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ISSN: 0104-8740
revistapoliticaspublicasufma@gmail.com
Universidade Federal do Maranhão
Brasil
GENTRIFICATION AND THE RENOVATION OF THE HISTORICAL TOWNS IN BRAZIL: the process that leads to
habitation deficit
Abstract: This article is a critical discussion about policies to preserve the Brazilians´ historic centers which need to
protect local and cultural groups, but in practice, are in the process of gentrification? that increases housing problems
for those entering the consuming culture areas. The process of gentrification ? linked to business interests inevitably
makes the local residents leave their areas considered inherited by them, to create power landscapes to motivate
commercial exploitation. This creates new centralities that provide higher returns towards investments made.
Key words: gentrification ?, housing, heritage, landscapes of power.
Nos estudos de Barros e Pugliese (2008) o hectares compondo o núcleo primitivo da cidade.
processo de gentrificação do centro histórico de (BOGÉA et al, 2007).
Salvador ocasionou a desapropriação sistemática dos Silva e Sette (2008) ao realizarem pesquisa no
moradores, uma vez que o Estado invocou a Centro Histórico de São Luís do Maranhão,
propriedade sobre bens tombados para dar-lhes uso considerado Patrimônio Histórico da Humanidade pela
privatístico e atender a interesses da especulação UNESCO, em 1997, identificaram mudanças ocorridas
imobiliária. Com a implementação da política de nesse espaço a partir da implementação das políticas
revitalização houve a higienização de grupos de revitalização. O espaço estudado vem
considerados “indesejáveis”. Quanto à criação de corporificando novas memórias dos grupos que detêm
paisagens de poder, convém destacar que a maioria o poder econômico e político. Notou-se a proliferação
dos casarios restaurados foram transformados em de diversos bares, restaurantes, casas de shows e
lojas de souvenir, bares, restaurantes típicos, espaços voltados para atividades lúdicas em meio à
galerias de arte, museus ateliês e casas de proliferação de inúmeros estacionamentos. Além do
espetáculos. Além disso, viu-se que atos mais, com a especulação imobiliária houve a expulsão
desapropriatórios visando à inserção do capital no da população. Muitos sobrados foram postos à venda
consumo cultural geraram a exclusão de grande gerando a completa alteração de um modus vivendi
parte da população residente. que se constitui contraparte humana dos edifícios
As intervenções do Pelourinho tiveram um tombados, a cultura viva do lugar. Essa foi substituída
grande impacto na transformação da apropriação pela contemplação estrangeira de manifestações
e consumo do espaço urbano, pois a maioria dos culturais organizadas.
imóveis, 64,8%, foi convertida em uso comercial, Essa tendência contemporânea de
sendo que apenas 16 % deles permaneceram para remodelamento das feições dos centros históricos,
uso residencial. (NOBRE, 2003). impulsionada pelo desenvolvimento capitalista, trouxe
Para Zukin (2000), o enobrecimento redefine o conseqüências significativas para a reativação das
significado social de um lugar especificamente atividades e a criação de novas paisagens de poder
histórico para um segmento do mercado e a em São Luís. Para Zukin (2000), do ponto de vista
descentralização densa redefine o mercado histórico ou estrutural, a paisagem é claramente uma
imobiliário em termos de um sentido de lugar. Os ordem espacial imposta ao ambiente. Portanto, ela é
dois processos trazem implicações significativas sempre socialmente construída. É edificada em torno
para valores de propriedade, nível de emprego e de instituições sociais dominantes e ordenada pelo
outros fatores econômicos que prometem corroer poder dessas instituições que transformam
tanto o lugar como o vernacular. inevitavelmente o patrimônio em “produto cultural”
No tocante ao aspecto habitacional, Barros e passível de ser vendido e modificado, associando seus
Pugliese (2008) afirmam que a maioria das pessoas, interesses a feitos considerados relevantes para a
pobres e negras, foram expulsas de suas casas e, comunidade.
juntamente com elas, a cultura que construíram e Essa ativação produtiva causou certos prejuízos
que deu identidade ao espaço. Muitas dessas quando se verificou que alguns bens, de certo modo,
pessoas encontram-se nas ruas, favelas, periferias passaram a ser considerados como entrave ao
e lugares marginais. Teve-se, portanto, a retirada crescimento do bairro. Percebeu-se o ritmo de
dos indivíduos “descartáveis por sua posição social “destruição do passado cultural a partir da demolição
e institucionalizou-se, ali, a cultura maquiada e de edifícios e monumentos arquitetônicos em nome
falsificada dos modos de viver, fazer e criar de uma da modernização e da necessidade de atender ao
grande população”. (BARROS ; PUGLIESE 2008). perfil do turista”. (SILVA; SETTE, 2008, p.8) Assim,
Nesse sentido, há um grande erro da ação considera-se que o Centro Histórico de São Luís-MA
pública na gestão do patrimônio, onde o culto à caracteriza-se como um lugar ocupado por um
memória tem como pano de fundo os interesses processo de gentrificação distinto daquele
que sempre prevaleceram nos processos de tradicionalmente esperado pelas políticas púbicas de
preservação e conservação do nosso patrimônio revitalização.
histórico com o objetivo de privilegiar a construção Percebe-se que as atividades motivadas
de espaço para uma elite branca e culta. (OLIVEIRA tipicamente pelo turismo provocaram um certo
apud PONTES; OLIVEIRA, 2007). estranhamento entre moradores e o público visitante.
• São Luís Tal estranhamento inicial levou a reconhecer no Centro
São Luís, capital do Estado do Maranhão, Histórico um flagrante distanciamento em relação aos
localizada na porção Meio-Norte do Brasil, constitui moldes em que foi concebido e gestado o Programa
a última fronteira da região Nordeste com a de Revitalização. (SILVA; SETTE, 2008) Com isso,
Amazônia. Herdou de seus antepassados um os objetivos de restaurar e preservar o patrimônio
conjunto arquitetônico colonial de influência ibérica arquitetônico para beneficiar a permanência da
sem precedentes na América Latina tanto pela sua população residente alcançou resultados contrários
extensão como por sua homogeneidade. aos planejados.
O Centro Histórico de São Luís é um dos maiores • Recife
da América Latina, habitado por um uma população O Bairro do Recife - ou Recife Antigo - situado no
de baixa renda, é constituído de duzentos e vinte centro da capital pernambucana é um ponto turístico,
mas, por algum tempo, devido à degradação física apresentaram similaridades, principalmente no
das edificações e dos espaços públicos, ficou ligado que tange aos resultados desses três exemplos
ao estigma de local perigoso e marginal. apresentados: São Luís, Recife e Salvador.
A Prefeitura da Cidade do Recife, em 1987, Percebe-se que as políticas de revaloração
promoveu um plano para revitalização do Bairro do dos centros buscam a singularização do lugar,
Recife. O discurso justificativo para o plano consistiu com criação das paisagens de poder numa
na retenção da população e melhoria na estrutura espécie de identidade da consciência coletiva
física da área. Os princípios que nortearam o projeto para se diferenciar das demais. Contudo, à
configuravam em reabilitação das estruturas medida que as paisagens são transformadas para
históricas e promoção social. As propostas estavam o setor de turismo, elas se tornam cada vez mais
voltadas para a conservação dos bens patrimoniais semelhantes. Assim, a busca pela diferenciação
e para a participação da comunidade pobre residente incita replicação dos modelos mais exitosos
promovendo concorrência entre as cidades,
no bairro. (PONTUAL, 2008) A implantação do Plano
descrita por Sanches (2003) como a busca
de Revitalização do Bairro Recife (PRBR), em 1993,
incessante da atração do capital. Nesse sentido,
com investimento do governo municipal em parceria
o que ocorreu em Salvador, São Luís e Recife
com vários agentes privados, tinha como objetivo a
traduz-se como consumismo do patrimônio, uma
requalificação da área e sua reativação para o violência simbólica com dilapidação expressa do
desenvolvimento. patrimônio cultural imaterial ali erigido na medida
Em 1998 o Bairro do Recife foi tombado, a nível em que fomentou a expulsão e o desenraizamento
federal, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e dos moradores que davam identidade ao espaço.
Artístico Nacional (IPHAN). No dossiê de Esse processo de gentrificação presenciado
tombamento está destacada como justificativa a rica neste texto reflete a priorização de uma memória
diversidade de estilos arquitetônicos e padrões coletiva permeada de uma decisão ideológica,
urbanos representativos das temporalidades de política e social a respeito da apropriação e
formação da cidade e, portanto, lugar de identidade mercantilização dos bens materiais e simbólicos
dos recifenses. (PONTUAL, 2008) protegidos, inclinando-se cada vez mais para
Para Leite (2007), é válida “qualquer intervenção atender aos interesses da elite dominante, o que
que melhore as possibilidades de usos dos espaços evidencia uma distância acentuada entre o
públicos da cidade. Mas o que ocorreu no Bairro do discurso protecionista e as suas práticas. Se, por
Recife caracterizou um processo de “gentrificação” um lado, relaciona-se os feitos simbólicos da
acarretando forte exclusão social, na medida em que memória coletiva de seu povo aos valores dos
espacializou as atividades de lazer do bairro numa grupos sociais e à economia local, por outro lado
espécie de zoneamento da diferença”. As políticas percebe-se uma articulação negativa entre a
implementadas não trouxeram, de fato, contribuições política de preservação e o consumo do lugar por
efetivas para sua requalificação, seja no que se refere meio do uso e apropriação por distintos grupos e
aos edifícios de interesse da preservação ou aos interesses sociais externos.
espaços públicos. Predominaram a exploração pela A monumentalização do centro histórico
iniciativa privada e a descaracterização do patrimônio, promove o atropelamento da comunidade local
o que promoveu a remoção das pessoas de suas existente na área, bem como o despovoamento
casas para criação de bares e restaurantes. pelas classes menos privilegiadas em prol da
Nesse sentido, existe uma inflexão na concepção modernização urbana, símbolo da elite.
(SCOCUGLIA, 2004).
dos planos de preservação, reabilitação e
Percebe-se que o incentivo ao turismo, tão em
revitalização.
voga, produz o que se pode chamar de uma
“memória aparente”, estando mais próxima de
As práticas urbanísticas mudaram,
uma superação dialética que deixa, após grandes
conotando distintos significados aos
espaços públicos. Embora esses planos
mudanças, uma negação do centro convertendo
de revitalização tenham sido evocados as áreas antigas por meio de uma vida social
como de sucesso e que não esvaziaram nova. (PELLEGRINO, 2007). A atuação conjunta
o sentido de público, a revisão dos de fatores como especulação imobiliária sem
mesmos, à luz da crítica às práticas controle revela um exercício da soberania estatal
urbanísticas, indicam, segundo Capel voltada para um dirigismo totalizante das novas
(2005, p: 59), que “el énfazis en los formas de ocupação do território que implica em
proyectos económicamente viables, y en problemas sociais. No que concerne ao de
las negociaciones, ha llevado a errores moradia, percebe-se um elevado déficit
graves. Há permitido recalificaciones habitacional que reflete a necessidade de
que no deberían haberse hecho”. produção de novas moradias, principalmente para
(PONTUAL, 2008, p. 4). o grupo social que foi excluído e expulso desses
espaços. Apesar da ausência de indicadores
4 CONCLUSÃO exatos, é de conhecimento público que parcela
significativa desse segmento vive em habitações
Apesar da diferenças conceituais entre precárias, sem infra-estrutura, sem regularização
gentrificação e política de revitalização, ambas da ocupação e em áreas de periferias.
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Edileuza Sette
Professora Mestre da UFRR.
(95)- 81176437
E-mail: edileuzasette@hotmail.com