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resenha

TEORIA E CULTURA
TEORIA E CULTURA

A razão populista de Ernesto Laclau: uma


crítica agonística

Mayra Goulart da Silva*


Theófilo Codeço Machado Rodrigues**

introdução em 2014 uma proximidade política e de apoio ao


projeto iniciado em seu país por Nestor e Cristina
Populismo. Conceito chave para compreender- Kirchner, em 2003. Casado com a cientista política
mos alguns governos da Europa e da América Latina belga ChantalMouffe, escreveu com ela em 1985 um
no início do século XXI. Mas, seguramente, não sob de seus mais importantes livros, Hegemonia e estraté-
os mesmos termos pelos quais foi apreendido na Rús- gia socialista.
sia dos Narodniki no XIX ou na Argentina de Perón
no XX. Nesse início de século um populismo de novo No texto, a ideia de luta hegemônica e os sujeitos
tipo inspira governos e partidos tão díspares quanto o nela envolvidos são apresentados sem qualquer alu-
Syriza da Grécia e o Podemos da Espanha ou a Bolívia são a conteúdos, identidades ou essências transcen-
de Evo Morales, a Argentina dos Kirchner, a Vene- dentes, sendo compreendidos, portanto, como pro-
zuela de Hugo Chavez e o Equador de Rafael Correa. duto de um contexto histórico e linguístico particular,
Contudo, se os conteúdos dos modelos populistas são efêmero e instável por definição. Nessa dinâmica de
tão diferentes ao longo dos séculos, o mesmo não po- produção de identidades imanentes, o populismo
deria ser dito de suas formas. Pois antes de ser tratado surge como operador particularmente eficiente para
pela dicotomia de uma chave de leitura positiva ou o questionamento do status quo, o que permitiria
negativa, o populismo deve ser visto de forma neu- encará-lo como uma ferramenta contrahegemônica
tra como uma mera forma de construção do político. – entendida como esforço de ruptura com as estru-
Essa é a interpretação do populismo produzida pelo turas políticas comprometidas com um sistema eco-
teórico argentino Ernesto Laclau que vem ganhando nômico global, que se define pela opressão das classes
protagonismo cada vez mais relevante na agenda das populares. Sendo assim, o objetivo deste comentário
ciências sociais, bem como no mundo da política. é atentar para os riscos de tal associação, uma vez que
Não é pouco, portanto, mencionar que o economis- as possíveis conexões - axiológicas, porém não ne-
ta líder do Syriza e ministro das Finanças da Grécia cessárias - entre populismo e cesarismo plebiscitário
Yanis Varoufakis tenha sido seu aluno ou que Íñigo podem drenar o potencial emancipatório dos movi-
Errejón, cientista político e dirigente do Podemos, te- mentos engajados na luta hegemônica.
nha escrito uma tese de doutorado sobre a ascensão
do MAS – Movimiento al Socialismo - na Bolívia refe-
renciada em Laclau.
A Razão Populista: pós-
marxismo, pós-fundacionalismo
Nascido na Buenos Aires de 6 de outubro de 1935 e luta hegemônica
Ernesto Laclau foi certamente um dos mais impor-
tantes teóricos políticos de seu país ao lado de nomes
como Guillermo O´Donnell e AtilioBorón. Consi- A despeito da importância de Hegemonia e Estra-
derado um pós-marxista, Laclau viveu na Inglaterra tégia Socialista, foi com a publicação de On Populist
desde a década de 70 onde foi professor emérito de Reason na Inglaterra em 2005 - recentemente tradu-
teoria política da Universidade de Essex. Apesar da zido para o português em 2013 – que o autor trouxe
distância geográfica, manteve até o fim de sua vida à luz do dia a sua definição melhor acabada sobre o

* Doutora em Ciência Política pelo IESP/UERJ e Professora de Teoria Política e Política Internacional da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro.
E-mail: mayragoulart@gmail.com
** Mestre em Ciência Política pela UFF, Doutorando em Ciências Sociais pela PUC-Rio. Cel: (21) 98276-1315
E-mail: theomachado@gmail.com
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autores, com o passar do tempo a luta de classes ca- históricos populares, argumenta Zizek, haveria cer- ausência originária, torna possível conferir às lutas

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que compreendeu como populismo. Para evitar
surpresas desnecessárias, podemos adiantar a con- minharia para uma polarização clara entre o prole- ta “resignação, a “aceitação do capitalismo como o um sentido e às forças históricas serem dotadas de
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clusão do autor em A Razão Populista. O populismo tariado e a burguesia. Como a história demonstrou, “único jogo possível”, a renúncia a qualquer tentativa plena positividade. Os contextos nos quais o conceito
não tem cor, não tem ideologia e nem uma base social ao contrário da simplificação, a sociedade burguesa real de superar o existente regime capitalista liberal” aparece serão aqueles de uma falta (no sentido ge-
particular. O populismo não é um conteúdo, mas sim complexificou-se em diversas frações sociais. E é jus- (LACLAU, 2013, p. 330-331). ológico) de uma fissura que precisa ser preenchida,
uma forma. É, antes de mais nada, uma forma espe- tamente essa complexificação que interessa a Laclau. de uma contingência que precisa ser superada. Hege-
cífica de construção do político; uma lógica política. Para o autor, não é possível apontar uma ontologia Denúncia que Laclau não só recusa como utiliza monia não será o desdobramento majestoso de uma
Mas como essa lógica política é constituída? Imagi- privilegiada do proletariado ou, em outras palavras, de toda uma seção de seu livro para negar. Pois o su- identidade, mas a resposta para uma crise (LACLAU
nemos uma determinada sociedade. Nesta sociedade indicar a classe trabalhadora como portadora históri- jeito histórico que efetivará a luta anticapitalista não e MOUFFE, 1985, p. 07).
há determinadas demandas que grupos específicos ca da realização da superação da sociedade capitalis- é a priori nenhuma classe específica, seja o proleta-
solicitam às instituições políticas, ao poder estabele- ta. Laclau é oriundo do marxismo na medida em que riado urbano, seja o lumpemproletariado, mas sim o Essa formulação recupera, portanto, a filosofia
cido. Se essas solicitações – que Laclau define como está preocupado com a luta anticapitalista. Contudo, “povo” através da articulação de suas demandas equi- heideggeriana que concebe a existência como sen-
“demandas democráticas” – são atendidas individu- seu pós-marxismo advém de não compreender ape- valentes. do marcada pelo polemos, que, por sua vez, aparece
almente o problema acaba. nas o proletariado como sujeito protagonista desse como instância transhistórica que permite entender o
conflito. Não obstante, para compreendermos o esforço do “ser” como produto de lutas, antíteses ou fricções não
Todavia, se as instituições ignoram essas “deman- autor em atualizar o marxismo expurgando-o de seu amistosas por meio das quais são criados novos ter-
das democráticas” elas começam a se acumular na Em termos práticos, reportando-nos a um exemplo conteúdo metafísico, é preciso levar em conta que, mos. A despeito de sua originalidade, Heidegger não
sociedade passando qualitativamente do nível da so- anterior, não existe motivo pelo qual conflitos que ao assumir a categoria de pós-fundacionalismo para é, todavia, a referência fundamental para os autores
licitação para o da exigência. À tal percepção desse ocorrem nas relações de produção deveriam ser os definir o horizonte epistemológico marcado pela su- aqui estudados, que concentram suas atenções nas
acúmulo de “demandas democráticas” não atendidas pontos privilegiados de uma luta anticapitalista glo- peração da filosofia do sujeito, Laclau e Mouffe pres- contribuições de Carl Schmitt. Incorporando o léxico
que se tornaram exigências Laclau denominará como bal. Um capitalismo global cria inúmeros pontos de supõem a possibilidade de retomar o ideal moderno schmittiano, os autores se veem perante um univer-
“demandas populares”. Essas “demandas populares” ruptura e antagonismo – crises ecológicas, desequilí- de autoafirmação - self-assertion. Tal ideal é, contu- so político inelutavelmente constituído por frontei-
constituem de um lado o “povo” contrapondo-se às brio entre diferentes setores da economia, desempre- do, separado da noção de auto-fundação, na medida ras de antagonismo, no qual apenas os fenômenos
instituições políticas opressoras. Como essas “deman- go em massa etc. -, e somente uma sobredetermina- em que a crença na capacidade da razão humana de de equivalência e diferenciação podem engendrar a
das populares” são heterogêneas, porém equivalentes, ção dessa pluralidade antagônica pode criar sujeitos encontrar fundamentos últimos para a existência é formação de sujeitos políticos, constituídos de modo
ou seja, possuem um mesmo inimigo institucional a anticapitalistas globais capazes de levar adiante uma incompatível com a rejeição de suas bases metafísi- instável, precário e efêmero, através de uma relação
enfrentar, elas precisam de um significante vazio que luta digna desse nome. E, conforme demonstra toda cas, essencialistas e universalizantes. Nesse esforço, é hegemônica.
as unifique. Esse significante vazio cristaliza-se, em experiência histórica, é impossível determinar a prio- formulada uma teoria acerca da formação dos sujei-
geral, na pessoa de um líder. Está pronta a situação ri quem serão os atores hegemônicos nessa luta. Não tos políticos despojada de qualquer essencialismo, na De acordo com esta abordagem, a ideia de equi-
populista: o antagonismo entre as “demandas popu- está claro, de modo algum, que eles serão os trabalha- qual toda identidade se configura sob uma perspec- valência, corresponde a uma simplificação do espaço
lares” do “povo” e a opressão das instituições políticas dores. Tudo o que sabemos é que eles serão aqueles tiva relacional, isto é, através de uma relação de an- político em dois campos antagônicos, cujas diferen-
estabelecidas. que estarão fora do sistema, os excluídos, aqueles a tagonismo. Sob esta perspectiva, a identidade de um ças internas são subsumidas perante à centralidade
quem denominamos os heterogêneos, decisivos no sujeito não lhe é intrínseca, mas depende da relação do que é idêntico (ALVES, 2010, p. 92). Já a ideia de
A consequência é inevitável: a construção de um estabelecimento de uma fronteira antagônica (LA- que ele estabelece com outros termos num sistema de diferença, ao contrário, tenderia a complexificar esse
povo é a condição sine qua non do funcionamento CLAU, 2013, p. 223). diferenças historicamente construído e instável, uma mesmo espaço, ensejando a diversificação de senti-
da democracia. (...) Se acrescentarmos a isso que o vez que, composto por estruturas discursivas (e sujei- dos e o pluralismo das identidades. Da aporia entre
“povo”, conforme vimos, não está essencialmente li- Com efeito, cabe ressaltar que tal leitura não é ori- tos) antagônicas que impedem seu completo fecha- antagonismo – entendido como elemento consti-
gado a qualquer matriz simbólica particular, então ginal no seio do marxismo. Frantz Fanon já apontava mento em uma só totalidade (ALVES, 2010, p. 89). tutivo do processo de formação das identidades – e
teremos abarcado o problema do populismo con- de forma heterodoxa em 1961 em seu clássico Os con- pluralismo – reivindicado como princípio orientador
temporâneo em todas as suas dimensões (LACLAU, denados da terra para o protagonismo do lumpem- O conceito de hegemonia é, então, recuperado destas dinâmicas – o agonismo emerge como filosofia
2013, p. 246). proletariado nas lutas anticoloniais. A originalidade pelos autores, adquirindo feições de atributo inerente compreensiva e normativa.
de Laclau – do ponto de vista do campo do marxismo à formação e transformação das comunidades políti-
Para atingir seu objetivo Laclau recolhe um amplo - está em superar a necessidade organizativa e sim- cas, posto que considerado como solução precária e Sendo assim, o modelo agonístico se define por
e interdisciplinar leque de autores que o auxiliam a plificadora de um único sujeito histórico identificado provisória para uma crise na qual uma parte, que até duas preocupações centrais: a recuperação do polí-
construir as bases de sua teoria. Da filosofia à psica- como uma classe e assinalar a heterogeneidade do então supunha preencher o vazio da totalidade, deixa tico e a tentativa de domesticá-lo. Neste comentário,
nálise vemos o texto passar com facilidade por Freud, campo antagônico que constitui o “povo”. Esse é, ali- de ser capaz de fazê-lo, sendo substituída por outra, tratar-se-á de ambas. Primeiramente, é preciso apre-
Lacan, Zizek, Wittgenstein, Frantz Fanon, Lefort, ás, o nó do debate atual entre Laclau e Zizek. Zizek conforme explicitado em Hegemonia e Estratégia So- sentar os desdobramentos da definição do político
ChantalMouffe e tantos outros. No entanto, a despei- acusa um certo pós-modernismo em Laclau por este cialista: como instância constitutiva do social, na qual são
to das múltiplas influências, o autor pode ser consi- supostamente ter abandonado o tema da luta antica- formadas as identidades dos grupos através de um
derado um pós-marxista. Mas o que isso significa? pitalista e ter apostado na política da identidade mul- O conceito de hegemonia não emerge para processo de condensação de demandas plurais, o que
Lembremos primeiramente do Manifesto Comunista ticultural. definir um tipo novo de relação em sua identidade configura uma dinâmica de representação capaz de
de 1848. A partir de uma rigorosa análise histórica específica, mas para preencher um hiato aberto na gerar coesão em torno de uma substância comum –
da Europa Ocidental pós revolução burguesa, Marx Por detrás da narrativa histórica da crescente de- cadeia da necessidade histórica. Hegemonia irá alu- que, por sua vez, é a pré-condição de qualquer acordo
e Engels previram para um futuro não tão distante sintegração do marxismo essencialista clássico e a dir a uma totalidade ausente e às diversas tentativas em termos de procedimento. Para isso, utilizar-se-á
a simplificação da luta política. De acordo com os emergência de uma pluralidade de novos agentes de recompô-la e rearticulá-la que, ao superar esta do conceito de razão populista, proposto por Ernesto

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Laclau com o propósito de atender ao mesmo ob- dição de uma verdadeira soberania do povo (RO- aqui empreendida, na medida em que evita uma as- expectativas e os valores partilhados pelos seus cida-

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jetivo. Apenas depois de operada essa reconciliação SANVALLON, 2000). sociação precipitada entre populismo e cesarismo. dãos, a democracia não pode ser obtida à custa do
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entre a teoria política e o político, que passa pela acei- Conforme o argumento esboçado neste comentário, liberalismo, nem vice-versa.
tação de sua transcendência coercitiva sobre o social, Schmitt resolve esse problema por meio do con- o populismo não é a melhor ferramenta para a luta
será possível compreender os riscos dessa forma po- ceito de aclamação, que indicaria uma dinâmica hegemônica, mas não porque dê origem a regimes O agonismo, portanto, serve de contraponto im-
pulista de conceber a formação da vontade geral. participativa por meio da qual o povo manifesta sua necessariamente autoritários. Sua incompatibilidade prescindível aos fenômenos populistas, ao enfatizar
aprovação ao líder. Seus atos, quando aclamados, po- advém do caráter elitista da concepção de política e que, a despeito de qualquer antinomia conceitual, li-
Os limites do populismo como deriam ser vistos como expressão da soberania popu- de representação que o estrutura, uma vez que, por beralismo e democracia não podem ser considerados
operador contra-hegemônico lar. Weber, por sua vez, indica que, mais importantes estar demasiado centrada na função do César, torna- como substitutos funcionais, ou como elementos em
do que os mecanismos participativos, seria o respei- -se pouco emancipatória sob a perspectiva do demos. um processo de barganha. As demandas por igualda-
to à liberdade individual e ao pluralismo de valores, de e liberdade, disseminadas pela tradição iluminista
Esteja certo ou errado, o fato é que Laclau tornou- apontados como únicos critérios de legitimidade CONSIDERAÇÕES FINAIS e incorporada pela maioria das sociedades contem-
-se o teórico mais requisitado por políticos e acadê- possíveis em um mundo secular. porâneas só podem ser devidamente atingidas por
micos para explicar as mudanças ocorridas na hora O próprio pós-fundamentalismo, enquanto epis- regimes que ensejem uma articulação entre estes dois
presente. E isso não é pouca coisa. No entanto, ao Laclau, entretanto, critica essa associação necessá- temologia impermeável a princípios transcendentes, componentes. Se há alguma liberdade dos modernos
assumir feições reconstrutivas o populismo, como ria entre individualismo e pluralismo, embora acre- traz consigo alguns inconvenientes. Pois, se o ato de esta se refere a lutas teóricas e políticas que articulam
qualquer movimento transformador, sempre pres- dite que a simples manifestação da soberania popular representação constitui simultaneamente represen- as demandas por soberania popular e direitos indi-
supõe um momento de instabilidade. Assim como o também não seja um critério suficiente, por descon- tantes e representados, não havendo uma essência viduais.
carisma, a razão populista não se situa no plano da siderar a articulação histórica entre as tradições de- coletiva ou vontade geral que o transcenda, torna-se
racionalidade, mas na esfera da vontade. Ao atuali- mocrática e liberal, sedimentada ao longo dos séculos mais difícil subordiná-lo a qualquer ideia de respon- Não obstante, reconhecendo uma tendência ao
zar os elos entre a dimensão fático-institucional e o XVII, XVIII, XIX e XX. De acordo com esta hipótese sabilidade alheia aos seus ditames, visto que não fica encapsulamento dos indivíduos em suas vidas priva-
plano ético/valorativo, renovando suas pretensões – que encontra pontos de contato com a formulação claro a quais vontades ou interesses os representantes das, o agonismo incorpora a bandeira dos modelos
de legitimidade o populismo, enquanto movimento apresentada por Rosanvallon em Le peupleintrouva- devem ser responsivos e que tipo de controle o demos deliberativo e participacionista de democracia, consi-
carismático, cumpre o papel de reverter - ainda que ble: histoire de la représentation démocratiqueen Fran- deve exercer sobre eles. Ou, em outros termos, dife- derando que instituição de espaços políticos e sociais
por pouco tempo - a tendência rotinizante que afeta ce (2002) – do processo de modernização decorre rentemente das noções de razão e emancipação, que de deliberação e participação podem ajudar a estimu-
todo ordenamento jurídico-político, reconectando-o uma transformação fundamental da estrutura das servem como horizonte normativo da luta hegemô- lar o interesse pela respublica. Por este motivo, a par-
as suas bases ético-morais. sociedades, que além de demograficamente superio- nica gramsciana, a razão populista não opera a partir tir da ênfase na deliberação e na participação como
res teriam se tornado mais complexas e plurais. Neste de critérios valorativos de legitimidade para além do práticas sociais a serem associadas a instituições e
É em virtude desses atributos que o populismo novo contexto tornou-se impossível pensar no povo ato de representação particular entre os líderes e seus valores liberais - como o Parlamento, a divisão entre
surge como operador plausível para a luta contrahe- como agente unitário capaz de se expressar sobera- seguidores. Diante disto, agrava-se o risco de que, Estado e Igreja, Estado e Sociedade Civil, à garantia
gemônica pela transformação nas estruturas de po- namente de modo inequívoco, já que composto de por pressupor uma identidade substantiva com o de- das liberdades individuais e etc-, o agonismo torna-
der que perpetuam a opressão das classes populares. inúmeros grupos com interesses e vontades contra- mos, o César dele se desvincule, agindo em seu nome -se uma alternativa para compensar os malefícios da
O objetivo deste artigo, contudo, é demonstrar, a par- ditórios. como bem entender. liderança e o risco do populismo, uma vez que retira
tir de um esforço conceitual, os inconvenientes dessa dos líderes a possibilidade de apresentarem-se como
opção, haja vista outras características do conceito A homogeneidade, no entanto, também é aceita Em contraste com os princípios que orientam o representantes da totalidade. Deste modo, respon-
que lhe atribuem uma deriva cesarista. Tais atributos, como componente necessário à ideia de representa- entendimento liberal acerca dos mecanismos repre- dendo ao questionamento levantado ao longo do tex-
por sua vez, advém do arcabouço teórico que o estru- ção apresentada por Laclau, embora ela seja mitigada sentativos, que sublinham a pluralidade de opiniões e to, ao incorporar propostas institucionais que visam
tura, mais precisamente, da teoria elitista da repre- pela consideração de sua precariedade e do hiato en- a proteção das minorias, o entendimento laclauniano evitar a degeneração de fenômenos populistas em
sentação, delineada por Thomas Hobbes e atualizada tre representantes e representados, que atribui a todo tende a realçar a homogeneidade e as maiorias. Dian- regimes bonapartistas, democracias plebiscitárias ou
em Max Weber e Carl Schmitt. ato de identificação um caráter incompleto. Para o te disto, destacam-se dois problemas centrais: (1) o ditaduras cesaristas, o modelo agonista se apresenta
autor, o processo de complexificação não ocorre ape- que fazer com as parcelas da população que não par- como um paradigma mais adequado aos movimen-
A conceitualização schmittiana ressalta a dimen- nas dentro da sociedade, mas, também, dos próprios tilham da mesma identidade dos grupos majoritários tos contra-hegemônicos que contemplem um ideal
são da homogeneidade, apresentando-a como um indivíduos, que por serem compostos de inúmeras ?; (2) quais os limites dessa identificação majoritária, emancipatório, no qual a soberania do povo não seja
desdobramento normativo de um corolário realis- dimensões valorativas deixam de ser capazes de se tendo em vista o caráter multifacetado dos indivídu- obtida às custas de suas liberdades individuais ou da
ta, isto é, do pressuposto de que, na modernidade, a identificar por completo com qualquer coisa ou pes- os e grupos sociais ? opressão de minorias.
representação, enquanto momento de identificação soa. Toda forma de identificação torna-se parcial e
entre governantes e governados, é um componente temporária, por isso, é necessário atrelar a legitimi- Na tensão entre a regra da maioria – enquanto REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
inextrincável aos sistemas políticos, que não mais dade dos representantes a algo mais do que sua ca- princípio que alimenta as pretensões de legitimidade
podem recorrer a fundamentos transcendentes de le- pacidade de identificação para com os representados. democrática – e o pluralismo – como elemento ine- ALVES, Ana Rodrigues C. O conceito de Hegemonia:
gitimidade. Nessa chave, a política seria simplificada rente a qualquer processo decisório em sociedades de Gramsci a Laclau e Mouffe. In: Lua Nova, São Pau-
em uma relação face-a-face entre um povo unifica- É preciso reconhecer, contudo, o esforço de La- modernas – reside o principal obstáculo à sobrevida lo, 80: p. 71-96, 2010.
do e seu chefe, excluindo todas as outras formas de clau em afirmar que, sob uma perspectiva norma- do ideal democrático em um contexto tão diferente
organização e expressão legítimas, conflagrando um tiva, a aclamação da maioria não é suficiente para daquele que o originou. Pois, conforme salientado, LACLAU, Ernesto. A razão populista. São Paulo: Três
tipo de ‘democracia iliberal’, no qual as restrições de conceder legitimidade a um ordenamento político, por Chantal Mouffe, em Deliberative Democracyor Estrelas, 2013.
certas liberdades públicas são teorizadas como con- sendo este um ponto central para a argumentação Agonistic Pluralism (2000), se levarmos em conta as

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