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INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS – ICJ


FACULDADE DE DIREITO

Philippe Rosa Portela

A moderna negação das virtudes:


De Aretê a​ ​der Wille zur Macht

Belém

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2017

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A MODERNA NEGAÇÃO DAS VIRTUDES:


De Aretê a ​der Wille zur Macht

Philippe Rosa Portela

RESUMO
O presente artigo se propõe a realizar uma breve análise conceitual do presente
estado de desordem da linguagem moral, indicando como uma de suas principais
causas, a perda do arcabouço tradicional que dava sentido aos conceitos e teorias
éticas. Verificar como se implantou o atual estado de incomensurabilidade moral e
conseguinte desordem social. O eixo central do presente trabalho se dá na
percepção que houve uma substituição das virtudes, como guias centrais da ação
humana, pela vontade.

Palavras chave: Virtude, moral, vontade

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INTRODUÇÃO​.
1
Alasdair MacIntyre , em uma de suas mais proeminentes obras, After Virtue, nos faz
uma proposição curiosa. Ele nos convida a imaginar um mundo no qual as ciências
naturais sofressem o efeito de uma catástrofe. A culpa por uma série de desastres
ambientais fosse atribuída, pela população em geral, aos cientistas. Resultando na
destruição da maior parte do conhecimento cientifico e na morte ou no
aprisionamento dos cientistas. Além da proibição do ensino das ciências naturais
nas escolas e universidades. Tempos depois, haveria um movimento de tentativa de
ressureição e resgate destas disciplinas cientificas. Porem só restariam vestígios,
meros fragmentos destituídos do contexto teórico que lhes dava significado.
Dessa forma, os indivíduos se valeriam de conceitos e teorias cientificas que
lembrariam em maior ou menor grau o que se conhecia como ciência antes desta
catástrofe. Porém, é inegável que haveria uma enorme arbitrariedade, e um fundo
subjetivista nas interpretações de fatos objetivamente incontestáveis, e talvez o pior,
os indivíduos desta sociedade não perceberiam o grave estado de desordem em que
as “ciências naturais” ou o que sobrou destas se encontraria.
MacIntyre nos apresenta esse recurso de pensamento para levantar uma hipótese.
De que em nosso mundo atual a linguagem moral está no mesmo estado de
desordem em que se encontram as ciências naturais do mundo imaginário por ele
proposto. Conforme MacIntyre “ we posses indeed simulacra of morality, we continue
to use many of the key expressions. But we have – very largely, if not entirely – lost
2
our comprehension, both theoretical and practical of morality”​

1- ORDEM E LOGOS
Para que seja possível a investigação filosófica e dialética pretendida, é necessário
compreender a tradição de pensamento da qual se trata. De tal sorte, analisar-se-á o
conceito de ordenação, central na tradição clássica grega – posteriormente vindo a
ser considerada uma virtude cardial cristã, na idade média-.
Para se ter ideia da importância da ordem para o pensamento ateniense é preciso
pensar o ​logos​. Que dentre muitos possíveis significados, unidos de certa forma na
língua grega, dentre eles: verbo; razão; conceito; pensar. Foi por Heráclito

1
​Filósofo Escocês, radicado nos EUA, reconhecido, principalmente, por suas contribuições para a
filosofia moral e política. Pesquisador Sênior do Centre for contemporary Aristotelian Studies in Ethics
and Politics (CASEP) na universidade metropolitana de Londres, Professor emérito de filosofia da
universidade de Notre Dame. suas principais obras são: “After Virtue” “Whose Justice? Which
Rationality?” E “Three Rival Versions of Moral Enquiry”
2
MACINTYRE, Alasdair. After Virtue​: ​A study in moral theory​. ​University of Notre Dame Press​, ​2007,
p. 2.
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conceituada como o principio organizacional, segundo o qual o cosmos ordena a si


próprio.
O verbo fala, então, o que dirá o cosmos? Estes “padrões” de ordenação seriam
exatamente a forma como o ​logos​ nos é transmitido, posto que superabundante e
transcendente, seria incompreensível, em sua totalidade, à racionalidade humana.
Ora, se em última instancia, todas as coisas se referem a inteligência que governa
todas as coisas (logos) toda estão ​ordenadas​ segundo a inteligibilidade que dela
emana.
“Este ​logos​, os homens, antes ou depois de o haverem ouvido, jamais o
compreendem. Ainda que tudo aconteça conforme este ​logos​, parece não
terem experiência em tais palavras e obras, como eu as exponho,
distinguindo-se em tais palavras e obras, e explicando a natureza de cada
3
coisa”

A própria sociedade ateniense também conta com uma ordenação, que de forma
fina, mantem a harmonia – através da ordem-. O homem ateniense, portanto, sabe
quem é através de seu papel, de sua natureza, e ao saber isto, sabe o que lhe é
devido. Tendo um entendimento claro das ações que lhe são exigidas e aquelas que
deixam a desejar daquilo que lhe e exigido.
MacIntyre ao caracterizar a ação entendida na Grécia antiga afirma: “ mas o
interesse de um indivíduo é sempre seu interesse enquanto esposa ou enquanto
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anfitrião ou algum outro papel” .
A importância de se entender isto é perceber o paralelo entre duas cosmovisões. A
grega clássica, e a moderna –pós iluminista-. O indivíduo ateniense não possui a
capacidade que é pressuposto para a filosofia moderna: A capacidade de abstrair-se
de forma completa de um ponto de vista particular, para então analisar e julgar este
ponto de vista “de fora”. E porque o homem ateniense não possui essa capacidade?
Porque não existe um “fora”, o homem que tentasse retirar-se de sua posição, ou de
seu papel, estaria tentando fazer com que ele mesmo desaparecesse, pois só há
sentido na ordem.
Portanto a ideia implícita nesta ontologia grega é o pertencimento. O indivíduo está
ligado, está verdadeiramente engendrado em sua comunidade, e não faz sentido
fora dela. De tal sorte que a própria ideia de virtude só pode ser entendida –só fara
sentido- quando herdada como parte de uma tradição.
“Uma tradição é uma argumentação, desenvolvida ao longo do tempo, na qual
certos acordos fundamentais são definidos e redefinidos em termos de dois
tipos de conflito: os conflitos com críticos e inimigos externos a tradição que
rejeitam todos ou pelo menos partes essenciais dos acordos fundamentais, e
os debates internos, interpretativos, através dos quais o significado e a razão

3
Diels-Kranz 22B1
4
MACINTYRE, Alasdair. Justiça de quem? Qual racionalidade. Edições Loyola, São Paulo, 2010. 4º
edição, p. 32
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6

dos acordos fundamentais são expressos e através de cujo progresso uma


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tradição e construída”

2- ARETÊ E O PAPEL DA PHRONESIS


Mas afinal, o que seriam as virtudes? Aristóteles considera que a natureza essencial
de qualquer coisa pode ser determinada ao avaliar seu propósito, seu fim. E este,
por conseguinte, pode ser descoberto pela observação da estrutura do objeto de
pesquisa e suas atividades típicas. Portanto, consiste em um método teleológico –
análise dos bens últimos das coisas, seu propósito, ou ainda, sua razão de ser-.
Aristóteles, também enxerga a existência de bens mais imediatos, que estariam
escalonados e “hierarquizados” em uma cadeia sequencial. Todos voltados ao bem
último, o bem supremo. Considerado assim pois escolhemos este por si mesmo, não
necessitando de algo superior que lhe conceda validade.
O ​telos​ humano, ou bem ultimo do homem é a ​eudaimonia. ​Traduzida como
felicidade. Devemos entender o ​telos​ humano não como um objetivo que pode ser
alcançado independentemente dos meios, o ​Telos​ do homem, na concepção
aristotélica, é um certo tipo de vida. Não é algo a ser alcançado em um ponto futuro,
como uma linha de chegada. Ele perpassa pela forma como toda a vida é
construída. A boa vida culmina na contemplação do divino, portanto ela se dirige
para um “clímax”.
Aristóteles, em ética a Nicômaco, conceitua virtude como a boa predisposição de
caráter para a escolha de ação excelentes. Excelência entendida como o ponto
excelente ou o “meio-termo”, entre o excesso e a deficiência. Logo, ações
excelentes, levam o homem ao seu ​telos.​ È importante observar que o cultivo das
virtudes, através do habito, forme “desejos excelentes” no homem. Portanto são
formas de agir e sentir.
“Por conseguinte, a virtude é uma disposição intencional, que repousa em um
meio-termo relativo a nós e determinado por um principio racional, qual seja
aquele que um homem prudente usaria para determina-lo. É um meio termo
6
entre os dois tipos de vicio, um de excesso e outro de deficiência”

As virtudes como expressões de racionalidade pratica, encaminham o homem ao


seu ​telos .”the virtues are precisely those qualities the possesion of which will enable
a man to achieve eudaimonia and the lack of which will frustrate his movement
7
toward that telos” ​ Desse modo, as virtudes não são somente disposições para agir
de certa forma, mas para também sentir de determinada maneira. Portanto agir
virtuosamente pode ser caracterizado como agir a partir da inclinação formada pelo

5
MACINTYRE, Alasdair. Justiça de quem? Qual racionalidade. Edições Loyola, São Paulo, 2010. 4º
edição, p. 23
6
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, 1106b36- 1107ª3
7
MACINTYRE, Alasdair. After Virtue​: ​A study in moral theory​. ​University of Notre Dame Press​, ​2007,
p. 148.
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7

cultivo das virtudes.“the immediate outcome of the exercise of a virtue is a choice


8
which issues in right action”
Destarte, cabe aqui fazer um pequeno parêntese, e distinguir os dois tipos de virtude
que Aristóteles define: as virtudes de caráter e as virtudes intelectuais. As primeiras
segundo Aristóteles seriam desenvolvidas pelo treinamento e aperfeiçoadas pelo
hábito. Torna-se corajoso o homem que age corajosamente de forma habitual.
Moldando sua ação e seu caráter para que se torne uma “segunda natureza”.
Enquanto as virtudes intelectuais são desenvolvidas pela instrução sistematizada, a
educação. Portanto devem ser repassadas ao mais novos, através da tradição. Este
é o caráter pedagógico da ética das virtudes. Devendo cultiva-las naqueles que
ainda não tem autonomia suficiente para escolhe-las prontamente.
A importância desta distinção é importantíssima, pois ajudara a responder o seguinte
questionamento: Se virtudes implicam na escolha de ações excelentes, em
situações praticas, como poderemos distingui-las e escolhe-las? Posto que tais
escolhas demandariam um julgamento. Ou seja, o exercício das virtudes requereria
a capacidade de discernir e realizar aquilo que fosse bom, no lugar certo, na medida
certa. E como seria tal, possível ?
Para Aristóteles, há um ​telos​ que a parte racional da nossa alma persegue, a
verdade. Porem a parte racional da alma não é meramente especulativa, ela se
preocupa com a ação. O que veio a se chamar razão pratica é o que se encontra em
Aristóteles como a parte calculativa da alma. E seu objetivo é a ação apropriada em
qualquer circunstancia em que o individuo se encontre. Para explicar como nossas
ações viriam a atingir esse fim racional, ou razoável. Aristóteles introduz o conceito
de ​phronesis.
Phronesis ​seria a virtude intelectual peculiar a ação correta. É o que se traduz por
prudência. Ou sabedoria pratica. “o que permanece, então, é que este [a phronesis]
é um estado verdadeiro, ponderado, e capaz de ação com relação as coisas que são
9
boas ou más para o homem”
Para Aristóteles a ​phronesis​ não só, é a virtude mais importante da parte calculativa
da alma, como é a mais importante virtude intelectual. Sem esta, nenhuma das
virtudes de caráter pode ser exercida. Pois além de condição necessária para ser
bom, ​a prudência​ é suficiente. Ora, mesmo o individuo que não seja versado, ou não
esteja habituado à pratica de todas as virtudes de caráter, através da sabedoria
pratica, é capaz de constatar qual o agir demandado dele, tornando-seportanto apto
a escolher de forma excelente. A ​phronesis​ fornece a intuição e a motivação para
10
agir bem, o Agir “kata ton orthon logon” ou seja, de acordo com a razão correta .

8
ARISTÓTELES. Eudemian Ethics 1228a1
9
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, 1140b4-6.
10
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, 1138b25
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Aqui podemos fazer o primeiro paralelo com a filosofia ética moderna, e por
conseguinte o Direito: Este julgamento jamais poderia ser somente a aplicação de
regras rotineiras, ou leis.
Há de fato pouca menção a regras, ou normas, em Aristóteles, pois ele toma esta
parte da moralidade -obediência a normas promulgadas pela cidade estado, que
proíbem ou encorajam certas ações, que estejam de acordo com a razão- como
ações que o individuo virtuoso já saberia refrear ou executar. Posto sua prontidão
para a excelência
E aqui se faz outro paralelo importantíssimo entre lei e virtude. Talvez o mais
importante paralelo de todos, para este trabalho: Saber como aplicar a lei – e a
formulação da lei em si - só é possível para aquele que possui a virtude da justiça.
Pois ser justo é dar aquele aquilo que lhe é devido.
Não há na visão aristotélica, essa cisão entre lei e moralidade. Trata-las como duas
dimensões distintas é uma ficção moderna, separando artificialmente, duas coisas
que fazem parte de uma só, naturalmente.
Desse modo o florescimento da virtude da justiça em uma comunidade se dá a partir
de dois pressupostos: a existência de um critério objetivo e verificável de
merecimento, e a existência de um acordo socialmente estabelecido para quais
seriam estes critérios. Assim, grande parte da distribuição dos bens e das punições,
fica a cargo do governo, sendo especificados nas leis da cidade. Porem, sempre
haverá casos no quais a lei não é suficiente, ou é incerto como aplica-la, ou não se
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sabe exatamente o que a justiça demanda . E nesses casos deve-se agir “kata ton
orthon logon”.

3- A TENTATIVA ÉTICA SECULAR E A VONTADE


“A ignorância apresenta esse defeito capital: é que, não sendo nem bela nem boa
nem inteligente, considera-se muito bem-dotada de todos esses predicados. Quem
não sente necessidade de alguma coisa, não deseja vir a possuir aquilo de cuja falta
12
não se apercebe” .
Diante do exposto, resta-nos analisar a visão moderna sobre a ética e sua
articulação, ou desarticulação, com o ideal clássico.
A modernidade, por uma serie extensa de motivos, procede a uma ruptura com o
ideal clássico de ética. Abandonando, ou mesmo negando muitos de seus acordos
fundamentais, promovendo, dessa forma, um desentendimento, uma falta dos meios
materiais para a correta interpretação e dialogo com a tradição clássica. Por não ter,

11
Ver Antígona; tragédia sofocliana que trata especificamente do embate entre a “lei divina” ou “lei
natural” e a “lei da cidade”.
12
PLATÃO. O banquete. 204a
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ou não perceber os pressupostos desta, nem o arcabouço intelectual que lhe dava
sentido.
A tentativa de encontrar e justificar um princípio ético normativo - seja ele fundado na
razão prática ou no princípio da utilidade, tendo em vista o fato do pluralismo das
concepções de bem e as várias formas de ceticismo moral em favor de
argumentações de caráter subjetivista, particularista ou também pragmatista - se
afasta da pergunta ética clássica sobre qual a melhor forma de vida e dissolve-se.

A primeira diferença, que salta aos olhos, entre estas duas formas de entender o ser
e o fazer, se dá na própria ideia de individuo. Destituído dos papeis e locais que lhe
davam sentido, é agora percebido como um ser “livre” sem amarras, analisado no
vazio, ele passa a ser o centro da discussão e do pensamento moderno. Sozinho,
13
isolado. Segundo MacIntyre , podemos identificar a sociedade moderna da seguinte
forma: “modern society is indeed often, at least in surface appearance, nothing but a
collection of strangers, each pursuing his or her own interests under minimal
constraints.”
A questão principal na modernidade se torna: Que regras devemos seguir? E porque
devemos obedece-las? Isto tem fundo na expurgação da teleologia aristotélica do
arcabouço moral. E na tentativa de estruturação de uma ética secularizada, que
acaba por nos deixar órfãos de propósitos ou objetivos concretos.
Se não existe uma fundamentação teleológica da realidade, o que nos resta para
fundamentar e organizar a vida? Um voluntarismo individualista, ou então uma ficção
moral, baseada no consenso. Uma alteridade artificial, com vistas na tolerância.
“Ronald Dworkin has recently argued that the central doctrine of modern
liberalism is the thesis that questions about the good life for man or the ends of
human life are to be regarded from the public standpoint as systematically
unsettlable. On these individuals are free to agree or to disagree. The rules of
morality and law hence are not to be derived from or justified in terms of some
more fundamental conception of the good for man. In arguing thus Dworkin
has, I believe, identified a stance characteristic not just of liberalism, but of
14
modernity. Rules become the primary concept of the moral life”

Quanto ao princípio da utilidade, usá-lo-emos para ilustrar o que se pretendeu dizer.


15
Usando a acepção de Jeremy Bentham do princípio utilitarista. A sociedade se
organizaria em prol daquilo que trouxesse o maior prazer para a coletividade, em
maior intensidade, e se afastasse da dor. Este é o ​telos​ utilitarista. Os indivíduos

13
MACINTYRE, Alasdair. After Virtue: A study in moral theory. University of Notre Dame Press, 2007,
p. 250-251
14
MACINTYRE, Alasdair. After Virtue: A study in moral theory. University of Notre Dame Press, 2007,
p. 119.
15
​Filósofo​ e ​jurista​ inglês, nascido em Londres. Foi dos últimos ​iluministas​ a propor a construção de
um sistema de filosofia moral, não apenas formal e especulativa,​ juntamente com ​John Stuart
Mill​ e ​James Mill​, foi tradicionalmente considerado como o difusor do ​utilitarismo
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estariam, nestes termos, submetidos a normas gerais que satisfizessem o bem da


maioria, pois o seu critério de validade é numérico, um simples calculo quantitativo.
Destarte, seguindo Nietzsche, ao levar estes pensamentos às ultimas
consequências, como deve-se levar. Chegaremos a conclusão de que se não há
nada na moralidade, pois expressões de vontade, minha moralidade só poderá ser o
que minha vontade cria. Não há, portanto, espaço para as ficções, e convenções dos
homens, como os direitos humanos, utilidade, a maior felicidade do maior numero.
Se o sujeito racional autônomo, racionalmente justificável, do iluminismo é uma
farsa, Nietzsche teria razão ao nos dizer que devemos então deixar a vontade
substituir a razão, e nos transformarmos em sujeitos morais autônomos, através de
um ato gigante e heroico de vontade?
“Até agora todos os seres têm apresentado alguma coisa superior a si
mesmos; e vós, quereis o refluxo desse grande fluxo, preferis tornar ao
animal, em vez de superar o homem? A alma olhava o corpo com desprezo, e
então nada havia superior a esse desdém; queria a alma um corpo fraco,
horrível, consumido de fome! Julgava deste modo libertar−se dele e da terra.
Irmãos meus, dizei−me: que diz o vosso corpo da vossa alma? Não é a vossa
alma, pobreza, imundície e conformidade lastimosa? O homem é um rio turvo.
E preciso ser um mar para, sem se toldar, receber um rio turvo. Pois bem; eu
vos anuncio o Super−homem; é ele esse mar; nele se pode abismar o vosso
16
grande menosprezo”.

A tese nietzschiana depende, porém, de um pilar central: Todas as reinvindicações


racionais de moralidade falharam. Logo, os princípios de moralidade devem ser
explicados em termo de uma serie de racionalizações que escondem o fenômeno
fundamentalmente não racional da “​der Wille zur Macht”​ ​ ou vontade de poder.

Nietzsche toma inicialmente este conceito de Schopenhauer. A vontade cega e


insaciável, uma força que estaria para além dos nossos sentidos. Una, ela
representa tudo que vemos, é o substrato que constitui a existência. Mas para
Nietzsche, a Vontade não está fora do mundo, ela se dá na relação. É impossível
uma só força, uma força única e indivisível, a vontade de potência se diz sempre no
plural. Sendo assim, o mundo seria este embate constante, sem equilíbrio possível,
apenas tensão que se prova pelo movimento, às vezes delicado, outras vezes
violento.
A vida é Vontade de Potência, mas não se pode restringi-la apenas à vida orgânica;
ela está presente em tudo, desde reações químicas mais simples até à
complexidade da psiquê humana. Ela é aquela que procura expandir-se, superar-se,
juntar-se a outras e se tornar maior. Tudo no mundo é Vontade de Potência porque
todas as forças procuram a sua própria expansão. Neste campo de instabilidade e
luta, jogo constante de forças instáveis, a permanência é banida junto com a
identidade: neste mundo reina a diferença. Força como superação, como constante

16
​NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Editora Companhia das Letras, 2011.
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ir para além dos próprios limites. “O mundo visto de dentro, o mundo determinado
17
por seu ‘caráter inteligível’ – seria justamente ‘vontade de potência’, e nada mais” .

A vontade se mostra como sede de dominar, fazer-se mais forte, constranger outras
forças mais fracas e assimilá-las. Quanto pode uma força? A onda sonora que se
expande, o ímã que atrai, a célula que se divide formando o tecido orgânico, o
animal que subjuga o outro são exemplos desta Vontade que não encontra um ponto
de repouso, mas procura sempre conquistar mais. Cada força, quando dominante,
abre novos horizontes, encontra novas passagens, cria novos caminhos.

Se, em física, potência é a capacidade de realizar trabalho; na filosofia, Vontade de


Potência é a capacidade que a Vontade tem de efetivar-se. Contra uma
interpretação rasa de Darwin, Nietzsche argumenta que o homem não pode e não
quer apenas conservar-se ou adaptar-se para sobreviver, só um homem doente
desejaria isso; ele quer expandir-se, dominar, criar valores, dar sentidos próprios.
Isto significa ser ativo no mundo, criar suas próprias condições de potência. É um
efetivar-se no encontro com outras forças. Se tornar senhor. Dominar e instituir sua
própria ética, sua própria moralidade. Construir o seu próprio bem. Tornar-se um
ser-humano novo, único e incomparável, “vir a ser aquele quem é”.

“Querer liberta: eis a verdadeira doutrina da vontade e da liberdade – assim


Zaratustra ensina a vós […] Para longe de Deus e dos deuses me atraiu essa
vontade; que haveria para criar, se houvesse – deuses! Mas para o ser
18
humano sempre me impele minha fervorosa vontade de criar”

A Vontade de Potência não é a vontade querendo potência, não significa que a


vontade deseja uma potência que não tem. A potência não é algo que possa ser
representado. Isso é julgar através dos valores já estabelecidos. Para Nietzsche é
exatamente o contrário: A potência é aquilo que quer na Vontade. E o que é a
potência? É um eterno ​dizer sim​. A potência se afirma na vontade quando diz “Sim”
ao devir. É a afirmação pura de sua própria efetivação, a alegria provém da
afirmação. E o sentido é o resultado destas forças.

4- CONCLUSÃO
Diante da análise do exposto podemos retirar duas conclusões: A falha do projeto de
secularização ética iluminista. As conclusões e frutos desse projeto não são capazes
de sustentar-se de forma coerente e racional. O que acabou por contribuir de forma
17
​NIETZSCHE, Friedrich. Além do Bem e do Mal.​ ​Editora Companhia das Letras, 2005. §36
18
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Editora Companhia das Letras, 2011.
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decisiva para o estado de desordem na linguagem moral. E após a verificação desta


primeira conclusão, inferimos logico-dedutivamente que só restam duas posições
defensáveis: A tradição Nietzschiana ou a tradição Aristotélica.
Me permito aqui inferir que defender ou não a posição de Nietzsche, em última
análise significa responder a um questionamento: estávamos certos em rejeitar
Aristóteles? Acredito que não. Aristóteles é o filosofo que melhor nos oferece um
entendimento completo acerca da ética e da moralidade – entre muitos outros, diria
quase todos, os assuntos- sendo, sua posição não somente defensável, como sua
tradição de pensamento a mais robusta e coerente racionalmente. Pois a posição
nietzschiana, por mim é considerada irracional, posto que os problemas por ele
propostos perduram, e suas soluções desafiam a própria razão.
Por último, me satisfaço com uma simples máxima, que é melhor compreendida
exatamente pela tradição aristotélica das virtudes. A ética não faz sentido sem o
telos​, qual poderia ser o propósito de uma razão pratica sem O bem? Corrigiríamos,
educaríamos e elevaríamos a alma humana para que?

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco.
ARISTÓTELES. Eudemian Ethics.

Diels-Kranz.

MACINTYRE, Alasdair. After Virtue: A study in moral theory. University of Notre


Dame Press, 2007
MACINTYRE, Alasdair. Justiça de quem? Qual racionalidade. Edições Loyola, São Paulo,
2010. 4º edição

NIETZSCHE, Friedrich. Além do Bem e do Mal.​ ​Editora Companhia das Letras, 2005
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Editora Companhia das Letras, 2011
PLATÃO. O banquete

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