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Nietzsche
G.K. Chesterton e F. Nietzsche
“Era Deus quem, nos últimos dias da Criação, se aninhou sob forma de serpente debaixo
da árvore do conhecimento. Então, ele recuperouse de ser Deus. O diabo é apenas o
descanso de Deus nesse 7º dia.” Nietzsche
Na reconstituição do diálogo virtual entre Chesterton
e Nietzsche efectuado pela sociedade
chestertoneana americana, assistimos ao confronto
entre o pensamento doentio de um escritor louco,
solitário e contraditório, e o pensamento sóbrio de
um homem são, com família e senso comum.
Friedrich Nietzsche (18441900), era uma criança obediente e terna, bondosa, submissa
e respeitadora, "o pastorzinho". Esse foi um dos seus paradoxos. A miopia, que o
conduziu à cegueira, foi uma das ironias da sua vida. A sua exaltação dos fortes e o
aniquilamento dos fracos foi, não só um paradoxo, mas uma miopia.
Muitos atribuem à sífilis terciária a loucura de Nietzsche, incluindo Dale Ahlquist. Mas em
Leipzig, onde Nietzsche terá frequentado prostitutas e bordéis homossexuais, ele já era
adepto do pensamento de Schopenhauer. E existe aquele pequeno detalhe de que a
sífilis terciária só se manifesta 8 a 30 anos após a primoinfecção. E, claro, existem outros
problemas a considerar: nem toda a neurosífilis produz paranóia e nem toda a paranóia
que ela possa causar implica um ódio profundo ao ser humano. Há escritores paranóicos,
como Franz Kafka, que parecem sofrer, mas têm empatia, compaixão e um esforço
construtivo. Parece que o papel fundamental e determinante da personalidade prévia e
do livrearbítrio, nunca são consideradas no caso de Nietzsche. Tal, só indica a
monstruosidade dos seus postulados e afirmações, por mais que a sua prosa seja
embriagadora, poética, metafórica, musical.
Mas ouçamos o que Nietzsche diz de si próprio:
“Meu pai morreu demasiado cedo faltoume a conduta severa e superior de um intelecto
masculino… Sem dúvida eu era um entendido em sombras.” O Viajante e a sua Sombra,
1879.
“Convoquei a Roma uma assembleia de príncipes; quero mandar fuzilar o jovem Kaiser.
Adeus.” Carta a Strindberg, 1888. Assina NietzscheCésar, Dionísio ou, o Crucificado.
Por várias vezes falou da necessidade de nos mascararmos, como numerosas seriam as
suas máscaras.
Ficou conhecido pelas suas afirmações de que Deus está morto, de que necessitamos de
outro homem, um superhomem, de que a moralidade acabou, uma vez que, no seu
conceito, Deus era o guardião da moral.
Nietzsche iria causar a maior revolução que a Terra tinha conhecido até então, todos os
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meios justificariam os fins, fazendo a apologia da vontade e da força: “vocês dizem que
uma boa causa justifica uma guerra; eu digo que uma boa guerra justifica qualquer
causa”. Os fracos deveriam ser eliminados pelos fortes ou, inclusive, nem deveriam
nascer, os indesejáveis deveriam ser esterilizados, o casamento só deveria ocorrer sob
supervisão médica, muita gente deveria ser sacrificada, a fim de que se salvasse a
Humanidade.
O seu pessimismo inicial vem da influência de Schopenhauer:
Deus não existe, a matéria é má, vale mais não nascer, vale mais morrer do que viver,
não existe qualquer sentido para a vida. A suprema felicidade é apenas pessoal e
conseguese pela anulação da vontade, pela ascese como tal, não é possível ser feliz. O
suicídio só é mau porque é um acto voluntário. Existe predestinação, não existe livre
arbítrio, nem Bem e Mal; o mundo é uma representação e o homem luta para chegar ao
nada, à não existência, a um estado onde se dissolverá, sem individualidade, numa
espécie de éter, o nirvana oriental. Não existe uma consciência individual; cada
consciência humana expressa tons de uma consciência comum, a que Chesterton
chama,A Alma da Colmeia.
Sobre o pessimismo, Chesterton afirma que o Mal é tão grande que o Bem não existe,
pois tudo o que é material é mau. Por outro lado se Deus é Criador do que é material,
então o pessimismo transforma Deus num demónio.
“Pareciame que Schopenhauer se estava a dirigir a mim, pessoalmente”, Schopenhauer
como educador, Nietzsche, 1874.
De Darwin, numa fase posterior, Nietzsche herda o optimismo:
O mundo está errado porque quem o controla são os mais fracos, uma classe de
escravos, que impedem o seu progresso porque utilizam a moralidade, para submeter os
mais fortes.
O mundo pode e deve ser mudado, deve sofrer uma revolução para se livrar da
moralidade e de Deus, para que, tal como na natureza, apenas sobrevivam os mais
fortes. Os mais fracos devem ser eliminados ou escravizados.
A vida é a vontade de poder. Os novos valores da humanidade devem radicar no homem
forte, poderoso, nobre e belo.
O determinismo é marcante: o destino individual está no homem desde o início, inscrito
num perene movimento da vida, circular, em que tudo o que foi, voltará a ser, o eterno
retorno 1.
Chesterton diria que os optimistas não acreditam num destino do homem após a morte,
mas aprisionam o homem num destino antes de nascer! O optimismo, diria ainda
Chesterton, tem a concepção de um Mal tão pequeno que nem existe; faz do diabo,
Deus.
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Dale Ahlquist afirma que Nietzsche queria negar Deus porque queria negar o pecado. E
ainda hoje ninguém quer falar de Deus porque ninguém quer falar do pecado, que é a
verdadeira razão da nossa separação de Deus.
Mas, mesmo com toda esta catástrofe, este genocídio, em nenhuma época Nietzsche é
estudado com tanto entusiasmo e paixão como na nossa época.
As nossas universidades ensinam as doutrinas de Nietzsche às novas gerações de
estudantes, omitindo sempre a sua insanidade e as suas consequências. Mesmo este
texto, no meu próprio país, seguramente encontrará uma dezena de académicos que
nele encontrarão uma centena de reparos. Curiosamente, contamse pelos dedos de
uma mão os académicos que podem apontar as várias incorrecções que cometemos com
Chesterton. E Chesterton previu tudo isto: a ascensão dos nazis ao poder na Alemanha e
o despotismo, a pobreza e a escravatura socialista na Rússia. Disse mesmo, em 1934,
que a guerra se iniciaria na Polónia. Previu a eugenia do nosso tempo e a chegada ao
poder dos plutocratas.
Todos o esqueceram.
Pelo contrário, a insanidade que ele apontou a Nietzsche, progrediu para o Gramscismo,
o Existencialismo e o Desconstrucionismo.
“Não existem factos, só interpretações.”
“Tu tens o teu caminho; eu o meu. Quanto ao caminho certo, ele não existe.”
“Todas as coisas dependem da interpretação; a interpretação que prevalece num
determinado tempo é função do poder, não da verdade.”
“O sentido da vida e a moralidade depende de cada um. Os fortes expandemse
experimentando tudo e vivendo de forma arriscada. A vida consiste em muitas
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Se a imortalidade não existe, a vida tornase insuportável. E porque não háde a vida ser
insuportável? 2
A vida de Nietzsche foi.
Incapaz de constituir família ou de ter uma relação duradoura com uma mulher, excepto a
sua irmã. Seriamente doente a partir de 1870, aos 26 anos, até final da sua vida, por
mais 30 anos! Onze anos louco, internado num asilo.
A Polónia, de onde clamava ter as suas verdadeiras origens, viria a ser uma das
principais vítimas, de um lado e do outro da fronteira, dos seus superhomens. Morreu em
Weimar, o nome da república que foi a antecâmara da ascensão do partido nacional
socialista na Alemanha.
Deus já tinha morrido há muito tempo, antes dele, mas continuava vivo, e, ao que dizem,
à frente da sua Igreja.
Os cristãos encontraram o caminho para fora do túmulo, porque, como diz Chesterton
emO Homem Eterno, têm um Deus que lhes mostrou o caminho.
Relativamente a este ateu, como alguns dos outros oriundos da negrura das florestas do
Bradenburgo, como sublinha Chesterton, o seu ateísmo escondia um paganismo; o seu
paganismo escondia a adoração pelo demónio:
“Se um demónio vier e te disser que tens que voltar a viver esta vida uma e outra vez,
vezes sem fim, ficarás abatido e triste ou experimentarás um momento de exaltação
sublime? Na verdade, dirlheàs: tu és o meu deus e eu nunca ouvi nada mais divino!” 3
A “novidade” do pensamento de Nietzsche já tinha sido expressa por Sófocles ou pelos
gnósticos, cátaros e albigenses. A sua “novidade” remonta a Heráclito e a Esparta. A sua
"novidade" é pagã, précristã. O seu pensamento já acorrera a outros, como
Shakespeare, que o atribui a loucos como Ricardo III:
"A consciência não passa de uma palavra que os cobardes usam
Concebida a princípio para amedrontar os fortes.
Que os nossos fortes braços sejam a nossa consciência, as espadas a nossa lei!"
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O homem comum está com Shakespeare, e considera o cavalheiro alemão um louco.
Só os académicos e as escolas do nosso tempo o consideram lúcido e apelativo.
O que aconteceu à nossa época para o considerar apelativo? Porque se encontra nos
programas de filosofia das nossas universidades como um ícone estético? Porque há
inteiros sistemas de filosofia e de arte que defendem a eugenia, a fealdade, a ausência
de moral, de Bem ou de Mal, da verdade, do correcto significado das palavras?
A resposta que ocorre, a mais horrível e inquietante, é que por baixo desta ideologia se
esconde um ódio místico à infância, à maternidade e à Igreja de Deus. A outra resposta,
que nos chega na calma pesada e soturna de um Outono, é de que algo grandioso e
horrível, algo angustiante e tenebroso, se prepara no interlúdio. E que o crepúsculo se
vai abater sobre a terra dos homens; não o dos ídolos, mas o dos demónios.
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(legendas em português no canto inferior direito)
António Campos
1 É verdade que aquele tipo de recorrência a que Buda chamava a “Roda da Tristeza”, o
pobre Nietzsche lá conseguiu arranjar maneira de chamar Alegre Sabedoria ou Gaia
Ciência. Ocorreme dizer que, se a sua ideia de alegre sabedoria era esta simples e nua
repetição, sempre gostaria de saber qual seria a sua ideia sobre uma Triste Sabedoria.
Mas é um facto que, no caso de Nietzsche, esta ideia não pertence ao momento do seu
exórdio, mas antes ao momento do seu esgotamento. Ela apareceu no fim da sua vida,
quando já estava perto do colapso mental e, na realidade, é algo de bem contrário às
suas primeiras e melhores inspirações: essas que falavam de uma liberdade selvagem ou
de uma inovação fresca e criativa. Pelo menos uma vez, ele tentara partir para novas
ideias, mas só lhe serviu para acabar ele próprio partido pela roda. Chesterton em São
Tomás de Aquino, 1925.
2 "O discurso de Nietzsche é forte e sedutor. Mas o seu tom é sempre de desdém. Ele
tratava o homem com um desprezo profundo, com um sarcasmo infinito; ele escarnecia
mas não sorria. Os seus seguidores têm as mesmas características. Nunca ninguém
encontrou uma alegria nietzscheana." Chesterton versus Nietzsche, reconstituição de
debate virtual da sociedade chestertoneana americana.
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3 Deverão existir poucos outros exemplos de vida que nos recordem tanto as palavras
de Mt 12, 3638:
Iosif Stalin, o carniceiro georgiano, no quarto dia de coma tem um instante de lucidez.
Aponta uma das muitas fotografias ampliadas que decoram as paredes as que tirou
com Nadja num Verão feliz: uma menina alimenta um cordeiro com um biberão. É uma
ironia. Em 5 de Março de 1953 a agonia recomeça. Desfigurado, tenta respirar. Ergue o
braço esquerdo. Svetlana, a filha, dirá depois que foi um último gesto de ameaça, como
se quisesse amaldiçoar todos os presentes.
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