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ESTUDO DE CASO DE
IMPLEMENTAÇÃO, CERTIFICAÇÃO E
MANUTENÇÃO DA NBR ISO 9001 NO
CONTEXTO HOSPITALAR
Germano Mendes Rosa (IFMG )
germano.rosa@ifmg.edu.br
Jose Carlos de Toledo (UFSCar )
toledo@power.ufscar.br
1. Introdução
Este artigo constitui parte de uma pesquisa de doutoramento e retratou, por meio de estudo de
caso único, a implementação da NBR ISO 9001 em um hospital filantrópico de médio porte,
sua certificação e situação pós-certificação. Essa pesquisa tem sua importância legitimada por
dois motivos essenciais apontados por Rakhmawati, Sumaedi e Astrini (2014): primeiro, não
há na literatura informação suficiente sobre SGQ ISO 9001 em hospitais pós-certificação, o
que impossibilita avaliação de sua consistência e, segundo, a maioria das pesquisas foram
realizadas em países desenvolvidos.
O artigo se divide em sete seções, incluindo essa, que apresentou o trabalho; na seção seguinte
apresenta-se o referencial teórico enfatizando o SGQ ISO 9001; na seção três esclarecem-se
os procedimentos metodológicos; na seção quatro descreve-se o estudo de caso; na seção
cinco realiza-se a análise dos resultados; e na seção seis são dadas as considerações finais.
Deseja-se proveitosa leitura!
2. Referencial teórico
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Um SGQ pode ser entendido como uma tecnologia gerencial, uma função de gerenciamento
aplicada à melhoria ou à garantia da qualidade do processo e produtos da organização (VAN
HARTEN; CASPARIE; FISSCHER, 2000; VAN HARTEN; CASPARIE; FISSCHER, 2002).
Van Harten, Casparie e Fisscher (2000) destacam dois aspectos ou dimensões importantes ao
considerar um SGQ:
Wardhani et al. (2009) citam seis fatores considerados importantes na implementação de SGQ
em hospitais, sendo estes: características organizacionais, cultura organizacional, estrutura
para a qualidade, suporte técnico, liderança e envolvimento de médicos. A Figura 1 apresenta
esses fatores e suas relações.
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A ISO desenvolveu normas para um modelo de SGQ (série ISO 9000) que contribuíram para
avaliar aspectos de serviços de saúde, particularmente na Alemanha e na Suíça. Contudo,
como tais normas dizem respeito a procedimentos de gestão ao invés de resultados clínicos, a
ISO 9001 tem sido mais frequentemente implementada em departamentos mais burocráticos
como laboratórios, setor de radiologia e transporte, mas há exemplos de aplicação em todo o
hospital ou clínica (SHAW, 2000). No entanto, há pouca evidência publicada que comprove o
mérito da certificação ISO 9001 na melhoria da segurança e qualidade dos serviços
hospitalares (SHAW et al., 2010; RAKHMAWATI; SUMAEDI; ASTRINI, 2014).
Apesar de concordarem que a aplicação da norma ISO 9001 na área da saúde ainda não é
muito comum, van den Heuvel et al. (2005) relataram vários benefícios em estudo de caso do
Hospital da Cruz Vermelha, na Holanda, assim como Vitner et al. (2009), no caso de um
hospital israelita.
Isso ressalta que a norma ISO 9001 não constitui um livro de receitas, mas um framework
para disseminar qualidade em todos os aspectos do negócio e a conformidade do SGQ
hospitalar com o modelo ISO 9001 significa que o hospital (RATCLIFFE, 2009):
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Apesar do caráter internacional da norma ISO 9001, ela depende diretamente da consistência
entre auditores individuais registrados, especialmente em termos de sua interpretação no
campo da saúde (SHAW et al., 2010).
Por outro lado, geralmente a implementação de um SGQ segundo o modelo ISO 9001 não
incorre em grandes modificações em nível organizacional, uma vez que a maioria das
empresas já possui algum nível de controle sobre seus produtos e processos (VAN DER
WIELE; DALE; WILLIAMS, 2000), inclusive os hospitais.
Ao contrário, a motivação interna incide em forte efeito positivo nos resultados, podendo
ocorrer de duas formas: por questões ligadas a objetivos internos, influenciáveis e
controláveis pela gestão interna da organização (e.g. melhorar o atendimento ao cliente,
melhorar a eficiência dos processos, influenciar fornecedores, congregar diversos sistemas da
qualidade na organização, desenvolver mudança de cultura etc.), ou por indicação pessoal de
gestores por questões específicas (e.g. promover mudança de cultura na organização) (VAN
DER WIELE; DALE; WILLIAMS, 2000).
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Rakhmawati, Sumaedi e Astrini (2014) observaram que a implementação do SGQ ISO 9001
em organizações de saúde apresenta estágios em comum, apresentando seis etapas mostradas
na Figura 2.
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Figura 2 - Etapas comuns na implementação da norma ISO 9001 em organizações de serviços de saúde
3. Procedimentos metodológicos
A abordagem empregada na pesquisa foi qualitativa, tendo sido adotado o método de estudo
de caso único e, como instrumento de coleta de dados, um questionário semiestruturado. A
pesquisa se processou por meio de entrevista com o gestor responsável pelo sistema de gestão
hospitalar e análise de documentos internos. A unidade de análise foi escolhida por
conveniência (hospital certificado ISO 9001 sediado no Estado de Minas Gerais).
4. O estudo de caso
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Nesse início, a direção do hospital foi assumida pela Fundação L’Hermitage, uma instituição
de consultoria nas áreas de educação e saúde, por determinação do Ministério Público. Tal
ação se fez necessária face a situação de endividamento e precariedade administrativa na qual
o hospital se encontrava.
A Fundação L’Hermitage administrou o hospital por cerca de quatro anos até montar a mesa
de conselheiros e deixar o hospital seguir por conta própria. Durante o período dessa
administração houve um salto de crescimento do hospital, relatou o entrevistado.
O hospital alcançou a certificação na norma NBR ISO 9001 em 2009, valendo-se dos recursos
do Programa de Fortalecimento e Melhoria da Qualidade dos Hospitais do SUS/MG (PRO-
HOSP).
A Figura 3 mostra a linha histórica da busca pela certificação NBR ISO 9001.
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Portanto, a certificação NBR ISO 9001 apresentou-se como alternativa para construir e
validar um sistema de gestão para garantir a qualidade da assistência e reduzir o desperdício
acentuado de materiais e de medicamentos que existia, pois não havia otimização de
processos e de custos. A norma NBR ISO 9001 proporcionou ferramentas para evidenciar e
reverter tal situação. A conquista da certificação NBR ISO 9001 se deu em 2009 e é mantida
atualmente.
De acordo com o entrevistado, a certificação NBR ISO 9001 ocorreu de forma muito rápida,
mas acarretou em preço alto, pois a aceleração da mudança cultural incorreu em ônus e
conflitos entre o corpo clínico.
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Ao firmar contrato com o organismo certificador foi requerido ao hospital a definição de duas
coisas: o escopo de certificação e o foco da auditoria. Assim, o escopo estabelecido foi
“hospital geral de alta complexidade de urgência e emergência”, o que abrange todo o
hospital, exceto os serviços de oncologia e oftalmologia que ainda não foram englobados por
constituirem novas ofertas de serviços. O foco da auditoria escolhido foi “eficácia da gestão
de prontuários” o qual pretende-se manter.
Segundo o entrevistado, o foco da auditoria recebe uma nota de desempenho que vai de 0 a 5
e sublinhou que desde 2009 a nota se mantinha em 3 até o ano de 2014, mas por meio de
significativo esforço, conseguiu-se alcançar a nota 4 em 2015. É previsto que, ao alcançar a
nota máxima, pode-se optar pela mudança ou pela manutenção do foco. O entrevistado
afirmou que a pretensão é manter o prontuário como foco devido a sua importância, uma vez
que um prontuário bem gerido é a garantia de uma assistência segura. Nas palavras do
entrevistado:
“Se o prontuário estiver bem preenchido e bem registrado é possível realizar a evolução
clínica do paciente, além de determinar uma apuração eficiente dos custos, porque se eu
deixar de lançar um registro ou informação eu deixo de faturar.”
A auditoria externa
A auditoria externa é realizada anualmente e a forma com a qual ocorre está mudando. De
acordo com o entrevistado, antes os auditores consumiam significativo tempo analisando atas
e indicadores, mas atualmente eles têm demonstrado mais preocupação em verificar a prática
à documentação. O entrevistado sublinhou que na última auditoria recebida os auditores
fizeram várias perguntas aos pacientes sobre o atendimento, sobre as visitas do médico, sobre
a medicação que estavam recebendo, enfim, sobre muitas coisas. Isso mostra que não é
suficiente estar em dia com a documentação, é preciso demonstrar que tudo o que está escrito
está sendo praticado, relatou o entrevistado.
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A auditoria interna
A auditoria interna é realizada de acordo com a norma NBR ISO 9001 e a legislação
específica e as não conformidades encontradas são registradas no sistema de informação que
possui campos específicos para relato das mesmas, incluindo o nome do relator e a anexação
do relatório da auditoria. Os registros são enviados aos gerentes das áreas correspondentes
para que deem andamento.
Os setores têm até três dias para responderem à não conformidade registrada. Caso ela seja
solucionada de imediato, o setor responde e anexa a comprovação (foto, nota fiscal de compra
de equipamento etc.). Caso a solução demande um período maior, o setor deve estabelecer um
plano de ação por meio de módulo próprio do sistema de informação estabelecendo um prazo
e, partir disso, o próprio sistema monitora o cumprimento. Cabe ao entrevistado analisar e
aprovar os planos de ação, além de acompanhar as pendências.
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Para realizar a auditoria interna dispõe-se uma equipe interna formalizada e capacitada para
auditar tanto a norma ISO 9001 quanto o Programa 5S. Contudo, de acordo com o
entrevistado, a equipe não é solicitada com frequência, porque a demanda de trabalho no
hospital é intensa, o que compromete a realização de uma auditoria interna multidisciplinar.
Nas palavras do entrevistado:
A parte de qualificação dos fornecedores funciona de forma completa. O hospital conta com
um gerente de logística e também com o portal Bionexo, um portal específico de cotação e
venda de suprimentos hospitalares, dispondo de diversos fornecedores cadastrados com toda
documentação necessária disponível para consulta. O entrevistado esclarece que antes a
cotação era realizada por telefone, resultando em muita confusão e perda de tempo, o que
requeria dois funcionários apenas para acompanhar a atualização das documentações. Com o
portal Bionexo, as compras se tornaram rápidas, fáceis e confiáveis.
Nas reuniões ocorrem diálogos entre as equipes de gerentes, podendo acarretar em análise e
decisão simultaneamente.
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Há também outra reunião semestral realizada apenas com a equipe gerencial para realização
de análise de desempenho do hospital como um todo, inclusive financeira. Nessa reunião é
requisitado que cada setor apresente pontos de desempenho que são cruzados com os
indicadores estratégicos. Todas as informações são registradas em ata.
Houve significativa rotatividade da diretoria e isso é negativo. Mas, de forma geral, a direção
se envolve. Por exemplo, graças ao diretor anterior, adquiriu-se o sistema de informação da
qualidade, o que proporcionou boa contribuição ao SGQ, afirmou o entrevistado.
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O entrevistado relatou que nos hospitais interioranos é difícil lidar com os médicos, inclusive
para a alta direção, principalmente com os mais antigos, pois a relação de dependência é
desfavorável ao hospital. Conseguir novos médicos para determinadas especialidades é tarefa
árdua, mesmo oferecendo melhores salários e benefícios. Um dos principais entraves gira em
torno do que a cidade oferece de atrativo, o que nem se compara às metrópoles.
De acordo com o entrevistado, por enquanto a acreditação não é o foco atual da direção. A
pretensão é manter a certificação NBR ISO 9001 e continuar buscando a melhoria contínua.
Até mesmo porque a equipe de auditoria externa já exige muitos requisitos da ONA, de forma
que o hospital se adeque aos poucos, evitando intercorrências negativas.
5. Resultados e discussão
Apesar da intenção inicial do hospital ter sido a obtenção da acreditação nacional ONA, a
certificação NBR ISO 9001 apresentou-se como alternativa face à impossibilidade de
cumprimento a médio prazo da RDC 50, pré-requisito da primeira.
Apesar da norma ISO 9001 não ser específica da área da saúde, como explicita Shaw et al.
(2010), sua implementação no contexto hospitalar promove melhorias significativas nos
processos, como endossou com detalhes o estudo de caso. Ademais, percebeu-se uma relação
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Como maior benefício, a implementação NBR ISO 9001 propiciou maior visibilidade e
controle dos processos e custos das atividades assistenciais, como também observado por van
den Heuvel et al. (2005) e Vitner et al. (2009).
6. Considerações finais
Os autores enfatizam que a riqueza de informações geradas contribui para maior compreensão
dos benefícios e barreiras ligadas à certificação NBR ISO 9001 no contexto hospitalar,
principalmente se tratando de um país em desenvolvimento. Por outro lado, os mesmos
entendem que a maior limitação desse trabalho decorre da unicidade da amostra e seu caráter
exclusivamente qualitativo.
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