores), como a acetilcolina,
por exemplo.
− Baixo nível educacional/ocupacional.
− Traumatismo crânio-encefálico prévio.
− Doença cerebrovascular (duplica o risco).
− Antecedentes familiares de Demência Alzheimer - nalgumas famílias (5 a 10% dos
casos) há uma predisposição hereditária para o desenvolvimento do distúrbio.
Relativamente aos sinais e sintomas desta doença, é possível organizá-los em três etapas
de acordo com o grau de evolução da doença no tempo. Contudo, tenha-se atenção ao facto
de que estes estádios dificilmente são estanques e, muito menos, bem delimitados no
indivíduo que padece da doença.
Estádio inicial
− Memória: perdas ao nível da memória recente
− Linguagem: afasia ligeira (dificuldade em encontrar palavras)
− Orientação: procura o familiar, evita o não familiar
− Motor: alguma dificuldade em escrever, usar objectos
− Humor/comportamento: depressão /apatia
− AVD’s: precisa de ser recordado
Estádio moderado
− Memória: perda mais acentuada de memória recente
− Linguagem: afasia moderada
− Orientação: perde-se
− Motor: acções repetitivas, apraxia
− Humor/comportamento: alterações variáveis
− AVD’s: precisa de ser recordado e de ajuda parcial
Estádio severo
− Memória: confunde passado e presente
− Linguagem: afasia expressiva e receptiva
− Orientação: não reconhece lugares familiares
− Motor: bradicinésia, risco de quedas
− Humor/comportamento: alterações variáveis
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− AVD’s: precisa de ser recordado e de ajuda total
No que se refere ao tratamento, desde 1996 que existe um conjunto de fármacos que têm
permitido um atraso significativo na progressão da doença. Não é demais referir que o
cuidador é uma das peças-chave no combate a esta doença e, por isso, para o cuidador é
também preciso: educação, treino e consultas; apoio em situações limite; aconselhamento
individual e familiar; grupos de suporte.
Outra forma de demência muito frequente é a Demência Vascular. Entende-se por
Demência Vascular, uma alteração no funcionamento cognitivo relativo a lesões
cerebrovasculares de natureza isquémica ou, mais invulgarmente, hemorrágica. As
demências vasculares provocadas por multienfartes são as mais frequentes.
Como sintomas físicos e comunicativos constata-se a paralisia e dificuldades no discurso e
o aparecimento de sintomas cognitivos, comportamentais e emocionais muito semelhantes
aos descritos anteriormente. Quando a área cerebral lesada é extensa a pessoa começa a
experienciar sintomas de demência, incluindo perdas de memória (acontecimentos
recentes), dificuldades no discurso e linguagem, incapacidade na realização de tarefas
simples ou de rotina e dificuldade no reconhecimento de pessoas e objectos familiares.
No que respeita ao tratamento da Demência Vascular existem medidas que têm como
objectivo reduzir o risco de ocorrência de outros acidentes vasculares cerebrais, no entanto
não revertem os sintomas, embora possam impedir a sua evolução.
A Demência Secundária a Doença de Parkinson é uma doença neurológica lentamente
progressiva associada a uma perturbação numa área específica do encéfalo, ou seja, é uma
doença degenerativa do sistema nervoso central. No cérebro, determinadas células
produzem uma substância química denominada dopamina (neurotransmissor). A dopamina
transporta mensagens que informam o corpo sobre como e quando mover-se. A doença de
Parkinson ocorre quando estas células cerebrais morrem ou ficam danificadas. Deixa de
existir dopamina suficiente para transportar estas mensagens e o movimento torna-se mais
difícil.
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aliado ao distúrbio motor, gera incapacidade comparável aos acidentes vasculares
cerebrais.
Outros sintomas que poderão ser observados é a voz que se torna lenta e monótona
verificando-se, também, afectação na capacidade de controlar a saliva, pobreza de mímica
facial, diminuição do piscar de olhos, olhar fixo e marcha em passos curtos (petit pass)
arrastando os pés com o corpo inclinado para a frente. Há ainda a probabilidade de o
doente desenvolver um quadro depressivo e de ter alucinações, problemas em engolir,
sofrer de obstipação e de incontinência urinária.
A doença de Parkinson, descrita primeiramente por James Parkinson em "An Essay on the
Shaking Pulse" (1817), pode surgir em qualquer idade, mas é pouco comum nas pessoas
com idade inferior a 30 anos. O risco de desenvolver esta doença aumenta com a idade.
Ocorre em todas as partes do mundo e os homens são ligeiramente mais afectados do que as
mulheres (3:2).
O tratamento tem sido farmacológico, mas nenhum dos fármacos cura a doença, nem
suprime a sua evolução. No entanto, facilitam o movimento e, durante anos, estes doentes
podem levar a cabo uma vida funcionalmente activa. Entretanto, está a ser implementada
uma nova técnica, que consiste em estimular o cérebro (Deep Brain Stimulation – DBS)
através de eléctrodos que emitem sinais a uma região específica do cérebro com o intuito
de acalmar o excesso de actividade, reduzindo os tremores e movimentos descoordenados
dos doentes. Este método está já a ser utilizado nos pacientes que não respondem de forma
positiva aos tratamentos com medicamentos.
Fig. 30: Alterações típicas nas crises epilépticas consoante a(s) área(s) cerebral(ais) em disfunção.
Qualquer pessoa pode sofrer um ataque epiléptico devido, por exemplo, a um choque
eléctrico, deficiência de oxigénio, traumatismo craniano, baixa do açúcar no sangue
(hipoglicémia), privação de álcool, abuso de cocaína. 1 em cada 20 pessoas têm uma única
crise isolada durante a sua vida. As crianças mais pequenas podem ter convulsões quando
têm febre; nestes casos, são chamadas "convulsões febris", mas não representam epilepsia.
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Uma crise isolada não é sinónimo de epilepsia. Este termo apenas se emprega quando as
crises têm tendência a repetir-se, espontaneamente, ao longo do tempo.
A epilepsia afecta milhões de pessoas em todo o mundo. Pode iniciar-se em qualquer
idade, mas é mais comum até aos 25 e depois dos 65 anos.
Conquanto possa ser provocada por uma doença infecciosa, a epilepsia, ao invés de
algumas crenças habituais, não é contagiosa, ninguém a pode contrair em contacto com um
epiléptico. Na maioria dos casos a epilepsia deve-se a uma lesão cerebral causada por um
traumatismo provocado por acidente físico, um tumor, uma infecção, o parasita cisticerco,
problemas durante o parto, ou uma meningite. Embora com menor frequência pode ser
genética, significando que, em poucos casos, a epilepsia pode ser transmitida aos filhos.
Outro factor que pode explicar a incidência da epilepsia entre parentes próximos é que
algumas causas como a infecção e a meningite são contagiosas, expondo parentes
próximos a uma incidência maior. Do mesmo modo, a cisticercose, que pode causar
epilepsia, pode surgir em vários parentes próximos, porque ingerem alimentos
contaminados pelo parasita Taenia.
A epilepsia pode assumir várias formas, desde as muito benignas até formas gravíssimas,
sendo que, neste caso, as crises epilépticas são, geralmente, sintomas de doenças mais
generalizadas.
Podem dividir-se em dois grandes grupos: as epilepsias sintomáticas (as crises são
sintomas de uma doença de base) e as epilepsias idiopáticas (não se conhecem as causas
das crises).
As formas que são consideradas sintomáticas podem, por sua vez, ser agrupadas em dois
grandes grupos: as formas infantis (a maioria das vezes associadas a doenças metabólicas),
e as formas adquiridas (por lesão cerebral), o que pode acontecer em qualquer idade.
Vamos debruçar-nos sobre estas últimas. Quando acontece uma lesão em qualquer ponto
do cérebro ocorrem alterações locais que formam tecido cicatricial que, com mais
facilidade gera fenómenos bioeléctricos locais, desajustados em tempo e intensidade e
dando origem ao que se designa por “foco epiléptico”. Este foco epiléptico pode, em
determinados momentos, influenciar as áreas vizinhas e dar origem à sua entrada em
função. As convulsões são, em geral, movimentos rítmicos e estereotipados, limitados a
uma área do corpo (“crise parcial simples”), mas que podem estender-se a outras áreas,
sem haver perda do conhecimento. No entanto, as convulsões podem generalizar-se a todo
o corpo, ou seja, uma descarga começa numa zona circunscrita e, posteriormente, atinge
todo o cérebro, então designa-se por "crise parcial com generalização secundária".
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- Crise Generalizada Tónico-Clónica (Grande Mal): queda súbita (com ou sem grito),
rigidez, depois convulsões, paragem da respiração, face arroxeada, possível perda de urina
e/ou mordedura da língua, tudo durante menos de 5 minutos. Reaparece a respiração.
Possível confusão e/ou fadiga antes do retorno à normalidade.
- Ausência (Pequeno Mal): paragem súbita, durante segundos, mais comum em crianças.
Por vezes, acompanhada por pestanejo ou movimentos mastigatórios. Recuperação rápida,
com amnésia do doente para estes episódios. Quando não reconhecida, origina problemas
na aprendizagem.
- Crise Mioclónica: contracções musculares súbitas e maciças atingindo todo o corpo ou
partes do mesmo. O doente pode atirar com o que tem nas mãos ou cair de uma cadeira.
- Crise Atónica: Queda súbita, sem perda de conhecimento, em crianças ou adultos; 10 a
60 segundos depois, é possível pôr-se de pé e andar.
- Crise Parcial Simples: convulsões limitadas a uma área do corpo, mas que podem
estender-se a outras áreas, sem haver perda do conhecimento. Podem generalizar-se e
provocar uma crise de grande mal. Sensação de formigueiros ou picada percorrendo uma
ou mais áreas corporais. Visualização ou audição de coisas ou sons que não estão
presentes. Sensação inexplicável de medo ou prazer. Cheiros ou gostos desagradáveis, sem
nada haver que os provoque. Sensação "esquisita" no estômago.
- Crise Parcial Complexa: paragem seguida de movimentos mastigatórios e automatismos,
constando de gestos desajeitados de mexer na roupa, agarrar ou manusear objectos, despir-
se. Pode deambular. Pode resistir quando agarrado. Duração de alguns minutos, confusão
após a crise que pode ser mais longa e amnésia para o ataque.
- Estado de Mal Epiléptico: situação em que as convulsões se seguem umas às outras sem
haver, entre elas, recuperação da consciência. Necessita de hospitalização e tratamento
médico imediato, pois pode ser mortal ou provocar lesões cerebrais
O tratamento da epilepsia baseia-se no controlo das crises com medicamentos
antiepilépticos destinados a restabelecer o equilíbrio eléctrico no cérebro.
O objectivo do tratamento passa por reduzir o número de crises ou pará-las por completo.
Como estas aparecem subitamente, o doente tem de ser medicado constantemente, pelo que
os efeitos secundários causados pela medicação devem ser tidos em conta.
Quando a medicação não consegue controlar as crises, o doente pode ser proposto para
cirurgia se reunir condições para tal.
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3.1 - Dominância Hemisférica versus Especialização Hemisférica
Como vimos anteriormente, o conceito de “dominância cerebral” nasceu com a história da
afasia, quando Paul Broca chamou a atenção para o facto das alterações da linguagem
estarem relacionadas com lesões do hemisfério cerebral esquerdo. Por se considerar que a
linguagem é a expressão do pensamento, da razão, e por esta ser uma função dominante no
ser humano, considerou-se que o hemisfério onde se “localizava” esta função tão nobre
seria dominador relativamente ao outro que, na altura, se achava não centralizar funções
importantes para a razão, nem para a vida social.
O conceito de dominância hemisférica surgiu, então, para explicar a relação entre a
actividade dos dois hemisférios, no sentido de que determinadas funções linguísticas
exercidas predominantemente pelo hemisfério esquerdo exerceriam uma dominância sobre
as funções do hemisfério direito.
No entanto, hoje sabemos que, apesar do nosso cérebro englobar dois hemisférios, com
características morfológicas um pouco diferentes, não existe relação de dominância entre
eles. Pelo contrário, eles trabalham em conjunto, servindo-se dos milhões de fibras
nervosas que constituem as comissuras cerebrais e se encarregam de os pôr em constante
interacção.
Investigações mais recentes mostraram, então, que os dois hemisférios não interagem
através do domínio de um sobre o outro, mas sim, através da especialização de certas
funções, ou seja, um dos hemisférios é encarregado de um grupo de funções, enquanto o
segundo se encarrega de outras. O que é importante realçar é que ambos trabalham em
conjunto. Este novo conceito designa-se especialização hemisférica.
O conceito de especialização hemisférica confunde-se, por vezes, com os de lateralidade e
de assimetria, mas significam conceitos diferentes. A lateralidade refere-se ao facto de
que algumas funções serem representadas em apenas um dos hemisférios e outras nos dois;
a assimetria significa que um hemisfério não é exactamente igual ao outro.
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isso não quer dizer que o direito não colabore nesta função. Pelo contrário, é a prosódia
controlada pelo hemisfério direito, que confere à linguagem nuances afectivas essenciais
para a comunicação interpessoal. Quando ouvimos uma história, o hemisfério esquerdo
compreende o significado das palavras e da gramática. O hemisfério direito ouve o tom de
voz, a inflexão, faz o enquadramento da história num determinado contexto e cria uma
compreensão geral. É correcta a afirmação de que a linguagem se concentra no hemisfério
esquerdo. No entanto, caso este seja danificado, a pessoa habitualmente consegue
compreender o que está a ser dito, mas não responde. São perdidos muitos dos matizes da
linguagem se o hemisfério direito do cérebro é danificado.
Resumindo, estudos revelaram que o hemisfério direito percebe e comanda funções
globais, categoriais, da linguagem, enquanto o esquerdo se encarrega de aspectos mais
específicos.
O hemisfério esquerdo é, também, responsável pela realização mental de cálculos
matemáticos, pelo comando da escrita e pela compreensão dela através da leitura. Já o
hemisfério direito está mais envolvido na percepção de sons musicais e no reconhecimento
de faces, especialmente quando se trata de aspectos gerais. O hemisfério esquerdo participa
também no reconhecimento de faces, mas a sua especialidade é descobrir precisamente
quem é o dono de cada face. Da mesma forma, o hemisfério direito é especialmente capaz
de identificar categorias gerais de objectos e seres vivos, mas é o esquerdo que detecta as
categorias específicas. O hemisfério direito é melhor na detecção de relações espaciais,
particularmente as relações métricas, quantificáveis, aquelas que são úteis para nos
deslocarmos no ambiente. O hemisfério esquerdo não deixa de participar dessa função,
mas é melhor no reconhecimento de relações espaciais categoriais qualitativas. No que se
refere às aptidões motoras, o hemisfério esquerdo controla os movimentos mais precisos da
mão e perna direitas e o hemisfério direito controla esses mesmos movimentos, mas da
mão e perna esquerdas.
Concretizando em termos mais específicos, as evidências científicas têm indicado, por
exemplo, que o córtex parietal posterior direito é mais activado durante actividades não-
verbais e espaciais e o esquerdo é mais activado durante actividades verbais, ou seja, a
ança fonológica é associada ao funcionamento do hemisfério esquerdo e o esboço visuo-
espacial ao hemisfério direito.
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Fig. 37: Corpo caloso e comissura anterior (cortes frontal e sagital)
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3.2 - Síndrome de Desconexão do Corpo Caloso (Síndrome de Desconexão Inter-
Hemisférica)
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submetido à calosotomia viraria a cabeça discretamente para o lado e utilizaria o olho
direito para ver o objecto podendo, então, nomeá-lo e descreve-lo sem problema.
Outro sinal tido como clássico na síndrome aguda de desconexão do corpo caloso é a
redução, até mesmo a abolição, da linguagem de expressão, embora a linguagem de
recepção permaneça inalterada na maioria dos pacientes. Assim, tal como o “antagonismo
das mãos”, o comprometimento da linguagem tende a ser transitório e estar completamente
resolvido passados alguns dias. Paresia do membro inferior não dominante após a
calosotomia é outra queixa relativamente frequente. A causa neurofisiológica da redução
da linguagem e da paresia do membro inferior não dominante não está completamente
clara até o momento. Na verdade, não se sabe se estes sinais de comprometimento
neurológico decorrem da secção calosa propriamente dita ou de disfunção transitória das
áreas da linguagem e áreas motoras pelo procedimento cirúrgico.
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• Tipo III- Hipoplasia: embora, neste caso, o corpo caloso esteja completamente
formado, apresenta uma redução de tamanho e, em geral, está associada a
importantes alterações do córtex cerebral.
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