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ISSN 0103-847810
- REVISÃO BIBLIOGRÁFICA -
RESUMO INTRODUÇÃO
do conteúdo de eletrólitos na solução do solo, con- téria orgânica como eletroaceptor na respiração
duzindo à liberação de cátions presentes nos sítios (PONNAMPERUMA, 1972).
de troca da matriz coloidal. Deste modo,
alguns íons, macro e micronutrientes como C6H12O6 + 2NAD + 2ATP 6 2CH3COOH + 2NADH + 2H+ + 4ATP (4)
o potássio, o amônio, o zinco e o cobre 1/2O2 + H + e W 1/2H2O (5)
aumentam a sua concentração no meio e,
conseqüentemente, a sua absorção pelas
culturas, podendo, em alguns casos de excesso, Na respiração aeróbia, os elétrons são
atingir níveis de toxidez a culturas como o arroz captados pela nicotinamida adenina dinucleotídeo, e
irrigado (CAMARGO, 1992). transferidos para o oxigênio atmosférico, através de
A complexidade aparente das transforma- um carreador e oxidases terminais. O ácido pirúvico
ções que ocorrem em solos inundados serão discuti- é oxidado através do ciclo dos ácidos tricarboxílicos,
das brevemente neste trabalho, através das relações onde o oxigênio é usado como eletroaceptor terminal
de elétrons (eq. 5). A regeneração do NAD+ permite
entre o potencial de oxi-redução (EH) e a atividade
o sistema operar ciclicamente e completar a oxida-
elétrica e a de prótons sobre as características quími-
ção do substrato.
cas dos solos após a inundação, dando-se ênfase na
Na ausência do oxigênio, os microrga-
medição e efeito destas relações com a disponibili-
nismos anaeróbios facultativos e obrigatórios usam
dade e toxidez dos elementos reduzidos as plantas
NO3-, Mn(IV), Fe(III), SO4=, etc, produtos da dissi-
cultivadas neste sistema.
milação da matéria orgânica (CO2, N2) e até íons H+
como eletroaceptores em sua respiração
DESENVOLVIMENTO
(BARTLETT e JAMES, 1993). Como a taxa de
Efeitos iniciais da inundação - Um solo inundado difusão do oxigênio na água é mais lenta do que no
sem perdas por infiltração, assemelha-se a um siste- ar (LUXMOORE et al., 1970), o consumo de oxigê-
ma fechado, isto é, não troca matéria com a perife- nio pelos microrganismos é mais rápido do que o
ria, mas com possibilidade de trocar energia. Quan- suprimento por difusão, através da fase líquida nos
do um solo é inundado, o equilíbrio anterior é alte- solos inundados. Ocorre então a formação de um
rado, pois a água desloca o ar dos espaços porosos, gradiente de concentração de oxigênio, levando à
criando regiões de anerobiose devido à depleção do formação de duas camadas distintas: uma de oxida-
oxigênio e o aumento de CO2, produzido pela respi- ção e outra de redução, pois um solo submerso ou
ração microbiana. O oxigênio livre presente no solo saturado, não é uniformemente desprovido do oxi-
desaparece rapidamente em função da necessidade gênio. Desta forma, a concentração do oxigênio
de energia (microrganismos aeróbios) para os pro- pode ser elevada na camada superficial, onde a difu-
cessos biológicos, envolvendo transferência de elé- são de oxigênio é suficiente para o consumo dos
trons das substâncias utilizadas como fonte de ener- microrganismos aeróbios. A espessura desta camada
gia para as reações químicas consideradas como oxidada depende do equilíbrio entre difusão e con-
produto da respiração. O consumo de O2 deve regu- sumo de oxigênio, não ultrapassando em geral a
lar a atividade de elétrons na solução do solo, de alguns milímetros (KLUDZE e DeLAUNE, 1995).
acordo com a reação: Abaixo desta zona, a concentração do oxigênio de-
O2 + 4H+ + 4e- W 2H2O (1) cresce abruptamente para praticamente zero. Nesta
Assim, como a liberação de CO2 irá regular a ativi- região reduzida, desenvolve-se, para a maioria dos
dade de prótons na solução do solo de acordo com as cultivos adaptados a este meio, o sistema radicular, e
reações: onde ocorrem as principais transformações eletro-
químicas que afetam estas culturas (OLIVEIRA et
CO2 + H2O W H2CO3* (CO2) ; [H2CO3*] = kH PCO2 (2) al., 1993a). De forma concomitante, durante o pro-
H2CO3* W H+ + HCO3- ; k = (H+)(HCO3-)/(H2CO3*) = 10-6,36 (3) cesso de redução, ocorre liberação de gases como
produto final da respiração microbiana. CO2 e N2
A mudança de respiração aeróbia para são liberados rapidamente após o alagamento, sendo
anaeróbia no metabolismo dos carboidratos ocorre CO2 e H2 compostos gasosos típicos produzidos
em baixa concentração de oxigênio (3.10 mol L ). -6 -1 durante a fermentação. Encontram-se ainda quanti-
Estes sistemas seguem provavelmente vias comuns dades apreciáveis de etileno, ácido sulfídrico, ácidos
até a formação do ácido pirúvico (eq. 4), utilizando orgânicos voláteis (CAMARGO, 1992) e, finalmen-
compostos de carbono como substrato, componentes te, metano, produzido na fase metanogênica da de-
oxidados do solo e produtos da dissimilação da ma- composição anaeróbica de matéria orgânica por um
RT EH
E O
= ------- 1nk (10)
Pe = ------------ (17)
NF 0,059
que aceleram a semi-reação de redução ou de oxida- gley pouco húmico, que recebeu diferentes doses de
ção, produzindo valores de atividades de reagentes e palha de arroz (0, 5, 10, 20 e 40t.ha-1), um aumento
produtos que concordam com as predições do equi- de pH nas primeiras 24 horas, sendo a magnitude do
líbrio químico. Essa possibilidade depende inteira- aumento controlada pelo nível de palha adicionada.
mente do crescimento e comportamento ecológico MORAES e DYNIA (1992) observaram que a inun-
da população microbiana e da difusão dos produtos dação provocou o aumento do pH da solução do solo
das reações bioquímicas na solução do solo. Em e que este valor diminuiu após a drenagem. Em
alguns casos, as reações "redox" serão controladas solos ácidos, o aumento do pH, após a submergên-
pela dinâmica altamente variável de um sistema cia, depende não somente da relação do íon OH- e do
biológico aberto, resultando numa especiação que, consumo do íon H+, mas também da relação de íons
quando muito corresponderá às condições locais de H+ consumidos/elétrons consumidos. Para o au-
equilíbrio parcial. Em outros casos, incluindo os mento do pH, duas condições são necessárias: um
solos alagados, as reações "redox" serão controladas processo de redução bem desenvolvido e a presença
pelo comportamento descrito para sistemas fecha- suficiente de ferro reduzido. A explicação provável é
dos, que são efetivamente catalisados por bactérias,
de que substâncias, tais como compostos ferrosos
sendo pertinente neste caso, uma descrição de equi-
(Fe2+), sulfeto e amônia, formadas sob condições
líbrio.
reduzidas, são mais básicas do que quando sob con-
Na maioria dos solos, as reações de oxi-
dições oxidadas. O decréscimo no pH de solos alca-
redução são acompanhadas pela participação de
linos, após a submergência, pode ser explicado por
prótons. Pela reação:
várias alterações químicas e biológicas. A decompo-
(oxidante) + ne- + mH+ W (redutor) (20) sição da matéria orgânica produz CO2, o qual reage
o com H2O para formar ácido carbônico, que se disso-
a 25 C:
cia em íons H+ e HCO3-. Em solos alcalinos, a dimi-
0,059 (oxidante) m nuição do pH pode ser atribuída ao sistema
EH = Eo + ------ log ----------- - 0,059 --- pH (21)
n (redutor) n Na2CO3-H2O-CO2 (solos sódicos) e ao sistema
CaCO3-H2O-CO2 (solos calcários) (PONNAM-
Quando a relação m/n ou H+/e for igual a 1: PERUMA, 1978). O efeito do pH e do EH nas rea-
ções, e especialmente no equilíbrio químico final
0,059 (oxidante) dos solos submersos, é maior quando ambos exer-
EH = Eo + ------ log ----------- - 0,059 pH (22) cem este efeito, do que cada um individualmente
n (redutor) (MANZATTO et al., 1993). Essas alterações são
complexas por natureza, sendo seu conhecimento
significando que o valor teórico do coeficiente indispensável ao manejo da cultura neste sistema
∆EH/∆pH é -59mV à 25oC. A aplicação da equação (KLUDZE e DeLAUNE, 1995).
(22) ao sistema inorgânico O2-H2O resulta em: A condutividade elétrica (CE) é o fenô-
EH = 1,23 + 0,0015log PO2 - 0,059 pH (23) meno de transferência de eletricidade exercido pelas
partículas carregadas (íons, colóides) sobre uma
e ao sistema orgânico quinona-hidroquinona a
pH>8: força aplicada em um campo elétrico. A CE dos
O pH, na maioria dos solos, tende à neu- solos inundados segue o comportamento geral da CE
dos solos (JUN et al., 1985), aumentando após a
submergência, atingindo um máximo e decrescendo
EH = 0,699 + 0,0295log (quinona)/(hidroquinona) - 0,059 pH (24)
para valores estáveis. O aumento na CE, durante as
primeiras semanas após o alagamento, é devido à
tralidade após a submergência, atingindo usualmente mobilização do Fe2+ e Mn2+, acumulação de NH4,
um equilíbrio em torno de 6,5 a 7,5. A ação tampo- HCO3 e RCOO- e pelo deslocamento dos cátions
nante dos solos submersos é devido aos sistemas adsorvidos nos colóides por Fe++, Mn++ e NH4+
reduzidos do ferro, manganês e do ácido carbônico, (DeDATTA, 1983). Entretanto, alguns solos que
cujas reações de oxi-redução envolvem o consumo apresentam CE elevada, a inundação pouco altera os
ou a produção dos íons H+/OH- valores iniciais (OLIVEIRA et al., 1993a), ou verifi-
(PONNAMPERUMA, 1977). Propriedades do solo, cam-se resultados inconsistentes (MORAES e
tais como conteúdo de ferro ativo e matéria orgâni- DYNIA, 1992). Verifica-se também uma relação
ca, influenciam marcadamente as mudanças do pH entre a CE e a força iônica que pode variar para
(PONNAMPERUMA, 1972). CAMARGO et al. diferentes sistemas (PONNAMPERUMA, 1977).
(1993a) constataram após a inundação de um solo
nês solúvel, podendo atingir valores tóxicos para a aos seguintes fatores: a) hidrólise dos fosfatos de
cultura (TADANO e YOSHIDA, 1978). Obedecen- ferro e de alumínio, b) liberação do fósforo adsorvi-
do à seqüência termodinâmica, após o Mn, os do por intercâmbio aniônico nas argilas ou nos hi-
oxi-hidróxidos de Fe3+ são reduzidos a Fe2+. Na dróxidos de Fe3+ e de Al3+ e c) redução do Fe3+ a
ausência de O2, NO3- e Mn4+, o Fe3+ pode receber Fe2+ com liberação do fósforo adsorvido e fixado
elétrons da oxidação do carbono da seguinte forma: pelo Fe3+ (VELLOSO et al., 1993b). O aumento da
solubilidade do fósforo decorrente da inundação,
CH3COOH + 8Fe3+ + 2H2O 6 2CO2 + 8Fe2+ + 8H+ (30) determina uma melhor eficiência da utilização deste
elemento, minimizado a dependência de fertilizantes
A coloração cinza (gley) do solo é produ- fosfatados (GRANDE et al., 1986). A solubilidade
zida a partir da redução bacteriana do ferro em com- do silício aumenta com o tempo de inundação, pro-
binação com sulfetos (TANAKA e NAVASERO, movendo a absorção mais efetiva deste elemento e,
1966). O ferro sob forma reduzida (Fe2+) aumenta conseqüentemente, o desenvolvimento estrutural dos
após a inundação (VELLOSO et al., 1993b; aerênquimas. Deste modo, favorece o aumento do
MORAES e DYNIA, 1992), sendo preferencial- suprimento de oxigênio na raiz, promovendo a
mente absorvido pelas raízes das plantas. Em solos "energia de oxidação", importante para a rizosfera
ácidos, a concentração do Fe2+ na solução pode oxidada na defesa contra a toxidez dos elementos na
também ser fitotóxico para a cultura forma reduzida (PONNAMPERUMA, 1972).
(JUGSSUJINDA e PATRICK, 1993). A redução do Ao contrário dos demais elementos, o
sulfato, realizada por microrganismos estritamente zinco decresce sua concentração após o alagamento,
anaeróbios, ocorre em potencial de redução muito podendo ser devido à precipitação do Zn(OH)2 como
baixo (SHU-ZHENG, 1985). A reação de oxidação resultado do aumento do pH, precipitação do ZnCO3
do carbono e redução do sulfato podem ser esque- devido à acumulação do CO2, resultado da decom-
maticamente representadas pelas equações: posição da matéria orgânica e precipitação do ZnS
sob condições altamente reduzidas. DYNIA e
2CH3CHOHCOOH + SO4- 6 2CH3COOH + 2H2O + 2CO2 + S2- (31) BARBOSA FILHO (1993) constataram que a
4H2 + SO42- 6 S2 + 4H2O (32)
adição de palha de arroz reduziu ligeiramente os
teores de Zn e Cu extraíveis. O aumento da con-
O fósforo ocorre no solo sob duas formas:
a orgânica, de liberação lenta, e a inorgânica, cons- centração dos cátions Mn2+ e Fe2+ na solução do solo
tituída de fosfatos solúveis em solução redutora faz-se refletir no equilíbrio complexo de tro-
(MACHADO, 1985). Sob condições de inundação, ca/solução, com o deslocamento de outros cátions
os teores de fósforo disponível aumentam, princi- adsorvidos para a solução do solo. Após o alaga-
palmente nas primeiras semanas, devendo-se isso mento, verifica-se o aumento dos teores destes cáti-
ons na solução do solo, promovendo uma maior
disponibilidade (CAPECHE, 1991.
Presença de plantas de arroz
O arroz, crescendo em um ambiente anae-
róbio, deve apresentar adaptações que permitam a
proteção da rizosfera ao efeito da toxidez dos ele-
mentos nas suas formas reduzidas. Um dos meca-
nismos de proteção desenvolvido pela planta é a
ocorrência de uma rizosfera oxidada. Durante as
reações da fosforilação oxidativa, o oxigênio é en-
zimaticamente reduzido, formando uma molécula de
água nas células das plantas. O suprimento às raízes
das plantas pode ser feito "via solo" (sistemas aeró-
bios) ou "via planta", através de tecidos condutores
de ar, denominados aerênquimas, que representam
nas raízes do arroz, 5 a 30% do total dos tecidos.
Esta capacidade do arroz, em oxidar a região da
rizosfera, constitui um dos mais importantes aspec-
tos que condicionam a planta a amenizar os efeitos
Figura 1 – Relação entre pe e EH quando no equilíbrio de siste-
mas "redox" em água (incluindo solo) (25°C). Adap- tóxicos dos produtos da redução (LUXMOORE et
tado de Tian-Yen (1985). al., 1970).
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