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Fábio Frizzo
Universidade Cândido Mendes-Universidade Estácio de Sá
(Rio de Janeiro, Brasil)
sobre as elites locais, exercida através de uma trama vertical de relações sociais que
envolvem clientelismo e patronato.
A Terceira Via é composta por trabalhos como o do egiptólogo argentino Marcelo
Campagno, que aponta para a coexistência de lógicas complementares de Estado,
parentesco e patronato, necessárias à exploração dos camponeses. Por outro lado, neste
mesmo sentido, avançamos em uma proposta de análise baseada no marxismo, a partir da
identificação entre o Estado e uma classe dominante, já observada nos estudos marxianos
sobre as “formas asiáticas”.
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estes chefes sublocavam os lotes familiares aos camponeses, responsáveis pela produção e,
neste sentido, segundo a lógica marxista, verdadeiros proprietários da terra2.
O controle estatal exercido sobre o campesinato reconhecia, portanto, as lideranças
locais emergidas do processo de diferenciação social interno às comunidades aldeãs.
Segundo Eyre, este seria um conceito de poder emergente muito mais razoável do que
aquele que propõe uma imposição do Estado sobre as estruturas campesinas, garantindo
a flexibilidade necessária à produção no contexto natural da agricultura de cheia.
A necessidade de encontrar um padrão de organização social apropriado para
regiões de agricultura de cheia fez com que Eyre (2004, 167-85) criticasse a aplicação de
modelos burocrático-redistributivos que, segundo ele, partem de um ponto de vista mais
ideológico do que prático e que, em alguma medida, são baseados numa interpretação
européia da história. A solução encontrada foi a associação das relações de produção
egípcias –idênticas no espaço de milênios que separa o período faraônico do o Egito
moderno!– com aquelas encontradas nas comunidades do Vale do Rio Senegal, calcadas
na redistribuição anual de terras aráveis.
A ênfase no contexto ecológico é supervalorizada no trabalho de Eyre, em
detrimento de mudanças sócio-históricas tanto nas forças produtivas quanto nas relações
de produção. Soma-se a isto a extrapolação das fontes relativas a distintos períodos da
história egípcia, por vezes separados por milênios, resultando em uma continuidade
inabalável na estrutura econômico-social do Vale do Nilo. A exemplo dos modernistas
do século XIX, o autor identifica na composição demográfica a grande diferença entre o
Egito Antigo e Moderno, para ele:
“... a continuidade na história sócio-econômica do Egito do período faraônico aos tempos
modernos é mais que uma construção ideológica e a realidade dessa continuidade fornece
um aviso cauteloso contra abordagens que compartimentam períodos e mostram a história
como um processo de desenvolvimento linear (...). Dados dos períodos Greco-Romano,
Otomano e do Egito moderno podem ser usados como base para avaliação dos parcos dados
relevantes para o período faraônico”3.
2 Segundo Marx, “a propriedade significa originalmente nada mais que a relação do homem com suas condições naturais
de produção como pertencentes a ele, como suas...” (1975, 415).
3 Eyre (1997, 367).
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a mão de obra e qualquer outro bem ligado ao seu cargo e será designado para trabalhos
forçados”7.
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Conclusão
Há, em todos os modelos expostos, acertos a serem levados em consideração.
Questões como a diferenciação social nas comunidades camponesas ou o uso das elites
locais como correia de transmissão do poder central dão pistas importantes de como
o campesinato era dominado no Egito Faraônico. Tais acertos, todavia, não abonam
equívocos graves na visão histórica de certos autores, como o caso de Christopher Eyre e
sua visão histórica de continuidades milenares praticamente imutáveis regidas pela lógica
naturalizada da economia marginal.
A oposição entre Sociedades Ocidentais e Orientais feita por Moreno García, por
outro lado, parte de uma concepção histórica que unifica todas as experiências orientais
em oposição ao modelo feudal da Europa Ocidental, perpassando também uma ideia de
continuidade demasiada no tempo-espaço.
As propostas de terceira via, tanto do marxismo quanto de Marcelo Campagno,
aparecem como formas interessantes de identificar os processos de dominação e exploração
do campesinato a partir de uma lógica complexa que mescla diferentes mecanismos na
tentativa de manutenção do poder por uma classe dominante.
Por fim, parece ser salutar encarar a base da exploração na expropriação de
relações sociais locais necessárias à reprodução das comunidades aldeãs, o que explicaria
o surgimento do Estado e a manutenção de formas assimétricas de relacionamento em
sociedade anteriores a ele.
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