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Comunicação não-violenta

O primeiro ponto que é sempre necessário esclarecer sobre comunicação não-violenta é que não se
trata de falar mansinho, baixar a cabeça e evitar conflitos. É exatamente o contrário: reconhecer o
que faz sentido para nós e lutar para que haja mais vida. Comunicação trata de um processo de
conexão e de construção colaborativa de sentido, algo que se faz quando reconhecemos que somos
um coletivo. Não-violenta é uma proposta de futuro cujo conceito é insuficiente e, por isso mesmo,
provocador e transformador.
Nada do que está escrito aqui é regra ou transcrição direta do que foi dito. Minhas anotações estão
mais para isso mesmo: notas da minha experiência sobre um evento profundo, intenso e difícil de
processar. Como de costume, a experiência vivida é muito mais poderosa do que o texto jamais
conseguirá ser.
Isso esclarecido, vamos aos aprendizados.

1) A Comunicação Não-Violenta opera em três níveis


Existem três níveis interdependentes que se cruzam, informam e influenciam quando tratamos de
comunicação não-violenta. De modo didático, eles podem ser entendidos separadamente, mas na
prática da vida a tendência é que eles não se esgotem em si mesmos.
O primeiro nível é o intrapessoal e diz respeito à nossa relação com nós mesmos. É aqui que
entram nossas expectativas e também a maneira como nosso corpo, nossos pensamentos e nossos
sentimentos se articulam.
O segundo nível é o interpessoal, aquele que se refere à minha relação com o outro. Até uns dias
atrás, eu achava que esse era o único campo de atuação da CNV, porque é o mais evidente, é onde o
diálogo se mostra possível.
O terceiro nível é o sistêmico, correspondendo aos sistemas coletivos de acordos implícitos que
utilizamos para arquitetar as relações humanas. Salas de aula, tribunais, famílias, ônibus, hospitais,
todos esses espaços são regulados por sistemas de educação, justiça, família, coletividade, saúde
etc. É importante dizer que, ainda que não tenhamos inventado a maior parte dos sistemas dos quais
fazemos parte, nós somos responsáveis pela nossa participação neles.
Nós sofremos de cegueira sistêmica, ou seja, da incapacidade de perceber as normas dos sistemas
que regularmente organizam nosso comportamento. Algumas atitudes convencionais parecem
naturais, são ficções nas quais acreditamos com tanta força que muitas vezes sequer percebemos
que há, sim, uma escolha em cada ação nossa.

2) Algo intenso acontece quando paramos para ouvir


Por esses dias, meu celular estava sem internet. Eu saí de casa para comprar pão e deixei o telefone
em casa, já que ele não me seria útil na rua. Entrei no elevador e havia uma moça. Nos vimos com
algum susto. “Bom dia”, ela disse, “tudo bem?”. Eu menti qualquer coisa murmurada e perguntei a
ela se estava tudo bem. Ela mentiu que sim.
Tudo bem? Tudo bem.
Ela não queria minha resposta sincera e eu também não. Nós estávamos ocupados demais em
nossos mundinhos para aproveitar o minuto de elevador para compartilhar, conectar e ampliar um
pouquinho de nossas realidades.
Durante o curso, fomos convidados a perguntar para outra pessoa “como vai?” e ouvir a resposta
em silêncio. Ao longo de uns dois minutos, tínhamos à nossa disposição alguém para nos ouvir falar
com tanta sinceridade quanto conseguíssemos evocar. Quando falei sobre como estava me sentindo,
fui encontrando na escuta de alguém que nem sabia ainda meu nome a possibilidade de me conectar
comigo mesmo.
Dizer a verdade para uma pessoa desconhecida me deixou tão próximo dela quanto de amigos de
anos, ainda que só durante aqueles minutinhos em que nos retiramos do jogo dos fingimentos
sociais.

3) Todos os rótulos são superficiais e insuficientes


Melhor amigo. Mãe. Burro. CDF. Brigão. Canceriano.
Rótulos são atalhos para acessarmos o mundo, funcionam como mapas que nos indicam caminhos
para percorrer o território, mas sem demora corremos o risco de olhar o mapa e acharmos que
vemos o território. Rapidinho, passamos a achar que o mapa é tudo o que há.
Acontece que somos desconhecidos, sempre, porque estamos em constante e inacabável mudança.
Se hoje sou diferente de há dois anos, quando primeiro escrevi sobre comunicação não-violenta, por
que muitas pessoas me tratam como se eu fosse a mesma pessoa? Por que eu trato as pessoas na
minha vida como se fossem as mesmas, como se eu soubesse alguma coisa sobre as verdades delas?
Essas verdades se atualizam com o tempo, para elas e para mim.
Somos mistérios complexos. Quando chegamos em alguém com uma ideia pronta sobre quem é
essa outra pessoa, nós estamos nos relacionando com nossa expectativa, com nossa impressão, com
nosso julgamento, com nosso mapa, não com o território que se revela à nossa frente.

4) Somos todos incompetentes e está tudo bem


Se não podemos saber de antemão quem são os outros e o que buscam, estaremos errando o tempo
inteiro na tentativa de descobrir as respostas corretas. Somos, portanto, incompetentes, mas está
tudo bem se entendermos que a comunicação não-violenta não é uma ferramenta precisa e sim uma
investigação contínua.
A CNV é uma tática na qual, errando ou acertando, nós ganhamos, porque o objetivo é intensificar a
conexão entre as pessoas. Se eu te pergunto sobre tuas necessidades e erro, tu me explica e nós dois
ganhamos clareza. Se eu acerto, ganhamos clareza também. Assumir nossa incompetência frente ao
mistério do outro é um passo necessário para entrarmos em contato.

5) Ideias se espalham feito vírus


Dominic compartilhou uma história sobre o dia em que foi conhecer uma moça. Seus amigos já o
haviam alertado que ela era uma pessoa difícil, durona. Quando disseram isso, eles instalaram na
cabeça de Dominc essa ideia de pessoa difícil, durona. Daí pra frente, não havia muito que ele
pudesse fazer para se livrar da ideia. Uma vez transmitida, a ideia do outro passa a habitar nossa
cabeça.
O segredo não é gastar energia tentando negar as ideias que habitam nossas cabeças. Pelo contrário,
essas ideias são atalhos para pensar o mundo e podem ser úteis como sistema de alerta. Contudo, se
somos incompetentes e aceitamos nossa incapacidade de ler o território só com o mapa, precisamos
observar como ele se apresenta e verificar o que do nosso mapa é útil para o contato real.
Precisamos estar presentes o suficiente para criar um espaço entre nossas ideias (porque agora já
não são mais dos outros, já viraram nossas) e a realidade. Nesse espacinho, exercemos a observação
e a partir daí atualizamos nosso mapa.

6) Sentir raiva não é um problema


Qual foi a última vez em que algo irrelevante te tirou do sério? Provavelmente nunca, porque só nos
irrita aquilo que, de alguma maneira, nos importa. A raiva é um indício de que nos importamos. O
mesmo vale para a tristeza e para a alegria. Se estamos alheios ou indiferentes a algo, nós não
sentimos nada.
Entretanto, somos ensinados que devemos controlar e suprimir nossas emoções. Raiva, tristeza?
Nem pensar! Somos seres racionais e devemos ser lógicos, certeiros, frios, os sentimentos só
servem para atrapalhar nosso julgamento! Quanto tempo perdido tentando ignorar algo que é parte
de nós.
Nós somos o resultado de milênios de uma evolução precisa em que tudo o que persistiu conosco se
provou mais útil para nossa sobrevivência. Como explicar os sentimentos, essas coisas
avassaladoras que modificam nossa relação com o mundo de forma tão intensa? Uma proposta,
corroborada pela neurociência, é a de que os sentimentos são um sistema de alerta muito fino para
reconhecermos quando algo está fora de sintonia.
Para recuperar a sintonia, precisamos reconhecer nossa responsabilidade e para o que os
sentimentos nos alertam.

7) Nossos sentimentos são nossa responsabilidade


A tristeza que sinto quando alguém querido me decepciona e a raiva que me consome quando
alguém me agride são sentimentos que pertencem a mim. A agressão, ou o ato que serve como
gatilho, pode vir de outra pessoa, mas o sentimento é um sistema interno meu para me avisar que
tem algo errado. Meu, unicamente.
A responsabilidade pelo que eu sinto é minha, de mais ninguém.
Ninguém me deixa triste. Não há pessoa que me dê raiva. Essas frases são ficções que usamos para
deslocar para longe de nós a responsabilidade por aquilo que sentimos. Quando sinto raiva, tristeza,
alegria, cabe a mim lidar com esses sentimentos, reconhecer o que eles querem dizer e escolher o
que fazer com eles.
Isso não significa que é fácil, mas algo que pode ajudar é compreender a razão por trás dos nossos
sentimentos.

8) Tudo o que fazemos é para sanar nossas necessidades


Dominic propôs uma hipótese, a mesma lançada no curso de Compaixão que estou fazendo pelo
The New York Center for Nonviolent Communication (TNYCNC) : e se tudo o que fazemos for
para suprir uma necessidade?
Para compreender essa ideia, precisamos lembrar que necessidade é aquilo que não cessa. São
nossos valores e princípios que informam aquilo que entendemos que não pode nos faltar na vida.
Necessidade não é, por exemplo, querer comprar um carro. Isso é, no máximo, a forma como
decidimos atender a alguma necessidade.
No curso do TNYCNC, recebemos uma lista de necessidades e valores, “coisas que todos nós
queremos em nossas vidas”. Tenho refletido sobre minhas ações e outras que percebo ao meu redor
e até agora parece fazer muito sentido o argumento de que tudo o que fazemos seja para sanar
necessidades. Nesse caso, a comunicação não-violenta nos ajuda a perceber que necessidades são
essas, compreendendo que os sentimentos são a fumaça do fogo daquilo que necessitamos.
O TNYCNC sugere seis necessidades que funcionam como valores-guarda-chuva para uma série
incontável de necessidades. São elas: autonomia, conexão, sentido, paz, bem-estar físico e brincar.
Aqui está a lista completa e em inglês.

9) O que uma pessoa diz é diferente do que uma pessoa é


Estarmos sempre buscando sanar nossas necessidades não quer dizer que tenhamos consciência
delas nem que saibamos comunicá-las. Pelo contrário, somos treinados culturalmente a mentir sobre
como nos sentimos, inclusive para nós mesmos, ao ponto de perdermos contato com o que sentimos
de verdade.
Quando minha mãe me diz para cuidar o que falo ou como me comporto na rua, eu posso me sentir
ferido em termos da minha autonomia, da liberdade de ser quem sou, do sentido de lutar por
visibilidade – e posso também não saber que tudo isso se atiça em mim e solta a fumaça do
incômodo, às vezes até da irritação.
Quando minha mãe me diz para cuidar o que falo ou como me comporto na rua, ela estar sentindo
medo e preocupação, fumaças produzidas pela necessidade de ordem, harmonia, amor e, em última
instância, o próprio bem-estar físico porque o meu sofrimento a impacta porque meu bem-estar é
importante para ela.
Mas se ela me diz para cuidar o que falo e faço, eu posso ouvir apenas isso e achar que ela quer me
podar, me limitar, me controlar. Daí eu brigo, rompo, grito. Ou eu ouço e enxergo a pessoa que está
por trás daquelas palavras e descubro, em meio à minha ignorância e incompetência, que há um
mistério ali para ser investigado, o mistério de como uma pessoa tão diferente de mim é ao mesmo
tempo tão parecida.
E eu me conecto.

10) Ninguém ignora, mas sim presta atenção em algo mais


interessante
Um rapaz levantou a mão e fez uma pergunta ao Dominic: “Tem vezes que alguém vem me contar
algo, mas daí eu perco o foco e fico viajando. A pessoa meio que percebe isso e acaba se
incomodando, mas eu não consigo prestar atenção”.
Dominc riu e perguntou: “tu considerou que teus pensamentos eram mais interessantes naquele
momento?”
“Sim.”
“Então por que tu ia querer prestar atenção em algo menos interessante?”
Nossa atenção se volta para aquilo que capta nosso interesse. Para nos mantermos concentrados em
algo que não nos interessa, precisamos demandar muita energia – e nossa energia é limitada.

11) Para comunicar é necessário ter sinal


Não existe comunicação sem pelo menos duas pessoas conectadas. É como se fôssemos telefones
celulares: precisamos de sinal para que a comunicação acontece. Se não há sinal, podemos falar
tanto quanto quisermos e não conseguiremos que nossas mensagens cheguem à outra pessoa.
Em termos de comunicação não-violenta, ter sinal é estabelecer um elo com a outra pessoa. Esse elo
não precisa ser uma promessa de amizade eterna – até porque isso é impossível. Um elo é uma base
em comum sobre a qual as duas pessoas se encontram e se reconhecem como participantes de um
mesmo movimento, pertencentes em um mesmo instante de cocriação de diálogo.
Um elo pode ser a identificação de que a tua necessidade é uma necessidade que eu também tenho,
e daí temos um ponto em comum a partir do qual podemos trabalhar juntos.

12) O incômodo é a trilha sonora da mudança


Comunicação não-violenta, necessidades, elos. Lendo essas coisas, é até fácil pensar que a CNV se
trata de baixar a cabeça na hora do conflito e evitar incomodar os outros. Afinal, é não violência,
certo? Errado. Estabelecer processos de comunicação não-violenta passa por compreender e assumir
aquilo que é importante e imprescindível para a minha integridade neste momento. Quando
tomamos posição em defesa daquilo que acreditamos, a tendência é que esbarremos em sistemas
previamente instalados que não atendam às nossas necessidades.
O sistema legal e o sistema familiar, por exemplo, não contemplam minha necessidade de
reconhecimento enquanto homem que ama e se relaciona com outro homem e que deseja os
mesmos direitos que homens que amam e se relacionam com mulheres. Se o sistema que está em
jogo não atende à minha necessidade, nós entraremos em conflito e eu farei um movimento para
que ele mude e passe a me acomodar.
Isso vai doer porque vai mexer na vida de outras pessoas já acostumadas com os sistemas como eles
eram. O incômodo faz parte porque a mudança é inevitável e constante.

13) Dinâmicas de poder se instituem imediatamente


Conforme caminhamos do intrapessoal, passamos pelo interpessoal e começamos a chegar no
sistêmico, a desigualdade das relações vai se deixando evidente. Nossos sistemas posicionam
pessoas diferentes em lugares diferentes, acionando expectativas e possibilidades diferentes.
Dominic, como homem branco estrangeiro, consegue acionar uma posição de autoridade maior do
que um homem negro brasileiro costuma conseguir nos mesmos ambientes.
Quando um professor entra na sala de aula e se ajeita na mesa em frente a todas as demais carteiras
da sala, quem está na posição de aluno sabe que tem que ouvir e respeitar quem está na posição de
professor. Com o doutrinamento certo, saberá inclusive que deve confiar, obedecer e seguir o
professor.
Ao naturalizar sistemas que foram instalados para suprir determinadas necessidades, nós
naturalizamos também as relações de poder rígidas que os acompanham.

14) A CNV busca aumentar conexão e qualidade de verdade


das relações
A comunicação não-violenta é um movimento para criar conjuntamente o mundo em que queremos
viver, um mundo com melhores possibilidades de existência para todos. O caminho para isso é
aumentar a conexão, de modo que consigamos perceber que um é porque todos somos. Um mundo
em que uns precisam perder para que eu ganhe não é um mundo melhor para todos, então aí reside o
desafio.
Para lidar com o desafio, a CNV nos convida a aumentar a qualidade de verdade das relações. Ou
seja, a acolher nossas necessidades e a agir em nome delas juntamente às necessidades dos demais,
com as quais nos conectamos.
A comunicação não violência não pode prescrever um conjunto de regras porque trata de um
processo dinâmico, sempre em movimento, sempre conflitivo porque o encontro de diferenças será
sempre marcado por discordâncias e impasses. Não violência não é pacificação, é algo vivo,
incontrolável, um processo de investigação contínuo.

15) Ninguém fala a verdade quando o ambiente é punitivo


Se a verdade é o objetivo, por que mentimos tanto? Por que fingimos que estamos bem quando não
estamos, que está tudo certo quando algo nos incomoda? Fomos ensinados a nos calar ou a fingir
quando achamos que seremos retaliados se expormos a nossa verdade.
A verdade precisa de um espaço seguro para florescer. Eu encontro esse espaço na escrita e foi nela
que descrevi uma experiência no curso.
Hoje começou o curso de Comunicação Não-Violenta, amanhã ele termina. Lá, o Pedro
me encontrou. Eu caminhava tentando encontrar onde colocar os pés, daí olhei para a
frente e ele estava ali, pronto para me dar oi. Nos cumprimentamos e começamos a
conversar. Imediatamente vieram imagens das vezes que conversamos, dos contextos,
dos assuntos, dos lugares e pessoas em comum, enquanto no fundo da minha cabeça
uma coisa gritava: “eu não lembro o nome dele, como eu pude esquecer o nome dele, eu
sou uma péssima pessoa por esquecer o nome dele”. Quando ele me chamou pelo meu
nome, essa sensação ficou ainda pior.
Em vez de assumir e lidar com a verdade, tentei evitar o desconforto (que supus que
rolaria pra ele, porque o meu já estava instaurado). Acabei derramando sobre ele minhas
frustrações e reflexões sobre a vida sem nem perguntar como ele estava. Em algum
momento, ele contava uma história e lançou o próprio nome. Embora a raiz do problema
estivesse resolvida, os efeitos dele continuaram, porque eu estava me perguntando se ele
tinha percebido, se ele estaria magoado, se de alguma maneira eu havia cometido uma
gafe imperdoável.
Durante nossa conversa, senti necessidade de assumir que estava agitado e o fiz.
Expliquei que era porque eu estava acostumado a ouvir mais do que falar e, por isso,
parecia ser a pessoa mais centrada e calma das conversas em que entro, mas isso era
apenas parte da verdade. Enquanto eu falava, eu já perdia consciência de como a minha
agitação havia nascido – no fluxo do diálogo, ela estava ali interferindo no meu
comportamento a tal ponto que eu fiquei desconfortável com os silêncios que surgiram,
querendo preenchê-los o mais rápido possível. Agitado, portanto.
Escrevo esse texto não para pedir desculpas, porque cada vez mais quero estar alinhado
com uma perspectiva que entende que não há culpa. Escrevo esse texto essa história
porque precisei dar sentido a como me senti e compartilho – inclusive com o Pedro –
porque estou em um movimento para uma vida mais honesta comigo e com os outros.
(E porque o Pedro é um querido e estou seguro de que vai entender, em vez de virar a
cara na próxima vez que me enxergar HAHA ~riso nervoso~)
Escrevo, acima de tudo, para recuperar um pouco da raposa antropomórfica (quase
antropológica) que eu sempre fui, estranhando meu comportamento e o comportamento
de outros humanos.
Porque a curiosidade pelo milagre humano é algo que vale a pena investir energia.

Nós precisamos sentir segurança, senão mentimos ou fugimos, e sem verdade não há comunicação.

16) De volta àquela coisa intensa que acontece quando


ouvimos
Se há algo que podemos chamar de técnica dentro da comunicação não-violenta, é a escuta
empática. Como proposta, é algo simples: tu ouve o que a pessoa diz e mostra a ela o que tu
escutou. Sem julgamentos, sem conselhos, sem apontamentos. Vira espelho do outro.
Algo parecido com isso aconteceu quando o Pedro me narrou (por escrito) como ele viveu o
momento da minha gafe.
Olha que interessante. A gente já se encontrou hoje e, antes de eu ter lido por aqui tu já
me contou tudo isso ou parte disso. E eu te contei que tenho também uma história com
nomes, com não ser bom em lembrar nomes.
O que eu não te contei é que, quando eu te vi ainda na quinta à noite, eu repasso teu
nome na minha cabeça para checar comigo como ele soava e ver se condizia com minha
lembrança de ti, num exercício somente parcialmente efetivo de verificar se o nome que
eu lembrava era mesmo o teu. E quando nos encontramos na sexta e conversamos, eu
fiz o mesmo algumas vezes enquanto te ouvia. E eu só me senti 100% seguro se usar teu
nome depois que tu mesmo o usou, contando sobre ti, em uma dinâmica muito parecida
a que tu me viu fazer. E que eu só relaxei completamente a respeito do teu nome –
mesmo que, como eu te disse ao vivo, com o passar dos anos eu fui criando um
relaxamento em relação a nomes pessoais e a minha (in) capacidade de lembrá-los tanto
quanto me são oferecidos – quando eu mesmo o verbalizei. E, depois disso tudo, e tendo
te escutado usar teu próprio nome, e tendo imaginado que isso poderia ter sido um
comportamento extremamente estratégico para cuidar de mim na minha possível
incapacidade de lembrar de um nome, ou melhor, de me sentir seguro com a minha
lembrança, foi que eu, muito conscientemente, usei meu próprio nome em uma história
que te contava a meu respeito.
E o que eu acho fascinante ao compartilhar tudo isso contigo aqui, nesse fórum público,
é celebrar o quanto a gente se comunica em uma infinidade de níveis para além das
palavras. E o mistério da gente compartilhar tanto, assim, sem querer. Muito grato por
isso.

17) Todo mundo precisa de um sistema de apoio


Existir dá muito trabalho, cansa, esgota. Existir como alguém que se arma de verdade num mundo
acostumado a ilusões e falsidades é ainda mais exaustivo. Muito fácil nos sentirmos isolados,
especialmente se não temos uma rede preparada para nos amparar.
Rede, por sorte quase todos nós temos.
Mas rede sozinha ainda requer energia e iniciativa para ser acionada e virar apoio nos momentos de
necessidade, naquelas horas em que a gente está tão cansado que nem consegue pensar direito,
quanto mais localizar alguém em quem possamos confiar e fazer uma rápida ligação.
Para isso existem os sistemas de apoio.
Um sistema de apoio é um conjunto de acordos prévios sobre condutas possíveis. Se eu me sentir
mal, posso te ligar? Se eu precisar desabafar, posso contar contigo? Se eu quiser alguém que
escute, tu me escuta? Um sistema de apoio nos permite viver com mais tranquilidade porque
saberemos que a rede de proteção está montada e pronta para nos acolher.
Certa vez, uma amiga sofreu um acidente de moto. Ela me ligou e disse o que havia acontecido. Eu
não sabia o que fazer e acabei não fazendo nada. Outra amiga foi lá e a acompanhou até o hospital.
Era isso que ela precisava, companhia, mas eu não sabia como tratar da necessidade dela e acabei
falhando nesse ponto. Daquele dia em diante, acionamos um sistema de apoio: se nenhum outro
pedido fosse feito, no mínimo a presença estaria sendo requisitada. E eu irei, se e quando ela me
ligar, porque faço parte do sistema de apoio dela.

Tu tem um sistema de apoio para coconstruir o mundo em que tu deseja viver?

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