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nOTA bENE v. 1, n. 1, p. 125-128, jul.-dez.

2015

Aquém e além do formalismo:


Henri Focillon e a vida das formas
Before and Beyond Formalism: Henri Focillon and the Life of Forms

Laura Erber*
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – Rio de Janeiro – RJ – Brasil

Artistas são como nuvens.


(Richard Tuttle)

Tudo é forma, e a própria vida é uma forma.


(Balzac, citado por Focillon)

Quando nos referimos hoje à crítica laços ainda existentes entre modernismo
formalista, a expressão frequentemente e o último suspiro da expressividade
arrasta consigo, ainda que possivelmente romântica. Greenberg certamente con-
a contragosto, uma forte tonalidade tribuiu para a construção da imagem
depreciativa. Em geral isso se deve à cool da arte moderna enquanto seus
associação instantânea entre formalismo oponentes passaram a conectá-lo aos
e a presumida assepsia do discurso crítico aspectos mais ranhetas da crítica forma-
moderno, que teve, no último século, na lista.
figura de Clement Greenberg, um de seus No campo do pensamento estético, o
mais admirados e detestados representantes. conceito de forma, que mais tarde derivaria
E, no entanto, foi apenas no início dos na vertente formalista de estudo da arte,
anos 70, com o ensaio “A necessidade esteve inicialmente atrelado e por muito
do formalismo” (1972), que Greenberg tempo condicionado pela platônica teoria
passou a empregar positivamente o termo das ideias. No final do século XIX, e após
formalismo, utilizando-o para sublinhar o diversos golpes de antitranscendentalismo
rigor frio da arte modernista cortando os e recusa do idealismo filosófico, a noção

* Artista visual, escritora e professora adjunta do Departamento de Teoria do Teatro da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (Unirio). Doutora pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro com tese sobre os pactos verbais
no cinema de Carl Theodor Dreyer.

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de forma “desce à terra”1 e passa a ser estariam destinadas, pensando a forma e


compreendida (e empregada) no plano da os materiais que a ela resistem, e trazendo
imanência, como acontecimento concreto, para um mesmo nível de observação
presente no espaço e no tempo. A partir de alguns fenômenos considerados menores
Kant, a noção de forma determinou tanto o e as formas artísticas, permitindo estudar
juízo de gosto quanto as definições do belo arabescos decorativo-ornamentais numa
artístico. Nessa descida, o interesse pela continuidade com formas arquitetônicas e
forma foi metabolizado pelo projeto de escultóricas propriamente ditas.
situar os fenômenos artísticos como visibi- Um pequeno livro, já há muito es-
lidade pura, expurgada dos excessos histo- gotado, que o leitor encontrará apenas em
ricistas, e da causalidade cronológica. A for- sebos por obra do acaso e com sorte, pode
ma, de certo modo, se liberta – e com ela ajudar a colocar em perspectiva a noção
a arte, que pode ser lida como interrupção de forma e sua relevância para a renovação
da lógica causal, abolição ainda que mo- da história e da crítica de arte. Vida das
mentânea do holismo explicativo, o que formas, de Henri Focillon, editado no Brasil
tampouco impede que a forma logo seja em 1981 pela editora Zahar, com tradução
reapropriada. Será isolada e reapropriada de Léa Maria Sussekind Viveiros de Castro,
pela psicologia, tornando-se o objeto privi- é ainda hoje uma leitura importante para
legiado dos psicofisiologistas da virada do essa discussão. Não apenas pela elegância
século, como Alois Riegl, Heinrich Wölfflin do pensamento de Focillon, mas por
e Wilhelm Worringer, e depois mais intensa- oferecer uma versão do método formalista
mente interrogada pelos purovisibilistas alternativa àquela a qual nos habituamos
da Nova Escola de Viena, tais como Hans a encontrar no debate crítico norte-ame-
Sedlmayr e Otto Pächt que, sob a influência ricano, profundamente ancorada no credo
de Riegl, estudavam os fenômenos artísticos da objetividade analítica.
em sua autonomia formal, ou em seus jo- O livro de Focillon divide-se em
gos de configuração intra-artísticos (autode- cinco partes e cada uma delas desdobra
terminação formal), dando ênfase à análise uma diferente definição de forma. Logo
estrutural e evitando ao máximo a propensão de início Focillon mostra que para ele o
ao poético e vago das análises de cunho mundo das formas é um mundo paralelo
simbólico, que se contentavam em elucubrar ao da natureza, mas também distingue a
sobre o sentido formal sem interrogar mais vida das formas do funcionamento sígnico:
frontalmente os aspectos propriamente “o signo significa, a forma se significa”.
formais de cada forma. A importância dessa Essa afirmação é crucial para se entender
primeira grande onda formalista deve- as consequências da proposta de Focillon,
se muito ao fato de ter chamado atenção que também diferencia a compreensão ou
para a relação intrínseca das formas artísti- leitura da forma da leitura imagem:
cas, independentemente da função a que
Seremos sempre tentados a procurar na
forma um outro sentido além dela mesma
1 Pedro Sargento oferece uma leitura da deriva pós-he-
geliana do conceito de forma no ensaio Se um conceito e de confundir a noção de forma com a
desce à terra: a implementação da forma artística na obje- de imagem, que implica a representação
tualidade e na presencialidade. Actas das Terceiras Jor-
nadas Internacionais de Jovens Investigadores em Filosofia,
de um objeto, e, sobretudo, com a noção
Évora: Grupo Krisis, Universidade de Évora, 2012. de signo. (1981, p. 13)

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Ou seja, a forma não é o envoltório marcada pela figura de Gustave Geoffroy,


ou silhueta do sentido. Entender a forma a quem ajudou como assistente no am-
enquanto tal, sem atribuir-lhe valor de bicioso livro sobre os museus europeus,
símbolo ou de signo é o desafio a que se publicado em 1900, Les Musées d’Europe.
propõe Focillon. Esse método formalista Atraído pela tradição germânica de estudo
surgiu a partir de suas pesquisas sobre arte da arte, Focillon introduziu na França as
medieval, onde as formas da arquitetura metodologias de Heinrich Wölfflin e Adolf von
românica tiveram um peso especial. O Hildebrand. Surpreendentemente para a
método de Focillon foi duramente criticado carreira que havia escolhido, não dominava
em um artigo de 1931 sobre Mossiac em que outras línguas além do francês, sua aversão
Meyer Shapiro acusava-o de negligenciar pelo estudo de outros idiomas era tão
a iconografia e o simbolismo e dar ênfase notória quanto sua eloquência e poder de
demasiada à forma, numa perspectiva que, persuasão. Fugindo da guerra, fundou em
segundo ele, merecia pouca credibilidade. 1942, com Claude-Levi Strauss, Alexandre
Nos anos trinta, tanto Focillon quanto Koyré e Jacques Maritain, a Escola Livre
Shapiro emergiam na cena crítica como de Altos Estudos de Nova York. Durante
renovadores do medievalismo, publicando muitos anos foi professor de arte medieval
importantes trabalhos sobre escultura na Sorbonne e, depois, na Universidade de
românica. Ambos compartilhavam o inte- Yale. Seus cursos foram determinantes na
resse acentuado pela forma e minimizavam carreira de alguns dos mais significativos
seu significado religioso. Porém, à diferença historiadores da arte do século XX: André
de Shapiro, Focillon preferiu pensar a Chastel, Louis Grodecki e Charles Seymour
iconografia de modo mais provisório e foram seus alunos, sua metodologia teve
dinâmico, sublinhando sempre a separação ainda importantes consequências sobre o
entre forma e significado. Para Focillon estruturalismo de Greimas. Embora não
a iconografia poderia ser pensada nos se refira a ele, é possível ver no estudo
termos de um magnetismo entre forma e de Deleuze sobre Leibnitz e o Barroco
sentido, em que a forma pode atrair ou (A Dobra) uma afinidade com a vida das
repelir diferentes significados, pode ser formas de Focillon.
“preenchida” de modo inusitado, mas No capítulo As formas no tempo, com
também pode sobreviver após a morte do que conclui o livro, Focillon questiona a
conteúdo nela depositado, sempre levando noção de cronologia e interroga a natureza
em conta que esses são significados re- do tempo histórico e sua relação com a
cebidos e acolhidos pela forma enquanto emergência das formas artísticas. Para ele,
que o conteúdo fundamental da forma a vida das formas deve ser pensada em seu
continuaria a ser um conteúdo formal. momento, mas esse momento não deve ser
Focillon cresceu em um meio artísti- entendido como um “um ponto qualquer
co, tendo conhecido na infância Gustave sobre uma linha reta, mas uma inchação,
Rodin, porque seu pai, Victor-Louis um nó.” E diz isso para logo a seguir afirmar
Focillon era um gravador bem reputado, a crucial – embora não absoluta – autonomia
de quando em quando convidado para operativa da arte, desgarramento em relação
escrever resenhas críticas sobre os salões de ao tempo e ao contexto em que emerge. Por
pintura de Paris. A formação de Focillon foi esse motivo algumas formas sobrevivem por

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muito tempo depois de terem desaparecido Essa ideia de arte como interrupção
as intenções e as funções. Para Focillon, do tempo cronológico traz à tona um
existe um corte não suturável entre a forma debate que, décadas mais tarde, viria a
artística e a sua origem. Refuta o Zeitgeist, ser um dos pivôs da crise e da renovação
a cultura da época e a genialidade do da história da arte como disciplina. Essa
artista como fatores mais profundamente interrupção momentânea do tempo
determinantes da criação das formas. Dinâ- histórico caracterizaria o acontecimento
mica, pluralidade, antinomia e tempo formal, sendo que acontecimento é,
iridescente são as noções que mobiliza, para Focillon, “uma precipitação eficaz”,
fazendo convergir a noção de arte com e essa precipitação, um modo de agir
a de forma, numa visão materialista que sobre o tempo, não mais o tomando
dialetiza a relação entre forma e matéria. A como um fator de conformação passiva
arte importa, portanto, enquanto fenômeno das formas emergentes. Há assim um
visível e concreto, seu engendramento constante tensionamento entre forma e
e sua vida se dá numa dinâmica de dife- história. A precipitação de uma forma
renciação que tem como base o tempo. num determinado momento não é forço-
E é na abordagem do tempo que Focillon samente uma inovação absoluta, e pode
se mostra muito mais atrevido que seus acontecer de produzir um acontecimento
predecessores formalistas, pois é o primeiro formal que não seja um acontecimento
que, certamente influenciado por Bergson, histórico.
rompe totalmente com a linearidade Nessa lógica de disjunções e fricções
cronológica e com o historicismo positivista. entre o histórico e o formal, Focillon
Para Focillon as formas não estão nem desloca a atenção da interpretação das
“suspensas acima do tempo” nem dele re- formas para as condições internas de sua
sultam como num experimento com ele- irrupção, ou individuação (Simondon/
mentos químicos em contato, o próprio da Deleuze), enfim, para a lógica criadora,
vida das formas é sua intempestividade. sem recair no obscurantismo da genialidade
Na parte final do livro se delineia mais cla- do artista como causa. Nessa colocação
ramente a ideia de inatualidade da arte deri- do problema da forma, Focillon desfaz
vada de sua compreensão de forma como o reducionismo a que havia conduzido
fenômeno autônomo, mas não impermeável a noção tradicional de estilo, enquanto
às circunstâncias em que emerge. inaugura uma abordagem radicalmente
antideterminista, entende que não é a
O estágio da vida das formas não se história que cria a vida das formas, mas
confunde automaticamente com o
é a vida das formas, em seu ímpeto
estágio da vida social. O tempo que
comporta a obra de arte não a define metamórfico contínuo, que age sobre a
no seu princípio nem na particularidade vida histórica.
de sua forma. [...] O artista habita
uma região do tempo que não é,
obrigatoriamente, a história do seu Recebido: 19 de agosto de 2014.
tempo. (1981, p. 122-123) Aceite: 17 de setembro de 2014.

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