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1
Está insatisfeito com a sua conta poupança
e a inflação deixou-o órfão de uma hora
para a outra. A sua vontade era mesmo ser
milionário, mas sem cair na conversa de um
charlatão ou num esquema em pirâmide.
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CONTRA O FINANCISMO
3
1ª edição
Lisboa, 2017
© Felipe Miranda
Rodolfo Amstalden
Pedro Gonçalves
Diogo Baltazar, 2017
Impresso por:
unoeditorial.com
info@unoeditorial.com
A reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio, não autorizada pelos autores
e os editores violam direitos autorais. Qualquer uso deve ser previamente autorizado.
4
CONTRA O FINANCISMO
Felipe Miranda
Rodolfo Amstalden
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6
Prefácio ........................................................ 9
Introdução ................................................... 19
7
8
PREFÁCIO
Caro leitor,
9
A trabalhar na banca de investimento desde os 20 anos,
sei perfeitamente como funciona a indústria. Os truques e
subterfúgios que impedem que advogados, médicos, enge-
nheiros e professores não alcancem a emancipação financei-
ra.
10
Trata-se de um artifício retórico para tentar distanciar o
cidadão comum das pessoas “financistas”, atribuindo a essas
últimas o monopólio do conhecimento lucrativo.
11
Prever o futuro (vai subir ou vai cair) nada tem a ver com
a nobre tarefa de pesar vários tipos de futuro (vale a pena?).
Prever o futuro é uma ambição impossível. Pesar vários futu-
ros é um exercício útil.
12
O ficheiro de excel, portanto, não basta, pois só preenche-
mos as células com aquilo que já sabemos ou julgamos saber.
13
Cético — como bem definiu Oscar Wilde — é o homem
que conhece o preço de tudo, e não conhece o valor de nada.
“Eu sei que o mel que eu provo tem um gosto doce” — dizia ele.
“Mas sei também que esse adocicado talvez não me explique nada
sobre as verdadeiras propriedades do mel”.
14
Quais são as verdadeiras propriedades de uma ação? A
empresa por detrás da ação? Os investidores que insistem,
dia-a-dia, em comprá-la e vendê-la?
15
precisam saber exatamente o que acontecerá e não podem
dar-se ao luxo de perder, nem mesmo por mera hipótese.
16
que é dentista cinco dias por semana e também sabe cuidar
dos seus investimentos. Aquele que entende quando lhe fa-
lam de finanças e se faz entender quando o assunto são fi-
nanças.
17
escritas a ouro não poderiam prometer isso, pois Buffett ou So-
ros amparam-se, principalmente, em conhecimento tácito.
Pedro Gonçalves
18
INTRODUÇÃO
“Querido Pai,
19
Apesar de começar assim, este livro pouco tem de kafkia-
no. Ele não traz nenhuma ideia repressiva ou surreal. Tão
pouco simboliza um acerto de contas com a figura paterna.
Há outros motivos envolvidos desde o início.
20
estereótipo do financeiro sabe-tudo, amparados na certeza
de que uma mudança tangível na forma de tratar os seus in-
vestimentos poderá levá-lo a uma nova compreensão do que
é a rentabilidade.
21
Fenómenos sociais não podem ser reduzidos a cartilhas
económicas. Ao tentar fazê-lo, não estamos apenas a simpli-
ficar a realidade, mas a distorcer o mundo, naquilo que a lin-
guagem técnica batizou de “não-ergodicidade”. Distorções de
interpretação nos investimentos têm um corolário imediato:
prejuízo.
22
Trazendo para a linguagem canónica das finanças, esta-
mos a propor um instrumental mais moderno frente ao típi-
co investimento em valor (value investing). Uma filosofia que
permita ganhos formidáveis (e intuitivos) no longo prazo ao
investidor.
23
JOGO DE INFLUÊNCIAS
24
Antes que sejamos bombardeados por milhares de e-mails
das viúvas de Warren Buffett e Benjamin Graham, cumpre
esclarecer: não há absolutamente nada contra o value inves-
ting original. Pelo contrário, achamos que essa abordagem
funciona também. E já se provou historicamente adequada
para carteiras de ações de longo prazo.
25
UMA RAIZ FILOSÓFICA
Repare, não é por que o leitor não entende uma coisa que
ela não existe. Há o conhecimento passível de narrativa/for-
malização e há o mais opaco. Com o perdão da palavra, eu,
imitando a Clarice Lispector, sou um mistério para mim.
26
Deixe-me contar-lhe uma história rápida.
27
Não concordamos.
28
A HORA DE DEFINIR
29
Preâmbulos feitos, por quê o nome estranho de antifragi-
lidade? Sem precisar recorrer ao dicionário — ok, pode con-
ferir se quiser —, o que é frágil? Basicamente, é algo que se
parte facilmente aquando de um choque. E qual o contrário
de frágil? Com frequência, apontam-se supostos antónimos
como forte, vigoroso, robusto.
30
•• Antifrágil: toda a coisa ou situação em que os ganhos
aumentam mais do que proporcionalmente conforme
a intensidade do choque positivo; as perdas, por sua
vez, ficam maiores em intensidade inferior à do cho-
que negativo.
31
dade do choque — se é que é possível alguma felicidade de-
corrente de conversas com mediadores de seguros.
32
VAMOS POR PARTES
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Recado antecipado: não há somente armadilhas de valor;
o próprio valor é uma armadilha. Em rigor, os riscos escon-
didos e os eventos imprevisíveis são aqueles que acabam de-
terminando a evolução de um ativo financeiro. Isso remete
ao problema clássico da indução de David Hume e aos tais
cisnes negros de Nassim Taleb.
34
E se Buffett responde pelo tradicionalismo em ações,
Markowitz faz o mesmo para a montagem de portfólio. O
capítulo subsequente versa exatamente sobre o platonismo
de uma tal fronteira eficiente que inclusive ganhou o prémio
Nobel da Economia.
35
36
I. QUER INVESTIR EM VALOR?
37
Num esforço didático, acho que dá para resumir a filosofia
em dois pilares centrais:
38
Aparentemente, tudo se resume em saber o valor intrín-
seco, dado que o preço da ação é informação pública. Aqui já
vale a pena atentar para certas nuances da metodologia...
39
(eterna?) de espera e aguardar a chamada da sua senha para o
paraíso da precificação.
40
ação é cotada a preço inferior ao dos ativos menos as suas
obrigações financeiras, então o seu valor real está acima da-
quilo, configurando-se num ponto de entrada.
41
“O meu primeiro método, mais limitado, contempla com-
pra de ações a preços inferiores ao valor dos ativos cor-
rentes, sem dar nenhum peso à fábrica e a outros ativos
fixos, e subtraindo todas as obrigações financeiras da
firma. Nós usámos extensivamente essa técnica na ges-
tão de fundos de investimento e, por um período difícil
de 30 anos, devemos ter ganhado aproximadamente 20%
ao ano. Numa altura, entretanto, depois de meados dos
anos 50, esse tipo de oportunidade ficou bastante raro
por conta do persistente otimismo generalizado. Depois,
as oportunidades voltaram com maior frequência com a
queda de 1973/74. Em janeiro de 1976, contámos 300
situações como esta no stock guide da S&P, cerca de 10%
do total”.
42
última metade de século (1925-1975). Elas geram consis-
tentemente um retorno de 15% ou mais por ano, equiva-
lente a duas vezes o desempenho do índice Dow Jones em
igual intervalo. Tenho muita confiança no seguinte tripé
deste método: lógica sólida, simplicidade da aplicação e
um excelente histórico. No final, é uma técnica que per-
mite ao verdadeiro investidor explorar o excesso de oti-
mismo ou de apreensão inerentes à especulação alheia”.
43
PESCADOR DO FUTURO
44
A ideia central de Fisher é a de que determinados negócios
oferecem uma boa dose de certeza sobre a sua capacidade de
expansão — assim, na avaliação de uma companhia, negli-
genciar o componente de crescimento poderia levar à preci-
pitada conclusão de que uma ação está cara quando, na ver-
dade, mostra-se barata se contemplar o rendimento futuro.
45
tiva menos newtoniana, em que o valor intrínseco torna-se
uma variável.
46
taram as suas possibilidades? Todos os mercados en-
contram a sua maturidade e, para manter crescimento
acima da média por um período de décadas, uma em-
presa necessita desenvolver novos produtos para ex-
pandir o mercado atual ou encontrar um novo.
47
7. A companhia oferece um bom clima para trabalho em
grupo? Uma empresa é feita de pessoas e pessoas mais
felizes produzem mais. É capcioso medir isso, mas
pode procurar por boas políticas de remuneração e
analisar a forma como o top management trata os de-
mais empregados.
11. Há algum atalho, uma dica ou qualquer coisa que pos-
sa fazer o investidor perceber as vantagens competiti-
48
vas daquela empresa relativamente aos competidores?
É importante ao investidor entender de onde vêm os
fatores de sucesso daquela firma e como ela lida com a
concorrência.
49
15. Por fim, a integridade dos administradores é inques-
tionável? Para Fisher, o investidor jamais deveria co-
locar o seu dinheiro na ação de uma empresa cujos do-
nos não se relacionam com o mercado de forma 100%
confiável.
50
BICHO DE SETE CABEÇAS
A (€100, 50%)
(50% x 100) + (50%x 0) = €50
B (€0, 50%)
51
O modelo de Fluxo de Caixa Descontado foi original-
mente formalizado na tese de doutoramento de John Burr
Williams, posteriormente incluída na obra The theory of in-
vestment value.
52
Estava no último ano do mestrado quando surgiu uma
vaga de estágio. Eu tirava boas notas, mas faltava a compo-
nente prática.
53
Se eu estivesse otimista com a empresa, colocaria núme-
ros alinhados a um bom prognóstico de crescimento e ex-
pansão de margens. Estava feito um DCF capaz de entregar
uma ação atrativa, descontada se comparada ao seu valor
intrínseco. Já se eu não gostasse da empresa, embutiria rit-
mo fraco das receitas e margens estagnadas, deixando a ação
cara.
54
REI NU, REI POSTO
55
Por imposição lógica, tudo começa, portanto, com a deter-
minação dos fluxos de caixa.
56
Na primeira linha, a receita bruta é, por definição, a mul-
tiplicação de duas variáveis: a quantidade vendida e o seu
respetivo preço. Coisa fácil. Basta prever quanto é que a em-
presa vai vender e o número cobrado por cada unidade.
57
Novamente, de duas formas possíveis: supor diretamen-
te uma margem operacional ou passar, linha a linha, pelas
despesas de vendas, gerais e administrativas (no jargão em
inglês, SG&A).
58
Pois bem, por meio desse esforço rápido, temos o Fluxo de
Caixa do primeiro ano. Replicamos o mesmo exercício para
todos os restantes anos, até ao infinito, e trazemos a soma
total ao valor atual pela Taxa de Desconto apropriada.
Mas até agora não falámos desta última... tratámos apenas ge-
nericamente de uma Taxa de Desconto “adequada”. Mas qual é?
59
Ora, se os Fluxos de Caixa estão associados intrinseca-
mente à empresa, deve haver também uma Taxa de Juro que
represente o custo do dinheiro ao longo do tempo para a nos-
sa companhia de retalho. O nome dessa percentagem tempo-
ral é o Custo Médio Ponderado de Capital (Weighted Average
Cost of Capital ou WACC).
60
“K d ” é o custo médio da dívida, igualmente público (sub-
trair daqui o benefício fiscal da dívida).
61
A equação do CAPM é intuitiva. Segundo ela, o retorno
de uma ação é dado pelo rendimento de um ativo sem risco
(R f) mais quanto há de excesso de retorno de mercado sobre
o ativo sem risco (E(R m) — R f), ponderado pela resposta da
respetiva ação a variações do mercado.
62
EM BERÇO ESPLÊNDIDO
63
comportamento dos consumidores, o acerto nas coleções de
verão/inverno, condições climáticas, dinâmica da concorrên-
cia...
64
Não tenho a pretensão de virar Teseu, mas reservo ainda
mais uma crítica ao Procusto financeiro. Existe um problema
de autorreferência, ou seja, de incoerência interna ao modelo.
65
Tom Copeland, considerado um dos maiores entendidos
de avaliação de empresas no mundo, pendura há décadas o
seguinte quadro no seu escritório: “DCF RIP”.
66
II. AS ARMADILHAS DE VALOR
67
Entrou em casa sem conseguir disfarçar. Falava alto e ria
desenfreadamente. Gostava de o ver assim mais vezes, mes-
mo com aquelas risadas um pouco constrangedoras e exage-
radas. A alegria descomedida tinha uma razão der ser. Ele
tinha acabado de comprar um Land Rover, o jipe da moda.
Cinzento clarinho, bem típico da altura e exatamente da ma-
neira como a minha mãe gostava.
68
Land Rover todo rebentado nas engrenagens. Enquanto isso,
o Corsa estava lá, impávido e sereno como o Muhammad Ali.
69
ARMADILHAS CLÁSSICAS
70
ii. Uma empresa pode estar descontada em relação ao
património líquido porque se esperam prejuízos no
futuro. Numa primeira instância, os prejuízos soam
como pequenos embaraços na demonstração de resul-
tados do trimestre. Mas vão-se acumulando e passam
a transitar para o balanço. Mais especificamente, vi-
ram subtrações ao valor contabilístico. Ou seja, o valor
dos ativos vai cair no futuro, enriquecendo apenas os
mecânicos de plantão (no mercado financeiro, os me-
cânicos são os advogados).
71
dação está a ser mesmo contemplada? Porque se a empresa
não está realmente a pensar fechar, é apenas uma referência
platónica. São muitas as empresas que negoceiam abaixo do
seu valor de liquidação e poucas as que efetivamente vão ser
liquidadas.
72
naquele momento não podem servir como proxy para o valor
da companhia.
73
Além dos problemas da alavancagem no setor, esta avaliação
modesta refletia justamente a perceção de que os lucros iam, na
melhor das hipóteses, ficar parados. O mercado estava certo.
74
dência e dinheiro no bolso, o mesmo é dizer, cautelas e canja
de galinha nunca fizeram mal a ninguém.
75
UMA AÇÃO É UMA EMPRESA?
76
Sabia exatamente as nuances por trás das várias fações e foi
um dos primeiros a alertar em terras portuguesas, sobre as
tensões na região — o que viria a confirmar-se nesse ano.
77
a favores pessoais feitos anteriormente ao dono da correto-
ra. O petróleo, por sua vez, desabou dos $28 para os $20 no
espaço de dois meses. O mercado confundiu a guerra com
o petróleo. A commodity pode ter uma forte relação com os
movimentos bélicos, mas o petróleo não é a guerra em si. Se
todos estavam à espera da guerra, o petróleo já tinha sido
armazenado de acordo com a expetativa.
78
que: a ação não pode ser entendida meramente como uma
representação direta da firma.
79
matérias-primas empregues no processo produtivo. Acima
de tudo, o trabalho seria o elemento agregador de valor;
logo, a quantidade média de tempo de trabalho alocado para
produzir um bem determina o seu valor.
80
Todo o paradigma walrasiano (de Léon Walras, pilar das
Finanças Modernas), ao igualar o valor de um bem à utili-
dade marginal, recorre a parâmetros essencialmente indivi-
duais. A função utilidade (medida de bem-estar) é pensada
principalmente sob a ótica do indivíduo. E é aí que reside o
problema.
81
Isto é obviamente problemático, porque a definição parte
de uma observação individual e, no momento seguinte, reti-
ra as suas características individuais.
82
CONCURSO DE BELEZA
83
to, e não à empresa em si. Confundir esta lista de direitos
com a própria empresa é ignorar o contrato e a interação so-
cial diária que é delimitada pelo mercado.
84
FATO DE ALFAIATE
85
um concorrente com uma nova tecnologia que simplesmente
destrói a anterior, a empresa antiga vale zero. Os lucros pas-
sados não têm valor algum. Precisamos olhar para a frente,
para os fluxos de caixa futuros.
86
ao psicanalista e pedir: “Doutor, diga-me como é que eu vou estar
daqui a três meses, pois preciso preparar-me até lá”.
87
detetar-se”. Poucos meses depois, Fannie Mae e Freddie Mac
estavam falidas da Silva.
88
Ninguém aqui está muito preocupado com o estudo das
aves, é só um exemplo pontual do problema clássico da indu-
ção de David Hume, posteriormente também explorada por
Karl Popper e o seu falseacionismo.
89
Alimentei o peru durante 360 dias consecutivos. Todas as
manhãs, prato cheio, ele tinha uma confirmação adicional
sobre o amor da família Cristo. Crescia a confiança, baseada
na larga série de informações passadas (amostra grande, 360
observações) de que as coisas continuariam a correr muito
bem. Então, chegava a noite da consoada, no suposto ápice
da cumplicidade, lá estava o Geraldo transformado em jan-
tar. O peru virou Cisne Negro.
90
III. CRÍTICA DA RAZÃO PURA
91
Não o Modo, obviamente. O meu preferido era o Bugias,
um rato de óculos escuros em cima de uma american chopper.
Líder do trio e o mais racional, tinha a visão danificada por
causa de um ferimento de guerra. Para um brinquedo até que
era caro. Claro que eu me mantinha indiferente às cotações.
Quem é que pode colocar um preço à felicidade de uma crian-
ça?
92
COISAS DE ADULTOS
Mas ainda não nos ficamos por aqui porque, mesmo sa-
bendo que existem armadilhas, caímos nelas como patinhos.
E logo nós, iluministas vacinados, somos apanhados nos
nossos próprios truques. Fazemos engenharia inversa, cál-
culos para provar com os números — coitados dos números
— aquilo que mais desejamos. Tiramos MBAs em Universi-
dades Ivy League para acertarmos em cheio, bem mais do
que a média.
93
Este desejo passou a perturbar os economistas moder-
nos, especialmente na passagem para o século XX, quando
os primeiros expoentes da Economia Política (Smith, Marx,
Ricardo) foram dando lugar a abordagens menos conceituais
e mais “objetivas”.
94
maioria das pessoas demasiadamente humanas que eu co-
nheço (inclusivamente para mim). Duas das principais pre-
missas dizem respeito à consistência e à completude.
95
Décadas mais tarde, com o triunfo da Economia Compor-
tamental, conseguimos perceber que os pequenos ajustes
tinham ficado grandes demais e a realidade foi encolhen-
do, coitada. Formalmente, só foi reconhecido isto em 2002,
quando o prémio Nobel de Economia foi conferido ao psicó-
logo Daniel Kahneman. Mais vale tarde que nunca.
96
À ESPERA
97
os lucros de uma ação em janeiro vão subir também em feve-
reiro, e em março — naquilo que é conhecido tecnicamente
como momentum trading, em alusão ao momento de inércia.
98
Assim como o momentum trading deriva das expetativas
estáticas, podemos associar as expetativas adaptativas a uma
estratégia de investimento denominada “reversion to mean”, ou
simplesmente reversão à média. Existe uma média — um cen-
tro de alvo — na qual estamos a olhar e a tentar acertar. Se
ocorre um desvio acima da média, corrigimos a rota do barco
para baixo. Já se o desvio é para baixo, ajustamos para cima.
Ok, ok, já deu para entender que não é fácil. Vamos então
para a terceira empreitada, aquela que conquistou o coração
dos economistas mais ortodoxos: a hipótese das expetativas
racionais. Nesta conceção, o homo economicus ganha um pou-
co mais de jogo de cintura no trato do futuro. Ele forma ex-
petativas baseadas (i) na compreensão perfeita das leis que
regem o ambiente económico-financeiro e (ii) em todas as
informações disponíveis até ao momento em que as proje-
ções são construídas.
99
Quanto à compreensão das leis, é razoável supor que os in-
vestidores saibam como se comporta o mercado. No entanto,
até que se atinja um nível próximo da “perfeição”, essa com-
preensão exige tempo e muita experiência. Não basta per-
ceber da procura e da oferta nas ordens de compra e venda,
nem basta saber a diferença entre taxa fixa e taxa variável.
100
Reconhecendo os méritos da hipótese, muita coisa evoluiu
desde os tempos de Benjamin Graham. Este é o mundo mo-
derno pós-Gutenberg, com iPhone, Twitter e Facebook. Se
algo acontece, realmente ficamos a saber numa questão de
segundos.
101
detalhes. No entanto, quanto mais informação, maior o nú-
mero de correlações espúrias. Hoje temos auxílios para obter
explicação para tudo, só que de uma forma absolutamente
arbitrária. Na bolsa, isto é perigosíssimo.
102
Aliás, voltemos ao nosso freguês predileto, o modelo de
Fluxo de Caixa Descontado. Para estimarmos os fluxos de
caixa futuros de um modo robusto, dependemos idealmen-
te das expetativas racionais traçadas pelo homo economicus.
Com isto, estamos automaticamente a supor que todas as in-
formações são instantaneamente incorporadas nos preços.
Mas espere aí...
103
TUDO O QUE VEM É GRATO
104
para provar o ponto. Relembrando o falseacionismo de Karl
Popper no capítulo II, uma única exceção basta para violar-
mos a proposição de que descortinamos o futuro sem ten-
dências.
105
cas e habilidades individuais dos jogadores, o desporto é —
acima de tudo — paixão.
106
O adepto que acertasse na equipa campeã receberia US$
160. Craig perguntou aos participantes quanto é que eles po-
deriam gastar no máximo para entrar em cada uma das oito
apostas possíveis. Depois de recolhidas as intenções, a soma
das apostas máximas (que espelha as respetivas impressões
de probabilidade) alcançou os US$ 287! Ou seja, se alguém
apostasse em todos as equipas, perderia com certeza US$
127 — o que viola quaisquer preceitos de racionalidade.
107
O escritor Fernando Pessoa não só sabia encarar diferen-
tes cenários prospetivos como teve a astúcia de transformar-
se em diferente heterónimos. Na pele de Ricardo Reis, escre-
veu a seguinte estrofe:
108
IV. BUFFETT VALE MAIS
109
branca. Numa quarta-feira, cheguei a bater o recorde: foram
10 visitas à casa de banho para sentir aquele aperto horrível
nas costelas e gosto de bile na boca.
110
Passei por cinco consultórios diferentes, mas sem sucesso.
Era estranho, porque o processo obrigava-me a definir coisas
que para mim eram indefiníveis. Eu não poderia saber exa-
tamente tudo sobre mim e, mesmo assim, era obrigado a res-
ponder, ciente da imprecisão com que as palavras me saiam
da boca. Por maior que fosse o meu esforço, era insuficiente
para transmitir quem realmente era. E o pior: o médico ia
formar uma ideia a meu respeito baseada nas palavras que
eu lhe tinha dito, em grande parte mentirosas, mas que eram
sem querer.
111
Em nenhum momento, questionámos as virtudes de War-
ren Buffett e do seu método prático. As questões surgem em
relação às teorias e aos factos estilizados que se formaram
em torno dessa sábia figura de Omaha. Aliás, o capítulo pode
ser lido como uma resposta à pergunta que até há pouco pai-
rava no ar: “se há tantos problemas com o value investing,
como é que o Buffett pode ser tão bem-sucedido”?
112
Mas o entrave é ainda maior, pois nem mesmo o próprio
Buffett consegue autodescrever-se. Como qualquer fenóme-
no social, o processo de investimento envolve muito conhe-
cimento tácito e heurístico — ou seja, incapaz de formali-
zação. Ninguém consegue descrever com precisão, tim-tim
por tim-tim, um algoritmo bem-sucedido nos investimen-
tos.
113
O argumento ficou resumido na famosa frase de que pode-
mos conhecer mais do que podemos explicitar. Um conheci-
mento integralmente explícito é inconcebível. Conhecimen-
to tácito é importante por ser inclusivamente mais relevante
do que a parte formalizável do saber. Conforme Polanyi, há
mais valor naquilo que tem difícil captura e registo, precisa-
mente por estar atrelado ao indivíduo.
114
Closkey e Pérsio Arida — não necessariamente por esta or-
dem.
115
popular, descobrimos que a Berkshire investe, primei-
ramente, em large caps de crescimento, em vez de ações
tradicionalmente associadas aos conceitos de valor. Ao
longo desse período, a carteira bateu o benchmark em
27 dos 31 anos em análise e na média superou o S&P
500 em 11,14%. A carteira bateu o índice que contem-
pla a média ponderada de todas as ações em 10,92% e
uma carteira montada a partir de um modelo Fama &
French em 8,56% ao ano.
116
Breve digressão: quem mereceria o Nobel, Eugene Fama,
um dos precursores da hipótese de mercados eficientes, ou
Warren Buffett?
117
UM CASO PRÁTICO
118
alguns anos antes pela empresa ferroviária Burlington Nor-
thern Santa Fe.
119
COMO LER ENTÃO?
120
Quando uma ação tem o preço abaixo do valor em caixa,
por exemplo, pode ser um belo primeiro incentivo, pois te-
mos a noção de que há um colchão capaz de limitar as nossas
perdas. Simultaneamente, se esse dinheiro for bem empre-
gue, a ação estará preparada para subir. Cuidadosamente,
tenta diminuir a sua perda a partir de uma referência de um
“preço justo mínimo” e expõe-se a potenciais eventos positi-
vos.
Não adianta rezar ao Deus das finanças e achar que ele vai
trazer-lhe a verdade. Eu próprio tenho tentado há 30 anos.
Eu falo, falo, falo. Ele ainda não me respondeu. Ora aí está
um Sujeito introspetivo.
121
122
V. UM POUCO DE MUITO RISCO
123
A ideia não foi completamente original. Anos volvidos,
assume que provavelmente foi resultado do seu trajeto diá-
rio. Todos os dias passava pela gelataria Surf e deixava lá um
euro e dez cêntimos.
124
A partir daí o negócio normalizou. O fluxo de caixa pas-
sou a ser constante e não sofria os pavores da sazonalidade.
125
Num segundo momento, revelaremos as fragilidades des-
se modelo. Markowitz é apenas uma tentativa platónica de
construir portfólios ótimos. Através de métodos altamente
sofisticados (e inócuos) tentam-se definir retornos esperados
e patamares de risco, quando se trata apenas de um esforço
pseudocientífico de, mais uma vez, domesticar a incerteza e
simplificar a realidade.
126
A FRONTEIRA EFICIENTE
127
nar ativos de maneira ótima: o menor risco possível para um
dado retorno esperado; ou, analogamente, o maior retorno
esperado a partir de um dado nível de risco. Nesse contexto,
a medida de risco é definida a partir do desvio-padrão (ou va-
riância) dos ativos, contempladas as respetivas covariâncias.
128
Em resumo, o investidor escolherá uma cesta que:
129
MATEMATIZANDO
, onde:
0 ≤ wi ≤ 1
130
E agregamos também a restrição de que o retorno espera-
do não é uma variável, mas sim uma constante. Lembre-se
que estamos minimizando o risco para um “dado retorno”,
que é calculado por:
131
MARKOWITZ LEU HUME?
132
No seu estudo seminal sobre a Fronteira Eficiente,
Markowitz começa assim: “assuma que o retorno esperado
e o risco (variância) dos ativos são conhecidos”. A partir daí,
faz toda a derivação matemática do artigo, sob a ideia de que
retorno esperado e risco são de facto conhecidos.
133
por meio de uma combinação de técnicas estatísticas e do
“julgamento do homem prático”. Ênfase para esta segunda
parte. Depois de toda a matematização, precisamos recorrer
ao julgamento do Homem, ou seja, à subjetividade.
134
Este argumento passa a ser aceite até mesmo pela orto-
doxia em Finanças. Robert Barro, por exemplo, que é um
dos grandes expoentes do mundo académico, no seu artigo
Rare events and equity premium, demonstra a importância dos
eventos raros no preço das ações. Quando Markowitz traba-
lha apenas com média e variância, despreza elementos essen-
ciais da gestão de risco. Repito novamente que não estamos
apenas a simplificar a realidade, mas a distorcer a malvada.
135
ma de indução proposto por David Hume (lembra-se dele?).
Markowitz, que estudara filosofia e dizia-se muito interes-
sado nos ensinamentos de Hume, parece não ter entendido.
136
ALFRED NOBEL BIPOLAR
137
Somente assim poderá ter a certeza da preservação da parte
mais expressiva do seu património.
138
No próximo capítulo, apresentaremos exemplos práticos
para compor essa fatia arriscada da carteira — inclusiva-
mente com resultados reais de sucesso.
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VI. OPCIONALIDADES
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Considerámos a ideia interessante. Fica muito mais fácil
compreender alguns conceitos através de histórias reais e do
quotidiano de qualquer um.
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Um ano e pouco passou e certo dia, fizemos uma viagem
académica e, na emoção da viagem, achei que seria o momen-
to perfeito para dizer o que sentia.
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AQUECER OS MOTORES
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a qual o convocamos. Todavia, um aquecimento antes de co-
meçar pode sim tornar o movimento mais fluido. É o que fa-
remos aqui, a partir de agora. Vamos aquecer os motores por
meio de exemplos práticos.
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De A a Z, o investidor iniciante poderá replicar facilmente
configurações tais quais as sugeridas pelo exemplo eleitoral.
Ao intermediário, o discernimento entre ações frágeis e an-
tifrágeis haverá de tornar-se habitual. E aquele investidor
mais avançado não terá problemas ao desbravar o mercado
de opções, desde que munido dos preceitos de perdas limita-
das face a ganhos ilimitados. Voilà!
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QUEM VAI GANHAR A ELEIÇÃO?
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representaria a continuidade, em contrapartida o Leave seria
um resultado disruptivo e potencialmente catastrófico.
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Não estou numa posição de tentar adivinhar, mas dado o
risco real do Brexit acontecer, por que é que não te proteges
desse cenário?
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Complementando o conservadorismo dos depósitos, soa
astuta uma aposta em euros (15%-20%). A moeda única pro-
tegeria a carteira caso houvesse um resultado eleitoral sur-
preendente.
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AÇÕES ASSIMÉTRICAS
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i. Ações muito descontadas, cujo preço já considera o
pior cenário possível. O chão está perto e o teto está
longe. Quanto mais volatilidade, melhor. Nestes casos,
o acionista pode ficar feliz de antemão ao saber que a
sua empresa saiu no jornal, mesmo antes de verificar
se a notícia é boa ou má.
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um título que chamasse a atenção. Onde é que está a parte
favorável da assimetria?
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Em paralelo, as divisões de hotelaria e healtclub passavam
por uma profunda reestruturação, livrando-se de custos ex-
cessivos e implementando um choque de gestão com vista
a aumentar as margens. Os benefícios dessa reestruturação
ainda não eram evidentes mas indicavam, no mínimo, um
razoável corte de custos.
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No final de 2013, que assinala o bottom do mercado imo-
biliário português, os contratos de compra e venda dispara-
ram. Se no primeiro semestre a empresa tinha conseguido
fechar apenas quatro contratos, na segunda parte do ano,
esse número disparou para 30.
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Na altura, o BCP tinha acabado de realizar um aumento de
capital de 2,250 mil milhões que visava, sobretudo, o reem-
bolso dos instrumentos de capital híbrido (os famigerados
CoCo’s).
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compensados pelos lucros obtidos na SONC. Embora simpli-
ficado, este é um exemplo real dos benefícios da assimetria
enquanto repartida entre diversos casos.
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ANTIGRÁGIL NA VEIA
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Assim como na secção sobre ações assimétricas, ilustrare-
mos aqui uma performance de como uma carteira de opções
montada para um evento extremo pode trazer resultados ex-
cecionais.
Vejamos:
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O que aconteceu com as cinco componentes desta carteira?
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EPÍLOGO
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A diferença entre um bom cação e “o cação da minha avó”
é inexplicável; entra justamente na parte do conhecimento
tácito. Há algo na D. Elisa que está relacionado com a sua
própria competência e com as experiências individuais que
ela já viveu.
162
Entendemos, portanto, que a arte de investir pertence aos
investidores, e não aos teóricos sobre investimentos. Isso é
mais ético também, pois uma opinião sem exposição vale
zero. Só o investidor — e não o teórico de finanças — colo-
ca o dele na linha de fogo. Ele procura um bom ativo, vai lá
e compra. Expõe-se aos mesmos riscos que recomendaria a
um terceiro. Se eu recomendo para si e não compro, então a
minha sugestão não serve.
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Lembre-se: não precisa estar certo e muito menos de um
ego milionário. Precisa apenas de entrar em campo. Não há
um sujeito sequer que tenha enriquecido na bolsa sem ter
tentado enriquecer.
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Autores
FELIPE MIRANDA
RODOLFO AMSTALDEN
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Adaptado para Portugal por:
PEDRO GONÇALVES
DIOGO BALTAZAR
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Fundada em 2009, a Empiricus é uma casa in-
dependente de análise de investimentos. Que-
remos ajudá-lo a tornar-se num investidor mais
inteligente e bem remunerado - ambos requi-
sistos essenciais na busca da independência fi-
nanceira. Conheça mais em www.empiricus.pt
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