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Histórias do Futuro
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"Nosso desafio é manter viva a esperança" - Car... https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Histor...
Sobre estes e outros desafios do campo popular no Brasil e no mundo, Carta Maior
conversou com o pesquisador francês Christophe Ventura, que esteve no Brasil
para participar do Fórum Social Mundial 2018, entre 13 e 17 de março em Salvador.
Professor do IRIS – Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas, em Paris,
Ventura participou da criação e concepção do FSM desde o início, em 2001, em
Porto Alegre, foi secretário de relações internacionais do Parti de Gauche e ex-
assessor internacional de Jean-Luc Mélenchon e é especialista em América Latina e
um dos editores do site Mémoire des Luttes (http://www.medelu.org/).
Como assim?
A articulação entre a vinda de Lula e o Forum não foi muito boa, ele não veio ao
Fórum. Fez reuniões fora, com pessoas que participavam do Fórum. Lançamento do
comitê internacional de solidariedade a Lula e à democracia. Depois se reuniu com
representantes das organizações presentes no Fórum. À noite fez um ato no estádio
do Pituaçu, em Salvador. O estádio estava bem vazio. Pareceu um problema de
organização do PT, de comunicação. E o estádio é longe do centro da cidade, de
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relativamente difícil acesso. Sem sistema de transporte do Fórum até lá. Acho que
isso sinaliza uma dificuldade atual do PT em mobilizar. O discurso de Lula, no
entanto, foi excelente. Infelizmente, poucas pessoas estavam lá para ouvir. Ele
reafirmou que não vai se opor à Justiça, mas que será candidato porque é inocente,
que está tranquilo. Se for preso, será um inocente preso, e continuará a lutar da
prisão. Como estrangeiro, fiquei surpreso de ver como o ato não foi transmitido
nem mencionado em nenhum canal de TV, nem mesmo regional. É incrível e muito
violenta essa invisibilidade.
A fórmula está engessada, e não ceio que se transformará. Não sei nem mesmo se
haverá um próximo FSM. Do Fórum nasceram núcleos, redes, elos internacionais
temáticos. Essas estruturas menores vão sobreviver. Essa é a nova etapa. Não me
parece que o Fórum ainda tenha algo a oferecer nesse formato. O FSM é um evento
e um processo que datam de uma época que passou: o mundo de antes de 2008, de
antes da crise internacional. Passamos de uma época em que o desafio era
construir outra globalização (l’altermondialisation). O tempo de hoje é
caracterizado por uma fobia da globalização. Não é mais a mesma coisa.
E então veio 2008. E o FSM não está mais adaptado à realidade atual. Primeiro
porque perdemos a batalha da “outra globalização” diante da precipitação da crise,
da aceleração das tensões, dos con�itos, das guerras, da ascensão dos
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nacionalismos etc. E hoje vemos que nos setores mais populares, seja aqui no Brasil
seja no hemisfério Norte, não há mais esperança na globalização. Há uma rejeição a
ela. Esta batalha nós perdemos. Segundo problema do FSM: não só a forma de
organização foi ultrapassada pelo contexto, não responde mais à realidade, como a
batalha à qual nos lançamos não foi ganha. Então nos encontramos nesse momento
de perda de hegemonia. Este FSM é o re�exo de algo que não existe mais como
dinâmica, existe como um espectro que guardamos dos encontros passados. Não
tem mais o peso que tinha na cena política mundial. Houve um esgotamento.
Se de fato o Fórum Social Mundial não vier mais a ocorrer, o que sobreviverá, qual
seu legado?
O FSM tem características que nenhum outro espaço conseguiu substituir. Para as
organizações – sindicatos, associações, movimentos de mulheres – o FSM é um
espaço de encontro e de trabalho ainda único. Esse espaço não pode se perder, mas
talvez passe a ter outro nome que não Fórum Social Mundial, adaptado a este
período pós-2008, em que não temos mais a liderança da ideologia, perdemos o
poder de organização. E por isso mesmo ainda é preciso resistir, trabalhar juntos.
Os atores destes movimentos continuarão ativos por muito tempo, e isso é positivo.
As pessoas que participam e participaram dos FSM fazem um trabalho de fôlego, de
longo prazo, e existem hoje no mundo essas cadeias e redes de movimentos de
resistência e contestação que se organizam no nível internacional. Que fazem um
trabalho de campo e buscam formas de atuação e luta comum. Isso é uma conquista
que não se perderá.
O que é, aliás, criticado por parte da esquerda como uma pulverização das lutas. O
que acha desta crítica?
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não tem mais conseguido fazer isso. Porque tudo mudou. Hoje, somos confrontados
a processos capitalistas de produção que transformaram completamente a
sociologia da condição operária tradicional, as relações de poder entre trabalhador
e capital, e não compreendemos o fenômeno ainda em sua totalidade. Além disso, o
movimento operário ainda está sob o impacto do desmoronamento de seu
imaginário, ainda não se superou o fim da União Soviética, e este movimento
popular não tem mais um imaginário global. O que há são as lutas setoriais. É o
momento em que estamos, e que deve durar muito tempo.
Como entender por que, mesmo diante de tantos ataques neoliberais aos direitos
trabalhistas, à aposentadoria, ao serviço público, que ocorrem no Brasil desde o
golpe, parte da classe trabalhadora pareça anestesiada?
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Segundo as pesquisas, Lula não tem concorrentes nem á esquerda nem à direita,
aliás.
Ontem, chegando ao Rio, peguei um táxi. O motorista era muito simpático. Comecei
a puxar assunto sobre a política brasileira, dizendo como estava tudo complicado.
Perguntei sobre Marielle Franco. Ele disse: “ah, ela era mulher de um traficante e
trabalhava para o Comando Vermelho...” E Lula?, perguntei. “Ah, um corrupto”, ele
respondeu. Ok. E Temer?, emendei. “Pior ainda”, disse. É uma loucura a depreciação
da classe política, e a descrença na política em geral que senti aqui. Uma resignação
e um acomodamento. O problema deste tipo de descrédito da política é que ele é
propício ao fascismo. Porque a direita está mal também. Eles não têm ninguém.
É uma boa análise. A América Latina hoje nos mostra como novos tipos de regimes
políticos são implementados. São regimes neoliberais do ponto de vista econômico
e social, e autoritários e securitários do ponto de vista político e democrático –
como vemos agora com a intervenção militar no estado do Rio. O objetivo é duplo:
confiscar e reduzir os direitos sociais e democráticos e reprimir, de formas
diversas, qualquer forma de contestação. Uma dessas formas sendo a justamente a
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Espero que o povo venezuelano resista. Penso que não há solução sem o chavismo
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Maduro está certo quando solicita que a ONU envie observadores para as eleições. É
preciso que essas eleições de 20 de maio permitam relegitimar a política, e não o
enfrentamento – esta tem sido, aliás, a linha de Maduro até hoje. Quem quer a
confusão, o con�ito, é uma parte da oposição, pois sabe que não ganha as eleições.
Tudo indica que Maduro vá ganhar as eleições. No sistema eleitoral venezuelano,
ganha o primeiro colocado (em único turno). Se Maduro fizer 25% dos votos, pode
parecer pouco, mas se os adversários fizerem 5% ou 7%, ele é reeleito. Que a
situação do país está ruim é inegável. Mas essa eleição precisa acontecer e tudo
precisa correr bem para que o país saia dessa situação de crise aguda.
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Sempre houve fake news, claro, mas hoje alcançam outra velocidade. Na França,
estamos mergulhados nessa discussão. O governo Macron anunciou que fará uma
lei sobre as fake News na França, que pretende instaurar uma espécie de controle
feito pelo governo e pelo parlamento para retirar informações falsas – a questão é
que quem decide que elas são falsas é o governo. Na França, o pretexto é a suposta
guerra de informação da Rússia, que teria in�uenciado as eleições americanas. E
com essa justificativa, cria-se uma lei para controlar o que circula nas redes sociais
e para ter a possibilidade de proibir certos conteúdos. Hoje, existe um discurso
anti-Putin que domina a opinião pública francesa. Ele é o inimigo contra o qual o
sistema precisa lutar. Como diria Julian Assange, em nome do princípio
democrático e da liberdade de expressão, criam-se leis contra a liberdade de
expressão. Ela é reduzida em nome de sua proteção.
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se sabe como fará para governar, pois precisa se aliar a outras forças, e não se sabe
se vão para a esquerda ou para a direita. É uma situação interessante, mas a
esquerda italiana está morta. Na França, temos o Macronismo, que é um
transformismo, ou seja, uma construção que consegue integrar elementos da
esquerda e da direita para salvar o sistema, com essa cara de movimento novo.
Estou em total desacordo com este movimento. Penso que o que ele vende é uma
ilusão, como se fosse possível criar uma corrente de esquerda na Europa sem
mudar a Europa. É uma ilusão que vai acabar alimentando a extrema direita. É um
movimento que não assume uma ruptura com a Europa (União Europeia), e é aéreo,
sem penetração real. A Europa (UE) vai existir dessa forma por muito tempo, em
estado de crise permanente, ela não vai desmoronar. Mas ela é incapaz de se
transformar, de se converter em outra coisa. A aliança entre as burguesias alemã e
francesa é um sistema ruim, mas como funciona para garantir o poder da
Alemanha e da França, não haverá nenhuma mudança. E hoje a linha da Europa é:
“ame-a ou deixe-a”. Os países ou aceitam fazer parte nas condições de quem manda,
ou saem do bloco. Para ficar, o preço é esse. Por isso não creio em teorias de
democratização deste sistema, de criação de um novo parlamento. Isso é conto de
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