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A ristoteles Ga neeinaan ie asrolte oy: LIVROIII Capitulo I : Para os estudiosos da natureza do governo, do que é cada uma de suas 1275 a formas e de quantas sao elas, a primeirs. pergunta a fazer se refere a cidade: que é uma cidade? "Ate hoje esta € ama questi controvertida; iS ‘pessoas dizém que a cidade pratica uri ato, outras que nao é a cidade, mas a oligarquia ou 4 tirania no poder; vemos que a atividade do estadista e do desislador_sem_por objeto a cidade, e uma constituicéo € a forma de Crganizacao dos ‘habitantes de uma cidade. Mies a cidade é um complexo, “ho mesmo sentido de quaisquer Outras coisas que sio um todo mas se compéem de muitas partes;.€ claro, portanto, que devemos primeiro investigar a natureza do cidadio, pois uma cidade é uma multidio de cidadaos, e portanto se deve perguntar quem tem direito ao titulo de cidadio, e qual é essencialmente a natureza do cidadao. Ha opinides diferentes quanto a isto, pois nem todos concordam com que o cidadao seja sempre o mesmo, e freqiientemente alguém que seria cidad3o numa democracia no é cidadao numa oligarquia. Nao devemos levar em consideracéo aqui aqueles que adquirem a cidadania de alguma maneira excepcional — por exemplo, os cidadaos por adocao. A .cidadania nao resulta do fato de’ alguém ter 0 domicilio em certo lugar, pois os estrangeiros residences € os escravos também so domiciliados naquele lugar, nem sao cidadaos todos aqueles que participam de um mesmo sistema judiciario, assecuratério do direito de defender-se em uma acao € de levar alguém aos tribunais (este dircito cabe também as partes engajadas em um contrato comercial, que também podem acionar e ser acionadas nos tribunais); na verdade, ém muitos lugares mesmo este direito de acao apoiado nas leis nao € totalmente extensivo aos residences estrangeiros, que sio obrigados a apresentar ui cidadio responsavel por cles, de tal forma que eles somente participam deste privilégio de maneira incompleta; estes sio cidaddos somente no sentido em que aplicamos 0 termo a criancas ainda muito novas para serem arroladas como cidadaos € aos anciaos ja isentos dos deveres civicos, pois nao os chamamos cidadaos de mancira absoluta, mas com a qualificacio de‘os primeiros ainda nao 1275 b terem idade ¢ de os Ultimos ja serem idosos demais, ou alguma expressio equivalence (isto nao faz diferenca, porque o sentide é claro). Queremos definir um cidad@o no sentido absoluto, como alguém que nao tenha desqualificacdes desta natureza, que imporiam uma qualificacao corretiva, pois dificuldades deste género podem também ser levantadas e superadas a propésito de-cidadaos cujos direitos foram cassados ou que foram exilados. Um cidadao integral pode ser definido por nada mais nem nada menos que pelo direito de administrar justica e exercer funcdes publicas; algumas destas, todavia, so limitadas quanto ao tempo de exercicio, de tal modo que nao podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela mesma pessoa, ou somente podem sé-lo depois de certos intervalos de tempo pré-fixados; para outros encargos nao ha limitagdes de tempo no exercicio de fungées publicas (por exemplo, os jurados e os membros da assembléia popular). Talvez se possa dizer que estas pessoas nao ‘sio funcionarios de modo algum, e que suas fungdes nio Ihes dao participacio No governo, mas certamente seria ridiculo negar a autoridade de quem exerce 0 poder supremo. Isto, porém, ito faz qualquer diferenca, pois se trata de uma questéo puramente semintica, por nfo haver denominacao comum ao jurado e ao membro da assembléia popular, susceptivel de ser aplicada com propriedade a ambos. Para efeito de distincdo, portanto, chamemos as duas funcées de cargos sem limitacdes. Conseqiientemente, dizemos que sao cidadaos aqueles que podem exercer tais fungdes publicas. Esta.é de um modo geral a definicao de cidadao mais adequada a todos aqueles que geralmente sio chamados cidadaos. Nao se deve esquecer, outrossim, que coisas cujos principios subjacentes diferem especificamente, sendo um deles o primeiro, outro 0 segundo e outro 0 terceiro, nada ou quase nada tém em comum que seja digno de mencéo, quando consideradas nesta relacao. Com efeito, vemos que as constitu c6es diferem uma das outras em espécie, e que umas so posteriores e outras anteriores, porquanto formas erréneas € divergentes sao necessaria- mente posteriores as formas certas (depois parecera mais claro 0 sentido em que aplicamos 0 termo “divergente”-a constitui¢des").Entao 0 cidadao seré necessariamente diferente sob cada forma de constituicéo, e portanto a definicfo de cidadéo que ja demos aplica-se especificamente a cidadania em uma democracia; ela pode ser boa sob outras formas de governo, mas no nesessariamente. De fato, em algumas cidades 0 povo nao é »reconhecido como parte constitutiva das mesmas, ¢ nelas nao ha assem- bléias populares regulares, mas assembléias extraordindrias, com partici- pantes selecionados, e as aces judiciais sao distribuidas por grupos entre juizes diferentes — na Lacedeménia, por exemplo, as acdes por inadim- pléncia contratual so julgadas pelos éforos, que as distribuem entre si mesmos, enquanto os casos de homicidio sao julgados pelos ancidos, e outras aces sao julgadas por outros magistrados; este método nao é seguido em Cartago, onde certos magistrados julgam todas as causas. Mas nossa definicao de cidadao ainda comporta uma cotrecao, pois sob as outtas formas de constituicao um membro da assembléia ou de um 1276 a tribunal de jurados ‘nfo é um funcionério sem restrigdes, mas um funcionario definido de acordo com suas atribuigdes. Todos eles, ou alguns deles, recebem encargos deliberativos e judiciais relativos a todas as matérias ou a algumas delas: Entio, 0 que € um cidadao passa a ser claro depois destas consideracées; afirmamos agora que aquele que tem o direito de participer da funcao deliberativa ou da judicial € um cidadao da comunidade na qual ele tem este direito, e esta comunidade — uma cidade — € uma multidio de. pessoas suficientemente numerosa para assegurar uma vida independente na mesma, Na prética, porém, a cidadania é limitada 20 filho de cidadaos pelo lado do pai'e pelo lado di mae, e nfo por um lado s6, como no caso do filho apenas de pai cidadao ou apenas de mae cidada; outras pessoas fazem esta exigéncia retroagir ainda mais,.a segunda ou a terceira geracao precedente, ou até a geracdes mais recuadas. Julgando esta definicao apenas politica e apressada, algumas pessoas fazem a seguinte pergunta: como este antepassado da terceira ou quarta geracio chegou a ser cidadao? © leontino Gérgias''', em parte por perplexidade em parte por ironia, disse que pildes sao os objetos feitos pelos artifices de pildes, e os cidadaos de Larissa!" so feitos pelos governantes'”. Trata-se, todavia, de uma questio simples, pois se tais antepassados gozavam do direito de cidadania na forma expressa em nossa definicao de cidadio, eles eram cidadaos, pois obviamente impossivel aplitar a qualificag’o baseada no fato. de descender de um cidadao ou de uma cidada aos primeiros colonos ou 20s fundadores de uma cidade Surge uma dificuldade maior no caso-daqueles aos quais é concedida a cidadania em seguida a uma revolucdo — por exemplo, a investidura de cidadaos efetuada por Clistenes'”” em Atenas, apés a expulsio dos tiranos, quando ele arrolou nas tribos atenienses muitos estrangeiros residentes, tanto imigrantes quanto escravos. A diivida nestes casos nio é quanto a propria cidadania, mas se os. investidos nela a receberam legitima ou ilegitimamente. Também a este respeito se pode levantar uma nova diavida: se um homem é um cidadao ilegitimamente, seria ele verdadeira- mente um cidadao? Na verdade, “ilegitimamente" significa “erradamen- te”. As vezes vemos governando erradamente autoridades a respeito das quais nao poderiamos negar que elas governam, mas poderiamos dizer que nao governam legitimamente, € um.cidadao é definido por certa fungao de governo (um cidadao, como dissemos, é uma pessoa que participa de tais ‘ou tais fungdes); €. claro, portanto,. que mesmo homens admitidos ilegitimamente & cidadania devem ser tidos como cidadaos,.embora a diivida quanto. 4 legitimidade ou ilegitimidade de sua admissao se interligue com a pergunta feita anteriormente". Algumas pessoas perguntam: em que circunstincias uma ocorréncia é ato da cidade,-ou no €? Por‘exemplo, quando o governo se transforma de oligarquia ou tirania 1276b em democracia. Em tais circunstncias algumas pessoas pretendem que o novo governo nao deve honrar os compromissos nem cumprir outras obrigacdes semelhantes contraidas pelo governo anterior, sob a alegaczo de que aqueles ¢ estas nao foram assumidas pela cidade, ¢ sim pelo tirano, pois algumas formas de governo teem seus fundamentos na forca e nao visam ao bem comum. Se, portanto, algumas democracias sao igualmente governadas desta maneira, os atos das autoridades s6 podem ser chamados de atos da cidade no mesmo sentido em que se diz que os atos oficiais. emanados.de uma oligarquia ou de uma tirania também o sao. Parece ter afinidades com esta controvérsia a pergunta: haseados em que principios podemos afirmar que uma cidade é a mesma que era, Ou niio € mais a mesma, € sim ourra? O modo mais inequivoco de examinar esta dificuldade é ter em vista seu territério € sua populacao; 0 territério e a populagio podem ter sido divididos, @ alguns habitantes podem ter-se estabelecido em um local, e outros em outro; desta forma a questio pode ter uma solucao facil, pois como a palavra “cidade” tem varias acepcoes '", © problema posto desta maneira nao é tao dificil de resolver. Mas pode-se perguntar igualmente: quando se deve considerar que homens agrupados, vivendo num mesmo lugar, constituem uma cidade una? Obviamente sua unidade nao depende de muralhas, pois seria possivel elevar uma muralha em torno do Peloponeso inteiro; talvez seja 0 caso da Babildnia, ¢ de qualquer outra cidade cujo perimetro é 0 de uma nacao, mais que o de uma cidade; com efeito, dizem que por ocasiio da captura da Babilénia uma parte considerdvel da cidade s6 tomou conhecimento do fato dias depois. De qualquer forma, o exame desta dificuldade sera uri] em outra ocasiao (os estadistas nfo devem ignorar questdes como o tamanho mais conveniente para uma cidade, ou a conveniéncia de sua populacao ser constituida de uma sé raca ou de diversas). Dever-se* dizer, entéo, que uma cidade onde a mesma populacao vive no mesmo lugar é a mesma cidade enquanto a populacao for da mesma raca, apesar de sempre haver alguém morrendo e alguém ndscendo, da mesma forma que costumamos dizer que um'rio é sempre o mesmo ou uma fonte é sempre a mesma, embora um novo fluxo de agua esteja sempre entrando nele ou nela outro esteja saindo dele oui dela? Ou dever-se-a dizer que, apesar de os habitantes serem os mesmos por uma identidade baseada na continuidade, a cidade € ourra? Ja que uma cidade é uma espécie de comunidade, e de fato é uma comunidade de cidadaos sob‘um mesmo governo, se a forma de governo foi alterada e é diferente parece ocorrer que a cidade ja nao é a mesma, assim como dizemos que um coro que em certa ocasiao atua em uma comédia € em outra atua numa tragédia é um coro diferente, embora ele seja composto pelas mesmas pessoas; dizemos igualmente de qualquer outro conjunto homogéneo ou composicao de elementos que eles sio diferentes se a forma de sua estrutura é diferente — por exemplo, diz-se gue uma harmonia musical composta das mesmas notas € uma harmonia diferente se em certe ocasiao ela é tocada no tom dério e em outra no tom frigio, Entdo, se for assim deveremos obviamente dizer que uma cidade é a mesma principalmente por causa de sua constituicéo, ¢ ela pode’ ser designada, ou nfo, pelo mesmo nome, quer seus habitantes sejam os mesmos homens ou sejam inteiramente diferentes. Quanto a dacidir se é justo que uma cidade deva ow no deva honrar seus compromissos depois de adotar outra ‘constitui¢io, isto € outra questio. Se Capitulo II Depois do que acabamos de dizer, devemos perguntar se é possivel 1277 a afirmar: que as qualidades dé um homem bom sao as mesmas de um bom cidadio, ou no sio as mesmas“”. Se este ponto merece uma investigacao; temos primeiro de determinar, pelo menos em linhas gerais, o que vem a ser a exceléncia de um cidadio. Digamos que o cidadio, como o marinheiro, é de certo modo um parcéiro numa comunidade; embora cada marinheiro tenha funcées diferentes (um € remador, outro é timoneiro, outro é vigia de proa e outros tém igualmente outras designacdes especiais), e portanto a definicio mais exata de sua exceléncia deva ser claramente especifica de cada um, tera de haver uma definicio de exceléncia igualmente aplicavel a todos eles. De fato, @ seguranca da navegagao é a preocupacao de todos eles, porquanto este é o objetivo de cada marinheiro. Da mesma forma, um cidadao difere do outro,.mas a preocupacao de todos é a seguranca de sua comunidade; esta comunidade é estabelecida gracas & constituicio, e conseqiientemente a bondade de um cidadio deve relacionar-se necessariamente com a constituicdo da cidade & qual ele pertence. Se ha, entio, varias formas de constituigao, é claro que nao pode haver uma s6 exceléncia, que seja a boniade perfeita de um bom cidadio; 20 falar em um homem bom queremos dizer que ele possui uma bondade tinica, a bondade perfeita, mas é obviamente possivel sef um bom. cidad’o sem possuir a bondade caracteristica de um homem bom. Também é possivel tratar do mesmo assunto colocando a questao de outra maneira, em relagio & melhor forma de constituicao. Se € impossivel que uma cidade seja inteiramente composta de homens bons, ¢ se cada pessoa deve necessariamente.executar bem a tarefa inerente & sua funcao (isto s6 é possivel gracas a exceléncia de cada um), a bondade de um bom cidadio no seria a mesma bondade de um homem bom; realmente, todos devem possuir a bondade do bom cidadio (esta é-a condigao indispensavel para que uma cidade seja a melhor possivel), mas.é impossivel que todos possuam a bondade de um homem bom, se nao é necessario que todos os cidadaos sejam homens bons em uma cidade boa. E uma vez que a cidade € constituida de pessoas dissimilares — da mesma forma que um ser vivo é composto antes de mais nada de corpo e alma, e uma alma é composta de razio e volicio, e uma familia de marido e mulher, e propriedade de senhor e escravo, de igual maneira uma cidade se compde de todas estas pessoas, € também de outros elementos dissimilares além destes — segue. se nécessariamente que.a bondade de todos os cidadaos nao é uma sé, do mesmo modo que entre os coreutas as qualidades do corifeu nfo s40 as mesmas do coreuta que esté a seu lado. Estas consideragdes demonstram que a bondade de um bom cidadao e a de um homem bom no sio geralmente a mesma bondade; nfo havera casos, entio, em que as qualidades do bom cidado.e as qualidades do homem bom coincidam? Responderemos a isto dizendo que um bom governante é um homem bom € sensato, e que um cidadao atuante na politica deve ser sensato. Algumas pessoas afirmam que a prépria educacao do governante deve ser diferente: vemos realmente que os filhos dos reis aprendem equitacio e exercicios militares, e como diz Euripides": “Nao quero sutilezas; basta o que a cidade pede”, como se houvesse uma’ educacéo especial para o governante Se as qualidades de'um governante sao as mesmas de um homem bom, € se 0 governado é também um cidadio, as qualidades do cidadao e as do homem nao podem ser as mesmas de um modo geral, embora em algum’ caso particular possam sé-lo, Foi a intuicao dessa diferenca que levou Ison a dizer que ele se sentia famint6 quando nio exercia a tirania, querendo exprimir com estas palavras que ele nfo sabia viver como um simples particular. Por outro lado,. costumamos elogiar 0s homens que tanto sabem mandar quanto obedecer, € parece que a exceléncia do cidadao consiste em ser capaz de mandar e obedecer igualmente bem. Se admitirmos, entéo, que as qualidades do homem bom se revelam quando ele manda, enquanto as do cidadao se mostram tanto ne posigio de mando quanto na de obediéncia,. parece que os dois nio merecem os mesmos elogios, Como as vezes se pensa que os que mandam e os que obedecem devem aprender coisas diferentes, é no as mesmas, enquanto o cidadao deve conhecer ambas as artes e partilhar ambas as posicdes, a inferéncia é Obvia, € pode ser apreendida mediante a seguinte explanacio: uma forma de autoridade é a do senhor; a parte desta autoridade relacionada com as tarefas domésticas triviais nao exige que o senhor saiba executé-las, e sim que saiba mandar que outros as execurém; a outra capacidade (com “outra capacidade” quero dizer a capacidade de executar tais tarefas) é qualidade de escravo. Dizemos que ha varias espécies de escravos, pois eles tem varias ocupacSes; parte delas cabe aos trabalhadores manuais que, como seu nome indica, séo pessoas que vivem da habilidade de suas maos, uma classe que inclui os artifices mecanicos. Por isto em algumas cidades os operérios antigamente nfo tinham acesso as fungdes de governo, € 56 conquistaram este direito quando se chegou a uma democracia extremada, 1277 b Nao € portanto adequado 20 homem bom, ao homem apto para a ° cidadania, ou 20 bom cidadao, aprender as tarefas daqueles que estio sujeitos a este tipo de autoridade, exceto para seu prOprio uso esporadica- mente, pois entao jé nfo ocorre o caso de uma parte ser o senhor e de outra ser o escravo. Existe, porém, uma forma de autoridade pela qual um homem governa pessoas da mesina raca, e homens livres (assim definimos a autoridade politica), e o futuro governante aprende esta forma enquanto é governado, assim como um homem s6 deve comandar a cavalaria depois de haver sido comandado por um comandante de cavalatia, e sé deve comandar tropas de infantaria depois de haver servido sob um comandante de infantaria’ e-haver comandando um regimento e uma companhia de. infantaria. Fala muito bem, portanto, quem diz que é impossvel comandar bem sem haver sido comandado. As qualidades de um governante e as de um governando sio diferentes, mas o bom cidadao deve ter os conhec mentos e a capacidade indispensaveis tanto para ser governado quanto para governar, e o mérico de um bom cidadao esta em conhecer 0 governo de homens livres sob os dois aspéctos, Conseqiientemente, ambas as qualidades sao caracteristicas de um homem bom, mesmo que a modera- Gao a justiga em um governante sejam de.uma espécie diferente da moderacio e da justica em um governado; com efeito, as qualidades de um homem bom — seu sentimento de justica, por exemplo — nao séo as mesmas quando ele esta sendo goverriado e quando ele é livre; elas serao de espécies diferentes, umas qualificando-o para ser governado as outras para governar, da mesma. forma que a moderagdo e @ coragem. si0 diferentes num homem e numa mulher (um homem seria considerado covarde se apenas tivesse a coragem de uma mulher corajosa, e uma mulher seria tida como tagarela se fosse apenas tio comedida quanto um homein bom, pois as proprias funcdes familiares de um homem e de uma mulher sio diferentes, j@ que 0 dever do primeiro € adquirir e 0 da segunda € preservar. © discernimento € a tinica qualidade especifica de um governante, pois as outras qualidades geralmente parecem necessérias aos governados € aos governantes; a sinceridade de opiniao, e nao o discernimento, é a qualidade distintiva do governado; o governado corresponde ao fabricante de flautas € 0 governante ao flautista que as utiliza Estas consideracdes respondem &s perguntas: as qualidades de um homem bom sao as mesmas de um bom cidadao, ou sao diferentes? Até que ponto elas sio as mesmas e em que ponto elas diferem? Capitulo IIL Ainda resta uma das dificuldades levantadas quanto as qualidades que 1278 a fazem_um cidadio: os cidadaos legitimos s40 0s tinicos que devem participar.do governo, ou os artifices também devem ser considerados cidadaos para este fim? Se os homens que nfo ocupam fungdes de governo também devem ser considerados cidadaos, nao € mais possivel que as: qualidades de todos os .cidadaos sejam as mesmas; pois os artifices se tornam cidadaos. Se, por outro lado, nenhum dos artifices € cidadao, em que classe eles serao postos, j4 quernaio-sio-estrangeitos residentes nem /estrangeiros propriamente ditos? Ol poderemos dizer que esta objecio—, no implica em incoeréncia jé que nem os escravos nem 05 libertos esto incluidos nas classes mencionadas?-Com efeito, € verdade que nem todas Tas pessoas indispensaveis & existéncia de uma cidade. devem set contadas entre os cidadios, porquanto os préprios filhos dos cidadaos nao sio cidadios no mesmo sentido que os adultos: estes séo cidados de maneira absoluta, enquanto aqueles sio cidadaos presuntivos (sio.cidadaos, mas incompletos).9De fato, antigamente a classe -dos-artifices-em-algumas cidades era constituida de escravos ou estrangeiros (por isto a grande maioria dos artifices ainda tem esta origem); logo, @ melhor-forma de, cidade nao devera admitir os artifices entre os cidadaos; se forem admitidos, nossa definicéo das qualidades do cidadao nao 'se aplicard a cada cidadao nem a cada homem livre como tal, mas somente aqueles isentos das atividades servis. Nas atividades servis, aqueles que prestam seus ) servigos a um individuo sao esceavas, € os que os prestam & comunidade | sdo artifices ou assalariados,/Estas.refl€x665 ui pouco mais desenvolv'das fOrnario mais clara a pOsitao destas classes (na realidade, 0 que jé foi cito, se bem entendido, esclarece suficientemente 0 assunto). Uma vez que ha numerosas formas de constituicéo, conseqiientemente ha diversas espécies de cidadaos, principalmente dos cidadaos em posicao submissa; logo, sob algumas formas de constituicao a cidadania teré de ser estendida ao artifice e a0 assalariado, enquanto sob outras formas isto é impossivel — por exemplo, em qualquer ‘constituicao do tipo chamado aristocratico, nas Se 1278 b quais as honrarias séo conferidas de acordo com as qualidades e'0 mérito Porquanto uma pessoa vivendo uma vida de artifice ou.de trabalhador assalariado nao pode aprimorar suas qualidades. Nas oligarquias, por outro lado, embora um assalariado nao possa ser cidadao (a admissio as fungdes de‘ governo nos. varios escalées € condicionada 20 vulto das riquezas possuidas), um artifice pode, pois a maioria dos artifices é rica, Em Tebas havia uma lei segundo a qual somente quem estivesse afastado do comércio no minimo por dez anos poderia assumir funcdes de governo, ‘mas sob varias formas de constituicao a lei eleva & condicao de cidadios até estrangeiros; em algumas democracias 0 filho de mae cidada é cidadio, ¢ 2 mesma regra se aplica aos filhos ilegitimos em muitas cidades; como, porém, estas pessoas somente ascendem a cidadania em decorréncia da falta de cidadaos legitimos (recorre-se a leis deste tipo apenas para fazer face a eventuais decréscimos de populacio), logo que uma cidade se vé em melhor situasio em termos de habitantes passa a privar' da cidadania Primeiro os filhos de pai ou mae escravos, depois 0s filhos apenas de maes ‘cidadas, ¢ finalmente restringem a cidadania apenas a cidadaos por ambos 0 lados. Mais Tatos demonstram que ha varias espécies de cidadios, € que cidadao em sentido absoluto € 0 homem que partilha os privilégios da cidade, como esta implicito’em Homero!? “. Como algum imigeante desonrado”, pois quem € excluido dos privilégios da cidade é como um estrangeiro domiciliado na mesma. Em cértas cidades, todavia, esta exclusio é dissimulada, com 0 objetivo. de permitir que as classes privilegiadas enganem os seus habitantes. O que vem de ser dito responde claramente & Pergunia: as qualidades de ‘um homem bom sio as mesmas do bom cidadao, ou sio diferentes? Em algumas cidades elas si0 as mesmas, mas em outras sao diferentes, também no primeiro caso nfo € qualquer cidadao que € um homem essencialmente bom, mas somente o estadista ‘que detém ou pode deter a conducio dos assuntos piblicos, por si mesmo } 0u Conjuntamente ‘com outros. Le L Cidads., oy nla AAT : ama \ } Apés a definic&o destes pontos, a préxima questao a ie examinada ed se devemos considerar que ha somente uma forma de tonstituicéo ou varias, ¢ se varias, quais séo elas, e quantas, ¢ quais sao, as diferencas entre elas. Uma constituicio é 0 ordenamento de uma cidade quanto as suas diversas fungdes de governo, principalmente a fungao mais importante de todas. O governo em toda parte detém o poder soberano sobre a cidade, e a constitui¢ao € o governo. Quero dizer que em cidades democraticas, por exemplo, 0 povo é soberano, mas nas oligarquins, ao contrario, uns poucos © sio, e. dizemos que elas tém uma constituicio diferente. Usaremos a mesma linguagem a propésito de outras form s.de governo: Devemos determinar primeiro os pontos fundamentais, ou seja, qual é 0 objetivo da existéncia da cidade, e quantas sao as espécies diferentes de sistemas para governar os homens e as comunidades em que eles vivem. Jé dissemos em. nossa primeira exposicéo”, (na~qual”estabelecemos 2 P Principios Felativos 8 economia domiéscicae a posicdo do senhor relacio'aos escravos, que o homem é por naturéza um animal social; po! { lo Rca RE OS HOMIHS HHS nevetem de aeistGncia ‘miuitaa, ainda assim eles desejam viver juntos. AO mesmo tempo eles 840 Tevados2'| Feunli-se por terem interesses cOmuns, na medida em que cada um deles | pode participar de uma vida melhor/E este, ent%o, 0 principal objetivo de “folos'€ de cada uim et Sepatado na vida comuaitiria, mas 0: bomens também se retinem e mantém a comunidade politica apenas para viver, ‘pois hé certamente algo de bom no simples fato de estar vivo, desde que a vida nao seja sobrecarregada de males penosos demais para ser suportados (é evidente que os homens em sua imensa maioriase apegam & vida ainda que tenham de enfrentar muitos inforténios, como se ela contivesse em si mesma um certo encanto e docura inerentes 3, sua propria natureza). Os varios’ tipos de governo sao facilmente definiveis, e j& os examinamos com freqiiéncia em nossas obras para o publico’. A autoridade do senhor sobre o escravo, embora na vetdade o interesses do Capitulo IV 11.” Bor, 1279.2 senhor € do escravo sejam comuns quando ambos sio adequados pela natureza a suas respectivas posic6es, é exercida principalmente com vistas ao interesse do senhor, mas acidentalmente € exercida com vistas 40 interesse do escravo, pois se o escravo perecer a autoridade do senhor nio sobrevivera, S a A autoridade do senhor sobre as criancas e a mulher e sobre toda a” ~/f casa, que denominamos a arte da economia doméstica, é exercida no interesse dos que obedecem, ou no interesse comum a ambas as partes — essencialmente no interesse dos que obedecem, como acontece com outras artes (a medicina e os exercicios atléticos, por exemplo), praticados ‘ng -interesse das pessoas sobre as quais elas atuam, embora também ‘obsan cideaunicareserexercdes cxlavecoee desea tere ee nada impede o treinador de ser as vezes uma das pessoas que se exercitam, da mesma forma que o timoneiro é sempre um membro da tripulacao. entio, embora o treinador e o piloto tenham em vista o bem daqueles que ditigem; eles participam acidentalmente dos beneficios, quando se in. cluem entre 0s outros, porquanto o timoneito é um marinheito em sua nau, e 0 treinador pode tornar-se uma das pessoas que treinam sob sua direcao. Conseqiientemente, também a respeito do poder politico quando {/. 0 governo € constituido segundo o principio da igualdade e da equivalén. cia entre.os cidadaos, estes pleiteiam o exercicio alternado das fungdes ‘{_governamentais. Antigamente, como € natural, todos se alternavam no exercicio de tais fung6es, e alguém olhava pelos interesses de quem estivesse exercendo as funcdes, da mesma forma que o outro, enquanto exercia a fungio, olhava pelos interesses dos demais; hoje, porém, as (Pessoasquerem ocupar permanentemente os cargos, por causa das vantagens que podem obter com as rendas publicas e com 0 exercicio das fungdes, como se a permanéncia no poder desse satide aos funcionérios, antes doentes crdnicos (se assim fosse, eles teriam razdes para pleitear avidamente os cargos). E dbvio, entio, que as constituicgées cujo objetivo é o bem comum'séo [@orretamente estruturadas, de conformidade com os principios essenciais J” da justica, enquanto as que visam apenas ao bem dos préprios governantes , sio todas defeituosese constituent dents 8 como ee fato, elas passam a ser despéticas, enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens livres} Estabelecidos estes pontos, resta-nos examinar a questao do nimero de constituicGes existentes e quais sio elas; deveremos estudar primeiro as formas corretas de constituicio, pois os desvios também aparecerao claramente quando estas forem definidas, Capitulo “‘V ‘Una vez que constituicao significa 0 mesmo que governo, e 0 governo € 0 poder supremo em uma cidade, e o mando pode estar nas mios de uma inica pessoa, ou de poucas pessoas, oud maioria, nos casos em que esta inica pessoa, ou as poucas pessoas, ou amaioria, governam tendo em vista o bem comum, estas constituicbes devem ser forcosamente as corretas; 20 conttério, constituem desvios os casos em que o governo é exercido com vistas ao prOprio interesse da tinica pessoa, ou das poucas pessoas, ou da maioria, pois ou se deve dizer que os cidadaos nao participam do governo da cidade, ou é necessario que eles realmente participem. Costumamos chamar de reino uma monarquia cujo objetivo é o bem comum; 0. governo de mais dé uma pessoa, mas somente poucas, chamamos de aristocracia, porque’ governam os melhores homens ou porque estes governam com vistas ao que é melhor para a cidade seus habitantes; e quando a maioria governa a cidade com. vistas ao bem comum, aplica-se ao governo o nome genérico de todas as suas formas, ou séja, governo constitucional (ha boas razdes para isto, pois embora um homem ou uns poucos homens possam preponderar por suas qualidades, quando o ntimero é maior passa a ser dificil que todos atinjam a perfeigio em todas as. qualidades, mas eles podem preponderar em valor militar, porquanto este aparece mais no maior ntimero; nesta forma de constitui- S80, portanto, a classe que luta pela cidade na guerra € mais poderosa, ¢ so 0s possuidores de armas que influem no governo). Os desvios das constituicdes mencionadas so a tirania, correspondendo @ monarquia, a oligatquia & aristocracia, e a democracia 20 governo constitucional; de fato, tirania € a monarquia governando no interesse do monarca, a oligarquia é © governo no interesse dos ricos, e a democracia € 0 governo no interesse dos pobres, ¢ nenhuma destas formas governa’para o bem de toda a comunidade. Devemos, porém, alongar um pouco mais a nossa exposicao, para dizer 0 que é cada uma destas constituicdes, pois 0 assunto envolve certas dificuldades, e 0 método de quem estuda filosoficamente qualquer matéria, € nao apenas sew aspecto pratico,-consiste em nao negligenciar ou 1279 b 1280 a omitir qualquer detalhe, e tornar evidente a verdade sobre cada um deles. ‘A tirania, como dissemos, é a monarquia governando despoticamente a comunidade politica; existé oligarquia quando o controle do governo esta nas maos dos possuidores de riquezas; temos a democracia quando, a0 contrario, o poder € exercido pelos que nao possuem muitos bens, ou seja pelos pobres. A primeira dificuldade é quanto a definicdo. Se os cidadaos em sua maioria fossem ricos e controlassem 0 governo, essa maioria no governo seria uma democracia?.Da mesma forma, se em algum lugar‘os pobres fossem menos numerosos que os ricos e detivessem 0 poder por serem mais fortes, poder-se-ia dizer que 0 governo seria oligérquico por ser controlado por uma minoria? Parece, entio, que nossa definicao de formas de governo nao era boa. Suponhamos, ainda, uma combinagio de riqueza com um pequeno atimero de pessoas € de pobreza com um grande ntimero, ¢ chamemos de oligarquia a constituicio em que os ricos, sendo poucos, ocupam as funcdes de governo, e de democracia aquela em que os pobres, sendo mais numerosos, acupam essas fungées; isco conduz a outra dificuldade. Que riome dariamos as constituicdes descritas pouco antes — aquela em que houyessé mais ricos do que pobres, e & outra em que os pobres fossem menos numerosos que 08 ricos, € os ricos controlassem o governo na primeira hipétese e os pobres na segunda — se nao existissem outras formas de goyerno além das mencionadas? A suposicao parece evidenciar que é acidental que poucos ou muitos controlem o poder nas oligarquias no primeiro caso e as democracias no segundo, porque o miimero de ricos é menor € o de pobres é maior em toda parte (nao ocorre, entdo, 0 caso de os aspectos mencidnados constituirem uma diferenca especifica), mas o que diferencia a democracia da oligarquia é a pobrezae a riqueza; conseqiientemente, onde quer que os governantes exercam 0 poder por causa da riqueza, sejam eles minoria'6u maioria, ter-se-A uma oligarquia, e onde os pobres governarem ter-se-a uma democracia embora aconteca acidentalmente, como dissemos, que onde os governantes exercem o poder por ser ricos eles sio poucos, e onde exercerh o poder por ser pobrés eles sao muitos, porque poucos homens so ricos mas todos desfrucam de liberdade, e riqueza e liberdade sao os fundamentos para as reivindicagdes das duas classes quanto ao exercicio do poder politico. Devemos determinar primeiro quais sio, segundo dizem os estudiosos do assunto, as qualidades determinantes da oligarquia e da democracia, e qual € 0 principio de justia sob cada uma destas formas de governo. Efetivamente, todos os homens se apegam A justica, mas s6 avancam até um certo ponto e nao dizem qual é o principio de justica absoluta em seu todo. Pensa-se, por exemplo, que justica é igualdade — e de fato’é, embora nao o seja para todos, mas somente para aqueles que sao iguais entre si; também se pensa que a desigualdade pode ser justa, e de fato pode, embora nao para todos, mas somente para aqueles que séo desiguais entre si; os defensores dos dois principios, todavia, omitem a qualificacao das pessoas iis quais eles se aplicam, e por isto julgam mal; a causa distoé que eles julgam tomando-se a'si mesmos como exemplo, e quase sempre se € um mau juiz em causa propria. Disto resulta que, enquanto “justo” significa justo apenas para certas pessoas e é distingiiido de maneira idéntica em relacio as coisas 2 serem distribuidas e 4s pessoas que as recebem, como ja dissemos na Etica , os partidérios dos dois principios concordam a respeito do que é a igualdade entre coisas, mas discordam quanto ao que constitui igualdade entre pessoas, principalmente pela razao mencionada pouco antes, porque os homens sio maus juizes quando se trata de julgar a si mesmos, e também porque, embora ambos os lados apresentem argumentos a respeito de uma justica limitada e parcial, pensam que estao falando da justiga absoluta. Com efeito, um dos lados pensa que s¢ as pessoas so desiguais sob alguns aspectos — na riqueza, por exemplo, elas sao desiguais em tudo, e 0 outro lado pensa que, se elas so iguais sob alguns aspectos — na liberdade, por exemplo, elas sao iguais em’ tudo. Mas o mais importante eles nao mencionam. Se os homens formassem a comunidade e se juntassem por causa da riqueza, sua participacao na cidade deveria ser proporcional a seus bens, € entio 0 arguinento dos paladinos da oligarquia pareceria valido — ou seja, que numa parceria com um capital de cem minas'" nao seria justo que uma pessoa que contribuisse com uma mina tivesse direito a uma participagio no principal ou nos juros igual & participaco de outra pessoa que houvesse contribuido com as noventa’e nove minds restantes. A cidade é formada nfo somente com vistas a assegurar a vida, mas para assegurar uma vida melhor (se assim no fosse, um grupo de escravos ou de animais irracionais constituiria uma cidade, mas como € assim, tal grupo nao seria uma cidade, pois os escravos e os.animais nfo participam do bem-estar. nem de uma vida livremente escolhida), e seu objetivo nao € o mesmo de uma alianga militar pata defesa contra ofensas de quem quer que seja, ¢€ cla nao existe por causa do comércio e relagdes de negécios — se fosse assim, os etruscos € 0s cartagineses € todos os povos que. vivem de comerciar uns com os outrds formariam,todos, de certo modo, uma tinica cidade. Na verdade, eles tém acordos sobre importagdes e convénios relativos @ abstencao de pracicas, comerciais desonestas, além de tratados de alianca para a defesa miicua, mas nao tém magistrados comuns a todos eles, designados para zelar pela observancia dos compromissos, ¢ sim magistrados diferentes de cada lado; tampouco cada cidade cuida de saber se os habitantes das outras sio como deveriam ser, nem tenta assegurar-se de que ninguém nas cidades participantes dos acordos sera desonesto ou imoral de algum modo:em sua conduta como cidadao, mas quer, somente que elas nao se prejudiquem urhas as outras. Por ‘outro lado, todos aqueles que tém intéresse num bom governo dao a devida consideracao a virtude € ao vicio em suas cidades. E claro, portanto, que qualquer cidade digna desta designacdo e que nao seja cidade apenas no nome, deve estar atenta as qualidades de seus cidadaos, pois de outra maneira a comunidade se torna uma simples alianga, diferindo apenas na localizacao se comparadas com as -1280 b 1281a aliancas propriamente ditas, pois nestas as cidades participantes sio separadas umas das outras. A lei, entdo, passa a ser um convénio, ou, na frase do sofista Licofron'” , “uma garantia dé justica reciproca’, ¢ ja nao se destina a fazer com que 0s cidadaos sejam bons € justos. E‘ébvio que isto se passa desta maneira, porquanto se alguém juntasse em um sé lugar duas cidades' — Mégara ¢ Corinto, por exemplo — de tal mancira que as muralhas das duas se tocassem, ainda assim elas nao seriam uma tinica cidade; € no passariam tampouco a sélo se se decrerasse 0 direitd de casamento entre os habirantes das dus cidades, embora o casamento entre cidadaos seja um dos elementos de comunidade caracteristicos das cidades; da mesma forma, ainda que certas pessoas vivessem em lugares separados, mas nfo a uma distancia rio grande que lhes impedisse o relacionamento — por exemplo, se um homem fosse carpinteiro, outro agricultor, outro sapateiro-e outro qualquer coisa parecida — e toda a populacao fosse constituida de dez mil pessoas, mas apesar disto elas nao tivessem relagdes mituas em coisa alguma além do intercimbio de produtos ¢ alianga militar, ainda assim elas nao constutuiriam uma cidade. E por que razao? Obviamente nao € porque seu relacionamento seja'a certa distancia, pois mesmo que elas se juntassem para o relacionamento deste tipo (cada um usando sua casa como se fosse uma cidade) e para ajuda militar..mitua contra ofensas injustificadas, como, numa .alianga defensiva, nem assim elas dariam a impressao de constituir uma cidade 2 quem observasse cuidadosamente os fatos, s¢ elas se juntassem com o mesmo objetivo que perseguiam quando passaram a relacionar-se na época em que viviam separadas. E evidente, portanto, que uma cidade nao € apenas uma reuniao de pessoas num mesmo lugar, com o propésito de evitar ofensas reciprocas e de intercambiar produtos. Estes propésitos s30 pté-requisitos para a existéncia de uma cidade, mas isto nao obstante, ainda que todas éstas condicdes se apresentem este conjunto de circuns- tancias nfo constitui uma cidade; esta € uma uniéo de familias e de clas para viverem melhor, com vistas a uma vida perfeita e independente: Este objetivo, todavia; no se realizara a nao ser que os habitantes vivam num lugar s6 e se casem entre si. Daf se originam as relacdes entre familias, as confrarias, as irmandades religiosas ¢ as diversdes que levam as pessoas a0 convivio. Tudo isto € obra da amizade, pois a amizade é a motivacao do convivio; logo, -j4 que o objetivo da cidade é a vida-melhor, estas instituigdes so o meio que leva aquele objetivo final. Uma cidade € uma comunidade de clas e povoados para uma vida perfeita e independente, € esta em nossa opiniéo € a maneira feliz ¢ nobilitante de viver. A comunidade politica, entio, deve existir para a pratica de acdes nobilitan- tes, € nao somente para a convivéncia. Portanto, aqueles que mais contribuem para a existéncia de tal comunidade desempenhami nela um papel mais importanre que o daqueles cuja liberdade e nobreza de nascimento é a mesma, ou até maior, mas lhes sao inferiores em qualidades politicas, ou que o daqueles cujas riquezas sio maiores, mas cujos méritos so menores. Nossa exposicao-evidencia que todos os adeptos, das diferentes formas de governo falam somente de uma parte do principio da justica a Capitulo VI é oe nae Surgem também dificuldades quando se quer saber quem deve dever 0 poder soberano.na cidade, pois ele pode ser exercido pelas massas, pelos ricos, ou pelos homens bons, ou por um sé homem melhor que todos os outros, ou por um tirano, mas todas estas alternativas parecem envolver conseqiiéncias desagradaveis. Por exemplo, nao seria injusto que os pobres se prevalecessem de sua superioridade numérica para dividir entre si mesmos os bens dos ricos? Certamente nao, diriam alguas, pois o poder supremo assim quis, e legitimamente. Que nome daremos, entio, a esta injustiga extrema? Insistamos; se depois de tudo haver sido tomado pelos pobres aos ricos na primeira divisio, uma nova maioria dividir outra vez os bens da nova minoria entre seus componentes, nao é evidente que ela estara destruindo a cidade? Mas com certeza as boas qualidades néo destroem quem as possui, nem a justica destr6i a cidade;logo, obviamente este principio também nao pode ser justo. Se fosse, todos os atos de um tirano seriam necessariamente justos, pois ele coage os outros por ser mais forte, tal como fo caso da coacao da maioria contra os ricos. E justo, entao, que a minoria e os ricos governem? Suponhamos que eles ajam de maneira idéntica € tomem os bens da maioria; isto sera justo? Se for, a tomada dos bens dos ricos pela multidao também sera. E ébvio, portanto, que cudo isto é errado e nao é justo. Entio os homens bons deverio goverhar ¢ deter o poder supremo sobre todos os outros? Se assim for, conseqiiente- mente todos os outros serdo degradados, se nfo forem distinguidos com fungées de governo, pois falamos de funcées como distincdes, e se as mesmas, pessoas exercerem permanentemente as funcdes de governo as demais estarao inevitavelmente degradadas. O ideal, entao, seria que 0 melhor dos homens governasse? Esta hipétese € ainda mais oligérquica, pois. numero de pessoas excluidas das honrarias seria ainda maior. Alguém poderia dizer que de qualquer modo seria um mal confiar o poder supremo a um sé homem, sujeito a todas as vicissitudes e paixdes humanas como todos os homens, em vez de entrégé-lo 2 lei. Mas seja a lei de contetido oligarquico ou democrético, em que isto nos ajudard a sair de 1281 nossas dificuldades? Cont efeito, as conseqiiéncias serio. idénticas as desctitas antes. A maioria destes pontos, entretanto, devera ser discutida €m outra ocasiao, mas o principio de que a maioria é necessariamente mais apta a exercer o poder soberano do que uns poucos homens excelentes pode justificar-se, ¢ embora talvez levante algumas dificuldades ele é Provavelmente verdadeiro. E realmente possivel que os integrantes da maioria, apesar de nao serem isoladamente homens bons, possam ser melhores quando reunidos, nao individualmente, mas‘coletivamente, do que 0s poucos individualmente bons, da mesma forma que os banqueres pablicos, para os quais muitos contribuem, sao melhores que os oferecidos a expensas de um sé homem; realmente, pode-se argumentar que onde ha tos homens, cada um tem uma certa porcao de bondade e prudéncia, € que quando eles se retinem, da, mesma maneira que’a multidao se transforma num $6 homem com muitos pés ¢ muitas mos e muitos sentidos, podem assumir também uma sé personalidade quanto as faculdades morais ¢ intelectuais. £ esta a razio de a maioria ser melhor juiz para as obras musicais as dos poetas, pois homens diferentes podem julgar aspectos diferentes do desempeaho, e todos eles podem julgar 0 Conjunto. Mas a superioridade dos homens excelentes sobre cada um dos Componentes da maioria, como aquela dos homens de melhor aspecto, segundo dizem, sobre os homens fisicamente vulgares, e das obras dos artistas da pintura sobre os objetos reais, consiste realmente no fato de um certo mimero de belos detalhes esparsos ter sido Combinado em um Conjunto exemplar, embora, se considerado separadamente, o olho de uma pessoa real ou outro detalhe de outra pessoa seja mais belo que o do homem no quadro do artista. Na’ verdade, nao é evidente que esta « Superioridade coletiva da maioria comparada’ com os poucos homens excelentes possa efetivamente existir a respeito de todas as democracias e de todas as maiorias, € talvez se possa argiiir que ela é claramente impossivel no caso de algumas delas — com efeito, o mesmo argumento se aplicaria a animais, e seria o caso de perguntar qual é a diferenca, na pratica, entre certos homens € os animais (nada impede que o que dissemos seja verdadeiro a propésito de uma determinada maioria). Pode- Se, portanto, usar estas consideracdes para resolver n&o somente as dificuldades expostas antes, mas também a questo conexa: qual deve sera autoridade dos homens livres ¢ a da massa dos cidadaos, ou seja, daqueles que nem sio ricos, nem se distinguem por algum tipo de exceléncia? No seria seguro, de fato, deixa-los: participar-das funcdes mais elevadas de - governo, pois sua insensatez os induziria a errar, e sua desonestidade a cometer injusticas; por outro lado, nao os-deixar participar criaria uma situacio inquieance, pois quando numerosas pessoas so deixadas sem as honrarias conferidas pelo exercicio de funcées de governo a cidade em que elas vivem esta fadada a ficar cheia de inimigos do governo. Resta apenas proporcionar-lhes participacao nas fungées deliberativas e judican- tes. Por esta razio Sélon alguns outros legisladores Ihes entregaram a

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