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A cidade e os citadinos

Colette Pétonnet
Referência: André Leroi-Gourhan ou les Voies
de l’Homme. Actes du colloque du CNRS, mars 1987. Paris,
Albin Michel, 1988, pp. 115-121. ISBN 2-226-03270-3.

Agradeço a meus pares pela oportunidade de exprimir publicamente em que


linha me situo, em quê e de que maneira minhas pesquisas no meio urbano, mais
frequentemente num ambiente parisiense, são devedoras de André Leroi-Gourhan.
Mas é com emoção que eu lamento que seja necessário render homenagem a sua
memória para que a tal ocasião me seja dada. Pois, eu creio, ele teria gostado de ouvir
evocar ao mesmo tempo um caminho que se distancia cada vez mais e algumas de suas
lições que o balizam no seu transcurso e me autorizam a segui-lo até os limites
extremos.
Para mim, sua herança não consiste em frutos maduros a serem colhidos, mas
em sementes capazes de germinar em qualquer terreno. É esse aspecto que eu gostaria
de mostrar ao expor meu caminho, em vez de algum detalhe de meus trabalhos mais
diretamente inspirado em seu pensamento.
Importava pouco a Leroi-Gourhan que os estudo se situe dentro da sociedade do
observador na medida em que o pesquisador se esforçava “para fazer estrangeiro a seu
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próprio meio” .
Todas as manhãs, durante muito tempo, tomei a Estrada do Val-de-Marne como
se parte em viagem, uma viagem de aventura. Quando eu sentia meu olhar enfraquecer,
eu mergulhava numa obra etnológica sobre Amazônia ou o Sepik. Mas como discernir
um objeto na floresta de HLM, na urbanização galopante dos anos sessenta? Se a
etnologia era “a análise livre e direta da composição [ou conjunto - “assemblage”] dos
materiais dos quais se constitui uma coletividade tida por única”, o que era uma
coletividade na periferia parisiense? A escala de uma ​commune​, talvez, só que bem

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As citações são extraídas de A. ​LEROI​-​GOURHAN​, “L'expérience ethnologique”, in Ethnologie générale,
Paris, Gallimard, “Encyclopédie de la Pléiade”, 1968.
mais vasta. Eu comecei prudentemente – eu diria quase de maneira iniciática – por uma
monografia e escolhi estudar uma cidade [cité] de trânsito, destinada aos barracos das
favelas [taudis] parisienses, e fenômeno naquele tempo bem pouco conhecido.
Era uma escolha criticável que eu não recomendo aos debutante? A Cidade
[Cité] tinha apenas quatro anos de idade, era povoada por pessoas de todas as origens,
misturadas arbitrariamente pela Administração. Nenhuma ligação interna permitia
defini-la como grupo e nada distinguia seus habitantes dos outros proletários. Mas todo
o ambiente, incluindo a Administração, apontava “esse pessoal aí” com o dedo como se
fossem réprobos; a Cidade [Cité] tinha um estatuto à parte e carregava um sobrenome:
Chicago. Ela tinha, portanto, lugar nessa definição: “a etnologia estuda indivíduos que
constituem grupos e que se percebem ou são percebidos como unidades distintas”.

Por ser falaciosa, essa unidade imposta desde o exterior, essa unidade imposta
desde o exterior nem por isso deixava de ser um dado a ser levado em conta. Nessa
época eu só consegui dar testemunho sobre a vida material e as mentalidades
proletárias, sem poder capturar, naquele momento, à falta de comparação, o que era
intimamente próprio da Cidade (eu soube mais tarde que todas se parecem, mas
fabricam cada uma seu estilo). Eu não cheguei também a ordenar meus materiais
segundo uma problemática interessante. Eu tinha ao menos cumprido minha função
etnográfica, “esse elemento insubstituível da constelação das ciências do homem”. Era
necessário continuar para além desse primeiro estágio. Mas como fazê-lo?

Proletários, havia um pouco deles em toda parte nesse espaço nebuloso. Eu pedi
conselho ao mestre. Ele disse: “É preciso encontrar [dégager] as constantes” Me lancei
novamente à caça com esse único viático, dessa vez ao loNgo do Sena, sobre o antigo
cais onde se comprimiam cabanas miseráveis. Dessas cabanas, eu fiz a recensão sem as
correntes de um topógrafo, contando meus passos, e para o interior, me fiando no
modelo [referência] do leito conjugal. Eu penetrava enfim num verdadeiro grupo étnico
composto de aliados, que me oferecia o contraste e as similitudes das quais eu
precisava. Em seguida, o comparei a dois grupos do mesmo tipo, dentre eles, uma outra
etnia, expandindo o campo de minhas explorações em várias cidades [cités] nas quais os
franceses tinham sofrido a dispersão que os Estrangeiros das favelas [bidonvilles] iriam
sofrer em breve, e que eu acompanhei em toda a largura do departamento
[département]. Essa comparação me permite estabelecer a que leis semiconscientes
obedecem os povoamentos [peuplements] (e, por outro lado, a desordem realizada pelo
arbitrário administrativo) na linha dessa outra definição de nosso papel que consiste “em
encontrar [dégager] as fórmulas de equilíbrio dos grupos humanos”. Durante essas
pesquisas, eu estava estritamente agarrado aos fatos e gestos da vida cotidiana: o
conteúdo da geladeira, a escolha da roupa, a cor de um muro, o cheiro das escadas, o
fogo e a água, os cachorros e os pássaros, o roubo de uma caixa de conserva, o
empréstimo de um punhado de moedas, todas coisas banais menos conhecidas no seio
das sociedades do que as trocas de prestígio. Me foi necessário algum tempo para
restituir o todo. Mas já havia nascido um nova corrente que chamamos etnologia
urbana. Esse termo, de importação americana, não me convém, pois ele atribui à
etnologia limites intra-muros no momento em que o modernismo industrial quebrou
todas as barreiras. Por outro lado, eu tinha trabalhado junto aos homens sem me
preocupar além da medida da urbanidade. No entanto, minha experiência da cidade
[ville] é longa e, ao invés de me esquivar a esse respeito, eu tento, ao contrário,
estabelecer uma reflexão mais próxima da acepção restrita do termo. Eu penso que nas
grandes cidades [villes] atuais, ocidentais ou não, é mais do que nunca necessário
“compreender primeiramente em quê os grupos são personalizados e diferentes”. (A
sociedade dita de massa é sem dúvida uma ilusão). Mas eu penso também que quando
tiver passado pelo crivo todos os grupos – eu prefiro dizer os meios/contextos [milieux]
— étnicos, profissionais, religiosos, esportivos, etc. e desvendado suas redes, não se terá
atingido a essência urbana.
Essa essência está em parte contida no movimento perpétuo, a multidão e o
anonimato protetor dos indivíduos, e a combinação desses três termos esconde [recèle]
os mecanismos de equilíbrio dos quais eu adoraria descobrir [déceler] as leis. Talvez
será necessário abordar a mecânica dos fluidos. Por ora, estou tentando me aproximar
dos fenômenos de maneira menos fugitiva que numa rua e encontrar balizas. Escolhi,
portanto como campo de pesquisa [terrain d'enquête] espaços públicos específicos e
diferentes nos quais o movimento lento da passagem das pessoas me deixa um pouco de
tempo para a observação. O primeiro desses campos é o cemitério do Père-Lachaise
constantemente atravessado por visitantes, onde eu abarco de uma só vez o século XIX
e o tempo presente. Eu não trabalho em tanatologia, nem no registro da estética
funerária, nem em tecnologia dos que trabalham com mármore, mas no repertório de
atividades que os homens inventam para si: passeios, peregrinações, devoções sobre
tumbas célebres, transmissão do conhecimento aos visitantes e aos turistas estrangeiros,
atenções à fauna e à flora. vigília às sepulturas. Essas atividades são o fato habitual cuja
presença é submetida a frequências variáveis. Foi-me necessário aprender a língua
esotérica e codificada empregada exclusivamente para endereçar a palavra a outro. À
medida em que progrido, cresce minha participação. Essa linguagem na base de pedras
lápides, de estética e de tecnologia criada, no anonimato que ele não suprime,
graduações que as pessoas dominam e com as quais elas jogam. Os visitantes são objeto
de uma análise e de uma descoberta constante, exercício ao qual me entrego também.
Minhas observações me remetem à noção de particularização e o fator multidão do
Père-Lachaise não é mais uma desconhecida para mim. No entanto, permanece
incapturável porque a quase totalidade dos atores se renova quase diariamente, mesmo
se cada um deles – é uma hipótese – representa cada vez as mesmas categorias, grupos
ou meios [milieux].

Sobre os segundos campos, mais difíceis, não direi nada, por falta de tempo, e
porque prefiro falar de uma outra experiência. É para uma finalidade totalmente
diferente que eu estudei New York em todos os sentidos, para servir um velho projeto: o
projeto de levar a cabo, do outro lado do Atlântico, pesquisas comparativas no seio do
proletariado. A escolha aí é bastante grande, mas o Gueto negro me atraiu mais porque
ele se inscreve no prolongamento da minha hipótese segundo a qual o equilíbrio das
sociedades poderia repousar na existência de um estrato inferior – ou seja, mantido num
estado ou um estatuto de inferioridade. Eu caminhei horas no Harlem, visitei lojas,
clubes e cafés, segui enfermeiras a domicílio, e frequentei assiduamente igrejas
miseráveis na esperança de em algum lugar penetrar num microcosmo qualquer. Meus
contatos, que permaneceram superficiais ou sem amanhã, não me permitiram. Sendo a
acolhida mais íntima no seio da classe média intelectual negra, eu mais uma vez
barganhei um acesso às redes de amigos ou de parentes. Não me foi dado. Fiquei
reduzida à relação individual que não se prolonga, nem no tempo, nem no espaço. É
devido à discriminação ou à essência urbana? Não sei. Em todo caso, as dificuldades da
pesquisa em Nova Iorque me levou de volta, com uma visão comparativa que eu não
estava buscando, aos contatos anônimos e efêmeros, a rua, a cidade [ville] o fenômeno
urbano, a Paris, onde eu posso mais facilmente trabalhar em nuançar a indiferenciação
da multidão.

Jogar o jogo da etnologia urbana consiste, para mim, em me deixar levar pelo
movimento da cidade [ville], em exercer a observação em outras partes além dos
grupos. A cidade [ville] é um espaço-tempo indissociável e indissociado. Eu não posso
discernir qualquer coisa que não seja da ordem da matéria organizada, tudo que posso é
avistar, aproximar, mas não capturar nem dominar. Eu não posso apresentar a vocês um
pensamento organizado, uma vez que aquilo de que tento me aproximar escapa pelo
movimento e a fluidez. Mas eu não estou nem em contradição, nem em confusão. Na
perseguição do aleatório, eu parto sempre da coleta de fatos, por mais irrelevantes e
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escassos que eles sejam .

Leroi-Gourhan não me desaprovaria. Ele continuaria me encorajando. E se me


dissessem que estou longe dele por esse caminho, e responderia que se pode distância
até ao infinito e continuar no mesmo prolongamento. Não é isso a filiação?

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​Cf. C. PÉTONNET, ​L'anonymat ou la pellicule protectrice​, in Le Temps de la réflexion, VIII, Paris,
Gallimard, 1987.

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