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O PRIMEIRO REINADO
1 822- 1 83 1
3 . 1 . A CONSOLIDAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA
1 4. R,•rrato d,· IJ. /'edro /, gravura cm metal de Henrique José da Silva (autor) e Urban-i\fajsarc (gra
vador).
14fi /1/STÓRJA DO BRASIL
3.3. A CONSTITUINTE
em maio de 1 823.Na fala de abertura dos trabalhos, Dom Pedro usou uma
expressão indicativa do que poderia acontecer.A frase não era sua, sendo cópia
da existente na carta constitucional da França, de junho de 181 4, por meio da
qual o Rei Luís XVIII tentou retomar a tradição monárquica, após a derrota de
Napoleão.O imperador jurava defender a futura Constituição "se fosse digna
do Brasil e dele próprio".O condicional deixava em suas mãos a última
palavra.
Os membros integrantes da Constituinte não tinham nada de radicais.
Eleito pela Bahia, Cipriano Barata - revolucionário de 1817 e nacionalista
intransigente - negou-se a participar dela, por vê-la "cercada de mais de 7 mil
baionetas, tropas formadas de grande número de nossos inimigos portugue
ses".Mesmo liberais com ativa presença no movimento da Independência,
como José Clemente Pereira, Gonçalves Ledo e o Cônego Januário Barbosa,
tinham sido presos ou exilados.A maioria dos constituintes adotava uma
postura liberal moderada, consistente em defender uma monarquia consti
tucional que garantisse os direitos individuais e estabelecesse limites ao poder
do monarca.
Logo surgiram desavenças entre a Assembléia e Dom Pedro, apoiado a
princípio por seu ministro José Bonifácio.Elas giraram em torno do campo
de atribuições do Poder Executivo (no caso, o imperador) e do Legislativo -
uma contenda que iria repetir-se, em situações muito diversas, em outros
momentos da história brasileira.Os constituintes queriam que o imperador
não tivesse o poder de dissolver a futura Câmara dos Deputados, forçando
assim, quando julgasse necessário, novas eleições.Queriam também que ele
não tivesse o poder de veto absoluto, ou seja, o direito de negar validade a
qualquer lei aprovada pelo Legislativo.Para o imperador e os círculos políticos
que o apoiavam, era n.ecessário criar um Executivo forte, capaz de enfrentar
as tendências "democráticas e desagregadoras", justificando-se assim a con
centração de maiores atribuições nas mãos do imperador.
Os tempos eram de incerteza política.Menos de um ano após a Inde
pendência, em julho de 182 3, José Bonifácio foi afastado do ministério,
porque ficara espremido entre a crítica dos liberais e as insatisfações dos
conservadores.Estes viam com maus olhos o comando pessoal do governo
pelo ministro, que lhes fechava o acesso direto ao trono.Daí para a frente, na
Constituinte, para a qual foram eleitos, e nas páginas do jornal O Tamoio,
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1 5. D. l'rdm I t' Sua Ji/1111 Maria d11 Gltiria, lilografi:1 fcila cm l':1ris, cm 1 826, segundo quadro a óko de
D. A Siqueira.
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ram seus ataques através de O Tamoio; Cipriano Barata e Frei Caneca comba
teram a monarquia centralizada, respectivamente, na Sentinela da Liberdade
e no Tifis Pernambucano.
A atividade de Cipriano, em Pernambuco, não demorou muito.Após a
dissolução da Constituinte, foi preso e enviado para o Rio de Janeiro, onde
ficaria detido até 1 8 30.Como figura central das críticas ao Império, passou
então a destacar-se Frei Joaquim do Amor Divino - o Frei Caneca -, que
participara ativamente da insurreição de 1 8 1 7.O apelido indicava sua origem
humilde, como vendedor de canecas, quando garoto, nas ruas do Recife.
Educado no Seminário de Olinda, centro de difusão das idéias liberais, con
verteu-se em intelectual erudito e homem de ação.
A contrariedade provocada na província pela nomeação de um gover
nador não-desejado abriu caminho para a revolta.Seu chefe ostensivo, Manuel
de Carvalho, proclamou a Confederação do Equador, a 2 de julho de 1 824.
Carvalho foi u ma figura curiosa, casado com uma americana e grande ad
mirador dos Estados Unidos.No dia da outorga da Constituição de 1 824, antes
pois da rebelião, enviou ofício ao secretário de Estado americano, solicitando
a remessa de uma pequena esquadra ao porto do Recife, para contrabalançar
as ameaças à liberdade resultantes da presença de navios de guerra ingleses e
franceses.No ofício, invocava a recente doutrina fixada pelo presidente
Monroe, contrária à intervenção de potências européias nas Américas.
A Confederação do Equador deveria reunir sob forma federativa e re
publicana, além de Pernambuco, as províncias da Paraíba, Rio Grande do
Norte, Ceará e, possivelmente, o Piauí e o Pará.O levante teve conteúdo
acentuadamente urbano e popular, diferenciando-se da ampla frente regional,
com a liderança de proprietários rurais e alguns comerciantes, que carac
terizara a Revolução de 18 1 7.
A viajante inglesa Maria Graham, que esteve no Recife tentando alcançar
um acordo entre as partes, comparou, guardadas as proporções, o ambiente
do palácio governamental ocupado pelos rebeldes ao da Convenção Nacional,
na Revolução Francesa.Viu as dependências palacianas ocupadas por ele
mentos populares - verdadeiros sans culottes - de olhos arregalados e ouvidos
à escuta, à espera de traições e ciladas.
Apesar de seu conteúdo nacionalista, diríamos melhor antilusitano, a
rebelião contou com a presença de vários estrangeiros.Dentre eles, destacou -
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uma catástrofe financeira para as duas partes envolvidas.A paz foi alcançada
com a mediação da Inglaterra, interessada em restaurar as transações comer
ciais normais que o conflito aniquilara.O tratado que pôs fim ao conflito ga
rantiu o surgimento do Uruguai como país independente e a livre navegação
do Prata e de seus afluentes.Este último ponto interessava às potências euro
péias, especialmente à Inglaterra, e também ao Brasil.No caso brasileiro, às
razões econômicas mesclavam-se razões de natureza geopolítica, pois a nave
gação fluvial era a principal via de acesso à região de Mato Grosso.
Internamente, a guerra provocou o temido e impopular recrutamento da
população através de métodos de pura força.O rei decidiu contratar tropas no
exterior para completar as fileiras do exército.A maioria dessas tropas era
formada por pessoas pobres, que nada tinham de militares profissionais e que
se inscreveram na Europa com a perspectiva de se tornarem pequenos proprie
tários no Brasil.Como seria de se esperar, em nada contribuíram para fazer a
guerra pender em favor do Império.Para piorar as coisas, algumas centenas
de mercenários alemães e irlandeses, que faziam parte dessas tropas, se amoti
naram no Rio de Janeiro em julho de 1828.A situação se tornou muito grave,
e o governo viu-se forçado a recorrer à humilhante proteção de navios ingleses
e franceses.
Os gastos militares vinham agravar os problemas econômico-financeiros
j á existentes.O volume físico de alguns produtos de exportação, como o café,
aumentou consideravelmente ao longo da década de 1820, mas os preços do
algodão, couro, cacau, fumo e do próprio café tenderam a cair.As rendas do
governo central, dependentes em grande medida do imposto sobre as impor
tações, eram insuficientes.A Inglaterra impôs, em agosto de 1 827, um tratado
comercial que mantinha a tarifa privilegiada de 15% sobre a entrada de seus
produtos.Essa medida foi estendida depois às demais nações.
O Banco do Brasil, criado por Dom João VI em 1 808, entrou em difi
culdades desde 182 1,quando o rei, pouco antes de partir para Portugal, retirou
o ouro nele depositado.Dom Pedro recorreu à emissão de grande quantidade
de moedas de cobre, dando origem a falsificações e ao aumento do custo de
vida, sobretudo nos centros urbanos.Ainda não se empregava o termo "infla
ção", mas o deputado mineiro Bernardo de Vasconcelos j á falava em algo
parecido, quando aludia à "inchação" do meio circulante.
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