Вы находитесь на странице: 1из 56

DISSERTAÇÃO

O Fundamento Ontológico do Estado Hegeliano

Uma análise do estado em Hegel exige que tenhamos em mente a visão global
do sistema onde está inserido, pois este é concebido como um organismo do qual suas
partes, inclusive o estado, retiram sua forma, conteúdo e fundamento. Assim, o sistema
hegeliano é constituído pelo desenvolvimento dialético-especulativo1 da Ideia e se
resumi no seguinte: inicialmente a Ideia se mantém na própria interioridade (lógica);
em seguida se exterioriza (natureza) e ainda nesta, retorna finalmente a sua
interioridade (espírito)2. Esta terceira e última parte do sistema é o campo onde se
desenvolve o pensamento político de Hegel, consistindo o espírito no fundamento
ontológico3 do estado. Podemos observar que, pelo movimento do sistema hegeliano,
todo o processo de desenvolvimento do espírito é manifesto no mundo concreto
através do estado. O estado consiste, então, numa emanação do espírito e compartilha
com este suas principais características. Desse modo, analisaremos a seguir o
fundamento ontológico do estado hegeliano por meio da investigação dos aspectos
essenciais do desenvolvimento do espírito.
Dessa forma, através do movimento da Ideia no sistema hegeliano, podemos
observar que, em oposição ao momento anterior de exteriorização da natureza, o
espírito tem como característica essencial um processo de interiorização. Seu conceito
fundamental pode ser extraído do §381 da Filosofia do Espírito: “Todas as atividade do
espírito nada são a não ser maneiras diversas da recondução do que é exterior à
interioridade que é o espírito mesmo; e só mediante essa recondução, mediante essa
idealização ou assimilação do exterior, vem a ser, e é, o espírito.” 4 Nesse processo de
interiorização, o espírito, enquanto subjetividade, toma a si mesmo como objeto5,
tornando-se também objetividade, de modo que nessa atividade reflexiva, é
suprassumida a oposição entre subjetividade e objetividade. 6 Dessa forma, qualquer

1 Explicar o que é dialético-especulativo.


2 Os três estágios fundamentais do desenvolvimento da Ideia são os três momentos do
sistema hegeliano, a saber:

“I. A lógica, a ciência da ideia em si e para si;


II. A Filosofia da Natureza, como a ciência da idéia em seu ser-outro;
III. A Filosofia do Espírito, enquanto ideia que em seu ser-outro retorna a si mesma.”

HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito. Tradução


de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições Loyola, 1995, §
18, p. 58.
3 Para Charles Taylor: “Com efeito, ele [Hegel] reabilita a noção de uma ordem cósmica como
pedra angular da teoria política (…)”. p. 409
4 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.
Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, § 381 - Adendo, p. 18-19.
5 “O espírito é o conceito efetivado, essente para si, [e] que a si mesmo tem por objeto. §382 -
Adendo, p. 23.
6 Segundo o pensamento hegeliano, o espírito “é o suprassumir da pressuposição, em si feita
por ele mesmo, da oposição entre o subjetivo e o objetivo.” §443 - Adendo, p. 217.

1
DISSERTAÇÃO

relação de dependência entre o espírito (subjetividade) e seu Outro (objetividade) é


suprassumida, uma vez que ambos tornam-se o próprio espírito.
A efetivação dessa suprassunção é, igualmente, o conceito hegeliana de
liberdade: “o não-ser-dependente de um Outro” 7. Pelo que podemos concluir que a
realização plena do espírito8 — sua essência e conceito — é a própria liberdade9.
Segundo Hegel: “O espírito livre, como vimos, é, segundo o seu conceito, unidade
consumada do subjetivo e do objetivo, da forma e do conteúdo, e, em consequência,
absoluta totalidade, portanto é infinito, eterno.10 No entanto, a liberdade do espírito não
existe como algo dado, mas antes como possibilidade a ser efetivada 11. Nessa
efetivação de si mesmo como liberdade, o espírito transpõe vários momentos ao longo
de seu desenvolvimento. Este é, precisamente, o conceito do espírito: o processo de
efetivação da liberdade12. Para Hegel:

A liberdade efetiva, assim, não é algo essente de modo imediato

7 “A substância do espírito é a liberdade, isto é, o não-ser-dependente de um Outro, e referir-


se a si mesmo.” §382 - Adendo, p. 23.
8 Em sua Filosofia da História Hegel retoma a definição de espírito como liberdade: “O Espírito
(…) é aquilo que tem o seu centro em si mesmo. Ele não tem unidade fora de si, mas a
encontrou: está em si e consigo. A matéria tem sua substância fora de si, o Espírito é o Ser-em-
si-mesmo (a existência autocontida). Mas, a Liberdade é precisamente isto. Pois, quando eu
sou dependente, refiro-me a algo que não sou, não posso existir independentemente de algo
externo. Eu sou livre quando estou comigo. Essa existência autocontida do Espírito é a
consciência própria, a consciência de si.” (HEGEL, G. W. F. A Razão na História: Uma
Introdução Geral à Filosofia da História. 2ª ed. Tradução de Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro
Editora, 2004, p. 64.)
9 Hegel deixa bem clara a identidade entre espírito e liberdade no trecho a seugir: “(…) todas
as propriedades do Espírito só existem através da Liberdade. Todas são apenas meios para se
atingir a Liberdade; todas buscam e apresentam isto e unicamente isto. A filosofia especulativa
discerne o fato de ser a Liberdade a única verdade do Espírito.” (HEGEL, G. W. F. A Razão na
História: Uma Introdução Geral à Filosofia da História. 2ª ed. Tradução de Beatriz Sidou. São
Paulo: Centauro Editora, 2004, p. 63.)
10 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.
Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, §441 - Adendo, p. 212.
11 O espírito (…) é a unidade da possibilidade e da efetividade. Entendemos por possível, em
geral, o ainda interior, [o conceito] que ainda não chegou à exteriorização, manifestação. Ora,
[já] vimos que o espírito como tal é somente enquanto a si mesmo se manifesta. A efetividade,
que precisamente consiste em sua manifestação, pertence assim ao seu conceito. [HEGEL, G.
W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito. Tradução de Paulo
Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições Loyola, 1995, § 383 -
Adendo, p. 26¨.]
12 Thadeu Weber explica em detalhes essa definição hegeliana do espírito como liberdade: “O
espírito tem o centro em si; a matéria tem sua substância fora de si. Ora, estar consigo (Bei-
sich-selbst-sein), ter o centro em si, significa ser livre. ‘Se sou dependente, refiro-se a outra
coisa, que não sou eu, e não posso existir sem coisa externa. Sou livre, quando estou comigo
mesmo’ (Frei bin ich wenn ich bei mir selbst bin) (Vorlesungen, p. 30). Isso é autoconsciência.
WEBER, Thadeu. Hegel: Liberdade, Estado e História. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1993, p.
193.

2
DISSERTAÇÃO

no espírito, mas algo a ser produzido por sua atividade. Desse


modo, [é] como o produtor de sua liberdade [que] temos de
considerar na ciência o espírito. O desenvolvimento total do
espírito apresenta somente o ‘fazer-se livre’, do espírito, de todas
as formas de seu ser-aí que não correspondem a seu conceito:
uma libertação que ocorre por que essas formas são
transformadas em uma efetividade perfeitamente apropriada ao
conceito do espírito.13

Diante disso, para compreendermos plenamente as estruturas fundamentais do estado


hegeliano, precisamos considerar o processo de efetivação do espírito desde o início14,
uma vez que seu primeiro momento de desenvolvimento, denominado de espírito
subjetivo, é fundamental para a composição do espírito objetivo, a partir do qual se
forma o estado.
Conforme dito anteriormente, o espírito se efetiva como liberdade através de sua
interiorização (por umas referência ao voltar-se a si do espírito). O espírito é a Ideia
que em seu ser outro retorna a si mesma.

(Antes de falar disso, tenho que falar do espírito como um retirar a si mesmo.

Ao considerarmos o espírito um pouco mais de perto,


encontraremos, como sua determinação primeira e mais simples,
a determinação de que é [um] Eu. [O] Eu é algo perfeitamente
simples, universal. Quando dizemos “Eu”, visamos decerto a algo
singular; mas, porque cada qual é Eu, dizemos assim apenas algo
totalmente universal. A universalidade do Eu faz com que ele
possa abstrair de tudo (…).15

a liberdade significa a não dependência de um Outro. A suprassunção dessa


dependência é realizada quando o espírito se interiorização, isto é, quando ele retorna
a si mesmo.

o espírito se efetiva como liberdade, quando toma a si mesmo como objeto.

13 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.


Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, §382 - Adendo, p. 24.
14 “Por isso não se pode começar pelo espírito enquanto tal, mas se deve começar por sua
realidade mais incongruente. O espírito é, sem dúvida, já no começo, o espírito; mas não sabe
ainda que é isto.” §385 - Adendo, p. 30.
15 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.
Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, §381 - Adendo, p. 19.

3
DISSERTAÇÃO

Assim, por não haver mais nenhum

Retorno a si mesmo
Recondução da exterioridade à interioridade
Tomar a si mesmo como objeto

“Primeiro, é somente espírito em si: seu vir-a-ser-para-si forma sua efetivação.


Mas o espírito só vem-a-ser para si por que se particulariza, se determina ou se faz sua
pressuposição — o Outro de si mesmo; antes de tudo, relaciona-se com esse Outro
como com sua imediatez, mas o suprassume enquanto Outro. Enquanto o espírito está
na relação a si mesmo como a um Outro, é somente o espírito subjetivo, o espírito
proveniente da natureza, e antes de tudo ele mesmo é espírito-da-natureza.” § 385 -
Adendo

Inicialmente ele toma a si mesmo como objeto, simplesmente se fechando em si


mesmo, negando o outro fora de si, a natureza. A natureza ainda subsiste fora dele. E
ele permanece na natureza. Sua liberdade é por isso, apenas formal, um conceito a ser
efetivada. Com isso, o espírito se particulariza, tornando-se algo semelhante à
natureza. Esse é o espírito subjetivo.

O espírito supera a natureza retirando-se para si mesmo. Essa tentativa de


superar a natureza simplesmente negando a natureza o torna algo semelhante à
natureza (espírito subjetivo).

Essa relação consigo mesmo é, contudo, feita no outro, isto é, na natureza. O


espírito retorna a si mesmo, negando a natureza, mas permanecendo na natureza. Ele
se fecha em si mesmo, mas fora de si, ao seu redor, permanece o seu outro, a
imediatez da natureza. Por isso a liberdade, isto é, a superação da relação entre
subjetividade e objetividade, no espírito subjetivo é algo apenas formal, apenas umas
abstração, pois fora dele permanece o outro, a sua universalidade é obtida pela
negação do Outro, que, contudo, ainda permanece fora dele, ao seu redor, e ele
dentro dela.

“Mas em sua imediatez, o espírito só é livre em si segundo o conceito ou a


possibilidade, não ainda segundo a efetividade (…).” §382 - Adendo

4
DISSERTAÇÃO

“A essência do espírito é, por esse motivo, formalmente a liberdade (…). Segundo


essa determinação formal, ele pode abstrair de todo o exterior e de sua própria
exterioridade, de seu próprio ser-aí (…). Essa possibilidade é sua universalidade
abstrata, essente para si dentro de si mesma.” §382

“O espírito é na forma da relação a si mesmo: no interior dele lhe advém a


totalidade ideal da idéia. Isto é: o que o seu conceito é, vem-a-ser para ele; para ele, o
seu ser é isto: ser junto de si, quer dizer, ser livre. [É o] espírito subjetivo.” § 385

“Essa universalidade é também seu ser-aí. Enquanto sendo para si, o universal se
particulariza, e nisso é identidade consigo.” §383

“Esse particular, nós só obtemos ao passar de um para o outro, pois o particular


contém um [termo] e um Outro; mas no começo, justamente, ainda não fizemos essa
passagem. A realidade do espírito é assim, primeiro, uma realidade ainda totalmente
universal, não particular.” §385 - Adendo

“Mas a realidade ainda totalmente abstrata, imediata, é a naturalidade, a não-


espiritualidade. Por essa razão, a criança está ainda aprisionada na naturalidade, só
tem impulsos naturais, não é ainda um homem espiritual segundo a efetividade, mas só
segundo a possibilidade ou o conceito.” § 385 - Adendo

“O Outro, o negativo, a contradição, a cisão pertencem assim à natureza do


espírito.” §382 - Adendo

“A liberdade do espírito, porém, não é simplesmente a independência do Outro,


conquistada fora do Outro, mas no Outro; não chega à efetividade pela fuga perante o
Outro, mas pela vitória sobre ele.” §382 - Adendo

“[O espírito] chega mediante ao Outro e mediante a suprassunção deste, a se


comprovar como aquilo — e a ser de fato aquilo — que deve ser segundo o seu
conceito, a saber, a idealidade do exterior, a ideía que a si retorna em seu ser-outro
(…).” §382

● Espírito e razão

Assim, podemos observar igualmente que: “O espírito livre ou o espírito como tal
é a razão (…)”16, uma vez que ele é “aquilo em que a razão consiste: uma unidade do

16 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.


Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, §440 - Adendo, p. 211.

5
DISSERTAÇÃO

subjetivo e do objetivo.”17

● Relação entre o Fundamento Ontológico e o Ser Humano


18

Hegel retoma a ideia de ordem racional oriunda da tradição clássica, isto é, a ideia
de que o ser humano faz parte de uma ordem universal baseada na Razão. Mas
diferente dos gregos, ele não considera essa ordem como oriunda da natureza (algo
exterior ao ser humano), uma vez que isso retiraria a autonomia do homem e
comprometeria a ideia de que a liberdade é a essência do Espírito e por conseguinte,
do ser humano.

● A Liberdade na Filosofia Política de Hegel;


19

● O Estado como unidade mínima de liberdade;

20

21

17 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas – v. III: A Filosofia do Espírito.


Tradução de Paulo Menezes, com a colaboração de José Machado. São Paulo: Edições
Loyola, 1995, §443 - Adendo, p. 217.
18 Não se trata, portanto, de uma ordem que transcende o ser humano e que ele tem
de aceitar. Antes, é uma ordem que flui de sua própria natureza apropriadamente
entendida. Consequentemente, ela está centrada na autonomia, visto que ser
governado por uma lei que emana de si mesmo é ser livre. A ordem, portanto, atribui
um lugar central ao indivíduo racional, autônomo.” p. 409
19 “O seu alvo [de Hege] é encontrar a sociedade com base não em algum interesse
particular ou princípio positivo tradicional, mas unicamente com base na liberdade.” p.
407
20 “Em primeiro lugar, o mais importante para o ser humano só pode ser obtido na
relação com a vida pública de uma comunidade, não na autodefinição privada de um
indivíduo alienado. Em segundo lugar, essa comunidade não pode ser uma
comunidade meramente parcial, como, por exemplo, um conventículo ou uma
sociedade privada, cuja vida é condicionada, controlada e limitada por uma sociedade
mais ampla. Seus limites devem coincidir com a realidade humana autosuficiente
mínima, com o Estado.” p. 421
21 “(…) Em segundo lugar, que a comunidade concernida é o Estado, isto é, uma
comunidade realmente autosuficiente.” p. 421-422

6
DISSERTAÇÃO

● O Estado como concretização do Espírito


22

23

24

● A Ideia como arquiteta do Estado plenamente racional


25

26

27

Hegel deriva seu modelo de sociedade a partir da ideia de liberdade. Mas essa
não é simplesmente a liberdade do ser humano e sim a liberdade da Ideia. Diante
disso, o modelo mais adequado à sociedade humana é retirado da Ideia. O conteúdo
concreto da obrigação moral é aquele que for mais adequado à organização social
baseada na Ideia.

22 “O objetivo da história do mundo é que o Espírito chegue ao conhecimento do que


ele verdadeiramente é, que ele objetifique esse conhecimento (dies Wissen
gegenständlich mache), que o realize num mundo que se encontra diante dele, em
suma, que produza a si mesmo como um objeto para si (sich als objektiv hervorbringe).
(VG, p. 74)” p. 400
23 “(…) a vontade cuja autonomia os seres humanos devem realizar não é unicamente
a do ser humano, mas a do Geist. Seu conteúdo é a Ideia que produz um mundo
diferenciado a partir de si mesmo.” p. 408
24 “Qual é, então, a forma de vida a que o ser humano precisa chegar para ser um
veículo adequado do Espírito? Antes de tudo, deve tratar-se de uma forma social.” p.
400
25 “É a Ideia absoluta que implementa um mundo diferenciado. A vontade racional
humana chega a um conteúdo (…) descobrindo as suas conexões com a razão
cósmica e, em consequência, chegando a discernir que aspectos de nossas vidas
como seres particulares refletem o verdadeiro universal concreto que é a Ideia. O que a
razão e a liberdade prescrevem à vontade humana é promover e sustentar a estrutura
das coisas que desse modo revela ser a expressão adequada da Ideia” p. 408
26 “A comunidade que é o locus da nossa vida moral mais plena é um Estado que se
aproxima de uma corporificação verdadeira da Ideia.” p. 412
27 “Uma doutrina das obrigações imanente e consistente não pode ser outra coisa que
a exposição sequencial das relações de que necessita a Ideia da liberdade e que, por
isso, são realizadas em toda a sua extensão, ou seja, no Estado. (FD, §148)” p. 409

7
DISSERTAÇÃO

28

29

30

31

32

O espírito subjetivo são os seres humanos considerados individualmente.

Por ter a liberdade como sua verdadeira essência, constituindo-se na


concretização do espírito, o ser humano pertence a dimensão do universal e do infinito,
embora também faça parte do mundo particular e finito. Seu maior propósito é portanto
o de superar essas limitações da particularidade e finitude do mundo sensível e efetivar
28 (…) Em terceiro lugar, a vida pública do Estado possui essa importância crucial
para os seres humano porque (…) expressa a Ideia, a estrutura ontológica das coisas.
Em última análise, ele é de vital importância porque constitui um dos modos
indispensáveis pelo qual o ser humano recupera sua relação essencial com essa
estrutura ontológica, os outros consistindo nos modos de consciência que Hegel chama
de espírito ‘absoluto’, e essa relação real que passa pela vida de uma comunidade é
essencial para a completude do retorno à identidade consciente entre o ser humano e o
Absoluto (o que significa também a identidade do Absoluto consigo mesmo).” p. 421
29 E, em terceiro lugar, que essa comunidade tem esse papel central por que expressa
a Ideia, a fórmula da necessidade racional subjacente ao ser humano e seu mundo. p.”
421-422
30 “O Estado tem de ser visto como a realização da necessidade racional, da Ideia.
Como tal, suas articulações devem ser entendidas como autoarticulações da Ideia.
Hegel fala do Estado como um “organismo”. Porém, é um organismo concebido como
produtor de suas articulações de acordo com um plano necessário. Essas articulações
são fixadas pelo Conceito (FD, § 269) Eles formam a constituição do Estado.” p. 477
31 “(…) a sociedade tem que ser do tipo que os seres humanos se relacionem com ela
como uma vida mais ampla na qual se encontram imersos. (…) E isso, por sua vez, dita
uma certa estrutura da sociedade. Ela tem de ser do tipo em que os vários momentos
do Conceito — unidade imediata, separação e unidade mediada — cheguem todos à
expressão plena e compatível. (…) As demandas da razão são, portanto, que os seres
humanos vivam em um Estado articulado de acordo com o Conceito, e que eles se
relacionem com ele (…) como participante de uma vida mais ampla. E essa vida mais
ampla merece sua fidelidade última porque é a expressão do próprio fundamento das
coisas, do Conceito.” p. 408
32 “Ser corporificado significa estar num tempo e lugar particulares e, em
consequência, ser finito. (…) é por isso que a existência dos muitos seres humanos e
de sua vida em conjunto na sociedade desempenha um papel essencial. O ser humano
é alçado ao universal porque já vive além de si mesmo numa sociedade, cuja vida
maior incorpora a sua.” p. 400

8
DISSERTAÇÃO

a sua verdadeira essência universal e infinita. O estado é precisamente isso, a forma


pela qual os seres humanos transcendem a sua finitude e particularidade e tornam-se
universais e infinitos. A vida maior da sociedade estatal, incorporando cada um de seus
membros num todo orgânico, é a universalidade e infinitude concretizada no mundo
sensível.

Para Hegel, o estado é precisamente a manifestação do espírito no mundo


concreto. Desse modo, o estado hegeliano possui como fundamento ontológico o fato
de constituir-se numa emanação do espírito, quando este alcança seu aspecto objetivo.

Diante disso, para Hegel, o ser humano — cuja essência é a liberdade —


constitui-se na manifestação do espírito no mundo concreto. E o espírito objetivo, por
sua vez, consiste na liberdade do ser humano efetivada através das intuições públicas,
cujo desenvolvimento máximo é o estado.

Segundo Hegel, o homem é a manifestação do desenvolvimento do espírito no


mundo concreto, isto é, o veículo por meio do qual o espírito concretiza a compreensão
de sua liberdade. Desse modo, o momento em que os seres humanos passam a se
organizar na forma de estado constitui-se no momento de efetivação da liberdade do
espírito, isto é, quando este efetiva a sua liberdade no mundo concreto.

Desse modo, uma vez que o espírito constitui-se precisamente nessa


autonomi33a, isto é, na superação de qualquer dependência exterior por meio do
retorno a si mesmo, o espírito tem como sua essência a liberdade.

34

Desse modo, desenvolver a liberdade do espírito é o objeto central do estado


hegeliano.

Assim, esse desenvolvimento é realizado, segundo Hegel, através de um


processo de autocompreensão do Espírito através do qual ele possa superar suas
limitações interiores e se descobrir como um ser, cuja única e verdadeira essência é a
liberdade.

33 “A autonomia expressa a demanda do Espírito de deduzir todo o seu conteúdo de si


mesmo, de não aceitar como vinculante qualquer coisa que seja meramente assumida a partir
de fora.” p. 403
34 “(…) a noção hegeliana do espírito como liberdade não pode acomodar nada que
seja meramente dado (…). Tudo tem de fluir por necessidade da Ideia, do Espírito ou
da própria Razão.” p. 403

9
DISSERTAÇÃO

35

36

37

38

Podemos observar, então, uma perfeita identidade entre o conceito do Espírito e o


ser humano.

Seu objetivo central é a autocompreensão do Espírito, isto é, o processo pelo qual


o Espírito se compreenda como um ser, cuja essência é a liberdade. Segundo Hegel

Desse modo, o objetivo da filosofia política de Hegel é a autocompreensão do


Espírito como um ser de liberdade, isto é, que ele compreenda a si mesmo como um
ser universal e racional. E essa processo de autocompreensão ocorre por meio dos
seres humanos, considerados por Hegel como manifestação do Espírito no mundo
sensível39.

Podemos confirmar essa conclusão por meio do conceito hegeliano de ser


humano. Para Hegel, o homem também possui uma essência racional e universal, ao
mesmo tempo em que se mantém limitado a uma Natureza corpórea e sensível. Seu
maior propósito também é aperfeiçoar a ideia de si mesmo, cuja essência é composta
por racionalidade e universalidade. De modo que seu desenvolvimento está igualmente
mediado pela Natureza (seus instintos e inclinações), os quais precisa superar para
desenvolver plenamente sua autocompreensão enquanto ser racional e universal.
Diante disso, como o Espírito precisa se manifestar na Natureza — pois se fosse
puro pensamento estaria regredindo ao campo da Lógica — o ser humano é a
manifestação do Espírito no mundo sensível. E a autocompreensão do Espírito se
desenvolve através do aperfeiçoamento da autocompreensão do homem. Contudo, a
própria autocompreensão do ser humano também precisa ser efetiva, isto é, deve ser
ativa e realizada no mundo natural. Se ela existir apenas no campo do pensamento,
mesmo que produto de um ser corpóreo como o homem, essa autocompreensão

35 “Por conseguinte, visando conhecer a si mesmo no mundo, o Espírito deve produzir


uma corporificação adequada na vida humana em que ele pode reconhecer a si
mesmo.” p. 400
36 “O Estado é a expressão real dessa vida universal que é a corporificação
necessária (…) à visão do Absoluto” p. 400
37 “(…) o Espírito só pode retornar para si mesmo através da transformação da forma
de vida do ser humano na história.” p. 400
38 “(…) a ideia da liberdade só existe verdadeiramente na realidade do Estado.” § 57
39 “O ser humano é o veículo dessa autocompreensão. Logo, o fato de o Espírito conhecer a
si mesmo requer que o ser humano chegue a conhecer a si mesmo e seu mundo como
realmente são, ou seja, como emanações do Espírito.” p. 400

10
DISSERTAÇÃO

estaria restrita ao campo da Lógica, um retrocesso para o desenvolvimento do Espírito.

Por isso, não basta que o ser humano compreenda a si mesmo como um ser
racional e universal, se a ideia que ele tem de si for um discurso vazio, composto
apenas por abstrações sem conteúdo sensível. Nesse caso, seu desenvolvimento
permaneceria preso às formas puras do pensamento abstrato, um retrocesso á Lógica
imediata em si. O ser humano deve efetivar a compreensão de si mesmo em sua
própria vida com seu comportamento, hábitos e atitudes. Assim como o que o homem
faz em vida precisa ser compatível com o nível da compreensão que ele tem de si
mesmo. E, para Hegel, a forma de vida que mais reflete a verdadeira essência
humana, a que mais faz do homem um ser racional e universal, é a vida em sociedade.
Desse modo, quando o ser humano pensa e age de modo individualista, movido
por instintos ou pela vontade egoísta, sua autocompreensão o prende à dimensão
particular e limita sua racionalidade. Isso deixa o homem alheio a sua própria essência
universal e racional, o que o torna, nas palavras de Hegel, “separado de si mesmo”.
Mas quando os seres humanos convivem socialmente, identificando-se não apenas
como simples indivíduos, mas como parte de um organismo social, sua
autocompreensão alcança a dimensão do universal e eles se tornam plenamente
racionais. É o que Hegel chama de “retorno a si mesmo”.
No entanto,

para que o ser humano consiga atingir esse nível de compreensão e por
conseguinte para que a sociedade humana evolua.
Existem vários nível de sociedade, segundo o desenvolvimento do homem. (falar
do conceito de liberdade e de como ela é o critério para o desenvolvimento do ser
humano/espírito)

Portanto, para que o ser humano consiga atingir esse nível de compreensão é
necessário que passe por um longo processo de desenvolvimento (Bildung). Esse
processo de formação se aplica tanto individualmente, a cada um dos seres humano,
ao longo do seu tempo de vida, como também se aplica ao próprio ser humano
enquanto espécie. A história universal consiste precisamente nesse processo de
formação. (Acrescentar o verbete do Dicionário Hegel)

Mas para isso é necessário primeiramente que ele passe por um processo de
desenvolvimento ao longo da história.

(Fazer a relação com a história)


O ser humano inicia a sua história com uma noção totalmente imediata de si
mesmo e do mundo que o cerca. Assim, o ser humano é movido inicialmente pela

11
DISSERTAÇÃO

satisfação de suas necessidades básicas e de seus impulsos naturais. Sua percepção


é limitada ao meramente sensorial. Desse modo, sua noção do universal é bastante
limitada. (Que noção do universal é essa?) Assim, podemos observar de que modo o
Espírito tem inicialmente uma noção limitada de si mesmo e de sua dimensão
universal.

Portanto, para Hegel, o Espírito evolui conforme evoluem as sociedades


humanas. , em outras palavras, conforme evoluem os estado.

a única forma de vida do ser humano que corresponde à sua verdadeira Natureza,
e por conseqüência, à Natureza real do Espírito, é a vida em sociedade.

Assim, a efetivação da autocompreensão do Espírito enquanto universalidade e


racionalidade se manifesta no mundo natural através das formas de vida sociais dos
seres humanos, sobretudo as formas estatais.

De modo que o seu desenvolvimento consiste em compreender racionalmente a


si mesmo, as suas instituições e o mundo em que vive. Para Hegel, é através da Arte,
da Religião e da Filosofia que o ser humano atinge plenamente essa compreensão. E o
momento em que o ser humano atinge essa compreensão de si mesmo, assim como
de seus semelhantes e do mundo que o cerca foi chamado por Hegel de Espírito
Absoluto.

Por isso, as formas estatais em que viveram os seres humanos ao longo da


historia são a manifestação da autocompreensão do Espírito. Seu desenvolvimento ao
longo dos séculos reflete o desenvolvimento do próprio Espírito.

● A Noção de Sittlichkeit

Existe uma relação dialética entre o modelo racional e universal de sociedade


baseado na Ideia e a Sittlichkeit. Essa relação é responsável pela concepção hegeliana
de história.

40

40 “’Sittlichkeit’ refere-se às obrigações morais que tenho para com uma comunidade
permanente da qual faço parte. Essas obrigações estão baseadas em normas e usos
estabelecidos (…). A característica crucial da Sittlichkeit é que nos manda produzir

12
DISSERTAÇÃO

41

42

43

44

Assim, a Sittlichkeit não é um modelo rígido de sociedade. Ao contrário, significa a


organização social e política estatal típica da cultura e dos costumes de um
determinado povo. Nunca existiu na história da humanidade um exemplo de sociedade
que estivesse plenamente de acordo com o modelo racional e universal de sociedade
baseado na Ideia. Contudo, as sociedades estatais humanas estão gradualmente
incorporando ao longo da história o modelo de sociedade universal e racional baseado
na Ideia. Inicialmente, os estados eram primitivos, baseados mais no mundo natural do
que na razão, e aos poucos foram se desenvolvendo à medida que incorporavam os
elementos próprios do modelo de sociedade baseado na Ideia. Para Hegel, a história
da humanidade consiste no processo de corporificação da Ideia através da Sittlichkeit.

● Relação entre Estado plenamente racional (dever-ser) e Estado

aquilo que já existe. (…) a vida comum que é a base da minha obrigação ética (sittlich)
já está aí em existência. Consequentemente, na Sittlichkeit, não há fissura entre o que
deve ser e o que é (…).” p. 411
41 “Porque a realização da Ideia requer que o ser humano seja parte de uma vida mais
ampla em sociedade, a vida moral alcança a sua realização suprema na Sittlichkeit.
Essa realização suprema obviamente é uma conquista (…). (…) a concretização da
moralidade ocorre numa Sittlichkeit realizada” p. 412
42 “A doutrina da Sittlichkeit é que a moralidade alcança a sua completude numa
comunidade. Isso confere á obrigação um conteúdo definitivo, tanto quanto o realiza,
de modo que a fissura entre Sollen e Sein é consertada. (…) Hegel começou seguindo
Kant ao distinguir vontade e liberdade da natureza. Porém, a concretização da
liberdade se dá quando a natureza (aqui a sociedade, que começou numa forma
rudimentar, primitiva) é renovada para atender às demandas da razão.” p. 411
43 “(…) o Estado plenamente racional será aquele que expressa em suas instituições
e práticas as ideias e normas mais importantes que seus cidadãos reconhecem e pelas
quais eles definem a sua identidade. E isso será assim por que o Estado expressa as
articulações da Ideia, que o ser humano racional passa a ver como a fórmula da
necessidade subjacente a todas as coisas, que está destinada a vir à consciência de si
no ser humano. Desse modo, o Estado racional restaurará a Sittlichkeit, a
corporificação das normas supremas, numa vida pública permanente. O Estado
plenamente desenvolvido incorporará o principal da vontade racional individual que
julgará com critérios universais (…)”p. 423.
44 “Essa integração da individualidade e Sittlichkeit é um requisito que podemos
deduzir da Ideia.” p. 423

13
DISSERTAÇÃO

empírico (ser);
45

Espírito em geral
46

47

48

49

50

51

“(…) aquilo em que a razão consiste: uma unidade do subjetivo e do objetivo.”


§443 - Adendo

45 “Porém, é claro que o Estado, em seus primórdios na história, é uma corporificação


bastante imperfeita do universal (…) O Estado plenamente adequando que o espírito
necessita para retornar a si mesmo tem de ser um Estado plenamente racional” p. 401
46 “O espírito livre, como vimos, é, segundo o seu conceito, unidade consumada do
subjetivo e do objetivo, da forma e do conteúdo, e, em consequência, absoluta
totalidade, portanto é infinito, eterno.” §441 - Adendo
47 “A substância do espírito é a liberdade, isto é, o não-ser-dependente de um Outro, e
referir-se a si mesmo.” §382 - Adendo
48 “O espírito é o conceito efetivado, essente para si, [e] que a si mesmo tem por
objeto. §382 - Adendo
49 “O espírito (…) é a unidade da possibilidade e da efetividade. Entendemos por
possível, em geral, o ainda interior, [o conceito] que ainda não chegou à exteriorização,
manifestação. Ora, [já] vimos que o espírito como tal é somente enquanto a si mesmo
se manifesta. A efetividade, que precisamente consiste em sua manifestação, pertence
assim ao seu conceito.” § 383 - Adendo
50 “A liberdade efetiva, assim, não é algo essente de modo imediato no espírito, mas
algo a ser produzido por sua atividade. Desse modo, [é] como o produtor de sua
liberdade [que] temos de considerar na ciência o espírito. O desenvolvimento total do
espírito apresenta somente o ‘fazer-se livre’, do espírito, de todas as formas de seu ser-
aí que não correspondem a seu conceito: uma libertação que ocorre por que essas
formas são transformadas em uma efetividade perfeitamente apropriada ao conceito do
espírito.” §382 - Adendo
51 “Por isso não se pode começar pelo espírito enquanto tal, mas se deve começar
por sua realidade mais incongruente. O espírito é, sem dúvida, já no começo, o
espírito; mas não sabe ainda que é isto.” §385 - Adendo

14
DISSERTAÇÃO

“O espírito livre ou o espírito como tal é a razão (…)” §440 - Adendo

“O Outro, o negativo, a contradição, a cisão pertencem assim à natureza do


espírito.” §382 - Adendo

“[O espírito] chega mediante ao Outro e mediante a suprassunção deste, a se


comprovar como aquilo — e a ser de fato aquilo — que deve ser segundo o seu
conceito, a saber, a idealidade do exterior, a ideía que a si retorna em seu ser-outro
(…).” §382

Espírito Subjetivo
52

Inicialmente ele toma a si mesmo como objeto, simplesmente se fechando em si


mesmo, negando o outro fora de si, a natureza. A natureza ainda subsiste fora dele. E
ele permanece na natureza. Sua liberdade é por isso, apenas formal, um conceito a ser
efetivada. Com isso, o espírito se particulariza, tornando-se algo semelhante à
natureza. Esse é o espírito subjetivo.

O espírito supera a natureza retirando-se para si mesmo. Essa tentativa de


superar a natureza simplesmente negando a natureza o torna algo semelhante à
natureza (espírito subjetivo) Fazer a relação com o ser humano prezo aos impulsos
naturais.

“Primeiro, é somente espírito em si: seu vir-a-ser-para-si forma sua efetivação.


Mas o espírito só vem-a-ser para si por que se particulariza, se determina ou se faz sua
pressuposição — o Outro de si mesmo; antes de tudo, relaciona-se com esse Outro
como com sua imediatez, mas o suprassume enquanto Outro. Enquanto o espírito está
na relação a si mesmo como a um Outro, é somente o espírito subjetivo, o espírito
proveniente da natureza, e antes de tudo ele mesmo é espírito-da-natureza.” § 385 -
Adendo

“O espírito subjetivo sabe que é livre, mas sua compreensão é apenas formal, que
precisa ser posta em prática no mundo.” §382 - Adendo

“Mas em sua imediatez, o espírito só é livre em si segundo o conceito ou a


possibilidade, não ainda segundo a efetividade (…).” §382 - Adendo

52 “Ao considerarmos o espírito um pouco mais de perto, encontraremos, como sua


determinação primeira e mais simples, a determinação de que é [um] Eu. [O] Eu é algo
perfeitamente simples, universal. Quando dizemos “Eu”, visamos decerto a algo
singular; mas, porque cada qual é Eu, dizemos assim apenas algo totalmente universal.
A universalidade do Eu faz com que ele possa abstrair de tudo (…).” §381 - Adendo, p.
19.

15
DISSERTAÇÃO

“A essência do espírito é, por esse motivo, formalmente a liberdade (…). Segundo


essa determinação formal, ele pode abstrair de todo o exterior e de sua própria
exterioridade, de seu próprio ser-aí (…). Essa possibilidade é sua universalidade
abstrata, essente para si dentro de si mesma.” §382

“O espírito é na forma da relação a si mesmo: no interior dele lhe advém a


totalidade ideal da idéia. Isto é: o que o seu conceito é, vem-a-ser para ele; para ele, o
seu ser é isto: ser junto de si, quer dizer, ser livre. [É o] espírito subjetivo.” § 385

“A liberdade do espírito, porém, não é simplesmente a independência do Outro,


conquistada fora do Outro, mas no Outro; não chega à efetividade pela fuga perante o
Outro, mas pela vitória sobre ele.” §382 - Adendo

Essa relação consigo mesmo é, contudo, feita no outro, isto é, na natureza. O


espírito retorna a si mesmo, negando a natureza, mas permanecendo na natureza. Ele
se fecha em si mesmo, mas fora de si, ao seu redor, permanece o seu outro, a
imediatez da natureza. Por isso a liberdade, isto é, a superação da relação entre
subjetividade e objetividade, no espírito subjetivo é algo apenas formal, apenas umas
abstração, pois fora dele permanece o outro, a sua universalidade é obtida pela
negação do Outro, que, contudo, ainda permanece fora dele, ao seu redor, e ele
dentro dela.

“Essa universalidade é também seu ser-aí. Enquanto sendo para si, o universal se
particulariza, e nisso é identidade consigo.” §383

“Esse particular, nós só obtemos ao passar de um para o outro, pois o particular


contém um [termo] e um Outro; mas no começo, justamente, ainda não fizemos essa
passagem. A realidade do espírito é assim, primeiro, uma realidade ainda totalmente
universal, não particular.” §385 - Adendo

“Mas a realidade ainda totalmente abstrata, imediata, é a naturalidade, a não-


espiritualidade. Por essa razão, a criança está ainda aprisionada na naturalidade, só
tem impulsos naturais, não é ainda um homem espiritual segundo a efetividade, mas só
segundo a possibilidade ou o conceito.” § 385 - Adendo

Espírito Objetivo

Depois ele toma a si mesmo como objeto, por fazer a natureza como a si mesmo,
por transformar a natureza. Nesse ato de transformar a natureza, ele tem a natureza
como a seu objeto, mas como ele transforma a natureza conforme a si mesmo, ele tem
a si mesmo como objeto. Essa natureza transformada é o mundo ético, o mundo do
direito e do Estado. Esse é o espírito objetivo. Assim, sua identidade consigo é
alcançada pela mediação da suprassunção da natureza, da transformação de um ser
outro no ser de si mesmo. Não existe mais algo fora de si, por que ele o suprassumiu.
Assim sua liberdade deixa de ser forma e passa a ser efetivada.

16
DISSERTAÇÃO

“Com efeito, pela suprassunção de seu ser-outro (…) o espírito essente em si,
torna-se para si, isto é, manifesta a si mesmo.” §383 - Adendo

“[O espírito] é o que implementa sua revelação em seu próprio elemento, não em
um material estranho.” §383 - Adendo

“O espírito pode sair de sua universalidade abstrata essente para si, de sua
relação simples consigo mesmo (…)” §382 - Adendo

“Sua possibilidade, pois, é imediatamente efetividade infinita, absoluta.” §383

“Por esse motivo, a ideia, ou o espírito essente-em-si, dormente na natureza,


suprassume a exterioridade, a singularização e a imediatez na natureza; cria para si
um ser-aí conforme à sua interioridade e universalidade, e assim se torna espírito
refletido sobre si mesmo, essente para si, consciente de si, desperto: ou o espírito
como tal.” §384 - Adendo

“Nesse grau, o espírito, que não está mais difundido no ‘fora-um-do-outro’ da


natureza, se contrapõe, como o essente-para-si, o manifesto-a-si, à natureza
inconsciente (…). Faz da natureza o objeto, reflete sobre ela, recupera a exterioridade
da natureza na interioridade do espírito; idealiza a natureza; e assim o espírito vem a
ser, no seu objeto, para si mesmo.” § 384 - Adendo

O espírito só é de fato livre quando molda a natureza conforme ele mesmo


(espírito objetivo) Fazer referência ao espírito racional.

Essa liberdade do espírito torna-se prática no mundo no espírito objetivo. No


espírito objetivo, o espírito torna o mundo como a si mesmo, isto é, como livre. Esse
mundo livre é o mundo ético. E enquanto ato de tornar o mundo como a si mesmo, o
espírito é vontade.

“[O espírito é] na forma da realidade como [na forma] de um mundo a produzir e


produzido por ele, no qual a liberdade é como necessidade presente. [É o] espírito
objetivo.” §385

“O manifestar (…) do espírito, que é livre, é [o] por da natureza como de seu
mundo, mundo como natureza autônoma. O manifestar no conceito é [o] criar do
mundo como ser do espírito, no qual ele se proporciona a afirmação e verdade da
liberdade.” § 384

“Essa determinação pertence ao espírito como tal: por isso vale dele não apenas
na medida em que ele se relaciona simplesmente consigo, em que é um Eu tendo a si
mesmo por objeto, mas também na medida em que sai de sua universalidade abstrata
essente para si, em que põe para si mesmo uma diferenciação determinada, um Outro
que ele; por que o espírito não se perde nesse Outro, mas antes nele se conserva e se
efetiva; ali estampa seu interior, faz do Outro um ser-aí que lhe corresponde: chega

17
DISSERTAÇÃO

assim, portanto, por essa suprassunção do Outro, da diferença efetiva, determinada, ao


ser-para-si concreto, ao ‘automanifestar-se’ determinado. O espírito, portanto, no Outro
só revela a si mesmo, sua própria natureza; esta porém consiste na automanifestação.
O ‘automanifestar-se’ é, por isso, ele mesmo o conteúdo do espírito (…). §383 - Adendo

“(…) pertence à ideia da liberdade que a vontade faça do seu conceito — [que é]
a liberdade mesma — seu conteúdo ou fim. Quando faz isso ela se torna espírito
objetivo, constrói para si um mundo de sua liberdade, e dá, por conseguinte, ao seu
conteúdo verdadeiro um ser-aí autônomo.” §460 - Adendo

“Enquanto o espírito subjetivo, por causa de sua relação a um Outro, ainda é não
livre, ou — o que é o mesmo — é livre somente em si, no espírito objetivo chega ao
ser-aí a liberdade, o saber do espírito sobre si mesmo como livre.” §385 - Adendo

“A plena efetivação dessa liberdade (…) — o acabamento da realização do


conceito do espírito objetivo — só é atingida no Estado, em que o espírito desenvolve
sua liberdade em um mundo posto por ele: no mundo ético.” §385 - Adendo

Vontade

“O espírito que se sabe como livre, e se quer como esse seu objeto — isto é, tem
sua essência por determinação e por fim — , é antes de tudo, em geral, a vontade
racional (…).”

“(…) enquanto vontade, entra o espírito na efetividade (…)” § 469

“A inteligência, sabendo-se como determinante do conteúdo — que tanto é o seu,


quanto ele é determinado como essente —, é [a] vontade.” §468

“(…) é o pensar que se determina a si mesmo para [ser] a vontade, e o pensar


permanece a substância da vontade, de modo que sem o pensar nenhuma vontade
pode haver, e o homem mais inculto só tem vontade na medida em que pensou; ao
contrário, o animal, porque não pensa, também não pode ter vontade alguma.” §468

“Esse conceito, a liberdade, só é essencialmente enquanto pensar; o caminho da


vontade — fazer-se espírito objetivo — consiste em elevar-se á vontade pensante: em
dar-se o conteúdo que só como vontade que-se-pensa ela pode ter. A verdadeira
liberdade, enquanto eticidade, é não ter a vontade como seu fim, um conteúdo
subjetivo, isto é, egoísta, e sim [um] conteúdo universal. Mas tal conteúdo só é no
pensar e pelo pensar (…)” §469

“Mas a atividade finalística dessa vontade é realizar seu conceito — a liberdade —


no lado exteriormente objetivo, de modo que esse seja como um mundo determinado
por aquela vontade, a ponto de estar nele munto de si mesma, concluída consigo
mesma, [e] o conceito, assim, implementado em ideia.” §484
Vontade

18
DISSERTAÇÃO

“(…) as determinações pelas quais [o espírito] progride em seu desenvolvimento


(…) são o caminho que consiste em se produzir como vontade (…).”

Além disso, Hegel relaciona à noção de liberdade o conceito de vontade, pois a


vontade que se volta para algo além de si mesma está presa à dependência. O que
significa dizer que a verdadeira liberdade é composta por uma vontade que supera todo
o querer voltado para o exterior e torna-se plenamente realizada consigo mesma. Essa
é a vontade universal53, cuja relação com o conceito de liberdade recebe o nome de
vontade livre. Para Hegel, a vontade livre é efetivada pelo estado na realdiade.

Essa concepção está diretamente relacionada ao conceito de vontade54, uma vez


que, segundo Hegel, só é livre aquele que não deseja algo além de si mesmo. Assim, é
através da vontade livre55 que o espírito consolida em si a suprassunção dos dois
momentos anteriores da Ideia, isto é, o pensamento interior da lógica e a existência
exterior da natureza. Isso ocorre por que a vontade livre56 é essencialmente a
expressão prática do pensamento, isto é, quando o pensamento oriundo da lógica se
realiza na existência exterior própria da natureza.

A determinação absoluta (…) do espírito livre (§21) é que sua liberdade seja
objeto para ele (…) a fim de ser para si, enquanto ideia, o que a vontade é em si (…).

53 “Que a vontade seja universal segue-se do conceito da sua liberdade. (...) A liberdade
consiste justamente na indeterminidade do querer ou no fato de que ela não tem em si
nenhuma determinidade natural. A vontade é, pois, em si uma vontade universal.” [HEGEL, G.
W. F. Propedêutica Filosófica. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1989, p. 277, §
18.]
54 “A noção mesma da vontade está vinculada com a liberdade.” p. 404

“(…) ele [Hegel] (…) caracteriza a vontade como “universalidade determinando-se a si mesma”
e, em consequência, como liberdade (§21).” p. 404

“Para conhecer o que é verdadeiramente correto, temos de abstrair da inclinação, do impulso,


do desejo, bem como de tudo que é particular; temos de conhecer, em outras palavras, o que a
vontade é em si (an sich). (GW, p. 921)” p. 403
55 “A vontade só é livre na medida em que não quiser nada outro, exterior, forâneo — senão
ela seria dependente — , mas só a si própria, a vontade. (Ibidem)” p. 403
56 “Em primeiro lugar, o pensamento é essencial à vontade. Ele é a sua ‘substância’, ‘de modo
que sem o pensar nenhuma vontade pode haver’. (EG, § 468, adendo)” p. 404

“Liberdade é precisamente o próprio pensar; (…) A unidade do pensar consigo mesmo é


liberdade, a vontade livre (…). A vontade só é livre como vontade pensante. (SW, vol. XIX, p.
528-29)” p. 404

“(…) a vontade apenas é vontade verdadeira, livre, enquanto inteligência pensante.” p. 404

“É por ser a expressão prática do pensamento que a vontade está essencialmente destinada a
ser livre.” p. 404

19
DISSERTAÇÃO

A vontade é a expressão prática do pensamento através das vontades dos seres


humanos. Para explicar isso, tenho que apresentar a relação do espírito e do ser
humano e do estado.

Só é livre aquele que possui uma vontade livre, isto é, aquele que não deseja
nada que está fora de si.

“Essa vontade livre também é verdadeiramente infinita, visto que o seu objeto não
é outro nem um limite posto a ela (§22). Nela ‘desaparece toda a relação de
dependência de qualquer outra coisa’ (§23) e ela é universal” p. 404

Diante disso, esse voltar-se a si mesmo do espírito que o torna essencialmente a


liberdade, exige por parte dele um ato de vontade. A essa vontade, que se confunde
com o próprio conceito de espírito e de liberdade, Hegel denominou de vontade livre.

Ideia

● Filosofia do Direito

“Com efeito, o racional, que é sinônimo da Ideia, adquire, ao entrar com a sua
realidade na existência exterior, uma riqueza infinita de formas, de aparências e de
manifestações, envolve-se, como as sementes, num caroço onde a consciência
primeiro se abriga mas que o conceito acaba por penetrar para surpreender a pulsação
interna e senti-la bater debaixo da aparência exterior.” (Prefácio - XXXVI)

“A identidade consci57
58

59

57 ente do conteúdo e forma é a Ideia filosófica.” (Prefácio - XXXVIII)


58 “Do que a filosofia se ocupa é de Ideias, não do conceito em sentido restrito;
mostra, pelo contrário, que este é parcial e inadequado, revelando que o verdadeiro
conceito (…) é o único que possui realidade justamente porque ele mesmo a assume.
Toda a realidade que não for a realidade assumida pelo próprio conceito é existência
passageira, contingência exterior, opinião, aparência superficial, erro, ilusão, etc. A
forma concreta que o conceito a si mesmo se dá ao realizar-se está no conhecimento
do próprio conceito, o segundo momento distinto da sua forma de puro conceito.” § 1 -
Nota
59 “A ciência do direito faz parte da filosofia. O seu objeto é, por conseguinte,
desenvolver, a partir do conceito, a Ideia, porquanto esta é a razão do objeto, ou, o que
é o mesmo, observar a evolução imanente própria da matéria.” § 2

20
DISSERTAÇÃO

60

61

62

63

64

65

66

67

60 “Ora, a verdade deste universal formal, que é indeterminado para si e só na matéria


encontra a sua específica determinação, é o universal que a si mesmo se determina, a
vontade, a liberdade. A partir do momento em que o conteúdo, o objeto e o fim do
querer passam a ser ele mesmo, o universal, como forma infinita, o querer deixa de ser
apenas a vontade livre em si, para ser também a vontade livre para si: é a Ideia em sua
verdade.” § 21
61 “A universalidade concreta em si mesma e, por conseguinte, existente para si é a
substância, o género imanente ou a ideia da consciência de si; é o conceito da vontade
livre como universal que vai além do seu objeto e, ao percorrer as determinações
deste, nela é idêntico a si. O universal em si e para si é aquilo a que se chama o
racional e só pode ser concebido de um modo especulativo.” § 24
62 “Neste desenvolvimento, o conceito conduz a ideia, que começou por ser abstrata,
à realização da totalidade do seu sistema, que, em ambas as formas, se mantém
idêntica como substância estranha ao contraste de um fim puramente subjetivo e da
sua realização.” § 28
63 “O fato de uma existência em geral ser a existência da vontade livre constitui o
Direito. O Direito é, pois, a liberdade em geral como Ideia.” § 29
64 “Enquanto objetivo, o pensamento apenas assiste ao desenvolvimento da ideia
como atividade própria da sua razão e nenhum complemento lhe acrescenta da sua
parte. Considerar algo racionalmente não é vir trazer ao objeto uma razão e com isso
transformá-lo, mas sim considerar que o objeto é para si mesmo racional. Assim é o
espírito em sua liberdade, a mais alta afirmação da razão consciente de si, que a si
mesma se dá a realidade e se produz como mundo existente. A ciência apenas se
limita a trazer à consciência este trabalho que é próprio da razão da coisa.” § 31 - Nota
65 “(…) a ideia da liberdade só existe verdadeiramente na realidade do Estado.” § 57
66 “Definida como subjetiva, livre de si, a vontade começa por ser um conceito que
carece de uma existência para ser também ideia.” § 107
67 “De onde, precisamente, o conceito recebe a sua realidade é da explicitação dos
momentos e, agora, é portanto como Ideia - quer dizer, como conceito que desenvolveu
as suas determinações até a realidade e que ao mesmo tempo é, como identidade dos

21
DISSERTAÇÃO

68

69

70

71

72

73

74

conceitos, a essência deles que existe em si mesma.” §141 p. 139


68 “Porque é um saber esta unidade do conceito na vontade e da sua existência na
vontade particular, fica presente a consciência dos distintos momentos da Ideia mas de
tal maneira o fica que, agora, cada um desses momentos é ele mesmo a totalidade da
Ideia e tem a Ideia como conteúdo e fundamento.” § 143 p. 141
69 “Como a moralidade objetiva é o sistema destas determinações da Ideia, dotada de
um caráter racional, é, deste modo, que a liberdade, ou a vontade que existe em si e
para si, aparece como realidade objetiva, círculo de necessidade, cujos momentos são
os poderes morais que regem a vida dos indivíduos e que nestes indivíduos e nos seus
acidentes têm sua manifestação, sua forma e sua realidade fenomênicas.” § 145 p.142
70 “O Estado é a realidade em ato da Ideia moral objetiva, o espírito como vontade
substancial revelada, clara para si mesma, que se conhece e se pensa, e realiza o que
sabe e porque sabe.” § 257 - 216
71 “Considerada abstratamente, a racionalidade consiste essencialmente na íntima
unidade do universal e do indivíduo e, quanto ao conteúdo no caso concreto de que
aqui se trata, na unidade entre a liberdade objetiva, isto é, entre a vontade substancial
e a liberdade objetiva como consciência individual, e a vontade que procura realizar os
seus fins particulares; quanto à forma, constitui ela, por conseguinte, um
comportamento que se determina segundo as leis e os princípios pensados, isto é,
universais. Esta ideia é o ser universal e necessário em si e para si do espírito.” § 258 -
Nota p. 217-218
72 “A Ideia do Estado: É ideia universal como género e potência absoluta sobre os
Estados individuais, o espírito que a si mesmo dá a sua realidade no progresso da
história universal.” § 259 - p.225
73 “A evolução da ideia tem mostrado, pelo contrário, que o espírito, livre e racional
que é, constitui em si a moralidade objetiva, que a verdadeira ideia é a razão realizada
e que esta é o que existe como Estado.” § 270 - p. 240
74 “É a partir da lógica (não decerto da lógica corrente) que se pode reconhecer como
é o conceito e, depois, mais concretamente, a Ideia que se determinam em si mesmos
e assim afirmam os seus momentos de universalidade, de particularidade e de
individualidade.” § 272 - p. 246

22
DISSERTAÇÃO

75

76

● Filosofia da História
77

78

79

80

81

82

75 “Ora, o conceito só é ideia e verdade com o caráter de realidade.” § 279 - Nota p.


256
76 “A verdade e o destino das ideias concretas dos espíritos dos povos residem na
ideia concreta que é a universalidade absoluta. Esse é o Espírito do mundo.” § 352 p.
312
77 “(…) a Idéia na verdade é o guia dos povos e do mundo; o Espírito, sua vontade
racional e necessária, orienta e sempre orientou o fluxo dos acontecimentos mundiais.”
(A Razão na História - p. 51)
78 “Por isso temos de contemplar à Idéia em geral, em sua manifestação como espírito
humano. Mais precisamente, a idéia de liberdade humana. A mais pura forma em que a
Idéia se manifesta é o Pensamento em si. Neste aspecto a Idéia é tratada na Lógica.”
(A Razão na História - p. 62)
79 “E assim entram dois elementos em nossa investigação: o primeiro, a Idéia, e
depois, o complexo das paixões humanas – um, a urdidura, o outro, a trama da imensa
tapeçaria da história do mundo. Sua ligação e união concreta constituem a liberdade
moral no Estado. Já falamos da Idéia de liberdade como sendo a essência do Espírito e
o objetivo positivamente final da história.” (A Razão na História - p. 69)
80 “A Idéia universal se manifesta no Estado.” (A Razão na História - p. 89)
81 “Esta união do universal e o particular é a própria Idéia, presente como Estado e
assim desenvolvendo-se ainda mais. (A Razão na História - p. 97)
82 “Por um lado, reconhecemos a Idéia em sua determinação, como liberdade
conhecedora de si e obstinada, que tem apenas a si como objetivo. Assim, ela é ao
mesmo tempo a simples idéia de razão e, da mesma forma, o que chamamos de
sujeito, a consciência de si, o Espírito que existe no mundo.” (A Razão na História - p.
99)

23
DISSERTAÇÃO

83

Liberdade

● Filosofia do Direito

84

85

86

87

88

83 “A história do mundo em geral é o desenvolvimento do Espírito no Tempo, assim


como a natureza é o desenvolvimento da Idéia no Espaço.” (A Razão na História - p.
123)
84 “O domínio do direito é o espírito em geral; aí, a sua base própria, o seu ponto de
partida está na vontade livre, de tal modo que a liberdade constitui a sua substância e o
seu destino e que o sistema do direito é o império da liberdade realizada, o mundo do
espírito produzido como uma segunda natureza a partir de si mesmo.” § 4 p. 12
85 “Tal é a liberdade que constitui o conceito ou substância ou, por assim dizer, a
gravidade da vontade, pois do mesmo modo a gravidade constitui a substância dos
corpos.” § 7 p.16
86 “A representação mais vulgar que se faz da liberdade é a do livre-arbítrio, meio-
termo que a reflexão introduz entre a vontade simplesmente determinada pelos
instintos naturais e a vontade livre em si e para si. Quando ouvimos dizer, de um modo
absoluto, que a vontade consiste em poder fazer o que se queira, podemos considerar
tal concepção como uma total falta de cultura do espírito, nela não se vê a mínima
concepção do que sejam a vontade livre em si e para si, o direito, a moralidade, etc.” §
15 - Nota p. 22
87 “Ora, a verdade deste universal formal, que é indeterminado para si e só na matéria
encontra a sua específica determinação, é o universal que a si mesmo se determina, a
vontade, a liberdade. A partir do momento em que o conteúdo, o objeto e o fim do
querer passam a ser ele mesmo, o universal, como forma infinita, o querer deixa de ser
apenas a vontade livre em si, para ser também a vontade livre para si: é a Ideia em sua
verdade.” § 21 p. 25
88 “Compreende-se assim que, quando apenas se fala de vontade livre sem
especificar que se trata da vontade livre em si e para si, fala-se apenas da disposição
da liberdade ou da vontade natural e finita (§ IIs), e assim se designa precisamente (a
despeito da linguagem e da convicção) algo que não é a vontade livre.” § 22 - Nota p.
27

24
DISSERTAÇÃO

89

90

91

92

93

94

95

89 “É nessa liberdade que a vontade se pertence, pois só ela se referencia a si mesma


e põe de lado tudo o que seja dependência de algo alheio. Não é só verdadeira mas é
a própria verdade, pois a sua definição consiste em ser na sua existência (isto é: como
oposta a si mesma) o que o seu conceito é, ou ainda porque o fim e a realidade do seu
puro conceito é a intuição de si mesma.” § 23 p. 27
90 “É a liberdade universal porque nela toda limitação e singularidade individual ficam
suprimidas; consistem estas, com efeito, na diferença do conceito e do seu objeto ou
conteúdo, isto é, na diversidade do seu objetivo ser para si e do seu ser em si, da sua
individualidade que decide e exclui e da sua universalidade.” § 24 p. 27-28
91 “É assim que a vontade, enquanto liberdade que existe em si mesma, é a própria
subjetividade. Esta é, ao mesmo tempo, o seu conceito e, portanto, a sua objetividade.
Por outro lado, a sua subjetividade, enquanto oposta à objetividade, é limitação; ora,
por esta oposição, a vontade, em vez de permanecer em si mesma, vê-se
comprometida no objeto e a sua limitação consiste também em não ser subjetiva, etc.”
§ 26 - Nota p. 30
92 “O destino absoluto ou, se se quiser, o instinto absoluto do espírito livre, que é o de
ter a sua liberdade como objeto (objetividade dupla pois será o sistema racional de si
mesma e, simultaneamente, realidade imediata) (§ 26s), a fim de ser para si, como
ideia, o que a vontade em si - uma palavra, o conceito abstrato da ideia da vontade - é,
em geral, a vontade livre que quer a vontade livre.” § 27 p. 30
93 “O fato de uma existência em geral ser a existência da vontade livre constitui o
Direito. O Direito é, pois, a liberdade em geral como Ideia.” § 29 p. 31
94 “Assim é o espírito em sua liberdade, a mais alta afirmação da razão consciente de
si, que a si mesma se dá a realidade e se produz como mundo existente.” § 31 - Nota
p. 34
95 “ Mas para que o espírito objetivo, o conteúdo do direito deixem de ser concebidos
através das correspondentes noções subjetivas, para que, por conseguinte, se deixe de
conceber como um puro dever-ser isto de o homem em si e para si não estar destinado
à escravatura, é preciso reconhecer-se que a ideia da liberdade só existe
verdadeiramente na realidade do Estado.” § 57 - Nota p. 57

25
DISSERTAÇÃO

96

97

98

99

100

101

102

103

96 “Mas a pura vontade natural é em si mesma violência contra a ideia da liberdade


que é em si existente e deve ser defendida de uma tal vontade sem cultura (…)” § 93 -
Nota p. 84
97 “A moralidade objetiva é a ideia da liberdade enquanto vivente bem, que na
consciência de si tem o seu saber e o seu querer e que, pela ação desta consciência,
tem a sua realidade. Tal ação tem o seu fundamento em si e para si, e a sua motora
finalidade na existência moral objetiva. É o conceito de liberdade que se tornou mundo
real e adquiriu a natureza da consciência de si.” § 142 p. 141
98 “Como a moralidade objetiva é o sistema destas determinações da Ideia, dotada de
um caráter racional, é, deste modo, que a liberdade, ou a vontade que existe em si e
para si, aparece como realidade objetiva, círculo de necessidade, cujos momentos são
os poderes morais que regem a vida dos indivíduos e que nestes indivíduos e nos seus
acidentes têm sua manifestação, sua forma e sua realidade fenomênicas.” § 145 p. 142
99 “No dever, o indivíduo liberta-se e alcança a liberdade substancial.” § 149 p. 144
100 “O direito que os indivíduos têm de estar subjetivamente destinados à liberdade
satisfaz-se quando eles pertencem a uma realidade moral objetiva. Com efeito, é numa
tal objetividade que reside a verdade da certeza da sua liberdade e na realidade moral
possuem eles realmente a sua essência própria, a sua íntima universalidade (§ 147a).
§ 153 p. 148
101 “No costume tem o Estado a sua existência imediata, na consciência de si, no
saber e na atividade do indivíduo, tem a sua existência mediata, enquanto o indivíduo
obtém a sua liberdade substancial ligando-se ao Estado como à sua essência, como ao
fim e ao produto da sua atividade.” § 257 p. 216
102 “O Estado, como realidade em ato da vontade substancial, realidade que esta
adquire na consciência particular de si universalizada, é o racional em si e para si: esta
unidade substancial é um fim próprio absoluto, imóvel, nele a liberdade obtém o seu
valor supremo, e assim este último fim possui um direito soberano perante os
indivíduos que em serem membros do Estado têm o seu mais elevado dever.” § 258 p.
217
103 “Considerada abstratamente, a racionalidade consiste essencialmente na íntima

26
DISSERTAÇÃO

104

105

106

107

108

unidade do universal e do indivíduo e, quanto ao conteúdo no caso concreto de que


aqui se trata, na unidade entre a liberdade objetiva, isto é, entre a vontade substancial
e a liberdade objetiva como consciência individual, e a vontade que procura realizar os
seus fins particulares; quanto à forma, constitui ela, por conseguinte, um
comportamento que se determina segundo as leis e os princípios pensados, isto é,
universais. Esta ideia é o ser universal e necessário em si e para si do espírito.” § 258 -
Nota p. 217-218
104 “(…) a vontade objetiva é o racional em si no seu conceito, quer seja ou não
conhecido do indivíduo e aceito pelo seu livre-arbítrio, e o termo oposto, o saber e o
querer, a subjetividade da liberdade que só se afirma no princípio que examinamos,
apenas contém um momento unilateral da ideia da vontade racional que só é
verdadeiramente ela mesma quando em si também é o que é para si.” § 258 Nota p.
219
105 “É o Estado a realidade em ato da liberdade concreta. Ora, a liberdade concreta
consiste em a individualidade pessoal, com os seus particulares, de tal modo possuir o
seu pleno desenvolvimento e o reconhecimento dos seus direitos para si (nos sistemas
da família e da sociedade civil) que, em parte, se integram por si mesmos no interesse
universal e, em parte, consciente e voluntariamente o reconhecem como seu particular
espírito substancial e para ele agem como seu último fim. Daí provém que nem o
universal tem valor e é realizado sem o interesse, a consciência e a vontade
particulares, nem os indivíduos vivem como pessoas privadas unicamente orientadas
pelo seu interesse e sem relação com a vontade universal; deste fim são conscientes
em sua atividade individual. O princípio dos Estados modernos tem esta imensa força e
profundidade: permitirem que o espírito da subjetividade chegue até a extrema
autonomia da particularidade pessoal ao mesmo tempo que o reconduz à unidade
substancial, assim mantendo esta unidade no seu próprio princípio.” § 260 p. 225-226
106 “Esta identidade absoluta do direito e do dever só se realiza como similitude do
conteúdo e com a condição de que o conteúdo seja completamente universal, isto é,
seja o único princípio do direito e do dever: a liberdade pessoal do homem.” § 261 p.
227
107 “É o início da liberdade consciente e, portanto, verdadeira. A real liberdade da
ideia, que é o que dá a cada um dos momentos da razão a sua realidade própria,
presente e consciente, também e, por conseguinte, o que atribui à atividade de uma
consciência a certeza suprema ao determinar-se a si mesma, quer dizer, a culminância
do conceito da vontade. Mas esta última determinação de si só pode pertencer ao

27
DISSERTAÇÃO

● Filosofia da História
109

110

111

112

113

114

domínio da liberdade humana quando se encontra na posição de uma culminância em


si mesma isolada e superior a toda a particularidade e a toda a condição. Só assim ela
será de acordo com o seu conceito. § 279 - Nota p. 259
108 “Não se pense, porém, que a história universal é o simples juízo da força, quer
dizer, da necessidade abstrata e irracional de um destino cego; antes, sendo em si e
para si razão, e como o seu ser para si é no espírito um saber, a história é, de acordo
com o conceito da sua liberdade, o desenvolvimento necessário dos momentos da
razão, da consciência de si e da liberdade do espírito, a interpretação e a realização do
espírito universal.” § 342 p. 307
109 “A natureza do Espírito poderá ser compreendida com uma espiada na direção
oposta – a matéria. A essência da matéria é a gravidade e a essência do Espírito – sua
matéria – é a Liberdade. Torna-se imediatamente plausível a todos o fato de que, entre
outras propriedades, o Espírito também possui a Liberdade. Mas a filosofia nos ensina
que todas as propriedades do Espírito só existem através da Liberdade. Todas são
apenas meios para se atingir a Liberdade; todas buscam e apresentam isto e
unicamente isto. A filosofia especulativa discerne o fato de ser a Liberdade a única
verdade do Espírito.” p. 63
110 “O Espírito, ao contrário, é aquilo que tem o seu centro em si mesmo. Ele não tem
unidade fora de si, mas a encontrou: está em si e consigo. A matéria tem sua
substância fora de si, o Espírito é o Ser-em-si-mesmo (a existência autocontida). Mas,
a Liberdade é precisamente isto. Pois, quando eu sou dependente, refirome a algo que
não sou, não posso existir independentemente de algo externo. Eu sou livre quando
estou comigo. Essa existência autocontida do Espírito é a consciência própria, a
consciência de si.” p. 64
111 “(…) a liberdade de espírito é a própria essência da natureza humana.” p. 65
112 “A liberdade não predominou repentinamente nos Estados, nem a razão nos
governos e constituições. A aplicação do princípio às condições seculares, toda a
moldagem e interpenetração da sociedade constituída por este princípio, é
precisamente o demorado processo da história.” p. 65
113 “A história do mundo é o avanço da consciência da liberdade (…).” p. 65
114 “Ao mesmo tempo, é a própria Liberdade que compreende dentro de si a infinita
necessidade de levar-se até à consciência e, assim, como o conhecimento de si é sua

28
DISSERTAÇÃO

115

116

117

118

119

120

própria natureza, até à realidade. A Liberdade em si é o seu próprio objetivo e o


propósito único do Espírito. Ela é a finalidade última para a qual toda a história do
mundo sempre se voltou. Para este fim, todos os sacrifícios têm sido oferecidos no
imenso altar da terra por toda a demorada passagem das eras. Só a Liberdade é a
finalidade que se compreende claramente e se completa em si mesma, o único pólo
duradouro estável na mudança de acontecimentos e condições, o único princípio
verdadeiramente eficaz que interpenetra o todo. Este objetivo final é o propósito de
Deus para com o mundo. Mas Deus é o Ser absolutamente perfeito e, portanto, pode
resolver tudo por Si, por Sua própria vontade. A natureza de Sua própria vontade, Sua
própria natureza, é aquilo que aqui chamamos de Idéia de liberdade. Assim, traduzimos
a linguagem da religião para a da filosofia.” p. 66
115 “A questão dos meios pelos quais a Liberdade se desenvolve em um mundo nos
leva diretamente ao fenômeno da história. Embora a Liberdade em si seja
essencialmente uma idéia interior não desenvolvida, os meios que ela usa são os
fenômenos exteriores que na história se apresentam diretamente aos nossos olhos.” p.
66
116 “Já falamos da Idéia de liberdade como sendo a essência do Espírito e o objetivo
positivamente final da história.” p. 69
117 “Portanto, o Estado se torna o objeto preciso da história do mundo; é onde a
Liberdade obtém a sua objetividade e se mantém no gozo desta objetividade.” p. 91
118 “A liberdade como ideal de natureza original não existe como original e natural. Ela
deve ser adquirida e conquistada e isso apenas é possível através de um processo
infinito da disciplina do conhecimento e da força de vontade.” p. 92
119 “O eterno equívoco do que seja a liberdade é que ela só é conhecida em seu
sentido subjetivo formal, subtraído dos objetivos essenciais. Assim, a limitação de
impulso, desejo, paixão – que pertence apenas ao indivíduo particular como tal – de
capricho e deliberação, é considerada uma limitação da liberdade. Ao contrário, esta
limitação é a própria condição que leva à emancipação; a sociedade e o Estado são
exatamente as condições em que a liberdade se realiza.” p. 92-93
120 “O principal é que a liberdade, como é determinada pelo conceito, não se baseia
na vontade subjetiva e no capricho, mas na compreensão da vontade geral e em que o
sistema da liberdade é o livre desenvolvimento de suas fases.” p. 99

29
DISSERTAÇÃO

121

122

123

124

125

126

Espírito

121 “(…) reconhecemos a Idéia em sua determinação, como liberdade conhecedora de


si e obstinada, que tem apenas a si como objetivo.” p. 99
122 “O desenvolvimento histórico portanto não é o simples crescimento inofensivo e
sem oposição da vida orgânica, mas um duro trabalho feito de má vontade contra si
mesmo. Além do mais, não é um simples desenvolvimento em geral, mas a obtenção
de um resultado de conteúdo inequívoco. Esta finalidade já afirmamos desde o início: é
o Espírito em sua essência, o conceito de liberdade.” p. 107
123 “Portanto, a história do mundo representa as fases no desenvolvimento do
princípio cujo conteúdo é a consciência da liberdade. A análise de suas fases
geralmente pertence à Lógica. A de sua especial natureza concreta pertence à Filosofia
do Espírito.' Iremos aqui apenas repetir que a primeira etapa é a imersão do Espírito na
vida natural e a segunda, a saída para a consciência de sua liberdade. Esta primeira
emancipação da natureza é incompleta e parcial, vem de sua naturalidade imediata,
ainda se refere a ela e por isso ainda está por ela sobrecarregada, como um de seus
elementos. A terceira etapa é a elevação da alma desta ainda especial forma de
liberdade para a pura universalidade da liberdade, onde a essência espiritual chega à
consciência e ao sentimento de si mesma. Estas etapas são os princípios fundamentais
do processo universal. Cada uma delas é, mais uma vez, dentro de si mesma, um
processo de sua própria formação.” p. 107-108
124 “A liberdade nada mais é senão o reconhecimento e a adoção de objetivos
materiais universais como o Direito, a Lei e a produção de uma realidade que esteja em
conformidade com eles: o Estado.” p. 111
125 “(…) a história do mundo representa o desenvolvimento da consciência de
liberdade que tem o Espírito e a conseqüente realização dessa liberdade. Este
desenvolvimento implica um progresso gradual, uma série de diferenciações cada vez
mais reais, resultantes da idéia de liberdade. A natureza lógica e, mais ainda, a
natureza dialética desse conceito em geral, a necessidade de seu desenvolvimento
abstrato são tratadas na Lógica.”
126 “(…) o essencial na história do mundo, vista de maneira geral, é a consciência da
liberdade e a compreensão do desenvolvimento dessa consciência. O rumo dos fatos
históricos nesta categoria é a direção que vai para o que é verdadeiramente essencial.”
p. 117

30
DISSERTAÇÃO

● Filosofia do Direito

● Filosofia da História
127

128

História e Política

Substância Ética

1.

“Em Hegel, a filosofia da história e a filosofia política estão associadas e formam a


esfera do que ele chama de “espírito objetivo”. p. 399

“Deveríamos vê-la [a filosofia hegeliana da história e da política] como uma


tentativa de resolver, na esfera da política, o que identificamos como o dilema dessa
geração, de como combinar a plenitude da autonomia moral com a recuperação
daquela comunidade, cuja vida pública conferiu expressão aos seus membros e cuja
realização paradigmática na história foi a pólis grega.” p. 399

O fundamento ontológico do estado hegeliano

“O objetivo para o qual tudo tende é a autocompreensão do Espírito ou da


Razão.” p. 400

“O ser humano é o veículo dessa autocompreensão. Logo, o fato de o Espírito


conhecer a si mesmo requer que o ser humano chegue a conhecer a si mesmo e seu
mundo como realmente são, ou seja, como emanações do Espírito. p. 400

“(…) o Espírito só pode retornar para si mesmo através da transformação da


forma de vida do ser humano na história.” p. 400

“Qual é, então, a forma de vida a que o ser humano precisa chegar para ser um
veículo adequado do Espírito? Antes de tudo, deve tratar-se de uma forma social.” p.

127 “Para início de conversa, deve-se observar que a história do mundo está no
domínio do Espírito.” p. 61
128 “Mas o Espírito e o rumo de seu desenvolvimento são a matéria da história.” p. 61

31
DISSERTAÇÃO

400

“(…) a existência dos espíritos finitos, no plural, fez parte do plano necessário do
Geist. Porém, o espírito finito deve ir além de uma identificação de si mesmo como
particular (…). p. 400

“Ser corporificado significa estar num tempo e lugar particulares e, em


consequência, ser finito. (…) é por isso que a existência dos muitos seres humanos e
de sua vida em conjunto na sociedade desempenha um papel essencial. O ser humano
é alçado ao universal porque já vive além de si mesmo numa sociedade, cuja vida
maior incorpora a sua.” p. 400

“Por conseguinte, visando conhecer a si mesmo no mundo, o Espírito deve


produzir uma corporificação adequada na vida humana em que ele pode reconhecer a
si mesmo.” p. 400

“O objetivo da história do mundo é que o Espírito chegue ao conhecimento do que


ele verdadeiramente é, que ele objetifique esse conhecimento (dies Wissen
gegenständlich mache), que o realize num mundo que se encontra diante dele, em
suma, que produza a si mesmo como um objeto para si (sich als objektiv hervorbringe).
(VG, p. 74)” p. 400

“O Estado é a expressão real dessa vida universal que é a corporificação


necessária (…) à visão do Absoluto” p. 400

“Porém, é claro que o Estado, em seus primórdios na história, é uma


corporificação bastante imperfeita do universal (…) O Estado plenamente adequando
que o espírito necessita para retornar a si mesmo tem de ser um Estado plenamente
racional” p. 401

Hegel retoma a ideia de ordem racional oriunda da tradição clássica, isto é, a ideia
de que o ser humano faz parte de uma ordem universal baseada na Razão. Mas
diferente dos gregos, ele não considera essa ordem como oriunda da natureza (algo
exterior ao ser humano), uma vez que isso retiraria a autonomia do homem e
comprometeria a ideia de que a liberdade é a essência do Espírito e por conseguinte,
do ser humano.

Autonomia

“(…) a noção hegeliana do espírito como liberdade não pode acomodar nada que
seja meramente dado [pressuposto, como a “natureza” para os gregos, por exemplo]
(…). Tudo tem de fluir por necessidade da Ideia, do Espírito ou da própria Razão.” p.
403

“A autonomia expressa a demanda do Espírito de deduzir todo o seu conteúdo de


si mesmo, de não aceitar como vinculante qualquer coisa que seja meramente

32
DISSERTAÇÃO

assumida a partir de fora.” p. 403

Vontade e Liberdade

“Para conhecer o que é verdadeiramente correto, temos de abstrair da inclinação,


do impulso, do desejo, bem como de tudo que é particular; temos de conhecer, em
outras palavras, o que a vontade é em si (an sich). (GW, p. 921)” p. 403

“A vontade só é livre na medida em que não quiser nada outro, exterior, forâneo
— senão ela seria dependente — , mas só a si própria, a vontade. (Ibidem)” p. 403

“A noção mesma da vontade está vinculada com a liberdade. Em primeiro lugar, o


pensamento é essencial à vontade. Ele é a sua ‘substância’, ‘de modo que sem o
pensar nenhuma vontade pode haver’. (EG, § 468, adendo)” p. 404

“É por ser a expressão prática do pensamento que a vontade está essencialmente


destinada a ser livre.” p. 404

“Liberdade é precisamente o próprio pensar; (…) A unidade do pensar consigo


mesmo é liberdade, a vontade livre (…). A vontade só é livre como vontade pensante.
(SW, vol. XIX, p. 528-29)” p. 404

“(…) ele [Hegel] (…) caracteriza a vontade como “universalidade determinando-se


a si mesma” e, em consequência, como liberdade (§21). (…) a vontade apenas é
vontade verdadeira, livre, enquanto inteligência pensante.” p. 404

“Essa vontade livre também é verdadeiramente infinita, visto que o seu objeto não
é outro nem um limite posto a ela (§22). Nela ‘desaparece toda a relação de
dependência de qualquer outra coisa’ (§23) e ela é universal” p. 404

“Essa vontade, que é determinada unicamente por ela mesma e, em


consequência, pelo pensamento ou pela racionalidade, é o critério último do que é
direito. Na FD §4 [Filosofia do Direito], ela é designada como o “terreno do direito” (der
Boden des Rechts). E por isso [a vontade] é o princípio básico do Estado plenamente
realizado.” p. 404

“O seu alvo [de Hege] é encontrar a sociedade com base não em algum interesse
particular ou princípio positivo tradicional, mas unicamente com base na liberdade.” p.
407

A Vontade do Espírito

“Hegel, em contrapartida, acreditava ter demonstrado que o ser humano


consegue a sua identidade básica ao ver a si mesmo como veículo do Geist. Se a
substância da vontade é pensamento ou razão e se a vontade só é livre quando ela
não segue nada além do seu próprio pensamento, o pensamento ou a razão em

33
DISSERTAÇÃO

questão acabam não sendo unicamente os do ser humano, mas, antes, os do espírito
cósmico que põe o universo.” p. 407

“(…) a vontade cuja autonomia os seres humanos devem realizar não é


unicamente a do ser humano, mas a do Geist. Seu conteúdo é a Ideia que produz um
mundo diferenciado a partir de si mesmo.” p. 408

“É a Ideia absoluta que implementa um mundo diferenciado. A vontade racional


humana chega a um conteúdo (…) descobrindo as suas conexões com a razão
cósmica e, em consequência, chegando a discernir que aspectos de nossas vidas
como seres particulares refletem o verdadeiro universal concreto que é a Ideia. O que a
razão e a liberdade prescrevem à vontade humana é promover e sustentar a estrutura
das coisas que desse modo revela ser a expressão adequada da Ideia” p. 408

“(…) a sociedade tem que ser do tipo que os seres humanos se relacionem com
ela como uma vida mais ampla na qual se encontram imersos. (…) E isso, por sua vez,
dita uma certa estrutura da sociedade. Ela tem de ser do tipo em que os vários
momentos do Conceito — unidade imediata, separação e unidade mediada —
cheguem todos à expressão plena e compatível. (…) As demandas da razão são,
portanto, que os seres humanos vivam em um Estado articulado de acordo com o
Conceito, e que eles se relacionem com ele (…) como participante de uma vida mais
ampla. E essa vida mais ampla merece sua fidelidade última porque é a expressão do
próprio fundamento das coisas, do Conceito.” p. 408

“Com efeito, ele reabilita a noção de uma ordem cósmica como pedra angular da
teoria política (…). Não se trata, portanto, de uma ordem que transcende o ser humano
e que ele tem de aceitar. Antes, é uma ordem que flui de sua própria natureza
apropriadamente entendida. Consequentemente, ela está centrada na autonomia, visto
que ser governado por uma lei que emana de si mesmo é ser livre. A ordem, portanto,
atribui um lugar central ao indivíduo racional, autônomo.” p. 409

Hegel deriva seu modelo de sociedade a partir da ideia de liberdade. Mas essa
não é simplesmente a liberdade do ser humano e sim a liberdade da Ideia. Diante
disso, o modelo mais adequado à sociedade humana é retirado da Ideia. O conteúdo
concreto da obrigação moral é aquele que for mais adequado à organização social
baseada na Ideia.

“A comunidade que é o locus da nossa vida moral mais plena é um Estado que se
aproxima de uma corporificação verdadeira da Ideia.” p. 412

“Uma doutrina das obrigações imanente e consistente não pode ser outra coisa
que a exposição sequencial das relações de que necessita a Ideia da liberdade e que,
por isso, são realizadas em toda a sua extensão, ou seja, no Estado. (FD, §148)” p.
409

O conceito de Sittlichkeit

34
DISSERTAÇÃO

Existe uma relação dialética entre o modelo racional e universal de sociedade


baseado na Ideia e a Sittlichkeit. Essa relação é responsável pela concepção hegeliana
de história.

“’Sittlichkeit’ refere-se às obrigações morais que tenho para com uma comunidade
permanente da qual faço parte. Essas obrigações estão baseadas em normas e usos
estabelecidos (…). A característica crucial da Sittlichkeit é que nos manda produzir
aquilo que já existe. (…) a vida comum que é a base da minha obrigação ética (sittlich)
já está aí em existência. Consequentemente, na Sittlichkeit, não há fissura entre o que
deve ser e o que é (…).” p. 411

“Porque a realização da Ideia requer que o ser humano seja parte de uma vida
mais ampla em sociedade, a vida moral alcança a sua realização suprema na
Sittlichkeit. Essa realização suprema obviamente é uma conquista (…). (…) a
concretização da moralidade ocorre numa Sittlichkeit realizada” p. 412

“A doutrina da Sittlichkeit é que a moralidade alcança a sua completude numa


comunidade. Isso confere á obrigação um conteúdo definitivo, tanto quanto o realiza,
de modo que a fissura entre Sollen e Sein é consertada. (…) Hegel começou seguindo
Kant ao distinguir vontade e liberdade da natureza. Porém, a concretização da
liberdade se dá quando a natureza (aqui a sociedade, que começou numa forma
rudimentar, primitiva) é renovada para atender às demandas da razão.” p. 411

Assim, a Sittlichkeit não é um modelo rígido de sociedade. Ao contrário, significa a


organização social e política estatal típica da cultura e dos costumes de um
determinado povo. Nunca existiu na história da humanidade um exemplo de sociedade
que estivesse plenamente de acordo com o modelo racional e universal de sociedade
baseado na Ideia. Contudo, as sociedades estatais humanas estão gradualmente
incorporando ao longo da história o modelo de sociedade universal e racional baseado
na Ideia. Inicialmente, os estados eram primitivos, baseados mais no mundo natural do
que na razão, e aos poucos foram se desenvolvendo à medida que incorporavam os
elementos próprios do modelo de sociedade baseado na Ideia. Para Hegel, a história
da humanidade consiste no processo de corporificação da Ideia através da Sittlichkeit.

2.

“(…) só podemos alcançar nossa existência moral mais elevada e mais completa
como membros de uma comunidade (…)” p. 413

“A doutrina que põe a Sittlichkeit no ápice da vida moral requer uma noção de
sociedade como (…) vida comunitária mais ampla, na qual o ser humano participa
como membro.” p. 413

“A comunidade é uma corporificação do Geist, e uma corporificação mais plena,

35
DISSERTAÇÃO

mais substancial que o indivíduo.

Para Hegel, a comunidade enquanto reunião das vontades subjetivas dos


indivíduos possui ela mesma uma vontade objetiva e, por conseguinte, torna-se mais
do que um simples agregado de individualidades, constituindo-se num sujeito, cuja
vontade é independente das vontades particulares, consideradas apenas
individualmente, de seus membros componentes. Essa é a “noção hegeliana do Geist
objetivo”.

A sociedade e sua relação com os indivíduos

“O Estado ou o povo é a ‘substância’ dos indivíduos.” p. 413

“A substância que se sabe livre, em que o dever-ser absoluto é igualmente ser,


tem realidade como espírito de um povo. A divisão abstrata desse espírito é a
singularização em pessoas, de cuja autonomia ele é a potência e a necessidade
interiores. Mas a pessoa sabe, enquanto inteligência pensante, aquela substância
como sua própria essência, e nessa convicção (Gesinnung) deixa de ser acidente dela,
vendo-a, antes, como seu fim último e absoluto na realidade, mas também como algo
que é alcançado no aqui e agora, quanto ao mesmo tempo ele a produz mediante a
sua atividade, mas como algo que de fato pura e simplesmente é. (EG, §514)” p. 414

“Hegel diz que a comunidade também é ‘essência’ e também ‘fim último’ para os
indivíduos.” p. 414

“A noção por trás de ‘substância’ e ‘essência’ é que os indivíduos só são o que


são por sua inerência à comunidade.”

“Tudo o que o ser humano é ele deve ao Estado; só nele pode encontrar a sua
essência. Todo valor que um ser humano tem, toda a realidade espiritual, ele tem
unicamente por meio do Estado. (VG, p. 111)” p. 414

“O indivíduo é um indivíduo nessa substância […]. Nenhum indivíduo pode ir além


[dela]; ele certamente pode se separar de outros indivíduos particulares, mas não do
Volksgeist. (VG, p. 59-60)” p. 414

“Essa unidade substancial é um fim em si imóvel absoluto, em que a liberdade


chega ao seu direito supremo, assim como esse fim último tem o direito supremo frente
aos singulares, cuja obrigação suprema é ser membro do Estado. (FD, §258)” p. 414

“O Estado não existe por causa dos cidadãos; alguém pode dizer que ele é o fim e
eles, os seus instrumentos. Porém, essa relação entre fins e meios é totalmente
inapropriada nesse caso. Por que o Estado não é algo abstrato, que se contrapõe aos
cidadãos; mas eles são, antes, momentos como na vida orgânica, em que nenhum
membro é fim e nenhum é meio. […] A essência do Estado é a vida ética ( die sittliche
Lebendigkeit). (VG, p. 112)” p. 415

36
DISSERTAÇÃO

“O que vemos aqui é a noção dos fins e meios cedendo seu lugar para a imagem
de um ser vivo. O Estado ou comunidade possui uma vida mais elevada; suas partes
estão relacionadas como partes de um organismo. Por conseguinte, o indivíduo não
está a serviço de um fim separado dele; ele está, antes, servindo a um fim mais amplo
que é a base de sua identidade, porque ele apenas é o indivíduo que ele é nessa vida
mais ampla.” p. 415

“Hegel acrescenta a essa noção de comunidade enquanto vivente a noção de


comunidade enquanto “consciente de si”. E é esta noção, junto com o uso das palavras
“Geist” e “Volksgeist”, que fez surgir a ideia de que o Estado hegeliano ou a
comunidade hegeliana é um superindivíduo. Porém, na passagem de VG em que ele
introduz o termo “consciência de si”, Hegel deixa claro que não está falando dele em
conexão com Volksgeist no sentido em que se aplica a indivíduos. Como qualquer
Geist mais amplo que o indivíduo, ele só tem existência mediante o veículo dos sujeitos
concretos individuais. Ele não é, portanto, um sujeito como eles.” p. 415

“Por conseguinte, na FD, §258, Hegel fala que o Estado possui “a efetividade da
vontade substancial […] na autoconsciência particular, uma vez que essa consciência
tenha se elevado à consciência de sua universalidade”. p. 415

“(…) quando concebemos um ser humano, não estamos nos referindo


simplesmente a um organismo vivo, mas a um ser capaz de pensar, sentir, decidir,
emocionar-se, responder, estabelecer relações com outros; e tudo isso implica uma
linguagem, um conjunto de maneiras relacionadas de experimentar o mundo, de
interpretar seus sentimentos, de pensar a sua relação com outros, com o passado, com
o futuro, com o absoluto e assim por diante. É o modo particular como ele situa a si
mesmo dentro desse mundo cultural que chamamos de sua identidade.” p. 415

“Ora, a linguagem e o conjunto relacionado de distinções subjacentes à


experiência e à interpretação, contudo, é algo que só pode crescer e ser sustentado
por uma comunidade. Nesse sentido, o que somos como seres humanos, somos
apenas numa comunidade cultural. (…) A vida de uma linguagem e de uma cultura é do
tipo cujo locus é mais amplo que o do indivíduo. Ela acontece numa comunidade. O
indivíduo possui essa cultura e, em consequência, sua identidade, mediante a
participação nessa vida mais ampla.” p. 416

“Assim, a cultura que vive em nossa sociedade molda nossa experiência privada e
constitui nossa experiência pública, que, por seu turno, interage profundamente com a
experiência privada. Desse modo, (…) somos o que somos em virtude de nossa
participação na vida mais ampla da nossa sociedade — ou, ao menos, de estarmos
imersos nela, caso a nossa relação com ela seja inconsciente e passiva, como
acontece com frequência.” p. 416

“O ponto em questão é que os objetos da experiência pública — ritos, festivais,


eleições, etc. — não são como fatos da natureza. Por que eles não são inteiramente

37
DISSERTAÇÃO

separáveis da experiência a que dão origem. Eles são parcialmente constituídos pelas
ideias e interpretações que estão na sua base. Um prática social dada, como, por
exemplo, votar na ecclesia ou numa eleição moderna, é o que é devido a um conjunto
de ideias e significados entendidos de forma comum, mediante o qual o ato de
depositar pedras numa urna ou assinar pedaços de papel equivale a tomar uma
decisão social. Essas ideias a respeito do que está acontecendo são essenciais para
definir uma instituição.” p. 417.

“Por conseguinte, certa visão do ser humano e de sua relação com a sociedade
está acomodada em algumas práticas e intuições de dada sociedade. Desse modo,
podemos conceber estas [práticas e instituições sociais] como expressão de certas
ideias.” p. 417

“Nesse sentido, podemos conceber as instituições e práticas da sociedade como


uma espécie de linguagem em que suas ideias fundamentais são expressas. Porém, o
que é ‘dito’ nessa linguagem não são ideias que poderiam estar nas mentes de certos
indivíduos apenas; elas são, antes, comuns a uma dada sociedade, porque estão
acomodadas em sua vida coletiva, nas práticas e instituições que são as dessa
sociedade de modo indivisível. Nessas, o espírito da sociedade é, em certo sentido,
objetivado. Elas são — para usar um termo de Hegel — ‘espírito objetivo’.”

“Essas instituições e práticas perfazem a vida pública de uma sociedade.” p. 417

“As normas da vida pública de uma sociedade são o conteúdo da Sittlichkeit.” p.


417

“(…) só a prática continuada define o que é a norma que nossa ação futura deve
procurar sustentar. Isso acontece especialmente no caso de ainda não haver
formulação teórica da norma (…)” p. 417

“A Sittlichkeit pressupõe que as práticas vivas sejam um “enunciado” adequando


das normas básicas, embora, no caso limítrofe da moderna filosofia do Estado, Hegel
veja a formulação teórica como algo que está se atualizando.” p. 418

“A vida mais feliz e não alienada do ser humano, desfrutada pelos gregos, é
aquela em que as normas e os fins expressos na vida pública da sociedade são os
mais importantes, pelos quais seus membros definem sua identidade como seres
humanos. Por que, nesse caso, a matriz institucional em que eles não podem deixar de
viver não é percebida como forânea. Ela é, antes, a essência, a ‘substância’ do self.” p.
418

“Assim, no espírito universal cada um tem a certeza de si mesmo, a certeza de


não encontrar, na realidade existente, nada além de si mesmo. (FE, p. 252 com modif.;
PhG, p. 258)” p. 418

“E pelo fato de essa substância ser sustentada pela atividade dos cidadãos, eles a

38
DISSERTAÇÃO

consideram obra sua.” 418

“Essa substância é igualmente a obra (Werk) universal que, mediante o agir de


todos e da cada um, se engendra como sua unidade e igualdade, pois ela é o Ser-para-
si (Fürsichsein), o Si, o agir (das Tun).” (FE, p. 305; PhG p. 418

“Viver num Estado desse tipo é ser livre. A contraposição entre necessidade social
e liberdade individual desaparece.”

“O racional é necessário como aquilo que pertence à substância, e somos livres


na medida em que o reconhecemos como lei e o seguimos como a substância da
nossa própria essência; a vontade objetiva e a vontade subjetiva são, então,
reconciliadas e formam um só todo harmonioso. (VG, p. 115)” p. 419

O surgimento da alienação

“Porém, a alienação surge quando objetivos, normas ou fins que definem as


práticas ou instituições comuns começam a parecer irrelevantes ou até mesmo terríveis
ou quando as normas são redefinidas de tal modo que as práticas parecem um
simulacro delas. (…) Quando isso acontece, as pessoas precisam voltar-se para outro
lugar para definir o que é centralmente importante para elas. (…) elas agem por conta
própria e definem a sua identidade como indivíduos. O individualismo se instaura (…)
quando as pessoas param de identificar-se com uma vida comunitária, quando elas
‘refletem’, isto é, voltam sobre si mesmas e veem a si mesmas primordialmente como
indivíduos com fins individuais. Esse é o momento da dissolução do Volk e de sua vida.
O que acontece aqui é que o indivíduo para de definir a sua identidade em primeira
linha pela experiência pública da sociedade. (…) A experiência pública parece-lhe
secundária, estreita e paroquial, tocando-o apenas parcialmente.” p. 419-420

Para Hegel, a Sittlichkeit consiste numa “comunidade como substância ética”,


uma “vida espiritual” da qual o ser humano naturalmente faz parte.

“Em primeiro lugar, o mais importante para o ser humano só pode ser obtido na
relação com a vida pública de uma comunidade, não na autodefinição privada de um
indivíduo alienado. Em segundo lugar, essa comunidade não pode ser uma
comunidade meramente parcial, como, por exemplo, um conventículo ou uma
sociedade privada, cuja vida é condicionada, controlada e limitada por uma sociedade
mais ampla. Seus limites devem coincidir com a realidade humana autosuficiente
mínima, com o Estado. (…) Em terceiro lugar, a vida pública do Estado possui essa
importância crucial para os seres humano porque (…) expressa a Ideia, a estrutura
ontológica das coisas. Em última análise, ele é de vital importância porque constitui um
dos modos indispensáveis pelo qual o ser humano recupera sua relação essencial com
essa estrutura ontológica, os outros consistindo nos modos de consciência que Hegel
chama de espírito ‘absoluto’, e essa relação real que passa pela vida de uma
comunidade é essencial para a completude do retorno à identidade consciente entre o
ser humano e o Absoluto (o que significa também a identidade do Absoluto consigo

39
DISSERTAÇÃO

mesmo).” p. 421

“Esse é o complexo de ideias que está por trás do uso hegeliano de termos como
‘substancia’, ‘essência’, ‘Endzweck’ [fim último], ‘Selbstzweck’ [fim em si] ao falar de
uma comunidade: antes de tudo, que o conjunto de práticas e instituições que
perfazem a vida pública de um comunidade expressam as normas mais importantes, as
que são mais centrais para a identidade dos seus membros, de modo que eles só se
sustentam em sua identidade, participando dessas práticas e instituições, as quais, por
seu turno, eles perpetuam com essa sua participação. Em segundo lugar, que a
comunidade concernida é o Estado, isto é, uma comunidade realmente autosuficiente.
E, em terceiro lugar, que essa comunidade tem esse papel central por que expressa a
Ideia, a fórmula da necessidade racional subjacente ao ser humano e seu mundo. p.”
421-422

“(…) a vida pública de uma sociedade expressa certas ideias, que são, por
conseguinte, em certo sentido, as ideias da sociedade como um todo, e não apenas
dos indivíduos, de modo que podemos dizer que um povo tem um certo ‘espírito’.” p.
422

“(…) a ideia de um Volkgeist, do espírito de um povo, cujas ideias são expressas


em suas instituições comuns, pelas quais os membros desse povo definem sua
identidade (…)” p. 422

Segundo a visão ontológica de Hegel, os seres humanos (Volksgeist) são veículos


de um espírito cósmico que está retornando à consciência de si através do ser
humano. Além disso, esse espírito cósmico põe o mundo e o Estado expressa a
“fórmula subjacente da necessidade pela qual esse espírito põe o mundo”.

“(…) o que Hegel tem em mente com ‘Estado’ é a comunidade politicamente


organizada. Seu modelo não é o Machtstaat de Frederico, o Grande, que ele jamais
admirou, mas a polis grega.” p. 423

“(…) o Estado plenamente racional será aquele que expressa em suas instituições
e práticas as ideias e normas mais importantes que seus cidadãos reconhecem e pelas
quais eles definem a sua identidade. E isso será assim por que o Estado expressa as
articulações da Ideia, que o ser humano racional passa a ver como a fórmula da
necessidade subjacente a todas as coisas, que está destinada a vir à consciência de si
no ser humano. Desse modo, o Estado racional restaurará a Sittlichkeit, a
corporificação das normas supremas, numa vida pública permanente. O Estado
plenamente desenvolvido incorporará o principal da vontade racional individual que
julgará com critérios universais (…)”p. 423.

“Essa integração da individualidade e Sittlichkeit é um requisito que podemos


deduzir da Ideia.” p. 423

Razão e História

40
DISSERTAÇÃO

1.

“Por isso, a concretização do Espírito requer o crescimento de uma comunidade


que expressará e corporificará plenamente a razão. E visto que o espírito põe o mundo
do espaço e do tempo para que realize a si próprio, essa concretização e, em
consequência, também a comunidade da razão, pode ser considerada o objetivo da
história.” p. 424

“O objetivo é que se torne conhecido que [o Espírito] avança unicamente para


conhecer a si mesmo como ele é an und für sich, que ele produza a aparição de si
mesmo em sua verdade diante de si mesmo — o objetivo é que ele traga à existência
um mundo espiritual que seja adequado ao seu próprio [isto é, do mundo] conceito, que
ele realize e aperfeiçoe a sua verdade, que a religião e o Estado sejam produzidos por
ele de tal modo que ele se torne adequado ao seu conceito […]. (VG, p.61)” p. 424

“(…) o espírito está tentando chegar a um entendimento, a um conhecimento do


self. Porém, para fazer isso, ele precisa dar existência a uma realidade, a uma
comunidade espiritual que também tem de ser uma comunidade real (o ‘mundo
espiritual’ [geistige Welt] tem de ser corporificado num ´Staat’ [Estado]) que seja
adequando ao seu conceito.

“O objetivo é que o Espírito chegue à consciência de si mesmo ou torne o mundo


congruente consigo mesmo (die Welt sich gemäß mache) — o que, no fim, dá no
mesmo […] (VG, p. 74)” p. 424

“Por conseguinte, a história tem de ser entendida teleologicamente como


direcionada para a realização do Geist.” p. 424

“O bem verdadeiro, a razão divina, é também o poder de produzir a si mesmo.


Esse bem, essa razão, em sua representação mais concreta é Deus […]. A noção da
filosofia é que nenhuma força prevalece sobre o poder do bem, de Deus, que pudesse
impedi-lo de alcançar seu fim (sich geltend zu machen) […] que a história do mundo
nada ostenta além do plano da Providência. Deus governa o mundo. (VG, p. 77)” p.
425

“A história, portanto, chega à sua culminância numa comunidade que está em


conformidade com a razão; ou, poderíamos dizer também, uma comunidade que
corporificou a liberdade, porque ‘o propósito final do mundo é a consciência que o
Espírito tem de sua liberdade e, em consequência, a primeira realização plena dessa
liberdade’. (VG, p. 63)” p. 425

“Essa liberdade obviamente não é individual, liberdade negativa, liberdade para


fazer o que quero. É a liberdade que o ser humano tem por seguir sua própria
essência, sua própria razão.” p. 425

41
DISSERTAÇÃO

“(…) a escolha arbitrária (das Belieben) do indivíduo precisamente não é


liberdade. Liberdade limitada é arbítrio (Willkür) relacionado com o elemento particular
das necessidades. (VG, p. 111)” p. 425

“seguir a razão é participar na vida mais ampla do Estado, porque ‘é só no Estado


que o ser humano possui existência racional’” p. 425

“(…) o Estado plenamente racional não é a primeira comunidade com que os


seres humanos se identificam como sua ‘substância’. Pelo contrário, todos os
desenvolvimentos históricos importantes têm lugar em tais comunidades [Estados, cuja
racionalidade ainda é incipiente].” p. 425

“O que estamos analisando aqui são os povos que se organizaram racionalmente.


Na história mundial, só se pode falar de povos que formaram um Estado. (VG. p. 113)”
p. 425

“Os seres humanos que vivem fora de um Estado, como, por exemplo, em
sociedades tribais patriarcais, estão totalmente à margem da história, seja antes de ela
realmente começar, seja em suas bordas.” p. 425

“O que surge no final da história não é a comunidade como tal, mas, antes, uma
comunidade que, pela primeira vez, é plenamente adequada ao conceito, à liberdade e
à razão.” p. 425

“Consequentemente, a marcha da história pode ser vista como a sucessão


dessas comunidades, sendo que as mais antigas são expressões imperfeitas daquilo
que as posteriores corporificarão de modo cada vez mais adequado.” p. 425

“Hegel denomina Volksgeister essas comunidades históricas concretas ou esses


povos que são corporificações (mais ou menos adequadas) do Espírito. Eles são os
sujeitos da história. ‘O Espírito de que estamos tratando aqui é o Volksgeist’ (VG, p.
59)” p. 425

“Volksgeist são culturas históricas, mais vistas como corporificações do Geist,


como um certo estágio de sua realização entre o ser humano e esse sujeito cósmico do
qual ele é o veículo.” p. 425

“Por conseguinte, a Ideia é realizada na história, só que através de estágios, e


esses estágios são civilizações históricas, Volksgeister.” p. 426

“A história mundial é a apresentação do divino, o processo absoluto do Espírito


em suas formas supremas desse progresso através de estágios em que ele alcança a
sua verdade e a consciência a respeito de si mesmo. As formas desses estágios são
Volksgeister da história mundial, o caráter de sua vida ética, sua constituição, sua arte,
religião, ciência. Levar cada um desses estágios à realização é a pulsão (Trieb) infinita

42
DISSERTAÇÃO

do espírito universal, seu impulso (Drang) irresistível; com efeito, essa articulação e sua
realização é seu conceito. (VG, p. 75)” p. 426

“(…) esse conjunto de estágios é necessário, [pois] está de acordo com o


Conceito. É necessário para a sua autorrealização que o espírito se desloque da
exterioridade extrema para a plena consciência de si. Porém, os estágios ao longo do
percurso igualmente são postos pela necessidade; cada um deles deve realizar-se
efetivamente.” p. 426

“A força motriz do movimento é a contradição, aquela entre a realidade exterior e


o que se pretende realizar. A contradição consequentemente leva qualquer forma dada
à dissolução. Porém, a natureza particular da contradição nessa forma determina o
resultado, e, em consequência, do colapso da primeira forma surge outra forma
específica. Tendo resolvido a contradição de sua predecessora, ela é vitimada por sua
própria, e assim por diante através de toda a história.” p. 426

“Desse modo, a história mostra um movimento dialético (…). Porém, visto que o
ponto inicial e o objetivo são postos pela Ideia, logo, por necessidade, todos os
estágios intermediários são necessários. (…) A história deveria, portanto, seguir um
plano dialético necessário. O plano da história é a Ideia (…). Consequentemente, a
dialética da história tem de ser entendida como reflexo dos estágios conceitualmente
necessários no autodesenvolvimento da Ideia.” p. 426

“Porém, não surpreenderá a ninguém que de fato haja certa maleabilidade de


ajustamento entre história e lógica. As relações conceituais, na sua forma geral,
admitem um número demasiado grande de combinações, o que nos impede de compor
uma moldura a priori bem rigorosa (…). A despeito disso, no entanto, há uma unidade
muito forte e até potencialmente convincente no plano geral das coisas. Quanto mais
alto dos elevarmos acima do detalhe, tanto mais persuasivo parecerá a filosofia da
história.” p. 427

“Os estágios da história (…) são representados pelos Volksgeister. Cada estágio é
corporificado em certo povo que labora para realizar a ideia daquele estágio particular.
Esse é o propósito comum dos povos; eles permanecem inteiramente tomados por
essa tarefa comum, inteiramente identificados com ela, até que ela seja alcançada.
Depois, ocorrem as divergências. Seus membros param de empenhar-se totalmente,
voltam-se para a reflexão, para uma identidade como indivíduos fora do objetivo
público. Eles incorrem na ‘nulidade política’ (VG, p. 68)”

“Nessa passagem, Hegel fala como se a transição de um estágio ao próximo se


desse através da realização plena e da morte natural de cada povo da história mundial
(…). Ao desenvolver a sua forma particular ao máximo, um dado Volksgeister também
fez a sua inadequação atingir a culminância. Não havendo mais desenvolvimento
ulterior da Ideia, o que se sobressai é unicamente a inadequação. Consequentemente,
é inevitável que os seres humanos abandonem esse Estado (…). (…) em algum outro
lugar, surge uma nova força que carrega em si o próximo estágio.” p. 427

43
DISSERTAÇÃO

“(…) os seres humanos não compreendem plenamente o que estão fazendo na


história. (…) por necessidade os seres humanos em estágios anteriores da história não
são capazes de entender o plano do Geist (…)” p. 427

“É nesse ponto que Hegel introduz a sua famosa ideia da astúcia da razão. A
razão é apresentada nessa imagem como ‘usando’ as paixões humanas dos seres
humanos para cumprir seus propósitos. Os seres humanos e seus propósitos tombam
na batalha, mas o propósito universal prossegue em segurança, acima disso tudo.” p.
427

“Não é a ideia universal que se coloca em oposição e se posiciona para a batalha


ou põe a si mesma em perigo; ela se mantém protegida de qualquer ataque e incólume
no plano de fundo e envia o particular da paixão para esfalfar-se na batalha. Podemos
chamar de a astúcia da razão o fato de a Ideia fazer as paixões trabalharem por ela de
maneira a infligir perda e fazer sofrer o dano aquilo de que se vale para ganhar
existência. (VG, p. 105)” p. 427

“(…) até mesmo os seres humanos nos estágios mais iniciais da história são os
veículos do Geist. Eles têm algum senso para as demandas do espírito, por mais que
este seja turvo (…). Consequentemente, não se trata meramente da questão de a
ambição individual humana estar sendo usada para um propósito forâneo. Trata-se,
antes, de que aquelas pessoas cuja ambição individual coincide com os interesses do
espírito estão imbuídas de um senso de missão. Instintivamente, elas sentem a
importância do que estão fazendo, e o mesmo sentem as pessoas em torno delas que
se congregam em torno das suas bandeiras. (…) Hegel usa a palavra ‘instinto’ para
esse reconhecimento inconsciente da significação.” p. 428

“(…) a obra do Weltgeist é sentida como um ‘impulso imanente’ presente entre os


seres humanos. Um impulso meramente ‘instintual’, isto é, que não é entendido; e é por
isso que a obra da razão é feita em meio ao estrépito das ambições individuais na
história.” p. 428

“(…) a grandeza dos indivíduos histórico-universais não reside apenas no fato de


eles serem instrumentos do Espírito universal. Eles também são os primeiros a sentir e
articular aquilo que terá de ser o próximo estágio. Quando levantarem essa bandeira,
as pessoas o seguirão. No momento em que uma forma estiver exaurida, quando o
Espírito tiver abandonado a forma reinante, será o indivíduo histórico-universal que
indicará o caminho que leva ao que todos os seres humano aspiram do fundo do
coração. ‘Os indivíduos histórico-universais são os primeiros a dizerem às pessoas o
que elas aspiravam’ (VG, p. 99)” p. 429

“Com efeito, o espírito que passou para o próximo estágio é a alma de todos os
indivíduos, só que em forma de senso interior inconsciente que os grandes vultos
humanos trazem à consciência deles pela primeira vez. (VG, p. 99)” p. 429

44
DISSERTAÇÃO

2.

O Estado Realizado

1.

O Estado “é a corporificação suprema da Sittlichkeit, que está implícita na noção


de que o ser humano é o veículo da vontade racional”.

“(…) Sittlichkeit, que constitui a liberdade substancial nos termos de Hegel. Ela
constitui um bem realizado. As pessoas se identificam com ela. Ela se torna a sua
“segunda natureza” (FD, §151), e elas são a sua realização efetiva na subjetividade.” p.
469

“O Estado é a comunidade em que as subjetividades universais podem ser atadas


umas as outras enquanto são reconhecidas como tais.” p. 470

“(…) ele [o Estado] é a corporificação suprema da Sittlichkeit, que está implícita na


noção de que o ser humano é o veículo da vontade racional.” p.466

“(…) Estado, que é a realização plena da Ideia da Sittlichkeit, isto é, a comunidade


em que o bem é realizado na vida comum. (…) No Estado, temos a realização plena e
autossubsistente. É a manifestação da vontade substancial. É a comunidade em que a
plenitude da vontade racional se torna manifesta na vida pública O Estado plenamente
realizado reconcilia a subjetividade individual plenamente desenvolvida com o
universal. Ele é a liberdade concreta.” p. 477

“A liberdade concreta consiste em que a individualidade da pessoa e seus


interesses particulares não só cheguem ao seu desenvolvimento completo e obtenham
o reconhecimento explícito do seu direito (…), mas, por um lado, que também passem
por si mesmas ao interesse do universal e que, por outro, com seu saber e seu querer,

45
DISSERTAÇÃO

o reconheçam como seu próprio espírito substancial e que o assumam como seu fim e
alvo e sejam ativos em buscá-lo. (FD, § 260 com modif.)” p. 477

“O Estado tem de ser visto como a realização da necessidade racional, da Ideia.


Como tal, suas articulações devem ser entendidas como autoarticulações da Ideia.
Hegel fala do Estado como um “organismo”. Porém, é um organismo concebido como
produtor de suas articulações de acordo com um plano necessário. Essas articulações
são fixadas pelo Conceito (FD, §269) Eles formam a constituição do Estado.” p. 477

46
DISSERTAÇÃO

Ideia, liberdade, espírito, autonomia, vontade, razão e estado

Ideia

● A Razão na História
129

130

131

132

129 “A Idéia se desenvolvendo no espaço é a Natureza, a Idéia subseqüentemente -


ou antes, conseqüentemente, pois é tudo um processo lógico- se desenvolvendo no
tempo é o Espírito. Este último, o desenvolvimento da Idéia no tempo, ou
desenvolvimento do Espírito, é a História. A História torna-se assim um dos grandes
movimentos da Idéia, enraíza-se em um fluxo metafísico de alcance universal. É a
História universal.” (Robert S. Hartman - p. 12)
130 “Para Hegel, a força que move a história é a dinâmica da Idéia (…).” (Robert S.
Hartman - p. 20)
131 “A História, para Hegel, "é o desenvolvimento do Espírito no Tempo, assim como a
Natureza é o desenvolvimento da Idéia no Espaço". Se compreendemos esta sentença,
compreendemos a Filosofia da História de Hegel. Todo o sistema de Hegel é construído
em cima da grande tríade: Idéia – Natureza – Espírito. A Idéia-em-si é o que se
desenvolve, a realidade dinâmica do depois – ou antes – do mundo. Sua antítese, a
Idéia-fora-de-si, ou seja, o Espaço, é a Natureza. A Natureza, depois de passar pelas
fases dos reinos mineral e vegetal, se desenvolve no homem, em cuja consciência a
Idéia se torna consciente de si. Esta auto consciência da Idéia é o Espírito, a antítese
de Idéia e Natureza, e o desenvolvimento desta consciência é a História. Assim, a
História e a Idéia estão inter-relacionadas.” (Robert S. Hartman - p. 21)
132 “Como a Idéia-em-si se desenvolve na pureza da dialética lógica, assim a Idéia-
fora-de-si, como Natureza, se desenvolve na forma de Espaço: E o Espírito – a idéia-
em/e-por-si-mesma – se desenvolve na forma de Tempo, o Tempo da Consciência do
Espírito. O Tempo, então, é para o Espírito o que a estrutura lógica é para a Idéia. E a
contrapartida concreta da Lógica no reino do Espírito, exatamente como é espaço-
tempo no reino da Natureza. A ciência da Idéia é a de estrutura lógica, ou seja, lógica; a
ciência da Natureza é a do Espaço, ou seja, a geometria"; a ciência do Espírito é a do

47
DISSERTAÇÃO

133

134

135

136

137

138

139

Tempo, ou seja, a história. (…) Vê-se que a filosofia da história é a culminação do


sistema hegeliano. A história é a completa solidificação da lógica, que é a base do
sistema. Como o Espírito é a Idéia concreta, a seqüência de acontecimentos históricos
é ao mesmo tempo temporal e lógica; ela é temporal até onde é o autodesenvolvimento
do Espírito e é lógica até onde é o autodesenvolvimento da Idéia. (Robert S. Hartman -
p. 22-23)
133 “Por outro lado, o Espírito ao superar assim seus próprios obstáculos elaborando e
compreendendo a si mesmo na História é continuamente criativo, mas sua criatividade
não é nada de ontologicamente novo, ela é predeterminada na potencialidade pura da
Idéia pura. É a Idéia em si, a Razão, que se completa na História. O Espírito, ao criar a
si mesmo no tempo, cria o ‘segundo reino’ da realidade, depois do reino da Natureza.
Ele assim completa o mundo, que tanto é a Natureza como o Espírito.” (Robert S.
Hartman - p. 26)
134 “A totalidade de todas essas civilizações é a Idéia quando se completou em
plenitude absoluta no tempo infinito: a Idéia absoluta.” (Robert S. Hartman - p. 29-30)
135 “(…) a Idéia na verdade é o guia dos povos e do mundo; o Espírito, sua vontade
racional e necessária, orienta e sempre orientou o fluxo dos acontecimentos mundiais.”
(A Razão na História - p. 51)
136 “Por isso temos de contemplar à Idéia em geral, em sua manifestação como
espírito humano. Mais precisamente, a idéia de liberdade humana. A mais pura forma
em que a Idéia se manifesta é o Pensamento em si. Neste aspecto a Idéia é tratada na
Lógica.” (A Razão na História - p. 62)
137 “E assim entram dois elementos em nossa investigação: o primeiro, a Idéia, e
depois, o complexo das paixões humanas – um, a urdidura, o outro, a trama da imensa
tapeçaria da história do mundo. Sua ligação e união concreta constituem a liberdade
moral no Estado. Já falamos da Idéia de liberdade como sendo a essência do Espírito e
o objetivo positivamente final da história.” (A Razão na História - p. 69)
138 “A Idéia universal se manifesta no Estado.” (A Razão na História - p. 89)
139 “Esta união do universal e o particular é a própria Idéia, presente como Estado e
assim desenvolvendo-se ainda mais. (A Razão na História - p. 97)

48
DISSERTAÇÃO

140

141

Liberdade

● A Razão na História
142

143

140 “Por um lado, reconhecemos a Idéia em sua determinação, como liberdade


conhecedora de si e obstinada, que tem apenas a si como objetivo. Assim, ela é ao
mesmo tempo a simples idéia de razão e, da mesma forma, o que chamamos de
sujeito, a consciência de si, o Espírito que existe no mundo.” (A Razão na História - p.
99)
141 “A história do mundo em geral é o desenvolvimento do Espírito no Tempo, assim
como a natureza é o desenvolvimento da Idéia no Espaço.” (A Razão na História - p.
123)
142 “O espírito do Homem, a síntese da Idéia Natureza divinas fazem a realidade
indeterminada da Idéia determinada na existência. Assim, ao pensar cada vez mais
sobre o mundo e, neste processo, desenvolvendo cada vez mais sua consciência, ele
faz a Idéia, ou seja, o Próprio divino pensador, cada vez mais consciente de Si Mesmo.
Tudo isto ocorre no passar de gerações humanas, organizadas em Estados e nações,
ou seja, em História Assim, a História é a autodeterminação da Idéia em progresso, o
autodesenvolvimento do Espírito em progresso. Além disso, como o Espírito é livre por
sua natureza interior, a História é o progresso da Liberdade.” p. 17
143 “Hegel mostra em nosso texto que o Espírito é a Liberdade de três maneiras. O
Homem é parte Natureza e parte Espírito, mas sua essência é o Espírito. Quanto mais
o homem se desenvolve espiritualmente, mais ele se torna consciente de si mesmo e
quanto mais ele se torna consciente de si mesmo, mais ele se torna ele mesmo – ou
seja, livre. O desenvolvimento do Espírito em direção à consciência de si na história do
mundo é o desenvolvimento para uma Liberdade sempre mais pura. A história do
mundo é o avanço da Liberdade, porque ela é o avanço da autoconsciência do Espírito.
Depois, não apenas o homem se torna livre, mas o Espírito em si – no homem e
através dele. O Espírito é essencialmente reflexivo e necessariamente faz de si uma
certa idéia, de sua própria natureza. E assim ele chega a um conteúdo de sua reflexão,
não descobrindo um conteúdo, mas colocando-se em seu próprio objetivo, em seu
próprio conteúdo. O conhecimento é sua forma e sua orientação. O conteúdo do
conhecimento é o espiritual em si. Assim, o Espírito está essencialmente consigo, ou
seja, livre.21 Em terceiro lugar, o fato de que o Espírito seja Liberdade é visto não na
natureza do homem ou na do Espírito, mas na de seu oposto, a Matéria. A Matéria é
pesada porque, em gravitação, cada pedaço de Matéria luta contra algo fora de si
mesmo. Por outro lado, o Espírito contém a si. A Matéria tem sua substância fora de si
e o Espírito, por outro lado, está sendo em si mesmo e é precisamente isto que é a

49
DISSERTAÇÃO

144

145

146

Espírito

● A Razão na História

147

148

Liberdade.” p. 25 - 26
144 “A Liberdade, como o Espírito, é dinâmica, ela progride dialeticamente contra seus
próprios obstáculos. Ela jamais é dada, deve-se lutar para obtê-la. Cada afrouxamento
do Espírito significa voltar à inércia da Matéria, o que significa a destruição da liberdade
quando os homens estão sujeitos à Matéria (como ocorre na pobreza, na doença, no
frio, na fome), ou quando estão sujeitos a outros homens e são usados por estes como
objeto.” p. 26
145 “Como os particulares sozinhos não fazem o universal, os cidadãos sozinhos não
podem ser a consciência da liberdade. Apenas o Estado como um todo, sua cultura, é
que realiza a liberdade. Só a liberdade individual é cheia de caprichos, arbitrária, e
deve estar subordinada à liberdade universal como quando concretizada em uma
cultura nacional. A história dos indivíduos sozinhos e mesmo a dos indivíduos na ainda
emocional comunidade irracional da família realmente ainda não é história. A História é
o avanço da consciência de liberdade. No momento em que o indivíduo está consciente
de sua liberdade, ele é o cidadão do Estado moral, membro de uma comunidade
cultural. O Estado, e não ele mesmo, é o universo de sua liberdade – ele em si é
apenas um exemplo.” p. 31
146 “A liberdade puramente subjetiva é cheia de caprichos, mas a Liberdade
universalizada na forma concreta de uma civilização é objetiva e, assim, moral
concreta. Sua forma objetiva é a lei.” p. 32
147 “A Idéia se desenvolve no espaço e no tempo. A Idéia se desenvolvendo no
espaço é a Natureza, a Idéia subseqüentemente - ou antes, conseqüentemente, pois é
tudo um processo lógico- se desenvolvendo no tempo é o Espírito. Este último, o
desenvolvimento da Idéia notempo, ou desenvolvimento do Espírito, é a História. A
História torna-se assim um dos grandes movimentos da Idéia, enraíza-se em um fluxo
metafísico de alcance universal. É a História universal.” p. 12
148 “Assim, a História é a autodeterminação da Idéia em progresso, o
autodesenvolvimento do Espírito em progresso. Além disso, como o Espírito é livre por
sua natureza interior, a História é o progresso da Liberdade.” p. 17

50
DISSERTAÇÃO

149

150

151

152

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem como foco um dos objetos centrais da Filosofia Pol ítica: o
Estado. A importância dessa temática se origina das permanentes dificuldades
jurídicas, morais e éticas que as organizações sociopolíticas humanas vêm sofrendo
desde o início da história da humanidade. Além disso, tal temática é particularmente
importante nos dias atuais, com a onda de protestos que vem se espalhando pelo

149 “A História, para Hegel, "é o desenvolvimento do Espírito no Tempo, assim como a
Natureza é o desenvolvimento da Idéia no Espaço"12 Se compreendemos esta
sentença, compreendemos a Filosofia da História de Hegel. Todo o sistema de Hegel é
construído em cima da grande tríade: Idéia – Natureza – Espírito. A Idéia-em-si é o que
se desenvolve, a realidade dinâmica do depois – ou antes – do mundo. Sua antítese, a
Idéia-fora-de-si, ou seja, o Espaço, é a Natureza. A Natureza, depois de passar pelas
fases dos reinos mineral e vegetal, se desenvolve no homem, em cuja consciência a
Idéia se torna consciente de si. Esta auto consciência da Idéia é o Espírito, a antítese
de Idéia e Natureza, e o desenvolvimento desta consciência é a História. Assim, a
História e a Idéia estão inter-relacionadas.” p. 21
150 “O que Hegel quer dizer com o "Tempo" em que a História se desenvolve é um
problema que ele deixa de discutir em nosso texto. Ele o menciona na Fenomenologia
da mente. Não se trata do tempo físico, pois este, junto com o Espaço, cabe no sistema
hegeliano para a Natureza. O "Espaço" em que a Natureza se desenvolve é o espaço-
tempo físico. O Tempo em que o Espírito se desenvolve é o tempo da consciência, no
qual o Espírito "esvazia e externaliza" a si e extingue as "fases" da história. Como a
Idéia-em-si se desenvolve na pureza da dialética lógica, assim a Idéia-fora-de-si, como
Natureza, se desenvolve na forma de Espaço: E o Espírito – a idéia-em/e-por-si-
mesma – se desenvolve na forma de Tempo, o Tempo da Consciência do Espírito. O
Tempo, então, é para o Espírito o que a estrutura lógica é para a Idéia. E a
contrapartida concreta da Lógica no reino do Espírito, exatamente como é espaço-
tempo no reino da Natureza.” p. 22
151 “A ciência da Idéia é a de estrutura lógica, ou seja, lógica; a ciência da Natureza é
a do Espaço, ou seja, a geometria"; a ciência do Espírito é a do Tempo, ou seja, a
história.” p. 23
152 “Como o Espírito é a Idéia concreta, a seqüência de acontecimentos históricos é
ao mesmo tempo temporal e lógica; ela é temporal até onde é o autodesenvolvimento
do Espírito e é lógica até onde é o autodesenvolvimento da Idéia. (…) Para o filósofo
idealista, o autodesenvolvimento do Espírito transforma a conseqüência lógica
primordial em seqüência temporal. ” p. 23

51
DISSERTAÇÃO

Brasil e a mudança de mentalidade dos brasileiros, que passam cada vez mais a
cobrar do Estado a prestação de serviços públicos de qualidade, assim como o
combate efetivo à corrupção e à má gestão de recursos públicos no país. Diante disso,
como forma de agregar valor e trazer um aprofundamento a tão relevante discussão,
pretende-se tratar a questão acerca do Estado sobre uma perspectiva histórico-
filosófica, expondo não apenas o Estado em suas estruturas essenciais, mas também o
modo como ele se constitui no fundamento da história da humanidade.
Desse modo, dentre os inúmeros filósofos que se ocuparam com a questão
acerca de qual deve ser o real papel do Estado em uma organização sociopolítica
humana, Hegel (1770 - 1831) foi certamente um dos mais relevantes, estabelecendo
assim um marco na História da Filosofia. E um dos fatores essenciais para que sua
ideia de Estado adquirisse tamanha importância é o caráter estritamente sistemático
com que é trabalhada a sua filosofia política. O Estado em Hegel reflete toda a
estrutura do sistema hegeliano e possui assim a forma do silogismo lógico, que por sua
vez é compreendida como sendo “a apresentação do conceito nos seus momentos.
Individualidade, particularidade e universalidade (...)” . Diante disso, em sua obra
Princípios Fundamentais da Filosofia do Direito (1821), Hegel constrói a ideia de
Estado a partir dos três momentos fundamentais do silogismo lógico: o Estado
Individual, considerado como organismo isolado que se refere a si mesmo (Direito
Estatal Interno); o Estado Particular, compreendido nas suas relações com os outros
Estados (Direito Estatal Externo) e o Estado Universal, concebido como espírito que se
realiza na História (Filosofia da História) . É, portanto, na História que o Estado em
Hegel adquiri a sua dimensão universal, o seu mais alto grau de desenvolvimento e
concretização. Dessa forma, é em sua obra Lições sobre a Filosofia da História (1830)
que Hegel aprofunda tal concepção, expondo a História Universal como o processo de
concretização da ideia de Estado .
O propósito desta pesquisa é, portanto, compreender a ideia de Estado em Hegel
por meio do seu processo de formação ao longo da História Universal. Desse modo,
pretende-se adotar como fundamento da pesquisa a noção de Estado em seus
aspectos essenciais, com ênfase não no formalismo jurídico, mas sim no conteúdo
político, expondo o Estado como efetivação da eticidade, isto é, como conciliação entre
a liberdade subjetiva (a vontade individual particular) e a liberdade objetiva (a vontade
substancial universal). Com base nisso, pretende-se situar a Filosofia da História dentro
da compreensão de Estado e expor como ela se constitui não apenas em seu momento
culminante, mas também na realização máxima da Filosofia do Espírito. Diante disso,
articulando principalmente as categorias de Razão, Espírito, Liberdade e
Autoconsciência, pretende-se finalmente demonstrar como a Filosofia da História
consiste no processo de efetivação do Estado , provando, por conseguinte, que este se
constitui no conteúdo central e essência fundamental da História Universal.
Dessa forma, dentro do sistema de Hegel, a Filosofia da História é situada no
interior da Filosofia do Espírito e, por conseguinte, — seguindo a divisão do sistema
hegeliano em Lógica, Natureza e Espírito — seu conteúdo já é desenvolvido
inteiramente no último desses momentos. Tal fato confere à Filosofia da História um
diferencial importante: ela reúne em seu interior o resultado de todo o longo e exaustivo
processo dialético de desenvolvimento conquistado desde o início do sistema
hegeliano até a sua conclusão. Somado a isso, os estudos de Hegel que resultaram

52
DISSERTAÇÃO

nas Lições sobre a Filosofia da História consistem em uma obra de maturidade,


representando um dos momentos mais elevados de seu pensamento e cumprindo um
papel de consolidação de todo o seu sistema. No entanto, a Filosofia da História,
apesar de sua grande importância para o sistema de Hegel, não figura entre as suas
obras mais estudadas, havendo sobre ela um reduzido número de pesquisas quando
comparada às demais temáticas do pensamento hegeliano. Além disso, não obstante o
elevado número de pesquisas sobre a filosofia política hegeliana, ainda subsiste na
comunidade acadêmica, sobretudo entre os menos familiarizados com seu
pensamento, uma noção equivocada à cerca do Estado em Hegel, que o julga como
sendo totalitário, autoritário e absolutista. No entanto, dentro do pensamento hegeliano,
quando o Estado é compreendido juntamente com a Filosofia da História, todos esses
equívocos caem por terra. Pretende-se com esta pesquisa, portanto, esclarecer e
amenizar de alguma forma esses mal entendidos e, assim, prestar uma pequena
contribuição para o desenvolvimento dos estudos à cerca da obra de Hegel.

Diante disso, Hegel retoma na Filosofia da História um conceito fundamental de


seu sistema: a Razão. Tal conceito é apontado como sendo o princípio fundamental da
História Universal e o objeto central da Filosofia da História. Para Hegel: “O único
pensamento que a filosofia traz para o tratamento da história é o conceito simples de
Razão, que é a lei do mundo e, portanto, na história do mundo as coisas aconteceram
racionalmente” . E ainda, a Razão não é apenas “o princípio universal da História
Filosófica” , mas — indo muito mais além — é identificada com a dimensão do Todo,
compreendendo, por conseguinte, a totalidade de todas as coisas existentes, o infinito
reunido em uma unidade universal. Nas palavras de Hegel:

A filosofia demonstrou através de sua reflexão especulativa que a Razão [...] é ao


mesmo tempo substância e poder infinito, que ela é em si o material infinito de toda
vida natural e espiritual e também é a forma infinita, a realização de si como conteúdo.
Ela é substância, ou seja, é através dela e nela que toda a realidade tem o seu ser e a
sua subsistência. [...]. Ela é o conteúdo infinito de toda a essência e verdade [...]. E ela
é forma infinita, pois apenas em sua imagem e por ordem sua os fenômenos surgem e
começam a viver. É a sua própria base de existência e meta final absoluta e realiza
esta meta a partir da potencialidade para a realidade, da fonte interior para a aparência
exterior, não apenas no universal natural, mas também no espiritual, na história do
mundo. Que esta Ideia ou Razão seja o Verdadeiro Poder Eterno e Absoluto e que
apenas ela e nada mais [...] manifeste-se no mundo — como já dissemos, isto já foi
provado em filosofia e aqui está sendo pressuposto como demonstrado.

Compreendendo o movimento da Razão no interior do Sistema Hegeliano, tem-se


que o Todo — isto é, a Razão — congrega em si o Sistema Hegeliano em toda a sua
extensão, abrangendo seu processo de desenvolvimento em cada um de seus
momentos e em todo o seu percurso. Assim, o sistema é resumido da seguinte
maneira: “O todo da ciência divide-se em três partes principais: 1. a Lógica, 2. a
Ciência da Natureza, 3. a Ciência do Espírito” . A Razão contém em si cada uma
dessas partes como momentos a serem suprassumidos, sendo o momento do Espírito
o mais elevado, no qual Razão obtém sua mais completa realização. E é a partir do

53
DISSERTAÇÃO

momento em que o Espírito atinge a sua forma de Estado que a História Universal se
inicia. A Filosofia da História se situa, então, na Filofia do Espírito, e é com base no
Estado — isto é, o Espírito concretizado em Estado — que Filosofia da História se
fundamenta.

Desse modo, através do método dialético-especulativo , Hegel desenvolve seu


sistema partindo do momento mais abstrato e indeterminado — tal como se encontra
na Lógica — até o momento mais determinado e concreto, alcançado, por sua vez, ao
final da Filosofia do Espírito, momento em que se desenvolve o Estado através da
Filosofia da História. Assim, os conceitos de Estado, Espírito e História se relacionam
intimamente. A Filosofia do Espírito alcança a sua mais alta concretização a partir do
Estado, que, por sua vez se desenvolvido na Filosofia da História, porque é por meio
do Estado concretizado na História que o Espírito se manifesta no mundo. Para Hegel:
“É, porém, no teatro da história universal que o espírito alcança a sua realidade mais
concreta; (...).” .
Mas como momento culminante do Sistema Hegeliano, a Filosofia da História é o
resultado de um processo crescente de aperfeiçoamento e concretização. E para
definir o momento em que o sistema reuniu as condições necessárias para avançar da
Natureza para o Espírito, Hegel estabeleceu como critério o desenvolvimento da
Liberdade. Nesse contexto, a Liberdade é compreendida como autonomia, isto é, a não
dependência de algo em relação a algum outro. Para Hegel: “A substância do espírito é
a liberdade, isto é, o não-ser-dependente de um Outro (...).” . Dessa forma, o
desenvolvimento da Liberdade no Sistema Hegeliano marca a passagem do momento
da Filosofia da Natureza para o momento da Filosofia do Espírito, isto é, a superação
das limitações inerentes a Natureza e a efetivação da Liberdade através da ascensão
ao reino do Espírito. A Liberdade é, então, identificada por Hegel como sendo a própria
essência do Espírito, isto é, o que permite ao Espírito ser efetivamente Espírito. Nas
palavras de Hegel:

É fácil acreditar que ele [espírito] possua, entre outras propriedades, a liberdade.
A filosofia, no entanto, ensina-nos que todas as propriedades do espírito só existem
mediante a liberdade, são todas apenas meios para a liberdade, todas a procuram e a
criam. Isso é um conhecimento da filosofia especulativa, ou seja, a liberdade é a única
verdade do espírito.

Contudo, no instante em que o Espírito suprassumi a Natureza, a consciência por


ele adquirida ainda é pouco desenvolvida e o processo que o Espírito percorre ao longo
do sistema consiste em que ele desenvolva plenamente a consciência de si mesmo: a
sua autoconsciência. Para Hegel: “Na autoconsciência (...) o espírito conhece a si
mesmo, ele é o julgamento de sua própria natureza e, ao mesmo tempo, é a atividade
de voltar-se para si e assim se produzir, fazer o que ele é em si” . Desse modo, todo o
processo de desenvolvimento do Espírito ocorrido no Sistema Hegeliano tem este
único objetivo: que ele conquiste essa autoconsciência, a consciência da Liberdade
como sua essência. “Por esse motivo, todo o agir do espírito é só um conhecer de si
mesmo (...)” e o modo através do qual o Espírito adquiri esse autoconhecimento, ou
autoconsciência, é precisamente o Estado, desenvolvido por sua vez, na História

54
DISSERTAÇÃO

Universal: “Seguindo esta definição abstrata, pode-se dizer que a história do mundo é a
exposição do espírito em luta para chegar ao conhecimento de sua própria natureza” ;
sendo tal natureza a Liberdade: “(...) a história universal é o progresso na consciência
da liberdade” . Essa é, por conseguinte, a Razão, o princípio universal e motor da
História, isto é, a efetivação da Liberdade do Espírito através do desenvolvimento do
Estado. Em outras palavras: o processo de desenvolvimento do Espírito consiste na
conquista de sua autoconsciência que ocorre por meio da concretização de sua
Liberdade no Estado através da História Universal. Nas palavras de Hegel:

Ao mesmo tempo, a liberdade em si mesma, que encerra a infinita necessidade


de se tornar consciente — pois ela é, segundo seu conceito, o conhecimento de si —, é
o fim a que ela tende e a única finalidade do espírito. Na história universal tudo
convergiu para esse objetivo final; todos os sacrifícios no amplo altar da Terra, através
dos tempos, foram feitos para esse objetivo final. É o único fim que se realiza e
cumpre, o único permanente na trama mutável de todos os acontecimentos e
circunstâncias, bem como a força verdadeiramente atuante. (grifo nosso)

E o Estado como concretização da Liberdade do Espírito na História ocorre por


meio do ser humano, isto é, as organizações sociais dos seres humanos na forma dos
Estados são a própria manifestação do Espírito no mundo, assim como a História
Universal é a própria história da humanidade. As civilizações humanas que constituem
Estados conservam, então, o mesmo propósito do Espírito: a efetivação da Liberdade.
Esta, por sua vez, é desenvolvida através da vontade e do agir nas relações jurídicas,
morais e éticas que os seres humanos têm entre si nos Estados, cujo propósito — a
Liberdade — vai se consolidando nos mais variados povos e civilizações ao longo da
história. O Estado é o fundamento e conteúdo da História Universal, por que seu
desenvolvimento rumo à Liberdade é a própria História Universal. Nas palavras de
Hegel:

Na história universal só se pode falar dos povos que formam um Estado. É


preciso saber que tal Estado é a realização da liberdade, isto é, da finalidade absoluta,
que ele existe por si mesmo; além disso, deve-se saber que todo valor que o homem
possui, toda a realidade espiritual, ele só o tem mediante o Estado. Sua realidade
espiritual consiste em que o seu ser, o racional, seja objetivo para ele que sabe, que
tenha para ele existência objetiva e imediata; só assim o homem é consciência, só
assim ele está na eticidade, na vida legal e moral do Estado, pois o verdadeiro é a
unidade da vontade universal e subjetiva. [...] Ele [o Estado] é assim o objeto mais
próximo da história universal, no qual a liberdade recebe a sua objetividade e usufrui
dela.

O Estado é, então, um organismo formado por uma infinidade de vontades


individuais, que através do direito e das leis, se harmonizam em torno de uma vontade
universal . A Liberdade se efetiva, portanto, a partir do momento em que cada um dos
membros do Estado suprassume sua vontade individual, movida pelos desejos e
impulsos naturais , e se eleva à vontade universal — isto é, a vontade livre — visando
não apenas a seus interesses subjetivos, mas também à objetividade do Estado.

55
DISSERTAÇÃO

Quanto mais bem sucedido for o Estado em efetivar essa dimensão universal, a saber,
a vontade livre em cada uma dessas vontades individuais, mais se concretizará a
Liberdade . O aperfeiçoamento do Estado na realização desse propósito constitui-se,
então, no fundamento da História Universal.

OBJETIVOS

Objetivo Geral: Expor a ideia de Estado como fundamento da História Universal


dentro da concepção hegeliana.

Objetivos Específicos:
1. Compreender a noção de Estado em Hegel sob uma perspectiva política,
destacando a liberdade como sua essência e demonstrando como ele se constitui na
realização da vida ética de um povo. Utilizando para tanto principalmente a obra
Filosofia do Direito;
2. Situar o Estado dentro da concepção de Espírito, assim como situar a História
dentro da concepção de Estado, demonstrando que o Espírito se manifesta no Estado
e este se manifesta na História. Utilizando para tanto principalmente as obras Filosofia
do Direito e Filosofia do Espírito;
3. Compreender a noção de História como processo de concretização da
liberdade através da ideia de Estado, destacando o desenvolvimento do Estado como
objetivo fundamental da História. Utilizando para tanto principalmente a obra Filosofia
da História.

56

Вам также может понравиться