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Revue francobrésilienne de géographie / Revista francobrasilera de geografia
31 | 2017 :
Número 31
Territorialidade de espaço
público em uma cidade ribeirinha
na Amazônia Setentrional
Brasileira – Afuá, Pará
Territorialité de l'espace public dans une ville riveraine dans le nord de l'Amazonie brésilienne Afuá, Pará
Territoriality of public space in a riverside city in the Brazilian Amazon Afua, Pará
J៰�頃ⴄ M鞓�鄄ះ�ⴄ៰� M鞓�鄄ៀ�褂ȅ頃 Mⴄⴄ褂鄄៰�頃, J鞓�ះ�ퟂ� C៰�鄄鄄ⴄ鞓� Nⴄៀ�៰� ⴄៀ� M鞓�鄄褂鞓�ȅ鞓�
M鞓�鄄ៀ�褂ȅ頃 Mⴄⴄ褂鄄៰�頃
Résumés
Português Français English
A Amazônia Brasileira possui distintas manisfestações espaciais nas cidades. Nesse contexto, a
compreensão dos fênomenos urbanos permite o reconhecimento das apropriações
contemporâneas e possibilita a tentativa de apreensão do cotidiano. Esta pesquisa investiga o
espaço público da cidade ribeirinha de Afuá (Arquipélago do Marajó, Estado do Pará, Brasil) que
estruturase sob o regime de palafitas e não permite o tráfego de veículos motorizados. Buscase a
compreensão da apropriação da orla desta cidade pela população local através da noção de
territorialidade. A pesquisa realizada possui caráter quantitativo e qualitativo mediante a
aplicação de questionários, referências bibliográficas e levantamento de campo (técnicas de
mapeamento do uso do solo, registros fotográficos e coleta de dados). As teorias de território,
sobretudo, as de Raffestin (1993, 2003) permitiram a elaboração de análises estruturadas em
dois aspectos: urbanos e socioterritoriais, que poderão servir de subsídios para elaboração de
uma proposta de intervenção urbana a fim de promover o desenvolvimento local.
L'Amazonie brésilienne se manifeste sous diverses formes spatiales urbaines. Dans ce contexte,
la compréhension des phénomènes urbains permet la reconnaissance des spécificités du monde
contemporain et la tentative d'appréhension du quotidien. Cette recherche examine l'espace
public de la ville riveraine d’Afuá (archipel de Marajó, État du Para, Brésil) qui est construit sur
un système de pilotis qui ne permet pas la circulation des véhicules à moteur. On cherche à
comprendre l'appropriation des bords de la rivière par la population locale à travers le concept de
territorialité. La recherche menée a été quantitative et qualitative, des questionnaires ont été
appliqués, les références ont été relevées et une enquête menée sur le terrain (avec des
techniques de cartographie de l'affectation des sols, d'enregistrements photographiques et
collecte de données). Les théories sur le concept de territoire, en particulier ceux de Raffestin
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(1993, 2003) ont permis la préparation d'analyses structurées en deux aspects: urbain et socio
territoriale, qui peuvent à l'avenir servir de support à la préparation d'une proposition
d'intervention urbaine, afin de promouvoir le développement local.
The Brazilian Amazon manifests itself in various urban spatial forms. In this context, the
understanding of the urban phenomena allows the recognition of the contemporary
appropriations and the apprehension of the daily life. This research investigates the public space
of the riverside town of Afua (Marajo Archipelago, State of Para, Brazil), a city structured under
wooden stilt system that does not allow traffic from motor vehicles. This research seeks to
understand the appropriation of the city river’s banks through the notion of territoriality. The
data from this research also allowed the construction of a proposal of urban intervention, using
the interface between the territory and the design of public space. The research has quantitative
and qualitative characteristics, questionnaires have been applied, and references have been
collected as well as a field survey (with landuse mapping techniques, photographic recordings
and data collection). Theories on the concept of territory, in particular those of Raffestin (1993,
2003), allowed the preparation of structured analyzes in two aspects: urban and socioterritorial,
which can in future support the design of an urban intervention, in order to promote local
development.
Entrées d’index
Index de motsclés : Afuá; ville riveraine; espace public; territoire; bords de fleuve.
Index by keywords : Afua; riparian town; public spaces; territory; riverfronts.
Index géographique : Afuá (Pará)
Índice de palavraschaves : Afuá; cidade ribeirinha, espaço público, território, orlas fluviais.
Texte intégral
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1 A urbanização brasileira, caracterizase pelo processo acelerado e tardio da
transformação dos espaços urbanos (SANTOS, 1993). De modo peculiar, na Amazônia
os grandes projetos aliados à intervenção do Estado nas formulações de políticas
estatais de incentivo à produção e ocupação foram responsáveis pelo crescimento
urbano. Estudos acerca do processo de urbanização brasileiro desmistificam a noção de
que a Amazônia é composta apenas por florestas intocadas. Esta região rica em
biodiversidade, também é palco de tramas urbanas, tal qual é evidenciado pelas
cidades e redes urbanas que a compõem (BECKER, 2005).
2 O crescimento demográfico e urbano das cidades da Amazônia brasileira, segundo
Porto (2007) a nível regional cresceu de 37,4% para 69,9% entre os anos de 1960 a
2000. O crescimento rápido desencadeou uma urbanização precária na maioria dos
casos, fator que implica diretamente na qualidade dos espaços que compõem os centros
urbanos. Dessa forma, a infraestrutura inadequada e a precariedade física destes
espaços, dificultam a qualidade de vida da população, tanto nas atividades
relacionadas ao trabalho como ao lazer e recreação.
3 A carência dessas infraestruturas urbanas, principalmente às relativas aos espaços
públicos tornouse ponto de partida para esta pesquisa que analisou o espaço público
da orla da cidade ribeirinha de Afuá, localizada no Arquipélago do Marajó, Estado do
Pará, na Amazônia Brasileira. Localmente denominada de “Veneza Marajoara”, em
função de ser contornada por três rios e diversos igarapés, Afuá possui um peculiar
modo de apropriação do território, em que o modo de vida ribeirinho prevalece, além do
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que é uma cidade que não permite o uso de veículos motorizados, em razão de ser
estruturada em palafitas.
4 Nesse sentido, esta investigação do espaço público da referida cidade baseiase em
aspectos físicos e socioterritoriais, pois estes permitem a apreensão do cotidiano e das
apropriações do espaço. Buscouse dessa forma, entender a orla como principal espaço
público da cidade, onde as territorialidades são manisfestadas em diferentes territórios,
construídos a partir das relações entre cultura, identidade e cotidiano.
Abordagens conceituais: território e
espaço público
5 O território é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que
realiza um programa) em qualquer nível, que ao se apropriar de um espaço o
"territorializa" (RAFFESTIN, 1993, p. 143). Esta concepção de território segundo
Raffestin, se forma mediante uma produção a partir do espaço, portanto, o território é
produto da apropriação realizada por seus atores, a este processo denominase de
territorialização. Ao mesmo tempo que é o território é meio, ele simultaneamente
interage e modifica seus agentes e atores.
6 Por sua vez Haesbaert (1995 e 1997), Haesbaert e Limonad (1999) apud Haesbaert
(2010) sintetizam três vertentes principais de abordagem de território: a política, a
cultural e a econômica. A primeira vertente compreende o território baseado nas
relações entre espaço e poder, no qual este é tido como um espaço delimitado e
controlado por algum tipo de poder. Já a perspectiva cultural, enfatiza a dimensão
simbólica e subjetiva, resulta da apropriação e valorização simbólica de um
determinado grupo em seu espaço vivido. Enquanto que a terceira abordagem reflete
espacialização das relações econômicas no território como fonte de recursos e capital.
7 Em se tratando do processo de territorialização, Saquet (2010) caracterizao pela
complexidade, em função de componentes sistêmicos, das tramas sociais e pela
dinâmica de apropriação e reprodução de relações sociais. Nesse sentido, afirma que
cada sociedade produz seu território, bem como, territorialidades de modo consoante
com normas, regras e crenças de suas atividades cotidianas. Este autor entende a
territorialidade como característica da territorialização, exercício pelo qual se
compreende e se pratica tal processo.
8 Para Robert Sack a territorialidade humana é definida como “a tentativa de um
indivíduo ou grupo de afetar, influenciar ou controlar pessoas, fenômenos e relações,
através da delimitação e da afirmação do controle sobre uma área geográfica (SACK,
1986, p. 2122) (tradução livre)”, neste caso, a área ao qual se referese é constituída
pelo território.
9 Como proposta de identificação dos territórios constituídos através de processos
culturais, identitários e do cotidiano, Raffestin (2003) destaca quatro abordagens de
territórios, as quais são: o território do cotidiano, o território das trocas, o território de
referência e o território sagrado. O território do cotidiano consiste, propriamente, no
território atual, relacionado com a satisfação das necessidades e que reflete a realidade
de aspectos como tensão, conflito e distensão que são evidenciados pelas
territorialidades de todos os dias. No território das trocas as articulações entre
diferentes escalas espaciais e economia são perceptíveis através da fluidez de
mercadorias e pessoas em constante movimento.
10 Já no território de referência as relações entre a materialidade e imaterialidade,
memória individual e coletiva constituemse as principais características dessa
abordagem baseada na vivência no território e de sua expressão através da leitura
espacial. Enquanto que no território sagrado se evidenciam aspectos relacionados com
religião e à política, nas sacralidades e rituais que promovem a construção da
identidade de um território (RAFFESTIN, 2003).
11 A complexidade da cidade como um sistema que agrega transformações dinâmicas e
intencionalidades muitas vezes contraditórias, traz à tona, um espaço que é palco de
diferentes pontos de vista e distintas classes socioeconômicas. Desta maneira, este
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espaço de lutas de classes è publicamente visualizado e materializado como o espaço
público. Por definição, este espaço é na perspectiva de Borja e Muxi (2003), a própria
cidade, em função da história da cidade ser a mesma de seu espaço público.
12 Conforme Borja e Muxi (2003) é principalmente no espaço público que as relações de
poder e cidadania por parte dos habitantes da cidade se materializam. Nessa
conjuntura, o espaço público é o principal espaço abordado pelo Urbanismo, a medida
que este revela a cultura urbana, congregado em três esferas espaço público: o físico, o
simbólico e o político.
13 Gomes (2012) destaca a existência de dois tipos de compreensão de espaço público,
um vinculado à área física (ruas, praças, etc.), tema principalmente do planejamento
urbano e outro relativo à uma esfera abstrata e imaterial conformada na vida política e
na democracia, o qual é temática da ciência política. Segundo este autor, essas duas
perspectivas de espaço público devem dialogar entre si, dado que o espaço público físico
é a espacialização da política, moldada em interesses coletivos.
14 Com ênfase no papel do espaço público através de sua configuração física, Panerai
(2006) destaca a finalidade deste em promover a distribuição e a circulação de pessoas
e serviços. O espaço público para este autor diz respeito “a totalidade das vias: rua e
vielas, bulevares e avenidas, largo e praças, passeios e esplanadas, cais e pontes, mas
também rios e canais, margens e praias” (PANERAI, 2006, p. 7980).
15 Por sua vez, Caldeirón (2009) afirma que o espaço público constituise como a coluna
vertebral da cidade, em razão de permitir sua organização e unidade. Adiciona que os
mesmos são caracterizados pelo convívio por excelência e por promoverem a melhoria
de qualidade de vida dos habitantes da cidade. Ademais, enfatiza que através da
“criação destes lugares de encontro e socialização, as pessoas de distintas culturas e
condições sócioeconômicas podem apropriarse da cidade” (CALDEIRÓN, 2009, p.
24).
16 Na definição de Alvares, Vainer e Queiroga (2009) o espaço público não compreende
somente os espaços de propriedade pública, relacionados aos bens de uso coletivo,
como as ruas, praças, parques ou edifícios públicos, como também a qualquer lugar que
indique a apropriação pública, tais como em ações realizadas no âmbito da esfera
pública. A contribuição destes autores tange também na afirmação que, embora ocorra
a propagação da ideologia de que o meios de informação e telecomunicação
provocariam um encurtamento das distância entre a sociedade, e a transformaria em
um “aldeia global, o espaço público para eles ainda “constituise em totalidade concreta
no qual se processa a sociedade; tratamse,mesmo, de processos sócioespaciais; não há
história, nem técnica, fora do espaço (ALVARES, VAINER e QUEIROGA, 2009, p.
131)”.
17 Arendt (2002) por sua vez, explica que o fato de um espaço tornarse público não
significa que este se torne político. Para esta autora este sem a presença da política não
pode ser encarado como um espaço verdadeiramente público. Destaca que é somente no
“espaço públicopolítico” que o convívio entre cidadãos pode ser assegurado e
transmitido para futuras gerações através da cidade como um lugar democrático.
18 Alguns teóricos como Serpa (2007) guiam a discussão do espaço público aliada à
crise da cidade, em função de que no “espaço público da cidade contemporânea, o
“capital escolar” e os modos de consumo são os elementos determinantes das
identidades sociais” (SERPA, 2007, p. 13). Este autor também discursa sobre a
constituição das sociedades contemporâneas, por sua complexidade e pelo notável
aumento do abismo entre íntimo e privado, ou seja, entre a vida privada e vida pública.
19 Igualmente, Delgado (1999) afirma que o espaço público possui a tendência de
constituirse como um cenário em relação à estruturação social, no sentido de que sua
organização e vivência estarem relacionadas “em torno ao anonimato e a desatenção
mútua ou a partir de relações efêmeras baseadas na aparência, na percepção imediata e
relações altamente codificadas e em grande medida fundadas no simulacro e na
dissimulação” (DELGADO, 1999. p. 13).
20 Diante dessas proposições, Lefebvre (2001) já na década de 1960 traz à tona
discussões acerca do Direito à Cidade, relativo ao direito à vida urbana, à cidades
renovadas e transformadas mediante a vivência nas mesmas por seus habitantes. Para
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este autor, isto deve ser conquistado mediante à atividade participante do cidadão por
meio da apropriação.
Reconhecimento do território em
estudo: a cidade de Afuá
21 O município de Afuá está localizado sob as coordenadas geográficas 00º 09’ 04” de
Latitude Sul e 50º 23’ 15” de Longitude Oeste, ao norte do Marajó, no estado do Pará,
limitando–se a 76 km a NorteLeste de Macapá, no estado do Amapá, a maior cidade
nos arredores (ver figura 01).
Figura 1. Localização da cidade de Afuá.
Fonte: base cartográfica da Secretaria Municipal de Infraestrutura de Afuá e Google Maps, 2015.
22 A cidade de Afuá se diferencia do modelo de ocupação colonial tradicional (figura 2),
foi fundada no ano de 1845 e transformada em vila em 1889. A apropriação deste
território se deu em solo de várzea e sua estruturação principalmente em palafitas, o
que possibilitou a criação de um sistema de vias suspensas que ora conectamse por
meio de vias de madeira ora pelas vias de alvenaria presentes no trecho mais antigo
(DIAS e SILVA, 2011).
23 Os autores Lomba e NobreJr (2013) enfatizam a hidrografia como elemento inerente
tanto nas relações econômicas como sociais da cidade de Afuá, de maneira especial na
relação urbanorural materializados pelos mercados ou feiras. Além disso, Carvalho
(2013) mostra que a cidade também expõe suas características através do portos, este
que ligam a cidade à outras pelo acesso com rio, assim como pelo meio de transporte
empregado, a bicicleta.
24 A cidade de Afuá é uma cidade totalmente ciclável. A arquitetura desempenha um
papel muito importante na distinção do território afuaense, que se caracteriza pela
predominância de casas de madeiras em palafitas.
Figura 2. Vista aérea da cidade de Afuá.
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Fonte: www.skyscrapercity.com/, 2014.
25 Carvalho (2013) ainda destaca a composição da habitação em Afuá no que diz
respeito ao uso de cores marcantes nas fachadas, aos ornamentos, da mesma forma,
afirma que as habitações geralmente são formadas por dois ou três quartos, uma sala e
cozinha, sendo que esta última, um exemplo da cultura ribeirinha na cidade, pela
presença do "jirau", uma estrutura que se assemelha à uma bancada de pia,utilizada
para o preparo de alimentos.
26 No ano de 2000 o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística registrou, 29.505 mil
habitantes no município, sendo que 23% dessa população é urbana, o que constitui
cerca de 6.787 mil habitantes. No censo realizado em 2010, houve um aumento para
35.042 mil habitantes no município, com uma população urbana registrada em 9.478
habitantes.
27 Análises físicas
28 A cidade de Afuá está situada em um relevo de várzea, caracterizado segundo a
conformação das feições de relevo relacionadas ao Arquipélago do Marajó, o qual
apresenta duas regiões predominantes, a região dos campos, constituída pelo Planalto
Rebaixado da Amazônia sendo a mais elevada e a região dos furos, que constitui a
Planície Amazônica, a mais baixa (OTCA; GEF; PNUMA, 2012).
29 As cotas altimétricas de Afuá são baixas alcançam no máximo quatro metros. Em
função dessa característica, fenômenos de enchentes denominados de “lançantes” pela
população local, ocorrem períodos específicos em que as cotas dos rios aumentam e
inundam toda cidade (figura 03).
Figura 3. Típica lançante em Afuá.
Fonte: http://www.parachaves.blogspot.com.br/ , 2014.
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30 O trecho mais antigo da cidade constituise pela orla, a evolução da ocupação urbana
(conforme apresentado na figura 4) que se estende de noroeste a leste na cidade de Afuá
entre o período de 1890 a 1940. Por conseguinte, no intervalo dos anos de 1941 a 1980
esta foi dirigida do sentido norte ao centro do sítio urbano, além do que avança na
direção leste com a construção de um aeródromo (também conhecido como aeroporto
municipal).
Figura 4. Mapa de evolução e expansão urbana.
Fonte: mapa dos autores, 2015.
31 Já nos anos de 1981 a 2006, a cidade passa a sediar uma nova área denominada de
“Capimmarinho” ou “Capinlândia” com o vetor de expansão de nordeste a leste até os
dias atuais.A evolução da ocupação na cidade em um sítio alagadiço e de várzea
permitiu a formação de dois bairros principais: o Central e o Capimmarinho ou
Capinlândia.
Morfologia urbana
32 Em se tratando da forma da cidade, Kohlsdorf (1996) propõe estudos baseados em
categorias analíticas morfológicas, fundamentadas em projeções ortogonais do espaço,
tais como planta baixa, malha urbana, macroparcelas e microparcelas, entre outros,
tais quais revelam a morfologia da cidade e ajudam a identificar a forma da mesma, um
dos produtos das relações sociais no espaço. Essas projeções geométricas no plano
horizontal revelam a condição do parcelamento do solo na cidade. Com base nesses
estudos, foram elaborados mapas que mostram a relação das quadras e lotes, bem como
sua configuração geral através de um sistema de macro e microparcelas.
Figura 5. Mapa de macroparcelas e microparcelas.
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Fonte: mapa dos autores, 2015.
33 No que diz respeito à análise do sistema de macroparcelas (quadras), o tecido urbano
mostrase irregular (figura 5) em função dos polígonos irregulares que constituem as
quadras tanto no bairro Central como no Capimmarinho, com exceção de algumas que
começam a tomar formas retangulares neste último. Já no sistema de microparcelas, os
lotes exibem mais irregularidades quanto à forma em relação às quadras. No bairro
Central, as microparcelas são maiores variando de uma média de 10 metros de testada
a 50 metros de comprimento, aproximadamente.
34 Essa configuração se altera em alguns pontos no bairro Capimmarinho em que os
lotes sofrem redução em suas dimensões e, em alguns casos tornamse regulares.
Mostram que as macroparcelas começam a ser planejadas e por conseguinte, há uma
divisão mais formal e ordenada das microparcelas.
Conectividade viária
35 O mapa de conectividade mostra o grau de integração das áreas da cidade através da
malha viária, além de mostrar a hierarquia entre as ruas em relação a seus diferentes
usos. Esta técnica se embasa na teoria da lógica social do espaço ou sintaxe espacial,
que segundo Ribeiro e Medeiros (2012) “tem por foco o estudo das relações entre espaço
e sociedade (RIBEIRO; MEDEIROS, 2012, p.126)”, tendo como principais variáveis de
estudo a conectividade e integração da malha viária com os diversos espaços da cidade.
36 A conectividade corresponde às conexões estabelecidas por um determinado eixo
viário a qualquer outro sistema da cidade e é representada por um mapa axial formado
pelos eixos viários do tecido urbano, que de acordo com o grau integração permite a
visualização de uma gradação de cores que variam de cores quentes a cores frias,
respectivamente, das mais a menos conectadas.
Figura 6. Mapa de axialidade.
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Fonte: mapa dos autores, 2015.
37 Dessa forma, este mapa mostra que os eixos viários compreendidos na faixa imediata
da orla são mais integrados com os demais eixos, seguido de um eixo mais central da
cidade (denominado localmente de “rua do meio” e que sedia um número considerável
de pequenos comércios e serviços [ver mapa de uso e ocupação do solo) e que liga as
extremidades da orla com o tecido urbano central. Nesse sentido, percebese que a orla é
a área mais conectada com o restante da cidade.
38 Com relação à infraestrutura viária, notase duas tipologias de arruamento, ora as
vias são apoiadas e revestidas em madeira, ora em são construídas em concreto
armado. Ambas tipologias possuem em média aproximadamente três metros de
largura e cerca de um metro e cinquenta centímetros acima do solo em função da área
alagadiça e das cheias das marés. As vias em concreto armado alocamse na parte mais
antiga da cidade e contornam um considerável trecho da orla situada entre o Rio Afuá e
Rio Marajózinho enquanto que as em madeira compõem a maioria das vias na cidade.
A figura 7 exibe as referidas tipologias.
Figura 7. Vias em concreto armado e estivas de madeira.
Acervo: foto dos autores, julho de 2015.
Uso do Solo
39 Rocha e Forest (1998) enfatizam que a principal característica do uso do solo é o
mapeamento das relações socioeconômicas ocorridas no território, dentre as quais
manifestam as relações de apropriação do espaço. Nessa acepção, elaborouse o mapa
de uso e ocupação do solo no entorno imediato da orla de Afuá, que se deu mediante a
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coleta de informações in loco pelo autor. Tais informações, são tangenciais às
atividades e usos presentes nas microparcelas (lotes) e áreas predefinidas (no caso de
praças, portos, etc.) no trecho que varia aproximadamente de 100 a 300 metros
(distância aproximada das quadras no sentido leste/oeste, o que constitui o entorno
imediato).
Figura 8. Mapa de uso do solo do entorno imediato da orla.
Fonte: mapa dos autores, 2015.
40 Quanto as feições das atividades presentes na orla, estas se exprimem pela variedade
de usos incorporados na área. No trecho norte, os usos são predominantemente
residenciais, contudo, com uma ampla presença de pequenos portos, dentre os quais
são responsáveis pela ligação entre a cidade e as pequenas ilhas lindeiras do município
de Afuá.
41 No segmento oeste, a variação de usos é mais expressiva, encontramse desde
madeireiras, residências, pontos comerciais, áreas de uso misto, institucionais,
cobertura vegetal no interior das macroparcelas (lotes), até usos educacionais e
recreativos, com destaque aos espaços públicos (que são mais frequentes nesta área) e
dos portos (privados e municipal). Isto ocorre porque a “frente da cidade” é uma área
histórica, umas das primeiras áreas a serem ocupadas, que incorpora uma dinâmica
mais ligada com a capital do Estado do Amapá, Macapá, em razão das grandes
embarcações que atracam nos portos privados.
42 Já no trecho sul, os usos predominantes são constituídos pelo uso misto 1
(comércio/residência), pelos serviços ofertados pelas feiras municipais de produtos
alimentícios, companhia de eletricidade e cemitério, assim como alguns
estabelecimentos comerciais que são pontuais e os trapiches relacionados a estes.
Enquanto que a leste a cidade é circundada pela cobertura vegetal fechada.
Análises socioterritoriais
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Figura 9. Mapeamento dos trechos de maior e menor permanência.
Fonte: mapa dos autores, 2015.
46 No território das trocas a relação entre a formalidade e informalidade se evidencia na
economia urbana da orla de Afuá (figura 10). O movimento de pessoas é ocasionado
principalmente pela existência do mercado de carne, o qual possibilita a aproximação
da economia informal através de pequenos vendedores de hortaliças, frutas e de artigos
como roupas e utensílios domésticos. Essa relação igualmente ocorre nos mercados de
pescado e açaí, notase a presença de feirantes e ambulantes aos arredores destes. Além
disso, essa relação também ocorre com os portos, notase uma hieraquia entre portos
municipais, privados e trapiches não oficiais.
Figura 10. Relações formais e informais dos mercados e feiras no território das trocas.
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Fonte: fotos dos autores, 2015.
47 Em relação ao território de referência, através de questionários e mapas foram
localizados pontos nodais, marcos visuais e visão serial de território (Lynch, 1997),
estes importantes efeitos visuais estavam em sua maioria na orla da cidade: Igreja
Matriz, Trapiche, Mercado Municipal e Camera Municipal, “Quiosque da quadra” e
“Jambeirão” (pequena praça). Além disso, crianças representaram através de desenhos
a construção de seus territórios de referência, relativos à uma apreensão afetiva acerca
destes. As crianças cartografaram seus territórios vividos e as referências que possuem
no espaço público da orla da cidade de Afuá, nos quais puderam ser identificados
representações da orla, quadras e praças.
48 Em acepção ao território sagrado (figura 11), a simbologia das festividades e lendas
constituemse as manifestações das sacralidades que se dão principalmente pelas
festividades e lendas recorrentes ao longo da orla da cidade. Através de questionários,
os moradores das cidades elencaram uma diversidade de lendas relacionadas e das
festividades religiosas e festivais relacionadas com o rio. As lendas mais conhecidas são
a do Boto (Inia geoffrensis) e da Cobragrande que se refere à existência de uma enorme
cobra que habita abaixo da igreja matriz, ambas muito presentes na Amazônia
Brasileira. A festividade religiosa mais conhecida é a de Nossa Senhora da Conceição e o
Festival do Camarão como festa popular.
Figura 11. Representação do território sagrado no Festival do Camarão.
Fonte: www.prefeituradeafua.com.br, 2014.
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Considerações finais
49 A temática oriunda da territorialização do espaço público de Afuá, recebe devida
relevância quando se considera que os modelos de cidades ribeirinhas – citase a
condição/relação riovárzeacidade constituemse uma parcela importante das
cidades que formam a rede urbana da Amazônia, no sentido de que a compreensão
dessa realidade possibilita o conhecimento das relações socioespaciais e das
territorialidades da região.
50 As análises dos territórios mediante a consideração da cultura e do cotidiano
permitiram o conhecimento das territorialidades presentes nos espaços públicos de
Afuá. As diferentes abordagens percebidas em um mesmo território possibilitam a
compreensão da complexidade das relações socioespaciais da cultura ribeirinha de uma
cidade da Amazônia Setentrional Brasileira.
51 A interface desses territórios constituise como chave para a apropriação e
identificação social, tais quais devem nortear as práticas de planejamento e gestão
urbanas, assim como, aos projetos urbanos voltados para a apropriação do espaço
público, a fim de que os usuários, atores e/ou
52 agentes sociais neles envolvidos sintamse identificados e comprometidos com o
espaço que os envolve.
53 Compreender esses processos de apropriação no espaço e território urbanos como
fenômenos espaciais inerentes à articulação das relações sociais, tal como na orla de
Afuá, permite a leitura da cidade em diferentes escalas que, posteriormente, pode
subsidiar intervenções no âmbito de planos, programas e projetos urbanos a fim de
qualificar e promover o desenvolvimento sustentável de cidades.
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Table des illustrations
Titre Figura 1. Localização da cidade de Afuá.
Crédits Fonte: base cartográfica da Secretaria Municipal de Infraestrutura de
Afuá e Google Maps, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img1.png
Fichier image/png, 333k
Titre Figura 2. Vista aérea da cidade de Afuá.
Crédits Fonte: www.skyscrapercity.com/, 2014.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img2.png
Fichier image/png, 1,5M
Titre Figura 3. Típica lançante em Afuá.
Crédits Fonte: http://www.parachaves.blogspot.com.br/ , 2014.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img3.png
Fichier image/png, 1,2M
Titre Figura 4. Mapa de evolução e expansão urbana.
Crédits Fonte: mapa dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img4.png
Fichier image/png, 558k
Titre Figura 5. Mapa de macroparcelas e microparcelas.
Crédits Fonte: mapa dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img5.png
Fichier image/png, 267k
Titre Figura 6. Mapa de axialidade.
Crédits Fonte: mapa dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img6.png
Fichier image/png, 125k
Titre Figura 7. Vias em concreto armado e estivas de madeira.
Crédits Acervo: foto dos autores, julho de 2015.
http://confins.revues.org/11935#text 14/15
2017620 Territorialidade de espaço público em uma cidade ribeirinha na Amazônia Setentrional Brasileira – Afuá, Pará
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img7.png
Fichier image/png, 1,2M
Titre Figura 8. Mapa de uso do solo do entorno imediato da orla.
Crédits Fonte: mapa dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img8.png
Fichier image/png, 250k
Titre Figura 9. Mapeamento dos trechos de maior e menor permanência.
Crédits Fonte: mapa dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img9.png
Fichier image/png, 231k
Titre Figura 10. Relações formais e informais dos mercados e feiras no
território das trocas.
Crédits Fonte: fotos dos autores, 2015.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img10.png
Fichier image/png, 737k
Titre Figura 11. Representação do território sagrado no Festival do Camarão.
Crédits Fonte: www.prefeituradeafua.com.br, 2014.
URL http://confins.revues.org/docannexe/image/11935/img11.jpg
Fichier image/jpeg, 141k
Pour citer cet article
Référence électronique
José Marcelo Martins Medeiros, Jacy Côrrea Neto et Mariana Martins Medeiros,
« Territorialidade de espaço público em uma cidade ribeirinha na Amazônia Setentrional
Brasileira – Afuá, Pará », Confins [En ligne], 31 | 2017, mis en ligne le 08 juin 2017, consulté le
20 juin 2017. URL : http://confins.revues.org/11935
Auteurs
José Marcelo Martins Medeiros
Professeur à l'Universidade Federal do Amapá, medeirosjose@gmail.com
Jacy Côrrea Neto
Arquiteto do Núcleo de Estudos em Estética do Úmido, Curso de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal do Amapá, neto.scorrea@gmail.com
Mariana Martins Medeiros
Engenheira Florestal, Mestre em Ciências Florestais pela UnB, professora da Universidade do
Estado do Amapá, eng.marimedeiros@gmail.com
Droits d’auteur
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