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Financiamento da Educação e Pacto Federativo: Qual o Papel do FNDE?
Financiamento da Educação e Pacto Federativo: Qual o Papel do FNDE?
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Financiamento da Educação e Pacto Federativo: Qual o Papel do FNDE?

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O livro Financiamento da educação e pacto federativo: qual o papel do FNDE? esmiúça a atuação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) entre os anos de 1995 e 2006, por meio do pormenorizado exame de critérios, instrumentos e recursos financeiros da política desse órgão na oferta de programas suplementares, na educação básica, aos governos municipais, estaduais e do Distrito Federal. Muito se ouve falar de linhas gerais dos programas nacionais, por exemplo, os de Alimentação Escolar, Dinheiro Direto na Escola e Livro Didático, todos eles geridos pelo FNDE, porém é muito menos visível o fato de que estes e outros programas constituem a política de assistência da União na educação básica, a qual, nas suas permanências e mudanças, pode ser passível de análise científica, o que é realizado neste livro. A autora insere a política de assistência técnica e financeira da União na educação, em grande medida operada por meio do FNDE, na discussão acadêmica do pacto federativo brasileiro e da organização da educação, dimensões institucionais habilidosamente entrelaçadas na análise. A obra interroga práticas e possibilidades de incidência das ações do FNDE frente às profundas desigualdades sociais e educacionais do Brasil; os resultados, emblematicamente expressos nos valores por aluno do FNDE regionalizados, expõem expressivos limites para a efetivação do critério redistributivo nas políticas de assistência da União aos governos subnacionais. É uma obra vigorosa, fundamentada em referências multidisciplinares e calcada em vasta pesquisa em documentos normativos e técnicos, em entrevistas e em dados da oferta e do financiamento da educação. A autora oferece-nos um texto de interesse de um público amplo, atento às ações estatais em diferentes setores. Para pesquisadores da área da educação, oferece um leque de contribuições teóricas e metodológicas à construção do conhecimento sobre as ações públicas na área, bem como desafia a continuidade da realização de estudos que interpelem as ações estatais diante das desigualdades inaceitáveis do país, tendo em conta as diretrizes e as práticas do federalismo brasileiro e as relações entre as esferas de governo no campo educacional.
LanguagePortuguês
Release dateSep 24, 2021
ISBN9786525012827
Financiamento da Educação e Pacto Federativo: Qual o Papel do FNDE?

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    Financiamento da Educação e Pacto Federativo - Rosana Evangelista da Cruz

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    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO EDUCAÇÃO - POLÍTICAS E DEBATES 

    Àqueles que, permanentemente, das diferentes formas possíveis, envidam esforços na construção de uma

    escola pública, democrática, laica e de qualidade.

    AGRADECIMENTOS

    Aos professores Rubens Barbosa de Camargo, César Minto, Vitor Henrique Paro e Lisete Arelaro, que tão fortemente marcaram minha formação e impulsionaram meu crescimento como pesquisadora e como militante em defesa da educação pública.

    Aos meus pais, irmãs e familiares, do Piauí e de São Paulo, que estiveram sempre apoiando-me e incentivando.

    A todas as pessoas e instituições que contribuíram para a realização da pesquisa que gerou o presente livro, fornecendo-me informações e documentos, em especial, aos profissionais do MEC e do FNDE.

    Aos amigos e amigas do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Políticas e Gestão da Educação (Nuppege), da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação e da Campanha Nacional, pelo Direito à Educação, com os quais reforço, cotidianamente, o entendimento da necessidade de articulação entre produção científica, compromisso político e transformação social.

    À Universidade Federal do Piauí e aos colegas do Departamento de Fundamentos da Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação, pelo apoio permanente.

    Àqueles que, sabendo dos desafios a que me propus nesta pesquisa, ofereceram sugestões sobre possíveis caminhos de investigação.

    Uma notícia está chegando lá do Maranhão

    Não deu no rádio, no jornal ou na televisão

    Veio no vento que soprava lá no litoral

    De Fortaleza, de Recife e de Natal

    A boa nova foi ouvida em Belém, Manaus,

    João Pessoa, Teresina e Aracaju

    E lá do norte foi descendo pro Brasil central

    Chegou em Minas, já bateu bem lá no Sul

    A novidade é que o Brasil não é só litoral

    É muito mais, é muito mais que qualquer zona sul

    Ficar de frente para o mar, de costas pro Brasil

    Não vai fazer desse lugar um bom país.

    (Milton Nascimento e Fernando Brant)

    Prefácio

    Caro leitor, devo confessar que é com muita satisfação e honra que aceitei o convite para fazer o prefácio de uma obra tão essencial para entender aspectos fundamentais da política e do financiamento educacional de nosso país, como esta que agora chega às suas mãos.

    De início, várias reminiscências se manifestaram, pois a autora foi nossa aluna no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação entre 2000 e 2002¹ da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e minha orientanda de doutorado do mesmo programa entre 2005 e 2009 e, sem falsos elogios, lembro-me dela sempre com perguntas inteligentes, preocupada com a superação das desigualdades e com a intenção maravilhosa de tentar entender para transformar, que move o coração e a mente de pesquisadores identificados com as questões populares.

    Seu perfil de arguta pesquisadora e de militante tenaz pela educação pública, laica, gratuita, de qualidade socialmente referenciada e para todos, jamais deixou de contribuir em pesquisas (locais, regionais e nacionais) e movimentos sindicais e sociais (locais, regionais e nacionais) relevantes em defesa da escola pública.

    Ao lado de uma personalidade alegre, firme, solidária, organizada e destemida encara os problemas da vida, da política, dos amigos e da família sempre com um sorriso e humor contagiantes, sem perder a seriedade.

    Seu olhar atento, sua simpatia, sua abordagem profunda e sua insistência acadêmica (no sentido de perseguir seu objeto de pesquisa! Lembro de seu levantamento incansável de dados e informações junto aos técnicos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, órgão responsável por inúmeros repasses de recursos aos demais entes federativos e, portanto, de políticas nacionais redistributivas da União) resultou numa grande tese de doutorado intitulada Pacto federativo e financiamento da educação: a função supletiva e redistributiva da União – o FNDE em destaque (CRUZ, 2009).

    Na época de sua defesa, a banca examinadora, composta por Prof. Dr. José Marcelino de Rezende Pinto (USP-RP), Prof.ª Dr.ª Lisete Regina Gomes Arelaro (Feusp), Prof. Dr. Luís Carlos Sales (UFPI) e Prof. Dr. Nicholas Davies (UFF), grandes nomes da área de financiamento da educação, só encontrou elogios ao trabalho, indicando sua imediata publicação, que por obra do destino só agora vem a público numa versão escanhoada, mas sem perder seus principais achados e suas análises pertinentes. Lembro-me, ainda, que mesmo no próprio Exame de Qualificação, realizado um pouco antes, com a participação de uma banca – integrada também por importantes nomes da área de financiamento da educação – composta pela Prof.ª Dr.ª Nalú Farenzena (UFRGS), dos professores Nicholas Davies (UFF) e Romualdo Portela de Oliveira (Feusp), foram apresentados elogios à pesquisa proposta e com valiosas críticas e sugestões de forma a enriquecer o trabalho ao seu final.

    Como dito em seu resumo, a tese discute as relações entre pacto federativo e financiamento da educação, tendo como eixo a problematização da função supletiva e redistributiva da União, especialmente pelas ações executadas pelo FNDE, no período de 1995 a 2006 (CRUZ, 2009, p. 9). Por isso, em termos do recorte temporal, a pesquisa tomou o primeiro e segundo governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC), do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), com Paulo Renato de Souza como Ministro da Educação em todo o período, e o primeiro Governo de Luís Inácio Lula da Silva (Lula), do Partido dos Trabalhadores (PT), com vários Ministros da Educação à frente do MEC: Cristovam Buarque (jan. 2003 a jan. 2004), Tarso Genro (jan. 2004 a jul. 2005) e Fernando Haddad (jul. 2005 a 2011, portanto, até o final do Governo Lula).

    Em termos metodológicos, a pesquisa realizou extensa discussão teórica sobre a questão do federalismo, utilizando referencial nacional e internacional. Do ponto de vista empírico documental, trabalhou de forma organizada e profunda com a análise da legislação nacional, bem como de inúmeros relatórios anuais, além de Atas, Portarias e Resoluções do FNDE, de dados e informações da execução orçamentária do MEC e do FNDE do referido período (buscando também na Secretaria do Tesouro Nacional). Ademais, realizou entrevistas com agentes públicos (evidentemente não identificados) que apresentaram a dinâmica do órgão, o que permitiu uma visão mais acurada sobre este.

    De modo geral, na pesquisa efetuada, a autora buscou investigar as diferentes formas de instituir um padrão mínimo de equalização nas condições de acesso a serviços públicos, como um dos elementos centrais para a própria sobrevivência do pacto federativo (CRUZ, 2009, p. 9), por meio da apreciação e análise da enorme quantidade de materiais que teve à disposição. Com isso, buscou avaliar o padrão de distribuição dos recursos entre a União e os entes federativos, para o qual a autora propôs-se a calcular o valor-aluno FNDE, o qual também foi confrontado com demais dados referentes às desigualdades sociais e educacionais no Brasil.

    Destaque-se que o momento investigado foi demarcado com políticas educacionais equalizadoras, ou melhor, focalizadoras – terminologia mais adequada ao perfil neoliberal que caracterizou o período –, pois também coincide com o tempo de vigência do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – Fundef, criado em 1996, colocado em funcionamento em todo país em 1998 e que terminou em 2006. Além de outros procedimentos no órgão que, contraditoriamente, tentaram desenvolver uma dinâmica um pouco mais universal e automática para a realização da distribuição dos recursos aos entes federativos por meio de diferentes programas (alguns mais antigos e outros criados no período), cuja origem, em grande parte, estava vinculada ao Salário Educação – SE.

    Além da Introdução e das Considerações Finais, a obra é composta por seis capítulos: no primeiro, apresenta o percurso metodológico da pesquisa. No segundo, é realizada uma revisão bibliográfica sobre o conceito de federalismo, debatendo como os autores do campo da Ciência Política têm problematizado o tema, além do debate sobre a questão fiscal e as transferências intergovernamentais. No terceiro capítulo, é realizada a discussão do federalismo brasileiro, explicitando o formato federalista consagrado na Constituição Federal de 1988. O quarto capítulo centra-se na discussão sobre as relações federativas e o financiamento da educação, com particular ênfase sobre as políticas executadas após os meados dos anos de 1990, em sua interface com a organização federal do Brasil. O quinto e sexto capítulos são dedicados ao FNDE, o coração da investigação. No quinto há uma breve retrospectiva da história do FNDE e a descrição sucinta de seus principais programas, discutindo os critérios e a sistemática de distribuição dos recursos entre as unidades da federação, destacando as transferências voluntárias da União e o total executado pelo MEC. No sexto capítulo são apresentadas as principais fontes de recursos do FNDE e sua execução financeira, em que a autora confronta a execução financeira, via valor-aluno, e os dados referentes às desigualdades sociais e educacionais no Brasil, verificando se a função supletiva e redistributiva do FNDE se confirma, com vistas a diminuir as disparidades nas condições de oferta educacional (CRUZ, 2009, p. 43).

    Sem "dar spoiler (a tradução de to spoil é o verbo estragar" em inglês...), pois acredito que o leitor terá todo interesse em percorrer os meandros da obra, buscando entender, com os argumentos da autora, o papel do FNDE na educação nacional. 

    Mas, de modo geral, como a própria autora admite, quanto ao tipo de federalismo de nosso país:

    A pesquisa permitiu concluir que o modelo federativo brasileiro encaminha para um tipo de federalismo caracterizado como executivo, porque, sistematicamente, a União define unilateralmente políticas que confinam a autonomia dos entes federados, que no caso das educacionais são protagonizadas pelo MEC ou, no caso de políticas educacionais descentralizadas, pelo próprio FNDE (CRUZ, 2009, p. 9).

    A autora, ao investigar a sistemática de repasses de recursos da União, pelo FNDE, pode examinar de perto os critérios adotados para a partilha desses recursos entre as redes estaduais e municipais de educação, no período de 1995 a 2006. Neste sentido, entendeu que o FNDE participa do processo de definição das políticas, dependendo do contexto, em questões de fundo programático ou de caráter mais operacional.

    Ao examinar a política de financiamento da educação do FNDE, a autora detectou três modalidades de assistência financeira destinada aos entes federativos: a direta, a automática e a voluntária. A assistência direta é muito relevante, principalmente porque envolve programas muito importantes para as escolas públicas, entre eles, o PNLD, dentre os outros programas do livro (PNBE e Pnlem), que têm critérios objetivamente definidos e passíveis de acompanhamento institucional e social. A modalidade de assistência financeira automática tem os critérios de distribuição de recursos mais claros e permitem maior transparência para os entes federados e para a sociedade civil, por exemplo, o Pnae e o PDDE têm essa característica. A assistência financeira voluntária, embora considerada importante para viabilizar políticas de cada gestão do período, além de tornar mais burocrático o processo de repasse, tem um histórico que evidencia sua permeabilidade a questões político-partidárias (CRUZ, 2009, p. 360). Isso resulta num formato que não atende plenamente ao objetivo de equalização de oportunidades educacionais em termos nacionais e explicita um alto grau de discricionariedade na administração desses recursos voluntários.

    Rosana Cruz percebe em sua pesquisa que as transferências diretas e automáticas assumiram preponderância no total dos recursos executados, representando 76% do total administrado pelo FNDE de 1995 a 2006 e que a burocracia especializada do MEC e do FNDE, representada na figura dos técnicos de carreira, está presente no processo de construção dos critérios de repasse de recursos e se apresenta para a construção das políticas do FNDE, defendendo propostas que considera mais adequadas ao papel do MEC e da União, em seu caráter supletivo e redistributivo.

    Embora parlamentares se fizeram presentes no MEC e no FNDE, com vistas a pleitear recursos para seus estados ou bases partidárias, principalmente no período em que as transferências financeiras voluntárias eram a principal forma de repasse e se revela determinante nas políticas de transferências voluntárias, a pesquisa revelou que não se pode concluir que o padrão de assistência financeira voluntária do FNDE decorre, exclusivamente, de critérios técnicos ou político-partidários, porque se evidenciaram situações diversas de distribuição, concomitantemente priorizando estados mais carentes do apoio federal ou privilegiando com maiores valores estados da base de apoio da coalização governante.

    Ao finalizar, a autora reconhece que as desigualdades educacionais são fruto de um processo mais amplo de exclusão socioeconômica, a qual não poderá ser combatida, exclusivamente, pela ação de um setor ou autarquia federal (CRUZ, 2009, p. 368). Por isso, como pesquisadora-militante propõe que o país avance no sentido de elaborar um projeto de desenvolvimento de forma a superar as graves desigualdades socioeconômicas existentes…

    Enfim, caro(a) leitor(a), em suas mãos encontra-se uma grande investigação recente sobre um dos órgãos do Ministério da Educação – o FNDE –, responsável pelas importantes políticas supletivas ou redistributivas aos estados e municípios do país, que foi fruto de um esforço sério, dedicado, atento e profundo legitimado por uma pesquisadora-militante de mão cheia. Quem quiser entender o importante papel do FNDE em tempos recentes, tem aqui uma imprescindível obra de referência.

    Fevereiro de 2021 do ano pandêmico (em todos os sentidos) e sem carnaval…

    Prof. Dr. Rubens Barbosa de Camargo

    Livre-docente pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – Feusp

    rubensbc@usp.br

    LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    Sumário

    Introdução 23

    1

    Nas trilhas do desenvolvimento da pesquisa: o percurso metodológico 29

    1.1 Ajustes nos dados do salário-educação 33

    1.2 A atualização dos dados financeiros 34

    1.3 Ponderações sobre os procedimentos tomados para o cálculo do valor-aluno 35

    1.4 A metodologia de descentralização dos recursos geridos diretamente pelo FNDE e pelos organismos

    internacionais 37

    2

    O federalismo em debate 43

    2.1 Os determinantes da adoção e manutenção da organização federal 49

    2.2 O federalismo e a questão da centralização e da descentralização 54

    2.3 Federalismo, questão fiscal e transferências intergovernamentais 58

    3

    O federalismo brasileiro 65

    3.1 Notas históricas 65

    3.2 A Constituição Federal de 1988 – um novo pacto federativo 71

    3.2.1 As competências e a autonomia dos entes federados 72

    3.2.2 Disponibilidade de recursos financeiros 78

    3.3 O contexto 1995 a 2006 83

    3.3.1 A questão da descentralização e da (re)centralização 87

    3.4 As desigualdades regionais no Brasil, a questão tributária e a representação política 90

    3.4.1 A questão tributária 91

    3.4.2 A questão fiscal e as políticas redistributivistas 94

    3.4.3 A representatividade política dos estados na vontade nacional 111

    4

    Relações federativas e o financiamento da educação pública no Brasil ١١٧

    4.1 A questão do direito à educação 117

    4.2 As responsabilidades dos entes federados 119

    4.3 A matriz de financiamento da educação pública ١٢٥

    4.3.1 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) 132

    4.3.2 O salário-educação 147

    4.4 Desigualdades educacionais 152

    5

    O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) 161

    5.1 Critérios de distribuição de recursos 172

    5.1.1 A assistência financeira automática 174

    5.1.1.1 O Programa Nacional da Alimentação Escolar (Pnae) 175

    5.1.1.2 O Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) 179

    5.1.1.3 Transferências automáticas para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) 184

    5.1.1.4 O Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar – PNATE 187

    5.1.1.5 Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de

    Deficiência (Paed) 190

    5.1.2 A assistência financeira direta 191

    5.1.2.1 Os Programas Nacionais do Livro (PNLi) 192

    5.1.3 A assistência financeira voluntária 195

    5.1.3.1 A sistemática de apresentação e aprovação dos PTAs 204

    5.2 A construção dos critérios para o atendimento do FNDE 209

    5.3 A representatividade dos recursos do FNDE 228

    6

    O FNDE e o financiamento da educação 233

    6.1 A execução dos recursos do salário-educação 245

    6.2 O valor-aluno FNDE 252

    6.2.1 O valor-aluno salário-educação 254

    6.2.2 O valor-aluno FNDE após a descentralização 263

    6.3 A natureza das transferências do FNDE – entre o automático/universal e o voluntário 268

    6.4 O FNDE e as desigualdades socioeconômicas e educacionais 275

    Considerações Finais 283

    Referências 297

    Índice Remissivo 335

    (conclusão)

    (conclusão)

    (conclusão)

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    (conclusão)

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    (conclusão)

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    (continua)

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    Introdução

    A República Federativa do Brasil é organizada de tal forma que abarca a existência de três esferas governamentais: a União, os estados e os municípios, os quais respondem por políticas públicas para a mesma base territorial, o que remete à necessidade de divisão de responsabilidades, de forma a evitar justaposições que impeçam o adequado desenvolvimento de políticas que visem ao bem-estar público. Entretanto nem sempre o aparato legal e institucional e as relações estabelecidas garantem organicidade às políticas e ações desenvolvidas.

    A Constituição Federal de 1988 foi um marco na reorganização do federalismo brasileiro, uma vez que explicitou os mecanismos de repartição de responsabilidades entre União, estados e municípios e ampliou a capacidade de intervenção dos municípios ao reconhecê-los como entes federados dotados de autonomia político-administrativa. O novo sistema envolveu, também, a definição de transferências constitucionais de recursos públicos entre as esferas governamentais, com vistas a possibilitar que estados e municípios executassem políticas públicas para a garantia do suprimento de necessidades básicas da população sob sua responsabilidade.

    Na década de 1990, as reformas políticas no Brasil se encaminharam para um processo de estímulo à descentralização de ações e políticas, suscitando a discussão sobre o financiamento destas. Embora a União, como maior arrecadadora de recursos públicos no país, execute transferências governamentais, no âmbito político e acadêmico o debate apresentou como questão fundamental o federalismo no Brasil, no que diz respeito a uma maior concentração de recursos na esfera federal e à centralização na definição das políticas, impedindo o efetivo compartilhamento do poder e a autonomia dos entes federados.

    No campo educacional, ocorreu o mesmo questionamento, uma vez que a Constituição Federal também definiu compartilhamento de responsabilidades, encaminhando a oferta da educação básica para as esferas estadual e municipal, assim como reforçando a vinculação de recursos públicos para a manutenção e desenvolvimento do ensino. Entretanto, o cerne da questão é o processo crescente de centralização da definição das políticas educacionais pelo governo federal, embora existam mecanismos de descentralização das responsabilidades de execução de tais políticas.

    O Ministério da Educação é o órgão responsável por colocar em curso as políticas educacionais do governo federal, porque compete à União a coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis e sistemas, conforme previsto na legislação. Entretanto a maior parte dos recursos federais para a educação é direcionada para a sua própria rede de atendimento, sobremaneira o atendimento ao ensino superior.

    No que diz respeito à educação básica, a participação do governo federal é irrisória. Segundo dados do Censo Escolar de 2006, a oferta federal para a educação infantil (0,04%) e ensino fundamental (0,08%) e médio (0,76%) não chega sequer a um 1% do total de matrículas das diferentes redes de ensino do país. Na educação básica, apenas as matrículas na educação profissional são mais significativas, alcançando 10,73%, em 2006. Esses dados revelam que os estados, o Distrito Federal e os municípios são os maiores responsáveis pela educação básica no país, cabendo à União prestar assistência aos entes federados, com o intuito de efetivar sua função supletiva e redistributiva, prevista na Constituição Federal.

    Para exercer tal função, o governo federal conta com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia vinculada ao Ministério da Educação (MEC), que atua no financiamento das ações suplementares voltadas, principalmente, para o ensino fundamental público ofertado por estados e municípios. Essa autarquia tem importante papel nas políticas federais para a educação, uma vez que tem por objetivo viabilizar aquilo que a Constituição Federal define, em seu artigo 211, como exercício da função supletiva e redistributiva da União em relação às demais esferas governamentais, com o objetivo de garantir a equalização de oportunidades educacionais e o padrão mínimo de qualidade do ensino.

    A necessidade desse tipo de intervenção equalizadora revela o que muitos autores consideram como um problema central do federalismo brasileiro, as desigualdades sociais e regionais, que resultam em diferenças fundamentais nas condições de vida e de acesso a serviços públicos nas diferentes regiões e redes de ensino do país, denunciando o que Sérgio Prado (2003a, p. 16) define como disparidades sociais, ou seja, a possibilidade de que cidadãos iguais, em jurisdições diferentes, venham a receber serviços públicos em qualidade e quantidade desiguais. Nesse sentido, percebendo a complexidade da questão federativa, este livro apresenta os resultados de pesquisa que investigou as relações existentes entre pacto federativo e financiamento da educação básica, centrando a análise na função supletiva e redistributiva da União, realizada, principalmente, pelas ações desenvolvidas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

    A motivação para desenvolver esta investigação surgiu ainda durante o desenvolvimento da dissertação de mestrado em Educação (CRUZ, 2002). Ao analisar o processo de implementação do Projeto Nordeste para a Educação Básica, financiado pelo Banco Mundial e pelo Governo brasileiro, evidenciou-se que esse projeto se justificava pela necessidade de combater as desigualdades regionais, sendo suas ações intermediadas pelo FNDE, que, além da operacionalização dos projetos de cooperação internacional, desenvolvia uma variedade de programas junto a estados e municípios. A referida pesquisa indicou a existência de vários condicionantes nas relações estabelecidas entre o Banco Mundial e a União, e entre a União, os estados e os municípios, assim como entre os estados e seus respectivos municípios.

    A experiência de pesquisa vivenciada durante o mestrado, as atividades docentes realizadas na Universidade Federal do Piauí, na Área de Fundamentos Político-Administrativos da Educação, assim como a participação em pesquisas sobre políticas educacionais², têm reforçado a necessidade de aprofundar os estudos sobre os mecanismos e estratégias executadas pelo governo federal ao ofertar condições financeiras para estados e municípios garantirem o atendimento educacional, principalmente da etapa obrigatória da educação básica, o ensino fundamental.

    A necessidade de realização de uma pesquisa nesta perspectiva de análise sobre o papel do governo federal também está ancorada na constatação de que, embora exista um sistema de arrecadação e de transferência de recursos advindos dos tributos, com o objetivo de prover condições para o exercício de responsabilidades com a promoção de políticas sociais básicas para cada ente federado, o pacto federativo brasileiro convive com intensas desigualdades sociais e regionais, as quais afetam claramente a capacidade arrecadadora de alguns entes federados, demandando da União o exercício de sua função supletiva e redistributiva, o que ocorre por inúmeras estratégias.

    No âmbito educacional, dentre tais estratégias, inserem-se as políticas desenvolvidas pelo FNDE, que, em 2006, executou 93% do total de recursos operados pelo MEC, excluindo-se as atividades administrativas e o ensino superior e tecnológico, conforme dados de execução por programas apresentados no Sistema de Acompanhamento Financeiro do governo federal, sendo, portanto, inegável a relevância do papel que desempenha no âmbito das políticas educacionais voltadas aos estados e municípios.

    As ações do governo federal realizadas por intermédio do FNDE ocorrem por meio de assistência financeira direta, automática e voluntária. As duas primeiras formas de assistência baseiam-se em critérios claramente definidos e mensuráveis, em geral no número de alunos apurados pelo Censo Escolar realizado nacionalmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em alguns casos com diferenciais conforme regiões ou características dos alunos atendidos por tais políticas. A modalidade de assistência financeira voluntária ocorre, principalmente, mediante a celebração de convênios, dependendo de inúmeros fatores técnicos e políticos para a sua operacionalização, como alertou Jacques Velloso ao analisar o comportamento da distribuição dos recursos do FNDE na década de 1980, momento em que havia a predominância de critérios clientelísticos ou outros que não atendem a um fim redistributivo ou, ainda, para o consumo pelo próprio Ministério (VELLOSO, 1988, p. 31).

    Considerando a riqueza e a complexidade das ações desenvolvidas pelo FNDE e a constatação do pequeno número de estudos acadêmicos globais sobre as ações dessa autarquia e suas políticas, articulados com a questão federativa, observa-se a necessidade de trabalhos com esse foco. Dentre os estudos realizados sobre o FNDE ou sobre suas políticas, destacam-se as produções de Jorge Abrahão de Castro (1996, 1997, 2000); Sonia Draibe (1999); Jorge Abrahão de Castro, Angela Barreto e Paulo Corbucci (2000); e Claudia Parente (2001), que tratam das políticas desenvolvidas pelo órgão no contexto de redefinição das políticas educacionais nos anos de 80 ou 90 do século passado, aprofundando a análise dos programas que consideram de maior impacto para a reforma educacional. Aspectos centrais das ações de financiamento da educação pelo FNDE, em diferentes períodos históricos, também podem ser encontrados em Jacques Velloso (1988); José Melchior (1987); e Maria de Fátima Lo Bello (1999).

    Castro (1997) analisa o conflituoso processo (latente ou manifesto) de tomadas de decisões a respeito dos gastos do MEC na década de 1980, incluindo aquelas realizadas pela Fundação de Assistência ao Educando (FAE) e pelo FNDE. O autor também aborda, especificamente, o processo de fusão da FAE ao FNDE, em 1997, discutindo o impacto dessa mudança no processo de gasto e nos aspectos políticos e institucionais da interação MEC/FNDE (CASTRO, 2000).

    Entre os esforços para analisar as ações do governo federal no âmbito das políticas sociais ou educacionais, debatendo, articuladamente, as temáticas referentes ao federalismo, à descentralização e ao financiamento perpassando, de forma mais complexa, as três categorias no debate da política educacional nos anos de 1990, destacam-se os trabalhos de Jorge Abrahão de Castro (1997); Marisa Duarte e Vanessa Teixeira (1999); Marta Arretche (2000); e Janete Azevedo (2002). Para além das políticas dos anos de 1990, Gilda Araújo (2005) desenvolve tese sobre municípios, federação e educação, partindo de uma abordagem conceitual no campo da história das instituições e ideias políticas no Brasil.

    Dessa forma, este livro se inclui entre os estudos que pretendem abordar as políticas de financiamento da educação, aprofundando a discussão sobre a execução do papel redistributivo e supletivo da União em relação aos demais entes federados, executados, primordialmente, por meio das ações da autarquia FNDE, dada a sua grande singularidade na representação das políticas educacionais que atingem diretamente estados e municípios.

    Permeado pelas preocupações e interesses até aqui expostos, este trabalho adota como eixo central a seguinte questão de pesquisa: compreendendo que os regimes federados são mais coerentes quando adotam como uma de suas preocupações centrais a necessidade de instituir um padrão mínimo de equalização nas condições de acesso a serviços públicos por parte da população sob a sua responsabilidade, sobretudo quando previsto no pacto federativo, em que medida a União, no campo educacional, tem adotado uma política de financiamento da educação básica condizente com a função supletiva e redistributiva prevista na Constituição Federal de 1988, especificamente por meio das ações desenvolvidas pelo FNDE? Dito de outra forma, considerando as imensas desigualdades sociais e econômicas existentes entre os entes federados das diferentes regiões, estados e municípios do país, em que medida a União, como esfera central da organização política federativa brasileira, tem cumprido sua função supletiva e redistributiva no financiamento da educação, por intermédio das ações desenvolvidas pelo FNDE, com o objetivo de diminuir as desigualdades educacionais regionais?

    Partindo dessas inquietações, a pesquisa que originou este livro teve por objetivo geral investigar as relações existentes entre pacto federativo e financiamento da educação básica, concentrando a análise na execução dos recursos geridos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) voltados às ações suplementares da União à educação pública ofertada por estados e municípios, no período de 1995 a 2006.

    A opção por um período de 12 anos, contemplando três gestões governamentais, Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002) e Luís Inácio Lula da Silva (2003-2006), está amparada na compreensão de que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, as gestões pós 1995 representaram marcos na reformulação das ações da autarquia, permeadas pelas políticas de reforma do Estado, no contexto das crises recentes do capitalismo mundial e da adoção de inúmeras estratégias para a sua superação. Tal contexto influenciou e influencia as ações do FNDE, condicionando suas políticas.

    No contexto de crise se destacam as estratégias adotadas pelo governo federal, como parte de um programa de reforma do Estado visando à sua minimização, de focalização dos gastos e de um extensivo processo de descentralização de políticas sociais, com transferência de funções de gestão, diga-se responsabilidade de execução, para estados e municípios, embora mantendo a definição das políticas em âmbito central. Dessa forma, percebe-se uma significativa alteração na distribuição das competências entre os entes federados no que se refere à implementação de políticas sociais, de forma que o governo federal conseguiu reverter o processo de descentralização de recursos consagrado pela Constituição Federal de 1988 (CF/88) por meio de estratégias de recentralização como, por exemplo, a criação ou ampliação de alíquotas de contribuições sociais.

    Colaborando com esta linha de análise sobre recentralização federal, Sulamis Dain, ao investigar os desembolsos dos programas sociais, destaca uma contaminação da política social e das relações intergovernamentais pela política de estabilização, uma vez que, com o objetivo de alcançar os superávits negociados, o Governo criou mecanismos de retenção de repasses a programas sociais, em especial dos gastos universais e de conteúdo redistributivo da saúde e da assistência social (DAIN, 1995, p. 360), opondo-se claramente à ampliação dos direitos de cidadania, previstos na CF/88, para responder às diretrizes de ajuste fiscal.

    Assim, partindo do objetivo mais amplo de investigar as relações existentes entre pacto federativo e financiamento da educação básica, pretende-se: 1) discutir os principais elementos que permitem a caracterização de um regime como federativo, explicitando os aspectos centrais dessa forma de organização do Estado; 2) analisar a configuração do federalismo brasileiro, evidenciando suas principais características, tendo como marco a Constituição Federal de 1988; 3) problematizar as relações federativas no Brasil, tendo como foco as relações que a União estabelece com estados e municípios no que concerne ao financiamento da educação básica; 4) analisar o formato de financiamento da educação adotado pelo FNDE, verificando se ele permite à União executar o papel supletivo e redistributivo em relação aos demais entes federados, com vistas a minimizar as desigualdades nas condições de oferta educacional; 5) sistematizar as fontes e montantes de recursos operados pelo FNDE no período de 1995 a 2006; 6) analisar os critérios adotados para a partilha dos recursos entre as redes estaduais e municipais de educação nesse mesmo período; e 7) problematizar a distribuição dos recursos operados pelo FNDE entre estados e municípios a partir do cálculo do valor-aluno por gestão governamental, verificando se o padrão adotado permite a minimização das desigualdades educacionais.

    Com tais objetivos, o presente estudo se situa entre aqueles desenvolvidos no âmbito de análise de políticas públicas, com foco no exame dos critérios que fundamentam a distribuição dos recursos federais para a educação ofertada por estados e municípios, por intermédio do FNDE, problematizando os resultados desses critérios na distribuição final. Portanto, não se pretende avaliar a efetividade, eficácia ou eficiência de nenhum programa específico operado pela autarquia, tipo de estudo que se aproximaria da avaliação de políticas públicas (ARRETCHE, 1999), mas procurar a existência de coerência entre os pressupostos que fundamentam a ação do FNDE, direcionados à função supletiva e redistributiva, e à distribuição final de seus recursos.

    O presente trabalho está estruturado em seis capítulos. No primeiro, apresenta-se o percurso metodológico da pesquisa. No segundo, é realizada uma revisão bibliográfica sobre o conceito de federalismo, debatendo como os autores do campo da Ciência Política têm problematizado o tema, com ênfase na discussão dos determinantes da adoção e manutenção dos regimes federativos e da centralização e descentralização nesses regimes. Ainda nesse capítulo, como reveladora dos principais problemas dessa forma de organização do Estado, debate-se a questão fiscal e as transferências intergovernamentais.

    A discussão do federalismo brasileiro é realizada no terceiro capítulo, partindo de uma breve retrospectiva do processo que culminou na adoção do regime no Brasil, explicitando o formato federalista consagrado na Constituição Federal de 1988, o contexto brasileiro no período de análise da presente pesquisa (1995 a 2006) e as polêmicas que envolvem a forma federal no Brasil: a questão tributária, as políticas redistributivas e a questão da representação política dos estados na vontade nacional.

    Tendo desenvolvido uma discussão mais geral sobre o tema, o quarto capítulo centra-se na discussão sobre as relações federativas e financiamento da educação, com particular ênfase sobre as políticas executadas após os meados dos anos de 1990, em sua interface com a organização federal do Brasil. Discutem-se a questão do direito à educação, as responsabilidades dos entes federados com a oferta educacional e a matriz de financiamento da educação, de forma a problematizar as principais políticas que revelam o caráter federativo do financiamento e a questão das desigualdades educacionais.

    Ao FNDE dedicamos os dois últimos capítulos deste livro. No quinto capítulo, fazemos uma breve retrospectiva da história do FNDE e descrevemos sinteticamente seus principais programas, discutindo os critérios e a sistemática de distribuição dos recursos entre as unidades da federação, assim como os intervenientes da construção de tais critérios e a representatividade do FNDE nas transferências voluntárias da União e no total executado pelo MEC. No sexto capítulo, apresentam-se as principais fontes de recursos do FNDE e sua execução financeira, separando a execução da quota estadual/municipal do salário-educação, a quota federal e o total dos recursos do FNDE, confrontando a execução financeira, via valor-aluno, e os dados referentes às desigualdades sociais e educacionais no Brasil, verificando se a função supletiva e redistributiva do FNDE se confirma, com vistas a diminuir as disparidades nas condições de oferta educacional.

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    Nas trilhas do desenvolvimento da pesquisa: o percurso metodológico

    A pesquisa desenvolvida está no campo da avaliação do ponto de vista do gasto e financiamento de políticas públicas, conforme Eduardo Fagnani (1999), que pondera que não é qualquer fonte de financiamento que tem efeitos redistributivos. O autor alerta para a necessidade de considerar três indicadores de gasto e financiamento que podem revelar os limites e o caráter redistributivo de determinada política: a direção do gasto social, a magnitude do gasto social e a natureza das fontes de financiamento.

    Ao considerar-se a direção do gasto social, segundo Fagnani, deve-se verificar onde foram aplicados os recursos, se estes se direcionaram para os segmentos prioritários atendidos, se houve articulação da política pública avaliada com os setores privados, assim como os possíveis desvios da atuação estatal, "como a utilização dos programas sociais para fins eleitoreiros, clientelistas ou fisiológicos" (FAGNANI, 1999, p. 122, grifos do autor).

    Quanto à magnitude do gasto social, o autor indica a necessidade de verificar se ela é compatível com a dimensão das carências sociais que a política implementada pretende atingir. Neste sentido, considera que a avaliação ganha com a adoção de uma perspectiva histórica na análise dos gastos, assim como com a adoção de séries históricas de longo prazo que demonstrem a evolução dos gastos, especialmente por critérios correlacionados, como o gasto per capita (FAGNANI, 1999, p. 122-123).

    Por fim, considerando o indicador natureza das fontes de financiamento, Fagnani pondera que cada fonte pode revelar o tipo de compromisso do gestor com o financiamento da política. Por conseguinte, diferencia três tipos de fontes: recursos fiscais, recursos autossustentados e contribuições sociais. Os fiscais são caracterizados como provenientes de receitas de impostos e taxas aplicadas sem a preocupação de retorno financeiro, portanto tendo maior potencial redistributivo. Os recursos autossustentados têm sua valorização por meio de aplicações financeiras, o que inclui os empréstimos e financiamentos nacionais e internacionais, sendo, assim, uma fonte insuficiente para atender os segmentos mais pobres da sociedade. Os recursos provenientes de contribuições sociais são caracterizados como parafiscais, porque, sendo custeados por trabalhadores e/ou empresas, não atendem plenamente ao objetivo da eqüidade perseguido nas estratégias de desenvolvimento social (FAGNANI, 1999, p. 123).

    A abordagem de Fagnani parece bastante adequada ao objeto da presente investigação, porque é uma pesquisa sobre financiamento da educação que pretende considerar, nas ações do FNDE, os três indicadores apontados pelo autor: a direção, a magnitude e a natureza do gasto social dessa instituição, com vistas a verificar o exercício da função supletiva e redistributiva da União em relação aos demais entes federados.

    Dessa forma, serão analisados os dados da execução orçamentária da despesa de todos os recursos geridos pelo FNDE, de 1995 a 2006, extraídos diretamente do Sistema de Acompanhamento Financeiro do Governo Federal (Siafi)³, relacionados, sempre que possível, à sua distribuição por Unidade da Federação e por rede de ensino atendida. A execução financeira voltada ao atendimento das escolas privadas sem fins lucrativos, embora seja abordada na distribuição global dos recursos, não será foco de discussão no presente trabalho porque não está diretamente ligada às questões eleitas como prioritárias para esta investigação, remetendo a outro tipo de estudo — as relações entre o público e o privado na educação, como nas pesquisas desenvolvidas por Nicholas Davies (1999); Theresa Adrião e Vera Peroni (2005); Vera Peroni, Vera Bazzo e Ludimar Pegoraro (2006), entre outros.

    Além dos dados do Siafi, a pesquisa adotou como fontes para a investigação os relatórios anuais de atividades, as leis que fundamentam os programas da autarquia, as resoluções e as atas de reuniões do Conselho Deliberativo do FNDE (CD/FNDE), assim como a bibliografia produzida sobre a temática. A ênfase nos documentos oficiais, como fontes primárias, está vinculada à compreensão da importância desse material para a análise das políticas públicas.

    A investigação foi desenvolvida em quatro etapas, sem uma divisão rígida quanto à sequência de realização de cada uma, movimento determinado no próprio processo de seu desenvolvimento, garantindo um permanente diálogo entre o trabalho de investigação, as referências empíricas e a reflexão teórica.

    A primeira etapa envolveu a revisão bibliográfica sobre federalismo, federalismo no Brasil e financiamento da educação, perpassando por livros, teses, artigos e legislação nacional, etapa que foi fundamental para a compreensão do formato e das consequências da adoção do regime federativo no Brasil. A segunda, adotando um corte longitudinal, abarcou a investigação das políticas educacionais propagadas ou desenvolvidas pelo FNDE no período de 1995 a 2006, por meio da análise documental e da sistematização dos dados de execução financeira da autarquia, inicialmente com base nos relatórios anuais.

    A análise documental, por estar baseada em documentos produzidos pelos órgãos públicos e balanços de execução financeira do governo federal, buscou identificar informações factuais a partir de questões ou hipóteses de interesses, conforme Lüdke e André (1986, p. 38). Quando verificado que os relatórios adotam metodologias diferenciadas no decorrer dos anos para sistematização dos dados financeiros, impedindo sua comparação, foi necessária a realização de trabalho de campo, parte da terceira etapa da pesquisa, executada durante cinco meses, entre os anos de 2006 e 2008, na sede da autarquia, em Brasília, com a colaboração de técnicos da área de Planejamento e Orçamento do FNDE.

    Nessa terceira etapa, também foram realizadas visitas a vários departamentos do FNDE e outros órgãos públicos com o objetivo de complementar informações ou obter esclarecimentos. Dentre as visitas, destacam-se: Secretaria do Tesouro Nacional; Ministério da Educação (todas as Secretarias-Fins da educação básica); Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep); Núcleo de Educação da Consultoria de Orçamento da Câmara de Deputados; Assessoria Jurídica do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados; União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime); Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e Superintendência de Representação do Piauí em Brasília.

    Ainda como trabalho de campo, foram realizadas entrevistas com o objetivo de preencher as lacunas nas informações sistematizadas pelos documentos da autarquia, com o intuito de responder,

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