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Tutoria

V
Módulo II
Dor Abdominal,
Diarreia, Vômitos e
Icterícia

Acadêmico: Roger Aparecido Durigan


2016-2
1
Sumário

Problemas e Objetivos ----------------------------------- 3

Problema 1 – Meu filho não para de vomitar ------- 10

Problema 2 – Problemas com os portões ------------ 35

Problema 3 – Com ou sem molho? -------------------- 59

Problema 4 – Diarreia que não melhora ------------- 80

Problema 5 – Minha doença tem cura? ------------ 101

Problema 6 – Doutor chega de sofrimento! -------- 139

Problema 7 – Meu filho nasceu com icterícia ----- 159

Problema 8 – Tipo de hepatite? Como assim? ---- 180

Problema 9 – Doutor, estou com hepatite? -------- 207

Problema 10 – Minha doença é péptica ou infecciosa


--------------------------------------------------------------- 223

SUMÁRIO EXTRAS ----------------------------------- 236

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Problemas e Objetivos
Problema 1 – Meu filho não para de vomitar
Nayara procurou o pronto socorro, pois seu filho Maurício, de 21 dias, começou
a apresentar vômitos, após a amamentação. Ela caracterizou os vômitos como
sendo “fracos” e que se tornavam cada vez mais precoces em relação às
mamadas. Dava bromoprida à criança, mas os vômitos persistiram. Ficou muito
preocupada ao lembrar que seu vizinho teve diagnóstico de “derrame” quando
apresentou vômitos intensos. Maurício parecia sempre estar com fome, mesmo
após ter acabado de vomitar, “de tanto que mamou”, informou a mãe. Os
vômitos são leitosos e a criança tem perdido peso desde que começou a vomitar.
A urina ficou mais concentradaescura e as evacuações diminuíram em volume.
Durante o exame, o Dr. Bosi percebeu achados significativos que incluíam:
turgor diminuído e mucosas secas, além de taquipneia e taquicardia com pulso
fino.Foram realizados alguns exames cujos valores eram: ureia = 60mg/dl,
creatinina = 1,0mg/dl, Na+ = 130mEq/l, K+ = 3,2 mEq/l, Cl- = 86mEq/l. Maurício
foi prontamente internado e o Dr. Bosi foi rápido em instituir medidas
imediatas e mediatas para o caso. Este tranquilizou Nayara ao explicar que seu
filho não tinha problema na cabeça, como no caso do seu vizinho.
 Objetivos
O1: Discutir a fisiopatologia do vômito central e periférico e as características
semiológicas e seus principais estímulos desencadeantes.
O2: Conhecer as principais drogas antieméticas e seu mecanismo de ação.
O3: Correlacionar as alterações hemodinâmicas com o quadro de hipovolemia.
O4: Discutir os distúrbios hidroeletrolíticos relacionado ao caso.
O5: Discutir os princípios básicos do tratamento da hipovolemia, hiponatremia e
hipocalemia que acompanha a desidratação.

Problema 2 – Problema com os portões


Guilherme é um próspero empresário do ramo de portões eletrônicos em Rio
Verde. Sua Família vem crescendo assim como sua barriga, nos últimos seis
anos. O caçula Leônidas, mama exclusivamente ao seio, mas sempre apresenta
crises de choro após as mamadas que só acalmam no colo. Seu filho do meio,
hoje com dois anos foi levado à consulta pediátrica por episódios repetidos de
pneumonia e otite. Não há um mês sequer que o pequeno Vinícius não passe sem
o uso de antimicrobianos, por tais motivos. Tatiana Débora sua filha de quatro
anos também está apresentado mudanças de seu comportamento, com bastante
tosse noturna, irritabilidade e sono agitado. A avaliação do médico foi
minuciosa e além de halitose e erosões dentárias em ambas as crianças, só
percebeu que elas estavam um pouco abaixo do peso esperado, embora a família
referisse alimentação adequada tanto em quantidade como em qualidade. O
pediatra informou ao Sr. Argentafim que gostaria de fazer alguns exames como
radiografia contrastada de esôfago, estômago e duodeno (EED); pHmetria
esofágica, manometria esofágica; e talvez até uma endoscopia digestiva em cada
criança. Guilherme pensou “esse cara é louco! Trago meus filhos com queixas
de tosse e ele faz exames de estômago”. Sentindo a desconfiança de seu cliente o
médico apressou-se em explicar seu real interesse, acalmando o obeso
empresário. Para isto usou como analogia portões mal funcionantes, sendo
forçados por ladrões quer ao entrar invadiam vários espaços na propriedade

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invadida, causando transtornos múltiplos. Neste momento recomendou algumas
mudanças de hábitos e prescreveu o uso de pró-cinéticos e inibidores da
secreção ácida do estômago para serem usados tão logo os exames fossem
realizados.
Guilherme Argentafim tomou então três providências imediatas:
1. Marcou os exames para o mesmo dia e comprou as medicações;
2. Procurou o seu médico para verificar se sua sensação de queimação noturna
poderia ser tratada com aquelas medicações já que seus antiácidos habituais já
não faziam mais efeito e ele tinha medo de precisar de cirurgia e;
3. Principalmente, reforçou as medidas de segurança dos portões de sua empresa.
 Objetivos
O1: Rever a anatomia da junção esôfago-estômago com ênfase aos elementos da
barreira antirrefluxo.
O2: Conhecer o refluxo gastroesofágico.
O3: Compreender a classificação do refluxo em fisiológico e patológico (primário e
secundário) e doença do refluxo gastroesofágico (DRGE).
O4: Compreender a fisiopatologia da DRGE.
O5: Compreender as manifestações digestivas e extra digestivas da DRGE.
O6: Conhecer os métodos diagnósticos das doenças do esôfago destacando a DRGE.
O7: Conhecer o tratamento farmacológico e não farmacológico da DRGE.
O8: Discutir o impacto comportamental e financeiro da DRGE nas famílias.

Problema 3 – Com ou sem molho?


Pedro, estudante do terceiro ano do curso médico, tem 21 anos, procurou o
médico, pois na última semana tem sido acordado com dor abdominal em
queimação na região do epigástrio, irradiada para dorso, diariamente. Refere
que, em geral, não toma café da manhã, almoça uma “coxinha” com
refrigerante, lancha salgadinhos tipo Cheetos na cantina da UniRV e, à noite,
toma um copo de leite e come pão com queijo. Relata que seu pai e dois tios
paternos já tiveram úlcera duodenal. O médico solicitou exames de rotina de
sangue, de urina e de fezes, os quais foram normais. Baseado no quadro clínico
ele pediu, adicionalmente, uma endoscopia digestiva alta que demonstrou a
presença de gastrite de antro com erosões elevadas, úlcera duodenal em
atividade e duodenite erosiva. A biópsia do antro gástrico demonstrou gastrite
crônica e a presença de Helicobacter pylori. Após o resultado, Pedro ficou
assustado e perguntou como e por que ele desenvolveu todas estas alterações e
qual será o tratamento. Ele quer saber, também, se é necessário erradicar a
bactéria, pois aprendeu que a úlcera é ocasionada pelo ácido do estômago.
 Objetivos
O1: Rever a anatomia, histologia e fisiologia do sistema digestivo alto com enfoque
nos mecanismos de secreção ácida do estômago.
O2: Discutir a definição, fisiopatologia, clínica e o mecanismo de ação das drogas
utilizadas no tratamento das doenças pépticas gastroduodenais (gastrite, úlcera e
duodenites).
O3: Descrever os mecanismos de patogenicidade do H. pylori e as drogas utilizadas
no seu tratamento.
O4: Discutir os aspectos biopsicossociais relacionados a doença péptica.

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Problema 4 – Diarreia que não melhora
Sami, 19 anos, é solteiro, pardo, mecânico, natural e procedente de GO. Mora
em São Simão há quatro anos. Queixa-se de diarreia há dois dias, que começou
com uma evacuação aquosa, mas evoluiu com a presença de “catarro” e laivos
de sangue nas fezes. As evacuações passam de dez episódios ao dia, são de
pequeno volume, acompanham-se de dor abdominal em cólica no hipogástrio e
sensação de câimbras no reto (tenesmo). Refere que há três dias vem se sentindo
progressivamente doente, com adinamia, dor de cabeça e febre que ultrapassa
os 39ºC, até que ontem surgiu a diarreia. Desconfia que o quadro foi causado
por um cachorro-quente com muito molho que comeu há quatro dias em uma
banca de rua. Desde então só comeu alimentos preparados em casa. Marcela,
sua namorada, que não quis o sanduíche, não adoeceu. Sami informou também
que já teve diarreia no passado e que, após o exame de sangue, o médico disse
que não era grave e que ele necessitaria somente de tratamento com
sintomáticos. Vanessa, a interna que o atendeu, constatou que o paciente estava
febril, desidratado, com o abdome doloroso à palpação profunda, mas, sem
sinais de irritação peritoneal. Os ruídos hidroaéreos estavam aumentados.
Depois de analisar o caso, junto com o residente, colheu os exames necessários e
explicou ao paciente que condutas seriam tomadas.
 Objetivos
O1: Explicar a fisiopatologia das diferentes formas de diarréia aguda.
O2: Explicar as manifestações clínicas da diarréia aquosa e da desinteria.
O3: Discutir os fundamentos do tratamento clínico das diarréias agudas.
O4: Discutir as medidas preventivas para as diarréias infecciosas.

Problema 5 – Minha doença tem cura?


Laís levou seu filho Ricardo, de um ano e seis meses de idade, ao pediatra, pois
ele está com diarreia há dois meses. Segundo a mãe, a criança nasceu em boas
condições, com 3.500g, e evoluiu bem até um ano de idade, quando iniciou
quadro de diarreia. A diarreia era caracterizada como sendo frequente (cinco a
sete evacuações/dia), fezes amolecidas, com restos alimentares, sem sangue ou
muco. Persiste até o momento. Foi amamentado até dez meses, quando foi
introduzido leite em pó integral no esquema alimentar da criança. Sua dieta
atual é composta por duas mamadeiras/dia, no almoço e jantar recebe a comida
da casa, duas frutas nos lanches e sobremesas como iogurtes, gelatinas e geleias.
As condições socioeconômicas da família são boas. O trigo vem sendo oferecido
para a criança desde os sete meses de idade. Ao exame físico Rafael
apresentava-se irritado, hipocorado e com abdome distendido. Peso = 7.650g e
estatura = 76cm. O pediatra explicou para a mãe as principais possibilidades
diagnósticas, mas disse que somente com os resultados de uma série de exames
solicitados, poderia comprovar suas hipóteses.Laís saiu preocupada, pois acha
que terá dificuldades, tanto econômicas como na dinâmica familiar para cuidar
do seu filho. Resultados de exames:
 Pesquisa de substâncias redutoras nas fezes: negativo;
 Pesquisa de gordura fecal: menor que 3g/24 horas;
 Pesquisa de Alfa-1-antitripsina fecal: menor que 3,0 mg/g fezes secas;
 Anticorpo anti-endomíseo (EMA) positivo
 Anticorpo anti-transglutaminase (iTG) – positivo

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 Teste do suor (Cloretos) – menor que 40 mEq/l
 Objetivos
O1: Definir o conceito de diarréia crônica.
O2: Discutir o diagnóstico da diarréia crônica.
O3: Explicar a fisiopatologia, quadro clínico, principais exames e conduta da diarréia
crônica.
O4: Discutir as repercussões na conduta de uma família que convive com uma
criança em tratamento de diarréia crônica.

Problema 6 – Doutor chega de sofrimento!


Alana tem 23 anos de idade e vem apresentando diarreia crônica, acompanhada
de emagrecimento progressivo. Segundo a paciente, há 5 meses evacua em
média 7 vezes/dia. As fezes são líquidas e sem sangue. Refere, também, aftas de
repetição e artralgia. Nesse período, já emagreceu 6 Kg e está muito apática. Ela
disse que não consegue trabalhar e que está muito preocupada em perder o
emprego. O médico explica que um diagnóstico provável é doença inflamatória
intestinal. Após longa conversa com a paciente, ele solicita alguns exames para a
confirmação diagnóstica, bem como para a definição do tipo da doença. Disse
que após a avaliação dos resultados, poderá dar início ao tratamento. Alana,
preocupada, perguntou se existem muitos tipos de doenças inflamatórias e se
existe cura para todos os tipos.
 Objetivos
O1: Definir o conceito de doenças inflamatórias intestinais (DII).
O2: Explicar a fisiopatologia das DII.
O3: Discutir o diagnóstico diferencial da DII.
O4: Analisar o quadro clínico e diagnóstico da DII.
O5: Estudar o tratamento da DII, entendendo a farmacologia das drogas utilizadas.
O6: Discutir as repercussões biopsicossociais da DII.

Problema 7 – Meu filho nasceu com icterícia


O Sr. Thales levou sua filha Fernanda, de cinco anos, ao pediatra porque a
menor tem intestino preso desde os três anos de idade. Informa que a criança
evacua a cada cinco dias, com muito esforço e dor. As fezes são muito
endurecidas. A paciente chora e tem medo de evacuar. Já fez vários tratamentos
sem resultados satisfatórios O pai refere que a filha está sempre com a calça
suja de fezes, por escape fecal e, pelo odor fétido, não quer mais ir à escola, pois
é motivo de “bullying” pelos colegas. Informa ainda, que o quadro surgiu após a
matrícula da criança em escola europeia durante o período em ele estava
fazendo curso no exterior. Recorda que até então a criança, que havia
recentemente adquirido auto controle esfincteriano, encontrava-se bem.
Atualmente, a paciente mantém uso irregular de óleo mineral e leite de
magnésia. Quanto à alimentação, Fernanda não tem bom apetite e prefere leite,
sucos artificiais e biscoitos. O pai pede ao médico que o ajude, pois não aguenta
mais ver a filha sofrer com este problema.
Objetivos
O1: Explicar o reflexo de evacuação e o desenvolvimento do controle esfincteriano
na evacuação.
O2: Definir os conceitos de constipação intestinal e escape fecal.
O3: Discutir o diagnóstico diferencial das constipações.
O4: Analisar a fisiopatologia e a abordagem terapêutica da constipação intestinal.

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O5: Discutir o impacto psicossocial da constipação e do escape fecal na qualidade de
vida do paciente pediátrico e na dinâmica familiar.

Problema 8 – Tipo de hepatite? Como assim?


Dona Nicole, 48 anos, obesa, hipertensa crônica, em uso de metildopa há quatro
meses. Na última semana, ela observou que seus olhos e pele estavam
amarelados. Procurou o médico, pois achava que estava com hepatite. Ao exame
físico, observou-se icterícia ++/4+, sem outros achados. Os exames
complementares mostraram: hematócrito 21%, hemoglobina 7 g/dl, bilirrubina
total 25mg/dl (direta: 5 mg/dl, indireta: 20 mg/dl), TGO/TGP normais. O
médico suspendeu a medicação e iniciou o tratamento com corticoides. Algumas
semanas depois, Dona Nicole estava curada. Após alguns meses, a paciente
voltou a procurar o pronto-socorro, pois, vinha sentindofortes dores
abdominais, há 24 horas, além de observar que seus olhos estavam amarelados
novamente. A dor era do tipo cólica e localizada no hipocôndrio direito, e que
piorava a ingestão de alimentos gordurosos. Referia que a urina ficou escura e
as fezes esbranquiçadas. Ao exame físico, foram observadas discreta icterícia,
temperatura axilar 36,5° C e dor à palpação em quadrante superior direito do
abdome. Peso= 87 Kg; IMC= 33 e PA = 130/80 mm Hg. Os exames de
emergência demonstraram:
 Hemograma: leucócitos : 15.500 (neutrófilos: 62%, linfocitos: 23 %,
bastões: 0%) Reticulócitos: 1,5%
 TGO (AST): 85 U/L, TGP (ALT: 98 U/L, CGT: 105 U/L, FA: 700 U/L.
 Bilirrubina total: 7,0 mg/dl
 Bilirrubina direta: 6,2 mg/dl
 Bilirrubina indireta: 0,8 mg/dl
 Amilase: 65 U/L
 Ureia : 35 e creatinina: 0,9
 Glicemia: 87 mg/dl
 Colesterol: 285 mg/dl
 Triglicérides: 386 mg/dl
 Ecografia de abdome: cálculo em colédoco e dilatação de vias biliares intra e
extra hepáticas.
 Objetivos
O1: Explicar a anatomia do fígado e das vias biliares.
O2: Discutir o metabolismo da bilirrubina.
O3: Discutir as principais causas de hiperbilirrubinemia indireta distinguindo a
hemólise dos defeitos de conjugação.
O4: Explicar o quadro clínico, diagnóstico diferencial e as complicações da colestase
O5: Discutir a fisiopatologia da formação dos cálculos biliares.
O6: Explicar o quadro clínico, diagnóstico e o tratamento da litíase biliar nas
diferentes localizações (na vesícula e no colédoco).
O7: Descrever a fisiopatologia, diagnóstico, quadro clínico e tratamento de
pancreatite aguda.

Problema 9 – Doutor, estou com hepatite?


Luan, 35 anos, vem apresentando, há três semanas, náuseas, vômitos, fraqueza e
falta de apetite. Associado ao quadro, há cinco dias, notou que seus olhos
estavam amarelados. O médico observou a presença de hepatomegalia
discretamente dolorosa e esplenomegalia. Em relação aos antecedentes, Luan

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sofreu um acidente automobilístico durante uma viagem para o interior do país
há cinco anos, quando teve necessidade de receber transfusão de sangue. Há
aproximadamente 2 meses, na região onde mora, várias crianças têm
apresentado quadro de febre, vômitos e icterícia. Em análise da água local, o
Serviço de Vigilância Sanitária detectou alta taxa de contaminação fecal. Após a
realização de alguns exames na emergência do hospital, o médico disse que ele
estava com hepatite, mas para saber qual tipo necessitava de outros exames.
Luan chegou em casa e, imediatamente, tentou achar na internet se a hepatite
poderia justificar todos os seus sintomas e que tipo de hepatite ele poderia ter.
EXAMES DA EMERGÊNCIA:
Hemograma: hematócrito: 45%, hemoglobina 13,6, leucócitos: 4100 (linfócitos
48%, neutrófilos 40%)
BIOQUÍMICA: Glicemia: 50 mg/dl; TGO: 350 U/l; TGP: 280 U/l; Bilirrubina
total: 12 mg/dl; Bilirrubina direta: 8,0 mg/dl; Bilirrubina indireta: 4,0 mg/dl.
 Objetivos
O1: Definir o conceito de hepatite.
O2: Discutir os tipos de hepatite virais mais freqüentes.
O3: Conhecer o quadro clínico, os critérios diagnósticos e terapêuticos dos diferentes
tipos de hepatites virais.
O4: Discutir a epidemiologia das hepatites virais.

Problema 10 – Minha doença é péptica ou infecciosa?


Leila, 22 anos, solteira, procurou a emergência do HURSO com relato de que há
24 horas começou a apresentar dor persistente, de início súbito em hipogástrio,
com piora progressiva nas últimas horas, associada ànáuseas, vômitos,
inapetência, febre de 39ºC, disúria e dificuldade para urinar. Informava,
também, parada de eliminação de gases há cerca de seis horas. Relatava, ainda,
presença de corrimento amarelado vaginal. Sua última menstruação foi há 15
dias. Ao exame clínico apresentava-se com fácies de sofrimento agudo, febril
(39ºC), eupneica, corada, hidratada, anictérica e acianótica. F.C = 95bpm; P.A=
120 x 80mmHg. A ausculta cardiopulmonar mostrava-se sem anormalidades. À
avaliação do abdome verificou-se dor intensa à palpação do hipogástrio e fossa
ilíaca direita, sinal de Blumberg positivo e Rovsing negativo; diminuição dos
ruídos hidroaéreos.Ao toque vaginal, observou-se dor à mobilização do colo do
útero, abaulamento do fundo de saco de Douglas e empastamento anexial
bilateral. Os exames laboratoriais revelaram leucocitose com desvio à esquerda
e neutrofilia. A rotina radiológica para abdome agudo revelou velamento
pélvico e ausência de pneumoperitônio. Os residentes de clínica médica e de
cirurgia chegaram à conclusão de que se tratava de um quadro de abdome
agudo, mas tiveram muita dificuldade em chegar a um diagnóstico definitivo,
apesar de terem formulados vários diagnósticos diferenciais para o caso de
Leila.
 Objetivos
O1: Discutir o conceito de abdome agudo inflamatório e os possíveis diagnósticos
diferenciais.
O2: Explicar a fisiopatologia das manifestações clínicas relacionadas ao abdome
agudo inflamatório.
O3: Discutir e integrar os achados laboratoriais e de imagem com os diversos
diagnósticos diferenciais do abdome agudo.

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O4: Explicar as diferentes modalidades terapêuticas para abdome agudo
inflamatório.

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Problema 1 – Meu filho não para de
vomitar
Náusea e Vômito
Náusea, ânsia e vômito podem ocorrer separadamente ou em conjunto. Quando
ocorrem juntos, frequentemente são em sequência, como manifestações de eventos
fisiopatológicos que integram o reflexo emético.
O vômito é um ato complexo que requer coordenação neurológica central,
enquanto a náusea e a ânsia de vômito não necessitam da ativação do reflexo do
vômito.
Quando a náusea, a ânsia ou o vômito se manifestam por sintomas isolados,
seu significado clínico pode diferir do quadro estereotipado do vômito
A náusea é uma sensação subjetiva desagradável que a maiorias das pessoas já
experimentou em algum momento da vida, geralmente conhecida como sensação de
vômito iminente, na região epigástrica ou da garganta. As náuseas constituem a
sensação subjetiva da necessidade de vomitar.
A ânsia de vômito consiste em movimentos respiratórios abortivos e
espasmódicos, com a glote fechada. Quando faz parte da sequência emética, a ânsia
de vômito está associada à náusea intensa e, normalmente, mas não invariavelmente,
culmina com o ato de vomitar.
O vômito é um ato parcialmente voluntário de expulsão forçada do conteúdo
gástrico ou intestinal através da boca. Os vômitos devem ser diferenciados da
regurgitação, um refluxo sem esforço do conteúdo gástrico para o esôfago que, às
vezes, atinge a boca, mas geralmente não está associada à ejeção forte típica dos
vômitos. Os vômitos (êmese) representam a expulsão do conteúdo gastrintestinal alto
resultante da contração do intestino e da musculatura da parece toracoabdominal,
diferindo da regurgitação, que é a passagem sem esforço do conteúdo gástrico para a
boca.
O vômito é o meio pelo qual o trato gastrointestinal superior livra do seu
conteúdo, quando qualquer parte do trato superior excessivamente irritada,
hiperdistendida ou hiperexcitada.
O reflexo do vômito é coordenado por um centro do vômito no bulbo. O
reflexo inicia com a estimulação de receptores sensoriais e é muitas vezes (mas não
sempre) acompanhado por náusea. Vários estímulos de todas as partes do corpo
podem provocar o vômito, entre os quais estão substâncias químicas no sangue,
como as citocinas e certos fármacos, dor e perturbação do equilíbrio como acontece
em um carro em movimento ou em um barco balançando. Os sinais sensoriais que
iniciam o vômito se originam, principalmente, da faringe, do esôfago, do estômago e
das partes superiores do intestino delgado.

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Os impulsos são transmitidos por fibras nervosas aferentes vagais e simpáticas
para múltiplos núcleos distribuídos no tronco cerebral, na área chamada de “centro
do vômito”. Desse centro, os impulsos motores que causam vômitos são transmitidos
pelos quinto, sétimo, nono, décimo e décimo segundo nervos cranianos, para o trato
gastrointestinal superior, pelos nervos vagais e simpáticos para regiões mais distais
do trato, e pelos nervos espinhais para o diafragma e músculos abdominais.
Sinais eferentes do centro do vômito iniciam uma onda peristáltica retrógada
que inicia no intestino delgado e se move para cima. Essa onda é ajudada pela
contração abdominal que aumenta a pressão intra-abdominal. O estômago relaxa de
modo que a pressão aumentada force o conteúdo gástrico e intestinal de volta para o
esôfago e para fora da boca.
Durante o vômito, a respiração é inibida. A epiglote e o palato mole fecham a
traquéia e a parte nasal da faringe para evitar que o vômito seja inalado (aspirado).
Se o ácido ou partículas pequenas de alimento entram nas vias aéreas, podem lesar o
sistema respiratório e causar pneumonia da aspiração.
 FISIOPATOLOGIA
O conhecimento dos mecanismos fisiopatológicos permite o tratamento com
drogas que atuem em receptores específicos, estimulados ou inibidos de acordo com
as diferentes etiologias das náuseas e/ou vômitos.
A coordenação neurológica dos vários componentes do vômito é fornecida pelo
centro emético (ou centro do vômito). As vias aferentes neurais que levam os sinais
de ativação do centro emético surgem em vários locais do corpo. Vias neurais
aferentes surgem de vários locais ao longo do tubo digestivo – da faringe, do
estômago e do intestino delgado (vias aferentes também surgem em órgãos não
digestivos, como o coração e os testículos). Impulsos aferentes desses órgãos são
retransmitidos do núcleo solitário ao centro emético.
 Ativadores dos vômitos
Os estímulos eméticos atuam em vários locais. A êmese provocada por
pensamento ou odores desagradáveis origina-se no córtex cerebral, enquanto os
nervos cranianos medeiam os vômitos após a ativação do reflexo nauseoso.
A cinetose [qualquer distúrbio causado por um movimento não habitual do
corpo, como o enjoo que experimenta quem viaja de navio, avião etc. Também
chamado de enjoo de movimento ou mal do movimento] e os distúrbios da orelha
interna atuam no aparelho labiríntico, enquanto os irritantes gástricos e agentes
citotóxicos, como a cisplatina, estimulam os nervos aferentes vagais
gastroduodenais. Os aferentes viscerais não gástrico são ativados por obstrução do
colo e do intestino, bem como pela isquemia mesentérica. A área postrema, um
núcleo bulbar, responde a estímulos eméticos provenientes do sangue, sendo
chamada de zona do gatilho quimiorreceptora.
Além dos vômitos iniciados por estímulos irritativos do próprio trato
gastrointestinal, os vômitos também podem ser causados por sinais nervosos que se
originam em áreas do cérebro. Isso é de modo particular verdade, para pequena área
localizada bilateralmente, no assoalho do quarto ventrículo, chamada de Via de Zona

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dos Quimiorreceptores – ZAQ (chamada também de zona de disparo de
quimiorreceptores para o vômito).
Apesar de sua localização central, a ZAQ está fora, pelo menos em parte da
barreira hematoencefálica e serve principalmente como aparelho de detecção sensível
de moléculas circulantes endógenos e exógenas que podem ativar. A estimulação
elétrica dessa área pode iniciar os vômitos; porém, mais importante, a administração
de certo fármacos, incluindo a apomorfina, a morfina e alguns derivados de
digitálicos, pode estimular, diretamente, essa zona de disparo de quimiorreceptores e
iniciar o vômito. A destruição dessa área bloqueia esse tipo de vômitos, mas não
bloqueia os decorrentes de estímulos irritativos, no próprio trato gastrointestinal.

Também, sabe-se que mudanças rápidas na direção ou no ritmo dos


movimentos corporais podem fazer com que certas pessoas vomitem. O mecanismo é
o seguinte: o movimento estimula receptores, no labirinto vestibular do ouvido
interno, e daí os impulsos são transmitidos, principalmente, por via dos núcleos
vestibulares do tronco cerebral para o cerebelo e desse, para a zona de disparo dos
quimiorreceptores e, por fim, para o centro do vômito, causando o vômito.
Por fim, as vias originam-se de outras estruturas do sistema nervoso central,
inclusive o córtex, do tronco cerebral e do sistema vestibular, via cerebelo.
O circuito do reflexo emético envolve múltiplos receptores. Os
neurotransmissores que medeiam a indução do vômito são SELETIVOS para ÁREA
DO VôMITO e para a ZGQ. Os principais envolvidos no geral são: acetilcolina,
histamina, 5-HT, dopamina e encefalinas e substância P. Os seguintes elementos são
os mais relevantes:
 A estimulação do receptor de serotonina 5-hidroxitriptamina3 (5-HT3)
provoca a liberação de dopamina que, por sua vez, estimula os receptores da
dopamina D2 no centro emético, ativando a sequência emética. Essa sequência é a
base para a ação farmacológica dos agentes antieméticos.
 Os receptores histamínicos H1 e os muscarínicos M1, que são abundantes
no centro vestibular e no núcleo solitário, constituem os objetivos farmacológicos

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preferidos para inibir o enjôo, a náusea vestibular e os vômitos relacionados à
gravidez.
Os receptores canabinoides CB1 do complexo vagal dorsal inibem o
reflexo emético. Os agonistas cabinoides também modulam os canais iônicos 5-HT3.
Assim, o CB e os sistemas receptores 5-HT3 se localizam e interagem no tronco
cerebral.
Os receptores de neuroquinina (NK-1) localizados na área postrema e no
núcleo solitário vinculam-se à substância P e fazem parte das vias eméticas
terminais. Os antagonistas NK-1 reduzem a êmese por ação central e periférica.
 Ato do Vômito
Quando ativado, o centro emético aciona, através das fibras eferentes neurais,
os vários componentes da sequência emética. O ato do vômito envolve uma
sequência de eventos ou fases consecutivas que podem ser divididas em fases de pré-
ejeção, de ejeção e de pós-ejeção.
 Pré Ejeção
Náusea corresponde à primeira fase da êmese, o estômago se relaxa e ocorre a
inibição da secreção do ácido gástrico. Durante a náusea a pressão intratorácica
diminui e a pressão abdominal aumenta.
A náusea é o reconhecimento consciente da excitação subconsciente na área do
bulbo estreitamente associada ao centro do vômito ou que faz parte dele, e pode ser
causada por (1) impulsos que venham do TGI, causados por irritação, (2) impulsos
que se originem no mesencéfalo, associados à cinetose ou (3) impulsos do córtex
cerebral, para iniciar os vômitos.
Antiperistaltismo – o prelúdio do vômito: nos primeiro estágios da irritação
gastrointestinal excessiva ou da hiperdistensão, o antiperistaltismo começa a ocorrer
minutos antes de aparecem os vômitos. Antiperistaltismo significa peristaltismo para
cima, no TGI, e não para baixo. Ele pode se iniciar no íleo, e a onda antiperistáltica
viaja em direção oral, esse processo pode empurrar grande parte do conteúdo do
intestino delgado inferior de volta ao duodeno e ao estômago. Depois, à medida que
essas partes superiores do trato gastrointestinal, especialmente o duodeno, são
hiperdistendidas, a distensão é o fator excitatório que inicia o ato do vômito.
 Ejeção
A fase de ejeção é representada pelo vômito seco e o vômito propriamente dito.
O vômito seco é caracterizado por movimentos inspiratórios rítmicos e sincrônicos
do diafragma, músculos abdominais e intercostais externos, enquanto a boca e a glote
permanecem fechadas.
No início do vômito, ocorrem fortes contrações no duodeno e no estômago e
relaxamento parcial do esfíncter esofagogástrico, o que permite o movimento do
vômito do estômago para o esôfago. Quando a porção antral do estômago se contrai a
porção proximal se relaxa, mediada por nervos aferentes vagais que ativam
neurônios pós-ganglionares da parede do estômago e o conteúdo gástrico oscila entre
o estômago e o esôfago. Estes neurônios provavelmente têm como
neurotransmissores o polipeptídio vasoativo intestinal (VIP) ou o óxido nítrico.

13
Durante o vômito seco os músculos abdominais e o diafragma contraem
sincronicamente, enquanto a porção hiatal do diafragma não se relaxa, concorrendo
elevação da pressão intra-abdominal associada a redução na pressão intra-torácica.
Em contraste, durante o ato do vômito o relaxamento do hiato diafragmático permite
a transferência da pressão intra-abdominal para o tórax.
Então, o ato específico de vomitar, envolvendo os músculos abdominais,
ocorre e expele o vômito para o exterior.
A contração dos músculos reto abdominais e do oblíquo externo da parede
anterior do abdome, o relaxamento do esfíncter esofágico, o aumento da pressão
intra-torácica e intra-gástrica, a peristalse reversa e a abertura da glote e da boca,
resultam na expulsão do conteúdo gástrico, constituindo o ato do vômito
propriamente dito.
A contração retrógrada está sob o controle vagal e o neurotransmissor
envolvido é a acetilcolina.
Os dois eventos motores que ocorrem no intestino são de particular interesse no
reflexo do vômito - o relaxamento gástrico servindo para confinar ao estômago a
toxina ingerida oralmente, e a contração intestinal retrógrada para retornar qualquer
conteúdo gástrico contaminado para o estômago e mais facilmente disponível para
ejeção.
 GUYTON
Uma vez que o centro do vômito tenha sido suficientemente estimulado e
instituído o ato do vômito, os primeiros efeitos são: (1) respiração profunda, (2)
elevação do osso hióide e da laringe para a abertura do esfíncter esofágico superior,
(3) fechamento da glote para impedir o fluxo de vômito para os pulmões e (5)
elevação do palato mole para fechar as narinas posteriores.
Em seguida, ocorre forte contração do diafragma e contração simultânea dos
músculos da parede abdominal. Isso comprime o estômago entre o diafragma e os
músculos abdominais, elevando a pressão intragástrica a alto nível. Finalmente, o
esfíncter esofágico inferior se relaxa completamente, permitindo a expulsão do
conteúdo gástrico para o esôfago. Portanto, o ato de vomitar decorre de ação de
compressão dos músculos do abdome, associada à contração simultânea da parede
gástrica e abertura dos esfíncteres esofágicos, com expulsão do conteúdo gástrico.
HARRISON
Núcleos do tronco encefálico, incluindo o núcleo do trato solitário, núcleos
dorsais do vago e frênico, núcleos bulbares que regulam a respiração e núcleos que
controlam os movimentos faríngeos, faciais e linguais, coordenam o início dos
vômitos. Os neurotransmissores envolvidos nesta coordenação são incertos; porém,
as vias da neurocinina NK1, serotonina 5-HT3, e vasopressina podem participar.
Os músculos somáticos e viscerais exibem respostas estereotípicas durante os
vômitos. Os músculos inspiratórios das paredes torácica e abdominal se contraem,
produzindo altas pressões intratorácica e intra-abdominal que facilitam a eliminação
do conteúdo gástrico. O óstio gástrico hernia-se através do diafragma, e a laringe
move-se para cima, favorecendo a propulsão oral dos vômitos. Em condições
normais, as contrações intestinais que migram no sentido distal são reguladas por um

14
fenômeno elétrico, a onda lenta, que gira a 3 ciclos/minuto no estômago e 11
ciclos/minutos no duodeno. Com a êmese, ocorrem a abolição das ondas lentas e a
iniciação de picos que propagam a abolição das ondas lentas e a iniciação de picos
que se propagam oralmente e provocam contrações retrógradas que ajudam na
expulsão oral de conteúdos do intestino.
 TRATADO
O ato do vômito ocorre quando os componentes somático e visceral são
ativados simultaneamente. Os componentes incluem a contração rápida do diafragma
e dos músculos abdominais, o relaxamento do esfíncter esofágico inferior e uma forte
contração peristáltica retrógrada no jejuno, que empurra o conteúdo entérico para o
estômago e, em seguida, em direção a boca. Simultaneamente, os reflexos de
proteção são ativados. O palato mole é elevado para evitar a entrada do conteúdo
gástrico para a nasofaringe, a respiração é inibida momentaneamente e a glote é
fechada para prevenir a aspiração pulmonar. Outros fenômenos reflexos que podem
acompanhar esse quadro incluem hipersalivação, arritmias cardíacas e a passagem de
gases e fezes retais.
 Pós-ejeção
A fase de pós-ejeção consiste de respostas autonômicas e viscerais que
promovem o retorno do organismo a uma fase quiescente com ou sem náuseas
residuais.
EVENTOS DESENCADEANTES
- Considerações anatômicas: A área postrema é uma estrutura
circunventricular, localizada no piso do quarto ventrículo, no tronco cerebral. Trata-
se de entidade funcional, denominada zona de gatilho quimiorreceptora, envolta por
barreira hematoencefálica permeável, o que a torna sensível a substâncias
potencialmente emetogênicas presentes na circulação sanguínea. O centro do vômito
fica próximo à área postrema, na medula espinhal. Age como via comum no
processamento de diferentes estímulos aferentes, promovendo o vômito.
- Considerações químicas neurológicas centrais: Os receptores tipo 2 da
dopamina (D2) da área postrema são estimulados por altas concentrações plasmáticas
de substâncias emetogênicas, tais como íons de cálcio, morfina, ureia e digoxina. A
área postrema também pode ser ativada por estímulos aferentes do nervo vago e do
aparelho vestibular. Fibras vagais também possuem receptores 5-hidroxitriptamina
(5-HT3).
- Considerações químicas neurológicas periféricas: O trato gastrintestinal
dispõe de receptores promotores de estímulos aferentes abdominais via vagal,
capazes de desencadear o reflexo emetogênico após exposição à quimioterapia,
radioterapia, distensão abdominal etc. Os principais receptores intestinais envolvidos
no processo são 5-HT3, neuroquinina, dopamina e colecistoquinina, localizados nas
terminações dos aferentes vagais. Tais receptores situam-se próximos às células
enterocromafins da mucosa gastrintestinal, configurando uma rica fonte de 5-HT3,
que é lançado massivamente a partir dessas células em resposta aos diversos
estímulos e sensibiliza os aferentes vagais.

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- Opioides: A maioria dos receptores relevantes no centro do vômito são
excitatórios, isto é, causam náuseas e vômitos quando estimulados. A principal
exceção é o receptor μ-opioide, que é inibidor. O papel dos opioides na fisiopatologia
da êmese é paradoxal. Seu potencial antiemético é compensado por seu impacto
emético na área postrema. O equilíbrio entre as duas ações é, provavelmente,
dependente da dose. Doses habituais de opioides são frequentemente emetogênicas
devido à estimulação de receptores D2 na área postrema, ao passo que doses muito
elevadas podem não desencadear o mesmo efeito. Opioides altamente lipossolúveis,
como fentanil e metadona, podem ser menos emetogênicos que a morfina, pois
atravessam a barreira hematoencefálica mais rapidamente e, portanto, exercem um
maior efeito antiemético. Teoricamente, pacientes sensíveis aos efeitos emetogênicos
da morfina poderiam se beneficiar da rotação de opioides.

ETIOLOGIA
As náuseas, ou enjoo, correspondem a uma sensação de mal-estar, tanto na
região epigástrica como na faríngea. São acompanhadas de palidez cutânea,
bradicardia, sudorese, repulsa à ingestão de alimento e quase sempre precedem os
vômitos. Ambas as manifestações são frequentes em distúrbios do aparelho
digestivo, nas labirintopatias e na enxaqueca, mas podem ser encontradas em
doenças neurológicas, agudas ou crônicas, que aumentam a pressão intracraniana
(meningite, neoplasia, hemorragia, traumatismo cranioencefálico). Contudo, é
importante destacar que, nas encefalopatias, o vômito não é precedido de náuseas. É
o chamado vômito central ou cerebral ou também, impropriamente, vômito em jato.

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Vômitos repetitivos e volumosos podem ser muito prejudiciais acarretando
desidratação e perda de secreções gástricasespecialmente de ácido clorídrico, com
consequente alcalose metabólica e hipopotassemia. Em pacientes com quadro de
depressão do sensório e em coma o material vomitado pode seraspirado pelos
pulmões causando pneumonia de aspiração. O ato de vomitar,quando muito
vigoroso, pode causar ruptura do esôfago por pressão (síndrome de Boerhaave) ou
laceração linear da mucosa esofágica resultando em hematêmese e/ou melena
(síndrome de Mallory-Weiss).

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 SEMIOLOGIA
 Avaliação
A avaliação das náuseas e vômitos envolve a investigação da frequência,
duração, intensidade, aspecto, volume, fatores causadores ou agravantes (como o uso
de medicamentos), desconforto físico, social, emocional, financeiro, efetividade e
satisfação em relação ao tratamento proposto.
- Condições fisiopatológicas como: aceitação alimentar, frequência com que
ocorrem, fatores desencadeantes ou agravantes, coloração e aspecto dos vômitos
(fecaloide, biliar, alimentar, líquido de estase), hábito intestinal (consistência,
frequência e quantidade das evacuações), presença ou não de sintomas prodrômicos.
Vômito desencadeado por hipertensão intracraniana e meningismo, por exemplo,
aparece sem pródromo e tem característica de jato.
- Tratamentos/medicamentos que possam provocar náuseas (especialmente
opioides e quimioterapias) devem ser indagados.
- Estilo de vida – atividade física, tipo e frequência de alimentação, ingestão
de sólidos e líquidos.
- Aspectos emocionais, econômicos e sociais: sentimentos, preocupações,
dificuldades econômicas que causem preocupação ou impeçam o tratamento, acesso
ao banheiro e manutenção de hábitos (durante horário de serviço, número de
banheiros em casa/moradores etc.).
- O primeiro contato com quimioterapia e radioterapia é determinante para a
identificação precoce dos vômitos antecipatórios que podem surgir no segundo ciclo
e estão relacionados à incidência e à intensidade dos vômitos apresentados no
primeiro.
- Habilidade do doente e da família em lidar com as náuseas e vômitos:
informações adquiridas, segurança para auxiliar no tratamento e desenvolver ações.
Não são raros os casos em que o cuidador não suporta estar junto no momento em
que o paciente está nauseado ou vomitando, o que dificulta ainda mais o convívio
com este sintoma.
- Impacto social e familiar: interferência na vida diária, prejuízos gerados
pelas náuseas e vômitos e seu manejo. Em muitos casos o paciente abandona a
ocupação profissional por não conseguir controlar este desagradável sintoma.
- Efetividade do tratamento e satisfação com o resultado.
No exame físico devem ser buscados sinais como desidratação, alterações de
boca e orofaringe, distensão abdominal, presença de massas na topografia abdominal,
ascite, sinais de localização neurológica e meningismo.
Para a avaliação de exames complementares iniciais, são úteis: hemograma,
urinálise e raios X (RX) de tórax, avaliação bioquímica da função hepática, renal e
eletrólitos como cálcio, sódio e potássio. Na suspeita de obstrução de trato
gastrointestinal, RX simples de abdome em posição ortostática e supina deve ser
feito. Sinais de falência renal devem ser investigados com ultrassonografia de vias
urinárias, especialmente nos portadores de tumores pélvicos
 Características do Vômito
 Origem

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 Origem periférica: receptores viscerais, olfativas, gustativos, lesões
vestibulares, tubo gastro-intestinal, outros órgãos abdominais ou torácicos.
 Origem Central: Psicógeno ou por lesões dos centros, ou edema cerebral,
hemorragia, tumor, inflamação ou drogas.
 Frequência
Isolados
Em crises – enxaqueca, processos inflamatórios viscerais
Incoercíveis (indomável, irrefreável) – gastrites tóxicas endógenas e exógenas,
câncer
Volume
Temporalidade
Agudo – menos que uma semana
Crônico
Ou
 Agudo – 24h
 Tardios – após 24h (2 a 4 dias)
 Refratários – ocorrem apesar das medidas profiláticas e terapêuticas
 Antecipatórios – desencadeados pro lembranças do estímulo emetogênico
 Composição/Conteúdo do Vômito
Suco Gástrico
Vômito persistente com aspecto de limonada, de gosto ácido ou azedo,
durante a noite, somente de suco gástrico, podendo ter a presença de bile, sugestivo
de úlcera duodenal e espasmo pilórico, podendo ocorrer nas gastrites aguda ou
crônicas do álcool. Quando muito intenso temos a Gastro-Sucurréia de Reichmann
(Síndrome de Reichmann) expressão de processo ulceroso cm estenose funcional ou
orgânica, por espasmo do antro gástrico ou por gastrite hipertrófica, ou já estenose
fibrótica da região ulcerosa.
Alimentar
Presença de restos alimentares não-digeridos
- Quimificação: 1 a 2 horas após a ingestão de alimentos, com secreção
gástrica normal.
- Aquilia: mistura de alimentos e água
Partículas de alimento e bile mais de 8 horas após a ingestão-obstrução
abaixo da ampola de Vater
Bilioso
Obstrução abaixo da apola de Vater. Vômitos persistente de cor amarelo-
esverdeado. Poderá ser composto somente de bile. Identifica o refluxo do material
duodenal para o interior do estômago, e daí a sua expulsão pelo vômito.
Mucoso
Composto de material líquido com fragmentos pequenos de muco, sem
gosto azedo ou ácido, próprio dos vômitos por inflamação crônica da mucosa
gástrica. Quando esse vômito aparece ao despertar, pela manhã, precedido de náusea
é o que denomina Pituíta, e que, por si só, tem valor propedêutico do diagnóstico de

19
gastrite crônica com acloridria ou com hipocloridria, praticamente existente na
gastrite crônica de etiologia alcoólica.
Fecal/Fecalóide
Cor castanho escuro, precedido de outros tipos de vômitos – íleo paralítico
ou obstrução intestinal delgado: fecalóide/obstrução do intestino grosso: fecal.
Sanguíneo
- Hematêmese: vômitos com sangue vivo
- Melena: vômitos com sangue escuro ou preto (em borra de café)
Pus
Rotura de abcesso extra gástrico para o interior do estômago
Corpo Estranho
Presença de corpos estranhos como cálculo biliares, parasito intestinais
(ascaris), etc.
 Odor
Ácido penetrante: secreção ácido normal
 Sem Cheiro: aquilia (vômito só água)
Fecal: cheiro de fezes
Quanto ao Tempo de Aparecimento
Com Relação às Refeições
Imediato: até meia horas depois
Precoce: de 1 a 2 horas
Tardio: depois de 3 horas
Ultratardio ou estase: depois de 6 horas
Sem Relação com as Refeições
 Psicogênicos
 Vômitos explosivos (hipertensão encefálica, tumores cerebrais, etc)
 Pela manhã (uremia, gravidez)
 Irritação da faringe por muco nasal
 Gastrite crônica alcoólicas
 Sintomas Associados
É de extrema importância pois devemos relacionar os vômitos com o quadro
clínico de base. Podemos tomar como exemplo a cólica renal, apendicite aguda,
obstrução intestinal, IAM, etc.
CAUSAS GERAIS

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OUTRO MATERIAL
Envolve: inicio frequência, duração, intensidade, coloração e aspecto, volume,
fatores causadores ou agravantes, desconforto físico, social, emocional e financeiro e
tratamentos realizados, presença ou não de sintomas prodrômicos.
 Aspecto: fecaloide (TGI inferior), biliar (obstrução intestinal alta), alimentar,
liquido de estase, mucoso, hemorrágico (TGI superior: acima do ângulo de Treitz-
junção duodeno jejunal), purulento.
 Horário: em jejum (aquoso, mucoso-bilioso, alimentar de retenção); pós-
prandial (imediato, precoce, tardio- 4h ou maisvolumoso com alimento antigo e
parcialmente digerido sugere comprometimento do esvaziamento gástrico) ; noturno
(idem em jejum).
 Frequência: isolado, em crises, incoercíveis (uremia, DM, toxemia,
gravídico).
 Sintomas que precedem e acompanham
 Vínculos com refeição e alivio pós-vômito: geralmente gastroduodenal ou
inflamatório
 Em jato e sem náuseas (VÔMITO CENTRAL): vomitos cerebrais doenças
do SNC ( hipertensão craniana e meningite)
 Repercussão do estado nutricional: doença crônica e consuptivas.
 Alivio da dor: obstrução pilórica.
 Odor fétido: supercrescimento bacteriano (obstrução intestinal ou fistula
gastrocólica).

Hipovolemia
A hipovolemia caracteriza-se por uma
redução do volume de água corporal total e ocorre
quando a taxa de ingestão de água e sal é menor que
a taxa de perda dos mesmos por via renal ou extra-
renal, acarretando um aumento da concentração do
volume do LEC. As principais causas NÃO renais
de perda de liquido (hipovolemia) são: perda de
líquido pelo TGI (vômitos e diarréia), pela pele e
sistema respiratório. O acúmulo de líquido
excessivamente no espaço intersticial e/ou
peritoneal também podem levar a hipovolemia
intravascular.
Os vômitos, além de provocarem a perda de
líquido também leva a perda de HCl, acarretando
em alcalose metabólica.
Os sintomas de hipovolemia são inespecíficos
e consistem em fadiga, fraqueza, sede e tontura
postural; os sinais e sintomas mais graves incluem
oligúria, cianose, dor abdominal e torácica e confusão mental ou obnubilação. Os
distúrbios eletrolíticos associados podem causar outros sintomas, como, por
exemplo, fraqueza muscular em pacientes com hipopotassemia. Ao exame, a redução
do turgor cutâneo e ressecamento das mucosas orais secas constituem marcadores

21
menos ideais de diminuição do VLEC em pacientes adultos; os sinais confiáveis de
hipovolemia consistem em diminuição da pressão venosa jugular (PVJ), taquicardia
ortostática (aumento de  15-20 batimentos por minuto na posição ortostática) e
hipotensão ortostática (queda de  10-20 mmHg da PA em posição ortostática). A
perda mais pronunciada de líquido resulta em choque hipovolêmico, com hipotensão,
taquicardia, pulso filiforme, vasoconstrição periférica e hipoperfusão periférica
(cianose, pele fria e sudorese); esses pacientes podem apresentar cianose periférica,
extremidades frias, oligúria e alteração do estado mental. Os exames de bioquímica
de rotina revelam aumento de uréia e creatinina devido à diminuição da TFG.
Hipovolemia: há uma perda de líquido tanto intra quanto extracelular. Há então
ativação de baro e quimiorreceptores levando a um mecanismo compensatório
através do sistema adrenérgico e o sistema angiotensina-aldosterona e ADH.
A perda patológica de água rompe a homeostase de duas maneiras. A depleção
de volume do compartimento extracelular diminui a pressão sanguínea. Se a pressão
do sangue não pode ser mantida pelas compensações homeostáticas, os tecidos não
recebem oxigênio adequadamente. Também, se a perda de liquido é hiposmótica para
o corpo (como é o caso de sudorese excessiva), os solutos deixados no corpo elevam
a osmolaridade, alterando potencialmente a função celular.
Hipovolemia diminuição do volume circulatório diminuição do DC
hipotensão aumento das catecolaminas (simpático) aumento da FC, sudorese e
palidez.
 Compensação homeostática na desidratação grave:
1. Barorreceptores carotídeos e aórticos ativam centro de controle
cardiovascular: aumenta ativação simpática e diminui parassimpática. Aumentando
assim a FC; a força de contração; o DC. A estimulação simpática também causa
aumento da RVP pela vasoconstrição.
2. Vasoconstrição arteríolas aferentes nos rins diminui a TFG ajuda
conservar liquido; e também estimula secreção de RENINA por retroalimentação
paracrina das células granulares (diminui fluxo que passa pela macula densa).
3. A diminuição da PA + diminuição do volume sanguíneo + o aumento
da osmolaridade + o aumento da ANG II estimula sede no hipotálamo e liberação
de vasopressina (ADH) pela neurohipófise.
Fase inicial choque- estado compensado (baixa resistência vascular  baixo
DC  baixa PA)
 Desidratação
Desidratação é a contração do volume extracelular secundária à perdas
hidroeletrolíticas, cuja gravidade irá depender da magnitude do déficit em relação às
reservas corpóreas e da relação entre o déficit de água e de eletrólitos, principalmente
do sódio. A desidratação pode ser classificada de acordo com a magnitude do déficit
de água, estimada através de sinais clínicos e pela perda ponderal, em leve ou de 1º
grau (perdas de até 5% do peso), moderada ou de 2º grau (de 5 a 10%) e grave ou de
3º grau (>10%).

22
Distúrbios Hidroeletrolíticos
No caso do problema foram apresentados estados de Hipovolemia,
Hiponatremia e Hipocalemia.
Aproximadamente 60% do nosso peso corporal é composto de água (em torno
de 42 L,em um adulto médio). Destes, apenas 3,5 L estão no intravascular e 10,5 L
no interstício.Cerca de 28 L encontram-se no intracelular. O Na⁺ juntamente com
outros ânions, principalmente o cloreto (Cl) contabilizam mais de 90% do soluto do
LEC. O sódio é o principal íon do meio extracelular,distribuindo-se livremente pelo
espaço extracelular, além de ser o responsável pelamanutenção da osmolalidade do
meio interno. O gradiente de concentração de Na⁺ entre o meio intra e extracelular é
controlado pela bomba Na⁺/ K⁺ ATPase e a concentração total de Na⁺ é controlada
pela excreção renal. A reabsorção renal de Na⁺ ocorre principalmente no TCP
(proximal) e pode ser afetada pela inervaçãosimpática, PNA e PN cerebral. Eles
causam natriurese por efeito direto no ducto coletor medular e inibindo a liberação de
renina e aldosterona.
Os distúrbios na concentração sérica de Na+ são causados por anormalidades na
homeostasia da água, que levam a alterações na razão relativa entre Na+ e água
corporal.
 Hiponatremia
É definida por uma concentração plasmática de Na+ de < 135 mEq/L, é um
distúrbio muito comum em pacientes internados e esta associada a aumento da
mortalidade. Esta condição é considerada na verdade um distúrbio de água, e não de
íon sódio.
As causas são muito variadas, pode ser consequência de inúmeras condições
tornando-se muitas vezes um desafio diagnóstico.
Esse distúrbio resulta quase sempre de um aumento dos níveis circulantes de
AVP e/ou sensibilidade renal aumentada à AVP. A fisiopatologia subjacente da
resposta exagerada ou inapropriada à AVP difere de pacientes com hiponatremia, em
função de seu VLEC. Por conseguinte, a hiponatremia é subdividida, para

23
diagnóstico, em 3 grupos, dependendo da história clínica e do estado de volume:
hipovolêmica, euvolêmica e hipervolêmica.
 Classificação da Hiponatremia
A hiponatremia pode ser classificada de várias formas.
1 – Pelo tempo de evolução dos distúrbios
Aguda e hiperaguda: hiponatremia que desenvolveu em menos de 48 h;
quando em horas, é chamada de hiperaguda (hiperaguda não é usada no guideline
europeu)
Crônica: hiponatremia com pelo menos 48 h de duração ou ela é
desconhecida
2 – Gravidade dos Sintomas
Sintomas moderadamente graves: náuseas, cefaléia e confusão
Sintomas graves: vômitos, convulsões, rebaixamento do nível de
consciência e coma
3 – Intensidade da Hiponatremia (método íon especifíco)
Leve: 130 a 135 mEq/L
Moderada: 125 a 129 mEq/L
Profunda: menor que 125 mEq/L
4 – Pela osmolalidade/tonicidade
Hiponatremia Hipotônica: osmolalidade medida menor que 275
mOsm/Kg de água
Hiponatremia Isotônica: osmolalidade medida entre 275 a 295
mOsm/Kg de água
Hiponatremia Hipertônica: osmolalidade medida maior que 295
mOsm/Kg de água
5 – Pelo volume do líquido extracelular
Aumentado: hiponatremia hipervolêmica
Reduzido: hiponatremia hipovolêmica
Normal: hiponatremia isovolêmica
Fisiopatologia
A hiponatremia geralmente causa redução da osmolaridade, o que leva a uma
adaptação da célula com liberação de osmólitos para o extracelular. Essa é uma
adaptação fisiológica que visa manter a concentração intracelular de solutos
semelhante ao ambiente hipotônico do plasma, com o intuito de causar pouca
mudança no volume celular.
Diante de um paciente com hiponatremia, a primeira medida deve ser afastar
uma pseudo-hiponatremia. Na hiponatremia verdadeira, a osmolaridade sérica é sem-
pre baixa. Se houver hiponatremia com osmolaridade sérica normal ou elevada, está
ocorrendo uma pseudo-hiponatremia. Estas situações não representam distúrbios no
metabolismo da água e não necessitam de medidas direcionadas para correção do
sódio sérico.
 Hiponatremia Hipovolêmica
Uma história que sugira baixa ingesta e/ou perdas (cutânea, gastrintestinal ou
renal) excessivas, e exame físico que revele taquicardia e/ou hipotensão (sejam

24
espontâneas ou com manobra postural). O sódio urinário está baixo e a osmolaridade
urinária alta, demonstrando a retenção hidrossalina em resposta à hipovolemia
verdadeira. Quase sempre são condições que se associam a perda de volume e
desidratação. Depleção do volume circulante, com ou sem déficit corporal de Na,
eleva significativamente a secreção de vasopressina, o que causa retenção de água,
apesar da hipotonicidade.
 Hiponatremia Hipervolêmica
História e exame físico sugestivos de síndrome edematosa, como ICC, cirrose
ou síndrome nefrótica. Cada uma destas síndromes possui sinais específicos ao
exame físico, mas edema e ganho de peso são comuns a todas. Do mesmo modo, o
sódio urinário está baixo e a osmolaridade urinária alta, mas esta retenção
hidrossalina ocorre em resposta à hipovolemia relativa (redução no VIVE). Pacientes
com doença renal crônica avançada perdem a capacidade de excretar água livre,
frequentemente com osmolalidade urinária muito próxima da do sangue
(isostenúria). Por isso pacientes que acaba ingerindo água de forma excessiva podem
desenvolver hiponatremia.
 Hiponatremia Isovolêmica
Na maioria das vezes, a hiponatremia euvolêmica é causada pelo aumento
absoluto de água corporal total resultante da ingestão excessiva de líquidos associada
a dificuldade na excreção de água por conta da secreção inapropriada de ADH.
Outras causas são: diuréticos tiazídicos, insuficiência adrenal secundária,
hipotiroidismo grave e polidipsia primária.
 Pseudohiponatremia com osmolaridade sérica elevada
A situação mais clássica é a hiperglicemia, mas pode ocorrer também durante a
administração de contraste iodado hiperosmolar. Neste caso, ocorre saída de água do
líquido intracelular (LIC) para o extracelular (LEC) numa tentativa de equilibrar a
osmolaridade entre os dois espaços. Esta entrada de água no LEC dilui o sódio
sérico. Com a correção da glicemia, o sódio sérico normaliza sem que nenhuma outra
medida seja tomada.

 Pseudo-hiponatremia com osmolaridade sérica normal


É classicamente descrita nas hiperproteinemias (por exemplo, mieloma
múltiplo) e dislipidemias severas (por exemplo, hipertrigliceridemias), quando a
fração aquosa do plasma está reduzida à custa de excesso de proteínas ou lípidas.
Este fenômeno é mais comum quando o sódio sérico é medido pela técnica de foto-
metria de chama.
(OUTRO MATERIAL)
• Pseudo-hiponatremia ocorre quando o plasma tem concentrações muito
elevadas de proteínas ou lipídios: hiperosmolaridade(hiperglicemia, manitol).
• Hiponatremia hipovolêmica, se der volume hipotônico os vômitos causam
hiponatremia: perdas extrarenais (gastrointestinais-vômitos e diarreia, pele-sudorese
ou queimadura) e perdas renais.
• Hiponatremia euvolêmica, osmolaridade baixa: deficiência de glicocorticoide,
hipotireoidismo, intoxicação hídrica.
25
• Hiponatremia hipervolêmica, há excesso de ACT e sódio, embora o aumento
de água seja maior que o de sódio: ICC, cirrose, síndrome nefrotica, IRA,
extravazamento capilar devido a sepse, hipoalbuminemia por doença do TGI.
 Manifestações Clínicas
A hiponatremia causa uma diminuição da osmolaridade do espaço extracelular,
o que causa aumento da osmolaridade intracelular fazendo a água por osmose ir para
o meio intracelular para manter o equilíbrio osmótico.
A hiponatremia aguda e grave pode causar herniação do tronco cerebral e
apneia devido ao edema nas células do cérebro.
Sintomas neurológicos: anorexia, náuseas, vômitos, mal-estar, letargia,
confusão, agitação, cefaleia, sonolência, incapacidade de concentração, crises
convulsivas, coma e diminuição dos reflexos.
- Instalação Aguda: hiperexcitabilidade, cãimbras, irritabilidade e convulsões.
- Instalação Insidiosa: fraqueza, letargia, torpor, apatia, confusão e coma.
Sintomas iniciais: cefaleia, náuseas, vômitos, anorexia, confusão, agitação,
crises convulsivas, diminui os reflexos, cãimbras, fraqueza muscular, letargia.
Respiração de cheyne-stokes.
Sintomas mais graves: herniação de tronco encefálico (apnéia), coma e morte.

 Hipocalemia ou Hipopotassemia
É definida como uma concentração sérica de potássio menor que 3,5 mEq/L.
Dos distúrbios eletrolíticos encontrados em emergências, alterações no potássio
sérico são os mais graves e potencialmente graves.

26
Geralmente é assintomática, embora nos casos graves possa cursar com
alterações que vão desde fraqueza muscular até a arritmias cardíacas.
O potássio é um íon predominantemente intracelular, visto que apenas 2% de
sua concentração total encontra-se no compartimento extracelular. A concentração de
potássiono meio extracelular é mantida dentro de limites estreitos (3,5 a 4,5 mEq/L).
Existeum enorme gradiente entre o K intracelular e extracelular e tal gradiente é
responsávelpela excitabilidade nervosa e muscular, incluindo o miocárdio. Assim,
pequenas alteraçõesno K sérico podem causar significantes alterações na condução e
excitabilidade docoração, inclusive parada cardiorrespiratória.
A homeostase do potássio a longo prazo depende de mecanismos renais e é
regulada, em parte, pela aldosterona, via canais de sódio presentes na membrana
apical das célulasdos túbulos distais. A absorção de sódio nesses canais cria um
ambiente eletronegativo dentrodo túbulo, o que favorece a secreção passiva de
potássio via inúmeros tipos de canais depotássio. Além do rim, outros mecanismos
de perda de potássio incluem o suor e as fezes,contudo efetivamente a perda renal é a
maior fonte de excreção de potássio no organismo.
Fisiopatologia
Existe uma enorme diferença entre o potássio intracelular (140 mEq/L) e o
extracelular (3,5 a 5,0 mEq/L). Esse gradiente é responsável pela excitabilidade
nervosa e muscular que inclui o miocárdio. Pequenas alterações no potássio sérico
podem implicar profunda alteração na condução e excitabilidade do coração,
podendo alterar a função e o ritmo cardíacos e causar uma PCR.
A perda de K⁺ pelo TGI superior- vômitos é mínima, visto que a concentração de
K⁺ no liquido gástrico é de 10 mEq/L. neste caso o que é mais importante é a perda
gástrica de HCl, que gera uma alcalose metabólica e depleção de volume. Os rins
compensam a alcalose excretando bicarbonato na urina, mas há uma perda
obrigatória de K⁺ e Na⁺ com o bicarbonato. A depleção de volume aumenta os níveis
de aldosterona, o que impede que a alcalose respiratória seja corrigida e também a
hipocalemia, ate que a depleçao de volume seja corrigida. Amaioria dos casos de
hipocalemia em que relaciona-se com a gastroenterite, com perda de K⁺
principalmente por diarreia.
Manifestações Clínicas
- Músculos cardíacos e esqueléticos são vulneráveis a hipocalemia.
- Altera ECG: achata a onda T, deprime o segmento ST, aparece uma onda U
entre a onda T e a P.
- Pode ocorrer fibrilação ventricular e torsades de pointes.
- A hipocalemia torna o coração susceptível a arritmias induzidas por
digitálicos, com a taquicardia supraventricular, a taquicardia ventricular e o bloqueio
AV
- Músculo esquelético: fraqueza muscular e cãibras. Acomete primeiro os
MMII depois o braço.
- Paralisia abaixo de 2,5mEq/l; paralisia respiratória; rabdomiólise; motilidade
do TGI mais lenta; retenção urinaria; íleo paralítico; poliúria e polidipsia
- Em crianças maiores pode-se observar tetania e os sinais clássicos de trosseau
(espasmos carpais) e chevostek (presença de espasmos faciais).

Tratamento dos Distúrbios do Caso


27
 Tratamento da Hipovolemia
Hipovolemia leve e moderada: hidratação oral e dieta de manutenção normal.
Hipovolemia grave:hidratação intravenosa, e a escolha da solução dependerá
da fisiopatologia de base.
 Solução salina isotônica (NaCl 0,9%, 154 mEq/L Na⁺): indicado para
natremia normal ou hiponatremia com hipovolemia grave. Expande principalmente
LEC: 1 litro de soro fisiológico expande volume sanguíneo em 300ml.
 Solução hipotônica: em caso de hipernatremia.
 Glicose 5%: perda somente hídrica, como na diabetes insipidus. A
administração de 1L de soro glicosado ira expandir o volume intravascular em 75-
100 ml.
 Solução cristaloide com Na⁺: indicado para redução de volume secundário a
perda renal ou gastrointestinal de Na⁺. Também como adjuvante em queimaduras e
hemorragias.
 Solução com coloide de albumina: expande principalmente compartimento
intravascular. Usado mais em queimaduras e colapso circulatório grave.
Administração de volume através do soro com eletrólitos.
- De um modo geral, a desidratação leve e moderada pode ser tratada através
da via oral (TRO, terapia de reidratação oral), reservando-se a via parenteral para os
casos mais graves, para a correção dos distúrbios eletrolíticos severos e para aqueles
com vômitos incoercíveis ou com perdas continuadas muito intensas (>100ml/kg/h).
Fases da terapia de reidratação
 Fase de reparação ou expansão: Restabelecimento rápido dos volumes normais
de água e eletrólitos. Soro fisiológico é indicado na desidratação hipertônica. Fluidos
hipotônicos administrados rapidamente podem levar a um edema cerebral.
Associação de glicose com soro é indicado para não provocar hipoglicemia,
principalmente em crianças.
A fase de reparação termina quando desaparecem os sinais clínicos de
desidratação e quando a criança apresentar duas micções com urina clara, desde que
sejam afastadas outras causas de poliúria (hipopotassemia, hiponatremia e
hiperglicemia com diurese osmótica).
 Fase de manutenção: Repor as perdas fisiológicas de água e eletrólitos.

 Fase de reposição: Reposição de perdas anormais de água e eletrólitos.


 Tratamento da hiponatremia
O tratamento geral da hiponatremia é determinado pela gravidade dos sintomas
e pela duração do distúrbio. Hiponatremias recentes (< 48 horas) podem e devem

28
sercorrigidas rapidamente, ao passo que hiponatremia de duração desconhecida ou
crônicadeve ser corrigida mais lentamente.
Em casos de hiponatremias leves e crônicas é suficiente a restrição da infusão
de água livre e tratamento da doença de base. Em situações nas quais ocorre
necessidade dereposição de fluidos, deve-se tomar cuidado para não utilizar soluções
hipotônicas.A hiponatremia assintomática (geralmente Na⁺ 125 a 135 mEq/l) não
requer tratamento imediato com soluções de sódio, apenas correção da causa básica
que deve sempre ser identificada.
Hiponatremia hipovolêmica: inicialmente realizar a reposiçãovolemia. Com a
normalização do volume ocorre a inibição da secreção de ADH. Essa reposição é
feita com solução salina isotônica.
Hiponatremia hipervolêmica (presença de edema) ou normovolêmica por
SSIHAD deve-se restringir o aporte de líquidos em 50 e 75% das necessidades basais
e avaliar o uso criterioso de furosemida em alguns casos, com reposição da perda de
Na⁺.
Hiponatremia grave (Na⁺ menor que 120 mEq/l ou sintomática) é uma
emergência medica, e o seu tratamento deve ser imediato. Já a hiponatremia severa
(definida como Na < 120 mEq/L) deve ser corrigida para valores próximos àqueles
que tirem o paciente do risco neurológico ou que interrompamestados convulsivos e
de rebaixamento do nível de consciência.
Em geral,a abordagem inicial é trazer os valores do Na plasmático para
próximo de 120 mEq/L.A partir de então, a correção deve ser lenta. Essa abordagem
deve-se ao risco de lesãodesmielinizante com a correção rápida, surgindo assim a
temida complicação da mielinólisepontina. A mielinólise pontina é uma síndrome
neurológica grave e irreversível,caracterizada por tetraparesia flácida de
aparecimento tardio após a correção da hiponatremiapor desidratação neuronal.
Raramente a mielinólise ocorre em topografiaextrapontina e a ressonância magnética
é diagnóstica. Essa síndrome está relacionadaa correções inadvertidamente rápidas,
mas apresenta descrições mesmo em casos nosquais a correção foi mais cuidadosa.
Nos casos de hiponatremia aguda (menos de 48h) a correção deve inicialmente
visar à elevação do sódiosérico até 130 (Na⁺ desejado) e, nos casos crônicos (mais de
48h), apenas até 120. Normalmente emprega-se uma solução de NaCl a 3% (89 ml
de soro fisiológico + 11 ml de NaCl 20%, concentração final de 0,5mEq/l) e procura-
se não ultrapassar uma velocidade de infusão de 5mEq/Kg/h (10ml/kg/h) nas
hiponatremias agudas e 2,5mEq/kg/h (5ml/kg/h) nas hiponatremias crônicas.
Tais cuidados visam evitar um aumento muito rápido dos níveis de sódio. Em
todos os casos recomenda-se não elevar os níveis de Na⁺ mais que 8-10mEq/l nas
primeiras 24h.
Calcula-se inicialmente a quantidade de Na⁺ a ser administrada, através da
formula: [Na⁺(mEq)=(Na⁺ desejado -Na⁺ atual)x peso x 0,6].
Caso não lembre a forma: fazer 250ml de solução salina menor que 3% ou 5%
em 4-6h na fase aguda.
A solução hipertônica favorece a saída do liquido intracelular para extracelular,
devido ao aumento da osmolaridade extracelular, então diminui o edema cerebral. A
cada ml/kg de NaCl a 3%: aumenta o nívelsérico de Na⁺ em aproximadamente
1mEq/l.
Tratamento da hipocalemia
O objetivo inicial do tratamento da hipocalemia é prevenir e tratar
complicações musculares e cardíacas que oferecem risco de morte.
Posteriormente,deve-se repor os estoques de K corporal, deixando-os em níveis
29
normais. Sempre que possível, deve-se procurar identificar e corrigir a causa básica
que esta determinando o distúrbioeletrolítico. No entanto, independentemente da
causa, pode-se adotar a seguinte estratégia:
Casos leves, com K⁺ entre 2,5 e 3,5 mEq/l e sem manifestações clínicas, dar
preferência a reposição oral, utilizando-se cloreto de potássio a 6% (3 a
5mEq/kg/dia) e, se o paciente estiver em uso de diurético que expoliam K⁺ (ex:
furosemida), substituí-los por diuréticos poupadores de K⁺ (ex: espironolactona).
Casos moderados e graves, com K+ menor que 2,5mEq/l (com ou sem
manifestações clinicas), optar por reposição venosa (preferir V. femoral- veias
periféricas, evitar veias próximas do coração), idealmente com monitorização de
ECG, aumentando-se o aporte de K+ para ate 0,3 a 0,5mEq/kg/h (durante 3 a 5 h),
procurando-se não ultrapassar concentrações de 60 mEq/l, quando o K+ alcançam
3,5mEq/l, prosseguir com taxas normais de manutenção.
OLHAR LIVRO MEDICINA DE EMERGÊNCIA – USP

Antieméticos
Existem vários agentes antieméticos disponíveis, em geral usados para
condições específicas, embora possa haver certa sobreposição.
As náuseas e os vômitos podem constituir manifestações de uma ampla
variedade de condições, tais como efeitos colaterais de medicações, distúrbios
sistêmicos ou infecções, gravidez, disfunção vestibular, infecção do sistema nervoso
central ou elevação da pressão, peritonite, distúrbios hepatobiliares, radioterapia ou
quimioterapia e obstrução, dismotilidade ou infecções gastrintestinais.
Em geral, a ação de vomitar e a sensação de náusea que a acompanha são
consideradas reflexos protetores que ajudam a livrar o estômago e o intestino das
substâncias tóxicas e impedir sua ingestão subseqüente.
A identificação dos diferentes neurotransmissores envolvidos no vômito
possibilitou o desenvolvimento de um grupo distinto de fármacos antieméticos, que
possuem afinidade por vários receptores. Com frequência, são usadas associações de
fármacos antiémeticos com diferentes mecanismos de ação, sobretudo em pacientes
com vômito causado por agentes quimioterápicos.
 Antagonistas dos Receptores H1
A farmacologia dos anticolinérgicos, como agentes isolados, esses fármacos
possuem atividade antiemética fraca, embora sejam de particular utilidade na
prevenção ou no tratamento da cinetose.
Os mais comumente empregados desse grupo são cinarizina, ciclizina e
prometazina.
São eficazes contra náuseas e vômitos originados de muitas causas, incluindo
cinetose e a presença de irritantes no estômago. Nenhum é muito eficaz contra
substâncias que atuam diretamente sobre a ZGQ.
 Antagonistas dos Receptores 5-HT3
Os antagonistas seletivos dos receptores 5-HT3 possuem propriedades
antieméticas potentes, que são medidas, em parte, por meio do bloqueio dos
receptores 5-HT3 centrais no centro do vômito e na zona de gatilho quimiorreceptora,

30
porém principalmente pelo bloqueio dos receptores 5-HT3 periféricos nos nervos
aferentes espinais e vagais intestinais extrínsecos.
A ação antiemética desses fármacos limita-se aos vômitos atribuídos à
estimulação vagal (ex: pós-operatório) e à quimioterapia; outros estímulos eméticos,
como a cinetose, são pouco controlados.
A ondansetrona, a granissetrona, a dolassetrona e a palonossetrona. Os
primeiros três fármacos apresentam uma meia-vida sérica de 4 a 9 horas e podem ser
administrados 1 vez ao dia por via oral ou por via intravenosa. Todos esses três
fármacos têm eficiácia e tolerabilidade comparáveis quando administrados em doses
eqüipotentes.
A palonossetrona é um agente intravenoso mais recente, que exibe maior
afinidade pelo receptor 5-HT3 e apresenta meia-vida sérica longa de 40 horas.
Todos os fármacos sofrem extenso metabolismo hepático e são eliminados por
excreção renal e hepática.
Os antagonistas dos receptores 5-HT3 não inibem os receptores dopamínicos ou
muscarínicos. Não exercem efeitos sobre a motalidade esofágica ou gástrica, mas
podem retardar o trânsito colônico.
Usos Clínico: Náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia e náuseas e
vômitos pós-operatórios e pós-radioterapia.
Efeitos Colaterais
São agentes bem tolerados, com excelente perfil de segurança. Os efeitos
colaterais mais relatados consistem em cefaléia, tontura e constipação intestinal
 Antagonistas da dopamina
Os antipsicóticos fenotiazínicos, como clorpromazina, perfenazína,
proclorperazina e trifluoperazína, são antieméticos eficazes comumente usados para
tratar as manifestações mais intensas de náuseas e vômitos associados a câncer,
radioterapia,citotóxicos, opioides, anestésicos e outros fármacos. Podem ser
administrados por via oral, intravenosa ou por supositorio. Atuam, principalmente,
como antagonistas dos receptores D2 da dopaminana ZGQ, mas também bloqueiam
receptores de histamina e muscarínicos.
Os efeitos adversos são comuns e incluem sedação (especialmente
clorpromazina), hipotensão e sintomas extrapiramidais, inclusive distonias e
discinesia tardia. Outros antipsicóticos, como o haloperidol e a levemepromazina,
também atuam como antagonistas D2 na ZGQ e podem ser usados para êmese aguda
induzida por quimioterapia.
MEDRESUMO
Existem vários agentes antieméticos, e estes, em geral, são usados para
condições específicas, embora possa haver uma certa sobreposição. Ao usar
fármacos para as náuseas matinais durante a gravidez, por exemplo, o problema é a
potencial lesão ao feto que deve se ter em mente (boa parte dos fármacos deve ser
evitada durante os três primeiros meses de gestação). Os principais sítios de ação
para estes fármacos são os próprios receptores dos neurotransmissores
envolvidos com o mecanismo do vômito (M1, H1, 5-HT3 e D2).

31
Muitos antagonistas dos receptores H1, muscarínicos (M1) e 5-HT3 exibem
atividade antiemética clinicamente útil.
Os efeitos indesejáveis como cefaleia e desconforto gastrointestinal são
relativamente incomuns.
 Antagonistas H1: Prometazina (Phenergan), Cinarizina (Antigeron; Cinarix),
Ciclizina, Meclizina (Meclin) e Dimenidrinato (Dramin). Seu uso apresenta efeitos
colaterais como: sonolência (grande ação sedativa), diminuição da coordenação,
disartria.
 Antagonistas muscarínicos: Escopolamina/Hioscina(Buscopan). Efeitos colaterais:
boca seca, sonolência e visão embasada são os efeitos indesejáveis mais comuns.
Antagonistas seletivos dos receptores 5-HT3: Ondansetron (Nausedron),
Granistron, Tropisetron e Dolasetron (Anzemet). Os fármacos utilizados na
quimioterapia do tratamento do câncer são capazes de ativar os receptores 5-HT3 do
centro do vômito, desencadeando o reflexo do vômito. Daí a importância do uso de
Ondasetrona neste tipo de tratamento.
Antagonistas D2 (antipsicóticos): Metoclopramida (Plasil), Clorpromazina
(Amplictil), Perfenazina, Haloperidol (Haldol; Loperidol), Levomepromazina,
Domperidona (Peridal). A Metoclopramida apresenta ainda a capacidade de se ligar
ao receptores H1 e M1, provocando um bloqueio mais intenso da êmese.
(OUTRO MATERIAL)
Os vômitos são regulados centralmente pelo centro do vômito e pela zona do
gatilho quimiorreceptora (ZGQ), ambos situando-se no bulbo. A ZGQ é sensível a
estímulos químicos e é o principal ponto de ação de muitos fármacos eméticos e
antieméticos. A barreira hematoencefálica nas vizinhanças da ZGQ é relativamente
permeável, permitindo que mediadores circulantes atuem diretamente sobre esse
centro.
Existem vários agentes antieméticos disponíveis, em geral usados para condições
especificas, embora possa haver certa sobreposição.
Muitos antagonistas de receptores H1, muscarínicos, 5-HT3 e de dopamina
exibem atividade antiemética clinicamente útil.
 Antagonistas dos receptores H1 (anti-histaminicos) acoplados a proteína
G
Os mais comumente empregados desse grupo são cinarizina, ciclizina e prometazina;
são eficazes contra náuseas e vomitos originados de muitas causas, incluindo
cinetose, distúrbios da orelha interna e a presença de irritantes no estomago. Nenhum
é muito eficaz contra substancias que atuam diretamente sobre a ZGQ. A
prometazina é usada para náuseas matinais na gravidez e cinetose do espaço usada
pela NASA. MA: inibição do centro do vomito e dos impulsos transmitidos pelos
aferentes vagais labirinto cerebelo.
 Antagonistas de receptores muscarínicos M1 acoplados a proteína G
A hioscina (escopolamina) é empregada principalmente para profilaxia e
tratamento de cinetose e pode ser administrada por VO ou em adesivo transdérmico.
Tem fraca penetração no SNC. MA: inibição do centro do vomito.
 Antagonistas dos receptores 5-HT3 canal iônico ligante- dependente
Os receptores 5-HT3 são canais de cátions operados por ligantes, sem
envolvimento de segundo mensageiro. Ele se encontra na área postrema, região do

32
bulbo, envolvida no reflexo do vomito. A dolasetrona, granisetrona, ondansetrona,
palonosetrona e a tropisetrona são particularmente valiosas para prevenir e tratar os
vômitos e, em menor proporção, para diminuir as náuseas comumente observadas no
pós-operatório ou aqueles causados por radioterapia ou administração de citotóxicos
como a cisplatina. MA: O sitio primário de ação desses fármacos é a ZGQ. Porem,
também existem receptores 5-HT3 no núcleo do trato solitário (centro do vomito) e
nos núcleos aferentes vagais. Podem ser adm por VO ou parenteral.
 Antagonistas da dopamina D2
São os mais usados na pratica clinica. Os antipsicóticosfenotiazínicos, como
clorpromazina, perfenazina, proclorperazina e trifluoperazina, são antieméticos
eficazes comumente usados para tratar as manifestações mais intensas de náuseas e
vômitos associadas a câncer, radioterapia, citotóxicos, opioides, anestésicos e outros
fármacos, podem ser adm por VO, intravenosa ou por supositório. MA: Atuam,
principalmente, como antagonistas dos receptores D2 da dopamina na ZGQ, mas
também bloqueiam receptores de histamina e muscarínicos. Também atua
estimulando a motilidade gástrica intestinal, acelerando o esvaziamento gástrico. Em
altas doses também tem ação antiserotoninérgica que contribui para o efeito
antiemético. Ele aumenta a pressão do esfíncter esofágico inferior, diminui a
regurgitação e aspiração do conteúdo gástrico. Os antagonistas D2 tratam a êmese
produzida por estímulos da área postrema e são úteis para as etiologias
medicamentosas, tóxicas e metabólicas (uremia, radiação, gravidez)
Outros antipsicóticos como o haloperidol e a levomepromazina também atuam
como antagonistas D2 na ZGQ e podem ser usados para êmese aguda induzida por
quimio.
A metoclopramida é um antagonista D2 e é estreitamente relacionada com o
grupo dos fenotiazínicos, atuando centralmente sobre a ZGQ e tendo ação periférica
sobre o próprio TGI, aumentando a motilidade do esôfago, estomago e intestino. Isso
não somente se acrescenta ao efeito antiemético, mas também explica seu uso no
tratamento de refluxo gastresofágico e distúrbios hepáticos e biliares. Como a
metoclopramida também bloqueia os receptores de dopamina em outras regiões do
SNC, produz alguns efeitos adversos, inclusive distúrbios do movimento, cansaço,
inquietação motora, torcicolo espasmódico. Estimula a liberação de prolactina
causando galactorreia e distúrbios menstruais.
A domperidona é um fármaco semelhante, usado para tratar vômitos causados
por citotóxicos, bem como sintomas gastrointestinais. Diferentemente da
metoclopramida, não atravessam facilmente a barreira hematoencefálica e por isso
produz menos efeitos colaterais.
 Antagonistas do receptor NK1 (neurocinina 1- receptor substancia P)
O aprepitanto bloqueia os receptores da substancia P na ZGQ e no centro do
vomito. A substância P causa êmese quando injetada intravenosamente e é liberada
pelos nervos aferentes vagais gastrointestinais, assim como pelo próprio centro do
vomito. Oaprepitanto é adm por VO, sendo eficaz no controle da fase tardia da
êmese causada por fármacos citotóxicos, com poucos efeitos adversos significativos.
 Canabinoides
Verificou-se que o canabinolnabilona diminui os vômitos causados por agentes
que estimulam a ZGQ e, algumas vezes, é eficaz quando outros fármacos falham. O
efeito antiemético é antagonizado pela naloxona, o que significa que os receptores
opióides podem ser importantes no MA. Usado para vômitos causados por agentes
antineoplasicos citotóxicos.
 Glicocorticoides
33
Em altas doses (particularmente a dexametasona) também podem controlar a
êmese, especialmente quando causada por fármacos citotóxicos. O MA não é claro.
A dexametasona pode ser utilizada isoladamente, porém em geral é combinada com
um fenotiazinico, com ondansetrona ou aprepitanto.

34
Problema 2 – Problemas com os
portões
Anatomia da Junção Esôfago com Estômago
A parede do TGI consiste em 4 camadas de tecido. De dentro para fora são:
túnica mucosa, tela submucosa e as túnicas muscular e serosa.
 A túnica mucosa (interna) é uma membrana composta de uma camada de
epitélio em contato direto com o conteúdo do TGI, tecido conjuntivo areolar e uma
fina camada de músculo liso que forma pregas na túnica mucosa para aumentar a
área de superfície para atividades digestivas.
 Túnica submucosa consiste de tecido conjuntivo areolar que une a túnica
mucosa a muscular. Contêm vasos sanguíneos e linfáticos para absorção dos
produtos da digestão, e nervos que controlam as secreções do TGI.
 Túnica muscular: até a parte superior do esôfago é músculo estriado
esquelético que produz a deglutição voluntária. No restante do TGI é músculo liso,
disposto em estrato interno de fibras circulares e externo de fibras longitudinais
(movimento involuntário). Também possui nervos na muscular que controlam os
movimentos do TGI (motilidade).
 Túnica serosa é a mais externa. Composta por epitélio escamoso simples
e tecido conjuntivo. Secreta líquido seroso, que permite ao trato deslizar facilmente
contra outros órgãos. O peritônio é a maior túnica serosa do nosso corpo.
 “A BARREIRA ANTI-REFLUXO”
 Fatores esofágicos: São o ângulo de His, a roseta mucosa esôfago-gástrica,
o peristaltismo esofagiano, o segmento do esôfago intra-abdominal e o esfíncter
esofágico inferior (EIE).
 Fatores extra-esofágicos: Os pilares diafragmáticos (hiato esofágico)
contraem-se fazendo um mecanismo de pinça durante a tosse, inspiração profunda, e
manobra de Valsalva; os músculos da cárdia em forma de suspensório, os ligamentos
freno-esofagianos, e o peristaltismo esofágico gástrico junto com a competência do
piloro.
O esôfago é um tubo muscular (com aproximadamente 25 cm de comprimento)
com um diâmetro médio de 2 cm que se estende da faringe (parte laríngea da
faringe), passa através do mediastino, atravessa o diafragma e termina no estômago
(entrando pelo óstio cárdico). O comprimento do esôfago no adulto varia
ligeiramente de acordo com a estatura e o sexo. Ele transporta o alimento ao
estômago e secreta muco, que auxilia no transporte. O esôfago é provido de dois
tipos de glândulas: as produtoras de muco, que se localizam mais profundamente, e
as glândulas cárdicas, que são superficiais. As paredes do esôfago são constituídas
inicialmente de M. esquelético, mas sofrem transição para músculo liso nos 2/3
inferiores.
O esôfago está preso às margens do hiato esofágico no diafragma por meio do
ligamento frênico-esofágico, uma extensão da fáscia diafragmática inferior. Este
ligamento permite movimento independente do diafragma e esôfago durante a
respiração e deglutição. Ele apresenta um ramo superior que liga o esôfago na porção

35
superior do diafragma e um ramo inferior que se liga inferiormente no diafragma,
após ter passado pelo hiato esofágico. Ele mantém a posição correta do esôfago
dentro do hiato. O peristaltismo do esôfago impede que o alimento volte (M. circular
espreme e o M. longitudinal empurra).
O esôfago é provido de um esfíncter superior formado de fibras musculares
estriadas, que é o próprio músculo cricofaríngeo, e de um esfíncter inferior,
constituído de fibras musculares lisas, cuja individualidade só pode ser demonstrada
por métodos fisiológicos. Anatomicamente, o esfíncter inferior é indistinguível da
camada muscular circular do corpo do esôfago. Estes 2 esfíncteres permanecem
normalmente contraídos, mantendo o esôfago com as suas extremidades ocluídas, e
só se relaxam quando sob estímulo neurogênico, como ocorre no ato da deglutição. A
barreira antirrefluxo é formada pelo esfíncter esofágico, diafragma crural, ligamento
freno-esofágico e ângulo de His.
A junção esofagogástrica situa-se a esquerda
da vértebra T11 no plano horizontal que passa
através da ponta do processo xifóide. Denominada
também de linha zeta (Z) que é uma linha denteada
onde a túnica mucosa muda abruptamente de túnica
mucosa do esôfago para túnica mucosa do
estômago. Na cárdia, a transição do epitélio
estratificado pavimentoso para epitélio cilíndrico
gástrico é abrupta. A transição é facilmente
reconhecida à endoscopia, recebendo a
denominação de linha zeta.
O segmento distal do esôfago, em uma
extensão de 2 a 4 cm, comporta-se como um
verdadeiro esfíncter (esfíncter esofágico inferior).
Este segmento permanece normalmente contraído (tonicamente por ação miogênica,
independe de inervação; o relaxamento é mediado por inervação), desenvolvendo
pressão basal de 10 a 30 mmHg acima da pressão do fundo gástrico. Suas fibras têm
propriedades que as distinguem do restante da camada circular do corpo do esôfago.
Quando estudadas in vitro, desenvolvem um máximo de tensão com um mínimo de
alongamento; são hipersensíveis aos estímulos e apresentam resposta inibidora
neurogênica.
No momento da deglutição, por um reflexo de arco longo iniciado na faringe e
transmitido por via vagal, este segmento esfincteriano se relaxa. O relaxamento
antecede a chegada da onda peristáltica, ocorrendo entre 1,5 e 2,5 s após a primeira
fase de deglutição. O esfíncter volta a contrair-se após a passagem do bolo alimentar,
alcançando uma pressão ligeiramente superior à inicial, para logo retornar à pressão
basal. Isso impossibilita o refluxo do conteúdo gástrico, e o tônus desse esfíncter
também aumenta durante contrações gástricas e aumentos da pressão intra-
abdominal. A abertura esfincteriana se verifica do mesmo modo com a onda
peristáltica secundária.
O esfíncter superior recebe apenas fibras colinérgicas vagais e tem potenciais
de ação que são inibidos durante a deglutição. Assim, seu estado de contração tônica
parece depender de uma excitação contínua neurogênica, que cessa transitoriamente
por inibição central durante a deglutição. A fisiologia do esfíncter inferior do esôfago
ainda não está inteiramente esclarecida. O estado de contração tônica de suas fibras
parece ser de natureza miogênica, independentemente, portanto, da inervação. O seu
relaxamento, ao contrário, é mediado pela inervação, atuando, neste caso, um

36
neurotransmissor não colinérgico, não adrenérgico, possivelmente mediado pelo
óxido nítrico. A ausência de relaxamento do esfíncter constitui a acalasia.
 Hiato diafragmático/ esofágico: é a abertura no diafragma por onde o
esôfago atravessa, normalmente formada pelo pilar muscular direito do diafragma, a
nível de T10. Durante a inspiração, o M. diafragma se contrai e desce, aumentando a
pressão intra-abdominal e favorecendo o aumento da tensão no esfíncter esofágico
inferior, contribuindo para impedir o refluxo. Quando ocorre um alargamento desse
hiato (hérnia hiatal) pode predispor ao refluxo.
 Roseta gástrica: no nível do hiato esofágico, a mucosa esofágica assume o
formato de roseta, em consequência do enrugamento produzido pela ação do
esfíncter esofágico inferior. Essa rosta ocorre principalmente na transição esôfago
gástrica e ajuda a conter o conteúdo gástrico.
 O ângulo de His (ângulo esôfago gástrico): é formado pelo esôfago
abdominal e o fundo gástrico. Em condições normais esse ângulo é agudo. Assim o
volume do conteúdo gástrico aumenta a pressão no esôfago abdominal por
compressão extrínseca, decorrente de distensão do fundo do estômago. No recém-
nascido, esse ângulo é obtuso.
 Estômago
O estômago é a parte expandida entre o esôfago e o intestino delgado, tem
formato de J e esta imediatamente abaixo do diafragma. A cavidade gástrica é dotada
de dois orifícios: a cárdia, que corresponde à desembocadura do esôfago, e o piloro,
que corresponde à comunicação com o duodeno.
O estômago é classicamente dividido em três partes: o fundo, que é a parte
situada cranialmente ao plano horizontal que passa pela cárdia; o corpo, que é a parte
imediatamente distal ao fundo, com forma aproximada à de um cone truncado com a
base para cima e o eixo ligeiramente oblíquo da esquerda para a direita; e o antro, um
canal aproximadamente cilíndrico cujo eixo se orienta para a direita, para trás e para
o alto, terminando no piloro. O estômago tem sua posição determinada por fixação
ao nível da cárdia e do piloro. Além disso, as membranas peritoneais que recobrem
as suas superfícies anterior e posterior se unem ao longo da pequena e da grande
curvatura e dão origem aos ligamentos hepatogástrico, gastresplênico e gastrocólico,
que o fixam, respectivamente, ao lobo esquerdo do fígado, ao baço e à flexura
esplênica do cólon transverso.
O esvaziamento intermitente do estômago ocorre quando a pressão
intragástrica supera a resistência do músculo esfíncter do piloro. O piloro guarda o
óstio pilórico; sua parede é mais grossa porque contêm mais músculo liso circular. A
camada média da túnica muscular é mais espessa para formar o músculo esfíncter
pilórico. O piloro normalmente esta em contração tônica.

Refluxo Gastroesofágico
Refluxo gastroesofágico é um processo fisiológico que se refere ao movimento
(sem esforço) do conteúdo gástrico do estômago para o esôfago (retorno passivo sem
contração abdominal do conteúdo gástrico). Isso ocorre em todas as pessoas, várias
vezes todos os dias, comumente sem gerar sintomas ou sinais de lesão. O refluxo
também pode ser patológico, produzindo sintomas e sinais de lesão tecidual no
esôfago, orofaringe, laringe e trato respiratório. Lesão do esôfago por refluxo
(esofagite de refluxo) é a forma mais comum de DRGE, identificada mais amiúde
por azia recorrente. Em praticamente todos os pacientes com azia, há uma patologia

37
identificável na mucosa esofágica, embora apenas 40% tenham erosões
endoscopicamente identificáveis. Os restantes 60% de pacientes com azia
apresentam patologia endoscopicamente não detectável (microscópica), designada de
DRGE não erosiva (DRGENE).
O refluxo gastroesofágico pode ser conceituado como o fluxo retrógrado e
repetido de conteúdo gástrico para o esôfago. É freqüente em crianças, na maioria
das vezes de evolução benigna e caracterizado pela presença de regurgitações. Ao
lado da dor abdominal e da constipação intestinal, constitui um das principais causas
de consultas ao gastroenterologista pediátrico. (ARTIGO)
A maior parte dos casos corresponde ao refluxo fisiológico, resultante da
imaturidade dos mecanismos de barreira anti-refluxo. Embora podendo cursar com
condições ameaçadoras à vida, como as crises de apnéia, o refluxo fisiológico tem,
na maior parte dos casos, evolução satisfatória, sem comprometimento do
crescimento e desenvolvimento da criança. Por outro lado, o refluxo patológico
apresenta repercussões clínicas como déficit do crescimento, dor abdominal,
irritabilidade, hemorragias digestivas, broncoespasmo, pneumonias de repetição ou
complicações otorrinolaringológicas, exigindo habilidade no diagnóstico e atenção
na escolha do tratamento mais adequado a cada caso. (ARTIGO)
O refluxo gastroesofágico (RGE) é definido como o retorno involuntário do
conteúdo gástrico ao esôfago, podendo exteriorizar-se através de um processo
fisiológico em lactentes, crianças maiores, adolescentes e adultos. O material refluído
pode conter alimentos e líquidos, saliva e secreções gástrica, pancreática e biliar. A
maioria desses episódios ocorre até o esôfago distal, não acarretando sintomas e tem
duração rápida. O refluxo gastroesofágico fisiológico (RGE) se apresenta
clinicamente através de manifestações digestivas, a regurgitação e o vômito, sem
comprometimento do ganho pôndero-estatural ou outras complicações. Sua
prevalência atinge 67% dos lactentes entre três e quatro meses de idade. No fim do
primeiro ano de vida, somente 5% dos lactentes continuam apresentando sintomas.
(MOREIRA)
 Epidemiologia
DRGE é um processo multifatorial e uma das doenças mais comuns da
humanidade.
O RGE é seguramente uma das principais condições gastroenterológicas entre
as crianças. Apesar de predominar no sexo masculino, a diferença entre os sexos não
tem significância estatística. Estima-se que entre crianças que apresentam
regurgitações com freqüência preocupante para os pais, apenas 2% necessitarão de
investigação e 0,4% de cirurgia.
Atualmente, a DRGE é considerada um problema de saúde pública em razão de
sua elevada prevalência, evolução crônica, recorrências frequentes e
comprometimento da qualidade de vida. A prevalência estimada da DRGE baseia-se
apenas na presença de sintomas clássicos.
A DRGE afeta todos os grupos etários, mas os idosos procuram tratamento
mais frequentemente. O impacto negativo da DRGE na qualidade de vida é

38
significativo, maior do que em pacientes com diabetes melito e hipertensão arterial,
com rápida melhora após resposta favorável ao tratamento.
 Classificação do Refluxo Gastroesofágico
O RGE pode ser fisiológico ou patológico, primário ou secundário e, ainda,
oculto.
O RGE fisiológico é mais comum nos primeiros meses de vida. Em crianças
maiores e adultos pode ocorrer no período pós-prandial devido ao relaxamento
transitório do esfíncter esofágico inferior (EIE). As regurgitações pós-alimentares
surgem entre o nascimento e os quatro meses de idade, apresentando resolução
espontânea, na maioria dos casos, até um a dois anos de idade. Nesses casos o
crescimento da criança é normal, e não há outros sintomas ou complicações
associadas. A freqüência de regurgitações diminui após seis meses de idade,
coincidindo com a introdução de dieta sólida e adoção de postura mais ereta pela
criança.
Deve-se suspeitar do RGE patológico quando os vômitos e regurgitações não
melhoram após seis meses de vida, não respondem às medidas posturais e dietéticas,
e quando estão presentes repercussões clínicas como parada do crescimento ou
sintomas e sinais sugestivos de esofagite. O refluxo é denominado oculto quando
manifestações respiratórias, otorrinolaringológicas ou indicativas de esofagite
(irritabilidade, choro constante) ocorrem na ausência de vômitos e regurgitações.
O RGE primário resulta de disfunção da junção esofagogástrica.
O RGE secundário associa-se a condições específicas como estenose congênita
do esôfago, fístula traqueo-esofágica, atresia de esôfago, distúrbios da deglutição,
estenose hipertrófica do piloro, úlcera gástrica ou duodenal, pâncreas anular, pseudo-
obstrução intestinal, alergia alimentar (proteína do leite de vaca), infecção urinária,
parasitoses intestinais, doenças genético-metabólicas, asma, fibrose cística e
alterações do sistema nervoso central.
Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) decorre da falha da barreira
normal antirrefluxo gastroesofágico (RGE: conteúdo gástrico em movimento
retrógado sem esforço a partir do estômago para o esôfago). RGE propriamente dito
não é uma doença, mas sim um processo normal. Ele ocorre várias vezes durante o
dia, especialmente após grandes refeições, sem produzir sintomas ou lesão da
mucosa. Em contraste, DRGE é um espectro da doença, produzindo em geral
sintomas de pirose e regurgitação ácida.
A maioria dos pacientes não apresenta nenhum dano visível da mucosa durante
a endoscopia (DRGE não erosiva), enquanto outros têm esofagite, estenose péptica
ou esôfago de Barrett. Os sintomas podem incluir dores torácicas ou evidências de
manifestações extraesofágicas tais como sintomas pulmonares, de ouvido, nariz ou
garganta.
 Fisiopatologia
A patogênese da DRGE é complexa, resultando de um desequilíbrio entre os
fatores de defesa que protegem o esôfago (barreiras antirrefluxo, depuração esofágica

39
de ácido, resistência do tecido) e os fatores agressivos refluindo a partir do estômago
(acidez gástrica, volume e conteúdo gastrointestinal).
 Barreiras Antirrefluxo
O primeiro nível das 3 camadas que compõem a defesa esofágica contra
agressão aos ácidos, a barreira antirrefluxo, representa uma região anatomicamente
complexa, incluindo o componente intrínseco do esfíncter inferior do esôfago (EIE),
os pilares diafragmáticos, a porção intra-abdominal do EIE, os ligamentos
frenoesofágicos e o ângulo agudo de His.
O EIE é o principal componente da barreira antirrefluxo, sendo capaz de
impedir o refluxo, mesmo quando completamente deslocado do pilar diafragmático
por uma hérnia de hiato. Existe uma variação diurna considerável na pressão basal da
EIE; ela é mais baixa após as refeições e mais elevada à noite. Também é
influenciada por peptídeos e hormônios circulantes, alimentos (principalmente
gordura), bem como por vários medicamentos.

O EIE está dentro do hiato criado pelo pilar direito do diafragma e é fixado
pelos ligamentos frenoesofágicos, que inserem ao nível da junção escamocolunar.
Com relação ao desenvolvimento, o diafragma crural surge a partir do mesentério
dorsal do esôfago e é inervado separadamente do diafragma costal. É inibido por
distensão do esôfago, vômito e durante relaxamentos transitórios do EIE (tLESRs),
mas não durante a deglutição.
O diafragma crural exerce compressão extrínseca sobre o EIE intrínseco,
contribuindo para a pressão do EIE durante os períodos de aumento da pressão
abdominal, como tosse, espirros ou ao se inclinar.
 Relaxamento Transitório do Esfíncter Inferior do Esôfago.

40
tLESRs são o mecanismo mais frequente para
refluxo em pacientes com pressões normais do
esfíncter. tLESRS ocorrem independentemente da
deglutição, não são acompanhados pelos movimentos
peristálticos do esôfago, persistem por mais tempo (>
10 segundos) do que LESRs induzidos pela
deglutição e são acompanhados pela inibição do
diafragma crural.
tLESRs são responsáveis por quase todos os
episódios de refluxo em indivíduos saudáveis e por
50% a 80% dos episódios de DRGE em pacientes,
dependendo da gravidade da esofagite associada. No
entanto, um estudo sugere que a baixa pressão basal
do EIE, em vez do tLESRs, possa ser um mecanismo primário de RGE em pacientes
com hérnia de hiato irredutível.
Possíveis fatores que determinam a ocorrência de refluxo incluem esforço
abdominal, presença de hérnia hiatal, o grau de encurtamento do esôfago e duração
dos tLESRs. O estímulo dominante para tLESRs é a distensão do estômago proximal
por alimentos ou gás, o que não é surpreendente, dado que um tLESR é o mecanismo
da eructação. Outros estímulos são gordura, estresse e estimulação subliminar (para
deglutição) da faringe.
As evidências indicam que tLESRs são mediados através de vias vagais. A
sequência estruturada de eventos motores, incluindo LESR, inibição do diafragma
crural e peristalse secundária do esôfago, sugere que esse processo ocorre de forma
programada, provavelmente controlada por um gerador padrão dentro do núcleo
vagal. O braço motor é o nervo vago que compartilha elementos comuns com LESR
induzindo por deglutição.
 Relaxamento do Esfíncter Inferior do Esôfago Induzido pela Deglutição
Cerca de 5% a 10% dos episódios de refluxo ocorrem durante LESRs
induzidos por deglutição. A maioria dos episódios está associada à peristalse
defeituosa ou incompleta. Durante um LESR normal induzido por deglutição, refluxo
é incomum, porque (1) o diafragma crural não relaxa, (2) a duração do LESR é
relativamente curta (5-10 segundos) e (3) o refluxo é impedido pela onda peristáltica
que se aproxima. Refluxo durante LESRs induzido por deglutição é mais comum
com uma hérnia de hiato. Isto é atribuído à menor complacência da junção
esofagogástrica em pacientes com hérnia, permitindo assim que ele se abra com
pressões iguais ou inferiores à pressão intragástrica, desta forma permitindo o refluxo
do suco gástrico acumulado na hérnia de hiato.
 Hipotensão do Esfíncter Inferior do Esôfago
RGE pode ocorrer no contexto de um EIE hipotenso tanto induzido por tensão
ou livremente. Refluxo induzido por tensão ocorre quando a baixa pressão de
repouso de um EIE hipotenso é superado levando a sua abertura forçada secundária
ao aumento abrupto da pressão intra-abdominal por tosse, esforço ou inclinação. Este
tipo de refluxo é improvável quando a pressão do EIE é maior que 10 mmHg.

41
Refluxo devido a uma pressão baixa ou ausente no EIE é incomum. A maioria ocorre
em pacientes com esofagite grave e pode representar até 25% dos episódios de
refluxo; raramente ocorre em pacientes sem esofagite. Os mecanismos responsáveis
pela pressão baixa idiopática do EIE são mal compreendidos.
 Hérnia de Hiato
A contribuição da hérnia de hiato para DRGE é controversa. A hérnia de hiato
prejudica a função do EIE através de vários mecanismos, além de comprometer a
depuração do ácido esofágico. Refluxo é mais intenso em pacientes com uma hérnia
de hiato “irredutível” em oposição a uma “redutível”. Hérnias irredutíveis são
aquelas em que as pregas gástricas permanecem acima do diafragma entre as
deglutições.
O deslocamento do EIE a partir do diafragma crural para o interior do tórax
reduz a pressão basal do EIE e encurta o comprimento da zona de alta pressão,
principalmente devido à perda do segmento intra-abdominal do EIE. A presença da
hérnia de hiato elimina o aumento da pressão do EIE, que ocorre durante o esforço, e
aumenta o tLESRs durante a distensão gástrica com gás.
A etiologia da hérnia de hiato permanece desconhecida. Agrupamento
familiares de DRGE sugerem a possibilidade de um distúrbio hereditário da
musculatura lisa.

 Depuração Esofágica de Ácido


O segundo nível contra danos induzidos por refluxo é a depuração esofágica de
ácido. Este fenômeno envolve dois processos relacionados, porém distintos:
depuração de volume, que é a remoção efetiva do material de refluxo do esôfago, e
depuração ácida, que é a restauração do pH esofágico ao normal após exposição
ácida através de titulação com bases provenientes da saliva e secreções das glândulas
do esôfago.

42
Embora a competência da barreira antirrefluxo determine a frequência e o
volume do RGE, a depuração de ácido esofágico determina a duração da exposição
ácida de mucosa e, provavelmente, a gravidade da lesão da mucosa.
 Depuração de Volume
O peristaltismo esofágico depura o volume ácido nas posições verticais e
decúbito dorsal, mas é inoperante durante a fase do sono de movimento rápido dos
olhos (REM).
Peristalse primária é provocada por deglutição. O peristaltismo secundário, iniciado
pela distensão esofágica pelo refluxo ácido, é muito menos eficaz na depuração do
material de refluxo, oferecendo apenas um papel secundário de proteção.
Disfunção peristáltica (falhas de contração peristáltica ou contrações
peristálticas hipotensivas [< 30 mmHg] que esvaziam incompletamente o esôfago)
aumentam em frequência com a gravidade da esofagite.
A gravidade contribui para a depuração do bolo quando o refluxo ocorre na
posição vertical. À noite, quando em decúbito dorsal, este mecanismo não é
operacional, a menos que a cabeceira da cama esteja elevada. Essa importante
mudança do estilo de vida melhora o tempo de depuração ácida e é mais benéfico em
pacientes com aperistalse.
 Secreções das Glândulas Salivares e Esofágicas
Saliva é o segundo fator essencial para depuração normal do ácido esofágico.
Comparada com o ácido gástrico, a saliva é uma base fraca, com pH entre 5,4 e 7,8.
Embora a saliva seja ineficaz em neutralizar grandes volumes de ácido (5-10 mL),
neutraliza facilmente a pequena quantidade de ácido remanescente no esôfago após
várias contrações peristálticas.
Modulação da salivação pode contribuir para a DRGE. Diminuição da
salivação durante o sono é a razão pela qual episódios de refluxo noturnos estão
associados ao tempo de depuração ácida significativamente prolongado. Xerostomia
está associada à exposição esofágica prolongada ao ácido e com esofagite.
Tabagismo promove RGE (os tabagistas também têm tempo prolongado de
depuração ácida esofágica devido à hiposalivação).
Além da saliva, a secreção de solução aquosa rica em bicarbonato das
glândulas da submucosa do esôfago dilui e neutraliza o ácido esofágico residual.
Refluxo ácido no lúmen do esôfago estimula essas glândulas e ajuda a neutralizar o
ácido, mesmo que a deglutição não ocorra.
 Resistência dos Tecidos
Embora os mecanismos de depuração minimizem o tempo de contato do ácido
com o epitélio, mesmo indivíduos saudáveis têm refluxo ácido durante o dia e à
vezes à noite. No entanto, apenas alguns indivíduos vivenciam RGE sintomática e
um número ainda menor sofre de DRGE. Isso se deve a um terceiro nível de defesa
do esôfago conhecida como resistência ao tecido.
Conceitualmente, a resistência do tecido pode ser subdividida em fatores pré-
epiteliais, epiteliais e pós-epiteliais, que agem em conjunto para minimizar os danos
na mucosa a partir do refluxo nocivo do estômago.

43
A defesa pré-epitelial do esôfago é pouco desenvolvida. Não há nem uma
camada bem definida de muco, nem capacidade de tamponamento pelas células da
superfície para secretar íons bicarbonato na camada aquosa fixa.
As defesas epiteliais consistem em componentes estruturais e funcionais.
Componentes estruturais incluem membranas celulares e complexos juncionais
intercelulares da mucosa esofágica. Esta estrutura têm uma camada de 25 a 30
células de espessura de epitélio escamoso não queratinizado funcionalmente dividido
em uma camada celular basal proliferativa (estrato basal), uma camada média de
células escamosas metabolicamente ativas (estrato espinhoso da epiderme) e uma
camada de células mortas de 5 a 10 células de espessura (estrato córneo da
epiderme). A mucosa esofágica é um epitélio relativamente “apertado”, que resiste
ao movimento iônico aos níveis intercelular e celular, como resultado das junções
firmes e da matriz rica em lipídios glicoconjugados no espaço intercelular. O ácido
luminal ataca as defesas epiteliais através do dano na junção intercelular e
permitindo que íons de hidrogênio entrem e acidifiquem o espaço intercelular.
Os componentes funcionais de resistência dos tecidos incluem a capacidade do
epitélio do esôfago para tamponamento e eliminação de íons de hidrogênio. O
tamponamento intracelular é realizado através de fosfatos e proteínas negativamente
carregados, bem como por íons de bicarbonato. Quando a capacidade de tampão da
mucosa é ultrapassada e o pH intracelular cai, o epitélio tem capacidade de eliminar
ativamente ou neutralizar H+. Isto ocorre possivelmente, pela ação de duas proteínas
transmembrana, uma trocadora de Na+/H+ e outra trocadora Cl-/HCO3-NA+
dependente.
Outros contribuintes para a defesa epitelial incluem o fator de crescimento
epidérmico salivar, fator transformador de crescimento-α e prostaglandina E2. Esses
fatores melhoram a renovação das células epiteliais, aumentam a produção de
mucina esofágica e modulam a secreção de bicarbonato.
Dados sugerem que espaços intercelulares dilatados são o primeiro marcador
de dano celular ao epitélio esofágico. Essas alterações surgem com a exposição ao
ácido e à pepsina, durante o refluxo gastroesofágico, mas a via exata do dano às
junções intercelulares ainda não está clara e parece ser multifatorial. Outros
conteúdos nocivos do refluxo, como ácidos biliares, são prejudiciais, e espaços
intercelulares dilatados podem ser induzidos por estresse psicológico agudo. Espaços
intercelulares dilatados podem ser avaliados quantitativamente com microscopia
eletrônica (ME), mas eles também são identificáveis com microscopia ótica (MO). É
importante notar que a inibição agressiva do ácido com inibidores da bomba de
prótons leva à resolução completa dos espaços intercelulares dilatados em quase
todos os pacientes no período de 3 a 6 meses.
A defesa pós-epitelial é fornecida pelo suprimento sanguíneo esofágico. O
fluxo sanguíneo fornece oxigênio, nutrientes e bicarbonato, e remove H+ e CO2,
mantendo o equilíbrio acidobásico normal no tecido. O fluxo sanguíneo para a
mucosa do esôfago aumenta em resposta ao estresse do ácido luminal.

44
Ao contrário do estômago, onde lesões superficiais na mucosa podem ser
reparadas em horas, o esôfago é mais lentamente reparado, ao longo de dias ou
semanas.
 Fatores Gástricos
Fatores gástricos (volume e composição do refluído gástrico) são
potencialmente importantes na produção de esofagite de refluxo. Acidez gástrica
determina o grau potencial de lesão da mucosa do refluído. Aumentos no volume
gástrico aumentam a taxa de tLESRs, tornando disponível mais conteúdo gástrico
para refluxo.
 Secreção Ácida Gástrica
Ácido e pepsina ativada são os principais ingredientes do refluído gástrico a
produzir esofagite. O ácido sozinho causa lesão mínima em um pH inferior a 3,
principalmente por desnaturação de proteínas. Contudo o ácido combinado com
pepsina, mesmo em quantidades pequenas, rompe a barreira mucosa, resultando em
aumento da permeabilidade de H+, alterações histológicas e hemorragia. Em geral, a
secreção ácida gástrica é normal em pacientes com DRGE.
 Refluxo Duodenogástrico
Juntamente com ácido e pepsina, o conteúdo duodenal pode ser prejudicial para
a mucosa do esôfago. Os ácidos biliares conjugados produzem sua maior lesão na
presença de ácido e pepsina, enquanto tripsina e ácidos biliares desconjugados
causam lesão em um ambiente mais neutro. O refluxo duodenogástrico para esôfago
predispõe a complicações da DRGE. No entanto, a medida precisa do refluxo
duodenogástrico é difícil.
 Esvaziamento Gástrico Lento
A importância do esvaziamento gástrico lento na patogênese da DRGE é
controversa. No entanto, atraso no esvaziamento gástrico é um fator importante que
contribui para DRGE em alguns grupos, tais como pacientes diabético com
neuropatia periférica autonômica.
Com a agressão repetitiva da mucosa, a camada epitelial é destruída, surgindo
EROSÕES, INFLAMAÇÃO E EDEMA (esofagite erosiva). Se o processo continuar,
pode ocorrer o acometimento da camada submucosa e muscular, evoluindo com a
formação de ÚLCERAS, FIBROSE e ESTENOSE DO ESÔFAGO, que é uma
complicação da DRGE que ocorrer em 10% casos. Uma outra complicação é o
esôfago de Barret, que ocorre quando o epitélio esofágico (escasmoso) é substituído
por epitélio intestinal colunar (metaplasia) – epitélio ESCAMOSO substituído pelo
COLUNAR (intestino).
Bolsa ácida: aumento da produção ácida no fundo gástrico reflui EEI.
 Características Clínicas
Pirose é o sintomas clássico da DRGE, com os pacientes geralmente relatando
uma sensação de queimação, subindo partir do estômago ou parte inferior do tórax e
irradiando para pescoço, garganta e, ocasionalmente, dorso. Ocorre geralmente no
período pós-prandial, especialmente após grandes refeições ou após se ingerir
alimentos picantes, produtos cítricos, gorduras, chocolates e álcool. O decúbito
dorsal e inclinar-se para frente podem exacerbar a pirose. Estudos recentes têm

45
sugerido que a privação de sono, bem como o estresse psicológico ou auditivo
podem diminuir o limiar para a percepção dos sintomas. Pirose noturna pode causar
dificuldades no sono e prejudicar as atividades no dia seguinte.
DRGE geralmente é diagnosticada sintomaticamente pela ocorrência de pirose
dois ou mais dias por semana, embora sintomas menos frequentes não excluam a
doença. Apesar de um auxilio para o diagnóstico, a freqüência e a gravidade da
pirose não predizem o grau do dano esofágico.
Sintomas de pirose podem surgir por refluxo ácido, refluxo fracamente ácido,
refluxo biliar e estimulação mecânica do esôfago.
Outros sintomas comuns de DRGE são regurgitação ácida e disfagia. A
regurgitação de fluido ácido sem esforço, especialmente após as refeições e agravada
por inclinação ou posição de decúbito dorsal, é altamente sugestiva de DRGE. Entre
pacientes com regurgitação diária, a pressão do EIE geralmente é baixa, tornando
esse sintoma mais difícil de ser tratado com medicamentos do que a pirose clássica.
Disfagia é relatada por mais de 30% dos indivíduos com DRGE. Ocorre
geralmente no contexto de pirose de longa data com disfagia de progressão lenta para
sólidos. Perda de peso é incomum, porque os pacientes têm bom apetite.
Sintomas menos comuns associados com DRGE incluem sialorreia, odinofagia,
arrotos, soluções, náuseas e vômito. Sialorreia é o aparecimento súbito na boca de
um fluido ligeiramente azedo ou salgado. Não é líquido regurgitado, mas sim
secreções das glândulas salivares em resposta ao refluxo ácido. Odinofagia pode
ocorrer na esofagite grave ulcerada.
Alguns pacientes com DRGE são assintomáticos. Isto é particularmente
verdadeiro nos adultos mais velhos, talvez por causa da acidez diminuída do material
refluído em alguns ou pela diminuição da percepção da dor em outros.
 Manifestações Extraesofágicas
RGE pode causar um amplo espectro de condições, incluindo dor torácica não
cardíaca, asma, laringite posterior, tosse crônica, pneumonia recorrente e até mesmo
erosão dental. Alguns desse pacientes têm sintomas clássicos de refluxo mas muitos
apresentam “refluxo silencioso”, contribuindo para problemas na realização do
diagnóstico.
 Dor Torácica
Dor torácica relacionada ao RGE pode imitar angina de peito, apresentando-se
do tipo compressão ou queimação, pode estar localizada em região subesternal e
irradiar para o dorso, região cervical, mandíbula ou membro superior. É
frequentemente pior após as refeições, pode despertar o paciente do sono e pode
piorar durante estresse emocional. Exercícios pesados, como o teste ergométrico,
pode provocar RGE. Dor torácica relacionada a refluxo pode durar minutos ou horas,
muitas vezes desaparecendo espontaneamente, e pode ser aliviada com antiácidos. A
maioria dos pacientes com dor torácica induzida por DRGE tem sintomas de pirose.
O mecanismo da dor torácica relacionada à DRGE é pouco compreendido e,
provavelmente, é multifatorial, relacionado com a concentração de íons H+, volume e
duração do refluxo ácido, espasmo esofagiano secundário e contrações sustentadas
da musculatura longitudinal.

46
 Asma e Outras Doenças Pulmonares
DRGE sintomática é uma comorbidade importante em pacientes com asma,
estando associada à maior gravidade. DRGE deve ser considerada em pacientes
asmáticos com início na idade adulta, naqueles sem componente extrínseco (alérgico)
e naqueles que não respondem a broncodilatadores ou glicorticoides. Até 30% dos
pacientes com asma associada à DRGE não apresentam queixa esofágicas. Outras
doenças pulmonares associada à DRGE incluem pneumonia por aspiração, fibrose
pulmonar intersticial, bronquite crônica e bronquiectasia, Além disso, dados
preliminares sugerem que RGE pode piorar o curso de apneia obstrutiva do sono em
um subgrupo de pacientes.
Os mecanismos propostos para a asma induzida por refluxo incluem aspiração
do conteúdo gástrico para os pulmões com broncoespasmo secundário e ativação de
um reflexo vagal a partir do esôfago para os pulmões causando broncoconstrição.
 Doenças do Ouvido, Nariz e Garganta
DRGE pode estar associada a uma variedade de sintomas e sinais da laringe,
dos quais “laringite de refluxo” é o mais comum. Os pacientes apresentam
rouquidão, sensação de globo, pigarro frequente, dor de garganta recorrente e
aquecimento prolongado da voz. Sinais de ouvido, nariz e garganta atribuídos à
DRGE incluem laringite posterior com edema e enantema, úlceras e granulomas das
cordas vocais, leucoplasia e até carcinoma. Essas mudanças são geralmente limitadas
ao terço posterior das cordas vocais e espaços interaritenoideos, ambos nas
proximidades do esfíncter superior do esôfago.
DRGE tem sido postulada como a principal causa de tosse crônica (depois de
sinusite e asma). RGE aumenta a sensibilidade do reflexo de tosse em pacientes com
tosse crônica. (TRATADO DE GASTRO)
(OUTRO MATERIAL)
 MANIFESTAÇÕES ESOFÁGICAS
A apresentação clínica mais comum dos pacientes com DRGE inclui uma
historia longa de dor do tipo queimação retroesternal (pirose) e uma historia mais
recente de regurgitação. A dor do tipo queimação retroesternal, quando típica, é um
sintoma bastante sugestivo, devendo estar confinada as áreas epigástrica e
retroesternal. Deve ser identificada como uma sensação caustica ou de fisgada,
irradiada para pescoço, garganta e ocasionalmente para dorso, e não é
caracteristicamente descrita como uma sensação de pressão. Ocorre geralmente no
período pós-prandial especialmente após grandes refeições, ou após ingerir alimentos
picantes, produtos cítricos, gorduras, chocolates e álcool. A presença de regurgitação
indica progressão da doença. Alguns pacientes serão incapazes de inclinar (e
decúbito dorsal) sem experimentar um episódio desconfortável. Deve-se fazer uma
distinção entre regurgitação de alimentos digeridos e de não digeridos. Alimentos
não digeridos são indicativo de um outro processo patológico, como um divertículo
esofágico ou acalasia.
Pirose noturna pode causar dificuldades no sono e prejudicar as atividades no
dia seguinte. Quando a pirose domina as queixas de um paciente, ela tem alta
especificidade (89%), mas baixa sensibilidade (38%) para DRGE, conforme
diagnosticada por teste de pHmetria de 24H. DRGE geralmente é diagnosticada
sintomaticamente pela ocorrência de pirose dois ou mais dias por semana, embora

47
sintomas menos frequentes não excluam a doença. A azia associada à DRGE
tipicamente ocorre uma ou duas vezes ao dia e dura de alguns minutos a 1 hora,
podendo durar mais se não tratada. Este padrão se repete, mas com considerável
variação na frequência e severidade. Contudo, não se pode usar a frequência,
gravidade, ou duração da azia como previsor da gravidade endoscópica da doença.
Sintomas de pirose podem surgir por refluxo ácido, refluxo fracamente ácido,
refluxo biliar e estimulação mecânica do esôfago. O receptor que faz a mediação da
sensação de pirose durante a perfusão ácida não foi identificado, embora o receptor 1
de capsaicina ou vaniloide (TRPV1) seja um dos principais candidatos. TRPV1 é um
canal de cátions que se expressa em neurônios sensoriais, e sua ativação por calor,
pH ácido ou etanol pode provocar dor tipo queimação. O refluxo fracamente ácido
ocorre quando existe grande volume do conteúdo gástrico, grande parte do esôfago
proximal alcançada pelo refluxo e tempo prolongado de depuração ácida.
Ácidos biliares são postulados como indutores de liberação de mediadores
intracelulares através do dano nas membranas lipídicas. Além disso, no dano
esofágico induzido por ácido e por ácido biliar, a pepsina pode causar dano direto à
mucosa do esôfago, levando a dilatação dos espaços intercelulares e a aumento da
permeabilidade da mucosa esofágica. Distensão esofágica e contrações esofágicas
sustentadas são outros mecanismos propostos para explicar o sintoma pirose.
Hiperalgesia (baixo limiar de dor) e comorbidades psicológicas também têm sido
postuladas como contribuintes para o sintoma de pirose.
Outros sintomas comuns de DRGE são regurgitação ácida e disfagia. A
regurgitação de fluido ácido sem esforço, especialmente após as refeições é agravada
por inclinação ou posição de decúbito dorsal, é altamente sugestiva de DRGE. Entre
os pacientes com regurgitação diária, a pressão do EIE geralmente é baixa; muitos
têm gastroparesia associada, e esofagite é comum, tornando esse sintoma mais difícil
de ser tratado com medicamentos do que a pirose clássica. Disfagia é relatada por
mais de 30% dos pacientes com DRGE. Ocorre geralmente no contexto de pirose de
longa data com disfagia de progressão lenta para sólidos. Perda de peso é incomum,
porque os pacientes tem bom apetite. A DRGE também está associada à disfagia,
considerada como sintoma de alarme por causar preocupação sobre a formação de
constrição péptica ou adenocarcinoma com origem num esôfago de Barrett. Por essa
razão, disfagia em um paciente com azia é indicação para endoscopia precoce.
Sintomas menos comuns associados com DRGE incluem sialorreia
(aparecimento súbito na boca de um fluido ligeiramente azedo ou salgado),
odinofagia, arrotos, soluços, náuseas e vomito. Vômitos e regurgitações estão
presentes na maioria das crianças com RGE, principalmente no período pós-prandial.
Alguns pacientes com DRGE são assintomáticos. Isto é particularmente
verdadeiro nos adultos mais velhos, talvez por causa da acidez diminuída do material
refluído em alguns ou pela diminuição da percepção da dor em outros.
 MANIFESTAÇÕES EXTRA ESOFÁGICAS
Embora frequentemente a DRGE seja utilizada como sinônimo de esofagite de
refluxo, a definição de DRGE abrange lesões por refluxo na orofaringe, laringe e
trato respiratório. Consequentemente, um caso de DRGE pode apresentar sinais e
sintomas como faringite, dor de ouvido, gengivite, sensação de globus, erosão do
esmalte dental, laringite, bronquite e tosse crônica, asma e pneumonia por aspiração.
Com exceção da pneumonia por aspiração, que ocorre diante de considerável
regurgitação do conteúdo gástrico, a lesão por refluxo na orofaringe, laringe e vias
aéreas é mediada pelo ácido. Asma (chiado) e bronquite (tosse crônica) podem ter
como origem o contato direto entre o ácido e o epitélio da via aérea (microaspiração),

48
ou podem surgir indiretamente, mediante reflexo vagal esofagopulmonar iniciado
pelo contato do ácido com o epitélio esofágico. Desconhece-se a frequência da
rouquidão, asma, tosse crônica e laringite causadas por DRGE.
As manifestações clínicas podem ser específicas, tais como ruminação,
vômitos, regurgitações, eructação; relacionadas à esofagite, como dor, anemia e
sangramentos; respiratórias, como broncoespasmo e pneumonias de repetição;
otorrinolaringológicas como laringites, sinusites, otites e outras. Faringe: faringite
crônica, erosão do esmalte dentário. Laringe: rouquidão, granuloma de corda vocal.
Cavidade nasal: sinusite crônica, otite média. Árvore traqueobrônquica: tosse
crônica, broncoespasmo, asma secundária, pneumonite aspirativa.
 NO LACTENTE: Classicamente vômitos e regurgitação, ou seja, refluxo
regurgitante acompanhado ou não de sintomas como: choro forte semelhante ao das
cólicas do recém-nascido, choro no início das mamadas, recusa alimentar, acordar
noturno chorando, caretas, ruminação, apnéia, estridor, sibilância, catarros de
repetição, otites (devido a conexão pelo óstio faríngeo da tuba auditiva).
 NA CRIANÇA MAIOR: A regurgitação desaparece e isso, nem sempre
significa cura. Em aproximadamente 5% dos casos há permanência do refluir
gastroesofágico sem regurgitação. (Refluxo Ge oculto). Podem associar-se os
sintomas das complicações: Do trato gastrointestinal: pirose, dor retroesternal ou em
epigástrio, e disfagia a alimentos sólidos, halitose, ruminação; do trato respiratório:
otites catarros, sibilos, apnéias; e gerais: anemia, desnutrição.

 Diagnóstico Diferencial
Sintomas associados à DRGE podem ocorrer em outras doenças esofágicas e
extraesofágicas, incluindo acalasia, divertículos de Zenker, gastroparesia, litíase
biliar, úlcera péptica, dispepsia funcional e angina de peito.
 Diagnóstico
Um grande número de testes está disponível para avaliação de pacientes com
suspeita de DRGE. Muitas vezes, esses testes são desnecessários, porque os sintomas
clássicos de pirose e regurgitação ácida são suficientemente específicos para
identificar doença de refluxo e iniciar o tratamento médico. No entanto, este nem
sempre é o caso, e os médicos devem decidir quais testes escolher, de modo a fazer
um diagnóstico de maneira confiável, oportuna e barata, dependendo da informação
desejada.
História de azia (pirose) recorrente, regurgitação ácida e uma resposta positiva
a antiácidos ou a medicação supressora de acidez são suficientes para um diagnóstico
de DRGE. Exames específicos devem ficar reservados para pacientes com (1) DRGE
e também com sintomas de alarme de disfagia, perda de peso, ou sangramento

49
gastrointestinal; (2) DRGE de cronicidade suficiente (p. ex., 5 anos; histórico de
pirose > 10 anos, paciente > 40 anos, presença de náuseas e vômitos) para gerar
preocupação com o surgimento do esôfago de Barrett e (3) suspeita de DRGE com
sintomas atípicos, como dor torácica ou pela presença de sintomas orofaríngeos,
laríngeos ou das vias aéreas; ausência de resposta ao tratamento empírico com IBP
em dose dobrada e história familiar de câncer.
Diagnóstico pode ser feito SOMENTE PELA HISTÓRIA CLÍNICA SE:
- paciente apresentar PIROSE pelo menos 1 ou 2x por semana, de maneira
recorrente, por um período de 4 a 8 semanas.
- resposta positiva ao teste terapêutico (redução sintomática > 50% após 1-2
semanas de uso de IBP).
Nos casos de sintomas extra esofagianos atualmente indica-se inicialmente o
teste terapêutico com IBP com dose dobrada: caso o paciente melhore com a
medicação e com a sua retirada os sintomas voltam, está confirmado o diagnóstico de
DRGE. Caso não melhorem os exames complementares estão indicados. Ex: asma
induzida por refluxo precisa de um tempo de 2-3 meses para melhorar com o
tratamento empírico.
 Teste empírico de Supressão Ácida
É o método mais simples e definitivo para diagnosticar DRGE e avaliar sua
relação com os sintomas. Ao contrário dos outros testes que apensa sugerem uma
associação (p. ex. esofagite na endoscopia ou indica de sintoma positivo no teste de
pH), a resposta a terapia antirrefluxo garante uma relação causa e efeito entre DRGE
e os sintomas.
Com o advento dos IBPs, tornou-se o primeiro teste utilizado em pacientes
com sintomas de refluxo clássico ou atípico sem queixas de alarme. Os sintomas
normalmente respondem a um teste com IBP em 1 a 2 semanas. Se os sintomas
desaparecem com a terapia e retornam em seguida quando a medicação é
descontinua, a DRGE foi estabelecida.
Em testes empíricos para pirose, a dose inicial de IBP foi elevada (p. ex.
omeprazol 40-80mg/dia), geralmente por pelo menos 2 semanas.
Um testes empírico com IBP para diagnóstico de DRGE oferece muitas
vantagens: o teste é feito em consultório, é de fácil realização, relativamente barato
(especialmente com o uso de IBPs sem receita médica), disponível a todos os
médicos, evita muitos procedimentos desnecessários. As desvantagens são poucas,
incluindo resposta placebo e desfecho sintomático incerto se os sintomas não
desaparecerem completamente após tratamento prolongado.
 Endoscopia Digestiva Alta (EDA)
O exame endoscópico é o método de escolha para o diagnóstico das lesões
causadas pelo refluxo gastroesofágico, permitindo avaliar a gravidade da esofagite e
realizar biópsias onde e quando necessário como nos casos de complicações do
refluxo gastroesofágico (úlceras, estenose péptica e esôfago de Barrett). Deve, pois,
ser considerado em primeiro lugar. O exame endoscópico, embora apresente uma
sensibilidade de cerca de 60%, pela facilidade de sua execução e disponibilidade na
maioria dos centros médicos em nosso meio é o método de escolha para o
diagnóstico das lesões causadas pelo refluxo gastroesofágico. Tem excelente
especificidade de 90-95%.
Sinais mais confiáveis são friabilidade (sangramento fácil, e resulta do
desenvolvimento em resposta ao ácido de capilares alargados perto da superfície
mucosa), granularidade e estrias vermelhas. Conforme mencionado, a maioria dos
pacientes com DRGE é tratado inicialmente com IBPs e SEM ENDOSCOPIA. A

50
exceção importante é o paciente com sintomas de “alarme”: disfagia, odinofagia,
perda de peso e sangramento gastrointestinal. Nesse caso, a ENDOSCOPIA DEVE
SER REALIZADA PRECOCEMENTE para diagnosticar complicações da DRGE
(estenose) e para descartar outras entidades, tais como infecções, úlceras, câncer ou
varizes.
Diretrizes atuais sugerem que o principal papel da endoscopia é diagnosticar e
tratar COMPLICAÇÕES DA DRGE, principalmente estenose péptica e definir
esôfago de Barrett. Usando esse raciocínio, a maioria dos pacientes com DRGE
crônica só precisa de uma endoscopia durante o tratamento.
 Biópsia Esofágica
A biópsia esofágica não deve ser realizada aleatoriamente.
NÃO está indicada em pacientes que se apresentam para realização do exame
endoscópico na fase aguda da esofagite erosiva, sem úlcera, estenose ou suspeita de
metaplasia colunar.
Deve ser realizada em todos os pacientes com úlcera e/ou estenose; Está
indicada em caso de reepitelização com mucosa avermelhada, circunferencial ou não,
com extensão de pelo menos 2 cm, acima do limite das pregas gástricas. Nesse caso,
o diagnóstico endoscópico deve ser anunciado como “sugestivo de esôfago de
Barrett”. Está indicada nos casos de reepitelização com mucosa avermelhada, menor
que 2 cm de extensão. O diagnóstico endoscópico deve ser enunciado como
“sugestivo de epitelização colunar do esôfago distal”.
 Exame Radiológico Contrastado do Esôfago
O exame radiológico, embora seja muito difundido e apresente custo
relativamente baixo, não está indicado na rotina de investigação da DRGE, pois
apresenta baixa sensibilidade, particularmente nos casos de esofagite leve. As
principais informações que o exame radiológico pode oferecer referem-se a avaliação
da anatomia esofágica, como nas lesões estenosantes do esôfago e alterações motoras
pelo achado de ondas terciárias e espasmos do órgão. A indicação do método
radiológico no diagnóstico da DRGE está restrita ao esclarecimento do significado da
disfagia e da odinofagia. O exame radiológico, embora bastante difundido e de custo
relativamente baixo, não é mais tão utilizado como foi no passado porque apresenta
baixa sensibilidade, particularmente em casos de esofagite leve.
 Exame Cintilográfico
O exame cintilográfico apresenta indicações restritas, estando reservado para
casos onde exista suspeita de aspiração pulmonar de conteúdo gástrico, pacientes que
não toleram a pHmetria (pediátricos por exemplo) ou nos casos em que exista
necessidade de se determinar o tempo de esvaziamento gástrico. Sensibilidade bem
inferior a pHmetria e mais indicado para crianças.
 Manometria Esofágica
Principais indicações: Investigação de peristalse ineficiente do esôfago em
pacientes com indicação de tratamento cirúrgico; Determinar a localização precisa do
esfíncter esofágico inferior; Investigar apropriadamente alterações motoras do
esôfago; Avaliar o peristaltismo e alterações do tônus do esfíncter esofágico inferior.
Permite a avaliação da pressão e do relaxamento do EIE, assim como da atividade
peristáltica, incluindo a amplitude, a duração e a velocidade de contração.
Os objetivos do exame de manometria, seguindo a sequência acima, são:
Permitir ao cirurgião considerar a possibilidade da realização de fundoplicatura
parcial; Estabelecer o ponto preciso de instalação do eletrodo de pHmetria, critério
considerado essencial para avaliação do método; Diagnóstico de doenças associadas,

51
como doença do colágeno, espasmo esofágico difuso, “esôfago em quebra-nozes”;
Analisar a falta de resposta adequada ao tratamento clínico ou cirúrgico. Verifica as
pressões.A manometria esofágica geralmente não é indicada na avaliação do paciente
com DRGE SEM COMPLICAÇÃO, porque a maioria deles apresenta uma pressão
de repouso normal do EIE.
 pHmetria Prolongada
Embora considerada como “PADRÃO OURO” para o diagnóstico da DRGE, a
pHmetria é sujeita a críticas, pois tem demonstrado existir variações significativas na
sensibilidade do método. Ainda assim se trata do melhor procedimento para
caracterizar o refluxo gastroesofágico. É colocado um sensor de pH a
aproximadamente 5 cm acima do limite superior do EIE. Idealmente, a posição do
EIE é identificado por esofagomanometria. Durante o dia o paciente realiza suas
atividades normalmente. Por meio da avaliação pHmétrica, é possível quantificar a
intensidade da exposição da mucosa esofágica ao ácido. Permite também que
efetivamente se estabeleça a correlação entre os sintomas relatados pelo paciente e os
episódios de refluxo. O refluxo é considerado patológico quando o pHintra-esofágico
se mantém abaixo de quatro por mais de 4% do tempo total da duração do exame.
Parâmetros convencionalmente medidos incluem percentual do tempo total em que o
pH foi inferior a 4, percentual do tempo, em pé e decúbito dorsal, em que o pH foi
inferior a 4, número total de episódios de refluxo, duração do episódio de refluxo
mais longo, e número de episódios com mais de 5 minutos de duração. Deve ser
suspenso o uso de IBP 1 semana antes da realização desse exame.
Indica-se a realização do exame de pHmetria de 24 horas: Pacientes com
sintomas típicos de DRGE que não apresentam resposta satisfatória ao tratamento
com inibidor da bomba protônica e nos quais o exame endoscópico não revelou dano
à mucosa esofágica. Nesses casos, o exame deve ser realizado na vigência da
medicação; Pacientes com manifestações atípicas extra-esofágicas sem presença de
esofagite. Nesses casos, recomenda-se a realização do exame pHmétrico com dois ou
mais canais sensores de pH para caracterização simultânea do refluxo
gastroesofágico e do refluxo supra-esofágico (laringofaríngeo); Pré-operatório nos
casos bem caracterizados, em que o exame endoscópico não revelou esofagite.
Importante lembrar que a pHmetria prolongada não se presta ao
estabelecimento diagnóstico da esofagite de refluxo; serve apenas para caracterizar o
refluxo propriamente dito. Também não está indicada para o diagnóstico do refluxo
duodenogástrico (frequentemente denominado, de modo inadequado, de “refluxo
alcalino”).
 USG
Para crianças menores de 6 meses com alimentação exclusiva de leite.
 ESOFAGOGRAMA COM BÁRIO
É um exame de esôfago barato, prontamente disponível e não invasivo. É mais
útil para demonstrar estreitamentos anatômicos e avaliar a presença e a redutibilidade
de uma hérnia de hiato. Anéis de Schatzki, membranas ou estenose péptica com
discreto estreitamento só podem ser vistos com um esofagograma, não sendo
percebidos por endoscopia, que pode não distender adequadamente o esôfago. O
esofagograma com bário permite boa avaliação do peristaltismo e é útil, no pré-
operatório, para a identificação de uma bomba esofágica fraca. O refluxo espontâneo
de bário no esôfago proximal é muito ESPECÍFICO para o refluxo, mas não é
sensível.

52
Embora a pHmetria seja o padrão ouro. É a EDA que fornece informações mais
importantes para o manejo da doença, pela detecção imediata de complicações já
existentes e também por identificar a forma erosiva (tratamento e prevenir
complicações) e não erosiva (controle sintomatológico).
 Tratamento
O tratamento da DRGE é PRIMARIAMENTE CLÍNICO, tendo como
componentes principais modificações no estilo de vida e terapia medicamentosa. O
tratamento clínico tem como objetivo o alívio dos sintomas, a cicatrização das lesões
e a prevenção de recidivas e complicações.
 TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO
Modificações no estilo de vida: especialmente úteis em pacientes com queixas
leves e intermitentes; elevar a cabeceira da cama, evitar roupas apertadas e perder
peso pelo mecanismo de estresse abdominal, restringir álcool e tabaco por
diminuírem a pressão do EIE, reduzirem a depuração ácida e prejudicarem as
funções intrínsecas de proteção do epitélio escamoso, mudança na dieta: evitar
gorduras, cítricos, café, bebidas alcoólicas e gasosas, menta, hortelã, molho de
tomate, chocolate e codimentos em excesso (alho, cominho, cebola, pimenta), evitar
deitar após as refeições e evitar lanches antes de dormir, posicionamento em decúbito
lateral esquerdo.

 TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
 Inibidores da bomba de prótons: 1ª escolha na DRGE. Atuam inibindo a
bomba K⁺ /H⁺ ATPase da membrana da célula parietal, diminuindo a secreção de
HCl em 90% e, desta forma, diminui acidez da secreção gástrica refluída ,
contribuindo para a cicatrização da esofagite. O principal efeito adverso é a hipo ou
acloridria estomacal, que favorece osteoporose e fratura de quadril, e não relaciona-
se com risco aumentado de tumor carcinóide ou gastrinoma. A osteoporose ocorre
devido a diminuição da absorção intestinal de Ca2+. Também tem sido relatada a
maior predisposição de infecção entérica no uso prolongado de IBP. Ideal é ser
administrado antes das refeições,deve ser administrado 30min antes das refeições,
horário em que as bombas se encontram com maior grau de atividade. O período de

53
tratamento é de 6-12 semanas. No caso de complicações ou casos refratários deve-se
dobrar a dose do IBP (2 x dia) e tratar por mais 12 semanas.
Omeprazol: 20md/dia  maior interação medicamentosa: aumenta o efeito
anticoagulante. O Esomeprazol é o melhor para esofagite grave (mais usado para
cicatrização da esofagite).
 Bloqueador H2
Os bloqueadores de H2 inibem o receptor de histamina H2 da célula parietal
gástrica, inibindo uma via neuroendócrina que estimula a secreção ácida estomacal
(outros dois são acetilcolina e gastrina). Costumam ser prescritos em doses dobradas
por serem menos eficazes que os IBPs, diminuem a secreção de HCl em 65%. É
eficiente principalmente na inibição da secreção ácida noturna. Duração do
tratamento é de 8-12 semanas. Exemplos: ranitidina, cimetidina, famotidina,
nizatidina.
 Antiácidos: usados somente para alívio imediato da pirose. Não para
tratamento.
 Procinéticos: são adjuvantes na DRGE, usado para aumentar pressão no EIE,
aumenta o clearance esofágico e aumenta o esvaziamento gástrico. Usados de 15-30
min antes das refeições.
 Bromoprida (Digesan): antagonista dopaminérgico D2. Inibe efeito DOPA no plexo
mioentérico, aumenta atividade colinérgica local, aumenta tônus e atividade de TGI.
Usado com 10mg VO. 30 min antes das refeições.
 Metoclopramida (Plasil): antagonista dopaminérgico D2. Inibe efeito DOPA no
plexo mioentérico, aumenta atividade colinérgica local, aumenta tônus e atividade de
TGI. Usado com 10mg VO. 30 min antes das refeições.
 Domperidonav(Motilium): derivado metoclopramida com limitada ação central(ação
periférica), baixas reações adversas. Dose: 10 mg VO.
 Cisaprida (Prepulsid): mais potente procinético- agonista serotoninérgico 5HT3 e
5HT4; aumenta seu efeito colinérgico no plexo mioentérico. Necessária receita
medica.
Deve-se ter em mente que, nos casos de esofagite grau 1 da classificação de
Savary-Miller ou A da classificação de Los Angeles, quando não houver
possibilidade da utilização de IBP por razões financeiras ou de outra natureza, pode
ser considerado o emprego de bloqueador de receptor H2 da histamina (BH2),
empregando-se, preferencialmente, o dobro da dose, administrada duas a quatro
vezes ao dia. O insucesso terapêutico remete o paciente a ser tratado com IBP,
inicialmente em dose plena. Nos casos mais graves, que requerem aumento da dose
de IBP, ela deve ser duplicada, com administração de duas tomadas ao dia antes do
café e do jantar.
Convém mencionar que a adição de um procinético em associação com IBP
não aumenta os índices de cicatrização ou remissão de sintomas, assim, seu emprego
rotineiro não deve ser considerado.

54
 TRATAMENTO CIRÚRGICO
A cirurgia anti-refluxo pode ser convencional ou laparoscópica, ambas
operações de fundoplicatura.
 DRGE não-complicada
Devem ser consideradas as seguintes eventualidades: pacientes que não
respondem satisfatoriamente ao tratamento clínico orientado segundo as etapas
descritas, inclusive aqueles com manifestações atípicas cujo refluxo foi devidamente
comprovado; casos em que é exigido tratamento contínuo de manutenção com
IBP,especialmente em pacientes com menos de 40 anos;impossibilidade financeira
de arcar com os custos do tratamento clínico a longo prazo.
 Intervenção cirúrgica
A intervenção cirúrgica consiste na recolocação do esôfago na cavidade
abdominal,aproximação dos pilares do hilo diafragmático (hiatoplastia) e
envolvimento do esôfago distal pelo fundo gástrico (fundoplicatura). Ambas as
formas de acesso, aberta ou aberta laparoscópica, laparoscópica equivalem-se em
relação ao desaparecimento dos sintomas, em observações realizadas até 3 anos após
a operação. A morbidade e a mortalidade são baixas em ambas, embora os tipos de
complicações sejam diferentes. A médio prazo, não existem diferenças significativas
quanto ao controle efetivo do refluxo nem quanto à qualidade de vida.
Convém mencionar que operações prévias no abdome superior ou formas
complicadas da enfermidade podem inviabilizar a intervenção cirúrgica via
laparoscópica. De toda forma, os resultados das fundoplicaturas são altamente
dependentes da experiência do cirurgião com operações anti-refluxo. Existe, pois,
consenso de que a via de acesso cirúrgico a ser definida deve ser decidida caso acaso,
levando-se em conta a experiência prévia do cirurgião.
Os dois procedimentos mais populares, realizados por laparoscopia através do
abdome, são a fundoplicatura a Nissen de 360 graus e a fundoplicatura parcial de
Toupet.

Impacto na Vida do Paciente


A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é afecção de grande importância
médico-social pela elevada e crescente incidência , e por determinar sintomas de

55
intensidade variável que se manifestam por tempo prolongado, podendo prejudicar a
qualidade de vida das pessoas.
A DRGE, como uma doença crônica, prejudica intensamente a qualidade de
vida. Comparada a outros problemas médicos crônicos, este comprometimento é
semelhante ou ate maior do que artrite, IAM, insuficiência cardíaca ou hipertensão.
Comorbidades associadas à DRGE são comuns e incluem síndromes do intestino
irritável e doenças psiquiátricas em, respectivamente, 36% e 41% dos pacientes.
Essas comorbidades potencializam o efeito negativo sobre a qualidade de vida
observada na DRGE e afetam a resposta ao tratamento com inibidores da bomba de
próton.
Trata-se de uma doença com elevado impacto socioeconômico: elevados custos
diretos com consultas, exames complicados e medicação e custos indiretos, como
aumento das faltas no trabalho e diminuição da produtividade laboral.
Efeitos adversos também promovem diminuição do convívio social.
Comum: alimentação + obesidade + estresse.
 Testes diagnósticos para DRGE
 Testes para refluxo
- Monitoramento do pH intraesofágico (sistema com cateter ou livre de cateter)
- Impedâncio-phmetria ambulatorial (refluxo não ácido)
- Esofagograma com bário
 Testes para avaliar os sintomas
- Teste de supressão ácida
- Monitoramento do pH intraesofágico com análise dos sintomas
 Testes para avaliar os danos esofágicos
- Endoscopia
- Cápsula endoscópica sem fio
- Biópsia esofágica
- Esofagograma com bário
 Testes para avaliar a função esofágica
- Manometria esofágica
- Impedância esofágica
 Sistemas de Classificação Endoscópica para Esofagite
 Classificação Savary-Miller
- Grau 0: Não se aplica.
- Grau I: Lesão única, erosiva ou exsudativa em uma prega longitudinal.
- Grau II: Erosões múltiplas em mais de uma prega longitudinal.
- Grau III: Erosões circunferenciais.
- Grau IV: Úlcera, estenose ou esôfago curto, isolado ou associados aos graus
de I a III.
- Grau V: Esôfago de Barret +/- graus I a III.
 Classificação de Los Angeles
- Grau A: uma ou mais ruptura da mucosa confinada a pregas, menor ou igual a
5 mm.

56
- Grau B: Uma ou mais rupturas da mucosa > 5 mm confinada às pregas, mas
não contínuas entre partes.
- Grau C: Uma ou mais rupturas da mucosa entre partes superiores das pregas
da mucosa, as circunferencial.
- Grau D: Ruptura circunferencial da mucosa.

 Esôfago de Barret
Esôfago de Barret é a condição em que um epitélio colunar anormal
predisposto à malignidade substitui o epitélio escamoso estratificado que
normalmente reveste o esôfago distal.
O esôfago de Barret é consequência da doença do refluxo gastroesofágico
(DRGE) crônica, que danifica o epitélio escamosos do esôfago e faz com que ele
cicatrize por meio de um processo metaplásico em que as células colunares são
substituídas por células escamosos danificadas pelo refluxo. O esôfago de
revestimento colunar não causa sintomas, e a doença têm importância clínica porque
é um fator de risco para adencoarcinomas esofágico.
Esôfago de Barret geralmente é descoberto durante exames endoscópicos
realizados para avaliação de sintomas de DRGE na meia-idade e em adultos mais
velhos.
 Patogênese
A hipótese mais aceita é que a metaplasia aparece quando a DRGE danifica o
epitélio escamoso do esôfago, expondo assim as células multipotenciais do tronco
encefálico nas camadas basais ao suco gástrico, o que estimula sua diferenciação
anormal em células colunares. Dois outros candidatos para as células precursoras de
Barret incluem células-tronco nos ductos das glândulas da submucosa do esôfago e
células-tronco circulante da medula óssea.
Os genes que parecem desempenhar um papel fundamental na metaplasia
escamocolunar do esôfago de Barret incluem certos genes Cdx, conhecidos por
mediar a diferenciação de células do epitélio intestinal, e o gene que codifica a
proteína morfogenética óssea (BMP)-4, que também está envolvido na diferenciação
de células colunares.
 Diagnóstico
Esôfago de Barret é diagnosticado
por exame endoscópico, e dois critérios
devem ser cumpridos.
Primeiro, o endoscopista deve se
certificar de que um epitélio de aparência
colunar reveste esôfago distal. Em segundo
lugar, as amostras de biópsia do epitélio de
aparência colunar devem mostrar
evidências de metaplasia, que é uma
alteração de um tipo de células adulta para
outra. Para verificar que um epitélio de

57
aparência colunar reveste o esôfago distal, o endoscopista deve primeiramente
localizar a junção gastroesofágica (JGE), e só então determinar que o epitélio de
aparência colunar se estende acima da JGE do estômago.
Endoscopicamente, o epitélio colunar tem cor avermelhada e textura aveludada
que podem ser distinguidas facilmente do epitélio escamoso normal do esôfago, que
é claro e brilhante.
A maioria dos estudos publicados sobre esôfago de Barret em usado metaplasia
intestinal como critério de diagnóstico necessário. No entanto, algumas autoridades
afirmam que o epitélio cardíaco do tipo gástrico, que é composto quase
exclusivamente por células secretoras de muco, também é metaplásico, tem
predisposição maligna e pode ser considerado para o diagnóstico de esôfago de
Barret. Esse debate ainda continua sem solução.
O esôfago de Barret ainda pode ser classificado em segmento longo (quando o
epitélio metaplásico se estende por pelo menos 3 cm acima da JGE) ou curto (quando
< 3 cm de epitélio metaplásico reveste o esôfago)
 Tratamento
 Tratamento da DRGE
 Vigilância Endoscópica para displasia – apresenta debates
 Tratamento da Displasia
Devido as dificuldades em verificar o diagnóstico de displasia de baixo grau e
sua baixa taxa de progressão para CA, as terapias invasivas geralmente não são
recomendadas em pacientes com displasia de baixo grau no esôfago de Barret. Para
pacientes que têm alto grau de displasia, há várias opções de tratamento propostas.
Todas essas opções estão associadas com riscos substanciais e benefícios incertos:
esofagectomia, terapias endoscópicas, terapias ablativas endoscópicas e ressecção
endoscópica da mucosa.

58
Problema 3 – Com ou sem molho?
Trato Gastrointestinal
O TGI é um tubo longo que passa através
do corpo. O tubo possui paredes musculares
revestidas com epitélio e é fechado por um
esfíncter de músculo esquelético em cada
extremidade. A função primária do TGI é
transportar nutrientes, água e eletrólitos do meio
externo para o meio interno do corpo.
O trato digestório e os órgãos anexos
constituem o sistema digestório. O trato
digestório é um tubo oco que se estende da
cavidade bucal ao ânus, sendo também chamado
de canal alimentar ou trato gastrointestinal. As
estruturas do trato digestório incluem: boca,
faringe, esôfago, estômago, intestino delgado,
intestino grosso, reto e ânus e suas glândulas
associadas - glândulas salivares, fígado e
pâncreas.
Os órgãos digestório acessórios são os
dentes, a língua, as glândulas salivares, o fígado,
vesícula biliar e o pâncreas. Os dentes auxiliam
no rompimento físico do alimento e a língua auxilia na mastigação e na deglutição.
Os outros órgãos digestórios acessórios, nunca entram em contato direto com o
alimento. Produzem ou armazenam secreções que passam para o trato gastrintestinal
e auxiliam na decomposição química do alimento.
• Tubo digestório alto: boca, faringe, esôfago, estômago e intestino delgado
(duodeno, jejuno e íleo).
• Tubo digestório baixo: intestino grosso (ceco, cólon ascendente, transverso,
descendente, a curva sigmóide, reto e ânus).
• Órgãos anexos: glândulas salivares, dentes, língua, pâncreas, fígado e
vesícula biliar.
 HISTOLOGIA
Todos os componentes do trato digestivo apresentam certas características
estruturais em comum. Trata-se de um tubo oco composto por uma luz, ou lúmen,
cujo diâmetro é variável, circundado por uma parede formada por quatro camadas
distintas: mucosa, submucosa, muscular e serosa.
A camada mucosa é composta por: a) um revestimento epitelial, b) uma lâmina
própria de tecido conjuntivo frouxo rico em vasos sanguíneos e linfáticos e células
musculares lisas, algumas vezes apresentando também glândulas e tecido linfóide, e
c) uma muscular da mucosa, que separa a camada mucosa da submucosa e
geralmente consiste em duas subcamadas delgadas de células musculares lisas, uma
circular interna e outra longitudinal externa.
A camada submucosa é composta por tecido conjuntivo com muitos vasos
sanguíneos e linfáticos e um plexo nervoso submucoso (também denominado plexo
de Meissner). Esta camada pode conter também glândulas e tecido linfóide.

59
A camada muscular contém células musculares lisas orientadas em espiral,
divididas em duas subcamadas, de acordo com a direção principal seguida pelas
células musculares. Na subcamada mais interna (próxima do lúmen), a orientação é
geralmente circular; na subcamada externa, é majoritariamente longitudinal. Entre
estas duas subcamadas observa-se o plexo nervoso mioentérico (ou plexo de
Auerbach) e tecido conjuntivo contendo vasos sanguíneos e linfáticos.
A serosa é uma camada delgada de tecido conjuntivo frouxo, rica em vasos
sanguíneos e linfáticos e tecido adiposo, revestida por um epitélio pavimentoso
simples denominado mesotélio. Na cavidade abdominal, a serosa que reveste os
órgãos é denominada peritônio visceral e está em continuidade com o mesentério.
As principais funções do revestimento epitelial do trato digestivo são: prover
uma barreira seletivamente permeável entre o conteúdo do lúmen e os tecidos do
organismo; facilitar o transporte e a digestão do alimento; promover a absorção dos
produtos desta digestão; produzir hormônios que regulam a atividade do sistema
digestivo. Algumas células presentes nesta camada produzem muco para lubrificação
e proteção.
 Boca
A boca também referida como cavidade oral ou bucal é formada pelas
bochechas (formam as paredes laterais da face e são constituídas externamente por
pele e internamente por mucosa), pelos palatos duro (parede superior) e mole (parede
posterior) e pela língua (importante para o transporte de alimentos, sentido do gosto e
fala). O palato mole se estende posteriormente na cavidade bucal como a úvula, que
é uma estrutura com forma de letra V e que está suspensa na região superior e
posterior da cavidade bucal.
A cavidade da boca é onde o alimento é ingerido e preparado para a digestão
no estômago e intestino delgado. O alimento é mastigado pelos dentes, e a saliva,
proveniente das glândulas salivares, facilita a formação de um bolo alimentar
controlável. A deglutição é iniciada voluntariamente na cavidade da boca. A fase
voluntária do processo empurra o bolo da cavidade da boca para a faringe – a parte
expandida do trato digestório – onde ocorra a fase automática da deglutição.
 Histologia: A cavidade oral é revestida por um epitélio pavimentoso
estratificado, corneificado ou não corneificado, dependendo da região. A camada
córnea protege a mucosa oral de agressões mecânicas durante a mastigação e pode
ser observada na gengiva e no palato duro. A lâmina própria nestas regiões possui
várias papilas e repousa diretamente sobre o periósteo. Epitélio pavimentoso não
corneificado reveste o palato mole, lábios, bochechas e o assoalho da boca.
Os dentes são estruturas cônicas, duras, fixadas nos alvéolos da mandíbula e
maxila que são usados na mastigação e na assistência à fala.
Crianças têm 20 dentes decíduos (primários ou de
leite). Adultos normalmente possuem
32 dentes secundários.
 Língua
A língua é o principal órgão do
sentido do gosto e um importante
órgão da fala, além de auxiliar na
mastigação e deglutição dos
alimentos. Localiza-se no assoalho
da boca, dentro da curva do corpo da
mandíbula. Nos 2/3 anteriores do
dorso da língua encontramos as

60
papilas linguais. Já no 1/3 posterior encontramos numerosas glândulas mucosas e
folículos linfáticos (tonsila lingual). Os tipos de papilas são: papilas valadas,
fungiformes, filiformes e simples.
 Glândulas salivares
Parótidas, submandibulares e sublingual secretam a saliva. A saliva é um
líquido hiposmótico complexo secretado pelas glândulas salivares da cavidade oral.
Os componentes da saliva incluem água, íons, muco e proteínas, como enzimas
(lizosima-destrói bactérias) e imunoglobulinas (inativa bactérias e vírus). A saliva é
levemente básica, com pH entre 6 e 7 e a secreção salivar é controlada pelo sistema
nervoso autônomo, sendo que o parassimpático estimula a secreção. As glândulas
parótidas secretam principalmente uma secreção formada por alfa-amilase (inicia
digestão do amido), enquanto as glândulas submandibulares e sublinguais secretam
substância serosa e mucosa (composta por mucina), sendo o muco usado para
lubrificar a cavidade oral e unir as partículas alimentares, formando um bolo que será
deglutido. A saliva umedece, lubrifica e inicia a digestão através das enzimas amilase
(ou ptialina) e lipase, que atuam sobre os carboidratos e os lipídios, respectivamente.
A função final da saliva é proteção por meio da lisozima e imunoglobulinas. Secreta
pequena quantidade de lipase salivar.
 Faringe
A faringe é um tubo que se estende da boca até o esôfago. A faringe apresenta
suas paredes muito espessas devido ao volume dos músculos que a revestem
externamente, por dentro, o órgão é forrado pela mucosa faríngea, um epitélio liso,
que facilita a rápida passagem do alimento.
O movimento do alimento, da boca para o estômago, é realizado pelo ato da
deglutição. A deglutição é facilitada pela saliva e muco e envolve a boca, a faringe e
o esôfago. A faringe pode ainda ser dividida em três partes: nasal (nasofaringe), oral
(orofaringe) e laríngea (laringofaringe). A faringe comunica-se com as vias nasal,
respiratória e digestória. Durante a deglutição, o palato mole move-se em direção a
abertura da parte nasal da faringe; a abertura da laringe é fechada quando a traquéia
move-se para cima e permite a uma prega de tecido, chamada de epiglote, cubra a
entrada da via respiratória.
 Histologia: A faringe é revestida por epitélio pavimentoso estratificado não
corneificado na região contínua ao esôfago e por epitélio pseudo-estratificado
cilíndrico ciliado contendo células caliciformes nas regiões próximas à cavidade
nasal. A faringe contém as tonsilas. A mucosa da faringe também possui muitas
glândulas salivares menores de secreção mucosa em sua lâmina própria, composta de
tecido conjuntivo. Há ainda, no tecido conjuntivo subjacente, glândulas mucosas, que
produzem muco lubrificante.
 Esôfago
O esôfago é um tubo muscular (com aproximadamente 25 cm de comprimento)
com um diâmetro médio de 2 cm que se estende da faringe (parte laríngea da
faringe), passa através do mediastino, atravessa o diafragma e termina no estômago
(entrando pelo ostio cárdico). A presença de alimento no interior do esôfago estimula
a atividade peristáltica, e faz com que o alimento mova-se para o estômago.
 Histologia: O esôfago é um tubo muscular cuja função é transportar o
alimento da boca para o estômago. É revestido por um epitélio pavimentoso
estratificado não corneificado. De forma geral, o esôfago possui as mesmas camadas
que o resto do trato digestivo. Na submucosa existem grupos de pequenas glândulas
secretoras de muco, as glândulas esofágicas, cuja secreção facilita o transporte de

61
alimento e protege a mucosa. Na lâmina própria da região próxima do estômago
existem grupos de glândulas, as glândulas esofágicas da cárdia, que também
secretam muco. Na porção distal do esôfago a camada muscular consiste
exclusivamente em células musculares lisas; na porção média, uma mistura de
musculatura lisa e estriada esquelética; na porção proximal, apenas fibras musculares
estriadas esqueléticas. Apenas a parte do esôfago que está na cavidade peritoneal é
recoberta por uma membrana serosa. O restante é envolvido por uma camada de
tecido conjuntivo, a adventícia, que se mistura com o tecido conjuntivo circundante.
 Estômago
É a parte expandida entre o esôfago e o intestino delgado, tem formato de J e
esta imediatamente abaixo do diafragma, anteriormente ao pâncreas, superiormente
ao duodeno e a esquerda do fígado. O estômago está localizado no quadrante
superior esquerdo do abdome, entre o fígado e o baço. A cavidade gástrica é dotada
de dois orifícios: a cárdia, que corresponde à desembocadura do esôfago, e o piloro,
que corresponde à comunicação com o duodeno. O estômago é classicamente
dividido em três partes: o fundo, que é a parte situada cranialmente ao plano
horizontal que passa pela cárdia; o corpo, que é a parte imediatamente distal ao
fundo, com forma aproximada à de um cone truncado com a base para cima e o eixo
ligeiramente oblíquo da esquerda para a direita; e o antro, um canal
aproximadamente cilíndrico cujo eixo se orienta para a direita, para trás e para o alto,
terminando no piloro. O estômago têm sua posição determinada por fixação ao nível
da cárdia e do piloro. O esvaziamento intermitente do estômago ocorre quando a
pressão intragástrica supera a resistência do músculo esfíncter do piloro. O piloro
guarda o ostio pilórico; sua parede é mais grossa porque contém mais músculo liso
circular. A camada média da túnica muscular é mais espessa para formar o músculo
esfíncter pilórico. O piloro normalmente está em contração tônica.
 Histologia: O estômago, similarmente ao intestino delgado, é um órgão que
exerce funções exócrinas e endócrinas, digerindo alimento e secretando hormônios.
Trata-se de um segmento dilatado do trato digestivo, cujas funções principais são
continuar a digestão de carboidratos iniciada na boca, adicionar um fluido ácido ao
alimento ingerido, transformar este bolo alimentar em uma massa viscosa (quimo)
por meio da atividade muscular e promover a digestão inicial de proteínas por meio
da enzima pepsina. Também produz uma lipase gástrica que digere triglicerídeos
com o auxílio da lipase lingual.
No estômago são identificadas quatro regiões: cárdia, fundo, corpo e piloro. As
regiões do fundo e corpo possuem estrutura microscópica idêntica e, portanto,
histologicamente apenas três regiões são consideradas.
As camadas mucosa e submucosa do estômago não distendido repousam sobre
dobras direcionadas longitudinalmente. Quando o estômago está distendido devido à
presença de alimento, estas dobras se achatam.
A mucosa gástrica (tecido epitelial+lâmina própria+muscular da mucosa) é
revestida por um epitélio que sofre invaginações em direção à lâmina própria,
formando as fossetas gástricas. Nestas fossetas desemboca a secreção de glândulas
tubulares ramificadas características de cada região do estômago (da cárdia, fúndicas
e pilóricas). Separando a mucosa da submucosa adjacente existe uma camada de
músculo liso, a muscular da mucosa.
O epitélio que recobre a superfície do estômago e reveste as fossetas é colunar
simples, e todas as células secretam um muco alcalino. Junções de oclusão entre as
células superficiais e da fosseta também participam da barreira de proteção contra o
ácido.

62
Assim como o ácido hidroclorídrico (HCl), a pepsina e as lipases (lingual e
gástrica) também devem ser consideradas como fatores endógenos de agressão à
mucosa de revestimento do estômago. A submucosa é composta por tecido
conjuntivo denso contendo vasos sanguíneos e linfáticos; além das células
usualmente encontradas no tecido conjuntivo, está infiltrada por células linfóides e
macrófagos. A camada muscular é composta por fibras musculares lisas orientadas
nem três direções principais. A camada externa é longitudinal, a média é circular e a
interna é oblíqua. No piloro, a camada média encontra-se muito mais espessa para
formar o esfíncter pilórico. O estômago é revestido por umamembrana serosa
delgada.
 Funções Digestivas: Digestão do alimento; Secreção do suco gástrico, que
inclui enzimas digestórias e ácido hidroclorídrico como substâncias mais
importantes; Secreção de hormônio gástrico e fator intrínseco; Regulação do padrão
no qual o alimento é parcialmente digerido e entregue ao intestino delgado; Absorção
de pequenas quantidades de água e substâncias dissolvidas.
 Células do Estômago
 Células parietais ou oxínticas (encontradas principalmente no fundo
gástrico): o processo inicia quando o H⁺ proveniente da água de dentro das células
parietais é bombeado para o lúmen do estômago por uma H⁺-K⁺-ATPase em troca
por K⁺ que entra na célula. O Cl então segue o H⁺ através de um canal de cloreto de
vazamento, resultando em secreção de HCl pela célula. Essas células também
secretam fator intrínseco que forma complexos com a vitamina B12 e é essencial
para absorção desta vitamina no intestino.
Células parietais secretam ácido clorídrico 0,16 mol/L (na verdade, H+ e Cl);
cloreto de potássio, 0,07 mol/L; traços de outros eletrólitos e fator gástrico intrínseco.
O íon H⁺ origina-se da dissociação do H2CO3 (ácido carbônico) produzido pela ação
da enzima anidrase carbônica, uma enzima abundante nas células parietais. Uma vez
produzido, o H2C03 se dissocia no citoplasma, formando H⁺ e HCO3. A célula ativa
também secreta KCl no canalículo, que se dissocia em K⁺ e Cl ; o K⁺ é trocado por
H⁺ pela ação da bomba H⁺/K⁺ enquanto o Cl forma HCl.
 Células principais ou zimogênica: secretam a enzima inativada
pepsinogênio. E este por ação do H⁺ é ativado em pepsina (digestão inicial de
proteínas).
 Células semelhantes as enterocromafins (ECL): secretam histamina que
estimula a secreção ácida.
 Células mucosas do colo das glândulas gástricas: secretam muco.

63
Somatostatina inibe a gastrina.
1. Em um reflexo cefálico, os
neurônios parassimpáticos do nervo
vago estimulam as células G a
liberarem gastrina no sangue. A
presença de aminoácidos ou peptídeos
nos lúmens dispara um reflexo curto
para a liberação de gastrina.
2. A gastrina, por sua vez,
promove a liberação de ácido, tanto
direta quanto indiretamente,
estimulando a liberação da histamina.
3. A histamina é liberada pelas
células ECL em resposta a gastrina e a
acetilcolina do SNE. A histamina
difunde-se para seus alvos, as células
parietais, e estimula a secreção ácida
combinando-se com receptores H2 nas
células parietais.
4. O ácido no lúmen do estômago
estimula a liberação do pepsinogênio pelas células principais por um reflexo curto.
No lúmen, o ácido converte pepsinogênio em pepsina e inicia a digestão de proteínas.
5. O ácido também desencadeia a liberação de somatostatina pelas células D. A
somatostatina atua via retroalimentação negativa para inibir a secreção de ácido
gástrico, da gastrina, da histamina e do pepsinogênio.
 Intestino delgado
A principal parte da digestão ocorre no intestino delgado, que se estende do
piloro até a junção iliocólica (ileocecal), que se reúne com o intestino grosso. Os
principais eventos da digestão e absorção ocorrem no intestino delgado, portanto sua
estrutura é especialmente adaptada para essa função. Sua extensão fornece grande
área de superfície para a digestão e absorção, sendo ainda muito aumentada pelas
pregas circulares, vilosidades e microvilosidades.
O intestino delgado retirado numa é de cerca de 7 metros de comprimento,
podendo variar entre 5 e 8 metros (o comprimento de intestino delgado e grosso em
conjunto após a morte é de 9 metros).
O intestino delgado, que consiste em duodeno, jejuno e íleo, estende-se do
piloro até a junção ileocecal onde o íleo une-se ao ceco, a primeira parte do intestino
grosso.
 Duodeno: é a primeira porção do intestino delgado. Recebe este nome por
ter seu comprimento aproximadamente igual à largura de doze dedos (25
centímetros). É a única porção do intestino delgado que é fixa, é a porção mais curta
e mais larga. Apresenta 4 partes: Parte Superior ou 1ª porção; Parte Descendente ou
2ª porção (abertura do ducto colédoco e pancreático na papila maior do duodeno);
Parte Horizontal ou 3ª porção; Parte Ascendente ou 4ª porção.
 Jejuno: é a parte do intestino delgado que faz continuação ao duodeno,
recebe este nome porque sempre que é aberto se apresenta vazio. É mais largo

64
(aproximadamente 4 centímetros), sua parede é mais espessa, mais vascular e de cor
mais forte que o íleo.
 Íleo: é o último segmento do intestino delgado que faz continuação ao
jejuno. Recebe este nome por relação com osso ilíaco. É mais estreito e suas túnicas
são mais finas e menos vascularizadas que o jejuno. Distalmente, o íleo desemboca
no intestino grosso num orifício que recebe o nome de óstio ileocecal.
A maior parte do jejuno situa-se no quadrante superior esquerdo, enquanto a
maior parte do íleo situa-se no quadrante inferior direito. O jejuno e o íleo, ao
contrário do duodeno, são móveis.
 Histologia: A mucosa do intestino delgado apresenta várias estruturas que
aumentam sua superfície, aumentando assim a área disponível para absorção de
nutrientes. Quando observado a olho nu, o revestimento do intestino delgado
apresenta uma série de pregas permanentes, plicae circularis (válvulas de
Kerckring), em forma semilunar, circular ou espiral, que consistem em dobras da
mucosa e submucosa. Estas pregas são mais desenvolvidas no jejuno e, embora
estejam frequentemente presentes no duodeno e íleo, não são características destes
órgãos. Já as vilosidades intestinais ou vilos são projeções alongadas da mucosa
(epitélio e lâmina própria) com cerca de 0,5-1,5 mm de comprimento, em direção ao
hímen do intestino delgado. Entre os vilos existem pequenas aberturas de glândulas
tubulares simples denominadas glândulas intestinais (também chamadas de criptas),
ou glândulas de Lieberkühn.
A presença de pregas, vilosidades e microvilosidades aumenta muito a
superfície de revestimento intestinal - uma característica importante num órgão onde
a absorção ocorre tão intensamente. O epitélio de revestimento dos vilos é do tipo
cilíndrico simples. A lâmina própria do intestino delgado é composta por tecido
conjuntivo frouxo com vasos sanguíneos e linfáticos, fibras nervosas e fibras
musculares lisas. A muscular da mucosa não apresenta qualquer peculiaridade neste
órgão. A submucosa contém, na porção inicial do duodeno, grupos de glândulas
tubulares enoveladas ramificadas que se abrem nas glândulas intestinais. Estas são as
glândulas duodenais, cujas células secretam muco alcalino que protegem a mucosa
do intestino delgado do bolo alimentar acido que vem do estômago.
* A lâmina própria e a submucosa do intestino delgado contêm agregados
de nódulos linfoides (GALT), conhecidos como placas de Peyer.
* Segundo a DEE é na mucosa.
Células caliciformes estão distribuídas entre as células absortivas. Elas são
menos abundantes no duodeno e aumentam em número em direção ao íleo. Estas
células produzem glicoproteínas ácidas do tipo mucina que são hidratadas e formam
ligações cruzadas entre si para originar o muco, cuja função principal é proteger e
lubrificar o revestimento do intestino.
No intestino ocorre secreção de secretina, CCK, peptídeo inibidor gástrico
(GIP), peptídeo semelhante ao glucagon (GLP 1).
 GUYTON
 Fases da Secreção Gástrica
Diz-se que a secreção gástrica se dá em 3 “fases”: a fase cefálica, a fase
gástrica e a fase intestinal.

65
 Fase Cefálica
A fase cefálica de secreção gástrica ocorre, até mesmo, antes do alimento
entrar no estômago, enquanto está sendo ingerido. Resulta da visão, do odor, da
lembrança ou do sabor do alimento, e, quanto maior o apetite, mais intensa é a
estimulação. Sinais neurogênicos que causam a fase cefálica se originam no córtex
cerebral e nos centros do apetite na amígdala e no hipotálamo. São transmitidos pelos
núcleos motores dorsais dos vagos e pelos nervos vago até o estômago. Essa fase da
secreção, normalmente, contribui com cerca de 30% da secreção gástrica, associada à
ingestão da refeição.
 Fase Gástrica
O alimento que entra no estômago excita (1) os reflexos longos vasovagais do
estômago para o cérebro e de volta ao estômago, (2) os reflexos entéricos locais e (3)
o mecanismo da gastrina; todos levando à secreção de suco gástrico durante várias
horas, enquanto o alimento permanece no estômago. A fase gástrica da secreção
contribui com cerca de 60% da secreção gástrica total associada à ingestão da
refeição e, portanto, é responsável pela maior parte da secreção gástrica diária, de
cerca de 1.500 mililitros.
 Fase Intestinal
A presença de alimento na porção superior do intestino delgado, em especial
no duodeno, continuará a causar secreção gástrica de pequena quantidade de suco
gástrico, provavelmente devido a pequenas quantidades de gastrina liberadas pela
mucosa duodenal. Isso representa cerca de 10% da resposta de ácido à refeição.

Doenças Pépticas Gastroduodenais


 GASTRITE
O termo gastrite deve ficar reservado à inflamação da mucosa gástrica
documentada histologicamente. É a inflamação da mucosa gástrica documentada

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histologicamente com a presença de infiltrado leucocitário inflamatório na mucosa
do estômago.
Gastrite não é o eritema da mucosa
observado durante a endoscopia e não é
sinônimo de “dispepsia”.
Os fatores etiológicos que resultam
em gastrite são amplos e heterogêneos. A
gastrite tem sido classificada com base na
evolução temporal (aguda e crônica), nas
características histológicas e na
distribuição anatômica ou no mecanismo
patogênico proposto.
A correlação entre os achados
histológicos de gastrite, o quadro clínico
de dor abdominal ou dispepsia e os
achados endoscópicos assinalados pela
inspeção macroscópica da mucosa gástrica
é precária. Pode ou não ocorrer alterações
endoscópicas. PORTANTO, NÃO EXISTE UMA MANIFESTAÇÃO CLÍNICA
TÍPICA DE GASTRITE.
 Gastrite aguda
A gastrite aguda é um processo inflamatório transitório da mucosa que pode ser
assintomático ou provocar graus variáveis de dor epigástrica, náuseas e vômitos. Em
casos mais graves pode haver erosão da mucosa, ulceração, hemorragia,
hematêmese, melena ou, raramente, perda maciça de sangue.
As causas mais comuns de gastrite aguda são infecciosas. A infecção aguda por
H. pylori induz gastrite. É relatada como manifestações de inicio súbito de dor
epigástrica, náuseas e vômitos, e alguns estudos histológicos da mucosa, embora
limitados, mostraram um acentuado infiltrado de neutrófilos com edema e hiperemia.
Se não for tratado esse quadro evoluirá para gastrite crônica.
As gastrites infecciosas podem ser causadas por CMV, herpes simples. A
infecção bacteriana do estômago ou gastrite flegmonosa pode ser causada por
estreptococos, Escherichia coli, estafilococos.
Com danos à mucosa mais graves, a erosão, ou perda do epitélio superficial,
pode ocorrer, levando à formação de infiltrados neutrofílicos nas mucosas e
exsudatos purulentos. Também pode ocorrer hemorragia, que se manifesta como
pontos escuros em mucosa hiperêmica em outros aspectos. A presença concomitante
de erosão e hemorragia é denominada gastrite hemorrágica erosiva aguda.
 Gastrite crônica
Identificada histologicamente por um infiltrado de células inflamatórias que
consiste principalmente em linfócitos e plasmócitos, com pouco neutrófilos. A
distribuição da inflamação pode ser desigual e irregular, acometendo inicialmente as
porções superficiais e glandulares da mucosa gástrica. Esse quadro pode progredir
para uma destruição glandular mais acentuada, com atrofia e metaplasia. A gastrite
crônica tem sido classificada de acordo com as características histológicas, que
incluem alterações atróficas superficiais e atrofia gástrica.
A fase inicial da gastrite crônica é representada por uma GASTRITE
SUPERFICIAL. As alterações inflamatórias se limitam a lâmina própria da mucosa
superficial, com edema e infiltrados celulares que separam glândulas gástricas
intactas.

67
O estágio seguinte é a GASTRITE ATRÓFICA. O infiltrado inflamatório se
estende mais profundamente para dentro da mucosa, com distorção progressiva e
destruição das glândulas.
O estágio final da gastrite crônica é a ATROFIA GÁSTRICA. As estruturas
glandulares são perdidas e existe escassez de infiltrados inflamatórios. Ao exame
endoscópico, a mucosa pode mostrar-se substancialmente fina. Pode ocorrer
metaplasia, com substituição do tecido gástrico por duodenal com células
caliciformes, um importante fator de risco para CA gástrico.
 Classificação
A classificação é feita de acordo com local predominante de acometimento:
 Gastrite tipo A: a menos comum das duas formas , acomete
principalmente o fundo e o corpo, com preservação antral. Essa forma esta associada
à anemia perniciosa na presença de anticorpos circulantes contra as células parietais,
por causa disso, é também denominada GASTRITE AUTOIMUNE. Esses
anticorpos atacam a bomba H⁺/K⁺ ATPase das células parietais e fator intrínseco,
que também são atacadas por linfócitos. Esse tipo esta associado com gastrite
atrófica. Com a destruição das células parietais ocorrerá acloridria, que estimula a
produção de gastrina pelas células G, resultando em hipergastrinemia. Pode gerar
hiperplasia de células semelhantes a enterocromafins e tumores carcinóides gástricos
devido efeito trófico da gastrina.
 Gastrite tipo B: é a forma mais comum e predomínio antral. A infecção
por H. pylori é a causa dessa entidade. Apesar de descrita como “antral
predominante” pode ocorrer progressão do processo inflamatório para o corpo e
fundo dos indivíduos infectados. A conversão para uma pangastrite depende do
tempo-estimado em 15 a 20 anos. Sua incidência aumenta com a idade, e esta
presente em até 100% das pessoas de mais de 70 anos. Infecção pelo H. pylori 
inflamação  atrofia gástrica  metaplasia  adenocarcinoma gastrico. H. pylori é
o principal fator de risco para CA gástrico, ele aumenta o risco em 3-4 vezes, pode
causar linfoma de células B, linfoma gástrico MALT.
 Gastrite tipo C: etiologia não definida.
 Fisiopatologia
Múltiplos mecanismos evoluíram para proteger a mucosa gástrica. A mucina
secretada pelas células foveolares da superfície forma uma camada fina de muco que
impede que as partículas de alimentos toquem diretamente o epitélio. A camada de
muco também promove a formação de uma camada “imperturbável” de líquido sobre
o epitélio que protege a mucosa e tem pH neutro como resultado de secreção de íon
de bicarbonato por células epiteliais da superfície. Finalmente, o rico suprimento
vascular para a mucosa gástrica fornece oxigênio, bicarbonato e nutrientes, enquanto
lava o ácido que difundiu de volta em direção à lâmina própria.
A gastrite aguda ou crônica pode ocorrer depois da ruptura de qualquer um
desses mecanismos de proteção. Por exemplo, síntese reduzida de mucina em idosos
é sugerida como um fator que explica a sua maior suscetibilidade à gastrite.
Fármacos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) podem interferir na citoproteção
normalmente fornecida por prostaglandinas ou reduzir a secreção de bicarbonato,
sendo que ambos aumentam a suscetibilidade da mucosa gástrica a lesões. A ingestão
de substâncias químicas hostis, principalmente ácidos ou bases, acidentalmente ou
como tentativa de suicídio, também resulta em lesão gástrica grave,
predominantemente como consequência de danos diretos às células epiteliais e

68
estromais da mucosa. A lesão celular direta também está implicada na gastrite devido
ao consumo excessivo de álcool, AINE, radioterapia e quimioterapia.
 Quadro Clínico Geral
Dor epigástrica súbita, náuseas e vômitos, dispepsia, pirose, enchimento pós
prandial (sintomas principalmente após alimentação). Também pode ocorrer anemia,
perda de peso. 85% dos casos é assintomático.
 Tratamento
O tratamento na gastrite crônica é dirigido às sequelas e não à inflamação
subjacente. Os pacientes com anemia perniciosa necessitarão de suplementação
parenteral de vitamina B12 a longo prazo. A erradicação de H. pylori não é
recomendada como rotina, a não ser quando existe uma DUP ou linfoma MALT de
baixo grau.

 DUODENITE
A duodenite consiste numa inflamação do duodeno (porção inicial do intestino
delgado), que pode ser aguda ou crônica. A localização mais frequente é a primeira
porção do duodeno, a nível do bulbo duodenal. O termo duodenite é frequentemente
utilizado para designar determinadas alterações macroscópicas da mucosa duodenal
observadas durante a endoscopia digestiva alta, como eritema, hemorragias
subepiteliais e erosões. Contudo, para um diagnóstico preciso, os patologistas
consideram necessário demonstrar histologicamente (através do estudo anatomo-
patológico de tecido biopsiado das lesões suspeitas) a inflamação.
 Etiologia
São diversas as causas possíveis de duodenite, como infecções, sobretudo a
infecção crônica a Helicobacter pylori, estados de hipersecreção ácida pelo
estômago, alguns medicamentos (especialmente os anti-inflamatórios não
esteroides), álcool, stress e devido a uma doença grave ou a uma cirurgia prévia.
Outras causas menos frequentes incluem a ingestão cáustica e a radiação.
Em alguns doentes com duodenite, verifica-se um esvaziamento gástrico
acelerado. Tal não se observa em todos os doentes e não se sabe o papel deste
fenômeno no desenvolvimento da duodenite. De referir também que alguns autores
acreditam que o stress emocional poderá ter um papel no desenvolvimento desta
doença, apesar de tal não estar ainda demonstrado cientificamente.
 Fisiopatologia
A reação inflamatória na maioria dos casos desenvolve-se gradualmente,
dependendo da causa principal e da existência ou não de fatores agravantes, como o
consumo de bebidas alcoólicas em quantidade excessiva e/ou durante um período
prolongado de tempo. A evolução é variável. Enquanto que alguns doentes a
duodenite evolui para úlcera duodenal, com potencial desenvolvimento de
complicações como perfuração, noutros a situação permanece estável ao longo da
vida sem causar qualquer problema ou sintoma.
 Quadro Clínico
O quadro clínico de duodenite inclui sintomas inespecíficos como sensação de
enfartamento pós-prandial (após as refeições), náuseas, anorexia (falta de apetite),
soluços e desconforto abdominal. Este conjunto de manifestações clínicas pode ser
designado por dispepsia. Contudo, um número significativo dos doentes não possui
qualquer sintoma, e muitos nem sabem que possuem duodenite.
Os doentes podem apresentar ainda outras manifestações clínicas, como
episódios de dor abdominal, geralmente ligeira e com períodos de remissão de

69
duração variável. Alguns doentes possuem sintomas de maior gravidade, como
hematemeses, ou seja, vômitos de conteúdo hemático (hemorragia digestiva alta).
Além disso, em caso da duodenite evoluir para uma situação de úlcera duodenal,
podem surgir outros problemas para além das complicações hemorrágicas, como a
perfuração de úlcera e a obstrução do lúmen intestinal.
A perfuração de úlcera quando ocorre dá frequentemente origem a uma dor
abdominal intensa acompanhada por rigidez muscular abdominal, hipotensão e
taquicardia (frequência cardíaca aumentada, superior a 100 batimentos por minuto).
A obstrução manifesta-se por náuseas, vômitos, dor e sensação de enfartamento
abdominais e anorexia (diminuição do apetite).
 Tratamento
Não está recomendado nenhum tratamento específico para a duodenite. Este
consiste no alívio das manifestações clínicas (apenas nos indivíduos sintomáticos) e
na adoção de medidas gerais (indivíduos sintomáticos e assintomáticos). O doente
pode ser medicado com fármacos como os antiácidos, para tomar apenas quando
estão presentes sintomas e não de forma crônica. Não está demonstrado que ocorra
benefício clínico com a erradicação de Helicobacter pylori do organismo, pois apesar
desta infecção estar associada ao desenvolvimento de duodenite, não existe uma
relação clara entre a presença de infecção e os sintomas.

 DOENÇA ULCEROSA PÉPTICA (DUP): ÚLCERA


GÁSTRICA (UG) E ÚLCERA DUODENAL (UD)
Úlceras gástricas e duodenais geralmente ocorrem em uma área de mucosa
inflamada. Esta inflamação, denominada gastrite, duodenite ou bulboduodenite.
Uma úlcera é definida como a ruptura da integridade mucosa do estômago e/ou
duodeno que resulta em um defeito local ou uma escavação em virtude de inflamação
ativa. As úlceras ocorrem dentro do estômago e/ou duodeno e, na maioria das vezes,
são de natureza crônica.
Uma úlcera péptica é uma falha na mucosa com um diâmetro de pelo menos
0,5 cm (≥0,5cm) que penetra na muscular da mucosa (vai ate submucosa). Falhas
menores da mucosa são chamadas de erosões.
 Epidemiologia
Em países ocidentais, úlceras duodenais ocorrem mais frequentemente do que
úlceras gástricas. A idade predominante na qual a úlcera duodenal ocorre é entre 20 e
50 anos, enquanto que a úlcera gástrica ocorre mais comumente em pacientes com
mais de 40 anos de idade (incidência máxima na sexta década). A incidência de
doença ulcerosa gastroduodenal é de aproximadamente 1 a 2 por 1.000 habitantes por
ano.
Dois terços dos pacientes com úlcera são homens, e a doença é mais comum
em fumantes. O risco de recorrência da doença após a cura inicial é alto; mais de
50% dos pacientes têm úlcera recorrente dentro dos 12 meses de cura na ausência de
tratamento.
 Fatores de risco
Infecção por H. pylori, aspirina e AINEs, tabagismo.
 Fisiopatologia
 Úlcera duodenal
Ocorre principalmente por infecção por H. pylori gástrico e AINEs.
 H. pylori

70
A infecção crônica da mucosa gástrica do antro inibe a produção de
somatostatina pelas células D. A perda, pelo menos parcial, deste inibidor gera uma
hipergastrinemia leve à moderada e, consequentemente uma hipercloridria. Isso faz
com que o duodeno passe a receber uma carga ácida maior, o que por sua vez, induz
a formação de uma metaplasia gástrica no bulbo duodenal, ou seja, ocorre o
desenvolvimento de um epitélio tipo gástrico no duodeno, que normalmente tem
epitélio intestinal. Isso permite que o H. pylori passe a colonizar o duodeno, nas ilhas
de metaplasia gástrica, provocando duodenite e depois úlcera. Além disso, a bactéria
diminui acentuadamente a secreção de bicarbonato duodenal, o que reduz essa
barreira protetora, favorecendo o desenvolvimento da úlcera.
 AINEs
A inibição da COX 1 (citoproteção gástrica) inibe a produção de
prostaglandinas que são essenciais para manutenção da integridade e reparo da
mucosa gastrointestinal. A adesão de neutrófilos na microcirculação gástrica
desempenha um papel essencial para o início da lesão da mucosa desencadeada pelos
AINEs, que geram isquemia. Além disso, pode ocorrer: encarceramento do AINE
dentro da célula epitelial gerando lesão, diminuição da produção de muco e permite
difusão de H⁺ e pepsina nas células epiteliais, gerando danos e favorecendo úlceras.
São responsáveis por 5-10% das UD e 20-30% das UG.
 Úlceras gástricas
 Tipo I ou úlcera de pequena curvatura: 55-60% dos casos, associada a
normo ou hipocloridria, com gastrite atrófica do corpo gástrico. Patogenia: não
esclarecida, parece estar relacionada com grande proliferação bacteriana na junção
corpo/antro. A lesão à mucosa pelas bactérias a deixaria extremamente sensível ao
HCl e pepsina, mesmo em hipocloridria.
 O tipo IV ou úlcera de pequena curvatura (cardia), parte alta, próximo a
junção gastroesofágica teria o mesmo mecanismo da tipo I.
 Tipo II ou úlcera de corpo gástrico associada à UD ou tipo III ou úlcera pré-
pilórica (3 cm do piloro). Patogênese: semelhante à UD e possuem relação direta
com hipercloridria.
 Fatores não relacionados com H. pylori e AINEs que causam DUP:
 Tabagismo: aumento da produção de radicais livres, diminuição de
bicarbonato e aumenta o risco de infecção por H. pylori associado à diminuição de
cicatrização, diminui resposta ao tratamento e aumenta complicação (perfuração).
 Predisposição genética: parentes de 1º grau com UD tem 3 X maior risco
de desenvolve-la.
 Grupo sanguíneo O
 Drogas ilícitas e medicação (bifosfanatos)
 Radioterapia
 Doença: doença pulmonar crônica, IRC, cirrose, nefrolitíase, deficiência
de alfa-1-antitripsina, mastocitose sistêmica (aumenta produção e liberação de
histamina).
Estresse metabólico: independente de H. pylori. Associado a pós- operatório,
queimaduras, traumas, sepse, lesão encefálica, insuficiência de múltiplos órgãos.
 Quadro Clínico
A diferença dos sintomas não é confiável para ver a localização anatômica da
úlcera.
 UD: dor epigástrica, em queimação ou corrosiva- sensação mais definida ou
dor “de fome”. Na UD ocorre de 90 min à 3h antes refeição, é aliviada com
antiácidos e alimentação. O sintoma mais distintivo da UD é que a dor acorda o

71
paciente a noite entre 00:00-03:00h- coincide com o pico de secreção ácida por ação
vagal.
 UG: dor epigástrica, também em queimação ou corrosiva. Distingue-se da
dor da UD porque ela é desencadeada pelo alimento. Além disso, náuseas e perda de
peso é mais associada a UG.
 Mecanismo da dor: ativação de receptores químicos duodenais pelo ácido,
sensibilização duodenal exagerada aos ácidos biliares e pepsina ao motilidade
gastroduodenal alterada.

 Síndrome dispéptica ou dispepsia


Apenas 20-30% dos pacientes com úlcera duodenal ou gástrica apresentam.
Síndrome clínica da DUP, gástrica ou duodenal. Dor ou desconforto epigástrico mais
azia (queimação epigástrica), náuseas e sensação de plenitude pós-prandial.
 Complicações:
 Perfuração: início abrupto de dor abdominal generalizada e intensa. É a 2ª
complicação mais comum, ocorre principalmente em idosos. É chamada úlcera
penetrante quando ela forma um túnel com um órgão adjacente. A UD posterior pode
penetrar-se para pâncreas. Neste caso, ocorre dor epigástrica contínua, que não alivia
com antiácidos e nem alimentos e irradia-se para costas.
 Sangramentos gastrointestinais: a maioria das úlceras que sangram
situam-se na parede posterior do bulbo- próxima da artéria gastroduodenal. É a
complicação mais comum, principalmente idosos - 15% pacientes. Pode ocorrer
taquicardia, fezes escurecidas e vômitos em borra de café.
 Obstrução pilórica: 1- 2% dos pacientes. Associada com dor que piora
com alimentação, náuseas e vômitos com alimento não digerido.

Tratamento e Mecanismo de Ação das Drogas nas Doenças


Pépticas Duodenais
Dieta, tabagismo e álcool. Não existem alimentos que contribuem ou não, mas
deve-se observar os que desencadeiam sintomas para evitá-los. O tabaco prejudica os
mecanismo de reparo da mucosa e deve ser suspendido. O álcool não induz a
formação de úlceras, mas predispõe ao sangramento. Então, uso deve ser evitado.

72
 Tratamento farmacológico: diminui a secreção ácida gastrointestinal e
erradica H. pylori se presente e previne reecidivas e complicações.
 Agentes Antissecretores e Neutralizadores do Ácido
Antiácidos
Utilizados para alívio de sintomas e não para tratamento. Hidróxido de
alumínio-magnésia (com a capacidade de neutralização de HCl de aproximadamente
1000 mmol/dia) acelera a cicatrização da úlcera ao neutralizar o ácido gástrico.
Doses bem menores (capacidade de neutralização de HCl de 120 mmol/ dia) tem
eficácia idêntica a dose mais alta. Os mecanismos exatos pelos quais os antiácidos
aceleram a cicatrização das ulcerações pépticas ainda não estão claros.
O hidróxido de alumínio mais o de magnésio misturados: é o mais usado,
porque o hidróxido de alumínio isolado é constipante e o de magnésio é laxante.
Ideal é ser usado 1h após principais refeições e ao deitar – pico de secreção ácida. O
bicarbonato de sódio causa alcalose sistêmica devido seu uso prolongado.
 Antagonistas dos receptores de histamina H2
Existem 4 antagonistas do H2 disponíveis: cimetidina, ranitidina, famotidina e
niizatidina.
Eles são inibidores competitivos da secreção de ácido estimulada por
histamina, muito embora a famotidina pareça ter algum componente de inibição não
competitiva também. Suprimem o débito basal, bem como o débito de ácido
estimulado pelas refeições.
MA: bloqueiam competitivamente o receptor H2 nas células parietais e como a
histamina potencializa a ação da Ach e da gastrina, a diminuição da histamina irá
diminuir a responsividade das células a ACh e gastrina também.
 Inibidores da bomba de prótons
Atua diretamente na bomba H⁺/K⁺ ATPase da célula parietal, inibindo
diretamente e irreversivelmente a secreção de HCl pela mesma. Possuem início de
ação rápido (2-6h) e longa duração da inibição (72-96h). Melhor se administrado em
jejum, quando a bomba encontra-se ativa. Ela volta a funcionar normalmente depois
de 2-5 dias de suspensão. Drogas: omeprazol (20mg/dia), lanzoprazol (30mg/dia),
pantoprazol (40mg/dia), rabeprazol (20mg/dia) e esomeprazol (40mg/dia).
Esses agentes são pró-fármacos que precisam ser ativados pelo ácido para
inibirem a H⁺/K⁺ ATPase. O uso de IBPs pode levar a uma hipergastrinemia e
consequente efeito trófico sobre as células parietais e células semelhantes a
enterocromafins. Porem retorna ao normal em 1-2 semanas após interrupção do
tratamento e não associa-se com tumores carcinoides gástricos.
 Agentes protetores da mucosa
 Sucralfato (sal de sacarose complexo)
Demonstrou eficácia (semelhante a dos antagonistas dos receptores de H2) em
cicatrizar úlceras duodenais quando administrados em dose de 1g quatro vezes ao
dia. Tem pouca capacidade de neutralizar ácidos apesar de conter hidróxido de
alumínio.
MA: ao ser exposto ao ácido gástrico, os anions de sucralfato conseguem se
ligar eletrostaticamente a proteínas de carga positiva nos tecidos danificados,
formando uma barreira protetora que pode prevenir um posterior ataque ácido
péptico (forma uma película na base da úlcera porque é insolúvel em água e forma
uma pasta viscosa no estômago e duodeno impedindo assim a agressão do ácido,
pepsina e sais biliares). Também melhora os níveis mucosos de prostaglandinas,
estimula secreção de muco e bicarbonato, a ligação de sais biliares irritantes da
mucosa, a ligação de fatores de crescimento epidermal e a promoção de angiogênese.

73
 Bismuto
Subcitrato de bismuto coloidal e o subsalicilato de bismuto coloidal. Esses
agentes tem uma certa eficácia na cura de úlceras pépticas, mas os mecanismos
subjacentes desse efeito terapêutico não estão claros.
O bismuto forma complexos com o muco, o que parece revestir as crateras da
úlcera. Os efeitos de aumento na síntese de PGs da mucosa e de secreção de
bicarbonato também foram sugeridos, e o bismuto tem ações antimicrobianas contra
H. pylori.
 Análogos da prostaglandina E
As PGs endógenas, incluindo a PGE2, regulam o fluxo sanguíneo da mucosa, a
proliferação de células epiteliais, a restituição epitelial, a função imunocitária da
mucosa, a secreção de muco e bicarbonato, e a secreção ácida basal. Existem
evidências substanciais de que o efeito ulcerogênico de um AINE esteja relacionado
a sua capacidade de suprimir a síntese de PGs.
O misoprostol, um análogo da PGE2 é o único análogo de PGs aprovado pela
FDA para a prevenção da doença ulcerosa induzida por AINE. O agente melhora os
mecanismos de defesa da mucosa e também inibe a secreção de ácido gástrico.
Depois de ligar-se ao receptor de PG na célula parietal, o misoprostol inibe a
secreção de ácido gástrico de uma maneira dependente da dose mediada através da
inibição da produção de AMPc estimulada por histamina. Ele reduz a secreção ácida
noturna, basal e estimulada por alimentos na dose terapêutica padrão, embora o
efeito não seja potente quanto a de outras classes de agentes antissecretores.
RESUMINDO
 Antissecretores de primeira linha: IBPs e antagonistas do receptor H2 da
histamina.
 Drogas de 2ª linha: antiácidos, sucralfato e análogos das prostaglandinas.

 Tratamento cirúrgico
 Indicação:
- Intratabilidade: não cicatrização da úlcera após 8-12 semanas de tratamento
ou recidiva após o termino do tratamento eventos incomuns.
- Presença de complicações
 Vagotomia: interrupção da estimulação das células parietais pela
acetilcolina.

74
 Antrectomia: interrupção da estimulação das células parietais pela
gastrina.

Patogenicidade do H. pylori
O Helicobacter pylori coloniza o estômago de cerca de 50% da população
humana do mundo durante toda a vida e está perfeitamente adaptado para viver no
ambiente ácido do estômago humano. A colonização por este microrganismo
constitui o principal fator de risco para a úlcera péptica, bem como para o
adenocarcinoma gástrico e o linfoma do MALT (tecido linfóide associado à mucosa).
Por outro lado, há evidências crescentes indicando que a colonização pelo H.
pylori pode oferecer alguma proteção contra complicações da doença por refluxo
gastresofágico (DRGE), incluindo adenocarcinoma esofágico.
Sua forma em espiral e a presença de múltiplos flagelos unipolares permitem
que as bactérias movam-se livremente através da camada de muco, onde
permanecem protegidas do baixo pH gástrico. Estes microrganismos produzem
grandes quantidades de uréase (mecanismo de resistência aos ácidos), uma enzima
que hidrolisa uréia à amônia alcalina (tamponamento), e CO2, permitindo que as
bactérias controlem o pH de seu microambiente. A uréase também é a base para
testes diagnósticos (teste respiratório com uréia marcada e teste rápido de uréase em
biopsia) para detecção da infecção por este microrganismo.
O H. pylori é um bacilo gram negativo que coloniza naturalmente os seres
humanos há pelo menos 50000 anos e, provavelmente, no decorrer de toda a
evolução humana. Reside na mucosa gástrica, com uma pequena proporção de
bactérias aderentes à mucosa, havendo, possivelmente, um pequeno número que
entra nas células ou que penetra na mucosa; sua distribuição nunca é sistêmica.
Acomete igualmente homens e mulheres.
 Fatores de Risco: baixo nível econômico, países em desenvolvimento, idade
avançada, mas condições de moradia, baixo grau de instrução. Transmitido de pessoa
para pessoa pela via oral-oral, gastro-oral, fecal-oral. Mais comum em negros.
A maioria dos pacientes infectados pela H. pylori não desenvolvem
complicações ou sintomas clínicos desta infecção. Este fato levou à consideração dos
cientistas a possibilidade de que algumas cepas fossem mais virulentas que outras,
provocando a investigação da patogenia de diferentes cepas da H. pylori. Estas
investigações chegaram à conclusão que as cepas mais virulentas da H. pylori tinham
a capacidade de provocar alterações morfológicas, vacuolização e degenerações
sucessivas em cultura de células.
Esta capacidade foi relacionada à presença de uma proteína com
aproximadamente 140 kDa de massa, nomeada CagA (de gene associado a
citotoxina), altamente imunogênica e codificada pelo gene cagA presente em mais da
metade das cepas da H. pylori. Cepas que possuem a cag PAI são chamadas de
linhagens cagA-positivas e induzem alta titulação de anticorpos anti-proteína CagA.
Pacientes infectados por esta cepa desencadeam uma maior resposta inflamatória,
com maior risco de desenvolver um quadro sintomático, seja úlcera, gastrite atrófica
ou câncer gástrico. Deve-se salientar que cepas que não possuem cag PAI são
também encontradas em pacientes com úlcera péptica ou câncer gástrico, porém em
menor frequência
 Patogenicidade
Ao ganhar acesso ao hospedeiro humano, H. pylori reconhece e adere a vários
receptores de superfície do epitélio gástrico, colonizando assim a mucosa de forma

75
crônica, interrompendo funções celulares, estimulando uma intensa inflamação local
e resposta imune sistêmica, além de alterar a fisiologia da secreção de ácido. As
manifestações clínicas finais da infecção por H. pylori incluem úlcera gástrica e
duodenal, linfoma MALT e adenocarcinoma; entretanto, a maioria dos indivíduos
infectados permanecem assintomáticos durante toda a vida, apesar de desenvolver
uma gastrite histológica crônica.
A genética do hospedeiro, características bacterianas e fatores ambientais
podem influenciar no desfecho clinico. A patogenicidade do H. pylori depende de
fatores bacterianos e do hospedeiro, além de fatores ambientais menos bem
definidos. A virulência do patógeno infeccioso é baseada nas propriedades
bacterianas que permitem a colonização e a adaptação ao ambiente gástrico e em
uma resposta do hospedeiro que contribui para as alterações fisiológicas e
histológicas no hospedeiro.
Inicialmente a H. pylori produz proteases e lipases que desintegram o gel
mucoso. O H. pylori possui adesinas que permitem que eles se aderem as células
epiteliais recobertas de muco. Além disso, algumas de suas proteínas são capazes de
induzir a formação de citocinas (IL-8) por células da lâmina própria, estimulando
uma quimiotaxia para neutrófilos e linfócitos, determinando um processo
inflamatório. Também ocorre uma ativação para liberar o fator de ativação
plaquetária, que gera uma trombose dos capilares superficiais e consequente
isquemia. Isso levará a uma gastrite superficial aguda e posteriormente uma
GASTRITE CRÔNICA ATIVA.
Além disso, a inflamação induzida pelo H. pylori diminui o número de células
D produtoras de somatostatina, principalmente na região do ANTRO gástrico. Como
a somatostatina tem a função de inibir as células parietais, isso não ocorrera,
favorecendo um aumento da produção de HCl, levando a hipercloridria durante a
refeição, devido ao aumento da produção de gastrina pelas células G, que também
não estarão inibidas pela somatostatina.
A secreção ácida aumentada pode favorecer a formação de uma metaplasia
gástrica potencialmente protetora observada no duodeno de pacientes com úlcera
duodenal e essa metaplasia também pode ser colonizada pela H. pylori, e ser
subsequentemente inflamada e ulcerada.
O H. pylori também induz um aumento da produção de ROS’s mediada por
neutrófilos, induz a apoptose celular mediada por células T.

76
 TRATAMENTO
Os tratamentos recomendados geralmente incluem dois antibióticos
administrados varias vezes ao dia, por 7 a 14 dias, junto com medicação supressora
da secreção ácida. Tentativas de simplificar o regime da medicação ou encurtar a
duração do tratamento geralmente reduzem a eficácia.
Após a cura, a taxa de reinfecção anual em adultos, especialmente em países
desenvolvidos é incomum, provavelmente menor que 1%. A terapia tripla é
atualmente o tratamento inicial mais utilizado. Ela cura consistentemente mais de
80% das infecções. O metronidazol pode ser um substituto tanto de amoxicilina
quanto de claritromicina, mas este antibiótico só é apropriado para indivíduos
alérgicos à penicilina ou intolerantes à macrolídeos, porque a resistência ao
metronidazol é comum e pode reduzir o sucesso terapêutico.
O IBP mais usado no Brasil (1ª opção) é Omeprazol (20mg 2X ao dia)
 Esquemas de tratamento (scielo)
1) Inibidor de bomba protônica (IBP) em dose padrão + amoxicilina
(penicilina) 1,0 g + claritromicina (macrolídeo) 500 mg, duas vezes ao dia, durante 7
dias.
2) IBP em dose padrão, uma vez ao dia + claritromicina (macrolídeo) 500
mg duas vezes ao dia + furazolidona 200 mg duas vezes ao dia, durante 7 dias.
3) IBP em dose padrão, uma vez ao dia + furazolidona 200 mg três vezes ao
dia + cloridrato de tetraciclina 500 mg quatro vezes ao dia, durante 7 dias.

77
 Esquema Tratamento MEDCURSO
 EUA
 Esquema 1 (7-14 dias)
Omeprazol 20 mg 12/12h + Claritromicina (macrolídeo) 500mg 12/12h +
Metronidazol (antifúngico derivado imidazólico) 500 mg 12/12h.
 Esquema 2 (7-14 dias)
Omeprazol 20mg 12/12h + Claritromicina 500mg 12/12h + Amoxicilina (derivido da
penicilina) 1g 12/12h.
 Esquema 3 (14 dias)
Omeprazol 20mg 12/12h + Subsalicilato do Bismuto 525 mg 6/6h + Metronidazol
500mg 8/8h + Tetraciclina 500 mg 6/6h.
 Esquema 4 “sequencial” (5 dias + 5 dias)
 Fase 1: Omeprazol 20mg 12/12h + Amoxicilina 1g 12/12h
 Fase 2: Omeprazol 20mg 12/12h + Claritromicina 500 mg 12/12h + Tinidazol
500mg 12/12h
 Esquema 5 (10 Dias)
Omeprazol 20m 12/12h + Amoxicilina 1g 12/12h + Levofioxacino 500 mg 6/6h
 BRASIL
Esquema mais usado (7 dias)
Omeprazol 20mg 12/12h + Claritromicina 500mg 12/12h + Amoxicilina 1g 12/12h
Se alergia à amoxicilina
Omeprazol 20mg 12/12h + Claritromicina 500mg 12/12h + Furazolidona 200mg
12/12h

 Síndrome de Zollinger-Ellison
O síndrome de Zollinger-Ellison (ZES) é caracterizado por doença péptica
grave (úlceras/doença esofágica) causada por hipergastrinemia secundária a
gastrinoma, resultando na secreção aumentada de ácido gástrico.
As manifestações mais frequentes são dor abdominal (tipicamente no abdome
superior) e diarreia. A pirose está presente em 44% dos casos. Outros sinais incluem
náuseas, vômitos, má absorção, e perda de peso. Alguns doentes são diagnosticados
por complicações de úlceras (hemorragia gastrointestinal, perfuração e penetração).
O ZES é causado por um tumor secretor de gastrina (gastrinoma), normalmente
localizado no duodeno (50-85% dos casos), pâncreas, nódulos linfáticos abdominais
ou, em casos raros, localizações ectópicas (coração, ovário, fígado etc.). O ZES pode
ser esporádico (75% dos casos) ou associado a neoplasia endócrina múltipla tipo I
(MEN1; ver este termo), transmitida de forma autossômica dominante. A MEN1 é
causada por mutações no gene MEN1 (11q13) que codifica a proteína menina, esta
proteína liga-se e regula a atividade de vários fatores de transcrição.
O diagnóstico é principalmente baseado nas manifestações clínicas. Os níveis
elevados de gastrina sérica em jejum (FSG) estão quase sempre presentes. Níveis de
FSG 10 vezes superiores ao normal e pH gástrico <2 confirmam o diagnóstico. Se os
níveis de FSG estão elevados, mas inferiores a 10 vezes e o pH gástrico é <2, é

78
necessário realizar testes de estimulação da secretina (anormal: aumento>120
pg/ML) e o ácido basal (anormal: >15 mEq/hr-basal). São necessários estudos
imagiológicos para localizar o gastrinoma (cintigrafia dos receptores da
somatostatina, TAC, ecografia abdominal ou ecografia endoscópica). Pode ser
indicada esofagogastroduodenoscopia para detectar úlceras duodenais.
A hipersecreção de ácido gástrico deve ser controlada a curto e a longo prazo.
Os inibidores orais da bomba de prótons (IBPs) são os medicamentos preferidos
devido à sua ação de longa duração e potência (administrados uma ou duas
vezes/dia). Os IBPs intravenosos são eficazes quando a via oral não pode ser usada.
Os antagonistas dos receptores H2 podem ser também eficazes, mas é frequente
serem necessárias doses elevadas. A orientação clínica inclui ainda tratamento do
próprio tumor já que 60-90% dos tumores são malignos. É recomendada cirurgia
para doença localizada nos doentes não-MEN1. Para a doença metástica avançada
são usadas várias terapias anti-tumorais como quimioterapia, bioterapia (análogos
somatostatina/interferão), embolização de metástases hepáticas e cirurgia agressiva.
Estão sob investigação novos tratamentos (radioterapia mediada aos recetores de
somatostatina, novos agentes quimioterapêuticos e inibidores do fator de crescimento
e da tirosina cinase).
Na ausência de metástases hepáticas, o prognóstico é favorável (uma taxa de
sobrevida de 90-100% aos 10 anos). Os doentes com metástases hepáticas (65-75%
dos doentes) têm uma taxa de sobrevida de 20-40% aos 10 anos. Os doentes com
MEN1 raramente têm possibilidade de cura cirúrgica devido à presença de múltiplos
tumores e metástases nos nódulos linfáticos, contudo, apenas 15% têm um curso
agressivo e a taxa de sobrevida aos 10 anos é de 80-98%.

79
Problema 4 – Diarreia que não
melhora
 FISIOLOGIA
Os nutrientes são absorvidos exclusivamente no intestino delgado, os
eletrólitos e fluidos são absorvidos tanto no delgado quanto no cólon.
Diariamente, cerca de 9 litros de fluido alcançam o duodeno, sendo 2 litros
provenientes da dieta e 7 litros derivados do suco digestivo (saliva, suco gástrico,
bile, suco pancreático, secreção duodenal). Deste total de 9 litros, o intestino delgado
absorve 7,5 litros, sobrando cerca de 1,5 litros para o cólon. Deste montante, o cólon
absorve a maior parte, permitindo a eliminação de apenas 100 mL nas fezes.
Capacidade máxima do intestino grosso reabsorver é de 4 L.
 ENTERÓCITOS DAS VILOSIDADES
Responsáveis pela absorção.
Diversos hormônios, neurotransmissores e peptídeos intestinais influenciam
sobre a absorção e a secreção epitelial. A somatostatina, a noradrenalina, a
encefalina, o neuropeptídio Y, os glicocorticóides e os mineralocorticóides
estimulam a absorção de fluidos e eletrólitos. As substâncias secretagogas são:
serotonina, acetilcolina, VIP (peptídeo vasoativo intestinal) e a substância P.
Mediadores inflamatórios capazes de aumentar a secreção intestinal são a histamina,
as prostaglandinas, os leucotrienos e algumas citoquinas. Algumas toxinas ou
secretagogos agem aumentando a concentração intracelular de AMPc ou de GMPc.

80
Para compreender as três categorias gerais de diarreia – diarreias por má
absorção (diarreias osmóticas), diarreias secretórias e diarreias inflamatórias - é
necessário entender como o intestino normal lida com líquidos e solutos nas
situações de saúde e doença.
Não importa se uma pessoa consumiu uma refeição hipotônica (p.ex., um bife),
ou hipertônica (p. ex., um copo de leite e uma rosquinha com recheio de creme) - o
volume da refeição será aumentado pelas secreções gástrica, pancreática, biliar e
duodenal. Em seguida, o duodeno permeável faz com que a refeição fique
aproximadamente isotônica, com um conteúdo de eletrólitos semelhante ao do
plasma ao alcançar o jejuno proximal.
Durante a movimentação do quimo em direção ao cólon, as concentrações de
Na⁺ no líquido luminal permanecem constantes, mas o Cl é reduzido para 60 a 70
mmol/L, e o bicarbonato (HC03-) aumenta até uma concentração similar, como
resultado dos mecanismos de transporte de Cl- e HCO3- no enterócito e da secreção
de HCO3 no íleo.
No cólon, o K⁺ é secretado, e o mecanismo de transporte de Na⁺ do
colonócito junto com a baixa permeabilidade epitelial extrai Na⁺ e líquido das fezes.
Em decorrência disso, o conteúdo de Na⁺ nas fezes diminui para 30 a 40 mmol/L;
K⁺ aumenta, de 5 a 10 mmol/L no intestino delgado para 75 a 90 mmol/L; e cátions
divalentes pouco absorvidos, como Mg e Ca, ficam concentrados nas fezes em
valores de 5 a 100 mmol/L.
As concentrações aniônicas no cólon mudam drasticamente, porque a
degradação bacteriana de carboidratos (i. e., amidos, açúcares e fibra não absorvidos)
cria ácidos graxos de cadeia curta que chegam a alcançar concentrações de 80 a 180
mmol/L. No pH do cólon, esses produtos estão presentes como ânions orgânicos,
como acetato, propionato e butirato. Dependendo da concentração gerada, esses
ácidos graxos/ânions podem diminuir o pH fecal para 4 ou menos.
Ao serem eliminadas, as fezes têm osmolalidade aproximadamente igual a do
plasma (280 a 300 mOsm/kg H2O).Com a ingestão de solutos não absorvíveis ou
pouco absorvíveis (p. ex., Mg ou polietileno glicol), ou de carboidratos não
absorvidos (p. ex., lactulose ou, em indivíduos com deficiência de lactase, lactose),
uma fração considerável da osmolalidade das fezes é resultante do soluto não
absorvido. Esse hiato entre a osmolalidade fecal e a soma dos eletrólitos nas fezes
causa diarreia osmótica.
Diarreias inflamatórias caracterizam-se por lesão e morte de enterócitos, atrofia
das vilosidades e hiperplasia das criptas. Os enterócitos presentes nas vilosidades
rudimentares do intestino delgado são células imaturas com baixa atividade de
dissacaridases e peptídeo hidrolases, redução ou ausência dos mecanismos de
transporte de açúcares ou aminoácidos ligados ao Na, e redução ou ausência de
transportadores de absorção de cloreto de sódio. Por outro lado, as criptas
hiperplásicas preservam sua capacidade de secretar Cl (e, talvez, HCO3-). Se a
inflamação é grave, a lesão vascular ou a ulceração imunomediada permitem o
extravasamento de proteína (exsudato) dos capilares e linfáticos, contribuindo para a
diarreia.

81
A ativação de linfócitos, fagócitos e fibroblastos libera vários mediadores
inflamatórios que induzem a secreção de cloreto intestinal. Interleucina 1 IL-1 e fator
de necrose tumoral também são liberados no sangue, causando febre e mal-estar.
 TRATADO
A água em si não é transportada ativamente, mas se move através da mucosa
intestinal secundária a forças osmóticas geradas pelo transporte de solutos, ou seja,
eletrólitos e nutrientes. As vias de transporte molecular de íons e nutrientes através
da mucosa foram bem caracterizadas e são reguladas por um complexo sistema de
comunicação de mensageiros extracelulares e intracelulares que mantêm o equilíbrio
de fluidos através de uma ampla gama de condições fisiológicas. Normalmente, a
absorção é quantitativamente maior. Uma diminuição na absorção ou aumento na
secreção leva a um fluido adicional dentro do lúmen e a diarreia. A interrupção do
transporte de eletrólitos epitelial ou seu sistema de regulação por toxinas, fármacos,
hormônios e citocinas é uma das principais causas de diarreia.

Diarreia
A diarreia é uma experiência humana universal. Para a maioria das pessoas, os
episódios de diarreia duram um dia ou dois e desaparecem rapidamente, sem
intervenção médica. Para outros, a diarreia dura mais de alguns dias ou é complicada
por febre, prostração ou sangramento retal. A diarreia é um sintoma, não uma
doença, e, portanto, pode ocorrer em dezenas de condições. A avaliação e o
tratamento da diarreia podem ser complexos e demorados.
A frequência normal das evacuações varia de três vezes por semana até três
vezes por dia. Embora indivíduos raramente citem como definição de diarreia,
aumentos apenas na frequência, uma diminuição na consistência das fezes (aumento
da fluidez) e fezes que provocam urgência ou desconforto abdominal provavelmente
devem ser chamadas de diarreia.
Consistência é definida como a relação entre a água fecal e a capacidade de
retenção de água dos sólidos insolúveis fecais, que se compõem de massa bacteriana
e fibra proveniente dos alimentos.
A consistência fecal se correlacionou melhor com a proporção da capacidade
de retenção de água dos sólidos insolúveis e com a quantidade de água total presente,
e não apenas com a quantidade de água fecal.
Os pesos das fezes diárias de crianças e adultos são inferiores a 200 g, e pesos
fecais maiores constituem uma definição objetiva de diarreia (200g/dia); contudo,
essa definição exclui 20% dos sintomas diarréicos em pacientes excretando fezes
moles abaixo desse peso diário.
O limite máximo de 200 g por dia de peso de fezes é geralmente aceito nos
países ocidentais. Embora o peso das fezes muitas vezes seja citado como uma
definição “científica”, a diarreia não deve ser definida exclusivamente em termos de
peso fecal. Algumas pessoas têm maior peso fecal devido à ingestão de fibras, mas
não se queixam de diarreia, pois a consistência de suas fezes é normal. Por exemplo,

82
a saída de fezes pode ser tão grande quanto 300 g, quando se consome uma dieta rica
em fibras, como é o costume de países em desenvolvimento. Por outro lado, cerca de
20% dos pacientes encaminhados para a avaliação de diarreia podem ter um peso
fecal normal (devido a hiperdefecação? Mudança na consistência?).
Outra definição bem aceita é a presença de fezes liquefeitas por três ou mais
vezes ao dia, caracterizadas por diminuição de sua consistência e aumento de
frequência baseado no perfil basal de cada indivíduo.
Diarreia significa mudança no hábito intestinal do indivíduo, que implica em
aumento do peso das fezes, da quantidade da parte líquida e da frequência de
evacuações. Geralmente, mais de uma dessas características estão presentes. A
diarreia ocorre quando há excesso de fluido nas fezes, por anormalidades na
SECREÇÃO ou na ABSORÇÃO. Ocorre quando existe uma alteração do equilíbrio
absorção X secreção redução da absorção e/ou aumento da secreção. Diarreia é um
SINAL físico.
 Classificação de tempo de evolução:
 Aguda dura menos de 2 semanas
 Persistente dura de 2-4 semanas
 Crônica dura mais de 4 semanas
 Classificação quanto ao local da lesão:
 Intestino delgado: diarreia alta
 Cólon: diarreia baixa
A diarreia alta (não inflamatória) ocorre quando há comprometimento do
intestino delgado, sendo comum o surgimento de fezes liquefeitas ou pastosas com
volume normal ou pouco aumentado. A dor abdominal periumbilical pode estar
presente, com restos alimentares, oleosas, brilhantes.
Já na diarreia dita baixa, há, predominantemente, comprometimento do
intestino grosso, há aumento na frequência das evacuações e o volume de fezes está
diminuído, as fezes são líquidas e apresentam normalmente muco e sangue. É
frequentemente observado lesão na ampola retal, acompanhada de tenesmo,
urgência, é inflamatória. É conceituada como o aumento do teor líquido das fezes,
frequentemente associado ao aumento do número das evacuações e do volume fecal
em 24 h.
Devem-se buscar na anamnese informações objetivas acerca do volume de
cada evacuação, da frequência diária das mesmas e da consistência ou teor de líquido
das fezes. Algumas particularidades do quadro clínico podem ajudar no raciocínio
diagnóstico, ao apontar mecanismos etiopatogênicos subjacentes ao processo
diarréico.
Assim, se há restos alimentares digeríveis e, em particular, pode ser
reconhecida gordura nas fezes, isso indica defeito nos processos de digestão e
absorção. Quando a diarreia cessa ou diminui com um período de jejum completo, é
sugestivo que ela se deva a aumento da pressão osmótica intraluminal. Em
compensação, se a diarreia não cessar com o jejum, é provável que se trate de
processo secretório ou exsudativo. Havendo febre, dor abdominal e eliminação de
sangue parcialmente digerido, deve-se pensar na possibilidade de alterações
inflamatórias.
A motilidade anormal pode levar à diarreia que tem componentes secretórios e
osmóticos. O tempo de contato entre o conteúdo luminal e o epitélio deve ser
suficiente para permitir a completa absorção de fluidos e eletrólitos. A avaliação do

83
papel da motilidade intestinal na patogênese da diarreia é limitada pela falta dos
instrumentos necessários para medir as interações entre a motilidade, as forças de
propulsão e o tempo de trânsito.
Pode ser decorrente dos seguintes mecanismos: (PORTO/TRATADO)
 Diarreia Osmótica (aumento da pressão osmótica do conteúdo intraluminal):
O acúmulo de substâncias não absorvíveis no intestino delgado pode
determinar retardo da absorção de água e eletrólitos ou passagem de líquidos do meio
interno para o lúmen intestinal. Este tipo de diarreia aparece quando há defeito na
digestão ou na absorção de nutrientes, como se observa na síndrome de má absorção.
A maioria da diarreia osmótica é causada pela ingestão de cátions e ânions ou
açúcares e alcoóis de açúcar pouco absorvidos (p. ex., manitol sorbitol). Os íons que
são mal absorvidos incluem o sulfato de magnésio e o fosfato. Esses íons são
transportados ativamente por mecanismos que estão saturados com baixas
concentrações de íons intraluminal e passivamente por mecanismos que são lentos.
Juntos, esses processos limitam a absorção total a uma fração montante que pode ser
ingerido. Como nem o intestino delgado nem o cólon mantêm um gradiente
osmótico, os íons não absorvidos (e seus contraíons) que permanecem no lúmen
intestinal obrigam a retenção de água para manter uma osmolaridade intraluminal
igual à dos fluidos corporais.
Ocorre quando há grande quantidade de moléculas hidrossolúveis no lúmen
intestinal, levando à retenção osmótica de água. Tem como causa mais frequente o
uso de laxativos e a má-absorção intestinal de carboidratos; também por ingestão
excessiva de sorbitol (balas sem açúcar), uso de manitol, suplementação excessiva de
fibras, intolerância a lactose, uso de alguns antibióticos.
Em alguns pacientes, a motilidade anormal produz a “pressa” intestinal. Como
o rápido trânsito intestinal impede um tempo adequado para a absorção, a diarreia
surge, apesar da capacidade de absorção da mucosa intacta, conforme foi
comprovado. Em alguns doentes com pressa intestinal, o tempo de trânsito oral-cecal
pode ser tão curto quanto 10 minutos. Sob tais circunstâncias, a diarreia é exarcebada
pela má absorção de nutrientes, que resulta no componente osmótico dessa diarreia.
 Principais características: cessa com o jejum (melhora a noite); cessa com
a suspensão da substância osmótica (essa característica têm sido usada clinicamente
para diferenciar a diarréia osmótica da secretora); gap osmolar fecal alto
(125mOsm/L). É caracteriza pela eliminação de grande quantidade de água, sódio,
cloro, potássio e bicarbonato através das fezes. Estas perdas são agravadas pela
eventual presença de vômitos e febre, levando à desidratação, acidose metabólica e
hipocalemia.
 Diarreia Secretora – Não Invasiva (aumento da secreção de água e eletrólitos
pela mucosa intestinal):
A diarreia secretora tem muitas causas, e o mecanismo desse tipo de diarreia é
sempre a secreção de ânions (cloreto ou bicarbonato) ou a inibição da absorção de
sódio. Os estímulos para a secreção surgem a partir do lúmen intestinal, espaço
subepitelial ou circulação sistêmica e alteram substancialmente os sistemas de
mensageiros que regulam as vias de transporte específico de molécula limita a
absorção de sódio ou cloreto e resulta em diarreia; em outros, a falta de área de
superfície suficiente para a absorção de eletrólitos limita, particularmente a de sódio,
de forma crítica.
Este mecanismo ocorre quando há estímulos à síntese de AMP cíclico
intracelular, resultando em secreção ativa de água e eletrólitos pela mucosa do
intestino delgado. Na diarreia por enterotoxinas bacterianas (Vibrio cholerae,

84
Escherichia coli) e por alguns medicamentos (teofilina, prostaglandinas), este é o
mecanismo responsável. Agentes que aumentam monofosfato cíclico de adenosina
(cAMP), monofosfato cíclico de guanosina (cGMP), ou cálcio ionizado intracelular
(Ca⁺⁺) como a toxina da cólera, enterotoxinas de Escherichia coli, prostaglandinas e
peptídeo intestinal vasoativo (VIP) no enterócito, inibem a absorção de Na⁺ e
estimulam a secreção de Cl.
Para a absorção de fluido intestinal e de eletrólitos ser completa, o intestino
deve ter uma superfície e tempo de contato adequados com o conteúdo luminal. A
perda de substância de área de superfície, como na doença celíaca ou na DII ou após
a cirurgia de ressecção, pode comprometer a absorção de gás.
O trânsito mais lento pode levar a uma diarreia secretora, promovendo um
supercrescimento bacteriano no intestino delgado. O excesso de bactérias no
intestino delgado atrapalha a digestão e pode alterar o transporte de eletrólito.
 Principais características: não melhora com o jejum (perdura durante a
noite), grande volume (em geral 1L/dia), gap osmolar baixo (menor que
50mOsm/L) fezes aquosas. Causas: laxativos, medicações (diuréticos, drogas para
asma, colinérgicos, PGs-misoprostol), tumores produtores de hormônio.
Tipo de Causas Exemplos
Diarreia
Diarreia Secretagogos exógenos Enterotoxinas (p. ex., cólera)
Secretora Secretagogos endógenos Tumores neuroendócrinos (p. ex.,
síndrome carcinoide)
Ausência de transportador de Cloridorreia congênita
íons
Perda da área de superfície Ressecção intestinal, doenças
intestinal intestinal difusa da mucosa
Isquemia intestinal Aterosclerose mesentérica difusa
Trânsito intestinal Supercrescimento bacteriano
Diarreia Ingestão de agente mal Ingestão de magnésio
Osmótica absorvido
Perda de transportador de Deficiência de lactase
nutrientes

 Diarreia Exsudativa/Inflamatória – Invasiva ou Lesão da Mucosa (aumento


da permeabilidade da mucosa intestinal):
Ocorre, quando há dano ao epitélio intestinal. A lesão pode ser limitada à
membrana das microvilosidades do epitélio ou ser extensa, com a descamação do
epitélio e formação de úlceras, como as que ocorrem devido à intensa inflamação em
resposta a microorganismos invasivos (espécies de Shigella, por exemplo).
Alterações inflamatórias, neoplásicas ou isquêmicas na mucosa intestinal
resultam em passagem anormal de líquidos do meio interno para o lúmen do intestino
delgado.
São exemplos a diarreia das doenças inflamatórias e dos linfomas difusos do
intestino delgado.
Exsudação de proteínas do soro, sangue, muco ou pus, a partir de áreas
inflamadas, de doenças ulcerativas ou infiltrativas, aumenta o volume fecal e causa
diarreia. Nesse grupo, estão incluídas as doenças inflamatórias intestinais, neoplasias
intestinais, a colite induzida por antibióticos e a parasitose (giardíase). Ocorre devido
à liberação de citocinas e mediadores inflamatórios.

85
 Características: presença de muco, pus e/ou sangue nas fezes.
Clinicamente, manifesta-se como disenteria. Dor abdominal em cólica e febre é
comum.
 Causas: doenças inflamatórias intestinais, colite isquêmica, colite actínica,
colite amebiana, colite pseudomembranosa, tuberculose intestinal, infecção por HSV
ou CMV, neoplasias, infecções bacterianas invasivas. Os principais agentes
causadores são: Entamoeba histolytica, Salmonella spp., Shigella spp.,
Campylobacter, E. coli enteroinvasiva, E. coli enterohemorrágica e também Yersinia
e Vibrio spp.
 Diarreia Motora (alteração da motilidade do intestino delgado):
Este mecanismo ocorre quando há uma alteração capaz de modificar o padrão
normal do trânsito no intestino delgado. São exemplos o hipertireoidismo e a diarreia
funcional, condições nas quais o trânsito pelo intestino delgado é acelerado. Os
mecanismos envolvidos na diarreia motora são o trânsito acelerado, causando
inadequada mistura do alimento com as enzimas digestivas, e o pouco contato com a
superfície absortiva, por ressecção intestinal ou fístulas enteroentéricas.
 Diarreia Gordurosa (esteatorreia):
Ocorre quando aumenta concentração de lipídeos nas fezes. Decorre de uma
diarreia dos ácidos graxos (secretória), por mecanismos osmóticos, por má-absorção
de carboidratos dissacarídeos (deficiência de lactase). Causada pela má absorção de
carboidratos e ácidos graxos, que por efeito osmótico, induzem a diarreia. Sempre se
origina de uma doença do INTESTINO DELGADO (doença celíaca, doença de
Chron, giardíase).
 Classificação Clínica
A diarreia pode ser classificada de várias maneiras: tempo de duração (aguda X
crônica), volume (grande X pequenos), fisiopatologia (secretora X osmótica),
características das fezes (aquosa X gordurosa X inflamatória) e epidemiologia.
Para o clínico, a classificação utilizada é útil somente se delinear uma
abordagem diagnóstica e de tratamento, em um determinado paciente. A esse
respeito, nenhum esquema único é perfeito, o médico experiente utiliza todas essas
classificações para facilitar o atendimento ao paciente.
 Aguda X Crônica
A diarreia aguda (< 4 semanas - TRATADO) geralmente é causada por uma
infecção autolimitada ou facilmente tratada. A diarreia crônica geralmente não é
causada por um agente infeccioso. Portanto diante de um paciente com diarreia
crônica, o clínico deve considerar causas não infecciosas.
 Grande Volume X Pequeno Volume
A diferenciação da causa da diarreia em função do volume de fezes individuais
baseia-se na premissa de que o retossigmoide apresenta funções normais de um
reservatório de armazenamento. Quando a capacidade do reservatório é
comprometida por distúrbios inflamatórios ou de motilidade envolvendo o cólon
esquerdo, acontecem movimentos intestinais frequentes de pequeno volume. Se a
fonte da diarreia é no cólon direito ou no intestino delgado e se o reservatório
retossigmoide está intacto, os movimentos intestinais individuais são menos
frequentes e maiores. Portanto, fezes pequenas, frequentes e dolorosas podem

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apontar para uma patologia de cólon distal, enquanto fezes de grande volume e
indolor sugerem a fonte do cólon direito ou o intestino delgado.
 Osmótica X Secretora
A distinção da diarreia que resulta da má absorção intestinal dos eletrólitos não
ingeridos (diarreia osmótica) daquela que resulta da má absorção ou secreção de
eletrólitos (diarreia secretora) ajuda a separar um pequeno número de casos de
diarreia osmótica do número muito maior de diarreia secretora. Essa distinção é
baseada na medição da concentração osmótica nas fezes.
 Aquosa X Gordurosa X Inflamatória
A diarreia aquosa implica um defeito principalmente na absorção de água,
devido ao aumento da secreção ou à diminuição da absorção de eletrólitos (diarreia
secretora) ou à ingestão de uma substância pouco absorvida (diarreia osmótica). A
diarreia gordurosa envolve a absorção deficiente de gordura e talvez outros nutrientes
no intestino delgado. A diarreia inflamatória implica a presença de um número
limitado de doenças inflamatórias ou neoplásicas que envolvem o TGI.
 Características Epidemiológicas
Uma das abordagens clínicas mais úteis para estreitar o diagnóstico diferencial
é relacionar a diarreia ao seu contexto (viagem, alimento, água, etc)
 DIARREIA AGUDA
Segundo a Organização Mundial de Gastroenterologia (WGO), diarreia aguda
é a passagem de uma quantidade maior do que o normal de fezes amolecidas, além
do aumento do número de evacuações, que durem menos de 14 dias. Pode ser
interpretada como um aumento na quantidade de água e eletrólitos nas fezes, levando
à produção frequente de fezes malformadas. É esse comprometimento no equilíbrio
entre reabsorção e secreção pela mucosa intestinal que leva à liquidificação das
fezes.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, as infecções intestinais
associadas a quadros diarréicos são a segunda causa de morte de origem infecciosa
em todo o mundo. A prevalência estimada é de 3 a 5 bilhões de casos por ano. Nos
países em desenvolvimento estima-se a ocorrência de quatro a 10 episódios por
habitante/ano.
Em infecções severas, o número de evacuações diárias pode ultrapassar 20
episódios, com defecações ocorrendo a cada 20 ou 30 minutos. Nesta situação, o
volume diário de fezes líquidas pode exceder dois litros, com significante depleção
de volume (hipovolemia), desidratação e hipocalemia. Contudo, a maioria dos
pacientes tem de três a sete episódios diarréicos por dia, com perda diária não
excedendo um litro.
Pacientes com diarreia infecciosa frequentemente se queixam de náuseas,
vômito e dor abdominal, apresentando-se com diarreia aquosa, com má absorção ou
com sangue e febre (disenteria).
Os principais fatores de risco para diarreia infecciosa são a idade < 5 anos
(lactentes e pré-escolares), a baixa condição socioeconômica, baixa escolaridade,
qualidade e higiene deficiente dos alimentos, comorbidades, desnutrição,
imunodeficiência, qualidade da agua ruim e o saneamento básico precário.

87
No contexto das gastroenterites infecciosas, determinados comportamentos
e/ou circunstâncias às quais os pacientes se expõem, bem como algumas
comorbidades que apresentam, são considerados fatores de risco para a doença.
São eles: viagem recente (especialmente para países em desenvolvimento—
áreas tropicais); alimentos ou circunstâncias alimentares incomuns (frutos do mar,
especialmente crus; refeições em restaurantes ou lanchonetes); homossexualidade,
atividade sexual remunerada, uso de drogas intravenosas (pessoas em risco de
infecção por HIV e de desenvolvimento de SIDA-imunodeficientes); uso recente de
antibióticos; cuidadores de creches e seus familiares; pessoas em instituições de
longa permanência.
Aproximadamente 80% (90% - Harrison) das diarreias agudas se devem a
infecções por vírus, bactérias, helmintos e protozoários e pode se acompanhar de
náusea, vômito, desconforto abdominal, sintomas sistêmicos como febre e
desnutrição. O restante ocorre devido à ingestão de medicamentos, açúcares pouco
absorvidos (polímeros de frutose ou sorbitol), impactação fecal, inflamação pélvica
(p. ex., apendicite aguda) ou isquemia intestinal.
Frequentemente, nos quadros infecciosos, estão envolvidos microrganismos
não invasivos, que são especialmente ativos no intestino, causando diarreia aquosa.
Esses microrganismos levam à diarreia através de interações variadas com a mucosa
intestinal. Por exemplo, a E. coli enterotóxica e o Vibrio cholerae não se disseminam
além da mucosa intestinal e causam o quadro sem qualquer invasão do epitélio
intestinal, através da produção de enterotoxinas, que induzem à secreção de fluidos.
Apesar de menos comuns, alguns casos são por microrganismos invasivos. Estes
penetram o epitélio intestinal, resultando em distúrbio inflamatório. O melhor
exemplo é o da infecção por Shigella.
A maioria dos casos de gastroenterite é causada por vírus, como observado em
estudos que avaliaram coproculturas de pacientes com diarreia aguda. Apenas 1,5% a
5,6% das coproculturas foram positivas. No entanto, os casos mais graves em adultos
geralmente se devem a agentes bacterianos (Salmonella sp. e a Shigellasp). Há
quatro agentes virais causadores de gastroenterite aguda: norovírus, rotavírus,
adenovírus entérico e astrovírus.
A maioria das diarreias infecciosas é adquirida por transmissão fecal-oral ou,
mais comumente, pela ingestão de alimentos ou água contaminados com patógenos a
partir de fezes humanas ou de animais. Uma lesão ou infecção aguda ocorre quando
o agente ingerido supera ou desvia das defesas imunes e não imunes (ácido gástrico,
enzimas digestivas, secreção de muco, peristalse e flora residente supressora) da
mucosa do hospedeiro. As associações clínicas estabelecidas com enteropatógenos
específicas podem oferecer indícios diagnósticos.

88
 Rotavírus
Rotavírus é o principal agente causador de diarreia em crianças, principalmente
no período de seis meses até dois anos. Esta infecção é, sozinha, a mais importante
causa de gastrenterite severa nesses indivíduos.
Acredita-se que todas as crianças de países ricos e pobres venham a se infectar
por este agente até a idade de 3-5 anos. Apesar de ser mais comum em crianças,
também acomete adultos, especialmente em familiares de crianças infectadas. Salvo
isso, está associado à diarreia dos viajantes e a surtos diarréicos em universitários,
asilos, e outras instituições.
As manifestações clínicas nos adultos são menos severas em relação às
crianças, porém a sintomatologia é semelhante (vômitos, diarreia não sanguinolenta e
febre). A hipovolemia também é detectada em adultos. Associada a náuseas, vômitos
e dor abdominal. Causa diarreia pela destruição de enterócitos nas vilosidades,
estimulando secreção de líquidos devido a rotatoxina NSP4 e ativa o SN entérico, e
diminui a absorção dos líquidos.
 E. coli

89
 Salmonella
A infecção pode ser causada por um grupo de microrganismos com mais de 40
sorogrupos e 2000 sorotipos. Destacando-se que todos são patogênicos para os seres
humanos. A Salmonella spp. Pode ser classificada em tifóide e não tifóide.
Usualmente a infecção associa-se a ingesta de alimentos contaminados.
Notadamente, crianças e idosos possuem maior risco de infecção. Os animais são o
grande reservatório desses microrganismos.
Caracteriza-se por episódios agudos de náuseas, vômito e diarreia que pode ser
aquosa ou disentérica. Febre e cólicas abdominais são comuns.

90
 DIARREIA AGUDA NÃO INFECCIOSA
Álcool: principal causa
 Medicamentos: AINEs, digoxina, antiácidos a base de Mg,
antibióticos (os antibióticos mais frequentemente implicados são a clindamicina, a
ampicilina e as cefalosporinas), antihipertensivos, laxantes, antidepressivos,
quimioterápicos, broncodilatadores. Eritromicina é agonista do receptor de motilina
no TGI diarreia por hipermotilidade.
 Colite isquêmica, retocolite ulcerativa
 Toxinas animais e algas marinhas, frutos do mar, cogumelos.
 Envenenamento: metais pesados (arsênico presente em veneno de
rato), inseticidas (organofosforados e carbamatos).
Diarreia e sintomas neurológicos (formigamento e queimação em torno da
boca, rubor facial, sudorese, cefaléia, palpitações e tontura) da intoxicação por frutos
do mar podem ser causados pela liberação de histamina da carne em decomposição
de certos peixes (mahi-mahi [um tipo de golfinho], atum, espadarte ou cavala),
depois de sua captura. Esse tipo de envenenamento com frutos do mar é chamado de
escombrideo.

91
 Desinteria
Disenteria é uma síndrome na qual, além da diarreia acompanhada de cólicas
intensas, as fezes são mucossanguinolentas. Além disso, ocorre tenesmo ao final de
cada evacuação. Pode ser de origem amebiana ou bacilar (shigellose). Ocorre
principalmente por enteropatógenos bacterianos, como Salmonella spp., Shigella
spp., Campylobacter, E. coli enterohemorrágica, e por protozoários como Entamoeba
histolytica (invade mucosa ileal terminal e colônica proximal causando dor
abdominal intensa a palpação, simula apendicite).
 Diarreia aguda “baixa” (colônica): defecação frequente, de pequeno volume
e alívio da dor após evacuar, com febre, prostração e sangue ou pus nas fezes.
Cólicas principalmente no quadrante inferior esquerdo que melhoram após
evacuação. Comprometimento retal: urgência, tenesmo e dor ao evacuar.
 Diarreia Aguda Aquosa
É a diarreia líquida sem produtos patológicos - sem sangue, muco ou pus. Não
ocorre invasão da mucosa pelo patógeno, mas há produção de enterotoxinas.
As principais causas deste tipo de diarreia incluem: rotavírus, norovírus
(Norwalk), E. coli enterotoxigênica, V. cholerae 01, V. cholerae 0139 e demais
víbrios não cólera. Outras causas menos comuns são: E. coli enteroaderente,
Campylobacterjejuni e Cryptosporidium spp.
Em países em desenvolvimento e subdesenvolvidos os principais causadores de
diarreia aguda em crianças são os vírus, especialmente o rotavírus. Tais infecções se
caracterizam inicialmente por febre e vômitos, por dois a três dias, seguindo-se por
diarreia líquida profusa sem produtos patológicos (sangue, muco ou pus). Foram
identificados quatro padrões desta doença: endêmico (ou esporádico), epidêmico,
relacionado a viagens e infecções transmitidas de crianças para adultos. Seu curso é
geralmente autolimitado.
 Nas crianças:
É causada principalmente pelo rotavírus, nelas 60-70% é causa viral.
O quadro clínico inicia-se com pródromos de febre e sintomas respiratórios
leves, seguido de vômito e diarreia. Evolução para desidratação e acidose metabólica

92
pode ser rápida. Curso geralmente dura 7 dias. Evoluções mais prolongadas com
sintomas respiratórios mais intensos falam a favor de adenovírus.
 Nos adultos:
Causada principalmente por E. coli, atingindo viajantes e relacionada à
alimentação.
Quadro clínico: após um período curto de incubação surge um quadro de
diarreia aquosa acompanhada de anorexia, náuseas, vômitos, cólica abdominal e
febre baixa. Curso auto-limitado de alguns dias, se feita reposição volêmica. Quando
não é acompanhado de distúrbios sistêmicos suspeita-se de: síndrome do intestino
irritável, medicamentosa (colchicina, antiácidos, laxante, sal de Mg, tiazídicos e
teofilina).
Aquosa secretória: líquida, volumosa (mais de 1L/dia), mais de 5
dejeções/dia. Não melhora com jejum. Hiato osmótico <50mOsm/Kg água. Cólicas,
náuseas e vômitos são frequentes. Causas: toxinas bacterianas, rotavirus, cólera,
tumor secretor, ma absorção de sais biliares, laxantes.
Aquosa osmótica: líquida, frequente e abundante. Tipicamente melhora com
jejum ou 2-3 dias após remoção causa. Hiato osmótico >120mOsm/Kg água. Se há
fermentação: mais gases (flatulência e distensão abdominal) e acidez. Causas:
moléculas inabsorvíveis (sorbitol, antiácidos, laxantes) e dissacarídeos não
absorvíveis.
Aquosa alta: diarreia aquosa, cólica periumbilical, náuseas, vômito, distensão
abdominal, desidratação (oligúria e hipotensão). Causas: rotavirus, E. coli
enterotóxica.

Tratamento Clínico das Diarreias Agudas

A decisão de avaliar a diarreia aguda depende


de sua gravidade e sua duração, bem como de vários
fatores do hospedeiro. A maioria dos episódios de
diarreia aguda é leve e autolimitada, não
justificando o custo e a taxa de morbidade em
potencial das intervenções diagnósticas ou
farmacológicas.
As indicações para avaliação incluem diarreia
profusa com desidratação, fezes francamente
sanguinolentas, febre ≥38,5°C, duração >48h sem melhora, uso recente de
antibiótico, novos surtos na comunidade, dor abdominal grave associada em
pacientes com mais de 50 anos de idade e idosos (≥70 anos) ou
imunocomprometidos (SINAIS DE ALARME NA DIARREIA AGUDA).
O tratamento da diarreia pode ser sintomático (reposição de líquidos e agentes
antidiarréicos) e/ou específico (terapia antimicrobiana).
 Reposição hidroeletrolítica
Pacientes gravemente desidratados devem ser reidratados com solução salina
ou lactato de Ringer intravenoso, com a possível adição de K⁺ e NaHCO3
(bicarbonato de sódio), se houver necessidade. Pacientes com nível de consciência
preservado devem ser reidratados com soluções orais, que são igualmente eficazes na
reposição das perdas de fluidos e eletrólitos. Em casos leves a moderados de
desidratação, podem ser administradas soluções de reidratação oral a lactentes e
crianças em volumes de 50 a 100 ml/kg ao longo de 4 a 6 horas; adultos talvez

93
tenham que beber 1.000 ml/hora. Soluções de reidratação oral com osmolaridade
reduzida (Na⁺ 75 mmol/L, osmolaridade de 245 mmol/L versus Na⁺ 90 mmol/L,
osmolaridade 311 mmol/L nas soluções padrão) são mais bem toleradas e eficazes
nas diarreias não cólera, mas podem causar hiponatremia em pacientes com diarreias
de volume elevado. Soluções de reidratação oral com base na glicose, embora
efetivas para reidratação dos pacientes, podem piorar a diarreia. Nas desidratações
leve a moderada podem requerer 1000 ml de solução caseira ou comercial para repor
perda anterior mais 150-200 ml para cada nova dejeção que ocorrer.
A reposição hidroeletrolítica é de importância primordial em todas as formas
de diarreia aguda. A reposição isolada de líquidos pode ser suficiente nos casos
leves. As soluções orais com glicose e eletrólitos (bebidas energéticas ou formulas
especializadas) devem ser instituídas de imediato nos casos de diarreia grave para
limitar a desidratação, que é a principal causa de morte. Os pacientes profundamente
desidratados, em especial lactentes e idosos, necessitam de reidratação intravenosa.
A hidratação venosa é recomendada apenas a pacientes com desidrataçao grave
(perda maior que 10% do peso corporal).
 Soro: 1L de água potável em 3,5g de NaCl, 20g de glicose ou 40g de
sacarose, 1,5g de KCl e 3g de bicarbonato de sódio ou citrato de sódio 90mOsm/l de
Na⁺.
 Alimentação
A dieta deve ser isosmótica, equilibrada, facilmente digerida e com teor normal
em fibras, respeitando-se a anorexia do doente quando esta ocorrer. Preferir
alimentos sem lactose, já que a prevalência de intolerância à lactose é elevada, evitar
açúcar, lipídeos, álcool, leite e derivados, cafeína. Preferir sopas e vegetais cozidos
na água e sal, banana, batata, arroz, torradas e bolachas de água e sal.
 Probióticos
O uso de probióticos (suplementos microbiológicos vivos com capacidade para
manter ou normalizar a microflora intestinal) são potencialmente úteis para o
tratamento das diarreias não invasivas. Incluem vários tipos de Lactobacillus,
Bifidobacterium, Streptococcus e um fungo o Saccharomyces boulardii. Eles
repovoam a flora intestinal normal, diminuem o período de diarreia em pacientes
com quadros mais prolongados, também inibem o crescimento de patógenos no
intestino grosso (alteração do pH) e aumentam resposta imune do hospedeiro,
aumenta a função da barreira intestinal. Exemplos: Floratil e Florax.
 Antidiarréicos
Na diarreia moderadamente grave, afebril e não sanguinolenta, os agentes anti-
secretores e antimotilidade, como a loperamida (Imosec), podem ser medidas
adjuvantes úteis para controlar os sintomas. Esses agentes devem ser evitados nos
casos de disenteria febril e diarreias invasivas (inflamatórias), que pode ser
exacerbada ou prolongada por eles. O subsalicilato de bismuto (anti secretor) pode
reduzir os sintomas de vômitos e diarreia, mas não deve ser utilizado para tratar
paciente imunocomprometidos ou com comprometimento renal, por causa do risco
de encefalopatia por bismuto.
A loperamida (tem ação antissecretória e antiperistáltica) é um agente que age
perifericamente, já que raramente passa a barreira hematoencefálica e atinge a
circulação sistêmica. Sua posologia é de dois comprimidos de loperamida, seguidos
de um comprimido a cada evacuação líquida, sem que a dose máxima de 16 mg/dia
seja ultrapassada. É um opioide com ação nos receptores  e assim inibem a
liberaçao de acetilcolina com consequente diminuição da motilidade intestinal,

94
aumento da absorção de NaCl e água e diminuição da atividade secretora e da
velocidade de esvaziamento gástrico.
Os sais de bismuto (agente antissecretório) demonstram serem eficazes e
seguros no tratamento da diarreia aguda. Tais fármacos estimulam a absorção de
água e eletrólitos, liga-se a enterotoxinas e possuem efeito antibacteriano direto.
Todavia podem levar ao escurecimento da língua e das fezes, não devendo ser
ministrados com outros agentes antibacterianos e em aidéticos com contagem baixa
de leucócitos. É menos eficaz que a loperamida. Têm a vantagem de poderem ser
utilizados nos casos de disenteria.
Difenoxilato (Lomotil): 4mg de 6h/6h utilizado em caso de diarreia aguda não-
invasiva (sem febre, muco ou sangue nas fezes.)
 Antibioticoterapia
A antibioticoterapia é restrita a grupos especiais que possuem maior chance de
apresentar diarreia bacteriana grave.

Muitos médicos tratam de forma empírica, sem avaliação diagnóstica, os


pacientes de moderado a gravemente enfermos com disenteria febril usando
QUINOLONA, como o ciprofloxacino (500mg, 2x/dia durante 3 a 5 dias). O
tratamento empírico com metronidazol (250mg, 4x/dia durante 7 dias) também pode
ser considerado se houver suspeita de giardíase. De outro modo, a escolha dos
antibióticos e esquemas posológicos é ditada pelos patógenos específicos, padrões
geográficos de resistência e distúrbios encontrados. A cobertura com antibióticos esta
indicada quer um microrganismo causal seja descoberto ou não em pacientes
imunocomprometidos, que tenham valvas cardíacas mecânicas ou enxertos
vasculares recentes ou sejam idosos.
Quinolonas: Duração de 5 dias de tratamento, para Gram – e +.Exemplos:
norfloxacina: 12/12h, 400mg; ofloxacino: 12/12h, 400mg; ciprofloxacino: 12/12h,
500mg.

95
Medidas Preventivas para a Diarreia Infecciosa
Quando a diarreia é de origem infecciosa, a prevenção pode ser feita por meio
de medidas higieno-dietéticas, tais como: lavar bem as mãos, higienizar bem os
alimentos de fácil contaminação e, em casos de diarreia do viajante, usar medicação
profilática, como a rifaximina, antes de ir para países com potencial de
contaminação.
De forma geral, as recomendações são: hidratar-se bem e aguardar a evolução
por 24 horas, fazendo uma dieta leve. Indivíduos com diarreia devem evitar
alimentos que possam estimular as funções do trato gastrointestinal. Portanto, devem
evitar fibras, alimentos muito concentrados em sal ou açúcar, e também todos
aqueles que contenham condimentos ou elementos artificiais irritantes (café, água
com gás, chocolate, fibras).
A hidratação adequada é fundamental e pode ser feita por meio da ingestão de
água ou hidratantes orais. O leite e seus derivados também podem ser evitados, já
que pode haver intolerância à lactose e prejudicar a recuperação. Caso a diarreia
persista, piore, ou acompanhe outros sintomas, é necessário procurar o serviço
médico de urgência.
Medidas de saneamento: higiene das mãos e alimentos, água tratada, filtrada,
esgoto, uso adequado das fossas, cuidado com o lixo. A água pode ser facilmente
contaminada pelos micróbios causadores das diarreias. Por isso as fontes e
reservatórios de água devem ser protegidos, evitando-se o seu contato com fezes.
Educação para saúde: cuidados de higiene, uso soro oral.
A profilaxia com antibióticos está indicada para determinados pacientes que
visitarão países de alto risco, nos quais a probabilidade ou seriedade da diarreia
adquirida seria especialmente elevada, como aqueles com imunocomprometimento,
doença inflamatória intestinal, hemocromatose ou acloridria gástrica. O uso de
ciprofloxacino ou rifaximina pode diminuir 90% a diarreia bacteriana nesses
viajantes, embora a rifaximina não seja adequada para doença invasiva, mas sim um
tratamento para a diarreia do viajante descomplicada.
Por fim, os médicos devem ficar vigilantes para identificar se está ocorrendo
um surto de diarreia e alertar as autoridades de saúde pública sem demora, o que
pode reduzir o tamanho da população acometida.

COMPLEMENTO DIARREIA AGUDA –


GASTROENTEROLOGIA ESSENCIAL
Diarreia consiste em alteração do hábito intestinal por diminuição de
consistência das fezes e aumento da frequência e do volume das evacuações. Apesar
de a quantificação do peso fecal diário ser a forma mais precisa para se definir
diarreia, esta medida é pouco prática e restrita ao academicismo necessário às
pesquisas. Habitualmente, o peso médio diário das fezes é de 100 g/dia.
Alterações intestinais são caracterizadas por variações na consistência e pela
presença de produtos patológicos nas fezes. Estes são definidos pela presença de
muco, pus, sangue, resíduos alimentares ou fezes brilhantes e/ou flutuantes
(esteatorreia). Os três primeiros estão frequentemente associados a diarreias de
origem inflamatória, enquanto os dois últimos, às síndromes disabsortivas.

96
A investigação das características clínicas da diarreia auxilia na compreensão
da fisiopatologia envolvida no processo e até mesmo das etiologias mais prováveis.
Em muitos casos, terapêutica sintomática e específica pode ser introduzida com esses
dados iniciais. Sempre que possível, no entanto, deve-se definir a etiologia para se
conduzir a terapêutica de forma mais dirigida.
 Fisiologia e Fisiopatologia
O intestino tem a função de secretar substâncias que auxiliam no processo
digestivo e de absorver líquidos, eletrólitos e nutrientes. Fisiologicamente, a absorção
de nutrientes e líquidos excede a secreção, e o intestino delgado é predominante
nessa atividade. O intestino delgado recebe, aproximadamente, 10 L de líquidos por
dia (ingesta, secreções de saliva, gástrica, biliar, pancreática e intestinal), absorve
cerca de 6 L no jejuno e 2,5 L no íleo. O cólon recebe do delgado em torno de 1,5 L,
e apenas 100 ml são eliminados nas fezes. A capacidade absortiva total do cólon é de
4 a 5 L/24 h e, quando essa quantidade é ultrapassada, surge a diarreia.
O principal mecanismo pelo qual a água é absorvida e secretada se faz segundo
o gradiente osmótico criado pelo transporte ativo do sódio. O sódio é absorvido
associado ao cloro ou a alguns nutrientes. A absorção de Na+/Cl- pelas vilosidades
leva a água passivamente através da mucosa. Isso se dá pela menor concentração de
sódio no interior do enterócito em relação à luz intestinal.
Essa via é inibida pelo cAMP e GMPc, que sofrem estimulação da
adenilciclase e guanilciclase do enterócito. Essas enzimas podem ser ativadas pelas
toxinas bacterianas. A absorção acoplada de Na+ com glicose, galactose e
aminoácidos é ativa e não sofre influência dos agentes infecciosos, por isso é
utilizado para restaurar as perdas nas diarreias infecciosas. A secreção entérica
depende da secreção ativa de Cl-, que se acompanha da eliminação de Na+ e H2O
para o lúmen intestinal pelas células das criptas.
Assim, a água acompanha o movimento do Na+, e a absorção se faz pelas
células do ápice das vilosidades intestinais, enquanto a secreção é realizada pelas
células das criptas. Diversos agentes estimulam a secreção ou inibem a absorção,
como as prostaglandinas, o peptídio vasoativo intestinal (VIP) e o peptídio
calmodulina, enquanto as encefalinas atuam no sentido de estimular a absorção de
água e eletrólitos. No cólon, há vários mecanismos de transporte de sódio, através
dos quais ocorre a absorção de água. A absorção e a secreção acontecem
concomitantemente com predomínio do conteúdo absorvido. A diminuição da
absorção ou aumento da secreção ou a alteração de ambas produzem diarreia.
Muitos microrganismos alteram o equilíbrio de absorção e secreção no
intestino delgado e são capazes de provocar diarreia. Alguns produzem enterotoxinas
que ativam o mecanismo secretor e outros, por alterarem as vilosidades, prejudicam a
absorção. No íleo distai e cólon, a diarreia é causada principalmente por invasão e
destruição do epitélio, que resulta em ulceração, infiltração da submucosa com
eliminação de soro e sangue. Além disso, podem estimular resposta inflamatória
local, que resulta na produção de vários secretagogos, como as prostaglandinas e
interleucinas, e contribuem para a perda de líquidos para o lúmen intestinal.

97
A fisiopatologia da diarreia envolve cinco mecanismos básicos, sendo possível
a concomitância de mais de um deles no desencadeamento de determinado tipo de
diarreia:
 Diarreia Secretora
Resulta da hipersecreção de água e eletrólitos pelo enterócito, como ocorre pela
ação das enterotoxinas bacterianas. Pode também resultar da produção excessiva de
hormônios e outros secretagogos, como no gastrinoma (gastrina), na síndrome
carcinoide (serotonina, prostaglandinas, calcitonina), na cólera pancreática
(VIPomas), no adenoma viloso, na insuficiência adrenal e no hipoparatireoidismo.
 Diarreia Osmótica
O processo da digestão determina fisiologicamente a transformação do
conteúdo intestinal em material isosmótico. Distúrbios da digestão presentes nas
deficiências de dissacaridases, que mantêm um conteúdo hiperosmolar, determinam a
passagem de líquidos parietais para o lúmen intestinal e, consequentemente, diarreia.
O mesmo pode acontecer pela ingestão de agentes osmoticamente ativos como a
lactulose, o manitol, o sorbitol e os sais de magnésio.
 Diarreia Motora
Resulta de alterações motoras com trânsito intestinal acelerado, como ocorre
nas enterocolopatias funcionais ou doenças metabólicas e endócrinas. Surge,
também, por redução da área absortiva consequente de ressecções intestinais ou de
fístulas enteroentéricas.
 Diarreia Exsudativa/Inflamatória
Decorre de enfermidades causadas por lesões da mucosa resultantes de
processos inflamatórios ou infiltrativos, que podem levar a perdas de sangue, muco e
pus, com aumento do volume e da fluidez das fezes. É encontrada nas doenças
inflamatórias intestinais, neoplasias, shigelose, colite pseudomembranosa,
linfangiectasia intestinal.
 Diarreia Disabsortiva
Resulta de deficiências digestivas e lesões parietais do intestino delgado que
impedem a correta digestão ou absorção. Este processo pode causar diarreia com
esteatorreia e resíduos alimentares.
 Classificação
Existem várias formas de se classificarem as diarreias. A definição que
apresenta maior relevância clínica é a que distingue tipos de diarreia de acordo com
seu tempo de evolução. Assim, define-se como aguda a diarreia que tem duração
máxima de 30 dias, habitualmente ficando restrita a 2 semanas. A diarreia é
considerada crônica quando tem duração superior a 1 mês. Essa distinção auxilia na
conduta médica desde a avaliação de etiologias mais frequentes até as necessidades
de terapêuticas, empíricas iniciais.
As diarreias agudas devem ser consideradas como urgência médica devido aos
riscos inerentes especialmente relacionados com a desidratação habitual nesses
casos. A principal etiologia é a infecciosa. Contudo, são processos autolimitados, na

98
maioria das vezes, e a conduta primordial é a manutenção da homeostase com o
equilíbrio hidreletrolítico.
As diarreias crônicas apresentam condições etiopatogênicas muito mais
complexas, porém raramente necessitam de abordagem emergencial. Com isso, a
necessidade de tratamento empírico inicial é reduzida e o médico tem condições de
conduzir investigação adequada.
Outra forma também muito utilizada na prática clínica de classificar diarreia é
em relação ao local do trato gastrintestinal de sua origem. Denomina-se diarreia alta
a originada no intestino delgado e baixa a relacionada com o intestino grosso. A
importância dessa classificação está na diferenciação de causas mais frequentes em
cada local, dirigindo melhor conduta médica investigativa e terapêutica iniciais. A
maioria das etiologias que causam problemas ao trato gastrintestinal alto desencadeia
diarreia de padrão secretor. Por outro lado, as diarreias baixas costumam apresentar
padrão inflamatório.

 Historia Clínica
Na história do paciente, devem-se investigar o local e as condições em que a
diarreia foi adquirida. Deve-se investigar a ingestão recente de água, frutas ou
verduras potencialmente contaminadas, alimentos suspeitos, viagens recentes,
presença de pessoas próximas também acometidas, uso recente de antibióticos e
outros fármacos, história sexual, banho em locais públicos e contatos com animais.
Na avaliação da origem da diarreia, há que se considerar o período de incubação no
caso de infecções intestinais que podem levar de horas a 2 semanas.
A apresentação clínica da diarreia aguda é bastante semelhante, independente
do agente causador. Entretanto, algumas diferenças podem ocorrer de acordo com a
fisiopatogênese envolvida.
A diarreia inflamatória apresenta espectro clínico mais grave e exige
tratamento mais criterioso. É causada por bactérias invasivas, parasitos e bactérias
produtoras de citotoxinas que afetam preferentemente o íleo e o cólon. Promove
ruptura do revestimento mucoso e perda de soro, hemácias e leucócitos para o lúmen.
Manifesta-se por diarreia, em geral de pequeno volume, com muco, pus ou sangue,
febre, dor abdominal predominante no quadrante inferior esquerdo, tenesmo, dor
retal. Algumas vezes, apresenta, no início da evolução, diarreia aquosa, que só mais

99
tarde se converte em típica diarreia inflamatória, quando os microrganismos ou suas
toxinas lesam a mucosa colônica.
A diarreia não inflamatória é, em geral, moderada, mas pode provocar grandes
perdas de volume. É causada habitualmente por vírus ou por bactérias produtoras de
enterotoxinas e afeta preferentemente o intestino delgado. Os microrganismos
aderem ao epitélio intestinal sem destruí-lo, determinando diarreia secretora, com
fezes aquosas, de grande volume e sem sangue; pode estar associada a náuseas e
vômitos. As cólicas, quando presentes, são discretas, precedendo as exonerações
intestinais.
Na avaliação clínica, além de definir o padrão da diarreia aguda, devem-se
também avaliar possíveis complicações, especialmente a desidratação. Relato de
boca seca e sede, diurese concentrada, oligúria, associados a achados ao exame físico
de pele e mucosas desidratadas e hipotensão postural com taquicardia, demonstram
desidratação e sua gravidade. Sinais de toxemia indicam quadro mais grave e
necessidade de maior cuidado clínico. Desta forma, presença de febre alta,
taquipneia, vasodilatação periférica com hipotensão e pulsos rápidos e finos são
sinais de alerta.
O exame físico do abdome normalmente exibe dor leve difusa à palpação, com
possibilidade de descompressão brusca levemente dolorosa em situações de maior
distensão de alças e dor mais intensa. Os ruídos hidroaéreos estão frequentemente
aumentados. Dor localizada, sinais de irritação peritoneal intensa, massas ou
visceromegalias, distensão abdominal importante e ausência de ruídos são achados
que devem direcionar para avaliação cuidadosa pela possibilidade de outras afecções
abdominais.

100
Problema 5 – Minha doença tem
cura?
Diarreia Crônica
A diarreia que dura mais de 4 semanas exige avaliação para se excluir uma
patologia subjacente grave. Em contraste com a aguda, a maioria das causas da
diarreia crônica não é de origem infecciosa. A classificação da diarreia crônica pelo
mecanismo fisiopatológico facilita uma conduta racional para o tratamento, embora
muitas doenças causem diarreia por mais de um mecanismo. As principias causas de
diarreia crônica são as doenças inflamatórias intestinais, como a Doença de Crohn e
a retocolite ulcerativa, SIDA (AIDS), infecção por amebas e outros parasitas,
tumores e hipertireoidismo.

A diarreia aquosa crônica pode ser causada pela ingestão de substâncias mal
absorvidas, osmoticamente ativas (diarreia osmótica), ou, mais comumente, por
condições que causam a diarreia secretora. A ingestão de qualquer número limitado
de agentes osmóticos, como magnésio, fosfato e sulfato laxativos, ou carboidratos
mal absorvidos, provoca a diarreia osmótica. Por outro lado a diarreia secretora
crônica, na qual a má absorção de eletrólitos leva a retenção de líquido dentro do
lúmen, está associada a diversas condições clínicas.
A diarreia aquosa crônica também pode ser causada pela ingestão de drogas ou
venenos. A identificação de drogas como a causa da diarreia depende do
reconhecimento do início da ingestão da droga e do aparecimento do sintoma, que
ocorrem coincidentemente. Alguns medicamentos podem ativar os receptores e

101
transportadores específicos; por exemplo, a cafeína e a teofilina podem aumentar a
atividade intracelular do AMPc e a secreção de fluidos (diarreia Starbucks). A
eritromicina interage com o receptor motilina, estimulando a atividade motora
propulsiva no TGI. Outros antibióticos podem alterar a flora bacteriana no cólon e
levar a um resgate prejudicado de carboidrato mal absorvido ou uma abundância de
toxina produzida por Clostridium difficile (causa colite pseudomembranosa).
Outra categoria de diarreia aquosa crônica envolve a motilidade desordenada
ou a desregulação da função intestinal. Problemas como diarreia pós-vagotomia,
diarreia pós simpatectomia, neuropatia autonômica diabética, amiloidose pertencem
a essa categoria. A diarreia tem características da secretora, devido a desregulação
primária do transporte de eletrólitos ou a motilidade alterada que acelera a passagem
de fluido pelos locais de absorção do intestino.
Outra grande categoria de diarreia aquosa é a causada por disfunção endócrina,
hipertireoidismo e doença de Addison podem ser complicadas pela diarreia secretora
crônica. Os tumores endócrinos muito mais raros também produzem a diarreia,
normalmente alterando a absorção de eletrólitos ou acelerando o trânsito intestinal.
Outros tumores causam a diarreia aquosa obstruindo o intestino, bloqueando a
drenagem linfática, interferindo na absorção ou causando a secreção de eletrólitos
(carcinoma de cólon, linfoma e adenomas vilosos do reto).
A diarreia inflamatória crônica (presença de muco, pus e sangue nas fezes) é
causada por doenças inflamatórias como colite ulcerativa, doença de Crohn,
diverticulite, jejunoileite e doenças infecciosas que são invasivas ou ulcerativas
causadas por bactérias (como tuberculose, yersiniose, e colite associada ao
Clostridium difficile), virais que ulceram (como CMV, herpes simples), infecções
parasitárias e invasivas (estrongiloidíase).
A diarreia gordurosa crônica resulta de má absorção ou má digestão. As
síndromes de má absorção causadas por doenças da mucosa, como a doença celíaca
ou a doença de Whipple, normalmente produzem a diarreia gordurosa. O
supercrescimento bacteriano do intestino delgado causa a esteatorréia por
desconjugação de ácidos biliares. A má digestão, como resultado de insuficiência
pancreática exócrina ou concentração inadequada de ácido biliar duodenal, produz a
esteatorréia. Embora gordurosa, as fezes podem não estar muito soltas em condições
de má digestão, porque na ausência da digestão de gordura, os triglicerídeos
permanecem intactos e tem pouco efeito sobre a absorção de eletrólitos no cólon. Por
outro lado, a má absorção na presença de uma digestão normal pode produzir diarreia
bastante volumosa, por causa da ação catártica de ácidos graxos livres no cólon.
(TRATADO)
 CAUSAS SECRETORAS (HARRISON)
As diarreias são provocadas por distúrbios no transporte hidroeletrolítico
através da mucosa enterocolônica. Caracterizam-se clinicamente por eliminação
fecais aquosas e de grande volume, indolores e que persistem com o jejum. Como
não há soluto mal-absorvido, a osmolalidade fecal é verificada por eletrólitos
endógenos normais sem hiato osmótico fecal.

102
 Medicações: Os efeitos colaterais regular de medicamentos e toxinas são as
causas secretoras mais comuns de diarreia crônica. Uso repentino ou habitual de
laxativos estimulantes, consumo crônico de etanol pode gerar esse tipo de diarreia
devido à lesão dos enterócitos, com comprometimento da absorção de Na+ e água,
bem como trânsito rápido e outras alterações. Ingestão de determinadas toxinas
ambientais (arsênico) pode levar as formas crônicas, em vez de aguda, de diarreia.
Certas infecções bacterianas às vezes podem persistir e estar associadas a uma
diarreia do tipo secretor.
 Ressecção intestinal, doença da mucosa ou fístula enterocólica: estas
condições são distúrbios que podem resultar em uma diarreia do tipo secretor por
causa da superfície inadequada para reabsorção dos líquidos e eletrólitos secretados.
Esse subgrupo, diferente de outras diarreias secretoras, tende a se agravar com a
alimentação. Com uma doença (p. ex. ileite de Crohn) ou uma ressecção 100 cm de
íleo terminal, os ácidos diidroxibiliares podem escapar da absorção e estimular a
secreção colônica (diarreia colorreica), mecanismo que pode contribuir para a
chamada diarreia secretora idiopática, em que os ácidos biliares são funcionalmente
mal-absorvidos a partir do íleo terminal de aspecto normal. A regulação de feedback
negativo reduzida da síntese de ácido da bile pelo fator de crescimento de fibroblasto
19 produzida pelos enterócitos resulta em um grau de síntese de ácido da bile que
excede a capacidade normal para a reabsorção ileal, produzindo diarreia de ácido da
bile.
 Hormônios: embora incomuns, os exemplos clássicos de diarreia secretora
são mediadas por hormônios. A diarreia é gerada pela liberação de potentes
secretagogos intestinais na circulação, tais como serotonina, histamina,
prostaglandinas, e várias cininas. Embora diversos secretagogos liberados com a
gastrina possam desempenhar um papel, a diarreia resulta com mais frequência da
má digestão lipídica decorrente da inativação da enzima pancreática pelo pH
intraduodenal baixo.
O gastrinoma, um dos tumores neuroendócrinos mais comuns, pode apresenta
diarreia em até 33% dos casos e esta é a única manifestação clínica em 10% deles.
Embora diversos secretagogos liberados com a gastrina possa desempenhar um
papel, a diarreia resulta com mais frequência da MÁ DIGESTÃO lipídica decorrente
da inativação da enzima pancreática pelo pHintraduodenal baixo.
O VIPOMA (cólera pancreática/ síndrome de diarreia aquosa com
hipopotassemia e acloridria) secreta peptídeo intestinal vasoativo e uma variedade de
outros hormônios peptídicos, como polipeptídeo pancreático, secretina, gastrina,
polipeptídeo inibidor de gastrina (peptídeo insulinotrópico dependente de glicose),
neurotensina, calcitonina e as PGs. A diarreia secretora em geral é maciça, com
volumes fecais maiores que 3 litros/dia (até 20 litros já foi relatado). Desidratação
particularmente fatal, disfunção neuromuscular secundária à HIPOPOTASSEMIA,
HIPOMAGNESEMIA ou HIPERCALCEMIA associada; rubor e hiperglicemia
acompanham o VIPOMA.
O carcinoma medular de tireóide pode manifestar-se com diarreia AQUOSA
provocada pela CALCITONINA, outros peptídeos secretores ou PGS.
 Defeitos congênitos na absorção de íons: raramente, defeitos nos
transportadores específicos associados a absorção de íons causam diarreia aquosa
desde o nascimento. Estes distúrbios incluem a troca defeituosa de Cl/HCO3 com
alcalose e troca defeituosa de Na/H e resulta em acidose. Algumas deficiências
hormonais podem estar associadas á diarreia aquosa, como aquela que acontece na
insuficiência do córtex supra-renal (doença de Addison).

103
 CAUSAS OSMÓTICAS
A diarreia osmótica acontece quando solutos ingeridos, pouco absorvíveis e
osmoticamente ativos, atraem líquido suficiente para o lúmen, excedendo a
capacidade de reabsorção do colo. O débito hídrico fecal aumenta proporcionalmente
a essa carga de soluto. Em geral, a diarreia osmótica cessa com o jejum ou com a
suspensão da ingestão oral do agente causador.
 Laxativos osmóticos: a ingestão de antiácidos contendo Mg, suplementos
vitamínicos ou laxativos pode induzir diarreia osmótica, tipificada por um hiato
osmótico fecal (>50 mosmol/L).
 Má absorção de carboidratos: a má absorção de carboidratos decorrente
de defeitos adquiridos ou congênitos nas dissacaridases da borda ciliada e em outras
enzimas resulta em diarreia osmótica com pH baixo. Uma das causas mais comuns
de diarreia crônica em adultos é a deficiência de LACTASE (aflige 75% de não
brancos). Alguns açúcares, como o sorbitol, a lactulase ou a frutose, costumam ser
mal-absorvidos, de modo que a diarreia se estabelece com a ingestão de
medicamentos, chicletes ou doces que contenham esses açúcares mal ou
incompletamente absorvidos.
 CAUSAS ESTEATORREICAS
A má absorção de lipídeos pode induzir diarreia com fezes gordurosas, de odor
fétido e difíceis de escoar, frequentemente associada à perda ponderal e deficiências
nutricionais decorrentes da má absorção concomitante de aminoácidos e vitaminas. O
aumento do débito fecal é causado pelos efeitos osmóticos dos ácidos graxos,
especialmente depois da hidroxilaçao bacteriana, e, em menor extensão, pela carga
de lipídeos neutros. Em termos quantitativos, a esteatorreia é definida como um nível
de gordura fecal superior a taxa normal de 7 g/dia; a diarreia de trânsito rápido pode
resultar em gordura fecal de até 14 g/dia; a gordura fecal diária alcança em media 15
a 25 g nas doenças do intestino delgado e em geral é > 32g na insuficiência
pancreática exócrina. Má digestão intraluminal, má absorção da mucosa ou obstrução
linfática podem causar esteatorreia.
 Má digestão intraluminal: é um distúrbio que resulta, com maior
frequência, da insuficiência pancreática exócrina, que ocorre quando mais de 90% da
função secretora pancreática são perdidas. Causas: pancreatite crônica, fibrose
cística, obstrução do ducto pancreático e raramente, somatostatinoma. A proliferação
bacteriana no intestino delgado pode desconjugar os ácidos biliares e alterar a
formação de micelas, o que compromete a digestão dos lipídeos; ela ocorre com a
estase dentro de uma alça cega, divertículo de intestino delgado ou dismotilidade,
sendo especialmente provável no idoso. Por fim, a cirrose ou a obstrução biliar
podem acarretar esteatorreia leve devido a concentração deficiente de ácidos biliares.
 Má absorção na mucosa: ocorre má absorção na mucosa a partir de
diversas enteropatias, porém ela ocorre mais comumente devido a doença celíaca,
caracteriza-se por atrofia das vilosidades e hiperplasia das criptas no intestino
delgado proximal podendo apresentar-se com diarreia gordurosa associada a
múltiplas deficiências nutricionais de gravidade variável. Doença de Whipple, devido
ao bacilo Tropheryma whippleii e à infiltração histiocítica da mucosa do intestino
delgado, é uma causa menos comum de esteatorreia mais típica em homens jovens e
de meia idade, estando associada à artralgias, febre, linfadenopatia e fadiga extrema.
Vários outros distúrbios podem causar má absorção na mucosa, incluindo infecção

104
pelo protozoário como a Giardia, inúmeros medicamentos (colchicina, colestiramina,
neomicina); amiloidose e isquemia crônica.
 Obstrução linfática pós-mucosa: (linfangiectasia intestinal congênita ou
obstrução linfática adquirida): acarreta a constelação singular de má absorção
lipídica com perdas entéricas de proteína (muitas vezes causando edema) e
linfocitopenia. Há preservação da absorção de carboidratos e aminoácidos.
 CAUSAS INFLAMATÓRIAS
São geralmente acompanhadas de febre, dor, sangramento ou outras
manifestações de inflamação. O mecanismo da diarreia pode ser não apenas a
exsudação, mas, dependendo do local da lesão, pode incluir má absorção lipídica,
redução da absorção hidroeletrolítica e hipersecreção ou hipermotilidade decorrente
da liberação de citocinas e outros mediadores inflamatórios. O aspecto unificador na
análise fecal é a presença de leucócitos ou de produtos derivados de leucócitos, como
calprotectina. Com uma inflamação grave, a perda protéica exsudativa pode acarretar
anasarca. Qualquer pessoa de meia idade ou mais velha com diarreia crônica
inflamatória, especialmente com sangue, deve ser cuidadosamente avaliada para se
excluir um tumor colorretal.
 Doença inflamatória intestinal idiopática: as doenças nessa categoria,
como a doença de Crohn e a colite ulcerativa crônica, está entre as causas orgânicas
mais comuns da diarreia crônica em adultos e sua gravidade varia de leve a
fulminante e potencialmente fatal.
 Formas primárias ou secundárias de imunodeficiência: a
imunodeficiência pode acarretar diarreia infecciosa prologada. Com a deficiência de
IgA seletiva ou hipogamaglobulina variável comum, a diarreia é particularmente
prevalente e, com frequência, resulta de giardíase crescimento bacteriano excessivo
ou espru.
 Gastrenterite eosinofílica: a infiltração eosinofílica da mucosa, muscular
da mucosa ou da serosa e, qualquer nível do TGI pode provocar diarreia, dor,
vômitos ou ascite. Embora a hipersensibilidade a determinados alimentos ocorra em
adultos, à alergia alimentar verdadeira causando diarreia crônica é rara.
 Outras etiologias: pode ser provocada por enterocolite por irradiação,
doença do enxerto versus hospedeiro crônico, síndrome de Behçet e síndrome de
Cronkhite-Canada entre outras.
 CAUSAS COM DISMOTILIDADE
Um trânsito rápido pode acompanhar muitas diarreias com um fenômeno
secundário ou contribuinte, mas a dismotilidade primária é uma etiologia incomum
de diarreia verdadeira. Hipertireoidismo, síndrome carcinóide e certos fármacos
(prostaglandinas e agentes procinéticos) podem causar hipermotilidade com
resultante diarreia. A diarreia diabética pode advir, em parte, da dismotilidade
intestinal. A SII é extremamente comum e se caracteriza por comprometimento das
respostas sensoriais e motoras intestinais e colônicas a vários estímulos. Em geral, os
sintomas de frequência fecal costumam cessar a noite, alternam-se com períodos de
constipação, são acompanhados por dor abdominal aliviada com a defecação e
raramente resultam em perda de peso.
 CAUSAS FACTÍCIAS
A diarreia factícia responde por ate 15% das diarreias inexplicadas
encaminhadas a centros de assistência terciária. Quer como uma forma de síndrome
105
de Munchausen (fingimento ou autolesão para obter ganho secundário) quer como
bulimia, alguns pacientes tomam clandestinamente laxativos por conta própria,
isoladamente ou em combinação com outros medicamentos (p. ex. diuréticos) ou
acrescentam, de maneira sub-reptícia, água ou urina nas fezes enviadas para análises.
Esses pacientes são mulheres, na maioria das vezes com historia de doenças
psiquiátricas e de maneira desproporcional seguem carreiras na área da saúde.
Hipotensão e hipopotassemia são achados coexistentes comuns.
 Diagnóstico
São inúmeros os recursos laboratoriais disponíveis para avaliar o problema
muito comum da diarreia, porém muitos são dispendiosos e invasivos. Assim, a
avaliação diagnóstica deve ser racionalmente dirigida por uma anamnese e um exame
físico minucioso. Quando tal estratégia nada revela, com frequência os exames
simples de triagem estão assegurados para direcionar a escolha para exames mais
complexos.
A anamnese, o exame físico e os exames de sangue rotineiros devem tentar
caracterizar o mecanismo da diarreia, identificar as associações valiosas para o
diagnóstico e avaliar os estados hidroeletrolíticos e nutricional do paciente.
Os pacientes devem ser inquiridos sobre o início, duração, padrão, fatores
agravantes (especialmente a dieta) e atenuantes, bem como as características das
fezes diarreicas. Deve-se observar a presença ou a ausência de incontinência fecal,
febre, perda ponderal, dor, determinadas exposições (viagem, medicamentos,
contatos com diarreia) e as manifestações extras intestinais comuns (alterações
cutâneas, artralgias, aftas orais). Antecedentes familiares de DII ou ESPRU podem
indicar tais possibilidades.
Os achados físicos podem dar indícios, como uma massa tireóidea, sibilância,
sopros cardíacos, edema, hepatomegalia, massas abdominais, linfadenopatia,
anormalidades mucocutâneas, fístulas perianais ou flacidez do esfíncter anal. Pode
ocorrer leucocitose, elevação da taxa de sedimentação ou da proteína C reativa, que
sugerem inflamação; anemia refletindo perda sanguínea ou deficiências nutricionais;
ou eosinofilia, que pode ocorrer com parasitoses, neoplasias, doença vascular do
colágeno, alergia ou gastrenterite eosinofílica.
A bioquímica sanguínea pode mostrar distúrbios eletrolíticos, hepáticos ou
outros distúrbios metabólicos. A estimativa de anticorpos teciduais contra a
transglutaminase pode ajudar a detectar doença celíaca.
Uma prova terapêutica costuma ser apropriada, definitiva e tem uma razão
custo/benefício altamente favorável, quando um diagnóstico específico é sugerido na
consulta inicial com o médico. A persistência dos sintomas exigem exames
adicionais.
Os pacientes em que se suspeita da Síndrome do Intestino Irritável devem ser
inicialmente avaliados com sigmoidoscopia flexível e biópsias colorretais; aqueles
com achados normais poderiam se tranquilizados e, conforme indicado, tratados
empiricamente com antiespasmódicos, antidiarréicos, agentes formadores de massa,
ansiolíticos ou antidepressivos. Qualquer paciente que se apresente com diarreia
crônica e hematoquezia devem ser avaliados com exames microbiológicos fecais e
colonoscopia.
Estima-se que em 66% dos casos a causa de diarreia crônica permanece incerta
depois da consulta inicial, sendo necessários exames adicionais. A coleta quantitativa
e a análise das fezes podem fornecer dados objetivos importantes, que podem definir
o diagnóstico ou caracterizar o tipo de diarreia como uma triagem para exames

106
adicionais específicos. Quando o peso fecal é maior que 200 gramas/dia, devem ser
efetuadas análises fecais adicionais que possam incluir a concentração de eletrólitos,
pH, pesquisa de sangue oculto, de leucócitos, quantificação de lipídios e triagem para
laxativos.
No caso das diarreias secretoras (aquosa, com hiato osmótico normal) deve-se
realizar exames microbiológicos como culturas bacterianas fecais (inclusive em
meios para Aeromonase Pleisiomonas), o exame parasitológico de fezes para detectar
ovos e parasitos e o ensaio para o antígeno de Giardia (o teste mais sensível para
giardíase).
A proliferação bacteriana no intestino delgado pode ser excluída por aspirados
intestinais com culturas quantitativas ou testes respiratórios com glicose ou lactulose
que consistem em medir o hidrogênio, o metano ou outro metabolito (p. ex. CO2) no
ar exalado. Contudo, a interpretação desses testes respiratórios pode ser confundida
por perturbações do trânsito intestinal.
A endoscopia e a colonoscopia superiores com biopsias e raios X com bário do
intestino delgado são úteis para eliminar a doença inflamatória oculta ou estrutural.
Quando sugeridos pela historia ou por outros achados, devem-se realizar avaliações
para hormônios peptídicos (p. ex. gastrina sérica, PIV, calcitonina e hormônio
estimulante da tireóide/ hormônio tireoidiano, ou ácidos 5-hidroxiindolacético
urinário e histamina).
Na diarreia osmótica deve incluir os testes para intolerância à lactose e ingestão
de Mg, as duas causas mais comuns. Um pH fecal baixo sugere má absorção de
carboidratos; a má absorção de lactose pode ser confirmada por testes com lactose no
ar exalado ou por uma prova terapêutica com exclusão da lactose e observação do
efeito de uma carga de lactose (p. ex. 1L de leite). Níveis fecais de Mg ou laxativos
elevados, deve-se considerar a ingestão inadvertida ou clandestina e solicitar um
parecer psiquiátrico.
Para aquelas com diarreia gordurosa comprovada, deve-se empreender a
endoscopia com biópsia de intestino delgado (incluindo aspirado para Giardia e
procedimentos quantitativos); quando esse procedimento é inconclusivo, a
radiografia de intestino delgado constitui uma etapa seguinte apropriada. Quando os
exames do intestino delgado são negativos ou se suspeita de doença pancreática, a
insuficiência pancreática exócrina deve ser excluída com testes diretos, como o de
estimulação com secretina- colecistocinina, ou uma variação que poderia ser feita por
via endoscópica. Testes indiretos como o ensaio para elastase fecal a atividade da
quimotripsina fecal ou teste com a bentiromida não tem sido usados por ter
sensibilidade e especificidade baixas.
Deve-se suspeitar de diarreias crônicas do tipo inflamatória ante a presença de
sangue ou leucócitos nas fezes, achados que exigem coproculturas, exame
parasitológico de fezes para a detecção de ovos e parasitos, ensaio para a toxina do
C. difficile, colonoscopia com biópsias e, quando indicado, exames do intestino
delgado com contraste oral.

107
 HISTÓRIA CLÍNICA
 Características das fezes: volume, frequência, presença de muco e sangue.
 Exames e tratamentos já realizados
 Relação da diarreia com alimentação, medicação (inclusive laxantes) e bebida
alcoólica
 Pesquisar detalhadamente da cronologia: contínua ou intermitente, dias e números de
intervalos
 Períodos assintomáticos, dor que melhora com evacuação, muco fezes sugere
intestino irritável
 Antecedentes de quimio e radioterapia, viagens, cirurgias abdominais
 Historia familiar de doença do TGI: doença celíaca, de Crohn, retocolite, intolerância
alimentar
 Alterações dermatológicas: podem ocorrer pela má absorção de nutrientes
 Manifestações sistêmicas: febre, perda de peso sugere inflamatória
 EXAMES LABORATORIAIS
 Hematológicos e bioquímicos: busca-se identificar o mecanismo gerador da diarreia,
comorbidades associadas e repercussões nutricionais. Mais úteis são:
 Hemograma
 Bicarbonato

108
 Amilase
 Albumina
 HIV
 Ionograma: Na, K, Cl, Ca, P, Mg
 VHS e PCR
 Glicose de jejum
 Função hepática
 Função renal: ureia e creatinina
 TSH ultrassensível
 Vitamina A e D
 Sorologia para amebíase e giárdias
 Exames de fezes úteis:
 Parasitologia das fezes: pesquisar Giardia (3 amostras)
 Dosagem de Na e K fecal e calcular o hiato osmótico:
 290- 2x [(Na fecal) + (K fecal) ] o valor normal é de 50-125mOsm/kg água; na diarreia
secretória< 50mOsm/kg água e na diarreia osmótica:>125mOsm/kg água.
 Lactoferrina fecal: é um produto de neutrófilos. Positivo no caso de diarreia invasiva,
Doença de Crohn, retocolite ulcerativa, colite por radiação ou isquêmica e diverticulite.
 Pesquisa de leucócitos e sangue oculto nas fezes
 Coprocultura: solicitada se lactoferrina positiva, indicando diarreia invasiva. Pode
identificar E. colientero patogênica, Crypto sporidium, Aeromonas e Yersinia.
 Pesquisa e dosagem de gordura fecal: positiva se >7g de gordura por dia ou 6% de
gordura com dieta com ingestão mínima de 100g de gordura/ dia. Colhida fezes de 72h.
Nas doenças intestinais varia de 10-15g/dia e nas pancreáticas de >30g/dia. Qualitativa
e quantitativa.
 Pesagem das fezes: normal ate 250g/dia. Ate 400g/ dia: causa funcional-cólon irritável,
hipermotilidade. Acima de 800g/dia: má absorção: doença pancreática, deficiência de
sais biliares, enteropatia. Grande quantidade de agua: osmótica ou secretora.
 Retossigmoidoscopia e colonoscopia com biópsia: diagnosticam de 15-20% casos de
diarreia crônica. Indicada em casos crônicos e com sintomas atípicos: anemia
progressiva, sangue nas fezes, perda de peso, sinais de inflamação ou obstrução. Pode
definir: Doença de Crohn, retocolite ulcerativa, colite pseudomembranosa, isquêmica,
neoplasias, etc.
 Endoscopia alta com biopsia e cultura jejunal: diagnostica doença celíaca.
 Exames de imagem: TC e RM.
 Pesquisa de substâncias redutoras nas fezes: avalia a absorção de monossacarídeos,
como glicose e galactose, e de dissacarídeos- sacarose e lactose estão presentes nas
fezes em caso de ocorrência de má absorção do TGI. A deficiência enzimática mais
comum é a da LACTASE, que pode ser primária ou secundária, gerando intolerância à
lactose. Normal: negativo/ alterado: positivo.
 Pesquisa de alfa-1- antitripsina fecal (inibidor da alfa-1- proteinase): é uma enzima
resistente a degradação por enzimas digestivas. A presença de alfa-1- antitripsina nas
fezes é um marcador endógeno de perda proteica pelo tubo digestivo. Elevada nos casos
109
inflamatórios. Referência: até 3mg/g fezes secas ou até 0,75mg/g fezes frescas.
Alterada: ausente ou acima desses valores. Revela: doença da mucosa com ulceração ou
destruição linfática; enterite, intolerância a lactose.
 Anticorpos anti- endomísio (EMA): indicado para confirmação
da Doença Celíaca. O anticorpo IgA anti-endomísio é gerado na presença de dietas com
glúten. Possui quase 100% de sensibilidade e especificidade para Doença Celíaca.
Referencias: ausentes. IgA, IgG,IgM.
 Anticorpo anti-transglutaminase (mais sensível que antiendomísio): IgA e IgG. Presente
em disfunção intestinal ligada a doença celíaca. Também são anticorpos IgA, com
sensibilidade de 90% e especificidade de 95%.
 Teste do suor (cloretos): específico para diagnostico de Fibrose Cística- doença genética
na qual as glândulas que produzem muco, suor e enzimas digestivas apresentam
funcionalmente anormais. Referencia: 5-60 mEq/l.
(OUTRO MATERIAL)
AVALIAÇÃO/ABORDAGEM DO PACIENTE:
A avaliação diagnóstica deve ser racionalmente dirigida por uma anamnese e um
exame físico minuciosos. Quando tal estratégia nada revela, com frequência os exames
simples de triagem estão assegurados para direcionar a escolha para exames mais
complexos. A anamnese, o exame físico e os exames de sangue rotineiros devem tentar
caracterizar o mecanismo da diarreia, identificar as associações valiosas para o
diagnóstico e avaliar os estados hidroeletrolíticos e nutricional do paciente. Os pacientes
devem ser inquiridos sobre o inicio, duração, padrão, fatores agravantes e atenuantes,
bem como as características das fezes diarreicas. Deve-se observar a presença ou a
ausência de incontinência fecal, febre, perda ponderal, dor, determinadas exposições
(viagem, medicamentos, contatos com diarreia) e as manifestações extras intestinais
comuns (alterações cutâneas, artralgias, aftas orais). Antecedentes familiares de DII ou
ESPRU podem indicar tais possibilidades.
Uma prova terapêutica costuma ser apropriada, definitiva e tem uma razão
custo/benefício altamente favorável, quando um diagnóstico específico é sugerido na
consulta inicial com o médico. A persistência dos sintomas exigem exames adicionais.
Os pacientes em que se suspeita da síndrome do intestino irritável devem ser
inicialmente avaliados com SIGMOIDOSCOPIA FLEXÍVEL e BIÓPSIAS
COLORRETAIS; aqueles com achados normais poderiam se tranquilizados e, conforme
indicado, tratados empiricamente com ANTIESPASMÓDICOS, ANTIDIARRÉICOS,
AGENTES FORMADORES DE MASSA, ANSIOLÍTICOS ou ANTIDEPRESSIVOS.
Qualquer paciente que se apresente com diarreia crônica e hematoquezia devem
seravaliados com exames microbiológicos fecais e colonoscopia.
Estima-se que em 66% dos casos a causa de diarreia crônica permanece incerta depois
da consulta inicial, sendo necessários exames adicionais. A coleta quantitativa e a
análise das fezes podem fornecer dados objetivos importantes, que podem definir o
diagnóstico ou caracterizar o tipo de diarreia como uma triagem para exames adicionais
específicos. Quando o peso fecal é maior que 200gramas/dia, devem ser efetuadas
análises fecais adicionais que possam incluir a concentração de eletrólitos, pH, pesquisa
de sangue oculto, de leucócitos, quantificação de lipídios e triagem para laxativos.

110
DIARREIA SECRETORA:
o Exames microbiológicos: culturas bacterianas fecais (Aeromonas e
Pleisiomonas), exame parasitológico de fezes para detectar ovos e parasitos e o ensaio
para antígeno de Giardia.
o Avaliações para hormônios peptídicos: gastrina sérica, PIV, calcitonina, e
hormônio estimulante da tireoide/hormônio tireoidiano ou histamina.
DIARREIA OSMÓTICA:
o Testes para intolerância à lactose e ingestão de magnésio;
o Má absorção de carboidratos pH fecal baixo
o Má absorção de lactose  teste com lactose no ar exalado ou por uma prova
terapêutica com a exclusão da lactose e observação do efeito de uma carga de lactose;
DIARREIA GORDUROSA:
o Endoscopia com biópsia de intestino delgado + aspirado para Giardia +
procedimentos quantitativos; inconclusivo ?radiografia de intestino delgado 
negativo ? ou suspeita de doença pancreática? testes diretos (estimulação com
secretina-colecistocinina) para exclusão da insuficiência pancreática exócrina ;
DIARREIA INFLAMATÓRIA:
o Presença de sangue ou leucócitos nas fezes  COPROCULTURAS, EXAME
PARASITOLÓGICO DE FEZES para a detecção de ovos e parasitos, ENSAIO PARA
A TOXINA DO C.DIFFICILE, COLONOSCOPIA com BIÓPSIAS e, quando indicado,
exames do intestino delgado com contraste oral.

111
112
 Tratamento
O tratamento da diarreia crônica depende da etiologia específica e pode ser:
 CURATIVO: quando a causa pode ser erradicada, como a ressecção de um câncer
colorretal, a administração de antibiótico para doença de Whipple ou espru tropical, ou
a suspensão do uso de um fármaco.
 SUPRESSOR: em muitos distúrbios crônicos, a diarreia pode ser controlada por
supressão do mecanismo subjacente. Os exemplos consistem na eliminação da lactose
alimentar na deficiência de lactase ou de glúten na doença celíaca;/ uso de
glicocorticoides ou outros antiinflamatórios na doença inflamatória intestinal
idiopática;/ agentes adsortivos, como a colestiramina para a má absorção ileal de ácidos
biliares;/ os IBPS, como o omeprazol para a hipersecreção gástrica dos gastrinomas;/
análogos da somatostatina como a octreotida para o tumor carcinoide maligno (além da
síndrome do esvaziamento rápido, diarreia induzida por quimioterapia e AIDS);/
inibidores das PGS, como a indometacina para o carcinoma medular da tireoide;/ e a
reposição de enzimas pancreáticas para a disfunção pancreática.
 EMPÍRICO: quando não se consegue diagnosticar a causa ou o mecanismo especifico
da diarreia crônica. Os opiáceos leves, como o difenoxilato ou a loperamida, são
frequentemente valiosos na diarreia aquosa leve ou moderada. Para aqueles com diarreia
mais grave, a codeína ou a tintura de ópio podem ser benéficas. Esses agentes
antimotilidade devem ser evitados na doença inflamatória intestinal grave, porque
poderiam precipitar megacólon tóxico. A clonidina, um agonista alfa 2 adrenérgico (tem
efeito sobre a motilidade e o transporte intestinal), pode permitir o controle da diarreia
diabética.
 Em todos os pacientes com diarreia crônica, A REPOSIÇÃO HIDROELETROLÍTICA
É UM COMPONENTE IMPORTANTE DO TRATAMENTO. A reposição de
vitaminas lipossolúveis também pode ser necessária nos pacientes com
ESTEATORREIA crônica.
 Uso de probióticos, bactérias aparentemente boas (certas cepas de lactobacilos). Ao
modificar a flora do cólon, esses agentes podem estimular a imunidade local e a
velocidade da resolução da diarreia do viajante, da associada à antibióticos e da diarreia
infantil. Os fitoterápicos para a diarreia incluem aqueles que contem berberina (hidraste,
uva-espim), que parecem estimular a absorção de líquidos e eletrólitos. VER
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO SOBRE PROBIÓTICOS
 Agentes modificadores de fezes, tais como o PSÍLIO, alteram a consistência das fezes,
mas não reduzem seu peso. Podem ser úteis em pacientes com incontinência fecal
coexistente e em alguns pacientes com baixo peso das fezes. A mudança das fezes de
aquosas para semiformadas pode ser suficiente para aliviar os sintomas. Além disso, a
PECTINA pode atrasar o trânsito através do intestino proximal e aumentar a
viscosidade luminal, servindo assim como um tratamento empírico adjuvante.
Repercussões na Conduta de Uma Família que
Convive com Criança em Tratamento de Diarreia
Crônica.
113
Necessidade de orientação com nutricionista
Dieta: alimentas caros, exige esforço de toda a família para não contaminar os
alimentos com o glúten.
Dificuldade com crianças: escolas, festas
Crianças com imunidade baixa, perca de peso.
 CONVIVENDO/PROGNÓSTICO
Saber conviver com a diarreia é, também, saber trata-la. Siga à risca as orientações
médicas e livre-se o quanto antes do problema. Veja algumas medidas caseiras que você
pode adotar para acelerar o tratamento e a recuperação:
 Beba de 8 a 10 copos de líquidos leves todos os dias
 Beba pelo menos um copo de líquido toda vez que você tiver uma evacuação sem
controle
 Faça refeições pequenas ao longo do dia, em vez de três refeições grandes
 Coma alimentos salgados, como bolachas, sopa e bebidas energéticas
 Coma alimentos ricos em potássio, como banana, batata sem pele e suco de fruta
diluído. Esses alimentos e outros alimentos, como maçãs, são conhecidos como os que
“seguram o intestino”
 Descanse bem.
Se você apresenta uma forma crônica de diarreia, como aquela causada pela
síndrome do intestino irritável, tente enriquecer a dieta com grãos e farelos integrais
para dar consistência às fezes e regular os intestinos.
Se você está amamentando seu bebê, continue a fazê-lo mesmo com a diarreia.
 PREVENÇÃO
Diarreia associada a antibióticos pode ser prevenida com o uso de suplementos
que contêm bactérias benéficas. Para saber mais sobre isso, converse com seu médico.
Iogurte com culturas vivas ou ativas são uma boa fonte dessas bactérias benéficas e
também ajudam a evitar a diarreia.
As seguintes medidas de saúde podem ajudar na prevenção de doenças que
provocam diarreia:
 Lave as mãos com frequência, principalmente após ir ao banheiro e antes de comer
 Use álcool em gel para desinfetar as mãos com frequência
 Ensine as crianças a não levar objetos à boca.
Ao viajar para áreas subdesenvolvidas, siga as medidas abaixo para evitar a diarreia:
 Beba somente água mineral e não use gelo, a menos que ele seja feito com água mineral
 Evite vegetais não cozidos ou frutas com casca
 Evite frutos do mar crus ou carne malpassada
 Evite o consumo de lacticínios, principalmente se tiver intolerância à lactose

PRINCIPAIS PATOLOGIAS PARA SE PENSAR EM


DIARREIA CRÔNICA
 Doença Celíaca
Doença celíaca, também chamada espru celíaco, espru não tropical, e enteropatia
sensível ao glúten, é uma condição inflamatória do intestino delgado, precipitada pela

114
ingestão de trigo, centeio, aveia e cevada em indivíduos com certas predisposições
genéticas.
É uma doença autoimune dependente de linfócitos T e da autoimunidade humoral.
Está associada ao complexo de histocompatibilidade tipo II. Constitui uma causa
comum de má absorção de um ou mais nutrientes. São grupos de alto risco para doença
celíaca parentes de primeiro grau e indivíduos com diabetes mellitus tipo 1, doença
autoimune da tireóide, cirrose biliar primária, síndrome de Turner e Síndrome de Down.
Cerca de 10% dos pacientes diagnosticados com síndrome do intestino irritável ou
colite microscópica tem doença celíaca. O glúten não desaparece quando os alimentos
são assados ou cozidos, e por isto a dieta deve ser seguida à risca. O Glúten agride e
danifica as vilosidades do intestino delgado e prejudica a absorção dos alimentos.
A idade do inicio dos sintomas pode variar desde o primeiro ano de vida até a
oitava década. A Doença Celíaca acomete indivíduos de qualquer idade e de ambos os
sexos, com predomínio do feminino(3:1), geralmente na raça branca.
A marca registrada da doença celíaca é a presença de uma biópsia anormal do
intestino delgado e a resposta dessa entidade - sintomas e as alterações histológicas na
biopsia intestinal - após a eliminação do glúten da dieta.
As alterações histológicas exibem uma variação da gravidade da região proximal -
paradistal do intestino, que reflete provavelmente a exposição da mucosa intestinal a
quantidades variáveis de glúten da dieta; os sintomas não se correlacionam
necessariamente com as alterações histológicas, particularmente tendo em vista que
muitos pacientes com diagnóstico recente de doença celíaca podem ser assintomáticos.
 Etiologia
A etiologia da doença celíaca é desconhecida, porém fatores ambientais,
imunológicos e genéticos parecem ser importantes e contribuem para essa doença. Um
fator AMBIENTAL é a associação clara da doença com a GLIADINA, um componente
do glúten que esta presente no trigo, na cevada e no centeio.
Um componente imunológico na patogenia da doença celíaca é critico e envolve
respostas imunes tanto inatas quanto adaptativas. Anticorpos séricos – anticorpos IgA
antigliadina, IgA antiendomisiais e IgA anti-tTG – estão presentes, porem não sabemos
se esses anticorpos são primários ou secundários ao dano tecidual. Os estudos dos
anticorpos são usados com frequência para identificar pacientes com doença celíaca; os
pacientes com esses anticorpos devem ser submetidos a uma biópsia duodenal.
Fatores GENÉTICOS também estão envolvidos na doença celíaca. Todos os
pacientes com doença celíaca expressam o alelo HLA-DQ2 ou HLA-DQ8, apesar de
apenas uma pequena minoria das pessoas que expressam DQ2/DQ8 sofrerem de doença
celíaca. A ausência de DQ2/DQ8 exclui o diagnóstico dessa enfermidade.
Fisiopatologia
Fatores ambientais e genéticos são importantes no desenvolvimento da doença
celíaca. A fração protéica solúvel em álcool do glúten do trigo, as gliadinas, e
prolaminas similares no centeio e na cevada deflagram a inflamação intestinal em
indivíduos suscetíveis. Aveia, um cereal que contém prolaminas ricas em glutamina,
mas não em prolina, é raramente tóxica.
As GLIADINAS e as PROLAMINAS similares com alto conteúdo de PROLINA
são relativamente resistentes à digestão por proteases humanas. Um peptídeo com 33
aminoácidos, produto natural da digestão da ALFA 2 GLIADINA, pode ser importante
na patogênese da doença celíaca. Esse peptídeo resiste à digestão terminal pelas
proteases da borda em escova intestinal e contém 3 epítopos antigênicos previamente
identificados. O peptídeo também reage com TRANSGLUTAMINASE TECIDUAL e

115
estimula clones de linfócitos T intestinais restringidos por HLA DQ2 de indivíduos com
doença celíaca.
Foi constatado que aproximadamente 15% dos parentes de primeiro grau de
indivíduos afetados têm doença celíaca. Predisposição à sensibilidade ao glúten foi
mapeada até a região HLA-D no cromossomo 6. Mais de 90% dos indivíduos com
doença celíaca possuem o heterodímero DQ2 codificado pelos alelos DQA1*0501 e
DQB1*0201, em comparação com 20-30% dos controles. Um grupo celíaco menor é
portador de HLA-DQ8.
Pesquisas no genoma favorecem a existência de um locus de forte suscetibilidade
para doença celíaca na região HLA-D. Loci não-HLA foram implicados, mas ainda não
foram identificados. A proteína DQ2 expressa nas células apresentadoras de antígenos
tem sítios de ligação carregados positivamente; o tTG (o autoantígeno reconhecido pelo
antiendomísio EMA) pode aumentar a inflamação intestinal pela desamidação de
resíduos selecionados de GLUTAMINA na GLIADINA para ácido glutâmico carregado
NEGATIVAMENTE.
Na forma desamidada, a maior parte dos peptídeos de GLIADINA apresentam
uma afinidade de ligação mais ALTA por DQ2 e são estimulantes mais potentes DE
LINFÓCITOS T sensibilizados por glúten. A atrofia das vilosidades pode ser causada
pela inflamação que é deflagrada pela liberação de GAMA INTERFERON DE
CÉLULAS TCD4 DQ2 ou DQ8 restritas na lâmina própria. Alternativamente, linfócitos
intraepiteliais podem destruir diretamente células epiteliais intestinais sob a influência
da IL15 liberada dos enterócitos estressados.
 Mecanismos da Diarreia
A diarreia da doença celíaca tem vários mecanismos patogenéticos. A diarreia
pode ser secundária a (1) esteatorreia, que representa essencialmente o resultado das
modificações na função da mucosa jejunal; (2) deficiência de lactase secundária, uma
consequência das mudanças na função enzimática da borda em escova jejunal; (3) má
absorção de ácidos biliares, resultando em secreção de líquidos induzida por ácidos
biliares no colo, nos casos com doença mais extensa que acomete o íleo; e (4) secreção
de líquidos endógenos que resulta de hiperplasia das criptas. Os pacientes com
acometimento mais grave pela doença celíaca podem obter uma melhora temporária
com uma restrição de lactose e de gorduras da dieta enquanto se espera pelos efeitos
plenos da restrição total de glúten, que constitui a terapia primária.
 Manifestações Clínicas
Um número muito maior de indivíduos tem manifestações que não estão
obviamente relacionadas com a má absorção intestinal, como, por exemplo, anemia,
osteopenia, infertilidade, sintomas neurológicos (“doença celíaca atípica”), enquanto um
grupo ainda maior é essencialmente assintomático, embora com histopatologia do
intestino delgado e sorologia anormais, sendo a condição designada como doença
celíaca “silenciosa”.
Os sintomas variam desde má absorção significativa de vários nutrientes, com
diarreia, esteatorreia, perda de peso e as consequências da depleção nutricional (isto é,
anemia e doença óssea metabólica), até ausência de quaisquer sintomas gastrintestinais,
mas com evidência de depleção de um único nutriente (p. ex. deficiência de ferro ou de
folato, osteomalacia, edema devido a perda de proteínas). Foram identificados parentes
assintomáticos de pacientes com doença celíaca que tem essa doença seja por biópsia do
intestino delgado, seja por estudos sorológicos [p. ex. anticorpos antiendomisiais,
transglutamina tecidual (tTG)].

116
Comumente, a doença celíaca se manifesta precocemente na vida do indivíduo,
por volta dos 2 anos de idade, depois da introdução do trigo na alimentação; ou, mais
tarde, na segunda até a quarta décadas de vida. Contudo, a doença celíaca pode
manifestar-se em qualquer idade. A amamentação e o tempo de introdução do trigo na
dieta (4 a 6 meses de idade) podem reduzir o risco ou atrasar o início de doença celíaca
em crianças sob risco. Cerca de metade dos adultos com doença celíaca nos Estados
Unidos se apresenta com ANEMIA OU OSTEOPOROSE, sem diarreia ou outros
sintomas gastrointestinais. É provável que esses indivíduos tenham doença proximal
que compromete a absorção de ferro, folato e cálcio, mas com uma área de superfície
adequada no restante do intestino para absorção dos demais nutrientes.
Outras manifestações extra intestinais da doença celíaca são: RASH (dermatite
herpetiforme), DISTÚRBIOS NEUROLÓGICOS (neuropatia periférica, ataxia,
epilepsia), DISTÚRBIOS PSIQUIÁTRICOS (depressão, paranoia) e DISTÚRBIOS DA
REPRODUÇÃO (infertilidade, abortamento espontâneo), BAIXA ESTATURA,
HIPOPLASIA DE ESMALTE DENTÁRIO, HEPATITE CRÔNICA OU
CARDIOMIOPATIA.
Indivíduos com envolvimento significativo da mucosa apresentam-se com
DIARREIA AQUOSA, PERDA DE PESO OU RETARDO DO CRESCIMENTO e
com as manifestações clinicas de deficiências de vitaminas e sais minerais. Ocorre má
absorção para todos nutrientes, mais notavelmente carboidratos, gorduras, proteínas,
eletrólitos, vitaminas lipossolúveis, cálcio, magnésio, ferro, folato e zinco. Deficiência
de cobalamina (10% dos pacientes) é mais comum do que se pensava antes;
habitualmente, esse problema é corrigido por dieta com exclusão de glúten. Indivíduos
sintomáticos necessitam de suplementação de vitamina B12.
A diarreia é causada por muitos mecanismos, incluindo:
 Diminuição da área de superfície para absorção de água e eletrólitos;
 Efeito osmótico dos nutrientes não absorvidos no lúmen intestinal;
 Aumento da área de superfície para secreção de cloreto (hiperplasia da cripta);
 Estimulação da secreção de liquido intestinal por mediadores inflamatórios e ácidos
graxos não absorvidos.
Alguns indivíduos se apresentam com deficiência na secreção das ENZIMAS
PANCREÁTICAS, causada pela liberação diminuída de COLECISTOCININA da
mucosa, ou pelo supercrescimento bacteriano que pode contribuir para a diarreia.
 CLÁSSICA
É frequente na faixa pediátrica, surgindo entre o primeiro e terceiro ano de vida,
ao introduzirmos alimentação à base de papinha de pão, sopinhas de macarrão e
bolachas, entre outros industrializados com cereais proibidos.
Caracteriza-se pela diarreia crônica, desnutrição com déficit do crescimento,
anemia ferropriva não curável, emagrecimento e falta de apetite, esteatorreia, distensão
abdominal (barriga inchada), vômitos, dor abdominal, osteoporose, esterilidade, abortos
de repetição, glúteos atrofiados, pernas e braços finos, apatia, desnutrição aguda que
podem levar o paciente à morte na falta de diagnóstico e tratamento, edema periférico e
desidratação.
Outras manifestações: erupção (dermatite herpetiforme), distúrbios neurológicos
(miopatia, epilepsia), distúrbios psiquiátricos (depressão, paranoia) e distúrbios de
reprodução (infertilidade, aborto espontâneo).
*Indivíduos com comprometimento significativo da mucosa apresentam: diarreia
aquosa, perda de peso ou retardo do crescimento, e com as manifestações clínicas de
deficiência de vitaminas e nutrientes.

117
Ocorre má absorção de todos os nutrientes, mais notável a de carboidratos, gorduras,
proteínas, eletrólitos, vitaminas lipossolúveis, cálcio, magnésio, ferro, folato e zinco.
A deficiência de cobalamina é corrigida pela exclusão de glúten da dieta.
A diarreia é causada por vários mecanismos: diminuição da área de absorção de água
e eletrólitos, efeito osmótico dos nutrientes não-absorvidos no lúmen intestinal,
aumento da área de secreção de cloro e a estimulação liquido intestinal de mediadores
inflamatórios e ácidos graxos não absorvidos.
Alguns indivíduos se apresentam com deficiência na secreção das enzimas
pancreáticas, causada pela liberação diminuída de colecistocinina da mucosa, ou pelo
supercrescimento bacteriano que pode contribuir para a diarreia.
 NÃO CLÁSSICA
Apresenta manifestações monossintomáticas, e as alterações gastrintestinais não
chamam tanto a atenção. Pode ser, por exemplo, anemia resistente a ferroterapia,
irritabilidade, fadiga, baixo ganho de peso e estatura, prisão de ventre, constipação
intestinal crônica, manchas e alteração do esmalte dental, esterilidade e osteoporose
antes da menopausa.
 ASSINTOMÁTICA
Há ainda, a doença na forma assintomática. São realizados nestes casos, exames
(marcadores sorológicos) em familiares de primeiro grau do celíaco, que têm mais
chances de apresentar a doença (10%). Se não tratada a doença, podem surgir
complicações como o câncer do intestino, anemia, osteoporose, abortos de repetição e
esterilidade.
 Diagnóstico
O diagnóstico é feito por meio de alterações características encontradas em
espécime de biópsia do intestino delgado e que melhoram quando uma dieta sem glúten
é instituída. Achatamento da mucosa pode ser observada endoscopicamente por
REDUÇÃO DAS PREGAS duodenais ou calceteamento duodenal.
Características encontradas na biópsia intestinal incluem:
• AUSÊNCIA DE VILOSIDADES;
• HIPERPLASIA DE CRIPTA;
• AUMENTO DOS LINFÓCITOS INTRAEPITELIAIS;
• INFILTRAÇÃO DA LÂMINA PRÓPRIA POR CÉLULAS PLASMÁTICAS E
LINFÓCITOS.

118
Marcadores sorológicos para doença celíaca são úteis na confirmação do
diagnóstico, no rastreamento de parentes de primeiro grau, e no monitoramento da
resposta à uma dieta sem glúten. Anticorpos IGA EMA, detectados por
imunofluorescência indireta, são altamente sensíveis (90%) e específicos (90-100%)
para doença celíaca ativa em testes laboratoriais qualificados. Um ensaio
imunoenzimático ELISA para detecção de anticorpos contra tTG apresenta
sensibilidade semelhante à do teste EMA e é menos dependente do operador.
Um novo ensaio do tipo DOT BLOT contra tTG recombinante humana reage aos
anticorpos IGA e IGG, aumentando a especificidade para quase 100%. Pacientes com
doença leve podem ser negativos nos estudos de anticorpos. Em casos duvidosos
(sorologia negativa e biópsia duvidosa ou sorologia positiva e biópsia normal) a
genotipagem de HLA é útil para excluir o diagnóstico de doença celíaca nos indivíduos
que não apresentam o gene DQ2 ou DQ8.
O primeiro teste a surgir foi o anticorpo anti-gliadina, porém atualmente dá-se
preferência ao anticorpo anti-endomísio ou anti-transglutaminase tecidual que são mais
sensíveis e específicos para a doença.
Exames laboratoriais, como anticorpos antigliadina, antiendomísio e
antitransglutaminase positivos sugerem DC, embora altamente precisos e confiáveis,
são insuficientes para um diagnóstico.
PADRÃO OURO: biópsia intestinal.
O diagnóstico deverá ser confirmado por biópsia do intestino delgado com no
mínimo a coleta deele fragmentos.
Na biópsia intestinal, os achados característicos são: ausência de vilosidades,
hiperplasia das criptas, aumento dos linfócitos intra-epiteliais e infiltração da lâmina
própria por plasmócitos e linfócitos.
Marcadores sorológicos têm importância na triagem de parentes de primeiro grau
da doença celíaca e no acompanhamento da dieta com exclusão de glúten.
Anticorpos IgAanti-EMA detectados por imunoflorescência direta são sensíveis
(90%) e específicos (90 a 100%) para doença celíaca ativa.
O teste ELISA para detectar anticorpos anti-tTG tem igual sensibilidade ao teste
EMA, e depende menos da habilidade do técnico.
 Classificação de MARSH
É uma classificação histológica (microscópica) do estado da mucosa intestinal no
que se refere à Doença Celíaca. Ela leva em conta o grau de atrofia e a presença de
células inflamatórias. Sua graduação vai de 0 (normal) a 3 (3ª, 3b, 3c). O estágio 3c
significa atrofia total. Mesmo no grau mais avançado de atrofia pode haver regressão
para o normal com a dieta sem glúten.
As mudanças patológicas clássicas do intestino delgado são categorizadas através
da "classificação Marsh";
 Estágio Marsh 0: mucosa normal
 Estágio Marsh 1: número aumentado de linfócitos intra-epiteliais, geralmente mais
de 20 a cada 100 enterócitos
 Estágio Marsh 2: proliferação das criptas de Lieberkuhn
 Estágio Marsh 3: atrofia completa ou parcial das vilosidades
 Estágio Marsh 4: hipoplasia da arquitetura do intestino delgado
As mudanças geralmente melhoram ou são revertidas após o glúten ser removido
da dieta, devendo ser realizada diversas biópsias meses (4 a 6) após o início da exclusão
do glúten

119
 Tratamento
O tratamento consiste em dieta sem glúten que se prolongará pelo resto da vida do
paciente. Os cereais de trigo, centeio e cevada devem ser excluídos da dieta. Arroz e
milho são bem tolerados. Aveia (se não estiver contaminada com trigo) é tolerada pela
maioria. O encaminhamento precoce a um grupo de apoio de doença celíaca costuma
ser útil na manutenção da aderência á dieta. Por causa da deficiência secundária de
lactase, deve-se recomendar uma dieta sem lactose até que os sintomas melhorem.
Todos os indivíduos com doença celíaca devem ser rastreados para deficiências de
vitaminas e minerais e realizar uma densitometria óssea. Dos indivíduos com doença
celíaca, 70% têm osteopenia. As deficiências documentadas de vitaminas e minerais
devem ser repostas, e mulheres em idade fértil devem tomar suplementos de ácido
fólico.
A dieta sem glúten é o único tratamento possível para a DC. O paciente celíaco
que continuar ingerindo alimentos com glúten apresenta maior risco de desenvolver
outras doenças, como doenças de rins, pele e até câncer. A dieta deve ser seguida para o
resto da vida.
Deve-se repor os nutrientes que estão em níveis baixos.
Glicocorticoides.
Deve-se tomar cuidado com a contaminação dos alimentos com glúten, pois sabe-
se que, mesmo traços do glúten, podem desencadear os sintomas. Em casa, deve-se
separar os produtos que contém glúten dos que não contém. Lembrar que, sem proceder
limpeza adequada, utensílios utilizados para manuseio e preparação de produtos com
glúten poderão contaminar alimentos sem glúten. Recomenda-se que alimentos
geralmente consumidos com pães (geleias, margarinas, maioneses, entre outros)
também sejam de uso exclusivo do paciente celíaco.
Após suspensão do glúten da dieta, a recuperação da mucosa inicia-se
imediatamente, mas o tempo para o total restabelecimento anatômico da mucosa leva
vários meses (1 a 2 anos em média).
 Alimentos que contém glúten
Aqui está uma lista com alguns exemplos de alimentos com glúten, que não podem ser
consumidos em caso de intolerância ao glúten:
 Pão, torrada, bolacha, biscoito, massas, bolos,
 Cerveja, pizza, salgadinhos, cachorro quente, hambúrguer;
 Gérmen de trigo, triguilho, sêmola de trigo;
 Queijos, ketchup, maionese, shoyo;
 Salsicha, temperos industrializados;
 Cereais, barrinha de cereais, xaropes e alguns remédios.
 Hóstia distribuída na igreja católica;
 Molhos branco;
 sopas desidratadas ou temperos prontos;

120
 Intolerância à Lactose
Na maioria dos mamíferos a atividade da enzima lactase diminui na parede
intestinal após o desmame, caracterizando a hipolactasia primária que provoca sintomas
de intolerância à lactose. A intensidade dos sintomas de distensão, flatulência, dor
abdominal e diarreia variam, dependendo da quantidade de lactose ingerida, e
aumentam com o passar da idade. A hipolactasia é determinada geneticamente, porém
uma mutação ocorreu para que fizesse parte da humanidade tolerar o leite na idade
adulta. O diagnóstico é feito por teste de tolerância, empregando a lactose como desafio.
Com a descoberta dos finlandeses do polimorfismo associado com a persistência da
lactase, principalmente no norte da Europa, o exame genético passou a ser outra
ferramenta diagnóstica mais confortável para o intolerante. No Brasil, a hipolactasia é
mais frequente entre os negros e japoneses. Entretanto, na prática clínica indivíduos
com hipolactasia podem ser orientados a consumir alguns derivados do leite e alimentos
contendo lactose sem apresentar sintomas de intolerância, enquanto que outros terão que
fazer restrição de lactose na dieta.
A lactose é um dissacarídeo muito comum em nossa alimentação, advindo do leite
integral de vaca e de seus derivados. Esse dissacarídeo é composto por 2
monossacarídeos: a glicose e a galactose. Porém, para a digestão e absorção completa
da lactose, há necessidade de plena atividade das enzimas digestivas. Para isso, o
organismo lança mão de duas enzimas, a amilase salivar e a lactase. Os produtos desta
digestão (glicose e galactose) são totalmente absorvidos no intestino delgado e vão para
corrente sanguínea.
 Conceito
Má absorção ou má digestão de lactose é a diminuição na capacidade de hidrolisar
a lactose, que é resultante da hipolactasia. A hipolactasia significa diminuição da
atividade de enzima lactase na mucosa do intestino delgado, também denominada
recentemente de “lactase não persistente”. O aparecimento de sintomas abdominais por
má absorção de lactose caracteriza a intolerância à lactose. A má absorção de lactose
nem sempre provoca sintomas de intolerância à lactose. Após o desmame, ocorre uma
redução geneticamente programada e irreversível da atividade da lactase na maioria das
populações do mundo, cujo mecanismo é desconhecido, resultando em má absorção
primária de lactose. Porém, a hipolactasia também pode ser secundária a doenças que
causem dano na borda em escova da mucosa do intestino delgado ou que aumentem
significativamente o tempo de trânsito intestinal, como nas enterites infecciosas,
giardíase4, doença celíaca, doença inflamatória intestinal (especialmente doença de
Crohn), enterites induzidas por drogas ou radiação, doença diverticular do cólon e
anemia (estudo em ratos, mostrando diminuição na expressão gênica). Diferentemente
da hipolactasia primária do adulto, a hipolactasia secundária é transitória e reversível.
Embora, muitas vezes, sejam usados como sinônimos, é importante estabelecer
diferença entre a intolerância, a alergia e a sensibilidade, pois suas conseqüências são
bem diferentes, indo desde um mal estar até o risco de morte.
A alergia é uma resposta imunológica do organismo a algum componente
alimentar.

121
A intolerância é uma reação adversa que envolve digestão, absorção e
metabolismo de algum componente do alimento.
A sensibilidade é uma resposta anormal do organismo, que pode provocar
sintomas e reações parecidas com a alergia.
 Fisiopatologia
A lactose é encontrada apenas no leite materno, apresentando diferentes
concentrações nos mamíferos. No intestino humano, os níveis de lactase são baixos até
a 27ª-32ª semana de gestação, quando se elevam, rapidamente, começando a cair por
volta dos cinco anos de idade. Desta forma, os bebês prematuros nascidos com 28 a 32
semanas de gestação têm atividade reduzida de lactase, porém se forem de outra
maneira saudáveis, o cólon pode recuperar os carboidratos não absorvidos, prevenindo a
desnutrição e diarreia.
A enzima lactase hidrolisa a lactose em glicose e galactose que são absorvidas
pela mucosa intestinal. A glicose entra para o pool de glicose do intestino, e a galactose
é metabolizada no fígado para ser convertida em glicose, e entrar nesse pool. Caso a
galactose não seja metabolizada no fígado, o é pelos eritrócitos, ou é eliminada na urina.
A concentração de enzima lactase na mucosa intestinal varia, com atividade no duodeno
40% menor do que no jejuno. A lactose, não sendo hidrolisada, não é absorvida no
intestino delgado e passa rapidamente para o cólon. No cólon, a lactose é convertida em
ácidos graxos de cadeia curta, gás carbônico e gás hidrogênio pelas bactérias da flora,
produzindo acetato, butirato e propionato. Os ácidos graxos são absorvidos pela mucosa
colônica, desta forma recuperando a lactose mal absorvida para utilização energética.
Os gases, após absorção intestinal, são expirados pelo pulmão, servindo como
ferramenta diagnóstica. Esta fermentação da lactose pela flora bacteriana leva ao
aumento do trânsito intestinal e da pressão intracolônica, podendo ocasionar dor
abdominal e sensação de inchaço no abdome. A acidificação do conteúdo colônico e o
aumento da carga osmótica no íleo e cólon resultante da lactose não absorvida leva à
grande secreção de eletrólitos e fluidos, além do aumento do trânsito intestinal,
resultando em fezes amolecidas e diarreia. Apesar da falta de evidências, alguns autores
acreditam que a absorção da lactose nos pacientes com hipolactasia poderia ser
favorecida pela sua metabolização pela flora intestinal.
 Intolerância à lactose congênita
É herdada e autossômica recessiva, sendo uma condição extremamente grave.
Caso não seja diagnosticada precocemente pode levar ao óbito. O recém-nascido
apresenta diarreia líquida ao ser amamentado ou receber fórmulas, contendo lactose. O
estudo genético realizado com 24 famílias finlandesas mostrou que se deve a mutações
no gene LCT que codifica a enzima lactase. Com dieta restritiva de lactose os sintomas
desaparecem e esses recém-nascidos têm crescimento normal. A diferença entre a
hipolactasia primária do adulto e a intolerância à lactose congênita é molecular: na
primeira, a enzima lactase é normal, mas diminui a expressão ao longo da vida; na
segunda a enzima lactase está ausente, ou é truncada.
 Fisiopatologia

122
A lactose é um dissacarídeo composto de glicose e galactose, formado pelas
glândulas mamárias dos mamíferos através da glicose para suprir o componente
carboidrato durante a lactação. Sua concentração no leite varia de acordo com o tipo de
mamífero, sendo de 7% no leite de vaca.
Quando a lactose chega à luz intestinal, deverá ser hidrolizada em
monossacarídeos pela lactase, que é uma endoenzima presente na borda em escova da
mucosa (células epiteliais de revestimento do intestino). A digestão deste carboidrato
ocorre em todo o delgado, porém, sua atividade é grande no jejuno proximal, pequena
no duodeno e jejuno distal e praticamente ausente no íleo terminal.
A absorção da glicose e galactose é feita em velocidades diferentes. O fator
determinante da velocidade máxima de absorção da lactose depende da quantidade de
lactase presente na mucosa intestinal. Os monossacarídeos resultantes da hidrólise da
glicose e da galactose, passam através da mucosa e são transportados de maneira ativa
até a corrente sanguínea. Ambos, glicose e galactose, dependem do sódio para serem
transportadas. Quando estão na corrente sanguínea, caminham pela veia porta até o
fígado, onde são metabolizados.
A lactase, em condições de normalidade, está presente nas células distais das
vilosidades da mucosa intestinal, para efetuar a digestão da lactose. Sua ausência causa
uma diarréia osmótica pela permanência de lactose não digerida na luz intestinal, com
produção de quantidades anormais de hidrogênio, ácido lático, ácido acético e pela
decomposição bacteriana.
A presença na luz intestinal de um conteúdo osmoticamente superior à
osmolaridade das células da mucosa determina a passagem de água e, em menor
proporção, de eletrólitos, destas células para a luz entérica, a fim de igualar a pressão
osmótica. Assim, grandes quantidades de carboidratos, digeridos ou não, quando não
são absorvidos, retêm grande quantidade de água na luz intestinal na tentativa de
isotonicidade. Quando a quantidade de eletrólitos perdida é menor do que a de água, as
evacuações costumam ser liquidas.
A deficiência da enzima lactase pode se manifestar apenas quando o individuo
aumenta a ingestão de leite e derivados ou quando se associa outra causa potencial de
diarréia, como a vagotomia ou a ressecção gástrica. Sua manifestação se mantém latente
enquanto a quantidade de lactose da alimentação for pequena. Nestes casos a lactose
será metabolizada pela lactase produzida, ainda que em pequenas quantidades, pelas
vilosidades da mucosa intestinal. Embora os níveis de lactase sejam normais na
infância, estes indivíduos, quando adultos, passam a apresentar níveis baixos dessa
enzima. Essa diminuição de quantidade e de atividade da lactase intestinal é
determinada por fatores genéticos. No entanto, sofre a influência, também, de fatores
ambientais, tais como, na presença de desnutrição, parasitoses, infecções intestinais e
alcoolismo. Por outro lado em alguns casos, ela pode representar uma resposta
adaptativa à diminuição de ingestão de laticínios.
Como a enzima lactase está localizada nas células da mucosa intestinal, sua
deficiência secundária, ocorre nas doenças associadas às alterações morfológicas desta
mucosa, em especial, na jejunal. Pode advir, por exemplo, da doença celíaca, do espru
tropical, das infecções intestinais agudas e da toxicidade por antibióticos, em geral, a

123
neomicina. Na infância, essa deficiência pode ser secundária às infecções entéricas ou à
cirurgia abdominal.
 Sintomas
Os sintomas típicos incluem dor abdominal, sensação de inchaço no abdome,
flatulência, diarreia, borborigmos e, particularmente nos jovens, vômitos. A dor
abdominal pode ser em cólica e frequentemente é localizada na região periumbilical ou
quadrante inferior. O borborigmo pode ser audível no exame físico e para o paciente. As
fezes usualmente são volumosas, espumosas e aquosas. Uma característica importante é
que estes indivíduos, mesmo com quadro de diarreia crônica, geralmente não perdem
peso. Em alguns casos a motilidade gastrintestinal está diminuída e os indivíduos
podem se apresentar com constipação, possivelmente como consequência da produção
de metano.
Alguns autores também acreditam que a intolerância à lactose seja responsável
por diversos sintomas sistêmicos, como dores de cabeça e vertigens, perda de
concentração, dificuldade de memória de curto prazo, dores musculares e articulares,
cansaço intenso, alergias diversas, arritmia cardíaca, úlceras orais, dor de garganta e
aumento da frequência de micção. Na presença de sintomas sistêmicos, é preciso avaliar
se de fato decorrem da intolerância à lactose, se são sintomas coincidentes ou se
decorrem de alergia à proteína do leite de vaca (que afeta até 20% dos pacientes com
sintomas sugestivos de intolerância à lactose).
Existe uma grande variabilidade de sintomas entre os pacientes com intolerância à
lactose. Os fatores responsáveis por esta variabilidade incluem a osmolalidade e
conteúdo de gordura do alimento no qual o açúcar é ingerido, o esvaziamento gástrico, a
sensibilidade à distensão abdominal produzida pela carga osmótica da lactose não
hidrolizada no intestino delgado superior, o trânsito intestinal e a resposta do cólon à
carga de carboidrato. De uma maneira geral, os alimentos com alta osmolalidade e
conteúdo de gordura diminuem o esvaziamento gástrico e reduzem a gravidade dos
sintomas induzidos pela lactose. Para alguns autores, a flora fecal poderia se adaptar ao
aumento crônico da lactose na dieta, reduzindo a incidência e intensidade dos sintomas
após carga do carboidrato, porém a melhora dos sintomas pode ocorrer independente da
adaptação bacteriana, dificultando muitas vezes a suspeita diagnóstica de intolerância à
lactose.
 Métodos diagnósticos
Os testes de tolerância à lactose são realizados com desafio, o paciente ingere de
25g a 50g de lactose e se avalia os sintomas por duas a três horas. A técnica mais
difundida nos laboratórios de análises clínicas é a por curva glicêmica. Nesta técnica, é
coletada a glicemia em jejum e depois é feita uma curva. Se o paciente absorver a
lactose, a glicemia deve se elevar de 1,4 mmol/l ou mais22.
O teste respiratório do hidrogênio expirado é considerado PADRÃO-OURO para
o diagnóstico de intolerância à lactose, seguindo o primeiro Consenso de Roma para
metodologia e indicações de teste respiratório do hidrogênio expirado para doenças
gastrintestinais. O paciente tem que fazer o preparo na véspera, só podendo ingerir dieta
não fermentativa com restrição total de lactose, sem fumar (o cigarro aumenta o

124
hidrogênio expirado). Deve também evitar antibióticos por um mês antes do exame (a
presença da flora bacteriana é essencial para a produção do hidrogênio), não pode fazer
exercícios físicos (aumentam o hidrogênio expirado) e tem que se apresentar para o
exame com jejum de 10 a 12 horas, podendo ingerir água. A sensibilidade do exame é
de 80% a 92,3% e a especificidade 100% com 25g de lactose, desde que o preparo
esteja correto. A flora bacteriana colônica fica com atividade diminuída em pH ácido (é
esse o pH das fezes quando se dá a fermentação da lactose), podendo neste pH o exame
ser falso-negativo. O exame se baseia na produção de hidrogênio pela fermentação da
lactose não absorvida: o hidrogênio entra na corrente sanguínea e é expirado pelo
pulmão. O paciente sopra o basal, ingere a lactose, e depois sopra novamente após 60,
90, 120, 150 e 180 minutos, sendo considerado o exame positivo quando ocorre
aumento de hidrogênio expirado em 20 ppm (partes por milhão) em relação ao valor
basal. O paciente intolerante relata sintomas durante o exame, geralmente coincidindo
com aumento do hidrogênio expirado. A leitura é feita em cromatógrafo gasoso
específico para o hidrogênio. Em aproximadamente 15% dos pacientes predomina flora
produtora de metano: Methanobrevibacter smithii, o hidrogênio não se eleva. Os
pacientes com flora produtora de metano têm sintomas mais leves. Com a validação do
polimorfismo LCT-13910C>T, o exame genético passou a incorporar a rotina de
exames de laboratório para diagnosticar hipolactasia. Na Europa o exame é feito com kit
MutaReal Lactase Test que utiliza o PCR em tempo real, e com kit GenoType LCT que
se baseia na hibridização dos produtos de PCR de PCR multiplex com sondas selvagens
e mutantes aderidas às tiras de nitrocelulose. O kit que emprega hibridização reversa
não sofre interferência dos polimorfismos africanos observados nos pacientes da raça
negra imigrantes da África que vivem na Europa, e que provocam um desvio da curva
de melting por PCR em tempo real, sendo considerado melhor. No Brasil foi implantada
na rotina laboratorial do Hospital das Clínicas da FMUSP técnica que emprega PCR
convencional e tratamento do produto de PCR com enzima de restrição (RFLPPCR). A
concordância pelo Índice Kappa com teste respiratório do hidrogênio foi alta,
apresentando 100% de sensibilidade e 96% de especificidade. A técnica de PCR-RFLP
também é utilizada por outros autores na Europa. O diagnóstico que se baseia em medir
a atividade da enzima lactase em biópsia intestinal com kit Quick Lactase Test, embora
também tenha apresentado sensibilidade e especificidade de 100% com teste genético
de hipolactasia, é um exame invasivo74, dependendo de endoscopia para a coleta da
biópsia da segunda porção do duodeno, e a atividade da enzima lactase no duodeno é
menor que no jejuno.
 Tratamento
Nos pacientes com lactase não persistente, o tratamento é considerado
exclusivamente naqueles com sintomas de intolerância à lactose. Inicialmente se
recomenda evitar temporariamente leite e produtos lácteos da dieta para se obter
remissão dos sintomas. As maiores concentrações de lactose se encontram no leite e
sorvete, enquanto que os queijos geralmente contêm quantidades menores.
A exclusão total e definitiva da lactose da dieta deve ser evitada, pois pode
acarretar prejuízo nutricional de cálcio, fósforo e vitaminas, podendo estar associada

125
com diminuição da densidade mineral óssea e fraturas. Além disto, a maioria das
pessoas intolerantes à lactose pode ingerir 12 g / dia de lactose (equivalente a um copo
de leite) sem apresentar sintomas adversos. Para evitar os prejuízos nutricionais
decorrentes da exclusão total e definitiva da lactose da dieta, após exclusão inicial de
lactose, geralmente é recomendada a sua reintrodução gradual de acordo com o limiar
sintomático de cada indivíduo. Nesta fase, algumas medidas não farmacológicas podem
auxiliar na elevação deste limiar e contribuir para adaptação à lactose, como por
exemplo, a sua ingestão junto com outros alimentos, o seu fracionamento ao longo do
dia e o consumo de produtos lácteos fermentados e maturados.
Caso estas medidas não funcionem para reduzir os sintomas de intolerância à
lactose, medidas farmacológicas podem ser adotadas. A terapia de reposição enzimática
com lactase exógena (+β-galactosidase), obtida de leveduras ou fungos, constitui uma
possível estratégia para a deficiência primária de lactose. Estes preparados comerciais
de “lactase”, quando adicionados a alimentos que contenham lactose ou ingeridos com
refeições com lactose, são capazes de reduzir os sintomas e os valores de hidrogênio
expirado em muitos indivíduos intolerantes à lactose. Entretanto, estes produtos não são
capazes de hidrolisar completamente toda a lactose da dieta com resultados variáveis em
cada paciente. As “lactases” exógenas estão disponíveis comercialmente na forma
líquida e em cápsulas e tabletes, e possivelmente as diferentes preparações não são
equivalentes. A enzima solúvel pode ser adicionada ao leite que é então refrigerado de
um dia para o outro antes do uso (porém pouco prático para uso frequente). Existem
também leites comerciais com baixo teor de lactose (pré-incubado com lactose já
hidrolisada). Apesar dos trabalhos enfatizarem a eficácia das formulações líquidas de
“lactase” na melhora dos sintomas e na redução do hidrogênio expirado, a taxa real de
eficácia apresenta resultados discrepantes, que decorrem do tipo de microorganismo
utilizado, da contribuição da atividade residual da lactase da mucosa intestinal, e da
dose de reposição utilizada. As preparações em cápsulas e tabletes utilizadas na hora da
refeição são mais caras que o leite pré-hidrolisado, porém são eficazes, palatáveis, de
fácil uso e praticamente sem efeitos colaterais, sendo uma boa alternativa para reposição
enzimática nos pacientes intolerantes à lactose. Os sintomas da síndrome do intestino
irritável e da intolerância à lactose são muito parecidos e de fato, as duas condições
podem coexistir. Nos pacientes com intolerância à lactose que não apresentam melhora
com dieta restrita de lactose, a presença de síndrome do intestino irritável subjacente
deve ser aventada.
A ingestão de pró-bióticos contendo lactase teria o potencial de auxiliar na
digestão da lactose nos indivíduos intolerantes, no entanto os estudos que avaliaram o
benefício de sua utilização apresentaram resultados discordantes Como mencionado
previamente, nos pacientes com intolerância à lactose e redução do consumo de leite e
derivados, é importante avaliar se a ingestão diária de cálcio está adequada. O cálcio
deve ser suplementado caso esteja insuficiente na dieta, com monitorização e
suplementação se necessário também de vitamina D. Iogurtes com culturas vivas que
contém beta-galactosidase endógena são uma fonte alternativa de calorias e cálcio e
podem ser bem tolerado por muitos pacientes intolerantes.

126
127
 Uso das enzimas digestivas
No caso da intolerância à lactose, o uso do suplemento da enzima lactase é muito
comum e eficaz, já que supre a deficiência desta enzima no organismo e possibilita,
assim, a digestão da lactose. A lactase pode ser encontrada sob a forma de pastilhas
mastigáveis, em pó, comprimidos ou cápsulas em diversas farmácias convencionais, de
manipulação ou ainda em lojas de produtos naturais. A dose administrada vai depender
da quantidade de lactose a ser ingerida e da capacidade do seu organismo em produzir
mais ou menos lactase. Já no caso da alergia às proteínas do leite de vaca, o uso das
enzimas digestivas ainda não é muito comum. Entretanto, alguns estudos já estão sendo
realizados a fim de elucidar melhor o real papel de algumas enzimas na melhora dos
sintomas causados pelos alimentos alergênicos
 Doença de Whipple (DW)
Infecção crônica, de caráter multi-sistêmico e recidivante causada pelo bacilo
gram positivo diástase-resistente Tropheryma Whipplei, relacionado filogeneticamente
com o Mycobacetrium avium é designada por Doença de Whipple (DW)
 Epidemiologia
Desconhecemos o habitat natural do Trophryma Whipplei. A sua relação
filogenética com bactérias presentes no ambiente e o facto de ter sido detectada no solo
(o que pode ria explicar uma maior prevalência entre os agricultores) e em águas de
esgoto parecem sugerir uma fonte ambiental. Por outro lado, existem evidências de que
esta bactéria possa pertencer à flora comensal humana: estudos de PCR permitiram
detectar a presença do Tropheryma Whiplei em amostras de saliva, suco gástrico e em
biópsias duodenais de indivíduos sem a doença. No entanto, à luz dos conhecimentos
actuais, esta controvérsia permanece por resolver aguardando-se que novos estudos
possam vir a esclarecer esta dúvida.
A DW é uma doença rara mas a verdadeira incidência da doença ainda não é
conhecida.
 Etiopatogenia
A etiologia da DW permaneceu desconhecida até há bem pouco tempo, embora
houvesse fortes suspeitas de ter origem bacteriana.
Vários investigadores indicam como provável uma susceptibilidade individual ao
organismo, ou seja, parece haver um defeito na imunidade celular, envolvendo a
activação e interacção dos macrófagos com os linfócitos T, que resultaria na deficiente
fagocitose e degradação intracelular do bacilo, permitindo a sua disseminação a partir
do aparelho gastrointestinal. De facto, estes doentes apresentam macrófagos com
incapacidade de degradar o microorganismo a nível intracelular bem como uma resposta
deficiente de hipersensibilidade cutânea retardada. Esta alteração dos macrófagos
resulta da existência de um défice da expressão de proteínas membranares do receptor 3
alfa da cadeia do complemento (CD11b), um dos responsáveis pela fagocitose
intracelular. Nestes doentes existe também um defeito intrínseco na produção de IL-12,
o que induz uma menor produção de INF-G e, consequentemente, uma diminuição de
produção de imunoglobulinas G2 e da capacidade de fagocitose intracelular dos
macrófagos intestinais. Assim, parece que a alta concentração de bactérias viáveis na

128
mucosa intestinal está relacionada com o defeito de imunidade celular, caracterizada
pela deficiência de resposta Tr 1 e da presença reduzida de linfócitos CD4+ na lâmina
própria. Este facto sugere que a mucosa intestinal seja a porta de entrada do bacilo.
 Quadro Clínico
A DW é uma doença sistémica com manifestações clínicas variadas mas que
atinge de modo particular o intestino delgado.
A forma mais comum de apresentação é uma síndrome de má absorção com
diarreia e perda ponderal, podendo originar, se não for tratada, estados de caquexia. A
diarreia é, frequentemente, do tipo esteatorreia com fezes volumosas. As manifestações
clínicas mais frequentemente associadas à diarreia são a dor abdominal, a febre e
linfadenopatias periféricas e abdominais (mesentéricas e retroperitoniais). Em casos
raros podem surgir linfomas malignos nos doentes com DW.
As queixas osteoarticulares surgem em cerca de 90% dos doentes, sendo
predominantemente oligo ou poliartralgias simétricas, migratórias e de curta duração;
geralmente precedem o diagnóstico em cerca de 10 anos (nalguns casos em mais de 30
anos).
Em 45% dos doentes com DW, o Sistema Nervoso Central (SNC) é também
atingido pela infecção. O SNC é afetado de forma isolada em apenas 5% dos doentes.
Em aproximadamente 15 a 20% dos doentes as queixas gastrintestinais são frustres e a
DW pode manifestar-se simplesmente através das alterações neurológicas. As alterações
neurológicas mais frequentes da DW são distúrbios cognitivos, e dos movimentos
oculares, alterações do movimento (mioclonias) e alterações hipotalâmicas. Esta doença
ainda se pode manifestar sob a forma de convulsões, alterações neurológicas focais e
alterações da linguagem (disfasia).
As manifestações cardíacas são sobretudo endocardites, miocardites e
pericardites, sendo a válvula mitral a mais frequentemente atingida pela infecção53.
Outras manifestações raras da DW são: hiperpigmentação da pele, uveíte, vitreíte,
neurite, rectobulbar e papiledema.
 Diagnóstico
Em caso de suspeita de DW o procedimento imediato para diagnóstico é a
endoscopia digestiva alta. Os achados endoscópicos mais frequentes são o espessamento
das pregas da mucosa, com exsudados esbranquiçados confluentes alternando com
erosões e áreas de friabilidade da mucosa. Deve-se proceder à colheita para análise
histológica de pelo menos cinco biópsias ao longo da mucosa duodenal proximal e
distal e do jejuno próxima. O padrão histológico clássico da doença caracteriza-se pela
presença, na lâmina própria, de infiltrados de macrófagos de citoplasma granular com
inclusões PAS positivas e diástase resistentes (que correspondem a restos mais ou
menos intactos de bactérias fagocitadas), podendo também observar-se dilatação
linfática. Contudo, a presença de macrófagos com material PAS positivo não é
patognomônico desta doença.
A imunohistoquímica é outra ferramenta que pode contribuir para o diagnóstico.
Apresenta boa sensibilidade diagnóstica e permite, com o recurso a anticorpos, detectar
o bacilo em macrófagos circulantes no sangue periférico.

129
O estudo serológico é, por enquanto, considerado como um método com baixa
sensibilidade e especificidade para ser útil ao diagnóstico.

 Tratamento
A DW não tratada pode ser fatal. Com antibioterapia os doentes geralmente
evoluem com melhoria clínica e laboratorial. Devido à relativa falta de experiência no
tratamento da doença e dada a inexistência de trabalhos prospectivos sobre o tipo e a
duração do esquema terapêutico, não existe atualmente um consenso quanto aos
antibióticos a utilizar38. Sabemos que as recidivas da DW podem ocorrer vários anos
após a suspensão da antibioterapia (mesmo que o tratamento inicial tenha sido eficaz),
surgindo com maior frequência nos doentes com envolvimento do SNC e nos doentes
tratados com um único tipo de antibiótico ou com um antibiótico que não ultrapasse a
barreira hematocefálica (BH), como é o caso das penicilinas orais e das tetraciclinas.
Vários autores recomendam a utilização, pelo menos durante um ano, de antibióticos
que ultrapassem a BH uma vez que o SNC é frequentemente atingido e está envolvido
com maior frequência nas recidivas de DW.
 Fibrose Cística
A fibrose cística (FC) é uma doença genética de transmissão autossômico-
recessiva, cujas manifestações clínicas resultam da disfunção de uma proteína
denominada proteína reguladora da condutância transmembrana na fibrose cística ou
Cystic Fibrosis Transmembrane Condutance Regulator (CFTR). Esta proteína é
encontrada na membrana apical de células epiteliais do trato respiratório, de glândulas
submucosas, do pâncreas exócrino, do fígado, dos ductos sudoríparos e do trato
reprodutivo, entre outros sítios. Nestes locais, a sua principal função é agir como canal
de cloro, regulando o balanço entre íons e água através do epitélio. Embora o problema
básico seja o mesmo, o impacto deste comprometimento é diferente de um órgão para
outro.
A síndrome clínica consequente à diminuição ou à perda da função da CFTR é
multissistêmica e tem uma ampla gama de manifestações. A forma clássica da FC,
associada com a função da CFTR essencialmente ausente, é caracterizada por
insuficiência pancreática exócrina, doença sino-pulmonar crônica e progressiva e
concentração elevada de cloretos no suor, sendo esta última usada na confirmação

130
diagnóstica através do teste do suor. Em outro extremo, estão casos classificados como
"fibrose cística atípica" nas quais as manifestações são mais sutis, muitas vezes únicas
(pacientes monossintomáticos) e o teste do suor revela concentração de cloretos na faixa
limítrofe ou na faixa da normalidade. Estes últimos são um grande desafio para a
confirmação diagnóstica, que algumas vezes é feita só na vida adulta.
Quando a fibrose cística foi descoberta, em 1938, poucas crianças chegavam até
um ano de idade. A realidade hoje é bastante diferente, graças ao maior conhecimento
sobre a fisiopatologia desta doença, que tem permitido inúmeros avanços em relação ao
diagnóstico e ao tratamento, e modificado o prognóstico tanto em relação à expectativa,
quanto à qualidade de vida.
A FC é uma doença monogênica, cujo gene se localiza no braço longo do
cromossoma 7, locus q 31, éxon 102. Como é uma doença de herança autossômico-
recessiva, o doente precisa ser homozigoto para mutações causadoras de FC, tendo
recebido uma mutação do pai e outra da mãe. Quando ambos os pais são carreadores, ou
seja, possuem uma única mutação para FC, eles não têm a doença e apresentam 25% de
chance de gerar uma criança com FC em cada gestação. Se a criança não nascer com
FC, há 50% de chance de ela ser carreadora e 25% de ser homozigota normal.
O gene responsável pela FC codifica a proteína CFTR, composta de 1480
aminoácidos. Quando foram descobertos, tanto a proteína quanto o gene receberam a
denominação de Cystic Fibrosis Condutance Regulator devido à sua suposta função. A
CFTR atua, principalmente, como um canal de cloro regulado pela adenosina cíclica
monofosfato (AMPc), mas parece ser capaz de regular outros canais iônicos,
envolvendo-se intimamente na composição do fluido da superfície epitelial. Apesar do
grande número de mutações, muitas são raras. A mais frequente e mais estudada é a
F508del, previamente chamada ΔF508, que corresponde à ausência de 3 nucleotídeos
sequenciais (uma citosina e duas timinas), levando à deleção (del) de um resíduo de
fenilalanina (F) na posição 508 da proteína.
A descoberta do gene da FC estimulou os estudos da relação potencial entre o
genótipo e o fenótipo desta doença. Tem-se tentado classificar as mutações de acordo
com o mecanismo pelo qual elas comprometem a biossíntese da proteína CFTR e
correlacioná-las com diferentes expressões fenotípicas da FC. A correlação entre o grau
de comprometimento da CFTR e as manifestações varia entre os diferentes
componentes clínicos e é mais clara para o estado da função pancreática exócrina e
menos diretamente associada com as manifestações pulmonares. (Fig.4)

131
Figura 4: Manifestações da doença de acordo com a função residual da CFTR
como um resultado da combinação de mutações graves ou brandas no genótipo. IP:
Insuficiência pancreática, SP: Suficiência pancreática; ACVD: Agenesia Congênita de
Vasos Deferentes.
Quatro classes de mutação da CFTR levando a variados graus nos canais de cloro
com:
- Na DF508: produção de uma proteína anormal que não é liberada
adequadamente do retículo endoplasmático.
- Aumento da viscosidade das secreções exócrinas.
- Bloqueio da reabsorção do cloro nas glândulas sudoríparas, tornando o suor
hipertônico.
 Fisiopatologia e Manifestações Clínicas
A disfunção da proteína CFTR diminui a permeabilidade da membrana celular ao
cloreto, trazendo dificuldades ao transporte e à secreção deste íon. Consequentemente, a
concentração de cloretos na membrana apical das células epiteliais se eleva. Cada órgão
que depende da proteína CFTR - pulmões, pâncreas, intestino, glândulas sudoríparas e
vasos deferentes - expressa esta disfunção de maneira diferente, de acordo com a
sensibilidade de cada um deles ao déficit funcional. Os tecidos dos canais deferentes são
os que mais exigem o funcionamento adequado da CFTR, seguidos das glândulas
sudoríparas e do pâncreas.
Os tecidos dos canais deferentes requerem pelo menos 10% de proteína CFTR
normal para o seu desenvolvimento. A agenesia bilateral dos canais deferentes ocorre
quase universalmente em homens com FC e a esterilidade pode ser a única apresentação
de formas atípicas desta doença.
O próximo tecido mais sensível ao déficit da CFTR é o dos ductos das glândulas
sudoríparas, que requer cerca de 5% de proteína CFTR normal para reabsorver os
cloretos adequadamente. Sua disfunção resulta no acúmulo deste íon no suor, assim
como do sódio, cuja reabsorção também fica prejudicada. A perda aumentada de
líquidos e eletrólitos pode provocar diferentes manifestações clínicas. É comum a
queixa de suor salgado, algumas vezes com depósitos de cristais de sal na pele. Em
momentos de calor, a sudorese excessiva, com ou sem diarreia, pode levar a perdas
maciças de sódio provocando desidratação grave, com risco de evoluir para choque ou
coma, ameaçando a vida do paciente.
Algumas mutações da FC causam disfunção de mais de 99% da CFTR,
acarretando no comprometimento funcional do pâncreas exócrino. A CFTR é necessária
para a passagem de ânions e, consequentemente, água para o lúmen dos ductos
pancreáticos. No lúmen, os cloretos são trocados por bicarbonato. O comprometimento
da CFTR resulta na redução do conteúdo hídrico da secreção pancreática e em maior
acidez da mesma. Estas alterações contribuem para obstrução dos ductos pancreáticos e
autólise e fibrose do pâncreas. A intensidade deste processo determina a progressão da
doença pancreática. A lesão pancreática pode começar intrauterinamente e continuar
após o nascimento, na infância ou mais tarde, até que todo o tecido pancreático acinar
seja destruído.

132
Estima-se que 85-90% dos pacientes com FC têm insuficiência pancreática, sendo
a síndrome disabsortiva a apresentação clássica. A manifestação mais sugestiva de
disabsorção é a esteatorreia, que se caracteriza por fezes volumosas, oleosas e de odor
forte. Esta apresentação tem alto valor preditivo positivo para o diagnóstico de
insuficiência pancreática exócrina, mas nem sempre está presente. Às vezes, os sinais
clínicos de esteatorreia não são evidentes e a única manifestação de disabsorção é a
dificuldade de ganho ponderal. O comprometimento nutricional é uma das
manifestações iniciais mais comuns da FC, mas poucas vezes este diagnóstico é
considerado quando o paciente apresenta apenas esta manifestação.
Supõe-se que o ganho inadequado de peso na FC seja causado por balanço
energético negativo, resultante não só da má absorção de nutrientes causada pela
insuficiência pancreática exócrina, mas também da doença respiratória crônica e do
aumento da taxa de metabolismo basal. A insuficiência pancreática exócrina também
pode se manifestar por sinais e sintomas relacionados à perda proteica e à deficiência de
vitaminas lipossolúveis. Em lactentes, principalmente nos menores de 6 meses, a
primeira manifestação de FC pode ser uma síndrome de edema e hipoproteinemia,
algumas vezes associada à anemia hemolítica e esteatose hepática. Alguns pacientes
com insuficiência pancreática exócrina também desenvolvem disfunção do pâncreas
endócrino evolutivamente, manifestando o diabetes relacionado à FC (DRFC). O
mecanismo do DRFC é único e compartilha características tanto do diabetes insulino-
dependente como do diabetes por resistência periférica à insulina. O DRFC se
desenvolve com maior frequência em pessoas com insuficiência pancreática exócrina,
homozigotas para F508del e do sexo feminino.

No fígado, a CFTR se localiza na superfície das células dos pequenos ductos


biliares. Neste sítio, a secreção de cloretos, seguida passivamente de água, mantém a
solubilidade dos sais e das proteínas biliares, facilitando sua movimentação em direção
aos ductos biliares e à vesícula. Diante do déficit funcional da CFTR, os ductos biliares
tornam-se obstruídos pela secreção espessa, podendo resultar em cirrose hepática34. No
período neonatal, a obstrução dos ductos biliares extra-hepáticos por bile espessa leva à
estase intra-hepática, que pode se manifestar como icterícia prolongada. Este quadro,
conhecido como "síndrome da bile espessa", pode se assemelhar, clínica e

133
laboratorialmente, ao de atresia de vias biliares. Pode ocorrer ainda hepatomegalia com
esteatose secundária à desnutrição proteico‑calórica, à deficiência de ácidos graxos
essenciais, carnitina ou colina ou a resistência insulínica. Cálculos biliares são mais
prevalentes em pacientes com FC do que em indivíduos normais.
No intestino, a CFTR é único canal de cloro da membrana celular apical da
maioria das regiões. Sua disfunção compromete a secreção de cloretos para o lúmen
intestinal, o que, em indivíduos normais, se acompanha da movimentação de água para
a mesma região. Em consequência, o material fecal fica espesso, contribuindo para a
ocorrência de síndromes obstrutivas intestinais relacionadas à FC: íleo meconial,
obstrução intestinal distal e constipação. O íleo meconial é uma forma de apresentação
clínica precoce da FC que incide em 15 a 20% dos pacientes e é mais comum naqueles
com insuficiência pancreática. Quando ocorre, o recém-nascido não elimina mecônio,
apresenta distensão abdominal e vômitos biliosos. A radiografia abdominal revela
distensão de alças intestinais, com níveis hidroaéreos, podendo haver imagem "em vidro
fosco" no hipogástrio. A síndrome de obstrução intestinal distal, também conhecida
como equivalente de íleo meconial, corresponde à obstrução colônica distal transitória,
provocada pela passagem do material fecal espesso. Este quadro é mais comum em
pacientes mais velhos. A síndrome de obstrução intestinal distal é definida como
obstrução fecal aguda, completa ou incompleta, na região íleo-cecal, enquanto a
constipação é definida como impactação fecal gradual em todo o cólon.
O acometimento pulmonar difere do de outros órgãos em inúmeros aspectos, a
começar pela falta de linearidade observada entre o grau de disfunção da CFTR e a
gravidade da doença pulmonar. No entanto, a doença pulmonar é a principal causa de
morbidade e mortalidade na FC. Embora já tenham sido evidenciadas algumas
alterações pulmonares pré-natais, os pulmões são considerados praticamente normais ao
nascimento. Após o nascimento, um ciclo de obstrução, infecção e inflamação se
estabelece e acarreta danos progressivos. Trabalhos evidenciam que a inflamação e
remodelamento brônquico podem começar a ocorrer tão cedo, quanto em poucos dias de
vida.
Em condições não patológicas, ocorre nos pulmões um fluxo contínuo de sódio da
superfície luminal através do canal apical de sódio para o meio intracelular e,
posteriormente, para o interstício, por ação de uma bomba dependente de adenosina
trifosfato (ATP). Simultaneamente, há entrada de sódio, cloro e potássio na porção basal
da célula. O cloro acumula-se acima do gradiente eletroquímico intracelular e sai para o
lúmen, através do canal de cloro (CFTR) da membrana apical. O fluxo de água
transepitelial é produto do balanço do transporte desses íons. Na FC, devido à disfunção
da CFTR, a membrana apical torna-se impermeável ao cloro, dificultando a sua saída.
Como esta se acompanha normalmente de movimentação de água, a hidratação da
superfície celular fica comprometida. Para manter a neutralidade elétrica, ocorre um
influxo compensatório de sódio para as células, seguido de água, o que acentua ainda
mais a desidratação da superfície celular. O resultado deste processo é o muco espesso,
característica marcante desta doença que, por este motivo, já foi denominada
mucoviscidose. O espessamento da secreção leva à obstrução das vias aéreas e
compromete os mecanismos locais de defesa, facilitando a ocorrência de infecções.

134
A tosse é o principal sintoma inicial da FC. Inicialmente é intermitente,
aparecendo em decorrência de infecções respiratórias agudas. Costuma ser pior à noite e
pela manhã. É comum a ocorrência de pansinusite, com sintomas de vias aéreas altas
associados: obstrução nasal, peso na face, cefaleia. Algumas vezes, a tosse também
pode ocorrer acompanhada de sibilância e dispneia, na forma de uma síndrome de
bronquiolite, apresentação particularmente comum em lactentes. Os episódios de tosse
tendem a durar mais do que o esperado pela doença aguda e, com o passar do tempo,
tornam-se cada vez mais frequentes. A tosse, aos poucos, passa a ser produtiva e
persistente, caracterizando a doença pulmonar crônica e supurativa. O escarro espesso,
aos poucos, assume aspecto purulento, amarelado ou esverdeado.
 Manifestações clínicas
 Extremamente variadas;
 Forma clássica.
 Tosse crônica;  Desnutrição;
 Diarréia crônica;  Suor salgado.
Doença pulmonar (90%): tosse crônica, infecções respiratórias recorrentes, perda
progressiva da função pulmonar.
Insuficiência do pâncreas exócrino: diarréia crônica, fezes volumosas, brilhantes,
gordurosas e fétidas (85 a 90%).
 Fibrose cística suspeita diagnóstica: Manifestações fenotípicas características
Respiratórias
 Tosse crônica;  Bronquiectasias;
 Lactente chiador;  Infecção por P. aeruginosa
 “Pneumonias” de Mucóide;
repetição/crônicas;  Pólipos nasais;
 Colapso principalmente de  Pansinusite crônica.
LSD;

 Manifestações fenotípicas características Digestivas


 Íleo meconial;  Prolapso retal;
 Colestase neonatal prolongada;  Síndrome da obstrução
 Esteatorréia (insuficiência intestinal distal;
pancreática);  Cirrose hepática biliar;
 Desnutrição grave  Focal;
(edema/anemia);  Multilobular.
 Outras manifestações clínicas
 Icterícia neonatal  Esterilidade: 98% dos
prolongada; homens e em torno de 60% das
 Crescimento deficiente; mulheres;
 Puberdade tardia;  Pancreatite;
 Diabetes mellitus;
 Cirrose.
 Manifestações fenotípicas características: Metabólicas e outras

135
 Baqueteamento digital;
 Baixa estatura;
 Suor salgado;
 Cristais de sal na pele;
 Desidratação: hiponatremia (perda de sal);
 Alcalose hipocalêmica (S. de Bartter);
 Hipoprotrombinemia;
 Edema: hipoalbuminemia;
 Azoospermia obstrutiva.
 Diagnóstico
 Quadro clínico sugestivo e/ou;
 História familiar de fibrose cística e/ou;
 Teste de triagem neonatal alterado.
 Triagem neonatal (teste do pezinho)
Feito rotineiramente para 3 doenças congênitas, deve incluir a triagem para FC.
 Exame: dosagem da tripsina imunorreativa (TIR) em papel-filtro;
 Interpretação.
 Resultado de 1ª amostra ≥ 70 ng/ml;
 Alterado (solicitar rapidamente nova amostra para confirmação).
 Resultado de 2ª amostra alterado, realizar o teste do suor.
 Laboratório - papel filtro
Quando o resultado da segunda amostra estiver também alterado ou coleta com
mais de 45 dias de vida: a criança é encaminhada para realização do “teste do suor”.
 Teste do suor
 Dois testes em ocasiões diferentes, podendo ser no mesmo dia;
 Resultado ≥ 60 mEq/ml → positivo no recém-nascido (criança é encaminhada
para consulta médica).
 Duvidoso:
- RN: >=30 a <60 mEq/L
- Outra faixa etária: >=40 a < 60 mEq/mL
 Biologia molecular
 Mais de 1.000 mutações diferentes;
 Mutação mais comum: DF508;
 Presença de 2 mutações: confirma a doença;
 Não detecção de mutações: não afasta a doença.
Encaminhamento médico
 Teste do suor positivo;
 Detecção da mutação DF 508 homozigótica: a criança será encaminhada
imediatamente, mas fará o teste do suor posteriormente;
 Detecção da mutação DF 508 heterozigótica e teste do suor negativo: criança
portadora do gene.
 Tratamento
136
Para o aporte nutricional adequado de pacientes com FC é recomendada dieta
hipercalórica, hiperproteica e hiperlipídica.
Além de garantir a reidratação e a reposição de sódio, especialmente nos dias de
calor, o esquema de tratamento da fibrose cística inclui:
 Boa nutrição do paciente, por meio de dieta rica em calorias sem restrição de
gorduras;
 Suplementação de enzimas pancreáticas para auxiliar a digestão;
 Reposição das vitaminas lipossolúveis A, D, E, K;
 Inalações diárias com soro fisiológico, broncodilatadores ou mucolíticos,
conforme as características da secreção;
 Fisioterapia respiratória para facilitar a higiene dos pulmões e evitar infecções;
 Prescrição de antibióticos em casa ou no hospital, nos casos mais graves.
 Em casos de agudização: Antibioticoterapia venosa, oral ou inalatória em doses
elevadas;
 fisioterapia respiratória;
 fluidificação da secreção.
O tratamento de fibrose cística evolui bastante nas últimas décadas. Isso garante
aos pacientes vida mais longa e de boa qualidade.

Repercussões na Conduta de Uma Família que


Convive com Criança em Tratamento de Diarreia
Crônica.
Necessidade de orientação com nutricionista
Dieta: alimentas caros, exige esforço de toda a família para não contaminar os
alimentos com o glúten.
Dificuldade com crianças: escolas, festas
Crianças com imunidade baixa, perca de peso.
 CONVIVENDO/PROGNÓSTICO
Saber conviver com a diarreia é, também, saber trata-la. Siga à risca as orientações
médicas e livre-se o quanto antes do problema. Veja algumas medidas caseiras que você
pode adotar para acelerar o tratamento e a recuperação:
 Beba de 8 a 10 copos de líquidos leves todos os dias
 Beba pelo menos um copo de líquido toda vez que você tiver uma evacuação sem
controle
 Faça refeições pequenas ao longo do dia, em vez de três refeições grandes
 Coma alimentos salgados, como bolachas, sopa e bebidas energéticas
 Coma alimentos ricos em potássio, como banana, batata sem pele e suco de fruta
diluído. Esses alimentos e outros alimentos, como maçãs, são conhecidos como os que
“seguram o intestino”
 Descanse bem.

137
Se você apresenta uma forma crônica de diarreia, como aquela causada pela
síndrome do intestino irritável, tente enriquecer a dieta com grãos e farelos integrais
para dar consistência às fezes e regular os intestinos.
Se você está amamentando seu bebê, continue a fazê-lo mesmo com a diarreia.
 PREVENÇÃO
Diarreia associada a antibióticos pode ser prevenida com o uso de suplementos
que contêm bactérias benéficas. Para saber mais sobre isso, converse com seu médico.
Iogurte com culturas vivas ou ativas são uma boa fonte dessas bactérias benéficas e
também ajudam a evitar a diarreia.
As seguintes medidas de saúde podem ajudar na prevenção de doenças que
provocam diarreia:
 Lave as mãos com frequência, principalmente após ir ao banheiro e antes de comer
 Use álcool em gel para desinfetar as mãos com frequência
 Ensine as crianças a não levar objetos à boca.
Ao viajar para áreas subdesenvolvidas, siga as medidas abaixo para evitar a diarreia:
 Beba somente água mineral e não use gelo, a menos que ele seja feito com água mineral
 Evite vegetais não cozidos ou frutas com casca
 Evite frutos do mar crus ou carne malpassada
 Evite o consumo de lacticínios, principalmente se tiver intolerância à lactose

138
Problema 6 – Doutor chega de
sofrimento!
Doença Inflamatória Intestinal (DII)
A doença intestinal inflamatória (DII) é uma condição intestinal crônica de
mediação imune. A retocolite ulcerativa (RCU) e doença de Crohn (DC) são os dois
tipos principais de DII.
As doenças inflamatórias intestinais (DII), doença de Crohn e retocolite ulcerativa
são enfermidades crônicas do trato gastrointestinal. São diagnosticadas por um grupo de
características clínica, endoscópicas radiológicas e histológicas, mas não existe nenhum
achado que, isoladamente, possibilite o diagnóstico definitivo de uma ou outra doença.
Além disso, alguns pacientes são portadores de colite indeterminada, quadro em que
não é possível firmar o diagnóstico definitivo das formas clássicas de DII.
 Epidemiologia
A incidência e a prevalência da doença de Crohn e da retocolite ulcerativa variam
com a localização geográfica; os índices mais altos são para as populações brancas da
Europa setentrional e da América do Norte.
Para ambas as doenças, a incidência é igual em homens e mulheres. A idade de
pico para surgimento dessas doenças situa-se entre 15 e 25 anos, com um menor pico
entre 55 e 65 anos. As duas doenças ocorrem na infância, embora seja baixa a
incidência antes dos 15 anos de idade.
O risco de ocorrência de retocolite ulcerativa é mais alto entre não tabagistas e
tabagistas prévios, em comparação com pessoas com tabagismo ativo. Não está
esclarecido se o inicio do tabagismo melhora os sintomas, embora tenha sido relatado
sucesso com o uso de adesivos de nicotina. Por outro lado, a incidência de fumantes é
maior entre pacientes com doença de Crohn do que na população em geral; e, em
pacientes que continuam a fumar, pode ser menor a probabilidade de resposta ao
tratamento clínico.
Os contraceptivos orais também estão relacionados com a DC, a relação (razão)
de probabilidade de DC para as usuárias de contraceptivos é de aproximadamente 1:4. A
apendicectomia é protetora contra a RCU, porém está associada a um risco aumentado
de DC. Esse risco elevado na DC é observado logo após a realização de apendicectomia
e, posteriormente, diminui, indicado que ele provavelmente reflete problemas de
diagnóstico em paciente com DC incipiente.
A DII é uma doença familiar em 5 a 10% dos pacientes. Em alguns desses
pacientes, pode haver início precoce da doença durante a primeira década de vida, e, na
DC, observa-se uma concordância nos locais anatômicos e tipos clínicos dentro das
famílias. Nos demais pacientes, a DII é observada na ausência de história familiar (isto
é, doença esporádica).
Evidências adicionais de uma predisposição genética à DII provêm de sua
associação a certas síndromes genéticas. Tanto a RCU quanto a DC estão associadas à

139
síndrome de Turner, enquanto a Síndrome de Hermansky-Pudlak associada à colite
granulomatosa, entre outras.
 Etiologia e Patogenia
Uma hipótese consensual estabelece que, nos indivíduos com predisposição
genética, tanto os fatores exógenos (p. ex., composição da microbiota intestinal normal)
quanto os fatores endógenos do hospedeiro (p. ex., função de barreira das células
epiteliais intestinais, função imune inata e adaptativa) interagem, causando um estado
crônico de função imune desregulada da mucosa, que é ainda mais modificada por
fatores ambientais específicos (p. ex., tabagismo, enteropatógenos).
Embora a ativação crônica do sistema imune da mucosa possa representar uma
resposta apropriada a um agente infeccioso não identificado, uma pesquisa desse agente
não foi, até o momento, gratificante na DII.
Assim, a DII é atualmente considerada uma resposta imune inapropriada à
microbiota comensal endógena no intestino, com ou sem algum componente de
autoimunidade.
Ainda mais importante, o intestino normal contém um grande número de células
imunes em um estado crônico denominada inflamação fisiológica, em que o intestino é
impedido de elaborar respostas imunológicas completas à microbiota comensal e
antígenos da dieta por meio de vias reguladoras muito potentes, que atuam dentro do
sistema imune. Durante a evolução das infecções no hospedeiro normal, a ativação
integral dos tecidos linfóides associados ao intestino ocorre, porém é rapidamente
sobrepujada pela atenuação da resposta imune e reparo tecidual. Na DII, esse processo
pode não estar normalmente regulado.
 Considerações Genéticas
Como as variantes causais específicas de cada gene ou lócus são, em sua maior
parte, desconhecidas, ainda não foi esclarecido se as semelhanças dos fatores de risco
genéticos associados à DC e RCU observadas são compartilhadas em nível estrutural ou
funcional. De forma semelhante, muito dos fatores de risco genéticos identificados
também são observados em associação a um risco de outras doenças imunologicamente
mediadas, sugerindo que vias imunogenéticas relacionadas estão envolvidas na
patogenia de múltiplos distúrbios diferentes, explicando a responsividade comum a
tipos semelhantes de terapias biológicas (p. ex., terapia com fator de necrose
antitumoral) e, possivelmente, ocorrência simultânea desses distúrbios.
As doenças e os fatores de risco genéticos que são compartilhados com a DII
incluem artrite reumatóide (TNFAIP3), psoríase (IL23R, IL12B), espondilite
anquilosante (IL23R), diabetes melito tipo 1 (IL10, PTPN2), asma (ORMDL3) e lúpus
eritematoso sistêmico (TNFAIP3, IL10).
Aproximadamente 15% dos pacientes com DII têm parentes de primeiro grau
acometidos pela doença, e a incidência entre parentes de primeiro grau é 30 a 100 vezes
a da população geral. As melhores estimativas dos riscos de parentes de primeiro grau
de indivíduos com DII desenvolverem a doença inferem uma chance de 3% a 9%.
Os fatores genéticos definidos até o momento que comprovadamente medeiam o
risco de DII ressaltaram a importância de vários mecanismos comuns de doença.

140
 Regulação Imune Defeituosa na DII
O sistema imune da mucosa normalmente não é reativo ao conteúdo luminal,
devido à tolerância oral (mucosa). Quando se administram antígenos solúveis por via
oral, e não por via cutânea ou intramuscular, isso induz uma ausência de responsividade
antígeno-específica. Múltiplos mecanismos estão envolvidos na indução da tolerância
oral e incluem deleção ou anergia das células T reativa a antígenos ou indução de
células T CD4+, que suprimem a inflamação intestinal (p. ex., células T reguladoras que
expressam o fator de transcrição FoxP3), que secretam citocina anti-inflamatórias, tais
como a interleucina IL 10 e o fator transformador do crescimento β (TGF-β). Na DII,
essa supressão da inflamação é alterada, resultando em inflamação descontrolada. Os
mecanismos dessa imunossupressão são regulada não estão totalmente elucidados.
Tanto na RCU quanto na DC, uma via inflamatória tende, portanto a emergir da
predisposição genética que está associada ao reconhecimento e reatividade
inapropriados do sistema imune inato a bactérias comensais, juntamente com vias
reguladoras inadequadas que levam à ativação das células T CD4+ na lâmina própria, as
quais secretam quantidades excessivas de citocinas inflamatórias em relação às citocinas
anti-inflamatórias.
 A Cascata Inflamatória na DII

141
Uma vez iniciada a DII pelo reconhecimento imune inato anormal de bactérias por
células parenquimatosas (p. ex., células epiteliais intestinais) e células hematopoiéticas
(p. ex., células dendríticas), a resposta inflamatória imune é perpetuada pela ativação
das células T.
Uma cascata sequencial de mediadores inflamatórios amplia a resposta: cada
etapa constitui um alvo potencial para terapia. As citocinas inflamatórias, como a IL-1,
a IL-6 e o TNF, exercem efeitos diversificados sobre os tecidos.
Promovem a fibrogênese, a produção de colágeno, a ativação das
metaloproteinases teciduais e a produção de outros mediadores inflamatórios; a ativam
também a cascata da coagulação nos vasos sanguíneos locais (p. ex., produção
aumentada do fator de von Willebrand). Essas citocinas são normalmente produzidas
em resposta à infecção, porém são habitualmente eliminadas ou inibidas no momento
apropriado para limitar a lesão tecidual. Na DII, a sua atividade não é regulada,
resultando em um desequilíbrio entre os mediadores pró inflamatórios e anti-
inflamatórios. Certos tratamentos, como compostos de ácidos aminossalicílico (5-ASA)
são potentes inibidores de fatores de transcrição que regulam a sua expressão.
(HARRISON)
Qualquer que seja o gatilho antigênico, linfócitos T ativados da lâmina própria
estão envolvidos na patogênese da DII. Na Doença de Crohn, os linfócitos ativados
parecem ser, basicamente, linfócitos Th1 que produzem interferon (IFN- γ). Citocinas
pró-inflamatórias, como interleucina (IL-1) e fator de necrose tumoral de um anticorpo
anti-TNF- α amplificam a resposta imune. Grandes quantidades de neutrófilos penetram
na mucosa inflamada atraídos por agentes quimiotáxicos, como IL-8 e leucotrieno B4.
Em casos de DII, a lesão epitelial parece ser decorrente de radicais livres de oxigênio
provenientes de neutrófilos e macrófagos, bem como de citocinas, tais como TNF- α e
IFN- γ. (CECIL)
 Fatores Exógenos
A DII pode ter uma etiologia infecciosa ainda não definida. Estudos
observacionais sugerem que múltiplos patógenos (p. ex., espécies de Salmonella,
Shigella, Campylobacter e Clostridium difficile) podem desencadear a DII ao induzir
uma resposta inflamatória que o sistema imune da mucosa pode ser incapaz de
controlar. Entretanto, no paciente com DII, a microbiota normal tende a ser percebida
inapropriadamente, como se fosse um patógeno. São observadas alterações na
composição da microbiota comensal tanto na DC quanto na RCU. Entretanto, não se
sabe se essas alterações são primárias ou secundárias à inflamação.
Fatores psicossociais podem contribuir para o agravamento dos sintomas. Eventos
importantes da vida, como doença ou morte na família, divórcio ou separação, conflito
interpessoal ou outra perda significativa, estão associados a um aumento nos sintomas
de DII, como dor, disfunção intestinal e sangramento. O estresso diário agudo pode
agravar os sintomas intestinais, mesmo após o controle dos eventos importantes da vida.
Quando avaliados com escalas psicológicas validadas, os pacientes com DII ativa
apresentam menor bem-estar psicológico e domínio, bem como maior angústia do que
os controles sem DII.

142
 Patologia
Retocolite ulcerativa e doença de Crohn têm um aspecto patológico característico,
entretanto esse quadro patológico pode não ser específico o suficiente para a
diferenciação entre essas duas entidades ou a distinção de outras doenças como as
colites infecciosas ou a colopatia isquêmica em alguns casos.
 Colite Ulcerativa

Retocolite
Retocolite Ulcerativa
Ulcerativa Moderada
 Características Macroscópicas
RCU é uma doença da mucosa, que acomete habitualmente o reto e estende-se
proximalmente até atingir parte do colo ou a sua totalidade. Cerca de 40 a 50% dos
pacientes apresentam doença limitada ao reto e retossigmoide, em 30 a 40%, a doença
se estende além do sigmóide, porém sem comprometer todo o colo, e, em 20%, ocorre
colite total. A disseminação proximal ocorre em continuidade, sem qualquer área de
mucosa preservada.
Embora as variações na atividade macrocópica possam sugerir áreas preservadas,
as biópsias da mucosa de aspecto normal estão habitualmente anormais. Por
conseguinte, é importante obter múltiplas biópsias da mucosa aparentemente não
acometida, tanto proximal quanto distal, durante a endoscopia. Uma ressalva é o fato de
que o tratamento clínico efetivo pode modificar o aspecto da mucosa, de modo que
áreas preservadas ou até mesmo o colo em sua totalidade podem ter aspecto
microscópico normal.
Com inflamação leve, a mucosa fica eritematosa e possui superfície
delicadamente granulosa que se assemelha a uma lixa. Na doença mais graves, a
mucosa apresenta-se hemorrágica, edemaciada e ulcerada. Na doença de longa duração,
podem existir pólipos inflamatórios (pseudopólipos) como resultado da regeneração
epitelial.
Durante a remissão, a mucosa pode evidenciar a um aspecto normal – porém, nos
pacientes com muitos anos de doença, tem um aspecto atrófico e indistinto, e o colo
inteiro fica estreitado e encurtado. Os pacientes com doença fulminante podem
desenvolver uma colite tóxica ou megacolo em que a parede intestinal se torna mais
fina, e a mucosa apresenta-se extremamente ulcerada, o que pode resultar em
perfuração.
 Características Microscópicas
143
Os achados histológicos se correlacionam muito bem com o aspecto endoscópico
e a evolução clínica da RCU. O processo fica limitado à mucosa e à submucosa
superficial, sem acometimento das camadas mais profundas, exceto na doença
fulminante (a camada muscular própria apenas é afetada em casos fulminantes da
doença).
Na RCU, duas características histológicas principais sugerem cronicidade e
ajudam a diferenciá-las da colite infecciosa ou autolimitada aguda. Primeiro, a
arquitetura das criptas no colo é distorcida; as criptas podem ser bífidas e seu número
reduzido, na maioria das vezes com uma lacuna entre as bases das criptas e a muscular
da mucosa. Segundo, alguns pacientes possuem plasmócitos basais e múltiplos
agregados linfóides basais.
Pode haver congestão vascular mucosa, com edema e hemorragia focal, assim
como infiltrado de células inflamatórias de neutrófilos, linfócitos, plasmócitos e
macrófagos. Os neutrófilos invadem o epitélio, habitualmente nas criptas, dando origem
a uma criptite e, finalmente, evoluindo para abscessos das criptas. As alterações ileais
em pacientes com ileíte por contracorrente incluem atrofia vilosa e regeneração das
criptas com inflamação aumentada, aumento da inflamação por neutrófilos e
mononucleares na lâmina própria e criptite focal e abscessos das criptas.
 Doença de Crohn

 Características Macroscópicas
A DC pode afetar qualquer parte do TGI desde a boca até o ânus. Diferentemente
da RCU, que acomete quase sempre o reto, este segmento é poupado com frequência na
DC. A doença de Crohn é segmentar com áreas poupadas no meio do intestino doente.
Fístulas, fissuras e abscessos perirretais assim como estenose anal estão presente
em 33% dos pacientes com DC, particularmente os com acometimento colônico.
Embora raramente, a DC pode acometer também o fígado e pâncreas.
Diferentemente da RCU, a DC é um processo transmural. A parede intestinal
encontra-se espessada e rígida. O mesentério, que está espessado, edemaciado e
contraído, fixa o intestino em uma posição. Inflamação transmural pode fazer com que
alças intestinais fiquem aderidas. Ocorre espessamento de todas as camadas do
intestino, e o lúmen está estenosado. “Lesões descontínuas” com duas áreas envolvidas

144
separadas por determinada extensão de intestino normal sugerem doença de Crohn. A
inflamação do cólon com preservação do reto é mais compatível com doença de Crohn
do que com retocolite ulcerativa.
A lesão mais precoce da doença de Crohn é a úlcera aftoide, que, tipicamente,
ocorre sobre placas de Peyer no intestino delgado e sobre agregados linfóides no cólon.
Com o avanço da doença, as úlceras aftoides aumentam de tamanho e tornam-se
estreladas ou serpiginosas. Por fim, as úlceras estreladas coalescem, formando úlceras
lineares longitudinais ou transversais. As ilhas remanescentes de mucosa não ulcerada
dão ao intestino um aspecto de paralelepípedo (cobblestone). Formam-se fissuras desde
a base das úlceras, estendendo-se pela muscular até a serosa.
Ao exame endoscópico, ulcerações aftosas ou pequenas e superficiais
caracterizam a doença leve; na doença mais ativa, ulcerações estreladas se fundem
longitudinal e transversalmente a fim de demarcar ilhas de mucosa, com bastante
frequência histologicamente normais. Esse aspecto de “calçamento” e característico da
DC tanto ao exame endoscópico quanto na radiografia baritada.

Como acontece na RCU, podem forma-se pseudopólipos a DC.


A DC ativa caracteriza-se por inflamação focal e formação de trajetos fistulosos
que desaparecem graças à fibrose e ao estreitamento do intestino. A parede intestinal
sofre espessamento e torna-se estreitada e fibrótica, resultando em obstruções intestinais
crônicas e recorrentes. As projeções do mesentério espessado circundam o intestino
(“gordura latejante”), e a inflamação serosa e mesentérica facilita o surgimento de
aderências e a formação de fístulas.
 Características Microscópicas
As lesões mais precoces são ulcerações aftoides e abscessos das criptas focais
com agregados indefinidos de macrófagos que formam granulomas sem caseação em
todas as camadas da parede intestinal.
Os granulomas podem ser visualizados nos linfonodos, mesentério, fígado e
pâncreas. Apesar de os granulomas serem um elemento patognomônico da DC, são
encontrados apenas raramente nas biópsias da mucosa. A ressecção cirúrgica revela
granulomas em cerca de metade dos casos.
Outras características histológicas da DC incluem agregados linfóides
submucosos ou subserosos, particularmente longe das áreas de ulceração, áreas
poupadas macroscópicas e microscópicas, bem como inflamação transmural
acompanhada por fissura que penetram profundamente na parede intestinal e, às vezes,
foram trajetos fistulosos ou abcessos locais.

145
 Manifestações Clínicas
 Retoculite Ulcerativa
 Sinais e Sintomas
Os principais sintomas de RCU são a diarreia, sangramento retal, tenesmo,
eliminação de muco e dor abdominal em cólica. A intensidade dos sintomas se
correlaciona com a extensão da doença. A RCU pode manifestar-se agudamente, porém
geralmente os sintomas já estiveram presentes por semanas a meses. Ocasionalmente, a
diarreia e o sangramento são tão intermitentes e leves que o paciente não procura
assistência médica.
Os pacientes com proctite eliminam habitualmente sangue vivo ou secreção
mucossanguinolenta, tanto misturada com fezes quanto formando estrias sobre a
superfície de fezes normais ou duras.
Relatam também tenesmo ou urgência com sensação de evacuação incompleta,
porém só raramente referem dor abdominal. Com a proctite ou proctossigmoidite, o
trânsito proximal torna-se mais lento, o que pode ser responsável pela constipação
observada comumente nos pacientes com doença distal.
Quando a doença se estende além do reto, o sangue costuma estar misturado com
as fezes, ou pode ser observada diarreia macroscopicamente sanguinolenta. A
motilidade colônica é alterada pela inflamação com trânsito rápido através do intestino
inflamado.
Quando a doença é grave, os pacientes eliminam fezes líquidas que contêm
sangue, pus e material fecal. Com frequência, a diarreia é noturna e/ou pós-prandial.
Apesar de a dor intensa não ser um sintoma proeminente, alguns pacientes com
doença ativa podem experimentar desconforto vago no baixo ventre ou ligeira cólica
abdominal central.
Cólica e dor abdominal intensas podem ocorrer nas crises mais graves da doença.
Outros sintomas na doença moderada a grave incluem anorexia, náuseas, vômitos, febre
e redução ponderal.
Os sinais físicos de proctite incluem um canal anal hipersensível e a presença de
sangue ao exame retal. Na doença mais extensa, os pacientes exibem hipersensibilidade
à palpação direita do colo. Os pacientes com colite tóxica relatam dor intensa e
sangramento, e os com megacolo evidenciam timpanismo hepático. Ambos podem ter
sinais de peritonite caso tenha ocorrido perfuração.
Em casos de retocolite ulcerativa, o sintoma dominante é a diarreia, que
comumente está associada a sangue nas fezes. As evacuações são frequentes, mas de
pequeno volume, como resultado da irritabilidade do reto inflamado. Urgência e
incontinência fecal podem limitar a capacidade do paciente em desempenhar suas
funções sociais Outros sintomas são febre e dor, que podem ocorrer no quadrante
inferior do abdome ou no reto.
Sintomas sistêmicos - febre, mal-estar e perda de peso - são mais comuns se há
envolvimento de todo o cólon ou de sua maior parte; esses sintomas podem ter maior
efeito que a diarreia na capacidade funcional do paciente.

146
 Características Laboratoriais, endoscópicas e radiográficas
A doença ativa pode ser associada a elevação dos reagentes da fase aguda
[proteína C reativa], na contagem das plaquetas, na velocidade de hemossedimentação
(VHS) assim como na redução da hemoglobina.
A lactoferrina fecal é um marcador altamente sensível e específico para detecção
de inflamação intestinal. Os níveis fecais de calprotectina se correlacionam muito bem
com a inflamação histológica, permitem prever as recaídas e a identificação de bolsite.
Pode haver leucocitose, porém não é um indicador específico de atividade da doença.
O diagnóstico baseia-se na história (anamnese) do paciente; nos sintomas clínicos,
no exame de fezes negativo para bactérias, toxina de C. difficile bem como ovos e
parasitos; aspecto sigmoidoscópico; e histologia dos espécimes de biópsias retal ou
colônica.
A sigmoidoscopia é utilizada para determinar a atividade da doença, sendo
habitualmente realizada antes do tratamento. Se o paciente não está tendo exacerbação
aguda, a colonoscopia é usada para determinar a extensão e atividade da doença. A
doença leve ao exame endoscópico caracteriza-se por eritema, diminuição do padrão
vascular e friabilidade discreta. A doença moderada caracteriza-se por eritema
acentuado, ausência de padrão vascular, friabilidade e erosões, e a doença grave, por
sangramento espontâneo e ulcerações. As características histológicas se modificam mais
lentamente que as clínicas, porém também podem ser usadas para classificar a atividade
da doença.
A alteração radiográfica mais precoce da RCU, visualizada no enema baritado, é
uma delicada granulidade mucosa. Com o aumento progressivo da gravidade, a mucosa
torna-se espessada, e acabam sendo visualizadas úlceras superficiais. As ulcerações
profundas podem aparecer como úlceras tipo “botão de camisa”, as quais indicam que a
ulceração penetrou na mucosa. Pode ocorrer o desaparecimento das haustrações,
especialmente nos pacientes com a doença de longa duração. Além disso, o colo fica
encurtado e estreitado.
A TC não é tão útil quanto a endoscopia e o enema baritado para fazer diagnóstico
de RCU.
 Complicações

147
Apenas 15% dos pacientes com RCU se apresentam inicialmente com
enfermidade catastrófica. A hemorragia maciça ocorre nas crises mais graves da doença
em 1% dos pacientes, e o tratamento da doença geralmente interrompe o sangramento.
O megacolo tóxico é definido como um colo transverso ou direito com diâmetro
>6 cm, com desaparecimento das haustrações nos pacientes com ataques graves de
RCU. Ocorre em cerca de 5% das crises e pode ser induzido por anormalidades
eletrolíticas e narcóticas.
A perfuração é a mais perigosa das complicações locais, e os sinais físicos de
peritonite podem não ser óbvios, especialmente se o paciente estiver recebendo
corticosteróides.
Os estreitamentos ocorrem em 5 a 10% dos pacientes e representam sempre uma
preocupação na RCU por causa da possibilidade de neoplasia subjacente.
Ocasionalmente, os pacientes com RCU desenvolvem fissuras anais, abscessos
perianais ou hemorróidas, porém a ocorrência de lesões extensas deve sugerir a
existência da DC.
 Doença de Crohn
 Sinais e sintomas
Apesar de a DC se manifestar habitualmente como inflamação intestinal aguda ou
crônica, o processo inflamatório evolui para um dos dois padrões da doença: um padrão
fibroestenótico-obstrutivo ou um padrão penetrante-fistuloso, cada qual com
tratamentos e prognósticos diferentes. O local da doença influencia as manifestações
clínicas.
 Ileocolite
Levando em conta que o local mais comum de inflamação é o íleo terminal, a
manifestação habitual da ileocolite é uma história crônica de episódios recorrentes de
dor no quadrante inferior direito e diarreia. Às vezes, a manifestação inicial simula
apendicite aguda com acentuada dor no quadrante inferior direito, massa palpável, febre
e leucocitose. Em geral, a dor manifesta-se como cólica; precede-a e é aliviada pela
defecação. Existe habitualmente uma febrícula.
Edema, espessamento da parede intestinal e fibrose dessa parte dentro da massa
são responsáveis pelo “sinal do barbante” radiográfico de um lúmen intestinal
estreitado.
A obstrução intestinal pode assumir várias formas. Nos estágios mais precoces da
doença, o edema e espasmo da parede intestinal produzem manifestações obstrutivas
intermitentes bem como agravamento dos sintomas de dor pós-prandial. Ao longo de
vários anos, a inflamação persistente progride gradualmente para estreitamento
fibroestenótico e estenose circunscrita. A diarreia diminui e é substituída por obstrução
intestinal crônica.
A inflamação mais acentuada da região ileocecal pode evoluir para espessamento
parietal localizado, com microperfuração e formação de fístula para o intestino
adjacente, pele ou bexiga, ou para a cavidade de abscesso no mesentério. As fístulas
enterovesicais se manifestam como disúria ou infecções vesicais recorrentes, ou menos
comumente, como pneumatúria ou fecalúria.
 Jejunoileíte

148
A doença inflamatória extensa está associada á perda da superfície disgestiva e
absortiva, resultando em má absorção e esteatorreia. As deficiências nutricionais
também podem resultar de ingestão precária assim como de perdas entéricas de
proteínas e de outros nutrientes. A má absorção intestinal pode causar anemia,
hipoalbuminemia, hipocalcemia, hipomagnesemia, coagulopatia e hiperoxalúria com
nefrolitíase nos pacientes com um colo intacto. Muitos pacientes necessitam de ferro
oral e, com frequência, intravenoso. As fraturas vertebrais são causadas por uma
combinação de deficiência de vitamina D, hipocalcemia e uso prolongado de
glicocorticoides. Outros nutrientes importantes para avaliar e proceder à sua reposição,
se estiverem embaixo níveis, incluem o folato e as vitaminas A, E e K.
A diarreia é característica da doença ativa; suas causas incluem (1) crescimento
bacteriano excessivo na estase por obstrução ou fistulação, (2) má absorção dos ácidos
biliares em virtude da doença no íleo terminal ou após sua ressecção, e (3) inflamação
intestinal com menor absorção de água e maior secreção de eletrólitos.
 Colite e Doença Perianal
Os pacientes com colite se apresentam com febrícula, mal-estar, diarreia, dor
abdominal em cólica e, às vezes, hematoquezia. O sangramento macroscópico não é tão
comum quanto na RCU e aparece em cerca de metade dos pacientes com doença
exclusivamente colônica. Apenas 1 a 2% sangram maciçamente.
A dor é causada pela passagem do material fecal por meio de segmentos
estreitados e inflamados do intestino grosso. O estreitamento pode ocorrer no colo em 4
a 16% dos pacientes e produz sintomas de obstrução intestinal. Se a endoscopia for
incapaz de atravessar um estreitamento na colite de Crohn, a ressecção cirúrgica deverá
ser aventada, especialmente se o paciente apresentar sintomas de obstrução crônica.
A doença perianal afeta cerca de 33% dos pacientes com colite de Crohn,
manifestando-se por incontinência, grandes dilatações hemorroidárias, estreitamentos
anais, fístulas anorretais abscessos perirretais.
 Doença Gastroduodenal
Os sinais e sintomas de doença do trato GI superior consistem em náuseas,
vômitos e dor epigástrica. As fístulas que acometem o estômago ou duodeno têm
origem no intestino delgado ou no grosso e não significam necessariamente a presença
de acometimentos do TGI superior. Os pacientes com DC gastroduodenal podem
desenvolver uma obstrução crônica da saída gástrica.
 Características laboratoriais, endoscópicas e radiográficas
As anormalidades laboratoriais incluem VHS e proteína C-reativa elevadas. Na
doença mais grave, os achados consistem em hipoalbuminemia, anemia e leucocitose.
As características endoscópicas da DC incluem preservação retal, ulcerações
aftosas e fístulas entre áreas normais. A colonoscopia possibilita o exame e a biopsia de
lesões expansivas ou estenoses e a biópsia do íleo terminal. A endoscopia alta mostra-se
útil para o diagnóstico de comprometimento gastroduodenal em pacientes com sintomas
do trato superior.
A endoscopia com cápsula sem fio (WCE, de wireless capsule endoscopy) torna
possível a visualização direta de toda a mucosa do intestino delgado. A acurácia
diagnóstica na identificação das lesões sugestivas de DC ativa é mais alta com a WCE

149
que com a enterografia TC ou seriografia do intestino delgado. A WCE não pode usada
na vigência de estreitamento do intestino delgado.
Na DC, os achados radiográficos mais precoces no intestino delgado incluem
pregas espessadas e ulcerações aftosas. A imagem de calçamento, induzida por
ulcerações longitudinais e transversais, envolve mais frequentemente o intestino
delgado. Na doença mais avançada, podem ser detectados estreitamentos, fístulas,
massas inflamatórias e abscessos. Os achados macroscópicos mais precoces da DC
colônica são as úlceras aftosas.
A inflamação transmural da DC dá origem a um diâmetro luminal reduzido e a
uma distensibilidade limitada. À medida que as úlceras se tornam mais profundas,
podem resultar na formação de fístulas. O “sinal do barbante” radiográfico representa
longas áreas de inflamação e fibrose circunferenciais, resultando em longos segmentos
de estreitamento luminal.
 Complicações
Sabendo que a DC é um processo transmural, forma-se aderências serosas que
proporcionam vias diretas para a formação de fístulas e reduzem a incidência de
perfuração livre. A perfuração ocorre em 1 a 2% dos pacientes, habitualmente no íleo,
porém ocasionalmente no jejuno ou então como uma complicação do megacolo tóxico.
Outras complicações incluem obstrução intestinal em 40%, hemorragia maciça,
má absorção e doença perianal grave.

150
 Marcadores Sorológicos
Os pacientes com doença de Crohn exibem ampla variação quanto ao modo de
apresentação e evolução com o passar do tempo. Alguns pacientes apresentam doença
de atividade leve e permanecem bem com medicações geralmente segura e leves;
entretanto, muitos outros exibem doença mais grave e podem desenvolver sérias
complicações, exigindo a realização de cirurgia.
As terapias biológicas atuais e em fase de desenvolvimento podem ajudar a
interromper a progressão da doença e proporcionam uma melhor qualidade de vida aos
pacientes com doença de Crohn moderada a grave. As terapias biológicas têm risco
potenciais, como infecção e neoplasia maligna, e o ideal seria determinar, por ocasião
do diagnóstico, quais os pacientes que irão necessitar de tratamento clínico mais
agressivo. Esse mesmo argumento aplica-se também a pacientes com RCU.
Foram descritos subgrupos de pacientes com diferentes respostas imunes a
antígenos microbianos. Infelizmente, esses marcadores sorológicos são apenas
marginalmente úteis para ajudar a estabelecer o diagnóstico de RCU ou CD e na
previsão da evolução da doença.

151
Para o sucesso diagnóstico da DII e na diferenciação entre DC e RCU, a eficácia
desses testes sorológicos depende de prevalência da DII em uma população específica.
Verifica-se uma positividade para pANCA em cerca de 60 a 70% dos pacientes com
RCU e 5 a 10% dos pacientes com DC.
60 a 70% dos pacientes com DC, 10 a 15% dos pacientes RCU e até 5% dos
controles sem DII são ASCA-positivos.
Em uma população com prevalência de RCU e DC de 62%, a sorologia de
pANCA/ASCA mostrou uma sensibilidade de 64% e especificidade de 94%.
 Manifestações Extraintestinais
Até 33% dos pacientes com DII apresentam pelo menos uma manifestação
extraintestinal da doença.
 Dermatológicas
O eritema nodoso (EM) ocorre em até 15% dos pacientes com DC e 10% dos
pacientes com RCU. As crises se correlacionam habitualmente com a atividade
intestinal; as lesões cutâneas surgem após o início dos sintomas intestinais, e os
pacientes sofrem com frequência de artrite periférica ativa concomitante.
O pioderma gangrenoso (PG) é observada em 1 a 12% dos pacientes com RCU e
menos comumente na colite de Crohn.
Outras manifestações dermatológicas consistem em piodermite vegetante, que
ocorre nas áreas intertriginosas; piostomatite vegetante, que acomete as membranas
mucosas.
 Reumatológicas
A artrite periférica se instala em 15 a 20% dos pacientes com DII, é mais comum
na DC e piora com as exarcebações da atividade intestinal. O tratamento tem por
finalidade reduzir a inflamação intestinal, e, na RCU grave, a colectomia costuma curar
a artrite.
A espondilite anquilosante (EA) ocorre em cerca de 10% dos pacientes com DII,
sendo mais comum na DC que na RCU. A atividade da EA não está realacionada com a
atividade intestinal e não cede com os glicocorticóides ou a colectomia.
A sacroiliite é simétrica, ocorre igualmente na RCU e na DC, é assintomática com
bastante frequência, não se correlaciona com a atividade intestinal e nem sempre
progride para a EA.
 Oculares
A incidência de complicações oculares nos pacientes com DII é de 1 a 10%. As
mais comuns são a conjuntivite, uveíte anterior/irite e episclerite.
 Diagnóstico Diferencial
Em 5% das amostras de ressecção do colo, é difícil classificar a RCU ou DC
(colite indeterminada), visto que AMBAS EXIBEM CARACTERÍSTICAS
HISTOLÓGICAS SUPERPOSTAS.
 DOENÇA INFECCIOSA: pode ser de origem bacteriana, fúngica, oral ou
protozoária.
 CAMPYLOBACTER: pode reproduzir o aspecto endoscópico de uma RCU
grave e acarretar uma recaída da RCU já existente;

152
 SALMONELLA: pode causar diarreia aquosa ou sanguinolenta, náuseas e
vômitos;
 SHIGELLOSE: causa diarreia aquosa, dor abdominal e febre seguida por
tenesmo retal, bem como eliminação de sangue e muco pelo reto;
 YERSINIA ENTEROCOLITICA: ocorre principalmente no íleo terminal e
acarreta ulceração mucosa, invasão de neutrófilos e espessamento da parede ileal;
 OUTRAS INFECÇÕES QUE BACTERIANAS QUE PODEM SIMULAR A
DII: C.DIFFICILE manifesta-se com diarreia aquosa, tenesmo, náuseas e vômitos;
E.COLI (êntero-hemorrágica/êntero-invasiva e êntero-aderente -> todas causam diarreia
sanguinolenta e hipersensibilidade abdominal);
O diagnóstico de colite bacteriana é feito enviando amostras de fezes para cultura
bacteriana e análise da toxina do C.Difficile, gonorréia, clamídia e sífilis que também
podem causar proctite.
 MICOBACTÉRIAS: ocorre principalmente no paciente imunossuprimido, mas
pode ocorrer em pacientes com imunidade normal. O acometimento do íleo distal e ceco
predomina, e os pacientes apresentam sintomas de obstrução do intestino delgado e
massa abdominal hipersensível. O diagnóstico é feito por COLONOSCOPIA COM
BIÓPSIA E CULTURA.
 VÍRUS: O CMV é mais comumente em imunocomprometidos. O CMV ocorre
mais comumente no esôfago, colo e reto, mas pode acometer também o intestino
delgado. Os sintomas incluem dor abdominal, diarreia sanguinolenta, febre e perda de
peso. Com a doença grave, podem ocorrer necrose e perfuração. O diagnóstico é feito
pela identificação de inclusões intranucleares características nas células mucosas pela
biópsia. O herpes simples pode ocorrer em indívudos imunocompetentes, se limita a
orofaringe bem como as áreas anorretais e perianais. Os sintomas incluem dor anorretal,
tenesmo, constipação, adenopatia inguinal, dificuldade miccional e parestesia sacrais. O
diagnóstico é feito pela biópsia retal, com a identificação de inclusões celulares
características e cultura viral. O próprio HIV pode causar diarreia, náuseas, vômitos e
anorexia. As biópsias do intestino delgado mostram atrofia parcial das vilosidades.
 PROTOZOÁRIOS: ISOSPORA BELI, pode causar infecção autolimitada em
hospedeiros sadios, mas acarreta diarreia aquosa crônica e profusa, assim como perda de
peso nos pacientes aidéticos.
A entamoeba histolytica ou espécies correlatadas infectam cerca de 10% da
população mundial; os sintomas incluem dor abdominal, tenesmo, evacuações moles e
frequentes com fezes que contém sangue e muco, bem como hipersensibilidade
abdominal. A colonoscopia revela ulceras pontilhadas focais com mucosa de permeio
normal. O diagnóstico é feito pela biópsia ou pelos anticorpos amébicos séricos.
 DOENÇA NÃO INFECCIOSA
 A DIVERTICULITE pode ser confundida com doença de CROHN clinica e
radiograficamente. Ambas as doenças causam FEBRE/DOR ABDOMINAL/MASSA
ABDOMINAL HIPERSENSÍVEL/LEUCOCITOSE/VHS ELEVADO/OBSTRUÇÃO
PARCIAL E FÍSTULAS. Tanto a doença perianal quanto a ileíte em uma seriografia e
anormalidades endoscópicas significativas da mucosa são mais prováveis na doença de
CROHN que na diverticulite. A recidiva endoscópica ou clínica após ressecção
segmentar fala a favor de DOENÇA DE CROHN.
 A COLITE ISQUÊMICA é confundida comumente com a DII. O processo
isquêmico pode ser crônico e difuso, como acontece na RCU, ou segmentar como na
DC. A inflamação colônica decorrente da isquemia pode regredir rapidamente ou
persistir e resultar em fibrose transmural bem como formação de estreitamento. Os
pacientes se apresentam habitualmente com dor de início súbito no QIE, urgência para

153
defecar e eliminação de sangue vermelho vivo pelo reto. O exame endoscópico
demonstra com frequência um reto de aspecto normal e transição nítida para área de
inflamação no colo descendente e flexura esquerda (ângulo esplênico) do colo.
 Pode ser difícil distinguir da DII os efeitos da RADIOTERAPIA sobre o TGI.
Os sintomas agudos podem ocorrer 1-2 semanas após o inicio da radioterapia. Quando o
reto e o sigmoide são irradiados, os pacientes desenvolvem uma diarreia
mucossanguinolenta e tenesmo, como acontece na RCU distal. Com o acometimento do
intestino delgado, a diarreia é comum. Os sintomas tardios consistem em má absorção e
perda de peso. Pode ocorrer a formação de estreitamento com obstrução e
sobrecrescimento bacteriano. As fístulas podem penetrar na bexiga/vagina ou parede
abdominal. A sigmoidoscopia flexível revela granularidade mucosa, friabilidade,
numerosas telangiectasias e ocasionalmente, ulcerações distintas. A biópsia pode ser
diagnóstica.
 A SÍNDROME DE ÚLCERA RETAL solitária é incomum, podendo ser
confundida com DII. Ocorre em pessoas de todas as idades e pode ser causada por
evacuação difícil bem como incapacidade de relaxamento do musculo puborretal. As
ulcerações únicas ou múltiplas podem resultar da hiperatividade do esfíncter anal, de
pressões intra-retais mais altas durante a defecção e da retirada digital das fezes. Os
pacientes queixam-se de constipação com esforço exagerado para defecar assim como
eliminam sangue e muco pelo reto. Outros sintomas incluem dor abdominal, diarreia,
tenesmo e dor perineal. Ulcerações com até 5 cm de diâmetro é observada
habitualmente na superfície anterior e anterolateral à uma distancia de 3-15 cm da
margem anal. As biópsias podem ser diagnósticas.
Vários tipos de COLITE estão associados aos AINES, como a colite de novo,
reativação da DII e proctite causada pelo uso de supositórios. A maioria dos pacientes
com colite relacionada com os AINES se apresenta com diarreia e dor abdominal, e as
complicações incluem estreitamento, sangramento, obstrução, perfuração e fistulização.
 COLITES ATÍPICAS: duas colites atípicas – colite COLAGENOSA e colite
LINFOCÍTICA – possuem aspectos endoscópicos completamente normais.
 COLAGENOSA: maior deposição de colágeno subepitelial e colite com
aumento do numero de linfócitos intra-epiteliais. A relação entre mulheres e homens é
de 9:1, na maioria entre a 6ª-7ª década de vida, o principal sintoma é a diarreia aquosa
crônica;
 LINFOCÍTICA: incidência quase igual entre homens e mulheres, e sem
deposição subepitelial de colágeno do corte patológico, maior frequência de doença
celíaca.

154
 Tratamento
 Terapia Clínica
Agentes antidiarreicos, comumente loperamida ou difenoxilato, têm utilidade em
pacientes com DII leve, para reduzir o número de evacuações e aliviar a urgência retal.
Anticolinérgico (tintura de beladona, clidinio, brometo de propantelina, etc) podem
reduzir as cólicas abdominais, a dor e a urgência retal. Uma combinação consiste de
beladona (15 mg) e ópio em pó(25 mg). Agentes antidiarreicos e antiespamódicos estão
contraindicados em casos de colite grave, porque há risco de precipitação de megacolo
tóxico. O uso crônico de narcóticos para a dor não deve fazer parte do tratamento da
DII. Em alguns casos, antidepressivos podem ser úteis. Anti-inflamatórios não
esteroidais podem exacerbar a atividade clínica da DII, devendo ser utilizadas com
cuidado.
O tratamento nutricional desempenha papel apenas limitado em casos de
retocolite ulcerativa. O paciente deve evitar alimentos específicos (tipicamente,
alimentos ricos em fibra) que pioram seus sintomas. O tratamento nutricional

155
desempenha um papel muito maior na doença de Crohn, em que muitos pacientes que
diminuíram a ingestão calórica, e nos quais pode estar ocorrendo má absorção de
vitamina B12, vitamina D, cálcio, magnésio, zinco e ferro.
 Aminossalicilatos
Agentes que contém ácido 5-aminossalicílico (5-ASA) são a chave da terapia para
retocolite ulcerativa e desempenham um papel pequeno no tratamento da doença de
Crohn.
O 5-ASA parece agir na superfície luminal, de forma que formulações orais são
elaboradas para prevenir a absorção do 5-ASA, tornando-o disponível no lúmen
intestinal. Na sulfassalazina, olsalazina e balsalazida, o 5-ASA está ligado de forma
covalente tanto a outra molécula de 5-ASA (olsalazina) como o outros agentes
(sulfassalazina e balsalazida); quando estas ligações covalentes são quebradas pelas
bactérias colônicas, o 5-ASA é liberado.
A eficácia das formulações de 5-ASA está altamente relacionada com a
concentração atingida no lúmen no local da doença.
O 5-ASA também está disponível na forma de enema, que alcança o cólon
descendente, e na forma de supositório, que se restringe ao reto. As formulações de
enema e supositória são bastante eficazes no tratamento de proctite ulcerativa, tanto na
terapia para doença ativa como para manutenção da remissão, podendo ser utilizadas
sozinhas ou associadas a formulações orais de 5-ASA.
 Corticosteroides
Corticosteroides orais são efetivos em casos leves a moderados de retocolite
ulcerativa e doença de Crohn. A terapia parenteral fica reservada para a doença
moderada a grave. O paciente permanece em doses altas de corticosteróides até que os
sintomas comecem a diminuir; depois disso, a dose será gradualmente reduzida. Se for
utilizada uma dose inicial inadequada de prednisona por causa do temor de efeitos
colaterais, torna-se menor a probabilidade de uma resposta positiva. Em alguns
pacientes, ocorre exacerbação de atividade da doença quando a dose de prednisona é
diminupida para patamares abaixo de certo nível (cortiço-dependência).
Não se deve usar corticosteróides em pacientes com abscessos não drenados ou
quando os sintomas são decorrentes de estenoses ou processos fribóticos. A terapia de
manutenção com corticosteróides é ineficaz para prevenção de recorrências em casos de
retocolite ulcerativa ou doença de Crohn em remissão.
 Imunomoduladores
A ação das drogas imunomoduladoras ocorrer pelo bloqueio da proliferação, da
ativação ou de mecanismos efetores dos linfócitos. É vasta a experiência com
azatioprina (AZA) e seu metabólito, 6-mercaptopurina (6-MP) no tratamento da DII; a
experiência não é tão grande com ciclosporina e metotrexato.
Azatioprina e 6-MP são efetivas no tratamento da doença de Crohn ativa e na
manutenção da remissão; seu papel na retocolite ulcerativa é menos claro.
Esses fármacos são administrados a pacientes portadores da doença ativa que não
responde a corticosteróides (pacientes cortiço-refratários), e a paciente cortiço-
dependentes. Nesses pacientes, acrescenta-se 6-MP ou azatioprina à terapia com o
corticosteróide; depois de transcorridos 3 ou 4 meses, ocasião em que já devem ter

156
começado os efeitos da 6-MP ou da azatioprina, a dose do corticosteróide será
gradualmente reduzida.
O principal fator limitante no uso de 6-MP e azatioprina é sua toxicidade; esses
dois fármacos comumente causam leucopenia, podem causar pancreatite e aumentar o
risco de linfoma.
 Antibióticos
Exceto em casos de sepse evidente, é pequeno o papel dos antibióticos no
tratamento da retocolite ulcerativa. Antibióticos são mais efetivos na doença de Crohn,
esses fármacos são utilizados no tratamento das complicações supurativas,
especialmente formação de abscesso e doença perianal, embora a drenagem cirúrgica
seja o principal tratamento para abscessos.
 Anticorpo Antifator de Necrose Tumoral
O infliximabe, um anticorpo quimérico murino-humano anti-TNF-α, é eficaz no
tratamento da doença de Crohn ativa moderada a grave e de fístulas associada à doença
de Crohn assim como para o tratamento de pacientes com retocolite ulcerativa
refratária.
A eficácia do infliximabe pode estar relacionada com a ligação ao TNF-α livre ou
a macrófagos e linfócitos lisados que apresentam TNF-α ligados à sua superfície.
O uso do infliximabe está associado ao risco substancial de infecção (sepse,
pneumonia e ativação de tubercuose) e ao risco pequeno, mas real, de linfoma, de forma
que é geralmente reservado pacientes que não responderam à azatioprina. O infliximabe
parece ter uma alta taxa de eficácia e baixa taxa de efeitos colaterais quando
administrado com azatioprina em vez de único agente, porque a azatioprina modula a
reação intrínseca à porção murina do infliximabe.
 Cirurgia
 Retocolite Ulcerativa
Comumente, 20 a 25% dos pacientes com colite ulcerativa extensa termina sendo
submetidos à colectomia, porque a doença não respondeu adequadamente ao tratamento
clínico. Em casos de retocolite ulcerativa, a colectomia total é o procedimento curativo.
Pode haver necessidade de colectomia de emergência em casos de megacólon tóxico, ou
em um grave ataque fulminante sem megacólon tóxico. A operação de rotina para colite
ulcerativa é a proctocolectomia e ileostomia de Brooke.
 Doença de Crohn
Após 10 anos do diagnóstico, aproximadamente 60% dos pacientes com doença
de Crohn são submetidos ao tratamento cirúrgico. Considerando que a ressecção
cirúrgica não é curativa na doença de Crohn, e considerando, também, serem prováveis
as recidivas, a abordagem é mais conservadora em termos da quantidade de tecido
removido. Insucesso de resposta ao tratamento clínico é causa comum de indicação de
ressecção cirúrgica em pacientes com doença de Crohn e também retocolite ulcerativa.
Entretanto, as complicações da doença de Crohn são indicações frequentes de
tratamento cirúrgico.
O procedimento cirúrgico mais comum é a ressecção do segmento acometido por
obstrução ou fístula. As abordagens cirúrgicas indicadas para o tratamento da doença de

157
Crohn são: ressecção de segmento acometido, colectomia subtotal com ileoproctostomia
e colectomia total com ileostomia.

158
Problema 7 – Meu filho nasceu com
icterícia
Reflexo de Evacuação e Controle Esfincteriano
O reflexo da defecação remove as fezes, material não digerido, do corpo. A
defecação se assemelha a micção, pois é um reflexo espinal desencadeado pela
distensão da parede do órgão. O movimento do material fecal para o reto normalmente
vazio dispara o reflexo.
O músculo liso do esfíncter interno do ânus relaxa, e as contrações peristálticas no
reto empurram o material em direção ao ânus. Ao mesmo tempo, o esfíncter externo do
ânus, o qual esta sob controle voluntário, conscientemente é relaxado se a situação for
apropriada.
A defecação muitas vezes é ajudada por contrações abdominais conscientes e
movimentos expiratórios forçados contra uma glote fechada (manobra de Valsalva).
A defecação, assim como a micção, está sujeita à influência emocional. O estresse
pode tanto aumentar a motilidade, e causar diarreia psicossomática em alguns
indivíduos, como diminuir a motilidade e causar constipação em outros. Quando as
fezes estão retidas no colo, ou por ignorar conscientemente o reflexo da defecação ou
por redução da motilidade, a absorção continua de água gera fezes duras e secas que são
difíceis de eliminar. (DEE)
 Defecação
A maior parte do tempo, o reto fica vazio, sem fezes, o que resulta, em parte, do
fato de existir fraco esfíncter funcional a cerca de 20 cm do ânus, na junção entre o
colon sigmóide e o reto. Ocorre, também, angulação nesse local que contribui com
resistência adicional ao enchimento do reto.
Quando o movimento de massa força as fezes para o reto, imediatamente surge a
vontade de defecar, com a contração reflexa do reto e o relaxamento dos esfíncteres
anais.
A passagem do material fecal pelo ânus é evitada pela constrição tônica dos (1)
esfíncter anal interno, espesso músculo liso com vários centímetros de comprimento na
região do ânus e (2) esfíncter anal externo, composto por músculo estriado voluntário
que circunda o esfíncter interno e se estende distalmente a ele. O esfíncter externo é
controlado por fibras nervosas do nervo pudendo, que faz parte do sistema nervoso
somático e, assim, esta sob controle VOLUNTÁRIO, consciente ou pelo menos
subconsciente; subconscientemente, o esfíncter externo é mantido contraído, a menos
que sinais conscientes inibam a constrição.
 Reflexos da Defecação
De ordinário, a defecação é iniciada por reflexos da defecação. Um desses
reflexos é o reflexo intrínseco, mediado pelo sistema nervoso entérico local, na parede
do reto. Quando as fezes entram no reto, a distensão da parede retal desencadeia sinais
aferentes que se propagam pelo plexo mioentérico para dar início a ondas peristálticas
no cólon descendente, sigmoide e no reto, empurrando as fezes na direção do reto. À
medida que a onda peristáltica se aproxima do ânus, o esfíncter anal interno se relaxa,
por sinais inibidores do plexo miontérico; se o esfíncter anal externo estiver relaxado
consciente e voluntariamente, ocorre a defecação.

159
O reflexo intrínseco mioentérico de defecação, por si só, não é normalmente
suficiente. Para que a defecação ocorra, em geral é necessário o concurso de outro
reflexo, o reflexo de defecação parassimpático, que envolve os segmentos sacros da
medula espinhal. Quando as terminações nervosas no reto são estimuladas, os sinais são
transmitidos para a medula espinhal e de volta ao cólon descendente, sigmoide, reto e
ânus, por fibras nervosas parassimpáticas nos nervos pélvicos. Esses sinais
parassimpáticos intensificam bastante as ondas peristálticas e relaxam o esfíncter anal
interno, convertendo, assim, o reflexo de defecação miontérico intrínseco de efeito fraco
a processo intenso de defecação que, por vezes, é efetivo para o esvaziamento do
intestino grosso compreendido entre a curvatura esplênica do cólon até o ânus.
Sinais de defecação que entram na medula espinhal iniciam outros efeitos, tais
como inspiração profunda, fechar a glote e contrair os músculos da parede abdominal,
forçando os conteúdos fecais do cólon para baixo e, ao mesmo tempo, fazendo com que
o assoalho pélvico se relaxe e, ao fazê-lo, se projete para baixo, empurrando o anel anal
para baixo para eliminar as fezes.
Quando é oportuno para a pessoa defecar, os reflexos de defecação podem ser,
propositadamente, ativados por respiração profunda, movimento do diafragma para
baixo e contração dos músculos abdominais para aumentar a pressão abdominal,
forçando, assim, o conteúdo fecal para o reto e causando novos reflexos. Os reflexos
iniciados dessa maneira quase nunca são tão eficazes como os que surgem naturalmente,
razão pela qual as pessoas que inibem, com muita frequência, seus reflexos naturais
tendem mais a ter constipação grave.
Nos RN e em algumas pessoas com transecção da medula espinhal, os reflexos da
defecação causam o esvaziamento automático do intestino, em momentos
inconvenientes, devido à ausência do controle consciente exercido pela contração e pelo
relaxamento voluntário do esfíncter anal externo.
Outros reflexos como duodenocólicos, gastrocólicos, gastroileiais,
enterogástricos, peritoneointestinal, renointestinal e o vesicointestinal também podem
afetar a atividade intestinal. (GUYTON)
 Função Defecatória
O processo de defecação em pessoas saudáveis começa com um período pré-
defecatório, durante o qual a frequência e a amplitude das sequências de propagação (3
ou mais sucessivas ondas de pressão) estão aumentadas. Estímulos como a vigília e
refeições (reflexo gastroileal, também conhecido como reflexo gastrocólico) podem
estimular esse processo. Esse período pré-defecatório é brusco e pode estar ausente em
pacientes com constipação de trânsito lento.
O reflexogastroileal também esta diminuído em pessoas com constipação por
trânsito lento. As fezes frequentemente estão presentes no reto antes de surgir a vontade
de defecar. A vontade de defecar normalmente surge quando as fezes entram em contato
com receptores no canal anal superior. Quando a vontade de defecar é resistida, um
movimento retrógrado de fezes pode ocorrer, aumentando o tempo de trânsito em todo o
cólon.
Embora a posição sentada ou de cócoras pareça facilitar a defecação, o benefício
da posição de cócoras não foi bem estudado em pacientes com constipação.
A flexão total do quadril alonga o canal anal no sentido anteroposterior e corrige o
ângulo anorretal, promovendo assim o esvaziamento do reto. A contração do diafragma
e dos músculos abdominais aumenta a pressão intrapélvica, relaxando simultaneamente
o assoalho pélvico. A atividade muscular estriada expulsa o conteúdo retal, com
pequena participação do cólon ou das ondas propulsoras do reto. O relaxamento
coordenado do músculo puborretal, o qual mantêm o ângulo anorretal e o esfíncter anal

160
externo no momento em que a pressão é aumentada no reto, resulta na expulsão das
fezes.
O comprimento do cólon esvaziado durante a defecação espontânea varia, mas
geralmente estende-se do cólon descendente até o reto. Quando a ação propulsora do
músculo liso é normal, defecar normalmente requer um esforço voluntário mínimo.
Se as ondas colônicas e do reto são pouco frequentes ou ausentes, a vontade
normal de defecar pode não ocorrer. (TRATADO GASTRO)
 FISIOLOGIA DA DEFECAÇÃO: defecação requer o relaxamento do músculo
puborretal com a descida do assoalho pélvico e retificação do ângulo anorretal durante o
esforço evacuatório, bem como o relaxamento do esfíncter anal interno.
 Desenvolvimento do Controle Esfincteriano
No lactente, o processo de eliminações é reflexo, e não existe controle consciente
ou envolvimento cortical. Aos NOVE MESES um controle esfincteriano com reflexo
condicionado pode ocorrer.
A mielinização do trato piramidal referente à área esfincteriana não está completa
até os 12-18 meses. Ao redor de um a dois anos, a criança começa a ter consciência das
sensações que acompanham o enchimento da bexiga. Aos três anos de idade, a criança é
capaz de reter a urina por um controle voluntário consciente da musculatura. Aos quatro
anos, a micção pode, de um modo geral, ser iniciada voluntariamente, e aos seis ou sete
anos a criança pode urinar segundo seu desejo, com quantidade de distensão da bexiga.
A maioria das crianças entre as idades de 18 a 24 meses já estará apta a iniciar o
treinamento esfincteriano, pois as habilidades necessárias para tal controle já estão
presentes nesta idade. Apesar disso, nos últimos anos, o controle esfincteriano vem
sendo postergado na maioria dos países, com um aumento gradual na idade em que este
controle se estabelece. Patologias que podem estar relacionadas ao treinamento
esfincteriano inadequado são as infecções urinárias de repetição, enurese, constipação,
recusa em ir ao banheiro e encoprese. Normalmente aos 4 anos tem controle
esfincteriano total.
A aquisição da continência urinária e fecal normalmente segue um padrão
evolutivo. Inicialmente a criança adquire o controle fecal noturno, seguido pelo controle
fecal diurno, posteriormente o urinário diurno e finalmente o urinário noturno.
O controle esfincteriano é um marco tanto do desenvolvimento quanto social. Sua
aquisição é fortemente influenciada por fatores educacionais, ambientais, sociais,
familiares, psicológicos e hereditários.
Uma criança pode ser considerada com controle esfincteriano quando não
necessita mais de ajuda ou de supervisão para usar o vaso (ou penico). Adquirir
independência para o uso do banheiro requer que a criança apresente não apenas
domínio de linguagem, mas ainda motor, sensorial, bem como neurológico e social.

Constipação Intestinal e Escape Fecal


O ritmo intestinal varia de um indivíduo para outro. Considera-se normal desde
três evacuações por dia até uma evacuação a cada 2 dias, ou seja, podem ser normais
intervalos de 8 a 48 h entre uma exoneração intestinal e a seguinte.
Quando as fezes ficam retidas por mais de 48 h, diz-se que há obstipação ou
constipação intestinal, fato designado na linguagem leiga como "prisão de ventre" ou
"intestino preso".
Na avaliação de uma possível obstipação intestinal, é necessário levar em conta
também a consistência das fezes. Podem ser apenas um pouco mais duras, ressecadas ou
em cíbalos (fezes em pequenas bolas, como nos caprinos).

161
A adequada progressão fecal depende de muitos fatores, destacando-se a
composição do bolo fecal, em especial da quantidade de fibras na alimentação, a
regulação neurovegetativa, merecendo referência a integridade dos plexos intramurais, a
ação de hormônios secretados no próprio aparelho digestivo ou fora dele
(principalmente da glândula tireoide) e de várias substâncias (serotonina,
prostaglandinas).
Têm importante papel no ritmo intestinal as condições psicológicas do paciente,
pois os arcos reflexos que participam da evacuação intestinal mantêm conexões com o
diencéfalo e o córtex; daí se dizer que o reflexo da evacuação é um "reflexo assistido”,
com mecanismos inibitórios e motores complexos.
A multiplicidade de fatores fisiopatológicos que participam da gênese da
obstipação intestinal possibilita reconhecer oito grupos de causas:
• mecânicas: quando há lesões que ocluem o lúmen ou impedem a contração
das paredes intestinais (malformações, impactação fecal, oclusão tumoral, processos
inflamatórios)
• neurogênicas: nas quais há comprometimento dos componentes nervosos
(aganglionose ou doença de Hirschsprung, megacólon chagásico, paraplegia)
• metabólico-hormonais: incluindo hipotireoidismo, uremia,
hiperparatireoidismo, porfiria
• psicogênicas: nas quais há alterações emocionais, muitas vezes ligadas
traumas na infância
• medicamentosas: em consequência do uso de antiácidos, anticolinérgicos,
opiáceos, além de outros
• relacionadas com a alimentação inadequada (dieta pobre em fibra)
• inibição reiterada do reflexo da evacuação
• hipossensibilidade senil.
O reconhecimento da origem da obstipação intestinal depende de um exame
clínico bem feito, que inclui o toque retal, complementado por estudo radiológico e
endoscópico do intestino grosso. E perguntar procedência do paciente, pois doença de
Chagas pode levar ao megacólon. (PORTO)
A constipação é uma queixa comum na prática clínica e em geral refere-se à
defecação difícil, infrequente ou aparentemente incompleta, persistente. Em virtude da
ampla faixa de hábitos intestinais normais, é difícil definir a constipação com exatidão.
A maioria das pessoas apresenta pelo menos 3 exonerações intestinais por
semana; entretanto, apenas a baixa frequência de evacuação não é um critério suficiente
para o diagnóstico de constipação. Muitos pacientes com constipação tem uma
frequência normal de evacuações, mas queixam-se de esforço excessivo, fezes
endurecidas, plenitude abdominal inferior ou sensação de evacuação incompleta. Os
sintomas de cada paciente devem ser analisados em detalhes para se determinar o que é
compreendido como “constipação” ou “dificuldade” à defecação. (HARRISON)
A constipação afeta uma porção da população ocidental e é particularmente
prevalente em mulheres, crianças e idosos. Para a maioria das pessoas afetadas, a
constipação é intermitente e não exige nenhuma ou uma mínima intervenção, tais como
suplementos de fibras ou outras modificações dietéticas. O tratamento da constipação
crônica começa com modificações do estilo de vida se necessário, e terapia com fibra.
Laxantes osmóticos e estimulantes, laxantes comuns, emolientes e enemas, por vezes,
são necessários para tratar a constipação refratária. Novos agentes e abordagens não
farmacológicas oferecem mais opções para o tratamento da constipação.
A definição de constipação intestinal varia entre as pessoas, e é importante
perguntar aos pacientes, o que eles querem dizer quando dizem “eu sou constipado”. A

162
maioria das pessoas descreve dificuldade na percepção dos movimentos do intestino ou
mal-estar relacionado com a evacuação. Os termos mais comuns usados para definir
constipação são: esforço para evacuar (52%), fezes duras (44%) e incapacidade de
evacuação (34%).
A definição médica tradicional de constipação, com base no intervalo de
confiança menor de 95% para os adultos saudáveis é de 3 ou menos evacuações por
semana. Na tentativa de padronizar a definição de constipação foi desenvolvido os
critérios de Roma III (2006).

Os critérios de Roma III permitem que os pacientes tenham fezes soltas ocasionais
e exigem que os sintomas estejam presentes durante os 3 meses anteriores, com um
início, pelo menos, 6 meses antes. Quando a dor ou desconforto abdominal for o
sintoma predominante, a síndrome do intestino irritável (SII) deve ser considerada como
o diagnóstico, em vez da constipação. ESSES CRITÉRIOS NÃO DEVEM SER
APLICADOS QUANDO O PACIENTE ESTA TOMANDO LAXANTES.
 FATORES DE RISCO: os fatores de risco para constipação nos EUA incluem
o sexo feminino, idade avançada, etnia não branca, baixos níveis de renda e
escolaridade, e baixo nível de atividade física. Outros fatores de risco incluem o uso de
certos medicamentos e, em particular, os distúrbios médicos subjacentes. A dieta e o
estilo de vida também tem um papel no desenvolvimento da constipação.

163
Os fatores de risco para constipação nos EUA incluem:
• GÊNERO: a prevalência de constipação por auto avaliação é de 2 a 3 vezes
maiores em mulheres do que em homens, e evacuações pouco frequentes (1 vez por
semana) são relatadas quase exclusivamente por mulheres. A razão para a
predominância do sexo feminino é desconhecida. Uma redução nos níveis de hormônios
esteróides foi observada em mulheres com constipação idiopática grave, embora o
significado clínico desse achado seja dúbio. Uma superexpressão de receptores de
progesterona em células do músculo liso do cólon tem sido descrito para regular para
baixo a contratilidade da proteína G, e regulação para cima para inibir a proteína G.
Além disso, a superexpressão do receptor de progesterona B sobre as células musculares
do cólon, tornando-as mais sensíveis às concentrações fisiológicas da progesterona, tem
sido proposta como uma explicação para a constipação grave de trânsito lento em
algumas mulheres.
• IDADE: há um aumento na prevalência com a idade. Pacientes idosos
hospitalizados/em asilos apresentam risco mais elevado de desenvolver a constipação. A
constipação em adultos mais velhos é mais comumente resultante de esforço excessivo e
fezes duras, do que uma diminuição na frequência. As possíveis causas para o aumento
da frequência do esforço para evacuar em adultos mais velhos incluem a diminuição de
ingestão de alimentos, mobilidade reduzida, enfraquecimento da musculatura da parede
abdominal e pélvica, doença crônica, fatores psicológicos e medicamentos
(analgésicos). A constipação também é comum em crianças menores de 4 anos.
• ETNIA NÃO BRANCA
• BAIXOS NÍVEIS DE RENDA E ESCOLARIDADE têm maiores taxas de
constipação.
• DIETA (ingestão de fibras: quanto maior a ingesta de fibras, menor a
incidência de constipação) E ATIVIDADE FÍSICA (conflitante entre os estudos), e a
DESIDRATAÇÃO têm sido identificada como um fator de risco potencial para a
constipação.
• MEDICAMENTOS: opióides, diuréticos, antidepressivos, anti-histamínicos,
antiespasmódicos, anticonvulsivantes, e antiácido de alumínio. O uso de aspirina ou
outros fármacos AINES na população idosa está associada à um risco pequeno mas
significativo no aumento de constipação.
 FUNÇÃO DO CÓLON
• CONTEÚDO LUMINAL: o conteúdo principal do lúmen do colón é de resíduos
de alimentos, água e eletrólitos, bactérias e gás. Alimentos inabsorvíveis que entram no
ceco contêm carboidratos que são resistentes à digestão e à absorção pelo intestino
delgado, como amidos e polissacarídeos não amiláceos (PNA). Alguns dos carboidratos
não absorvidos servem como substrato para a proliferação bacteriana e fermentação,
para a produção de ácidos graxos de cadeia curta e gás. Em média, as bactérias
representam aproximadamente 50% do peso das fezes. O farelo de trigo aumenta o peso
das fezes e diminui o tempo médio do trânsito colônico em pessoas saudáveis.
• ABSORÇÃO DE ÁGUA E SÓDIO: o cólon absorve avidamente o sódio e a
água. Aumento da absorção de água pode levar à fezes mais duras e menores. O colón
extrai mais de 1.000-1.500 ml do fluido que atravessa a válvula ileocecal, deixando
apenas de 100-200 ml de água fecal por dia. No cólon ocorre uma reabsorção de
eletrólitos e nutrientes menor que no intestino delgado e a troca de cloreto de sódio e o
transporte dos ácidos graxos de cadeia curta são os principais mecanismos para
estimular a absorção de água. Os mecanismos de absorção do cólon permanecem
intactos/normais em pacientes com constipação. Um mecanismo fisiopatológico
proposto na constipação por trânsito lento é que a falta de movimento peristáltico à

164
passagem do conteúdo através do cólon permite mais tempo para a degradação
bacteriana de fezes sólidas e um aumento da absorção de NaCl e água, diminuindo,
assim, tanto o peso das fezes como a frequência. O volume de água das fezes e a
quantidade de fezes sólidas parecem estar proporcionalmente reduzidos em pessoas
constipadas.
• DIÂMETRO E COMPRIMENTO: um cólon largo ou prolongado pode levar a
uma variação no trânsito colônico lento. Embora apenas uma pequena fração de
pacientes com constipação apresente megacólon ou megareto, a maioria dos pacientes
com dilatação do cólon ou do reto queixa-se de constipação. A largura do cólon pode
ser medida com o enema de bário. A largura superior à 6,5 cm na borda pélvica é
anormal e tem sido associada à constipação crônica.
• FUNÇÃO MOTORA: o músculo do cólon possui 4 funções principais: (1)
atrasar a passagem do conteúdo luminal de modo a dar tempo para a absorção de água,
(2) misturar o conteúdo e permitir o contato com a mucosa, (3) permitir ao cólon
armazenar as fezes entre as defecações, e (4) impulsionar o conteúdo em direção ao
ânus. A atividade muscular é afetada pelo sono, vigília, alimentação, emoção, conteúdo
colônico e pelos fármacos. O controle nervoso, parcialmente intrínseco e extrínseco, é
realizado pelos nervos simpáticos e parassimpáticos sacrais.
O trânsito do conteúdo ao longo do cólon leva horas ou dias (mais do que o
trânsito em outras porções do TGI). Estudos cintilográficos em pacientes constipados
mostraram que o trânsito total do conteúdo do cólon é lento. Em alguns pacientes, a taxa
de circulação do conteúdo é aproximadamente normal no cólon ascendente e na flexura
hepática, mas demorado no colón transverso e no cólon esquerdo. Outros pacientes
apresentaram um trânsito lento no lado direito e esquerdo do cólon.
As propulsões do cólon são de dois tipos básicos, contrações propagadas de baixa
amplitude (CsPBA) e contrações propagadas de alta amplitude (CsPAA). A frequência
e a duração da CsPAA estão reduzidas em alguns pacientes com constipação. Os
movimentos peristálticos em indivíduos com constipação estavam em menor número e
mais curtos na duração e, portanto, passou por uma curta distância ao longo do cólon,
em comparação com indivíduos saudáveis durante uma pesquisa.
• INERVAÇÃO E CÉLULAS INTERSTICIAIS DE CAJAL: a motilidade
colônica proximal está sob o controle involuntário do sistema nervoso entérico,
enquanto a defecação é VOLUNTÁRIA. A constipação por trânsito lento pode estar
relacionada à disfunção autonômica. Estudos histológicos têm mostrado números
anormais de neurônios do plexo mientérico envolvidos no controle excitatório ou
inibitório da motilidade do cólon, resultando assim na diminuição da quantidade de
transmissão excitatória da substância P e um aumento da quantidade de transmissão
inibitória do VIP (peptídeo vasoativo intestinal) ou NO. As células intersticiais de
CAJAL são as células marca passo do intestino e desempenham um papel importante na
regulação da motilidade gastrointestinal. Elas facilitam a condução da corrente elétrica e
servem de mediadoras da sinalização neural entre os nervos entéricos e músculos. As
células de CAJAL iniciam as ondas lentas ao longo do TGI. Imagens confocais das
células de CAJAL em pacientes com constipação por trânsito lento mostram não só
número reduzido, mas também alterações morfológicas das células de CAJAL, com
marcas irregulares na superfície e uma diminuição no número de dendritos. Em
pacientes com constipação por trânsito lento, o número de células de CAJAL
demonstrou estar diminuído no cólon sigmoide ou em todo o cólon.
• FUNÇÃO DEFECATÓRIA: o processo de defecação em pessoas saudáveis
começa com um período pré-defecatório, durante o qual a frequência e a amplitude das
sequências de propagação (3 ou mais sucessivas ondas de pressão) estão aumentadas.

165
Estímulos como a vigília e refeições (reflexo gastroileal ou reflexo gastrocólico) podem
estimular esse processo. Esse período PRÉ-DEFECATÓRIO é brusco e pode estar
ausente em pacientes com constipação de trânsito lento. O reflexo gastroileal também
está diminuído em pessoas com constipação por trânsito lento. As fezes frequentemente
estão presentes no reto antes de surgir a vontade de defecar. A vontade de defecar
normalmente surge quando as fezes entram em contato com receptores no canal anal
superior. Quando a vontade de defecar é resistida, um movimento retrógrado de fezes
pode ocorrer, aumentando o tempo de trânsito em todo o cólon.
A flexão total do quadril alonga o canal anal no sentido ântero-posterior e corrige
o ângulo anorretal, promovendo assim o esvaziamento do reto. A contração do
diafragma e dos músculos abdominais aumenta a pressão intrapélvica, relaxando
simultaneamente o assoalho pélvico. A atividade muscular estriada expulsa o conteúdo
retal, com pequena participação do cólon ou das ondas propulsoras do reto. O
relaxamento coordenado do músculo puborretal, o qual mantém o ângulo anorretal e o
esfíncter anal externo no momento em que a pressão é aumentada no reto, resulta na
expulsão das fezes. O comprimento do cólon esvaziado durante a defecação espontânea
varia, mas geralmente estende-se do cólon descendente até o reto. Quando a ação
propulsora do músculo liso é normal, defecar normalmente requer um esforço
voluntário mínimo. Se as ondas colônicas e do reto são pouco frequentes ou ausentes, a
vontade normal de defecar pode não ocorrer.
• TAMANHO E CONSISTÊNCIA DAS FEZES: fezes duras e pequenas são mais
difíceis de passar do que as fezes moles e grandes. As fezes humanas podem variar em
consistência desde pequenos caroços duros ao líquido. O volume de água das fezes
determina a sua consistência. O rápido trânsito colônico de resíduos fecais leva à uma
diminuição da absorção de água e um aumento no conteúdo de bactéria das fezes. O
BRISTOL STOOL SCALE é utilizado na avaliação da constipação e é considerado o
melhor descritor de forma e consistência das fezes. A consistência das fezes parece ser o
melhor preditor do tempo de trânsito intestinal do que de frequência da defecação ou do
volume das fezes.
 CLASSIFICAÇÃO
A obstrução mecânica dos intestinos delgado e grosso, medicamentos e doenças
sistêmicas podem causar a constipação e essas causas secundárias da constipação devem
ser excluídas, especialmente em pacientes com um início novo de constipação intestinal.
Na maioria das vezes, entretanto, a constipação é causada por DISTÚRBIOS DA
FUNÇÃO DO CÓLON OU DO RETO (constipação funcional). A CONSTIPAÇÃO
FUNCIONAL pode ser dividida em 3 grandes categorias – constipação de trânsito
normal, constipação de trânsito lento e distúrbios de defecação e evacuação retal.

166
 ESCAPE FECAL
Incontinência fecal associada com constipação, caracterizada por eliminação
involuntária de parte do conteúdo retal (fezes amolecidas) nas roupas.
O escape fecal é uma complicação frequente em crianças constipadas e causa
enorme frustração e hostilidade nas suas famílias, bem como baixa auto-estima,
depressão, ansiedade e outros distúrbios afetivos nestes pacientes.
Esta perda involuntária de parcela do conteúdo fecal consequente à retenção de
fezes no reto é constituída por fezes e muco, sendo denominada escape fecal ou soiling.
A frequência do escape fecal é variável dependendo do grau de impactação fecal,
podendo ser esporádica ou até várias vezes ao dia. Nesta última situação, considerando
que o conteúdo fecal expelido pode ser de consistência amolecida, há casos em que a
família acredita que a criança está apresentando diarreia. Outra situação, frequentemente
observada em nossos ambulatórios, é que algumas crianças com escape fecal secundário
à constipação recebem, erroneamente, o diagnóstico de encoprese e ficam por períodos
prolongados em acompanhamento psicológico, retardando o tratamento da constipação
e, muitas vezes, há o agravamento do caso. Por isso, anamnese cuidadosa deve ser feita
no sentido de diferenciar se o escape fecal é decorrente da constipação ou se é um
quadro de encoprese ou até mesmo de incontinência fecal secundária a lesões
anatômicas ou neurológicas.
Lembramos que ENCOPRESE pode ser definida como a evacuação completa em
sua plena sequência fisiológica em local ou momento inapropriado em crianças acima
de 4 anos, sendo de natureza psicológica ou psiquiátrica. Por sua vez, incontinência
fecal é definida pela falta de controle esfincteriano secundária a distúrbio
neuromuscular, ocorrendo, por exemplo, meningomielocele etc.

167
Diagnóstico Diferencial das Constipações
 A doença de Hirschsprung ocorre em 1 em 5.000 nascimentos vivos. Essa
moléstia caracteriza-se por um segmento localizado de estenose do cólon distal,
resultante de um defeito no desenvolvimento local de nervos intrínsecos no plexo
mioentérico.
 Causas anatômicas: ânus imperfurado, estenose anal, ânus anteriorizado
 Anormalidades dos músculos abdominais: gastrosquise, Síndrome de
Down
 Causas metabólicas e intestinal: hipotireoidismo, hipercalcemia,
hipocalemia, fibrose cística, DM, Doença celíaca.
 Doença tecido conjuntivo: esclerodermia, LES, Síndrome de Ehlers-
Danlos (defeito na síntese de colágeno).
 Drogas: opiáceos, fenobarbital, antiácidos, antidepressivos,
anticolinérgicos.
 Causas neurológicas: lesão medular, trauma medular, medula presa,
encefalopatias
 Desordens musculares e neural entérica: doença de Hirschsprung, displasia
neuronal, miopatia visceral, neuropatia visceral
 Outras: ingestão de metal pesado, botulismo, alergia lactose, síndrome do
intestino irritável, hemorróidas.
A constipação orgânica em crianças pode associar-se com: perda de peso, déficit
de desenvolvimento, dor abdominal grave, vômitos, fistulas e fissuras perianais
persistentes.
Sem dúvida, o principal diagnóstico diferencial com a constipação funcional é
doença de Hirschsprung (megacolo ou aganglionose congênita) e esta patologia deve ser
considerada em qualquer criança de qualquer idade com quadro grave de constipação.
Os pacientes podem apresentar retardo da eliminação de mecônio, distensão abdominal,
massa abdominal palpável e déficit de crescimento. A doença de Hirschsprung com
segmento curto ou ultracurto pode ter manifestações clínicas muito semelhantes com a
constipação crônica funcional, inclusive com a ocorrência de escape fecal.
 DISTÚRBIOS DO ÂNUS, RETO E ASSOALHO PÉLVICO
 RETOCELE
É o abaulamento ou deslocamento do reto através de um defeito na parede anterior
do reto; Podem surgir de danos ao septo retovaginal ou das suas estruturas de apoio
durante o parto vaginal; Os pacientes sintomáticos relatam incapacidade para completar
a evacuação, dor perineal, sensação de pressão local e a aparência de uma protuberância
na abertura vaginal ao esforço físico; A proctografia evacuatória pode ser usada para
mostrar uma retocele, medir o seu tamanho e determinar se o bário fica retido dentro da
retocele.
 SÍNDROME DO PERÍNEO DESCENDENTE
O assoalho pélvico desce em maior extensão do que o normal (1- 4 cm), quando o
paciente faz um esforço durante a evacuação e a expulsão retal é difícil; O ângulo
anorretal é alargado, como resultado da fraqueza do assoalho pélvico, o reto está mais
vertical do que o normal. O corpo perineal está fraco (facilitando assim a formação de
uma retocele), e o suporte muscular frouxo favorece a intussuscepção da mucosa retal
ou o prolapso retal; A fraqueza do assoalho pélvico pode advir de um trauma ou
estiramento durante o parto; Os sintomas incluem constipação, evacuação retal
incompleta, esforço excessivo e, menos comumente, evacuação retal digital; Há

168
desnervação parcial do músculo estriado e evidência de lesão do nervo pudendo, além
de perda de fibras musculares dos músculos do assoalho pélvico.
 SENSAÇÃO RETAL DIMINUÍDA
A vontade de defecar depende em parte da tensão dentro da parede do reto
(determinada pelo tônus do músculo circular da parede do reto), do ritmo, do volume de
distensão retal, e do tamanho do reto; Alguns pacientes com constipação parecem sentir
dor normalmente quando o reto é distendido ao volume máximo tolerável, mas eles não
conseguem sentir vontade de defecar com volumes intermediários, sugerindo uma
possível neuropatia sensorial do reto. A hipossensibilidade retal (HR) é definida como a
insensibilidade do reto à distensão por balão na investigação fisiológica anorretal, e a
constipação é o sintoma mais comum na apresentação da HR.
Prolapso retal (refere-se à completa protrusão do reto através do ânus) e síndrome
da úlcera solitária do reto (é um distúrbio raro, caracterizado por eritema ou ulceração
geralmente da parede anterior do reto, como resultado do esforço crônico/ muco e
sangue podem estar presentes quando o paciente faz esforço durante a defecação) :
São partes de uma série de deficiências que surgem a partir de enfraquecimento do
assoalho pélvico; Alguns pacientes podem queixar-se de muitas visitas infrutíferas ao
banheiro, com esforço prolongado em resposta a um desejo constante de defecar; O
paciente tem uma sensação de evacuação incompleta e pode passar uma hora ou mais
por dia no banheiro; A eliminação pouco frequente de fezes duras e pequenas é comum,
assim como outras características de um distúrbio intestinal funcional, tais como dor
abdominal e distensão; A defecografia, a ustransrretal e a manometria anorretal são
úteis no diagnóstico; A reparação de um prolapso retal pode agravar a constipação.
 DISTÚRBIOS SISTÊMICOS:
 HIPOTIREOIDISMO
A constipação é a queixa gastrointestinal mais comum nesses pacientes; Os
efeitos patológicos são causados por uma alteração da função motora intestinal e a
possível infiltração do intestino por tecido mixedematoso; O ritmo elétrico básico que
gera as ondas peristálticas no duodeno diminui no hipotireoidismo, e o tempo de
trânsito do intestino delgado está aumentado; Os sintomas incluem dor abdominal,
flatulência e constipação.
 DIABETES MELLITUS
A média do tempo de trânsito do cólon é maior nos diabéticos; a neostigmina
aumentou a atividade motora do cólon em todos os pacientes diabéticos, sugerindo que
o defeito é mais neural do que muscular.
 HIPERCALCEMIA
A constipação intestinal é um sintoma comum de hipercalcemia resultante de
hiperparatireoidismo, ou também causada por sarcoidose ou uma malignidade
envolvendo o osso.
 DOENÇAS DO SISTEMA NERVOSO:
 PERDA DE CONSCIÊNCIA
 DOENÇA DE PARKINSON
O trânsito lento, a diminuição da contração fásica retal, a fraqueza da contração
muscular na parede abdominal e a contração paradoxal do esfíncter anal durante a
defecação foram as características encontradas em pacientes com DP e a constipação
frequente; A perda de neurônios contendo dopamina no SNC é a deficiência subjacente
na DP; lesões em neurônios dopaminérgicos do SN ENTÉRICO também podem estar
presentes; Outra possível causa de constipação é a incapacidade de alguns pacientes
com DP em relaxar os músculos estriados do assoalho pélvico durante a defecação;

169
 ESCLEROSE MÚLTIPLA
A constipação em indivíduos com EM pode ser multifatorial e está relacionada à
uma redução da atividade motora do cólon pós-prandial, limitada atividade física e os
medicamentos que tem como efeito colateral a constipação;
 LESÕES DA MEDULA ESPINAL
Lesões acima dos segmentos sacrais/lesões medulares  levam a um distúrbio do
neurônio motor superior  constipação grave; Lesões do cordão sacral, cone medular,
cauda equina e nervos erigentes (S2-S4).
A integração neural de controle do esfíncter anal e a propulsão retossigmóide
ocorrem nos segmentos sacrais da medula espinal. O neurônio motor que supre os
músculos estriados do esfíncter está agrupado no núcleo de ONUF ao nível de S2. Há
evidências de que nervos EFERENTES parassimpáticos que surgem nos segmentos
sacrais entram no cólon, na região da junção retossigmóide e se estendem distalmente
no plano intermuscular para atingir o nível do esfíncter anal interno e proximalmente ao
meio do cólon através dos nervos do cólon ascendente, que mantém a estrutura dos
nervos periféricos. As lesões nos segmentos sacrais da medula espinal ou de nervos
eferentes levam à uma constipação grave.
 DISTÚRBIOS ESTRUTURAIS DO CÓLON, RETO, ÂNUS E ASSOALHO
PÉLVICO
Obstrução, Miopatias que afetam a musculatura do cólon, Miopatia hereditária do
esfíncter anal interno, esclerose sistêmica progressiva (esclerodermia), distrofia
muscular, aganglionose congênita ou hipoganglionose, hiperganglionose congênita
(displasia neuronal intestinal), neuropatias adquiridas.
 MEDICAMENTOS
Pode ser por efeito colateral ou medicamentos tomados em longo prazo.
 DISTÚRBIOS PSICOLÓGICOS
A constipação pode ser um sintoma de um distúrbio psiquiátrico ou de um efeito
colateral de seu tratamento. Os fatores psicológicos associados a um tempo de trânsito
do cólon prolongado em pacientes com constipação incluem um estado de humor
altamente deprimido e com controle frequente de raiva. Os escores psicológicos
correlacionavam inversamente ao fluxo sanguíneo da mucosa retal. Os fatores
psicológicos são susceptíveis de influenciar a função intestinal através das vias neurais
eferentes autonômicas.

Fisiopatologia da Constipação Intestinal


 CAUSAS

170
Do ponto de vista fisiopatológico, a constipação crônica em geral resulta da
ingestão inadequada de fibras ou líquido ou então do trânsito colônico ou da função
anorretal desordenados em consequência de um distúrbio neurogastrenterológico, certos
fármacos, idade avançada ou em associação a grande número de doenças sistêmicas que
afetam o TGI.
A constipação de início recente pode ser um sintoma de doença orgânica
significativa, como um tumor ou estenose. Na constipação idiopática, um subgrupo de
pacientes exibe esvaziamento tardio do colo ascendente e transverso com
prolongamento do trânsito (frequentemente no colo proximal) e uma frequência
reduzida das CPAA propulsivas.
A obstrução da via de saída para defecação (também chamada de distúrbios da
evacuação) pode retardar o transito colônico, o que em geral é corrigido pela reeducação
da defecação desordenada por biofeedback. A constipação de qualquer etiologia pode
ser exacerbada por hospitalização ou doenças crônicas que acarretam comprometimento
físico ou mental e resultam em inatividade ou imobilidade física. (HARRISON)

 FISIOPATOLOGIA
Na constipação funcional, o trânsito está normal e não há distúrbio da evacuação.
Esses pacientes podem sentir dor em associação à constipação, e pode ocorrer
superposição com síndrome do intestino irritável com predominância de constipação.
Em pacientes com constipação de trânsito lento adquirida, não associada à
dilatação do cólon, há redução no número de células intersticiais de Cajal nas diferentes
túnicas do cólon sigmoide, em comparação com controles.
Megarreto e megacólon idiopáticos podem ser congênitos ou adquiridos; suspeita-
se de um defeito do sistema nervoso entérico. No caso de megacólon, o segmento
dilatado exibe contratilidade fásica normal, mas redução no tônus do cólon, com
hipertrofia da musculatura lisa e fibrose muscular da mucosa, musculatura circular e
túnicas musculares longitudinais.
Defeitos adquiridos no sistema nervoso entérico podem resultar em constipação
em casos de doença de Chagas, causada pela infecção com Trypanosoma cruzi e
resultando na destruição dos neurônios mientéricos. Também tem sido relatado a

171
ocorrência de aganglionose adquirida com anticorpos antineuronais circulantes, com ou
sem associação à neoplasia. (CECIL)
 CONSTIPAÇÃO DE TRÂNSITO NORMAL
Na constipação de trânsito normal, as fezes viajam ao longo do cólon a uma taxa
normal. Pacientes com constipação de trânsito normal podem ter idéias erradas sobre
sua frequência intestinal e muitas vezes apresentam transtornos psicossociais. Alguns
pacientes apresentam alterações da função sensorial e motoras anorretais indistinguíveis
em pacientes com constipação de trânsito lento. Se o aumento da complacência e a
diminuição da sensação retal são efeitos da constipação crônica ou contribui para o
fracasso dos pacientes em apresentar a vontade de defecar, não está claro. A maioria dos
pacientes, no entanto, apresentava testes fisiológicos normais. A SII com constipação
difere da constipação de trânsito normal, pois a dor abdominal é o sintoma
predominante na SII. Quando a dor ou o desconforto abdominal for o sintoma
predominante, a SII deve ser considerada como o diagnóstico, em vez da constipação.
Fezes soltas intermitentemente não relacionadas ao uso de laxantes também sugere um
diagnóstico de SII. Ainda que a distinção entre a SII e a constipação separadamente seja
importante, os sintomas e a fisiopatologia dessas entidades se sobrepõem
consideravelmente.
 CONSTIPAÇÃO DE TRÂNSITO LENTO
É mais comum em mulheres jovens e é caracterizada por evacuações não
frequentes (menos de 1 evacuação por semana). Entre os sintomas associados incluem
dor abdominal, inchaço e mal estar. Os sintomas são muitas vezes intratáveis, e medidas
conservadoras tais como suplementos de fibras e laxantes osmóticos, geralmente são
ineficazes. O início dos sintomas é gradual e ocorre geralmente em torno da época da
puberdade. A constipação de trânsito lento resulta de distúrbios da função motora do
cólon. Pacientes que apresentam leves atrasos no trânsito colônico tem sintomas
semelhantes aos observados em pessoas com SII. Em pacientes com sintomas mais
graves, a fisiopatologia inclui retardo no esvaziamento do cólon proximal e menos
contrações propagadas de alta amplitude após as refeições. A inércia colônica é um
termo usado para descrever o transtorno em pacientes com sintomas graves no final do
espectro. Nessa condição, a atividade motora do cólon não aumenta após a refeição, a
ingestão de BISACODIL, ou a administração de um inibidor de colinesterase
(neostigmina).
 DISTÚRBIOS DEFECATÓRIOS
Resultam da falha em esvaziar o reto efetivamente devido a uma incapacidade de
coordenar os músculos do assoalho abdominal, retoanal e pélvicos. Muitos pacientes
com esse distúrbio também apresentam constipação de trânsito lento. Os distúrbios
defecatórios também são conhecidos como anismus, dissinergia, dissinergia do assoalho
pélvico, síndrome do assoalho pélvico espástico, defecação obstrutiva ou obstrução de
saída. Esses distúrbios parecem ser adquiridos e podem iniciar na infância.
Eles podem ser um comportamento aprendido, para evitar algum desconforto
associado à eliminação de fezes duras ou de grande dor associada à tentativa de
defecação estabelecida por uma fissura anal ativa ou hemorroidas inflamadas. Pacientes
com esse distúrbio normalmente apresentam uma contração inadequada do esfíncter
anal, quando se abaixam. Este fenômeno pode ocorrer em indivíduos assintomáticos,
mas é mais comum entre os pacientes que se queixam de defecação difícil. Alguns
pacientes são incapazes de elevar a pressão intrarretal para um nível suficiente para
expelir as fezes, um distúrbio que se manifesta clinicamente como a falha do assoalho
pélvico para descer ao esforço.

172
Distúrbios defecatórios são particularmente comuns em pacientes idosos com
constipação crônica e esforço excessivo, muitos dos quais não respondem ao tratamento
médico padrão. Distúrbios defecatórios raramente estão associados à anormalidades
estruturais, tais como a intussuscepção retal, obstrução por retocele, megareto ou
excessiva descida perineal.
Pacientes com distúrbios defecatórios podem relatar evacuações NÃO
FREQUENTES, ineficazes, com esforço excessivo, e a necessidade de desimpactação
manual, no entanto, os sintomas, especialmente no caso de disfunção do assoalho
pélvico, não se correlacionam com os achados fisiológicos. Para o diagnóstico de um
distúrbio defecatório, um grupo de trabalho de ROMA especificou os critérios:
O paciente deve satisfazer os critérios para a constipação funcional descrita na
tabela anterior de conceitos ROMA III;
Durante repetidas tentativas para defecar, o paciente deve apresentar pelo menos
DUAS das seguintes condições:
 Evidência de comprometimento na evacuação, baseada no teste de expulsão
do balão ou por imagem;
 Contração inadequada dos músculos do assoalho pélvico (esfíncter anal ou
puborretal) ou menos de 20% de relaxamento da pressão basal do esfíncter observada
através de manometria, imagens ou eletromiografia;
 Inadequada força propulsiva, avaliadas pela manometria ou imagem.
Em pacientes com esse distúrbio, a constipação é FUNCIONAL, causada por
disfunção do assoalho pélvico como determinado por testes fisiológicos. Na dissinergia
do assoalho pélvico está um subconjunto destes pacientes em que o esfíncter anal não
relaxa mais do que 20% de sua pressão basal de repouso durante a tentativa de
defecação, apesar da presença de forças propulsoras adequadas no reto.
A retenção fecal funcional (RFF) é o distúrbio defecatório mais comum em
crianças. É um comportamento aprendido que resulta da retenção da defecação, muitas
vezes devido ao receio de uma evacuação dolorosa. Os sintomas são comuns e podem
resultar em encoprese secundária (incontinência fecal) devido à perda de fezes líquidas
em torno de um fecaloma. A RFF é a causa mais comum de ENCOPRESE na infância.

 TRATAMENTO
Depois que se caracteriza a causa da constipação, pode-se tomar uma decisão
sobre o tratamento. A constipação por transito lento exige tratamento clinico ou
cirúrgico agressivo; o anismo ou a disfunção do assoalho pélvico geralmente responde

173
ao tratamento com biofeedback. Contudo, apenas em cerca de 60% dos pacientes com
constipação grave detecta-se um distúrbio fisiológico (metade com transito colônico
lento e metade com distúrbio da defecação). Os pacientes com lesões da medula
espinhal ou outros distúrbios neurológicos precisam de um esquema intestinal dedicado
que em geral inclui estimulação retal, terapia com enema e doses de laxativos
cuidadosamente cronometradas. (HARRISON)
O tratamento inicial da constipação é baseado em intervenções não
farmacológicas. Se essas medidas falharem, então agentes farmacológicos podem ser
usados. Se um distúrbio defecatório estiver presente, o tratamento inicial deve incluir
um biofeedback. Por outro lado, o tratamento inicial deve incluir aumento de líquidos,
exercícios e ingestão de fibras, tanto através de mudanças na dieta, como no uso de
suplementos de fibras comerciais.
Aos pacientes que não melhorarem com fibras devem ser indicados laxantes
osmóticos, tais como leite de magnésia ou polietilenoglicol. A dose do laxante osmótico
deve ser ajustada ate que as fezes tenham uma consistência macia. Agentes estimulantes
como o bisacodil, ou os derivados do sene, devem ser reservados para pacientes que não
respondem as fibras ou laxantes osmóticos.
 MEDIDAS GERAIS
 Tranquilidade: pacientes preocupados com o intestino irregular devem ser
informadas que isto ou outros sintomas defecatórios são comuns na população saudável
em geral, e que seus sintomas não são prejudiciais.
 Mudança do Estilo de Vida: reservar com calma e, se possível, um tempo
regular para evacuação. Se o paciente apresenta uma dificuldade na expulsão das fezes,
ele deve ser aconselhado a colocar um suporte de aproximadamente 15 cm de altura sob
seus pés, quando sentado no vaso, a fim de que seu quadril fique flexionado como na
postura de cócoras. Para pessoas sedentárias, a atividade física deve ser estimulada. O
uso de fármacos anticonstipantes deve ser evitado.
 Apoio psicológico: a constipação pode ser agravda pelo estresse ou pode ser
uma manifestação de transtorno emocional (p. ex. abuso sexual prévio). Tratamento
psicológico.
 Ingestão de líquidos: a desidratação ou a depleção de sal provavelmente
conduz a um aumento da absorção de sal e água pelo cólon, levando, por sua vez, a
passagem de pequenas fezes duras. Nenhum dado apoia a ideia de que o aumento na
ingestão de líquidos melhora a constipação.
 Mudanças alimentares e suplementação de fibras: Cada grama de trigo
ingerido rende aproximadamente 2,7 gramas de fezes expelidas, porém o resultado
terapêutico de uma dieta rica em fibras muitas vezes é decepcionante como tratamento
para constipação pelo peso resultante poder ficar ainda menor que o normal. Os
pacientes queixam-se principalmente de dificuldade na defecação, mais do que uma
diminuição na frequência de evacuação. A fibra dietética (12g/dia) parece ser mais
eficaz no alívio de constipação de LEVE A MODERADA, mas não na grave,
especialmente se ela estiver associada ao trânsito de cólon lento, distúrbios na
evacuação ou medicamentos. Embora a modificação da dieta possa não propiciar
sucesso, todos os indivíduos constipados devem ser alertados inicialmente para
aumentar a sua ingestão de fibras alimentares como o mais simples, o mais fisiológico e
a forma menos dispendiosa de tratamento.
 AGENTES TERAPÊUTICOS ESPECÍFICOS
 PRODUTOS DE FIBRA COMERCIAL:

174
 Metilcelulose: é um polissacarídeos não amídico ou não amiláceos
semissintético, de cadeia com comprimento variável e grau de metilação. A
metilaçãoreduz a degradação bacteriana no cólon.
 Ispagula (psílio): é derivada da casca de uma planta, possui alta capacidade de
retenção líquida, é fermentada no cólon a uma moderada extensão e aumenta a massa
celular bacteriana.Disponível como suspensão efervescente, grânulos e em pó. Aumenta
o volume fecal na mesma proporção que a METILCELULOSE (1-4g/dia).
 Policarbofila de cálcio: é uma resina hidrofílica, resistente a degradação
bacteriana e, portanto causa menos gases e inchaço.
 Goma de Guar: ela hidrata rapidamente para formar soluções altamente
viscosas.
 OUTROS LAXANTES
O principal grupo de laxantes que não as fibras são os agentes osmóticos e os
laxantes estimulantes; amaciantes de fezes e os emolientes são agentes terapêuticos
adicionais.
Íons pouco absorvidos: os íons MAGNÉSIO, SULFATO E FOSFATO são pouco
absorvidos pelo intestino e, portanto, criam um ambiente intraluminal hiperosmolar. Seu
modo de ação primário parece ser osmótico, mas eles podem ter outros possíveis efeitos
cujas consequências ainda não estão claras, tais como o aumento da concentração de
PGs nas fezes. Em pacientes moderadamente constipados, o uso regular de hidróxido de
magnésio é um laxante eficiente e seguro. O peso das fezes aumenta aproximadamente
7,3g para cada mmol de magnésio solúvel excretado. A dose padrão de hidróxido de
magnésio contém de 40-80 mmol de íons magnésio e geralmente produz uma evacuação
dentro de 6 horas. O sulfato de magnésio é um laxante mais potente que tende a
produzir um grande volume de fezes líquidas. Pacientes podem queixar-se desse
composto, pois ele frequentemente provoca distensão abdominal e súbita eliminação de
fezes líquidas com odor fétido. O uso do magnésio em adultos mais velhos é limitado
pelos efeitos adversos, tais como flatulência, cólicas abdominais e toxicidade do
magnésio.
 AÇÚCARES POUCO ABSORVÍVEIS:
 Lactulose: dissacarídeo sintético não absorvível que consiste em galactose +
frutose unidos por uma ligação resistente à lactase. Não é absorvida pelo intestino
delgado, mas sofre uma fermentação no cólon para produzir ácidos graxos de cadeia
curta, hidrogênio e dióxido de carbono (CO2), com consequente redução do pH fecal.

175
 Sorbitol: é tão eficaz quanto alactulose e menos dispendioso. 20g dele pode
provocar diarreia em cerca de metade dos indivíduos normais. O MANITOL é outro
álcool de açúcar que pode ser usado como laxante.
 POLIETILENOGLICOL
É um laxante isosmótico, metabolicamente inerte e capaz de se ligar às moléculas
de água, portanto, aumentando a retenção de água intraluminal, e não é metabolizado
pelas bactérias do cólon. A ingestão de PEG provoca um aumento no volume das fezes,
fezes moles, que podem tornar-se líquidas dependendo do volume de PEG consumido.
PEG + eletrólitos usado na lavagem intestinal antes da colonoscopia.
 LAXANTES ESTIMULANTES
Aumentam a motilidade e a secreção intestinal. Suas ações iniciam-se em horas e
frequentemente estão associadas à cólicas abdominais. Incluem a ANTRAQUINONA
(cáscara, aloe e sene) e o DIFENILMETANO (bisacodil pode atuar no ID e no IG;
picossulfato de sódio somente no CÓLON e fenolftaleína). O efeito dos laxantes
estimulantes é dose-dependente. As doses baixas impedem a absorção da água e do
sódio, enquanto doses altas estimulam a secreção do sódio seguido pela água no lúmen
do cólon. Eles agem rapidamente e são particularmente adequados para uso em dose
única para constipação temporária.
 Antraquinonas: produzidas por uma variedade de plantas. Compostos por
glicosídeos inativos, que quando, ingeridos não são absorvidos e passam inalterados
para o intestino delgado e são hidrolisados pelos glicosídeos bacterianos do cólon para
produzir as moléculas ativas. Esses metabolitos ativos aumentam o transporte de
eletrólitos para dentro do lúmen do cólon e estimulam o plexo MIOENTÉRICO para
aumentar a motilidade intestinal. Então 6-8hras após ADM ORAL estimula a defecação.
A longo prazo, a antraquinona causa apoptose das células epiteliais do intestino, que
então são fagocitadas por macrófagos e aparecem como pigmento lipofuscina que
escurece a mucosa do cólon, uma doença denominada PSEUDOMELANOSE COLI
(EFEITO ADVERSO).
 Óleo de rícino: vem da mamona. Após a ingestão oral ele é hidrolisado pela
lipase no ID para ácido RICINOLEICO que inibe a absorção de água pelo intestino e
estimula a função motora do intestino causando danos às células da mucosa e liberando
os neurotransmissores.
 AMACIANTES DE FEZES E EMOLIENTES
 Docusato de sódio: o composto estimula a secreção de líquido pelos ID e IG,
mas não aumenta o volume da ileostomia ou o peso das fezes em indivíduos normais.
 Óleos minerais: alteram as fezes promovendo a emulsificação da massa fecal e
proporcionando lubrificação para a eliminação das fezes. O uso prolongado pode causar
má absorção intestinal de vitaminas lipossolúveis, corrimento anal e pneumonia lipídica
em pacientes predispostos à aspiração de líquidos.
 ENEMAS E SUPOSITÓRIOS
Os compostos podem ser introduzidos no reto para estimular a contração ou a
distensão por ação química, amaciar fezes duras ou ambos. O bico do enema deve ser
dirigido posteriormente após ter passado o canal anal.
 Enemas de fosfato: Os enemas de fosfato sódico hipertônico geralmente são
eficazes. Eles causam distensão e estimulação do reto. São amplamente utilizados, mas
nenhuma evidência conclusiva suporta seu uso. Os enemas de fosfato administrados em
pacientes que não conseguem eliminá-lo rapidamente pode levar a uma hiperfosfatemia

176
grave e uma tetania hipocalcêmica. O uso de enemas de fosfato em crianças menores de
3 anos não é recomendado.
 Enemas salinos, de água da torneira e de água e sabão: podem ser eficazes
principalmente pela distensão do reto e amolecimento das fezes. A evacuação
normalmente ocorre de 2-5 minutos após a administração. Um enema salino não causa
nenhum dano à mucosa do reto e pode ser eficaz. Enemas de água e sabão podem causar
danos a mucosa retal e necrose.
 Supositórios estimulantes e enemas: a glicerina pode ser administrada como
um supositório e muitas vezes é clinicamente eficaz. O reto é estimulado por um efeito
OSMÓTICO.
 ATIVADOR DO CANAL CLORÍDRICO
 LUBIPROSTONA é um ácido graxo bicíclico novo, que ativa os 2 canais de
cloreto aumentando a secreção de fluidos e o trânsito intestinal sem alterar os níveis de
eletrólitos no soro. Também DIMINUI significativamente o esforço, melhorou a
consistência das fezes, reduziu a gravidade global dos sintomas e aumentou a frequência
de evacuações espontâneas.
 AGENTES PROCINÉTICOS
Induzem a um aumento da contratilidade em um segmento do TGI. A estimulação
do receptor 5HT4 nos nervos aferentes na parede do TGI induz à CONTRAÇÃO
peristáltica do intestino. Vários agonistas 5HT4 tem sido testados para o tratamento da
constipação.
 TEGASERODE: um agonista parcial 5HT4 é uma aminoguanidina-indol
derivada da serotonina. Foi retirada do mercado em abril de 2007. Aumentou o número
de evacuações espontâneas completas de 1 ou mais/semana, também melhorou a
frequência e consistência das fezes e reduziu o esforço, mas foi retirado do mercado
devido à preocupações com a segurança cardiovascular.
 PRUCALOPRIDA: agonista total 5HT4, é um derivado benzofurano que induz
as contrações fortes no cólon proximal em cães e acelera o trânsito intestinal em seres
humanos saudáveis e em pacientes com constipação funcional.
 TD-5108: é um agonista total 5HT4.
 ANTAGONISTAS PERIFÉRICOS MU-OPIOIDES
A ação antagonista dos opióides tem sido demonstrada para reverter a disfunção
intestinal induzida por opióides, sem reverter a analgesia ou precipitar os sinais de
retirada do SNC. Esses agentes podem ser eficazes no tratamento da constipação. A
METILNALTREXONA é um antagonista do receptor mu de ação periférica dos
opióides usada para tratar a constipação induzida por opióides. O ALVIMOPAN é
também um antagonista dos receptores um usado para tratar constipação.
 OUTROS AGENTES: colchicina (aumenta a frequência de evacuações) e
misoprostol (análogo das PGs) usados para constipação crônica grave. Agentes
colinérgicos (betanecol, neostigmina-inibidor de colinesterase); toxina botulínica
(injetada no músculo puborretal); neurotrofinas (fator de crescimento neural, fator
neurotrófico derivado do cérebro e neurotrofina3).
 OUTRAS FORMAS DE TERAPIA: treinamento da defecação, biofeedback
anorretal.
 TERAPIA CIRÚRGICA
Em pacientes nos quais a constipação não está associada a uma patologia de
evacuação e não responde a terapias medicamentosas agressivas (incluindo as

177
combinações descritas anteriormente), a colectomia subtotal com ileorrectostomia é
eficaz no alívio da constipação. A colectomia laparoscópica com ileorrectostomia pode
atingir a mesma taxa de sucesso com menor morbidade, comparada a colectomia aberta
com ileorrectostomia.
Crianças que apresentam escape fecal frequentemente estão com suas vestes
íntimas sujas e por isso ficam malcheirosas, sofrendo discriminação em ambientes
sociais e muitas vezes sendo penalizadas pela própria família que julgam que a perda
fecal é voluntária.

 Métodos de Treinamento do Controle Esfincteriano


Não existem ensaios clínicos comparando os métodos entre si, sendo eles:
Brazelton, Azrin e Foxx, Treinamento Precoce e Spock
 Método de Treinamento – Brazelton
Capacita a criança a aprender por si mesmas. É um método lento. Necessárias
habilidades da criança e dos pais.
- Criança: sentar, caminhar, entender comandos, desejar autonomia, sentir-se
segura e querer agradar os pais e imitá-los.
- Pais: seguros, livres de ansiedade, disponibilidade de tempoe não devem
punir ou pressionar a criança.
 Método:
- 24 meses: comprar penico, apresentar à criança, deixar junto com seus
brinquedos, deixa-lá conhecer o objeto e sentar com roupas. Após 1 semana (se a
criança está interessada) sentar coma s fraldas, retirar o cocô da fralda e colocar no
penico, despejar no vaso, mostrar para que serve e comparar com o vaso dos adultos.
Repetir estes procedimentos: retirar as fraldas, convidá-la para sentar no penico, trainar
primeira as vezes, SE aceitar: deixar sem fralda e leva-lá para urinar frequentemente.
SE não quiser, tentar após 2-3 meses, ensinar a lavar as mão após o uso, de noite
acorda com fralda seca de 3 a 6 meses após.
 Método de Treinamento – Azrin e Foxx
Treinamento intensivo, condicionamento e imitação. Habilidades necessárias
(sentar, caminhar, seguir mais de 10 instruções e saber tirar a roupa, controlar a bexiga
(fica seca entre as trocas de fraldas, demonstrar se quer urinar e avisa se urinou ou
evacuo))
- Fase prepatória: ensinar as palavras para o treinamento (seco, molhado, xixi,
cocô), obter atenção da criança, dar uma instrução de cada vez, aguardar a realização da
tarefa e elogiar ao cumprir a tarefa.
- Fase de treinamento: material necessário (boneca que urina e demonstrações),
oferecer líquidos à criança, leva-la ao penico a cada 15 minutos, após 3 tentativos com
sucesso (urinou) pode espaçar os horários.
- Fase de acompanhamento: prática positiva e supercorreção (mudar as calças
molhadas, colocas no lugar para lavar, trocar a roupa e limpar o local molhado)
 Método de Treinamento – Treinamento Precoce
Contato próximo om bebê, mãe reconhece os sinais de uma eliminação, coloca o
penico com a criança no colo, inicia a partir de 2-3 semanas.
 Método de Treinamento – Spock
178
Mostre como são feitas as eliminações, habilidade presentes, convide-a para fazer
o mesmo, semelhante à Brazelton.

179
Problema 8 – Tipo de Hepatite? Como
assim?
► FÍGADO
O fígado é a maior glândula do organismo (pesa cerca de 1,500g e responde por
aproximadamente 1/40 do peso do corpo adulto), e é também a mais volumosa víscera
abdominal. Fígado é revestido por uma cápsula delgada de tecido conjuntivo (cápsula
de Glisson).
Sua localização é na região superior do abdômen, logo abaixo do diafragma,
ficando mais a direita, isto é, normalmente 2/3 de seu volume estão a direita da linha
mediana e 1/3 à esquerda. Ocupa hipocôndrio direito epigástrio e uma parte do
hipocôndrio esquerdo.
Além de suas muitas atividades metabólicas, o fígado armazena glicogênio e
secreta bile. A bile passa do fígado nos ductos hepáticos direito e esquerdo que se unem
para formar o ducto hepático comum, que se une ao ducto cístico para formar o ducto
colédoco. Além de armazenar bile, a vesícula biliar concentra a bile absorvendo água e
sais. Quando o alimento chega no duodeno, a vesícula biliar envia bile concentrada
através dos ductos císticos e colédoco para o duodeno.
O fígado apresenta duas faces: diafragmática e visceral.

A face diafragmática (ântero superior) é convexa e lisa relacionando-se com a


cúpula diafragmática. A face diafragmática é amplamente separada do diafragma pelos
recessos subfrênicos, ou espaços entre a parte anterior do fígado e o diafragma. E esses
recessos são separados em direito e esquerdo pelo ligamento falciforme. Essa face é
coberta por peritônio visceral, exceto posteriormente na área nua do fígado, onde esta
em contato direto com o diafragma.
A face visceral (póstero inferior) é irregularmente côncava pela presença de
impressões viscerais. É coberta por peritônio exceto na fossa da vesícula biliar e na
porta do fígado. Essa face relaciona-se com: lado direito da face anterior do estômago,
parte superior do duodeno, omento menor, vesícula biliar, flexura direita do colo e colo
transverso direito, rim e glândula suprarrenal direitos.
 TRÍADE PORTAL: ducto colédoco, artéria hepática e veia porta.

180
O fígado é dividido em lobos, estes não são lobos verdadeiros e tem apenas
relação secundária com a arquitetura interna do fígado. A face diafragmática apresenta
um lobo direito e um lobo esquerdo, sendo o direito pelo menos duas vezes maior que o
esquerdo. A divisão dos lobos é estabelecida pelo ligamento falciforme. Na extremidade
desse ligamento encontramos um cordão fibroso resultante da obliteração da veia
umbilical, conhecido como ligamento redondo do fígado.
A face visceral é subdividida em 4 lobos (direito, esquerdo, quadrado anterior e
inferior e caudado posterior e superior) pela presença de depressões em sua área central,
que no conjunto se compõem formando um "H", com 2 ramos ântero-posteriores e um
transversal que os une. Embora o lobo direito seja considerado por muitos anatomistas
como incluindo o lobo quadrado (inferior) e o lobo caudado (posterior) com base na
morfologia interna, os lobos quadrado e caudado pertencem mais apropriadamente ao
lobo esquerdo. O lado esquerdo anatômico é separado do direito na face diafragmática
pelo ligamento falciforme (contiguo com o ligamento coronário superiormente) e na
face visceral pelo ligamento redondo e pela fissura do ligamento venoso.
O ligamento redondo é remanescente fibroso da veia umbilical; e o ligamento
venoso um remanescente do ducto venoso fetal.

Entre o lobo direito e o quadrado encontramos a vesícula biliar e entre o lobo


direito e o caudado, há um sulco que aloja a veia cava inferior. Entre os lobos caudado e
quadrado, há uma fenda transversal: a porta do fígado (pedículo hepático), por onde
passam a artéria hepática, a veia porta, o ducto hepático comum, os nervos e os vasos
linfáticos.
Subdivisão funcional do fígado: parte direita e parte esquerda do fígado, cujos
tamanhos são semelhantes e cada parte recebe seu próprio ramo primário da artéria
hepática e veia porta, e drenada pelo próprio ducto hepático. O lobo caudado é uma
exceção, pois sua vascularização é independente da bifurcação da tríade portal. O fígado
ainda pode ser subdividido em 4 divisões e depois em 8 segmentos hepáticos
cirurgicamente ressecáveis, sendo cada um deles servido independentemente por um
ramo secundário ou terciário da tríade portal, respectivamente.

181
 Vascularização
 VEIA PORTA traz 75-80% do sangue para o fígado, este sangue sustenta o
parênquima hepático (hepatócitos) e tem 40% mais oxigênio do que o sangue que chega
ao átrio direito. A veia porta é formada pelas veias mesentérica superior e esplênica, e
ela conduz praticamente todos os nutrientes que são absorvidos pelo TGI para os
sinusoides hepáticos, exceto pelos lipídeos que são absorvidos pelo sistema linfático.
 A ARTÉRIA HEPÁTICA, que representa apenas 20-25% do sangue recebido
pelo fígado, é distribuído inicialmente para estruturas não parenquimatosas (ductos
biliares intra-hepáticos). A artéria é um ramo do tronco celíaco e pode ser dividida em
artéria hepática comum (do tronco celíaco até a origem da artéria gastroduodenal), e
artéria hepática própria (da origem da artéria gastroduodenal até a bifurcação da artéria
hepática). Na porta do fígado a artéria hepática e veia porta terminam dividindo-se em
ramos direitos e esquerdos.
Entre as divisões estão as veias hepáticas direita, intermédia e esquerda que são
intersegmentares em sua distribuição e função, drenando parte dos segmentos
adjacentes. As veias hepáticas, formadas pela união das veias coletoras que, por sua vez,
drenam as veias centrais do parênquima hepático, abrem-se na VCI.
 HEPATÓCITOS
O componente estrutural básico do fígado é a célula hepática, ou hepatócito. A
unidade anatômica do fígado não é o hepatócito, mas o lóbulo hepático, o qual apresenta
uma configuração geométrica, constituída de um centro ocupado pela veia central (ou
veia centrolobular ou veia hepática), circundado pelas trabéculas ou colunas de
hepatócitos, cujos limites são os espaços porta. Os hepatócitos estão radialmente
dispostos no lóbulo hepático (unidade anatômica e ácinos são unidades funcionais). Os
hepatócitos são organizados em lâminas ou “placas” cribriformes, anastomosantes, que
se estendem dos tratos portais até as veias hepáticas terminais. Entre as placas de
hepatócitos estão os sinusoides vasculares. O sangue atravessa os sinusoides e passa
para as veias hepáticas terminais por numerosos orifícios na parede da veia. Os
sinusoides são revestidos por células endoteliais fenestradas e descontínuas.
Espaços porta (tríades portais interlobulares), estão presentes nos cantos dos
lóbulos. O fígado humano contém de 3 a 6 espaços porta por lóbulo, cada um contendo
um ramo da veia porta, um ramo da artéria hepática, um dueto (parte do sistema de
duetos biliares) e vasos linfáticos. A veia porta ramifica-se repetidamente e envia
pequenas vênulas portais (interlobulares) aos espaços porta. As vênulas portais
ramificam-se em vênulas distribuidoras, que correm ao redor da periferia do lóbulo. A
partir das vênulas distribuidoras, pequenas vênulas desembocam nos capilares
sinusóides. Os sinusóides correm radialmente, convergindo para o centro do lóbulo para
formar a veia central ou veia centrolobular. À medida que a veia central progride ao
longo do lóbulo, ela recebe mais e mais sinusóides, aumentando gradualmente em
diâmetro. Ao final, ela deixa o lóbulo em sua base fundindo-se com a veia sublobular,
de diâmetro maior. As veias sublobulares gradualmente convergem e se fundem,
formando duas ou mais grandes veias hepáticas que desembocam na veia cava inferior.
A artéria hepática ramifica-se repetidamente e forma as arteríolas interlobulares,
localizadas nos espaços porta. Algumas destas arteríolas irrigam as estruturas do espaço
porta e outras formam arteríolas que desembocam diretamente nos sinusóides, provendo
uma mistura de sangue arterial e venoso portal nestes capilares. A principal função do
sistema arterial é suprir os hepatócitos com uma quantidade adequada de oxigênio. O
sangue flui da periferia para o centro do lóbulo hepático.
Além das células endoteliais, os sinusóides contêm macrófagos conhecidos como
células de Kupffer. Estas células são encontradas na superfície luminal das células

182
endoteliais, e suas principais funções são: metabolizar eritrócitos velhos, digerir
hemoglobina, secretar proteínas relacionadas com processos imunológicos e destruir
bactérias que eventualmente penetrem no sangue portal a partir do intestino grosso.
O fígado é um órgão vital, sendo essencial o funcionamento de pelo menos 1/3
dele - além da bile que é indispensável na digestão das gorduras - ele desempenha o
importante papel de armazenador de glicose e, em menor escala, de ferro, cobre e
vitaminas.
A função digestiva do fígado é produzir a bile, uma secreção verde amarelada,
para passar para o duodeno. A bile é produzida no fígado e armazenada na vesícula
biliar, que a libera quando gorduras entram no duodeno. A bile emulsiona a gordura e a
distribui para a parte distal do intestino para a digestão e absorção. Outras funções do
fígado são:
 Metabolismo dos carboidratos
 Metabolismo dos lipídeos
 Metaboliso das proteínas
 Processamento de fármacos e hormônios
 Excreção da bilirrubina
 Excreção de sais biliares
 Fagocitose
 Ativação de vitamina D
► VESÍCULA BILIAR
A vesícula biliar (7 – 10 cm
de comprimento) situa-se na fossa
da vesícula biliar na face visceral
do fígado. Esta fossa situa-se na
junção do lobo direito e do lobo
quadrado do fígado. A relação da
vesícula biliar com o duodeno é
tão íntima que a parte superior do
duodeno normalmente é
manchada com bile no cadáver. A
vesícula biliar tem capacidade
para até 50 ml de bile. A vesícula
tem 3 partes: fundo, corpo e colo.
O ducto cístico une o colo da
vesícula biliar ao ducto hepático
comum.
A túnica mucosa do colo
forma a prega espiral (válvula espiral). A prega espiral mantêm o ducto cístico aberto e
oferece resistência adicional ao esvaziamento súbito de bile quando os esfíncteres estão
fechados e há aumento súbito da pressão intra abdominal.
O hormônio CCK produzido pelo duodeno mediante a presença de alimento
gorduroso no mesmo, juntamente com a estimulação parassimpática, promove a
contração da vesícula biliar e relaxamento do músculo esfíncter do ducto colédoco,
favorecendo a secreção de bile através da papila maior do duodeno.
O Ducto Cístico (4 cm de comprimento) liga a vesícula biliar ao Ducto Hepático
Comum (união do ducto hepático direito e esquerdo) formando o Ducto Colédoco. O
comprimento varia de 5 a 15 cm. O ducto colédoco desce posterior a parte superior do
duodeno e situa-se na face posterior da cabeça do pâncreas. No lado esquerdo da parte
descendente do duodeno, o ducto colédoco entra em contato com o ducto pancreático

183
principal e quando se unem formam uma dilatação, a ampola hepatopancreática (ampola
de Vater) e a extremidade da ampola abre-se na papila maior do duodeno (de Vater). O
músculo circular ao redor da extremidade distal do ducto colédoco é mais espesso para
formar o músculo esfíncter do ducto colédoco. Quando o esfíncter contrai, a bile não
consegue entrar na ampola; portanto, reflui e segue pelo ducto cístico ate a vesícula
biliar, onde é concentrada e armazenada.
Os hepatócitos drenam bile para os canalículos biliares formados ente eles. Os
canalículos drenam para os pequenos ductos biliares interlobulares e depois para os
grandes ductos biliares coletores da tríade portal intra-hepática, que se fundem para
formar os ductos hepáticos direito e esquerdo.

Metabolismo da Bilirrubina
Os pigmentos biliares são constituídos por uma cadeia de quatro anéis pirrólicos
ligados por três pontes de carbono. É o principal produto de degradação do heme cujas
fontes no organismo, são a hemoglobina, a mioglobina e as hemoproteínas.
A formação da bilirrubina depende da biossíntese e degradação dos grupos heme,
presentes principalmente nas hemácias. A duração média de vida de uma hemácia é de
120 dias, ficando frágeis para existirem no sistema circulatório, suas membranas
celulares se rompem e a hemoglobina liberada é fagocitada pelos macrófagos teciduais
(sistema reticuloendotelial). Assim, as hemácias são fagocitadas pelo sistema retículo
endotelial (fígado, baço e medula óssea) para posterior degradação da hemoglobina,
liberando os grupos heme.
A maior parte dos grupos heme provém das hemácias senescentes, que são
capturadas pelo sistema retículo endotelial e sofrem degradação enzimática. No
organismo humano cerca de 1 a 2 milhões de hemácias são destruídas por hora, gerando
6 gramas de hemoglobina para degradação e posterior formação de 300 miligramas de
bilirrubina por dia.
A hemoglobina é degradada em globina e grupos heme, onde a primeira é
quebrada e transformada em aminoácidos para reutilização no organismo e, o segundo é
fagocitado principalmente no fígado, baço e medula óssea, até a formação de
bilirrubina. O átomo de ferro é carreado pela ferretina na circulação sanguínea e
reutilizado para formação de outros grupos heme.
A degradação do heme ocorre com a abertura do anel de tetrapirrol da porfirina
pela ação da enzima heme oxigenase, onde há quebra da ponte alfa metenil entre os
pirróis I e II. Nesta reação ocorrem duas oxigenações e o NADPH, com seu poder
redutor, libera Fe2+, CO e biliverdina, um pigmento verde. Tem sido estimado que mais
de 86% do monóxido de carbono endógeno é derivado da quebra enzimática do heme, e
a quantidade de monóxido de carbono respiratório tem sido usada como um mensurador
indireto da produção de bilirrubina.
Logo, através da enzima biliverdina redutase ocorre a formação de bilirrubina
livre (bilirrubina não conjugada) que é gradualmente liberada dos macrófagos para o
plasma. Essa enzima adiciona um hidrogênio fornecido pelo NADPH reduzindo a dupla
ligação entre os pirróis III e IV. O pigmento amarelo formado será carreado até o fígado
pela albumina, onde será posteriormente conjugado e excretado. A bilirrubina é uma
molécula apolar, lipofílica e insolúvel no plasma sanguíneo, também chamada

184
bilirrubina livre. Logo após sua formação se liga a albumina e é carreada até o fígado,
onde ocorrerá sua conjugação com o ácido glicurônico. A bilirrubina conjugada é uma
molécula polar, solúvel nos líquidos corporais e hidrofílica.
A bilirrubina entra pela face sinusoidal dos hepatócitos (absorvida nas membranas
dos hepatócitos) por difusão facilitada, ligando-se à ligandina, uma grande proteína
citosólica que tem tanto função de transporte quanto de detoxificação, aumentando a sua
solubilidade no citosol. Uma molécula de uridina-difosfato-glicose (UDP-glicose) é
transformada em UDPglicuronato através da enzima UDP-glicose desidrogenase no
reticulo endoplasmático. O UDP-glicuronato se liga a bilirrubina, formando o composto
bilirrubina diglicuronídeo, reação catalisada pela bilirrubina-UDP-glicuronil transferase.
Cerca de 80% da bilirrubina indireta será conjugada em acido glicurônico, para formar
glicuronideo de bilirrubina, cerca de 10% se unirão ao sulfato para formar sulfato de
bilirrubina, e em torno de 10% se associarão a diversidade de outras substâncias. Por
último, a bilirrubina conjugada é excretada dos hepatócitos para os canalículos biliares
por transporte ativo primário, entra no ductobiliar e é armazenada na vesícula biliar
(bile), para posterior excreção no duodeno. A bilirrubina conjugada é o principal
componente da bile.
Armazenada na vesícula biliar, a bilirrubina conjugada é então excretada no
duodeno (bile), mas sua melhor absorção ocorre no intestino grosso, onde é reduzida a
uma série de derivados incolores, chamados estercobilinogênios. A reação é catalisada
por desidrogenases bacterianas beta glicuronidase anaerobicamente no cólon. O ácido
glicurônico é removido por ação de enzimas bacterianas específicas (glicuronidases),
enquanto o pigmento é reduzido a urobilinogênio. A bilirrubina conjugada não é
captada pela mucosa intestinal. Quando atinge a parte distal do íleo e o colo, a
bilirrubina conjugada é hidrolisada em bilirrubina não conjugada pelas BETA
glicuronidases bacterianas. A bilirrubina não conjugada é reduzida pela flora bacteriana
intestinal normal para formar um grupo de tetrapirróis incolores chamados de
urobilinogênios. Em animais que não possuem microrganismos intestinais para esta
etapa, a bilirrubina passa inalterada e é excretada nas fezes, não ocorrendo a formação
de urobilinogênio. A maioria do urobilinogênio formada no intestino é excretada nas
fezes (estercobilina). Uma pequena parte é reabsorvida para a circulação portal e
reexcretada na bile. Uma pequena fração (1 a 5%) do urobilinogênio volta para a
circulação geral (via ciclo entero-hepático) e é excretado pelo rim (urobilina).
OBS: Um GLICURONÍDEO, também conhecido por glicuronosídeo, é qualquer
substância produzida pela ligação do ácido glicurônico a uma outra substância via
uma ligação glicosídica.

185
VALORES REFERENCIAIS DE BILIRRUBINA:
 DIRETA: 0,2mg/dl (ate 0,4)
 INDIRETA: 1mg/dl
 TOTAL: 0,2 a 1,0mg/dl
VALORES BILIRRUBINA TOTAL EM RN:
 menos de 24h: 1,4 a 8,7mg/dl
 menos de 48h: 3,4 a 11,5mg/dl
 de 3 a 5 dias: de 1,5 a 12mg/dl

186
Hiperbilirrubinemia Indireta
O aumento da bilirrubina indireta é causado pelo aumento da degradação do heme
ou deficiência da conjugação no fígado. A aumento da bilirrubina direta é causado,
principalmente, por deficiência na eliminação da bilirrubina pela bile. E o aumento de
ambas bilirrubinas pode ser causado por obstrução do fluxo de bile (com predomínio de
aumento da direta) ou por lesão mais intensa dos hepatócitos (em que há deficiência na
conjugação e também refluxo de bilirrubina conjugada para o sangue).
A hiperbilirrubinemia leve pode ser clinicamente indetectável, mas icterícia torna-
se evidente em concentrações plasmáticas de bilirrubina de 3 a 4 mg/dl, dependendo da
pigmentação normal do paciente, das condições de observação e da fração de bilirrubina
que se encontra elevada.
A hiperbilirrubinemia pode resultar tanto de fatores extra-hepáticos quanto de
defeitos herdados ou adquiridos em aspectos específicos da distribuição de bilirrubina
hepática.
A concentração plasmática de bilirrubina não conjugada ([BNC]) é determinada
por um equilíbrio entre a taxa de produção de bilirrubina (TPB) e a depuração
(clearance) hepática de bilirrubina (C) de acordo com a relação:
[BNC]TPB/C
Onde a C, é análoga à depuração da creatinina no teste de função renal; ela é uma
medida da taxa na qual a bilirrubina é excretada do plasma, constituindo um teste
quantitativo verdadeiro da função hepática. Embora a TPB e a C não sejam facilmente
quantificadas, dosagens investigativas resultaram em conhecimentos fisiopatológicos
úteis. A equação 1 indica que a [BNC] aumenta linearmente com um aumento na TPB
ou hiperbolicamente com uma diminuição na C oferecendo uma base para a
classificação de hiperbilirrubinemias não conjugadas de acordo com a sua patogênese.
 Produção Aumentada de Bilirrubina
Produção aumentada de bilirrubina e hiperbilirrubinemia não conjugada resultante
podem ser causadas por hemólise, por uma destruição acelerada de hemácias
transfundidas, reabsorção de hematomas ou eritropoiese inefetiva (p. ex.,
envenenamento por chumbo, anemias megaloblásticas relacionadas com a deficiência
de ácido fólico ou de vitamina B12, anemia sideroblástica, porfiria eritropoiética
congênita ou doenças mieloproliferativas ou mielodisplásicas).
Nessas situações, outras provas hepáticas tipicamente são normais e a
hiperbilirrubinemia é modesta, raramente excedendo 4 mg/dl; valores superiores
implicam disfunção hepática concomitante. No entanto, após a transfusão sanguínea
rápida ou a reabsorção de hematomas maciços causados por traumatismo, a carga
aumentada de bilirrubina pode ser transitoriamente suficiente para produzir urna
icterícia franca. As causas de hemólise são numerosas. Além dos distúrbios sanguíneos
específicos, a hemólise leve acompanha muitas doenças adquiridas. Na vigência de
doença sistêmica, que pode incluir um grau de disfunção hepática, a hemólise pode
produzir um componente da hiperbilirrubinemia conjugada, além de uma concentração
elevada de bilirrubina não conjugada. A hemólise prolongada pode levar à formação de
cálculos biliares de bilirrubina, que podem causar colecistite, obstrução ou qualquer
outra consequência da doença calculosa sobre as vias biliares.
 Distúrbios hemolíticos:
- hereditários: esferocitose, eliptocitose, anemia falciforme, talassemia e deficiência
de enzimas eritrocitárias, deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase e
piruvatoquinase.

187
- adquiridos: anemia hemolítica microangiopática, hemoglobinúria paroxística
noturna, anemia ligada à acantose, hemólise imune e infecções parasitárias (malária).
 Depuração Diminuída da Bilirrubina Hepática
 Captação Diminuída da Bilirrubina
Vários medicamentos (p. ex., rifampina, ácido flavaspidico, novobiocina e vários
contrastes colecistográficos) inibem competitivamente a captação hepatocelular de
bilirrubina. A hiperbilirrubinemia não conjugada resultante desaparece com a
interrupção da medicação. A captação diminuída de bilirrubina hepática também parece
contribuir para hiperbilirrubinemia não conjugada da síndrome de Gilbert, embora a
principal base molecular para essa síndrome seja urna redução da conjugação de
bilirrubina.
 Comprometimento da Conjugação de Bilirrubina
A causa mais frequente de depuração diminuída da bilirrubina é uma diminuição
na atividade de conjugação da bilirrubina. A conjugação da bilirrubina com ácido
glicurônico é catalisada por uma UDP-glicuronosil transferase, designada UGT1A1 e
codificada pelo complexo do gene UGT1. O gene UGT1A1 é incorporado por splicing
alternativo de uma variante do éxon1 específica para bilirrubina, designada éxon A1,
com quatro éxons comuns (éxon 2 a 5) que codificam uma extremidade terminal
carboxila compartilhada por todas as proteínas codificadas pelo UGT1. Sua região
promotora normalmente contém uma sequência tipo A(TA)6TAA TATAbox.
 Distúrbios Genéticos da Conjugação da Bilirrubina
As hiperbilirrubinemias hereditárias são um grupo de cinco síndromes no qual a
hiperbilirrubinemia ocorre como uma anormalidade bioquímica isolada, sem evidências
de necrose hepatocelular ou colestase. A síndrome de Crigler-Nnjjar tipos 1 e 2 e a
síndrome de Gilbert são formas hereditárias de hiperbilirrubinemia não conjugada que
resultam de mutações no UGT1A1. Na síndrome de Crigler-Najjartipo 1,
essencialmente não existe atividade enzimática funcional, enquanto pacientes com a
síndrome de Crigler-Najjar tipo 2 têm até 10% do normal e pacientes com a síndrome
de Gilbert (mais comum) tem de 10% a 33% do normal, levando a concentração de
bilirrubina de 18 a 45, 6 a 25, e de 1,5 a 4 mg/dL, respectivamente. Cada um desses
distúrbios é herdado como um traço autossômico recessivo.
 Hiperbilirrubina Não Conjugada no Período Neonatal
A maioria dos neonatos desenvolve hiperbilirrubinemia não conjugada leve entre
os dias 2 e 5 após o nascimento devido à imaturidade hepática e aos baixos níveis de
UGT1A1. Os níveis de pico na bilirrubina são tipicamente inferiores a 5 a 10 mg/dl, e
os níveis retornam ao normal dentro de 2 semanas, quando os mecanismos de
distribuição da bilirrubina amadurecem. A prematuridade, com hemólise ou imaturidade
hepática, está associada a níveis mais altos de bilirrubina indireta e isso pode levar que a
BI atravesse a barreira hematoencefálica levando a precipitação nos núcleos da base
causando kernicterus (lesão encefálica) que podem demandar fototerapia.
O esteróide pró-gestacional3 alfa, 20beta-pregnanediol e certos ácidos graxos
encontrados no leite materno (mas não no soro) de algumas mães inibem a conjugação
de bilirrubina e podem causar uma hiperbilirrubinemia neonatal excessiva (icterícia do
leite materno). Por comparação, a hiperbilirrubinemia neonatal familiar transitória
(síndrome de Lucey-Driscoll) é causada por um inibidor da UGT1A1 encontrado no
soro materno.
 Defeitos de Conjugação Adquiridos
Uma modesta redução na capacidade de ligação da bilirrubina ocorre na hepatite
avançada ou cirrose. Todavia, nesta situação, a conjugação é mais bem preservada do
que outros aspectos da distribuição de bilirrubina, como a excreção canalicular.

188
Perturbações farmacológicas e metabólicas também podem levar a reduções adquiridas
na conjugação de bilirrubina. Vários medicamentos (p. ex., pregnanediol, novobiocina,
cloranfenicol, gentamicina e vários inibidores da protease do HIV) podem causar
hiperbilirrubinemia não conjugada por inibição da UGT1A1. Em todas as circunstâncias
nas quais os inibidores da UGT1A1 causam hiperbilirrubinemia não conjugada, a
hiperbilirrubinemia é maior em pacientes com síndrome de Gilbert subjacente.

Colestase
Colestase é uma alteração da secreção biliar hepatocelular, envolvendo todos os
componentes da bile (Popper). Geralmente, ela representa um obstáculo ao fluxo biliar,
dificultando ou impedindo a chegada da bile ao duodeno. Tal situação constitui a
colestase mecânica, comprometendo a árvore biliar extra-hepática ou a intra-hepática.
Mas existem situações nas quais não há obstáculo ao fluxo biliar e, às vezes,nem
icterícia, caracterizando a forma de colestase intra-hepática, cuja natureza é devida a
alterações provavelmente metabólicas. Colestase é definida como toda alteração
fisiopatológica caracterizada pela diminuição ou ausência de fluxo biliar no duodeno.
 FISIOPATOLOGIA
Colestase é a retenção sistêmica dos constituintes da bile como resultado da falha
na produção e excreção biliar. No fígado, os hepatócitos estão organizados em placas
cribriformes que se anastomosam ao longo dos sinusoides. No polo apical, entre os
hepatócitos adjacentes, situa-se o canalículo ou espaço biliar de 1 a 2 μM. Cada
hepatócito pode ter múltiplos canalículos (até três), que são caracterizados por
microvilos que sobressaem no lúmen canalicular.
A bile consiste em água, eletrólitos e solutos orgânicos. Ela é constantemente
modificada pelos colangiócitos que revestem os ductos biliares e pela mucosa da
vesícula biliar e, desta forma, a bile da vesícula biliar é marcadamente diferente da bile
hepática. A mucosa da vesícula biliar absorve água e concentra a bile, portanto, a

189
concentração total de lipídios na bile da vesícula biliar é muito maior que na bile
hepática (10 vs. 3 g/dl, respectivamente).
Os principais ácidos biliares primários são o ácido cólico e o ácido
quenodesoxicólico. Os ácidos biliares secundários, ácidos litocólico e desoxicólico, que
são derivados da quebra intestinal dos ácidos primários, são mais hidrofóbicos,
aumentam na colestase, e podem ser tóxicos para os hepatócitos. A amidação com
glicina ou taurina resulta na formação de sais biliares que preferencialmente são
secretados na bile. Os sais biliares são moléculas do tipo detergente anfofílicas
sintetizadas a partir do colesterol por uma via metabólica dependente de 7 alfa-
hidroxilase ou da esterol-27-hidroxilase.
A síntese de sais biliares responde por 50% do metabolismo hepático de
colesterol. Os sais biliares são secretados no espaço canalicular por uma bomba
exportadora de sal biliar dependente de energia. Na membrana canalicular, os sais
biliares existem como micelas simples (apenas sais biliares) ou mistas (com
fosfatidilcolina e colesterol) e são transportados para a vesícula biliar.
Uma refeição gordurosa resulta em contração da vesícula biliar com expulsão dos
sais biliares no duodeno, onde formam micelas com a gordura intraluminal. O principal
fosfolipídeo na bile é a fosfatidilcolina, também chamada de lecitina. A fosfatidilcolina
na bile é derivada de uma de fosfatidilcolina hepática recém-sintetizada, que é, então,
transportada através do hepatócito por uma proteína transferidora de fosfatidilcolina e
liberada no receptor MDR3 (do inglês, multidrugresistance receptor 3), um
transportador específico de fosfatidilcolina para a secreção final na bile. Todos os
lipídeos biliares, incluindo o colesterol, são secretados de forma controlada por um
conjunto de transportadores que se ligam à adenosina trifosfato (ATP).
 CAUSAS: defeito na secreção de bile pelo hepatócito e obstrução intra ou extra-
hepatica dos canais biliares.
 COLESTASE INTRA-HEPÁTICA
Geralmente é decorrente de disfunção hepatocelular ou de lesão nos ductos
biliares de pequeno e médio calibre por vírus, álcool e medicamentos. Ou seja, ocorre
quando o hepatócito é incapaz de excretar a bile ou quando existe algum problema de
drenagem da bile na árvore biliar dentro do próprio parênquima hepático. Apresenta-se
sob duas formas: metabólica e mecânica.
 Metabólica: A colestase intra-hepática de causa metabólica apresenta-se com
ou sem lesão hepatocelular, sendo a última mais frequente. Exemplos de colestase intra-
hepática sem lesão hepatocitária são: (1) reação aos anticoncepcionais e esteróides
anabolizantes, dependentes do determinismo genético, pela sensibilidade aos radicais
contidos no carbono na posição 17 (C17) destas substâncias; (2) colestase da gravidez,
que pode apresentar-se somente com prurido (prurido da gravidez) ou com prurido e
icterícia; (3) na criança, a colestase pode aparecer associada a uma série de situações,
tais como infecções virais (hepatite, células gigantes, citomegalia), metabólicas e
atresias intra ou extra-hepáticas. As colestases com lesão hepatocitária ocorrem
principalmente nas hepatites e cirroses.
 Mecânica: Compreende as colestases secundárias a obstáculo ao fluxo biliar
intra-hepático. Os principais exemplos são: (1) a cirrose biliar primária, que se
acompanha de colestase nos últimos estágios, quando há evidente destruição dos duetos
biliares, além de inflamação e fibrose periductal; (2) as metástases hepáticas, nas quais a
colestase só ocorre quando grande parte do parênquima está invadido e os nódulos
tumorais comprimem os duetos biliares; (3) na doença de Hodgkin, por lesão destrutiva
dos duetos biliares, lesão centrolobular e formação de cicatrizes fibróticas; (4) no câncer
da bifurcação do hepático comum, a icterícia tem característica de extra-hepática, com

190
dilatação ductal a montante; (5) a atresia dos duetos (intra e/ou extra-hepática), assim
como a dilatação congênita dos duetos intra-hepáticos (doença de Caroli), manifesta-se
com icterícia desde os primeiros meses de nascimento e pode estar associada à cirrose;
(6) cálculos intra-hepáticos provocam icterícia, quando numerosos e disseminados.
 COLESTASE EXTRA-HEPÁTICA
Na obstrução extra-hepática, geralmente não há lesão hepatocitária, e a icterícia é
produzida por um obstáculo situado entre a bifurcação do hepático comum e a papila de
Vater (principalmente do COLÉDOCO), dentro ou fora do tronco biliar. Quando a
obstrução é prolongada, as estruturas acima dela tornam-se dilatadas, e o colédoco e os
duetos biliares podem aumentar até 10 vezes o seu diâmetro. As causas mais comuns de
obstrução extra-hepática são coledocolitíase e câncer (papila, pâncreas). Outras causas
pouco comuns são: obstrução das vias biliares devido à penetração de áscaris no
colédoco, carcinoma da vesícula e blastomicose sul-americana cuja adenomegalia
parasitária comprime as estruturas do hilo hepático. Também pode ser provocada pela
colangite esclerosante, que é uma doença auto-imune, que leva a estenose no sistema
biliar intra e extra-hepático.
 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
As manifestações clínicas depende da localização e da causa do processo
obstrutivo e do grau em que a associação do aumento das citocinas pró-inflamatórias
diminui a síntese e secreção de sais biliares. A colestase intra-hepática geralmente é
resultado ou de disfunçãohepatocelular ou de lesões nos ductos biliaresintra-hepáticos
de pequeno e médio calibres por vírus, álcool ou drogas.
A retenção de sais biliares pode levar a um excesso de sais biliares hidrofóbicos,
como o desoxicólico, que são hepatotóxicos. Esses sais biliares retidos podem
extravasar para fora do fígado e elevar os níveis de sais biliares no soro e na pele; o
resultado é prurido. O colesterol em excesso é depositado em todos os tecidos,
particularmente como xantomas tendinosos e xantelasmas periorbitais, mas
clinicamente uma aterosclerose significativa é incomum.
Na colestase, as concentrações de sais biliares intestinais são inadequadas para
solubilizar os lipídeos da dieta; o resultado é a excreção do excesso de gordura não
absorvida. Os ácidos graxos de cadeia longa da dieta também irritam a mucosa do
cólon. A esteatorreia é sugerida pela presença de gordura corável nas fezes e confirmada
pela analise quantitativa de uma amostra de fezes.
Uma vez que a má absorção de vitaminas lipossolúveis A,D, E e K pode resultar
em síndrome de deficiência, estas e os ácidos graxos essenciais devem ser
administrados como suplementos dietéticos. Uma combinação de osteomalacia e
osteoporose representa uma grave consequência da colestase e da doença hepática
crônica.
 COMPLICAÇÕES
PANCREATITE AGUDA é principal complicação da colestase extra-hepática.

191
Cálculos Biliares
A bile formada nos lóbulos hepáticos é secretada para dentro de uma complexa
rede de canalículos, pequenos dúctulos biliares e ductos biliares maiores que se
deslocam juntamente com linfáticos e ramos da veia porta e da artéria hepática nos
tratos portais localizados entre os lóbulos hepáticos.
A bile hepática é um líquido isotônico com uma composição eletrolítica
semelhante à do plasma. A composição eletrolítica da bile vesicular difere da bile
hepática, pois a maioria dos ânions inorgânicos, cloreto e bicarbonato, já foi removida
pela reabsorção através do epitélio da vesícula. Como resultado da reabsorção da água,

192
a concentração total de solutos na bile aumenta de 3-4 g/dL na bile hepática para 10-15
g/dL na bile da vesícula.
Os principais solutos da bile consistem em ácidos biliares (80%), lectina e traços
de outros fosfolipideos (16%), além de colesterol não esterificado (4%), podendo chegar
a 8% no estado litogênico. Outros componentes incluem a bilirrubina conjugada,
proteínas (todas as imunoglobulinas, a albumina, os metabólitos de hormônios e outras
proteínas metabolizadas no fígado), eletrólitos, muco e, com frequência, medicamentos
e seus metabólitos.
A secreção basal total diária de bile hepática é cerca de 500 a 600 ml, e muitas
substâncias são captadas ou sintetizadas pelos hepatócitos e secretadas para dentro dos
canalículos biliares.
Os ácidos biliares primários, ácido cólico e ácido quenodesoxicólico (AQDC), são
sintetizados a partir do colesterol no fígado pela enzima 7 alfa-hidroxilase, conjugados
com glicina ou taurina e secretados para dentro da bile. Os ácidos biliares secundários,
como o desoxicolato e litocolato, são formados no colo como metabólitos bacterianos
dos ácidos biliares primários. No entanto, o ácido litocólico é absorvido muito menos de
maneira eficiente no colo que o ácido desoxicólico. Outro ácido biliar secundário,
encontrado em baixas concentrações, é o ursodesoxicólico (AUDC), um estéreo isômero
de AQDC.
Os ácidos biliares são moléculas semelhantes a detergentes que, em solução
aquosa e acima de uma concentração critica formas agregados moleculares
denominados micelas. Em presença de concentrações normais de colesterol e lectina,
ocorre a formação de micelas mistas, que favorecem a solubilização da bile. Quando
estas concentrações não estão normais, ocorre a precipitação dos cristais de colesterol
na bile. Além de facilitar a excreção biliar de colesterol, a bile atua formando micelas
com as gorduras dietéticas e vitaminas lipossolúveis, o que favorece na absorção
intestinal.
Após serem lançadas no duodeno, os ácidos biliares são reabsorvidos por difusão
passiva ao longo do TGI, tanto os não conjugados quanto os conjugados. Porém, o
mecanismo mais importante é o transporte ativo para os ácidos biliares conjugados no
íleo distal. Eles são reabsorvidos, caem na veia porta hepática, vão para o fígado e
rapidamente são captados novamente pelos hepatócitos, reconjugados e voltam a ser
lançados na bile (circulação êntero - hepática). Normalmente existe uma reserva de
ácidos biliares de 02-04g e eles recirculam na circulação entero-hepática pelo menos 1
vez ou mais a cada refeição.
Normalmente recircula de 5-10X diariamente. Normalmente, é excretado nas
fezes cerca de 0,2-0,4 g/dia de ácidos biliares, que também são produzidos diariamente
pelo fígado, mantendo sua concentração constante. Sua produção é limitada pelo
fedback negativo, pela enzima 7 alfa-hidroxilase. Produção máxima de 5 g/dia, quando
existem condições que prejudiquem a reabsorção.
 Função da vesícula biliar e dos esfíncteres
No jejum, o esfíncter de Oddi representa uma zona de alta pressão de resistência
ao fluxo de bile do colédoco para dentro do duodeno. Essa concentração tônica serve
para prevenir o fluxo do conteúdo duodenal para dentro dos ductos pancreáticos e
biliares e promover o enchimento da vesícula biliar. O principal fator que controla a
evacuação da vesícula biliar é o hormônio peptídeo colecistocinina (CCK), que é
liberada pela mucosa duodenal em resposta a ingestão de gorduras e aminoácidos. Ela
provoca contração da vesícula biliar, menor resistência do esfíncter de Oddi e fluxo
acelerado do conteúdo biliar para dentro do duodeno.

193
A bile hepática é concentrada dentro da vesícula biliar pela absorção transmucosa
de água e eletrólitos graças a um mecanismo que depende de energia. A capacidade da
vesícula é de 30ml.
 FORMAÇÃO DOS CÁLCULOS
Os cálculos biliares são formados devido a uma composição anormal da bile. São
divididos em dois tipos principais: os cálculos de colesterol, que são responsáveis por
mais de 80% do total, e os cálculos pigmentares, que representam menos de 20%. Os
cálculos de colesterol contêm habitualmente > 50% de monoidrato de colesterol mais
uma mistura de sais de cálcio, pigmentos biliares e proteínas. Os cálculos pigmentares
são constituídos principalmente por bilirrubinato de cálcio; contêm < 20% de colesterol
e são classificados em tipos “pretos” e “marrons”, sendo os últimos formados em
virtude de infecção biliar crônica.
Existem três tipos diferentes de cálculos biliares: cálculos biliares de colesterol,
cálculos biliares mistos e cálculos pigmentados, que por sua vez podem ser divididos
em cálculos negros e marrons. Os cálculos de colesterol e os cálculos mistos são
responsáveis por 80% da doença da vesícula biliar nos EUA. Os cálculos de colesterol
contêm mais de 70% de colesterol, enquanto os cálculos mistos também contêm
quantidades significativas de pigmentos, como a bilirrubina. Os cálculos pigmentados
negros, que geralmente estão associados a doenças hemolíticas, contêm sais de cálcio,
bilirrubina e proteínas. Os cálculos pigmentados marrons estão associados a colangite
intra-hepática e infecção.
 CÁLCULOS DE COLESTEROL
O colesterol é essencialmente insolúvel na água e depende de sua dispersão
aquosa dentro de micelas ou vesículas, sendo em ambos os casos necessária a presença
de um segundo lipídeo para solubilizar o colesterol. O colesterol e os fosfolipídios são
secretados e lançados na bile como vesículas unilamelares formando duas camadas, que
são transformadas em micelas mistas que consistem em ácidos biliares, fosfolipídios e
colesterol pela ação dos ácidos biliares. Se houver um excesso de colesterol em relação
aos fosfolipídios e ácidos biliares, observa-se a persistência de vesículas instáveis ricas
em colesterol, que se agregam em grandes vesículas multilamelares a partir das quais
ocorre a precipitação dos cristais do colesterol.
Existem vários mecanismos importantes na formação da bile litogênica
(formadora de cálculos). O mais importante é a secreção aumentada de colesterol. Isso
pode ocorrer em associação à obesidade, síndrome metabólica, dietas com alto conteúdo
calórico e ricas em colesterol ou medicamentos (p. ex. clofibrato) e pode resultar do
aumento da atividade da hidroximetilglutaril-coenzima A (HMG-CoA), a enzima
limitadora de velocidade da síntese hepática de colesterol, e da captação hepática
aumentada de colesterol a partir do sangue.
Nos pacientes com cálculos biliares, o colesterol dietético faz aumentar a secreção
biliar de colesterol, o que na ocorre nos pacientes sem cálculos biliares que recebem
dietas ricas em colesterol. Além dos fatores ambientais, como as dietas com alto
conteúdo calórico e ricas em colesterol, os fatores genéticos desempenham um papel
importante na doença calculosa biliar.
Foi encontrado um polimorfismo de nucleotídeo único do gene que codifica o
transportador de colesterol hepático ABCG5/G8 em 21% dos pacientes com cálculos
biliares, porém em apenas 9% da população geral. Acredita-se que ele produza um
ganho de função do transportador de colesterol e contribua para a hipersecreção de
colesterol. Uma alta prevalência de cálculos biliares é observada em: parentes de 1°
grau, índios norte-americanos, índios chilenos e chilenos-hispânicos. Em alguns
pacientes, a transformação hepática prejudicada do colesterol em ácidos biliares

194
também pode ocorrer, resultando em um aumento da relação colesterol litogênico/
ácidos biliares.
Mutações no gene CYP7A1 resulta na deficiência da enzima colesterol 7-
hidoxilase, a qual catalisa a etapa inicial do catabolismo do colesterol e da síntese dos
ácidos biliares. As mutações nesse gene pode contribuir para a suscetibilidade a
formação de cálculos biliares. As mutações no gene MDR3 (ABCB4), que codifica a
bomba de exportação dos fosfolipídios na membrana canalicular do hepatócito, podem
causar alteração na secreção dos fosfolipídios que irão penetrar a bile, resultando em
supersaturação de colesterol na bile e formação de cálculos biliares de colesterol na
vesícula biliar e nos ductos biliares. Assim, um excesso de colesterol biliar em relação
aos ácidos biliares e fosfolipídios é devido principalmente a hipersecreção de colesterol,
porem a hipossecreção de ácidos biliares ou fosfolipídios também pode contribuir.
A formação de cálculos de colesterol envolve 4 situações simultâneas:
 Bile supersaturada com colesterol. Porém não é suficiente para formação
dos cálculos, pois o tempo necessário para que os cristais de colesterol possam sofrer
nucleação e crescer é maior que o período durante ao qual a bile permanece na vesícula
biliar.
 Hipomotilidade (estase) da vesícula biliar promove a nucleação e formação
de vesículas multi lamelares. O esvaziamento de bile é reduzido.
 A nucleação dos cristais de monoidrato de colesterol, muito acelerada na
bile litogênica humana. A nucleação acelerada pode ser devido ao excesso de fatores
pronucleação (mucina, glicoproteínas da mucina como as imunoglobulinas) ou à
deficiência dos fatores antinucleação (a polipoproteinas A-1 e A-2, e outras
glicoproteínas). A nucleação dos cristais de monoidrato de colesterol e o crescimento
dos cristais ocorrem provavelmente dentro da camada de gel de mucina. A fusão das
vesículas da origem aos cristais líquidos, os quais sofrem nucleação e se transformam
em cristais sólidos de monoidrato de colesterol. O crescimento contínuo dos cristais
ocorre por nucleação direta das moléculas de colesterol a partir das vesículas biliares
uni ou multilamelares supersaturadas.
 Hipersecreção de muco da vesícula aprisiona os cristais nucleados, levando
sua agregação em cálculos – LAMA BILIAR.
 LAMA BILIAR: contêm cristais líquidos de leucitina-colesterol, cristais de
monoidrato de colesterol, bilirrubina de Ca e gel de mucina indica desarranjo da
secreção de mucina e de eliminação e favorece nucleação de solutos. É uma forma
precursora da doença calculosa.
Outras condições estão associadas à formação de cálculos de colesterol ou lama
biliar: a gravidez e a rápida redução de peso por meio de dieta com teor calórico muito
baixo. Parece haver 2 mudanças fundamentais durante a gravidez: (1) aumento
acentuado na saturação de colesterol da bile durante o 3° trimestre e (2) lenta contração
da vesícula em resposta a uma refeição padronizada, resultando em menor esvaziamento
da vesícula biliar.
Para resumir, a doença com cálculos biliares de colesterol ocorre em virtude de
varias alterações, que consistem em (1) supersaturação da bile com colesterol, (2)
nucleação do monoidrato de colesterol com subsequente retenção de cristais e
crescimento do cálculo, bem como (3) função motora anormal da vesícula biliar com
esvaziamento retardado e estase.

195
 CÁLCULOS PIGMENTARES
Os cálculos pigmentares pretos são constituídos por bilirrubina de cálcio puro ou
por complexos semelhantes a polímeros com cálcio e glicoproteínas de mucina, mais
comuns nos pacientes vítimas de estados hemolíticos (com maior quantidade de
bilirrubina conjugada na bile), cirrose hepática, síndrome de Gilbert ou fibrose cística.
Os cálculos com pigmento negro contêm 10% a 90% de bilirrubinato de cálcio em
combinação com uma variedade de outros sais de cálcio, como a hidroxiapatita e o
carbonato. Os cálculos de vesícula nos pacientes com doenças ileais, ressecção ileal ou
by-passileal geralmente são cálculos pigmentares pretos. A reciclagem êntero-hepática
da bilirrubina nos estados com doenças ileais contribui para sua patogenia.
Os cálculos pigmentares marrons (castanhos ou ferrosos) são formados por sais
bilirrubinato de cálcio não conjugado com quantidades variáveis de colesterol e
proteínas, sendo causados pela presença de maiores quantidades de bilirrubina não
conjugada insolúvel na bile que sofre precipitação para formar os cálculos. A
desconjugação de um excesso de mono e diglicuronatos de bilirrubina solúveis pode ser
mediada por BETA-GLICURONIDASE endógena, embora possa ocorrer também por
hidrolise espontânea. Às vezes, a enzima é produzida também quando a bile é infectada
cronicamente por bactérias, caso em que esses cálculos são marrons.
A formação de cálculos pigmentares é particularmente proeminente em asiáticos e
esta frequentemente associada a infecções na vesícula e na árvore biliar. Os cálculos
biliares marrons estão relacionados com dietas de baixa caloria, ricas em legumes e
verduras, podem localizar-se tanto nas vias biliares quanto no fígado, e têm uma forte
associação com a colangite piogênica recorrente e a colângio-hepatite.
As enzimas bacterianas desconjugam a bilirrubina do glicuronato e hidrolisam os
fosfolipídios, com isso levando à precipitação de cálcio, bilirrubina e ácidos graxos

196
livres. Estes cálculos, frequentemente macios e fáceis de fragmentar por via
endoscópica, são comumente tratados com extração endoscópica.
A idade mais avançada está associada à maior incidência de cálculos
pigmentados, assim como a nutrição parenteral total e as doenças hemolíticas.

Litíase Biliar
► COLELITÍASE
A colelitíase caracteriza-se por ser a presença de cálculos na vesícula biliar. Os
cálculos geram sintomas devido à inflamação que provocam o cálculo por migrarem
para o ducto cístico ou colédoco.
A relação homem-mulher da colelitíase ajustada para a idade é de 2,9 entre as
idades de 30 e 39 anos, mas diminui para 1,2 entre as idades de 50 e 59 anos. Em
comparação com os homens, as mulheres com colelitíase também têm maior
probabilidade de se submeter a uma colecistectomia. A gravidez parece ser um fator de
risco importante para a maior prevalência de colelitíase em mulheres jovens - 1,3% em
mulheres nulíparas comparadas com 13% em mulheres multíparas. O uso de estrogênios
também está associado a um maior risco de colelitíase sintomática e de colecistectomia,
com um risco relativo de 2, 1 a 3,7 comparado com nenhum uso de estrogênio.
Os mecanismos de aumento de risco compreendem a ativação da secreção biliar
de colesterol hepático via receptor-alfa, uma redução induzida pela progesterona na
contratilidade da vesícula biliar e uma alteração induzida por gravidez no equilíbrio de
sais biliares hidrofóbicos/hidrofílicos. A obesidade contribui para um risco maior de
cálculos biliares devido à estimulação na absorção de colesterol, sua síntese e secreção.
 Quadro Clínico
Os cálculos biliares podem estar presentes por décadas, antes que ocorra o
aparecimento dos sintomas – 70% a 80% permanecem assintomáticos durante toda a
vida.
Os sintomas causados pelos cálculos biliares frequentemente são inespecíficos e
incluem náuseas, distensão abdominal e dor no quadrante superior direito. A cólica
biliar, descrita como uma dor epigástrica ou no quadrante superior direito, que ocorre 15
a 30 minutos após uma refeição, frequentemente irradiando para a região dorsal
escápula direita ou ombro direito, dor continua, aguda, súbita, inicia bruscamente,
desaparece gradual ou rapidamente - é imprevisível, intensa e geralmente constante,
mas não é uma verdadeira cólica. A dor persiste por três a quatro horas (15 min a 5h –
(HARRISON) e pode estar associada a náuseas e vômitos. Na colecistite não
complicada, não há febre nem leucocitose, a dor em geral pode ser adequadamente
tratada com uma única dose de analgésico narcótico ou anti-inflamatório não esteroide

197
(AINE), e a dor geralmente melhora dentro de 6 horas. Crises de cólica podem ocorrer
com intervalos de dias ou meses. Não ocorre febre ou sinais de inflamação. Sinal de
Murphy POSITIVO.
Um nível elevado de bilirrubina sérica e/ou de fosfatase alcalina sugere um
cálculo coledociano. Febre ou calafrios com dor biliar implicam habitualmente uma
complicação, isto é, colecistite, pancreatite ou colangite. As queixas de plenitude
gástrica indefinida, dispepsia, eructação ou flatulência, especialmente após uma refeição
gordurosa, não devem ser confundidas com dor biliar. Estes sintomas são induzidos
com freqüência em pacientes com ou sem doença calculosa biliar, porém sem serem
específicos de cálculos biliares. A cólica biliar é mais frequentemente noturna,
ocorrendo poucas horas após deitar-se.
 Diagnóstico
A USG da vesícula biliar é muito precisa na identificação da colelitíase, tendo
substituído o colecistograma oral. Cálculos com apenas 2 mm de diâmetro podem ser
identificados de forma confiável, desde que sejam utilizados critérios rígidos [(p. ex.
“sombreado” acústico de opacidades que estão dentro do lúmen vesicular e que se
modificam com a posição do paciente (pela gravidade)]. Os percentuais de falsos
negativos e falsos positivos para a USG nos pacientes com cálculos biliares são de cerca
de 2% a 4%. A lama biliar é representada por um material com baixa atividade
ecogênica que forma uma camada na posição mais baixa da vesícula biliar. Tal camada
se desloca com as mudanças posturais, porém não produz sombreado acústico; essas
duas características distinguem a lama dos cálculos biliares.
A radiografia simples de abdome pode detectar os cálculos biliares que contêm
quantidades suficientes de cálcio a ponto de se tornarem radiopacos (10 a 15% de
colesterol e cerca de 50% de cálculos pigmentares). Também pode ser usado para fazer
o diagnóstico de colecistite enfisematosa, vesícula de porcelana, bile calcificada e íleo
biliar.
O colecistograma oral (CGO) tem sido historicamente um procedimento útil para
o diagnóstico de cálculos biliares, mas foi substituído pela USG e é considerado como
obsoleto. Pode ser usado para determinar a permeabilidade do ducto cístico e a função
de esvaziamento da vesícula biliar. Além dissfo, o CGO pode delinear também o
tamanho e numero de cálculos biliares, bem como determinar se estão calcificados.
Os radiofármacos, tais como os ácidos iminodiaceticos com substituição de N e
marcadores Tc (HIDA, DIDA, DISIDA, etc.), são extraídos rapidamente do sangue bem
como excretados e lançados na arvore biliar em altas concentrações mesmo na presença
de elevações séricas leves a moderada de bilirrubina. A ausência de imagem da vesícula
biliar na presença de visualização dos ductos biliares pode indicar obstrução do ducto
cístico, colecistite aguda ou crônica ou ausência cirúrgica do órgão. Esses exames
comportam alguma aplicação no diagnostico de colecistite aguda.
O exame mais específico para colecistite aguda é uma cintilografia hepatobiliar
com ácido iminodiacético (HIDA) marcado com tecnécio. Administrado por via
intravenosa, o HIDA normalmente é captado pelo fígado, excretado nas vias biliares e
concentrado na vesícula biliar. Quando um cálculo obstrui um ducto cístico, a vesícula
biliar não se enche com HIDA; a sensibilidade da cintilogralia com HIDA é 95%, mas a
198
especificidade varia acentuadamente e pode ser tão baixa quanto 50%, em pacientes
gravemente enfermos ou ictéricos.
 Exames de Sangue
Na colecistite aguda não complicada, exames laboratoriais geralmente mostram
leucocitose, mas também não são muito úteis. Níveis elevados de enzimas hepáticas,
hiperbilirrubinemia e níveis elevados de amilase e lipase não são comuns na colecistite
e sugerem outras complicações de colelitíase, como a colangite ou a pancreatite.
Quando a colecistite aguda é acompanhada por uma massa inflamatória, a vesícula
biliar pode comprimir o ducto comum e levar à obstrução do ducto biliar (síndrome de
Mirrizzi).

 Tratamento
Dor: AINEs – melhor meperidina que a morfina, pois esta pode gerar espasmo no
esfíncter de Oddi.
Cirúrgico: nos pacientes assintomáticos com cálculos biliares, o risco de virem a
desenvolver sintomas ou complicações que tornem necessária uma cirurgia é bastante
pequeno. Assim, a recomendação para realizar uma colecistectomia em um paciente
com cálculos biliares deveria basear-se provavelmente na avalição de 3 fatores: (1)
presença de sintomas suficientemente frequentes ou suficientemente intensos a ponto de
interferir na rotina geral do paciente; (2) presença de complicação prévia da doença
calculosa biliar, isto é, historia de colecistite aguda, pancreatite, fistula biliar, etc; ou (3)
presença de condição subjacente que predisponha o paciente a maior risco de
complicações devidas aos cálculos biliares (p. ex. vesícula biliar calcificada ou de
porcelana e/ou ataque prévio de colecistite aguda não obstante o atual estado
assintomático).
Pacientes com cálculos biliares muito volumosos (>3 cm de diâmetro) e os com
cálculos biliares em vesícula biliar com alguma anomalia congênita também podem ser
aventados para ser submetidos a uma colecistectomia profilática. Alguns autores
recomendam atualmente colecistectomia de rotina em todos os pacientes jovens com
cálculos silenciosos. A colecistectomia laparoscópica esta se tornando “padrão – ouro”
para o tratamento da colelitíase sintomática, pois em comparação com a colecistectomia
aberta (laparotomia), a laparoscópica tem uma menor permanência no hospital,
incapacitação mínima, menor custo.
Terapia clinica – Dissolução dos cálculos biliares: o ácido ursodesoxicólico
(AUDC) reduz a saturação da bile com colesterol e parece produzir também uma fase

199
cristalina líquida lamelar na bile que torna possível a dispersão do colesterol e sua
separação dos cálculos por meios físico-químicos. O AUDC pode retardar também a
nucleação dos cristais de colesterol.
Em pacientes cuidadosamente selecionados com vesícula biliar funcionante e
cálculos radiotransparentes <10mm de diâmetro, a completa dissolução pode ser
conseguida em cerca de 50% dos pacientes dentro de 6 meses a 2 anos. Essa terapia
deve ser limitada aos cálculos radiotransparentes <5 mm de diâmetro, para obtenção de
bons resultados. A dose de AUDC deve ser de 10-15 mg/kg ao dia. Os cálculos >15mm
raramente se dissolvem. Os cálculos pigmentares não respondem ao AUDC. As
vantagens do sucesso da colecistectomia laparoscópica reduziram o papel da dissolução
dos cálculos nos pacientes que desejam evitar ou que não são candidatos a
colecistectomia eletiva.
Contudo, os pacientes com doença induzida por cálculos biliares de colesterol que
sofrem episódios recorrentes de coledocolitíase após colecistectomia devem receber
tratamento a longo prazo com AUDC.
► COLEDOCOLITÍASE
A passagem de cálculos biliares e sua penetração no colédoco ocorre em cerca de
10 a 15% dos pacientes com colelitíase. A incidência de cálculos coledocianos aumenta
com a idade mais avançada do paciente, de forma que ate 25% dos pacientes idosos
podem possuir cálculos no colédoco por ocasião da colecistectomia. A grande maioria
dos cálculos ductais é representada por cálculos de colesterol (90%) formados na
vesícula biliar, que a seguir migram para a árvore biliar extra-hepática através do ducto
cístico. Os cálculos primários com origem de novo nos ductos são habitualmente
cálculos pigmentares (10%, e são castanhos) que se manifestam em pacientes com (1)
parasitismo hepatobiliar ou colangite recorrente crônica; (2) anomalias congênitas dos
ductos biliares (especialmente doença de Caroli); (3) ductos dilatados, esclerosados ou
estreitados; ou (4) um defeito do gene MDR3 (ABCB4) que acarreta a secreção biliar
alterada de fosfolipídios (colelitíase associada a baixos níveis de fosfolipídios).
 Quadro Clínico
Os cálculos coledocianos podem não provocar sintomas por vários anos, ser
eliminados espontaneamente e penetrar o duodeno ou (na maioria das vezes)
manifestar-se com cólica biliar na forma de complicação.
Síndrome colestásica: CÓLICA BILIAR (dores em QSD do abdome e/ou
epigástrio, continua com irradiação para região interescapular, escapular e ombro
direito); ICTERÍCIA (leve a moderada, pode ser flutuante pela obstrução parcial e
transitória); COLÚRIA; ACOLIA FECAL. A dor não se relaciona com a alimentação.
Os cálculos do ducto biliar comum podem descer da vesícula biliar ou subir
novamente em um ducto biliar comum dilatado, tortuoso, devido à infecção ou estase
biliar (geralmente cálculos de colesterol), ou podem ocorrer em paciente pós-
colecistectomia (geralmente cálculos marrons), nos quais frequentemente não são
detectados na cirurgia (2% nas colecistectomias). A apresentação clínica é colangite,
pancreatite ou obstrução biliar; cálculos grandes, obstrutivos, podem causar icterícia.
 Diagnóstico e Tratamento
Leucocitose, cultura de sangue aminotransferase normal ou elevada;
hiperbilirrubinemia com predomínio da BD (2-5 mg/dl, dificilmente ultrapassa 10-
15mg/dl); fosfatase alcalina (produzida quando ocorre aumento da pressão interna biliar
ou quando ocorre doença infiltrativa hepática, como neoplasia; é a enzima que mais se
eleva >150U/L, mas podem ocorrer aumento transitório e moderados >100U/L). Os
níveis de aminotranferase, bilirrubina e fosfatase alcalina geralmente são elevados.

200
O diagnóstico de cálculos em ductos biliares comuns pode ser realizado com
ultrassonografia, que geralmente mostra ductos biliares dilatados e ocasionalmente
identifica um cálculo. A MRCP pode identificar 95% dos cálculos maiores que 1 cm. A
CPRE (Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography (ERCP) -
Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica) permanece o "padrão-ouro" para o
diagnóstico e tratamento de cálculos em ductos biliares comuns. Se houver suspeita de
colangite, a CPRE deve ser realizada.
A CPRE é utilizada primordialmente para diagnosticar e tratar condições dos
ductos biliares como cálculos de colédoco, estenoses inflamatórias (cicatriciais),
extravasamentos (por trauma ou cirurgia) e câncer. A CPRE combina o uso de raios X e
um endoscópio, o qual é um tubo longo e flexível, com iluminação e uma microcâmera
na sua ponta. Através dele o médico pode ver o estômago e o duodeno por dentro,
encontrar a papila de Vater (saída no intestino dos ductos biliar e pancreático),
introduzir um cateter (sonda muito fina) através dele e injetar contraste para opacificar a
árvore biliar e o pâncreas permitindo que sejam vistos aos raios X.
O diagnóstico de coledocolitíase é feito habitualmente por colangiografia, seja no
pré-operatório por colangiograma retrogrado endoscópico (CRE) ou CPRM ou no intra-
operatório durante a colecistectomia. Até 15% dos pacientes submetidos
acolecistectomia tem cálculos coledocianos. Quando esses cálculos são suspeitados
antes da colecistectomia laparoscópica, a CPRE pré-operatória com papilotomia
endoscópica e extração dos cálculos constitui a abordagem perfeita – pois, além de
permitir a eliminação dos cálculos, define também a anatomia da árvore biliar em
relação ao ducto cístico. Os cálculos coledocianos devem ser suspeitados nos pacientes
com cálculos biliares que apresentam qualquer um dos seguintes fatores de risco: (1)
historia de icterícia ou pancreatite ou (2) testes anormais da função hepática e (3)
evidência USG de colédoco dilatado ou cálculos no ducto. Como alternativa, se a
colangiografia intra-operatória revelar cálculos retidos, poderá ser realizada CPRE pré-
operatória. Espera-se que a necessidade de realizar CPRE pré-operatória diminua à
medida que as técnicas laparoscópicas de exploração dos ductos biliares melhorem.
A utilização generalizada de colecistectomia laparoscópica e CPRE reduziu a
incidência de doença complicada do trato biliar assim como a necessidade de realizar
uma coledocolitotomia e drenagem por tubo em T dos ductos biliares. A EBE seguida
por passagem espontânea ou extração do cálculo constitui o tratamento de escolha no
atendimento dos pacientes coledocianos, especialmente nos pacientes idoso ou de alto
risco.
 Complicações
Icterícia obstrutiva, pancreatite (As características clínicas que sugerem
pancreatite com cálculo incluem níveis elevados de aspartato aminotransferase e
fosfatase alcalina.), cirrose biliar secundária, colangite bacteriana apresentam a tríade de
Charcot, composta por dor abdominal, icterícia e febre com calafrios.
A pancreatite aguda biliar é mais comum em pacientes com múltiplos cálculos
pequenos; também tem sido associada com microlitíase e lama biliar. Os pacientes
apresentam dor epigástrica aguda irradiando para região dorsal, hiperamilasemia e um
exame de imagem demonstrando um pâncreas edemaciado ou necrótico. Colangite ou
icterícia concomitante raramente podem ser observadas se o cálculo for obstrutivo.
Síndrome ou Lei de Courvousier: vesícula distendida e dolorosa a palpação com
função hepática normal. Sugere neoplasia (principalmente) e cálculos.

201
Pancreatite Aguda
Pancreatite aguda é uma doença inflamatória do pâncreas, caracterizada por
episódios de dor abdominal e elevação dos níveis séricos de amilase e lipase. Em
contraste com a pancreatite crônica, que se caracteriza por alterações da estrutura do
pâncreas e pela persistência da disfunção após a correção da causa precipitante, a
pancreatite aguda distingue-se pela completa restituição morfológica e funcional do
pâncreas, depois de terem sido corrigidos os fatores que precipitaram o quadro agudo.
Existem muitas causas de pancreatite aguda, porém os mecanismo pelos quais
essas condições desencadeiam inflamação pancreática ainda não foram totalmente
elucidados. Os cálculos biliares continuam sendo a principal causa de pancreatite aguda
na maioria das series (30 a 60%). O risco de pancreatite aguda em pacientes com menos
um cálculo biliar de <5 mm de diâmetro é 4x maior que o de pacientes com cálculos
maiores. O álcool é a segunda causa mais comum, sendo responsável por 15 a 30% dos
casos nos EUA.

 FISIOPATOLOGIA
Patologicamente, duas classificações morfológicas são reconhecidas pancreatite
aguda intersticial (adematosa ou leve- 80-90% doas pacientes) e pancreatite aguda
hemorrágica (grave ou necro-hemorrágica). O último tipo está associado a morbidade e
mortalidade maiores.
Os mecanismos precisos responsáveis pela pancreatite aguda não estão bem
esclarecidos. Entretanto, o mecanismo fundamental para transformação da injúria inicial
em pancreatite parecem ser a ativação intracelular de enzimas digestivas e a
autodigestão. A complexa cascata de eventos celulares que levam à pancreatite aguda se
inicia nas células acinares pancreáticas; a conversão intracelular de zimogênios
pancreáticos em enzimas ativas provavelmente envolve várias vias, incluindo: (1)

202
clivagem de tripsinogênio em tripsina pela hidrolase lisossômica catepsina B; (2)
interrupção da sinalização intracelular pelo Ca; e (3) autoativação do tripsinogênio.
Em modelos experimentais, a hiperestimulação do pâncreas pode resultar na fusão
de lisossomas e zimogênios em grandes vacúolos, seguida pela ativação de enzimas e
injúria intracelular aguda. A catepsina B é uma enzima lisossômica capaz de ativar o
tripsinogênio em tripsina. A tripsina então catalisa a conversão de muitas pró-enzimas
em suas formas ativas, que, por sua vez, são responsáveis pela principal complicação
sistêmica da pancreatite aguda.
O Ca intracelular também pode desempenhar um importante papel no início da
pancreatite aguda. Seu aumento intracelular e a interrupção da sinalização pelo Ca nas
células acinares ocorre na pancreatite induzida por hiperestimulação por ceruleína e por
obstrução do ducto pancreático. Este aumento está associado à vacuolização das células
acinares e autoativação do tripsinogênio, mediada pela translocação da adenosina
trifosfatase vacuolar para os compartimentos da membrana das células acinares e a
consequente acidificação dos compartimentos intracelulares.
O pâncreas possui vários mecanismos de defesa para resolver o problema de
autoativação dos zimogênios, sendo um deles o inibidor da tripsina da secreção
pancreática (pancreatic secretory trypsininhibitor - PSTI), que é encontrado nos
grânulos secretórios. O PSTI se liga ao sítio de ação da tripsina em uma proporção de
1:1 e inibe a atividade da tripsina. Quando mais de 10% do tripsinogênio é ativado, este
mecanismo inibitório se torna ineficaz. Desta forma, qualquer desordem ou agente que
afete adversamente ou sobrecarregue este mecanismo de proteção pode causar
pancreatite.
Durante a pancreatite, mediadores inflamatórios, incluindo citosinas (como o fator
de necrose tumoral alfa e o fator de ativação plaquetária) e as citosinas (como a IL-6),
são gerados e liberados. Estes agentes estimulam o recrutamento de células
inflamatórias, aumentam a ativação e aderência de células inflamatórias à parede
vascular ou causam injúria celular direta. A geração de mediadores pró-inflamatórios
pode levar à síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SIRS) e uma notável ativação
de leucócitos pode resultar em lesão de órgãos distantes e desenvolvimento de falência
múltipla dos órgãos. A SIRS e a infecção pancreática são as duas principais causas de
morte por pancreatite aguda.
Ocorrem 3 fases na fisiopatologia:
 Fase inicial: ocorre ativação intrapancreática das enzimas digestivas e por
uma lesão das células acinares. A ativação da tripsina parece ser mediada por hidrolases
lisossômicas, como a catepsina B, que passa, a se localizar juntamente com as enzimas
digestivas em organelas intracelulares; acredita-se que a lesão das células acinares seja a
consequência da ativação da tripsina.
 Segunda fase: envolve a ativação, quimioatração e o sequestro dos
neutrófilos e macrófagos no pâncreas, resultando em reação inflamatória
intrapancreática aumentada. Existe evidência em apoio do conceito de que a
sequestração dos neutrófilos pode ativar o tripsinogênio. Por conseguinte, a ativação
intrapancreática do tripsinogênio pelas células acinares pode ser um processo em 2

203
etapas (isto é, uma fase inicial independente dos neutrófilos e uma fase posterior
dependente de neutrófilos).
 Terceira fase: é devido aos efeitos das enzimas proteolíticas ativadas e das
citocinas, liberadas pelo pâncreas inflamado, sobre órgãos distantes. As enzimas
proteolíticas ativadas, especialmente a tripsina, não apenas digerem os tecidos
pancreáticos e peripancreáticos, mas também ativam outras enzimas, tais como elastase
e fosfolipase A2. Em seguida, as enzimas digestivas ativas e as citocinas digerem as
membranas celulares e causam proteólise, edema, hemorragia intersticial, dano
vascular, necrose por coagulação, necrose gordurosa e necrose das células
parênquimais. A lesão celular e a morte resultam na liberação dos peptídeos da
bradicinina, das substâncias vasoativas e da histamina que podem produzir
vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular e edema com profundos efeitos
sobre muitos órgãos, mais particularmente o pulmão. A síndrome da resposta
inflamatória sistêmica (SRIS) e a síndrome da angústia respiratória do adulto (SARA),
assim como a falência de múltiplos órgãos podem ocorrer como resultado dessa cascata
de efeitos locais e distantes.
 QUADRO CLÍNICO
Dor abdominal é o principal sintoma da pancreatite. A dor pode variar desde um
desconforte leve e tolerável e, mais comumente, a uma angústia intensa, constante e
incapacitante. A dor, que é constante e de natureza lancinante, localiza-se no epigástrio
e na região periumbilical e, com frequência, irradia-se para as costas, bem como para o
tórax, os flancos e a parte inferior do abdome, DOR EM FAIXA. A dor é mais intensa
quando o paciente fica em decúbito dorsal, e os pacientes podem obter algum alívio pela
posição sentada, com o tronco flexionado, e os joelhos fletidos. A dor não tem padrão
de surgimento e desaparecimento típico das cólicas, ela é CONSTANTE. A náusea, os
vômitos e a distensão abdominal, devido à hipomotilidade gástrica e intestinal e à
peritonite química, também constituem queixas frequentes. Anorexia também pode
ocorrer.
Comumente, os sons abdominais estão diminuídos ou ausentes, graças a um íleo
paralítico intestinal. Pode ocorrer icterícia mesmo em casos sem pancreatite induzida
por cálculo, devido à compressão do ducto biliar comum pelo pâncreas edemaciado. No
caso de episódios muito intensos, podem ser observadas hipotensão, taquipnéia,
taquicardia e hipertermia, com a febre comumente abaixo dos 38,5ºC. O exame da pele
pode revelar áreas sensíveis de endurecimento e eritema, resultantes da necrose da
gordura subcutânea e, em casos graves de pancreatite necrosante, ocasionalmente
surgem grandes equimoses nos flancos (sinal de Grey Turner) ou na área umbilical
(sinal de Cullen); estas equimoses são causadas pelo sangue localizado
retroperitonealmente desde o pâncreas e ao longo dos planos fasciais.
Em 10-20% dos pacientes são achados estertores nas bases, atelectasia e derrame
pleural (do lado esquerdo).
 DIAGNÓSTICO
Laboratoriais: principalmente elevação dos níveis séricos de amilase (já se eleva
no primeiro dia-2ª 12h após início dos sintomas - e se mantêm elevada por 3 a 5 dias) e

204
lipase (permanece elevada por 7 a 10 dias). Não tem nenhuma correlação entre a
gravidade da pancreatite e o grau de elevação dessas enzimas.
O normal da amilase é <160U/L. A especificidade para pancreatite aumenta muito
quando considerados valores acima de 500U/L e principalmente 1000U/L. A amilase
pode estar normal nos casos de pancreatite crônica avançada agudizada e na pancreatite
alcoólica, pois o parênquima pancreático já esta destruído, exaurido de suas enzimas.
Lipase: tem uma sensibilidade igual a da amilase (85%) e uma especificidade
maior (80%). A lipase também existe dentro do lúmen intestinal e as mesmas condições
abdominais que fazem aumentar a amilase também podem fazer aumentar a lipase. Em
geral essas condições não aumentam mais que 3x o limite da normalidade (normal: até
140U/L; 3x o normal: >450U/L, variando conforme o método laboratorial usado).
Pode ter leucocitose (15000-20000) e hemoconcentração com hematócrito >44%
e/ou azotemia com uréia >22mg/dL. Ocorrer hiperglicemia e hipocalcemia. A
hiperbilirrubinemia [bilirrubina sérica >68mol/L (>4mg/dL)] ocorre em cerca de 10%
dos pacientes. Entretanto, a icterícia é transitória, e os níveis séricos de bilirrubina se
normalizam em 4 a 7 dias. Os níveis séricos de fosfatase alcalina e de aspartato
aminotransferase (AST-TGO) também estão transitoriamente elevados e acompanham
os valores séricos da bilirrubina, podendo apontar para uma doença relacionada à
vesícula biliar. Os níveis séricos acentuadamente elevados de desidrogenase láctica
[>8,5mol/L (>500U/L)] sugerem um prognóstico sombrio. Hipóxia: PO2<60mmHg,
pode prenunciar o início da SARA.
A TC (padrão-ouro) confirma o diagnóstico de pancreatite aguda caso as enzimas
estejam com resultado duvidoso.
A USG mostra-se útil na pancreatite aguda para avaliar a vesícula biliar se houver
suspeita de cálculos biliares (principal causa de pancreatite aguda), por isto esta sempre
indicada.
Radiografia simples: pode encontrar derrame pleural no pulmão, e alterações
intestinais.
RNM é equivalente a TC.
O diagnóstico de pancreatite aguda exige 2 dos seguintes achados: dor abdominal
típica, elevação de 3x ou mais nos níveis séricos de amilase e/ou lipase e/ou achados
confirmatórios no exame de imagem do abdome em corte transversal.
 TRATAMENTO
Na maioria dos pacientes (85 a 90%) com pancreatite aguda, a doença é
autolimitada e regride de modo espontâneo, habitualmente dentro de 3 a 7 dias após a
instituição do tratamento. As medidas convencionais consistem em (1) analgésicos para
o controle da dor, (2) líquidos e colóides intravenosos para manter um volume
intravascular normal e (3) nenhuma alimentação oral (realizar nutrição enteral,
controvérsia entre via nasogástrica e nasojejunal; dieta rica em proteínas e pobre em
lipídeos).
Antibióticos para pancreatite necrosante infectada. A CPRE de urgência para
pacientes que apresentam pancreatite biliar aguda grave. CPRE eletiva com
esfincterectomia pode ser considerada em pacientes com obstrução biliar incipiente ou
persistente. Está indicada em todos os pacientes com pancreatite aguda grave e uma TC
205
contrastada demonstrando mais de 30% de necrose pancreática. O antibiótico de escolha
é o imipenem (amplo espectro), administrado durante pelo menos 10 dias. Os
antibióticos de segunda linha pertencem ao grupo das fluoroquinolonas (ex.
ciprofloxacina) associadas ao metronidazol. Em caso de infecção confirmada, a
antibioticoterapia deve ser mantida por 2-3 semanas.
Analgesia: meperidina ou outro opiáceo. A morfina deve ser evitada pelo seu
efeito teórico de causar espasmo do esfíncter de Oddi.
Deve realizar o controle eletrolítico e acido básico.

206
Problema 9 – Doutor, estou com
hepatite?
Hepatite Viral
Hepatites são processos inflamatórios difusos do fígado, que pode ser causado por
vírus, bactérias, fungos, parasitas, álcool, medicação, doenças metabólicas e reações
autoimunes.
Caracterizam-se, na prática, por um aumento significativo das aminotransferases,
com manifestação clínica variável, sendo a icterícia o principal sinal. As formas agudas
virais podem ocorrer com todos tipos de vírus, e a crônica com vírus B, C podendo
evoluir para cirrose, insuficiência hepática terminal e hepatocarcinoma.
A hepatite viral é uma infecção que afeta predominantemente o fígado. Quase
todos os casos de hepatite viral aguda são causados por 1 dos cinco agentes virais. Esses
agentes podem ser diferenciados por suas propriedades moleculares e antigênicas,
porém todos os tipos de hepatite viral produzem enfermidades clinicamente
semelhantes. As hepatites virais, em sua maioria, são doenças silenciosas, que em
muitas fases passam despercebidas na vida das pessoas, até o momento em que os sinais
e sintomas começam a aparecer e a doença se manifesta.
A hepatite viral aguda é uma síndrome clínica distinta que pode ser causada por
cinco diferentes vírus não relacionados. A doença é caracterizada clinicamente por
sintomas de mal-estar, náusea, falta de apetite, dor abdominal vaga e icterícia;
bioquimicamente, por elevações abruptas dos níveis séricos de bilirrubina e
aminotransferases; sorologicamente, pelo aparecimento do genoma viral no fígado e no
soro, seguido do desenvolvimento de anticorpos aos antígenos virais; e,
histologicamente, por graus variados de necrose hepatocelular e inflamação.
Em geral, a hepatite viral aguda é autolimitada e regride completamente sem lesão
hepática residual ou replicação viral. Algumas formas de hepatite, no entanto, podem
resultar em infecção persistente com lesão hepática crônica. As cinco formas de hepatite
virais são clinicamente similares e podem ser distinguidas apenas por ensaios
sorológicos.
As cinco causas conhecidas de hepatite aguda são os vírus da hepatite A (HAV),
B (HBV), C (HCV), D ou delta (HDV) e E (HEV). Já foram identificados outros
agentes transmitidos por transfusão (por ex. o vírus da “hepatite G” e o virus “TT”, mas
que não causam hepatite).
Todos os vírus das hepatites são vírus RNA, menos da hepatite B que é de DNA.
As hepatites A e E são formas de hepatite infecciosa; são disseminadas
principalmente pela via fecal-oral, são associadas a condições sanitárias precárias, são
altamente contagiosas, ocorrem tanto em surtos quanto esporadicamente e causam
apenas hepatite autolimitada.
As hepatites B, C e D são formas de hepatite sérica, disseminadas, em grande
parte, pelas vias parenterais e menos comumente pela intimidade ou exposição sexual.
Não são altamente contagiosas, ocorrendo esporadicamente e raramente causando
surtos. São capazes de levar à hepatite crônica e, por fim, à cirrose e ao carcinoma
hepatocelular.
 Fisiopatologia Geral

207
A patogênese da lesão hepática na hepatite viral não é bem compreendida.
Nenhum desses cinco agentes aparece ser diretamente citopática, pelo menos nos níveis
de replicação encontrados durante as hepatites agudas e crônica. A evolução
cronológica e a aparência histológicas da lesão do hepatócito na hepatite viral sugerem
que respostas imunológicas, particularmente respostas de linfócitos T citotóxicos aos
antígenos virais expressos nas membranas celulares dos hepatócitos, podem ser os
principais efetores da lesão. Outras citosinas pró-inflamatórias, a atividade de células
natural killer (células NK) e a citotoxicidade celular dependente de anticorpos também
podem desempenhar papéis moduladores na lesão celular e na inflamação durante a
infecção aguda pelo vírus da hepatite.
A recuperação das infecções pelo vírus da hepatite geralmente é acompanhada
pelo aparecimento de títulos em elevação de anticorpos contras os antígenos, como anti-
HAV, anti-HBs, anti-HCV-E1 e anti-HCVE2, e anti-HEV. Estes anticorpos podem
oferecer uma imunidade, pelo menos parcial, à reinfecção.

 Manifestações Clínicas Geral

208
O curso da hepatite aguda é altamente variável e sua gravidade pode variar desde
uma infecção assintomática transitória até uma doença grave ou fulminante. A doença
pode ser autolimitada e regredir, seguir um curso com recidivas, ou levar à infecção
crônica. Em um curso típico e clinicamente aparente de hepatite viral aguda em
evolução, o período de incubação varia de 2 a 20 semanas, em grande parte baseado na
etiologia viral e na dose de exposição. Durante esta fase, o vírus pode ser detectado no
sangue, mas os níveis séricos de aminotransferases e bilirrubina são normais, e os
anticorpos não são detectados.
A fase pré-ictérica da enfermidade é marcada pelo início de sintomas
inespecíficos, tais como fadiga, náuseas, falta de apetite e leve dor no quadrante
superior direito do abdome. Os anticorpos vírus-específicos aparecem primeiramente
durante esta fase, que, em geral, perdura por 3 a 10 dias, ou até mais tempo, podendo,
inclusive, constituir todo o curso da enfermidade em pacientes com formas subclínicas
ou anictéricas de hepatite aguda. Os títulos geralmente são mais altos neste período, e os
níveis séricos de aminotransferases começam a se elevar.
O início de uma coloração escura na urina marca a fase ictérica da doença, durante
a qual aparece icterícia e os sintomas de fadiga e náusea se agravam. A hepatite viral
aguda raramente é diagnosticada de forma correta antes do início da icterícia. Se a
icterícia for grave, as fezes assumem uma coloração esbranquiçada e pode surgir
prurido. Anorexia, disgeusia (perda do paladar) e perda de peso também podem ocorrer.
Via de regra, o exame físico mostra icterícia e dor à palpação profunda do hipocôndrio
direito. Nos casos mais graves, a hepatomegalia e a esplenomegalia pode estar
presentes. Os níveis séricos de bilirrubina (total e direta) elevam-se e os níveis de
aminotransferases geralmente são superiores a dez vezes o limite máximo da
normalidade, pelo menos no início. Durante a fase sintomática, ictérica, os níveis do
vírus da hepatite começam a decair no soro e no fígado.
A duração da enfermidade clínica é variável; tipicamente ela perdura por 1 a 3
semanas. A recuperação é primeiramente manifestada pelo retorno do apetite e
acompanhada pela normalização das elevações séricas de bilirrubina e
aminotransferases e pela depuração do vírus. Todavia, a convalescença pode ser
prolongada, até que os níveis de energia e de vigor retornem ao normal. Anticorpos
neutralizantes geralmente aparecem durante a fase ictérica e se devam a níveis altos
durante a convalescença.
As complicações das hepatites virais aguda incluem infecção crônica,
insuficiência hepática fulminante, hepatite recorrente ou colestática e síndromes extra-
hepáticas.
 Diagnóstico Geral
Exames sorológicos são adequados para o diagnóstico de hepatite viral aguda,
assim, a biópsia de fígado não é recomendada a menos que o diagnóstico permaneça
confuso e uma decisão terapêutica seja necessária. Se a biópsia for necessária, os
achados histológicos na hepatite viral aguda são caracterizados por inflamação
generalizada e focos de necrose. As células inflamatórias são predominantemente
linfócitos, macrófagos e histiócitos. Fibrose está ausente.

209
► HEPATITE A
 Epidemiologia
A hepatite A é altamente contagiosa e disseminada, em grande parte, pela via
fecal-oral, especialmente quando as condições sanitárias são precárias. A hepatite A têm
diminuído em frequência nos EUA, mas permanece uma causa importante de doença
hepática aguda no mundo, ocorrendo tanto de forma esporádica quanto epidêmica. A
investigação da fonte dos casos de hepatite A revela que a maioria se deve à exposição
direta pessoa a pessoa e, em menor extensão, à contaminação fecal de alimentos e água.
O consumo de moluscos de águas contaminadas é uma fonte bem conhecida,
porém incomum, de hepatite A. Raras situações de disseminação de hepatite A por
transfusões sanguíneas e de derivados do plasma foram descritas. Grupos de alto risco
de adquirir hepatite A incluem viajantes a áreas em desenvolvimento, crianças em
creches (e, secundariamente, seus pais), homens que fazem sexo com homens, usuários
de drogas injetáveis, hemofílicos que recebem derivados do plasma e pessoas em
instituições.
 Fisiopatologia
O HAV é um pequeno vírus RNA que pertence à família dos Picornaviridae
(gênero Hepatovírus). O vírus replica-se principalmente no fígado e é montado no
citoplasma do hepatócito como uma partícula de 27 nm, com um genoma RNA único e
um capsídio protéico externo (HAVAg). O vírus é secretado na bile e, em menor
extensão, no soro. Os maiores títulos de HAV são encontrados nas fezes durante o
período de incubação e na fase sintomática inicial da enfermidade.
Sua replicação ocorre exclusivamente no fígado, porém o vírus está presente no
fígado, na bile, nas fezes e no sangue durante o período subseqüente de incubação e a
fase pré-ictérica aguda da enfermidade. Embora o vírus persista no fígado, a semeadura
viral nas fezes, a viremia e a infectividade diminuem rapidamente depois que a icterícia
se torna evidente. O HAV pode ser cultivado de forma reprodutível in vitro.
Os anticorpos dirigidos contra HAV (anti-HAV) podem ser identificados durante
a enfermidade aguda quando a atividade das aminotransferases séricas é elevada, e a
eliminação fecal do HAV ainda está ocorrendo. Essa resposta precoce dos anticorpos
ocorre predominantemente na classe IgM e persiste por vários meses, raramente por 6-
12 meses. Porém, durante a convalescença, o anti-HAV da classe IgG passa a ser o
anticorpo predominante.
Após o HAV ser ingerido e sobreviver ao ácido gástrico, atravessa a mucosa do
intestino delgado e atinge o fígado pela veia porta. O mecanismo exato de absorção
hepática em humanos ainda é desconhecido. Uma vez que o vírus entre no hepatócito,
ele começa a replicar no citoplasma. O HAV é distribuído por todos o fígado. Embora o
antígeno do HAV tenha sido detectado em outros órgão (linfonodos, baço, rim), o vírus
parece replicar exclusivamente nos hepatócitos. Quando o vírus está maduro, atinge a
circulação sistêmica pelos sinusoides hepáticos e é liberado na árvore biliar pelos
canalículos biliares, chega ao intestino delgado e, por fim, é excretado nas fezes.
A patogênese da lesão hepatocitária induzido pelo HAV não está completamente
definida. A ausência de lesão celular nos sistemas de cultura de células sugere que o
HAV não é citopático. O dano celular imunomediado é mais provável.
 Manifestações Clínicas
O curso clínico da hepatite A aguda típica começa com um período de incubação
que, habitualmente, varia de 15 a 45 dias (média de 25 dias). A ictérica ocorre em 70%
dos adultos infectados pelo HAV, mas em menores proporções no caso de crianças. Os

210
anticorpos ao HAV (anti-HAV), que surgem em todos os pacientes infectados pelo
vírus, aparecem pela primeira vez pouco antes do início dos sintomas, elevam-se então a
um título alto e persistem depois por toda a vida. Por sua vez, os anticorpos anti-HAV
IgM-específicos surgem na fase inicial da doença e persistem por apenas 4 a 12 meses.
Os pacientes com infecção pelo HAV geralmente se apresentam com um dos 5
padrões clínicos a seguir: (1) assintomática sem icterícia, (2) sintomática com icterícia e
autolimitada após aproximadamente 8 semanas, (3) colestática, com a icterícia durando
aproximadamente 10 semanas ou mais, (4) recidivante, com 2 ou mais surtos de
infecção pelo HAV aguda ocorrendo em um período de 6 a 10 semanas e (5) Hepatite A
fulminante.
Sintomas prodrômicos em pacientes com hepatite A aguda incluem fadiga,
fraqueza, anorexia, náuseas, vômito e dor abdominal. Sintomas menos comuns são
febre, cefaléia, artralgias, mialgia e diarréia. A colúria precede outros sintomas em
aproximadamente 90% das pessoas infectadas; o sintomas ocorre dentre de 1 a 2
semanas após o início dos sintomas prodrômicos. Os sintomas de hepatite podem durar
de alguns dias a duas semanas e geralmente diminuem com o surgimento da icterícia
clinicamente evidente. Dor leve em quadrante superior direito e aumento discreto do
fígado podem ser observados no exame físico.
Casos graves e fulminantes de hepatite A podem ocorrer, particularmente nos
idosos e em pacientes com doença hepática crônica pré-existente. A hepatite A é a causa
mais comum de hepatite colestática recorrente.
 Diagnóstico
O diagnóstico de hepatite A aguda pode ser feito com base no achado de IgM
anti-HAV no soro de um paciente com características clínicas e bioquímicas de hepatite
aguda. O teste para anti-HAV total, embora não seja útil para o diagnóstico, representa
um meio de avaliar a imunidade à hepatite A.
A hepatite A aguda é clinicamente indistinguível de outras formas de hepatite
viral. O diagnóstico da infecção baseia-se na detecção de anticorpos específicos contra
HAV (anti-HAV) no soro. O diagnóstico da hepatite A aguda exige a constatação do
anticorpo anti-HAV do tipo IgM no soro. O resultado do teste é positivo desde o início
dos sintomas e geralmente permanece positivo por aproximadamente 4 meses.
O anticorpo anti-HAV do tipo IgG também pode ser encontrado no soro desde o
início da doença e permanece positivo geralmente por toda a vida e, após recuperação
clínica, é interpretado como marcador de infecção prévia pelo HAV.
 Prevenção
Uma vacina segura e efetiva contra o HAV está disponível e é recomendada para
todas as crianças a partir de 1 ano de idade e pacientes com alto risco de adquirir
hepatite A, incluindo viajantes a áreas endêmicas, homens que fazem sexo com homens
e usuários de drogas ilícitas. A vacina anti-HAV também é recomendada para todos os
pacientes com doença hepática crônica e receptores de derivados de plasma, como os
hemofílicos. Duas fórmulas de vacina anti-HAV estão disponíveis nos Estados Unidos;
ambas consistem de antígeno inativado do vírus da hepatite A purificado a partir de
cultura de células.
 Tratamento
Não existem terapias específicas para a hepatite A que reduzam ou melhorem o
curso da enfermidade. Um elemento importante do controle deve ser a profilaxia dos
contatos. A possibilidade de um transplante hepático deve ser precocemente
considerada nos casos de hepatite fulminante.

211
O tratamento da hepatite A baseia-se em repouso relativo (limitação de atividade
físicas conforme a tolerância do paciente) e aumento da ingesta calórica, associando-se
quando necessário, medicamentos sintomáticos (ex: antitérmico, antiemético). Não
existem evidências de que corticosteróides, estrogênio ou quaisquer outras drogas
“hepatoprotetoras” sejam úteis na hepatite A, independente da gravidade do caso.

► HEPATITE B
 Epidemiologia
A hepatite B é disseminada predominantemente pela via parenteral ou por contato
pessoal íntimo. É endêmica em muitas regiões, como o Sudeste Asiático, China,
Micronésia e África Sub-Saariana. Taxas menores ocorrem no subcontinente indiano e
no Oriente Médio. Nos EUA, a hepatite B é a causa mais comum de hepatite aguda, e a
infecção crônica afeta aproximadamente 0,5% da população.
A maioria dos casos em adultos deve-se a contato sexual ou parenteral. A hepatite
B é comum entre os usuários de drogas injetáveis, heterossexuais com vários parceiros
sexuais e entre homens que fazem sexo com homens. Hoje em dia, a transfusão
sanguínea e os derivados do plasma raramente transmitem a hepatite B, devido à
instituição de rastreamento de rotina das doações de sangue para a HBsAg e anticorpo
ao HBcAg, o antiHBc. A disseminação materno-infantil constitui um outro modo
importante de transmissão, não apenas em área as endêmicas, mas também nos Estados
Unidos, notadamente entre os imigrantes dessas áreas. O rastreamento de rotina de
mulheres grávidas e a profilaxia de neonatos estão agora recomendados.
A disseminação intrafamiliar da hepatite B também pode ocorrer, embora o modo
de contágio nesta situação não esteja bem definido. Infelizmente, a falta de atenção para
as precauções universais e técnicas assépticas, especialmente a limpeza de materiais e
equipamentos médicos compartilhados, permanece uma importante causa de pequenos
surtos e casos esporádicos de hepatite B aguda.
 Fisiopatologia
O HBV é um vírus DNA envelopado, de camada dupla, pertencente à família
Hepadnaviridae. O genoma viral consiste de um DNA de fita dupla incompleta com 3,2
kb de comprimento e possui quatro fases de leitura abertas, parcialmente superpostas,
que codificam os genes para o antígeno de superfície da hepatite B (gene S, HBsAg),
antígeno-core da hepatite B (gene C, HBcAg), a polimerase do HBV (gene P) e uma
pequena proteína que parece ter funções de transativação (gene X, HBxAg). O gene S
tem três códons de iniciação e é capaz de produzir três diferentes tamanhos de HBsAg
(S pequeno, médio e grande). O gene C tem dois códons de iniciação e pode produzir
dois produtos antigenicamente distintos: o HBcAg, retido nos hepatócitos até ser
montado e incorporado aos vírions do HBV, e o antígeno da hepatite B (HBeAg),
secretado no soro como uma pequena proteína solúvel.
O vírus infecta apenas humanos e símios superiores e replica-se
predominantemente nos hepatócitos e talvez, em menor extensão, nas células-tronco do
pâncreas, medula óssea e baço. Durante a infecção aguda e crônica, os pacientes com
hepatite B apresentam grandes quantidades de HBsAg no soro, a maioria na forma de
partículas tubulares e esféricas similares a vírus, incompletas, de 20 nm. O vírion
intacto é uma partícula de camada dupla com um envelope de HBsAg, um núcleo
capsídio interno de HBcAg e uma enzima polimerase ativa ligada a uma única molécula
do DNA do HBV de fita dupla. As pessoas que apresentam grandes quantidades de

212
HBV no soro também normalmente produzem HBeAg, fazendo deste um marcador
alternativo de altos níveis de replicação viral.
 Manifestações Clínicas
O curso típico da hepatite B autolimitada aguda começa com um período de
incubação de 30 a 150 dias (média de75 dias). Durante o período de incubação, o
HBsAg, o HBeAg e o DNA do HBV tornam-se detectáveis no soro e elevam-se a níveis
altos, com o vírus atingindo títulos de 10⁸ a 10¹¹ vírions/mL. No início dos sintomas o
anti-HBC eleva-se e os níveis séricos de aminotransferases também estão aumentados.
A icterícia aparece em um terço dos adultos com hepatite B e menos comumente em
crianças. Em geral, o DNA do HBV e o HBeAg começam a cair no início da
enfermidade e podem ser indetectáveis no momento de pico da enfermidade clínica. O
HBsAg torna-se indetectável e o anti-HBs eleva-se durante a recuperação, várias
semanas ou meses após o desaparecimento do HBsAg. O anti-HBs é um anticorpo de
longa duração e está associado à imunidade.
Têm sido descrito quatro fases da infecção pelo HBV: imunotolerância,
clareamento imune, o estado de portador inativo e reativação.
O período de incubação da hepatite B aguda varia de algumas semanas a 6 meses
(média de 60 a 90 dias), dependendo da quantidade de vírus replicante no inóculo. A
doença pode ser mais grave em pacientes coinfectados com outros vírus da hepatite e
naqueles com doença hepática subjacente estabelecida. Geralmente recomenda a
abstenção de álcool, mas a chance de uma recuperação tranqüila não parece ser
influenciada pelo consumo de quantidades moderadas de álcool durante a fase de
convalescência.
As infecções agudas são anunciadas por um pródromo de febre do tipo doença do
soro, artralgia ou artrite e erupção, que é mais comumente maculopapular ou
urticariaforme.
Os sintomas clínicos e a icterícia geralmente desaparecem após 1 a 3 meses, mas
alguns pacientes têm fadiga prolongada mesmo após a normalização dos níveis séricos
de ALT.
 Diagnóstico
O diagnóstico de hepatite B aguda pode ser feito com base no achado do HBsAg
no soro de um paciente com características clínicas e bioquímicas de hepatite aguda.
Entretanto, o HBsAg também pode estar presente como resultado de hepatite B crônica
ou no estado portador, e um paciente com hepatite aguda o HBsAg no soro pode, na
verdade, ter hepatite crônica e alguma forma sobreposta de lesão aguda, como hepatite
aguda A ou D ou uma doença hepática induzida por drogas. Por esta razão, o teste de
lgM anti-HBc é útil, porque este anticorpo eleva-se precocemente e desaparece dentro
de 6 a 12 meses após o início da doença. O teste para HBeAg, anti-HBe, DNA do HBV
e anti-HBs geralmente não é diagnóstico para hepatite B, mas pode ser valioso na
avaliação prognóstica. Aqueles que permanecem positivos para o DNA do HBV e/ou
HBeAg 6 semanas após o início dos sintomas provavelmente desenvolverão hepatite B
crônica. O desaparecimento do HBeAg ou do DNA do HBV representa um achado
sorológico favorável. Similarmente, o desaparecimento de HBsAg e o surgimento de
anti-HBs denotam recuperação.
A hepatite B também é uma causa importante de hepatite fulminante. Fatores
associados a prognósticos ruins da hepatite B aguda incluem a idade avançada, o sexo
feminino e talvez algumas cepas do vírus. Existem variantes do HBV que não têm a
capacidade de produzir HBeAg devido a uma mutação na região do precore do genoma
viral. Estes mutantes HBeAg-negativo estão associados a formas atípicas de hepatite B

213
aguda e crônica. Vários casos de hepatite B grave ou fulminante têm sido associados à
infecção com formas HBeAg-negativo do vírus.

214
 Tratamento
O tratamento da hepatite B aguda, de um modo geral, deve ser apenas
sintomático, à semelhança da hepatite A (espera-se recuperação espontânea na maioria
dos casos em adultos). Medicações antivirais específicas, por outro lado, são
habitualmente empregadas no tratamento das formas crônicas.
A utilização de terapia antiviral para hepatite B aguda é controversa. O interferon
alfa e a lamivudina são terapias bem estabelecidas para hepatite B crônica, mas estas
drogas não foram adequadamente avaliadas para infecção aguda. Em um pequeno
estudo, o interferon alfa não diminuiu a taxa de cronicidade ou a velocidade de
recuperação. Observações não controladas utilizando lamivudina em pacientes com
hepatite B grave e fulminante, entretanto, sugerem que esta terapia possa amenizar o
curso da infecção.
Por causa da segurança da terapia com lamivudina e dos resultados imprevisíveis
e potencialmente fatais dos casos graves de hepatite B aguda, a terapia com lamivudina
(100 mg diariamente até que a doença regrida e o HBsAg tenha se tornado negativo) é
prudente para pacientes com sintomas ou sinais de doença hepática fulminante
(elevação do tempo de protrombina, icterícia intensa), particularmente se forem
elevados os níveis de DNA do HBV. O tratamento da hepatite B deve também focar-se
em evitar maior lesão hepática e incluir a profilaxia dos contatos. O paciente deve ser
acompanhado com exames repetidos para pesquisa de HBsAg e níveis de alanina
215
aminotransferase 3 a 6 meses após, para determinar se houve desenvolvimento de
hepatite B crônica.

► HEPATITE C
 Epidemiologia
A hepatite C é disseminada predominantemente por via parenteral. Os pacientes
com maior risco são os usuários de drogas injetáveis e pessoas com várias exposições
parenterais. A transmissão sexual de hepatite C ocorre, mas não é comum. O
acompanhamento prospectivo de cônjuges e parceiros sexuais de pacientes com hepatite
C crônica mostra um risco baixo de transmissão sexual (menor do que 1 % por ano de
exposição). A disseminação materno-infantil ocorre em aproximadamente 5% dos
casos, geralmente em lactentes cujas mães têm altos níveis de RNA do HCV no soro e
um parto prolongado ou ruptura precoce das membranas.
Outra fonte potencial do HCV são acidentes com picadas de agulha e
contaminação ou esterilização inadequada de agulhas e seringas reutilizadas.
Infelizmente, surtos de hepatite C continuam a ser identificados no quadro de
assistência médica pela reutilização de seringas e outras falhas nas técnicas apropriadas
de assepsia. Desde a introdução do teste de rastreamento de rotina do sangue para
pesquisa de anti-HCV, a hepatite C pós-transfusional tornou-se rara.
Procedimentos de inativação realizados em derivados do plasma tornaram
incomum a transmissão do HCV em concentrados de fatores de coagulação. Entretanto,
ainda existem muitas pessoas com hepatite C crônica que foram infectadas, no passado,
desta forma. Estudos atuais de hepatite C aguda indicam que mais de 60% dos casos são
atribuídos a usuários de drogas injetáveis; 15% a 20% dos casos a exposição sexual
(geralmente envolvendo múltiplos parceiros sexuais); e apenas uma pequena proporção
de casos de transmissão materno-infantil, acidentes por picada de agulha e causas
iatrogênicas. Aproximadamente 10% dos casos não apresentaram história de exposição
potencial e permanecem inexplicados.
 Fisiopatologia
O HCV é um vírus RNA que pertence à família Flaviviridae. Originalmente, o
HCV foi identificado por técnicas moleculares, e o vírus não foi bem visualizado.
Provavelmente, o HCV circula como um vírus envelopado de camada dupla, com 50 a
60 nm de diâmetro. O genoma é uma molécula de RNA de fita positiva que tem
aproximadamente 9,6 kb de comprimento e contém uma fase de leitura aberta grande e
única, que codifica uma ampla poliproteína, modificada pos-translacionalmente em três
polipeptídios estruturais e vários polipeptídios não estruturais.
As proteínas estruturais incluem dois antígenos do envelope altamente variáveis
(E1 e B2) e uma proteína do núcleo capsídio relativamente conservada (C). O HCV
replica-se em larga escala no fígado e é detectado no soro em níveis de 10⁵ a 10⁷
vírions/mL durante as infecções agudas e crônicas.
 Manifestações Clínicas
Quando presente o sintomas da hepatite C aguda em nada difere das demais
formas de hepatite viral aguda. O curso clínico da hepatite C aguda começa com um
período de incubação que varia de 15 a 120 dias (média de 50 dias). Durante o período
de incubação, frequentemente dentro de1 a 2 semanas de exposição, o RNA do HCV
pode ser detectado por ensaios sensíveis, como a reação em cadeia da polimerase via
transcriptase reversa (PCR). ORNA do HCV persiste por um longo tempo no curso
clínico da doença. O anticorpo ao HCV (anti-HCV) surge tardiamente no curso da

216
hepatite C aguda e pode não estar presente no inicio dos sintomas e das elevações
séricas das aminotransferases. Se a hepatite for autolimitada, o RNA do HCV
rapidamente torna-se indetectável no soro; nessa situação, títulos de anti-HCV, em
geral, são modestos e, por fim, também podem decair a níveis não detectáveis.
 Diagnóstico
O diagnóstico de hepatite C aguda geralmente é feito com base na detecção de
anti-HCV no soro de um paciente com características clinicas e bioquímicas de hepatite
aguda. Entretanto, alguns não desenvolvem níveis detectáveis de anti-HCV até semanas
ou meses após o início da enfermidade, de modo que a retestagem do anti-HCV durante
a fase de convalescença ou testes diretos para o RNA do HCV são necessários para
excluir o diagnóstico da hepatite C aguda em um paciente que exibe testes negativos
para todos os marcadores sorológicos. Vários testes comerciais para o RNA do HCV
estão atualmente licenciados e são confiáveis para a detecção do RNA do HCV em
níveis superiores a 100 cópias/ml. Testes que quantificam o nível de RNA do HCV
também estão disponíveis, mas a dosagem da carga viral não é clinicamente útil no
diagnóstico ou monitorização da hepatite C aguda.
 Tratamento
Os critérios para início do tratamento agudo são os seguintes: (1) se o paciente
estiver sintomático (ictérico), recomenda-se não iniciar o tratamento de imediato,
dosando-se o HCV-RNA 12 semanas após o início do quadro. Se NÃO houver
clareamento viral espontâneo (isto é, o HCV_RNA permanece detectável após 12
semanas) deve-se dar início à terapia antiviral específica; (2) se o pacientes estiver
assintomático (ex: vítima de exposição ocupacional que está sendo laboratorialmente
monitorada) deve-se iniciar o tratamento imediatamente.
A terapia com interferon- peguilado e ribavirina mostrou-se benéfica na hepatite
C crônica, levando à depuração sustentada do vírus e à regressão da doença em pouco
mais de 50% dos casos. O papel da terapia durante a infecção aguda ainda não está
esclarecido. Considerando que 50% a 85% dos pacientes com doença aguda evoluem
para infecção crônica, a questão da terapia precoce frequentemente é levantada. Vários
estudos documentam que mais de 90% dos pacientes com hepatite C aguda tratados
com interferon- peguilado com ou sem ribavirina por 24 semanas apresentaram
remissão da doença e um desaparecimento sustentado do RNA do HCV.
O início da terapia pode, até mesmo, ser atrasado por 2 a 3 meses após o início da
infecção, sem prejuízo da alta taxa de resposta. Por estas razões, pacientes com hepatite
C aguda devem ser tratados apenas se o RNA do HCV permanecer detectável por 2 a 3
meses após o começo da infecção. Um regime apropriado e de interferon peguilado 2a
(180 μg) ou -2b (1,5 μg/kg) uma vez por semana por 24 semanas, combinado com
ribavirina (1.000 mg/dia se o peso corporal for menor do que 70 kg e 1.200 mg/dia se
for maior do que 70 kg). Está, atualmente, em investigação o possível papel da
genotipagem do HCV em orientar a terapia e limitar a sua duração para 12 a 16 semanas
em pacientes que se tornam RNA HCV-negativo dentro de 4 semanas apôs o início da
terapia.

► HEPATITE D
 Epidemiologia
A hepatite D está ligada à hepatite B e, consequentemente, sua epidemiologia é
similar. O HDV pode ser transmitido por vias parenteral e sexual. Pessoas sujeitas a
maior risco são portadores crônicos de hepatite B e pessoas que se submetem a

217
exposições parenterais repetidas. Nos EUA e na Europa Ocidental, a hepatite delta é
mais comum entre os usuários de drogas injetáveis e doentes com hemofilia e
talassemia transfundidos antes do rastreamento de rotina das doações de sangue. A
hepatite delta é endêmica na bacia Amazônica e na África Central e comum em alguns
países da Europa e do Mediterrâneo, inclusive o sul da Itália, a Grécia e o Leste
Europeu.
 Fisiopatologia
O vírus da hepatite delta é um vírus RNA peculiar que requer o HBV para sua
replicação. O genoma viral é uma curta molécula circular de RNA de fita única, com 1,7
kb, que tem uma única fase de leitura aberta e uma região não transladada altamente
conservada, lembrando o elemento autorreplicativo dos viroides. A única fase de leitura
aberta codifica o antígeno delta e a edição do RNA pode alterar o tamanho da molécula
para produzir um antígeno delta pequeno (195 aminoácidos) ou grande (214
aminoácidos).
O antígeno delta pequeno promove a replicação do RNA do HDV; o antígeno
delta grande promove a montagem do vírus e a sua liberação no soro na forma de uma
partícula viral delta madura com 36 nm.
O vírus D é o único vírus comprovadamente citotóxico. Esse é o principal
mecanismo implicados na hepatite D aguda, enquanto na forma crônica predomina a
lesão mediada pela resposta imune.
 Manifestações Clínicas
A hepatite delta ocorre em dois padrões clínicos, denominados coinfecção e
superinfecção. A coinfecção delta é uma ocorrência simultânea das infecções HDV
aguda e HBV aguda. Ela lembra a hepatite B aguda, mas pode manifestar uma segunda
elevação nos níveis de aminotransferases associada ao período da replicação do vírus
delta. O diagnóstico da coinfecção delta pode ser feito em um paciente com
características clínicas de hepatite aguda que demonstre HBsAg, anti-HDV e IgM anti-
HBc no soro. Imunoensaios para anti-HDV estão comercialmente disponíveis e são
confiáveis, embora os anticorpos possam aparecer tardiamente durante a enfermidade.
Em pacientes suspeitos de apresentarem hepatite delta, a repetição do teste para anti -
HDV durante a convalescença é apropriada.
 Diagnóstico
A superinfecção delta aguda é a ocorrência de infecção HDV aguda em uma
pessoa com hepatite B crônica ou em um portador crônico de HBsAg. O diagnóstico de
superinfecção delta aguda pode ser confirmado em pacientes com características
clinicas de hepatite aguda e que apresentem HBsAg e anti-HDV, mas que não
demonstrem IgM anti-HBc no soro. A superinfecção por HDV é mais frequente que a
coinfecção e muito mais provável de acarretar hepatite delta crônica. Outros exames
úteis para confirmar o diagnóstico de hepatite D em curso são os testes séricos para o
RNA do HDV (detectado pela PCR) e os antígenos do HDV (detectáveis por
immunoblot); ambos os testes são, atualmente, ensaios de pesquisa e não foram
padronizados. O antígeno delta também pode ser detectado prontamente nos espécimes
de biópsia hepática usando colorações imuno-histoquímicas.

218
 Prevenção
A hepatite delta pode ser evitada com a prevenção da hepatite B. A gravidade da
hepatite delta oferece uma justificativa para vacinação de rotina contra a hepatite B em
regiões onde a hepatite delta é endêmica. Não há meios de prevenção da hepatite delta
em um indivíduo já portador de HBsAg; nesta situação, é importante evitar exposição
adicional ao HDV.
 Tratamento
Nenhuma terapia específica está disponível para hepatite delta aguda. Lamivudina
e outros agentes anti-HBV são ineficientes contra a replicação do HDV. A maioria dos
casos de coinfecção aguda regride; pacientes com superinfecção devem ser tratados
quando estiver claro que a hepatite delta crônica tenha sobrevindo.

► HEPATITE E
 Epidemiologia
A hepatite E é responsável por formas epidêmicas e endêmicas de hepatite não-A
e não-B que ocorrem, com maior frequência, em países em desenvolvimento. Grandes
surtos foram registrados na Índia, Paquistão, China, norte e centro da África e América
Central. Em estudos provenientes da Índia e Egito, a hepatite E foi responsável por uma
alta proporção de casos de hepatite aguda esporádica. Nos EUA e na Europa Ocidental,
a hepatite E é rara, e a maioria dos casos é importada ou deve-se à transmissão
zoonótica de porcos ou ratos que hospedam um vírus similar.
O HEV é transmitido por via fecal-oral, e a maior parte dos casos pode ser
claramente atribuída à exposição à água contaminada sob condições precárias de
higiene. A hepatite E parece ser menos contagiosa do que a hepatite A, a outra forma de
hepatite infecciosa, sendo raros os casos secundários.
 Fisiopatologia
O HEV é um pequeno vírus RNA de fita simples não envelopado que atualmente
não está classificado. O genoma viral tem comprimento de 7,5 kb e codifica três fases
de leitura aberta: a primeira (ORF1) para proteínas não estruturais responsáveis pela
replicação viral; a segunda (ORF2) para a proteína do capsídeo (antígeno do HEV); e a
terceira (ORF3) para uma proteína curta de função desconhecida. O vírus e o antígeno
do HEV podem ser detectados nos hepatócitos durante a infecção aguda. Os mais altos
níveis de vírus são detectados nas fezes durante o período de incubação da doença.
Vírus similares ao HEV são encontrados em outras espécies, e cepas encontradas em
suínos domésticos podem ser infecciosas em humanos.
 Manifestações Clínicas
O curso clínico da hepatite E lembra o de outras formas de hepatite. O período de
incubação é de 15 a 60 dias (média de 35 dias). Frequentemente, a doença é colestática,
com níveis elevados de bilirrubina e de fosfatase alcalina. A hepatite E também tende a
ser mais grave do que outras formas de icterícia epidêmica, comum a taxa de
mortalidade de 1 % a 2% e uma taxa particularmente alta de insuficiência hepática
aguda em mulheres grávidas. Os vírions e o antígeno do HEV podem ser detectados nas
fezes e no fígado durante o período de incubação e na fase sintomática inicial, mas esses
exames não são meios práticos para o diagnóstico. Os imunoensaios enzimáticos
(ELISA) para anticorpos IgM e IgG ao HEV (anti-HEV) foram desenvolvidos e são
reativos em, pelo menos, 90% dos pacientes no início da enfermidade clínica.
Entretanto, esses exames não estão, em geral, nem disponíveis nem padronizados. Além

219
disso, o anti-HEV é encontrado em 1% a 2% da população normal, o que pode
representar casos subclínicos de hepatite que regrediram e foram adquiridos durante
viagem ou como resultado de exposição a animais domésticos ou a outros animais
infectados.
 Diagnóstico
O diagnóstico de hepatite E deve ser considerado em pacientes que apresentam
hepatite aguda e que tenham viajado recentemente a uma área endêmica,
particularmente se exames para outras formas de hepatite não forem reativos. A
detecção de anti-HEV, particularmente da subclasse lgM, é suficiente para fechar o
diagnóstico nesta situação. Como a hepatite E é rara nos Estados Unidos e no mundo
Ocidental, o teste para o anti-HEV dificilmente faz -se necessário.
 Prevenção e Tratamento
Não existem meios de prevenção ou tratamento conhecidos para hepatite E. As
imunoglobulinas, mesmo quando preparadas a partir do plasma de populações com uma
alta taxa de hepatite E, não parecem ser efetivas. Nenhum método específico de
tratamento foi avaliado.
Os viajantes (particularmente mulheres grávidas) para regiões onde a hepatite E é
endêmica devem ser aconselhados a ter cautela a respeito da ingestão de água e de
alimentos crus ou mal cozidos.
Vacinas recombinantes contra o HEV foram desenvolvidas e mostraram-se
eficientes em modelos animais de hepatite E. Estudos para avaliar a eficácia de uma
vacina contra o HEV estão atualmente sendo conduzidos em regiões endêmicas.

Epidemiologia das Hepatites Virais


A hepatite viral aguda é uma doença comum, que afeta 0,5% a 1 % da população
nos Estados Unidos a cada ano. A incidência anual da hepatite aguda vem diminuindo
constantemente desde 1990, em grande parte como resultado do uso de vacinas contra a
hepatite A e B e pela redução dos comportamentos de alto risco.
Em pesquisas populacionais recentes, as causas virais de hepatite aguda são as
seguintes: hepatite A em 37%, a hepatite B em 45%, e hepatite C em 18% dos casos. A
hepatite D é rara nos Estados Unidos (menos de 1% dos casos agudos) e a maior parte
dos casos de hepatite E recentemente relatados foram importados. Em até 3% dos casos,

220
a causa de hepatite não pode ser determinada, mesmo após variados testes. Na prática
clinica, outras formas não virais de hepatite aguda devem ser consideradas,
especialmente a mononucleose; sífilis secundária; doença hepática induzida por
drogas/medicamentos; colecistite aguda (ou obstrução biliar aguda); doença de Wilson;
e várias formas de lesão hepática isquêmica, maligna ou tóxica.
As condições do nosso país: sua heterogeneidade socioeconômica, a distribuição
irregular dos serviços de saúde, a incorporação desigual de tecnologia avançada para
diagnóstico e tratamento de enfermidades, são elementos importantes que devem ser
considerados na avaliação do processo endemo-epidêmico das hepatites virais. O
Ministério da Saúde criou, em 5 de fevereiro de 2002, o Programa Nacional para a
Prevenção e o Controle das Hepatites Virais (PNHV), que deverá contribuir para
aprimorar o conjunto de ações de saúde relacionadas às hepatites.
Para fins de vigilância epidemiológica no Brasil, define-se como caso confirmado
de hepatite A o indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente
anti-HAVIgMreagente, ou que preencha as condições de caso suspeito e vínculo
epidemiológico com caso confirmado de hepatite A.
Para fins de vigilância epidemiológica no Brasil, define-se como caso confirmado
de hepatite B o indivíduo que preencha a condições de caso suspeito e que apresente um
ou mais marcadores sorológicos reagente ou exame de biologia molecular para hepatite
B (HBsAg reagente, anti-HBcIgM reagente HBeAg reagente, DNA do HBV
detectável).
Para fins de vigilância epidemiológica no Brasil, define-se como caso confirmado
de hepatite C o indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente
anti-HCV reagente e HCV-RNA detectável.
Para fins de vigilância epidemiológica no Brasil, define-se como caso confirmado
de hepatite D o indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente
HBsAg ou anti-HBcIgM reagentes e um ou mais dos marcadores sorológicos (anti-
HDV total reagente, anti-HDVIgM reagente).
Para fins de vigilância epidemiológica no Brasil, define-se como caso confirmado
de hepatite E o indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente
anti-HEVIgM reagente.

221
222
Problema 10 – Minha doença é péptica
ou infecciosa?
Abdome Agudo
O termo abdômen agudo é amplo e compreende inúmeras situações clínicas.
Alguns autores têm definido abdômen agudo como uma dor na região abdominal,
não traumática, de aparecimento súbito, durando cerca de 6h e de intensidade
variável associada ou não a outros sintomas. Geralmente com duração de horas até
quatro dias, não ultrapassando sete dias. Em geral, necessita de intervenção
médica imediata, cirúrgica ou não.
- Uma grande série de doenças musculares, gastro-intestinais,
ginecológicas, urológicas, vasculares, psicossomáticas, cardíacas, parasitárias,
pulmonares e intoxicações exógenas, dentre outras podem causar dor abdominal e
até simular abdômen agudo.
As dores abdominais podem ser classificadas segundo:
- Anatomia: pela localização da dor se pode indicar as possíveis causas ou
órgãos acometidos.
- Causas abdominais e extra-abdominais.
- Processo desencadeante: geralmente utilizada pela cirurgia de urgência.
No entanto, habitualmente os cirurgiões classificam o abdômen agudo
segundo a natureza do processo determinante, em:
 Abdome agudo inflamatório: ele é caracterizado pela dor aguda ou
crônica devido a irritação do peritônio causado por diversos agentes, ou
relacionado com uma inflação previa das vísceras abdominais. A dor tem
características variáveis e progride de acordo com sua causa.
Inicialmente ela é branda e continua, depois se torna centralizada em uma área
bem localizada dentro de 1 a 2 horas. Geralmente está associada a náuseas,
vômitos, mal-estar geral, febre, sinais de irritação peritoneal.
- as principais causas são: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite
aguda, DIP e diverticulite aguda. apendicite, colecistite aguda, pancreatite aguda,
diverticulite, doença inflamatória pélvica, abscessos intra-abdominais, peritonites
primárias e secundárias, dentre outros. Ex: salpingite, gravidez ectópica, tumor de
ovário, cisto folicular, endometriose, peritonites.
 Abdome agudo obstrutivo: a dor é do tipo cólica e o paciente tende a
apresentar o abdome distendido. Geralmente tem uma parada na eliminação de
gases e fezes e o paciente pode ainda apresentar náuseas e vômitos. Ele tem uma
alteração do estado geral, geralmente sem febre, com hipotensão arterial e
complicações respiratórias agudas.
- as principais causas são: aderências, neoplasias de cólon, volvo de
sigmoide, bolo de áscaris, obstrução pilórica, hérnia encarcerada e estrangulada,

223
bridas, corpos estranhos, calculo biliar, intussuscepção (entrada de uma alça
intestinal na outra). No RX as alças intestinais encontram-se dilatadas.
 Abdome agudo perfurativo: é o abdome agudo que mais causa peritonite.
Tem um comprometimento do estado geral, fácies toxemica, desidratação, febre
com sudorese fria, hipotensão arterial e dor abdominal tipo ‘facada’. É
caracterizado principalmente pelo pneumoperitonio e historia anterior de ulcera.
- principais causas: ulcera péptica, cancer gastrointestinal, febre tifoide,
amebíase, diverticulite de colons, perfuração do apêndice, perfuração da vesícula
biliar.
 Abdome agudo isquêmico: paciente em mal estado geral, hipotensão
arterial grave, pulso fino, rápido e arrítmico, alteração do ritmo respiratório,
cianose nas extremidades, dor abdominal mal definida, vômitos de liquido escuro
com odor e presença de claudicação abdominal. A dor geralmente é intensa e
relacionada com história anterior de artiopatias crônicas IAM, AVC. O que acontece
é a eliminação de liquido necrótico causado por trombose arterial periférica,
embolia arterial ou trombose venosa periférica.
- principais causas: trombose da artéria mesentérica, torção do grande
omento, infarto esplênico. Isquemia intestinal, trombose mesentérica, torção do
omento, torção de pedículo de cisto ovariano, infarto esplênico, dentre outros.
 Abdome agudo hemorrágico: paciente em MEG, palidez cutâneo-mucosa
intensa, pulso fino e rápido, hipotensão arterial grave, sudorese fria e
rebaixamento do nível de consciência, ele tende a cursar para uma síndrome
hipovolemica . A dor abdominal é súbita, difusa à palpação superficial e profunda,
intensa.
- principais causas: gravidez ectópica, rotura de aneurisma abdominal,
cisto hemorrágico de ovário, rotura de baço, endometriose, necrose tumoral.

ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO


Causa mais frequentes de abdome agudo.
Caracterizado pela dor abdominal decorrente da inflamação aguda ou crônica
do peritônio causada por agentes diversos (bacterianos, físicos e quimicos), e/ou
secundária a uma inflamação prévia de vísceras abdominais (neste caso há
disseminação e implantação de células inflamatórias no peritônio).
Existem diversas causas de abdome agudo inflamatório, sendo as mais freqüentes
a apendicite aguda, a colecistite aguda, a pancreatite aguda e a diverticulite por doença
diverticular dos colos.
Os dados fisiopatológicos no abdome agudo inflamatório estão relacionados com
a reação do peritônio e as modificações do funcionamento no trânsito intestinal. A
cavidade peritoneal é revestida pelo peritônio, uma membrana serosa derivada do
mesênquima que possui uma extensa rede capilar sangüínea e linfática, com função
protetora por meio da exsudação, absorção e formação de aderências.
Todo agente inflamatório ou infeccioso, ao atingir o peritônio, acarreta irritação
do mesmo, cuja intensidade é diretamente proporcional ao estádio do processo
224
etiológico. Segue-se a instalação progressiva de íleo paralítico localizado ou
generalizado.
Toda vez que a serosa que envolve uma musculatura lisa sofre irritação, esta entra
em paresia ou paralisia. Por outro lado, a resposta do peritônio parietal exterioriza-se
clinicamente por dor mais bem localizada e contratura da musculatura abdominal
localizada ou generalizada, dependendo da evolução do processo. É importante salientar
que a contratura muscular pode ser voluntária ou, mesmo, determinada por doença
extraabdominal.
Podemos concluir que a dor abdominal secundária à irritação do peritônio visceral
(autônoma) é mal localizada e origina-se pela distensão e contração das vísceras,
enquanto a dor que segue a irritação do peritônio parietal (cerebroespinal) é contínua,
progressiva, piorando com a movimentação e sendo também mais localizada.
Além da topografia da dor abdominal, é de fundamental importância definir as
características da mesma, tais como: início, irradiação, evolução, caráter, intensidade,
duração, condições que a intensificam ou atenuam. Essa análise minuciosa, às vezes
árdua, é posteriormente recompensada, pois, como na maioria das doenças do sistema
digestório, a história clínica é a pedra fundamental do diagnóstico.
A dor no abdome agudo inflamatório pode ser desencadeada pelo início de uma
doença recente, como no caso da apendicite aguda, ou pela agudização de uma doença
crônica, como na colecistite aguda por colelitíase ou diverticulite do sigmóide por
doença diverticular dos colos.
O caráter progressivo da dor é observado no caso da apendicite aguda, colecistite
aguda, pancreatite aguda e diverticulite aguda do sigmóide. Na maioria das doenças de
conduta cirúrgica causadas por quadro abdominal de etiologia inflamatória, a dor
nitidamente evolui para piora. A irradiação da dor abdominal, tão importante na maioria
dos doentes com abdome agudo inflamatório, não deve ser confundida com localização.
A trajetória da dor é característica em muitas patologias, sendo de grande valor
diagnóstico.
O tipo de dor, em cólica, contínua, pontada, queimação etc., pode mudar no curso
da doença, permitindo orientação diagnóstica. A intensidade e a duração da dor, tão
importantes nos doentes com abdome agudo inflamatório, nem sempre são
proporcionais à gravidade, nem tampouco sugerem conduta cirúrgica, como na
pancreatite aguda.
É importante, também, analisar os fatores que intensificam ou atenuam a dor,
sendo freqüente a exacerbação da mesma com a movimentação e esforços, tão comum
no abdome agudo inflamatório.
Além da dor abdominal, é possível observar sintomas associados nos quadros de
abdome agudo de etiologia inflamatória. Náuseas e vômitos podem acompanhar uma
série de doenças abdominais. A febre é um sintoma freqüente, surgindo precocemente,
sendo menos intensa no início e assumindo características próprias e maior intensidade
nas fases de supuração. Alterações no hábito intestinal no abdome agudo inflamatório,
especialmente a constipação, acontecem nas fases avançadas da doença devido à
peritonite.

225
Algumas vezes são observados episódios de diarréia secundários a abscesso de
localização pélvica, particularmente nos casos de apendicite ou diverticulite
complicada. Sintomas urológicos, como disúria e polaciúria, podem acompanhar
quadros de apendicite de localização retrocecal e, mais freqüentemente, quadros de
dieverticulite do sigmóide.

Principais agentes etiológicos do abdome agudo:

►FISIOPATOLOGIA COLECISTITE AGUDA


A colecistite aguda pode ser definida como a inflamação química e/ou
bacteriana da vesícula biliar, na maioria das vezes desencadeada a partir da
obstrução do ducto cístico.
Como a litíase vesicular ou colelitíase são a principal causa dessa doença, a
obstrução decorre da impactação de um cálculo na região infundíbulo-colocística,
com conseqüente hipertensão, estase, fenômenos vasculares, inflamatórios e
proliferação bacteriana. O processo assim desencadeado pode involuir, abortar,
como decorrência da mobilização do cálculo. Pode, também, evoluir para
hidropisia vesicular, empiema, necrose, perfuração bloqueada ou em peritônio
livre (coleperitônio).
Caracterizada por dor no andar superior direito do abdômen há mais de 6
horas, com sinais ultra-sônicos de colecistite, ou dor no hipocôndrio direito com
litíase vesicular ao ultra-som, podendo estar associada à febre, leucocitose e/ou
proteína C reativa >10mg/l. Em 90% dos casos a causa da colecistite aguda é a

226
litíase, e 75% destes pacientes apresentam antecedentes de cólica biliar e
diagnóstico de colecistite crônica calculosa.
A dor da cólica biliar é causada pelo espasmo do ducto cístico, desencadeado
pelo estímulo da colecistoquinina durante a alimentação. É tipicamente do tipo
cólica no epigástrio e hipocôndrio direito, associada a náuseas e vômitos e de
duração menor que 6 horas.
A dor na colecistite aguda geralmente é causada pela obstrução do ducto
cístico pela impactação do cálculo biliar e seguida da inflamação da mucosa
vesicular. Pode ainda ocorrer infecção secundária evoluindo para empiema,
necrose e até a perfuração da vesícula biliar. Cerca de 10% dos casos de colecistite
aguda apresentam perfuração, levando, em algumas casuísticas, a 20% de
mortalidade.
O estado geral está na dependência da intensidade do processo inflamatório e
principalmente infeccioso. Costuma estar preservado, sem grandes alterações
hemodinâmicas e apresentar febre raramente superior a 38°C. Em
aproximadamente 20% dos pacientes é possível observar icterícia discreta.
A inspeção do abdome revela posição antálgica ou discreta distensão. A
palpação do abdome é, sem dúvida, o recurso propedêutico mais valioso, podendo
revelar hipersensibilidade no hipocôndrio direito, defesa voluntária ou não e
mesmo plastrão doloroso.
O sinal de Murphy — interrupção da inspiração profunda pela dor à palpação
da região vesicular — é, talvez, a expressão maior da propedêutica abdominal na
colecistite aguda. A percussão abdominal revela dor ao nível do hipocôndrio
direito, conseqüente à irritação do peritônio visceral, o mesmo ocorrendo com os
ruídos hidroaéreos que se encontram diminuídos ou, até, normais.
►FISIOPATOLOGIA DA APENDICITE AGUDA
A apendicite aguda é a causa mais freqüente de abdome agudo inflamatório,
sendo, provavelmente, a doença cirúrgica mais comum no abdome. Incide mais
freqüentemente entre a segunda e terceira décadas, e reconhece na obstrução do
lume apendicular, por corpo estranho (fecalito) ou processo inflamatório, seu
principal agente fisiopatológico.
Acredita-se que a sua principal causa seja a obstrução da sua luz do apêndice,
seguida da inflamação, infecção secundária e necrose evoluindo para a perfuração
do órgão.
Dor abdominal peri-umbilical (causado pela obstrução da luz apendicular e a
distensão da sua parede), irradiada para fossa ilíaca direita (correspondendo à
inflamação e infecção do apêndice) geralmente associada a náuseas e vômitos,
inapetência e febre baixa.
Este processo pode evoluir em poucas horas ou até um dia. Neste momento,
podemos encontrar ausência de leucocitose e no exame físico alguns sinais como
Blumberg (dor a descompressão brusca no ponto de McBurney), Rovsing (dor
referida na fossa ilíaca direita após compressão do hemiabdômen esquerdo,
levando a distensão do ceco).

227
A inspeção revela um paciente com pouca movimentação, atitude antálgica
(flexão do membro inferior direito) no sentido de aliviar a dor. Manobras como
pular ou tossir podem desencadear ou exacerbar a dor na fossa ilíaca direita.
Sinais sugestivos de apendicite aguda, tais como os indicados a seguir, são
bem conhecidos:
• Sinal de Blumberg: dor à descompressão brusca na seqüência da
palpação profunda da fossa ilíaca direita;
• Sinal de Rovsing: dor observada na fossa ilíaca direita por ocasião da
palpação profunda na fossa ilíaca e flanco esquerdo;
• Sinal de Lapinsky: dor na fossa ilíaca direita desencadeada pela palpação
profunda no ponto de McBurney com o membro inferior direito hiperestendido e
elevado.
A dor pode ser difusa e a resistência generalizada em casos de apendicite
aguda complicada com peritonite difusa.
A percussão da parede abdominal deve ser iniciada num ponto distante ao de
McBurney, encaminhando-se para a fossa ilíaca direita, onde a dor a essa manobra
será expressão da irritação peritoneal localizada. Por fim, a auscultação do abdome
costuma evidenciar diminuição dos ruídos hidroaéreos, mais evidente quanto mais
avançada a fase em que se encontra a apendicite aguda.
►FISIOLOGIA DA PANCREATITE AGUDA
A pancreatite aguda é uma doença que tem como substrato um processo
inflamatório da glândula pancreática, decorrente da ação de enzimas
inadequadamente ativadas, que se traduz por edema, hemorragia e até necrose
pancreática e peripancreática. Este quadro é acompanhado de repercussão
sistêmica que vai da hipovolemia ao comprometimento de múltiplos órgãos e
sistemas e, finalmente, ao óbito.
A coledocolitíase e a ingesta alcoólica abusiva são responsáveis por cerca de
80% das pancreatites agudas. Cerca de 10% são idiopáticas e os outros 10% são
atribuídos a todas as demais possíveis causas como hiperlipidemia, viroses
(cachumba, coxsackie, HIV), traumas abdominais, cirurgias abdominais, vasculites,
tumores pancreáticos, pâncreas divisum, parasitoses intraductais, drogas e outras.
O quadro inicial é de dor no andar superior do abdômen (epigástrio e
flancos), que pode irradiar para o dorso. Possui característica contínua e pode
estar associado à icterícia ou não. Os vômitos são frequentes e precoces, devido à
compressão do pâncreas sobre o duodeno e/ou estômago. A distensão abdominal
também é comum, e nos quadros graves poderão estar presentes a hipotensão
arterial, taquicardia, sudorese, febre, torpor, e coma.
Nem sempre o quadro clínico da pancreatite aguda é característico, o que,
por vezes, torna difícil o seu diagnóstico. São importantes, pela freqüência, a dor
abdominal intensa, inicialmente epigástrica e irradiada para o dorso, em faixa ou
para todo o abdome, além de náuseas e vômitos, acompanhada de parada de
eliminação de gases e fezes. O polimorfismo no quadro clínico da doença é o
principal responsável pelo erro no seu diagnóstico.

228
Considerando a ampla variedade de apresentações da pancreatite aguda, bem
como o grande potencial de gravidade da doença, há muito se constitui
preocupação a caracterização das formas leves e graves da pancreatite. A
diferenciação entre essas formas pode ser feita pelos critérios prognósticos com
base em dados clínicos, laboratoriais e de imagem. A diferenciação entre essas
formas pode ser feita pelos critérios prognósticos com base em dados clínicos e
laboratoriais (critérios de Ranson, APACHE II e outros) e/ou radiológicos (critérios
de Balthazar).
O exame físico da pancreatite aguda nas formas leves (80 a 90%) mostra um
paciente em regular estado geral, por vezes em posições antálgicas, sinais de
desidratação e taquicardia. O abdome encontra-se distendido, doloroso
difusamente à palpação profunda, especialmente no andar superior e com ruídos
hidroaéreos diminuídos. Algumas vezes, é possível palpar abaulamentos de limites
indefinidos, os quais sugerem a presença de coleções peripancreáticas. Nas formas
graves de pancreatite aguda (10 a 20%), o paciente se encontra em estado geral
ruim, ansioso, taquicárdico, hipotenso, dispnéico e desidratado. O abdome
encontra-se distendido, doloroso difusamente e com sinais de irritação peritoneal
difusa. É possível identificar equimose e hematomas em região periumbilical (sinal
de Cullen) ou nos flancos (sinal de Grey Turner). Os ruídos hidroaéreos
encontram-se reduzidos, ou mesmo abolidos.
►FISIOPATOLOGIA DA DIVERTICULITE
A diverticulite dos colos caracteriza-se pelo processo inflamatório de um ou
mais divertículos, podendo estender-se às estruturas vizinhas e causar uma série
de complicações. A doença diverticular dos colos compreende a diverticulose
universal dos colos, a doença diverticular do sigmóide e o divertículo do ceco, cada
uma dessas formas com características peculiares. Neste capítulo, serão abordados
aspectos clínicos da diverticulite do sigmóide. Essa doença é mais comum em
pessoas acima de 50 anos de idade, fato que contribui para o aumento da sua
morbimortalidade.
Esta complicação da doença diverticular (diverticulose) ocorre por
inflamação e infecção do divertículo(+comum em idosos no sigmoide), geralmente
decorrente da oclusão do seu óstio por fezes ou resíduos alimentares, podendo
levar até à perfuração.
Do ponto de vista fisiopatológico, caracterizase por um processo inflamatório
do divertículo e das estruturas peridiverticulares, geralmente desencadeado pela
abrasão da mucosa do divertículo por um fecalito. Esse processo inflamatório
rapidamente envolve o peritônio adjacente, a gordura pericólica e o mesocolo. As
manifestações clínicas da doença vão desde discreta irritação peritoneal até
quadros de peritonite generalizada.
A sintomatologia é variável, pois depende da localização do divertículo,
podendo evoluir com pneumoperitônio se perfurado para a cavidade abdominal,
ou abscessos em flanco ou bloqueios abdominais.

229
O sintoma principal é a presença de dor abdominal geralmente localizada na
fossa ilíaca esquerda querda ou na região suprapúbica, à semelhança de uma
apendicite do lado esquerdo. A dor, algumas vezes do tipo contínua e outras do
tipo cólica, localiza-se desde o início em fossa ilíaca esquerda podendo, em
determinadas circunstâncias, irradiar-se para a região dorsal do mesmo lado. É
possível encontrar anorexia e náuseas. As alterações do trânsito intestinal estão
caracterizadas por obstipação e algumas vezes diarréia. Quando o processo
inflamatório atinge a bexiga ou o ureter, o doente manifesta sintomas urinários do
tipo disúria e polaciúria.
Ao exame físico encontraremos o paciente febril, pouco taquicárdico. O
abdome se encontra discretamente distendido, e os ruídos hidroaéreos,
diminuídos. A palpação evidenciará sinais de irritação peritoneal (descompressão
brusca positiva, percussão dolorosa) localizados em fossa ilíaca esquerda, região
suprapúbica ou, às vezes, generalizada. Em muitas situações, é possível palpar uma
massa dolorosa na fossa ilíaca esquerda. O toque retal freqüentemente evidenciará
dor em fundo-de-saco. Não devemos esquecer que, em algumas circunstâncias, o
quadro clínico da diverticulite do sigmóide pode assumir características de
abdome agudo perfurativo ou, mesmo, abdome agudo obstrutivo.
- Diverticulite verdadeira: causado pela herniação da mucosa e submucosa.
- Diverticulite falsa: causada pela protusão da mucosa.
► FISIOPATOLOGIA DA DIP
A maior causa de DIP é por ascensão bacteriana a partir de contaminação
vaginal através do canal endocervical. É comum o início do quadro coincidir com o
período menstrual pelas alterações próprias deste período:
- alteração do pH vaginal;
- perda do tampão mucoso natural;
- diminuição da espessura do endométrio;
- contrações uterinas próprias que impulsionam os micro-organismos em
direção à tuba uterina.
Os agentes patogênicos normalmente envolvidos são Chlamydia tracomatis,
Neisseria gonorrhea, Mycoplasma hominis e Ureaplasma ureoliticum, e há, na
maioria das vezes, história clínica de vulvovaginite prévia.
A complicação mais comum é o abscesso tubo-ovariano, que acomete 19%
dos casos de DIP. Pode evoluir para quadro de pelviperitonite, alcançando o andar
superior do abdome, o que pode causar a peri-hepatite (síndrome de Fitz-Hugh-
Curtis).
Os processos inflamatórios pélvicos ou abscessos tubo-ovarianos são os
responsáveis por 30% a 40% dos casos de infertilidade primária pela evolução
com obstrução tubária ou formação de aderências pélvicas.

230
231
 EXAME CLÍNICO
- história pregressa: ginecológica (ciclo sexual, atraso menstrual, corrimento
vaginal- sinal de DIP), medicamentos, familiar, cirúrgica.
- sintomas: dor abdominal, vômitos, constipação, urinários, anorexia.
 EXAME FÍSICO
- geral: sinais sistêmicos, febre.
- abdômen: sinal de Blumberg, rovsing, Murphy, jobert (hipertimpanismo na
região hepática), lapinsky (psoas- dor a compressão do FID quando o paciente
eleva o MMIID), obturador(dor na FDI quando a coxa é fletida e o joelho
rotacionado), cullen, grey-turner, kehr (dor aguda no ombro quando há presença
de sangue ou outros irritantes), lenander (diferença entre a temperatura axilar e
retal > 1°), sinal de defesa abdominal e sinal de giordano.
- exame retovaginal.
 EXAMES LABORATORIAIS
- Hemograma: mostra leucocitose com neutrofilia acentuada. Pode mostrar
leucopenia em casos avançados.
- Hematócrito: aumentado devido a perda liquida no 3° espaço intercostal,
diminuído devido a anemia.
- Ureia e creatinina: aumentadas.
- VHS: aumentado mostra destruição tissular; elevado na DIP; não alterado na
apendicite.
- Amilase: diagnóstico de pancreatite aguda. Elevada em 24h a 48h.
- Lipase é mais específica.
 EXAME DO LÍQUIDO ASCÍTICO
- mostra peritonite acima de 250/mm3
 EXAME DE URINA

232
- piúria, cistite, nefrite, pielite.
- hematúria indica infecção, apendicite retrocecal.
 EXAMES DE IMAGEM
- USG
- TC
- videolaparoscopia: caso a USG seja imprecisa.
- RAIO-X: pode indicar presença de cálculos.
 COLECISTITE AGUDA
- leucocitose;
- elevação da fosfatase alcalina e transaminases;
- Síndrome de Mirizzi, que ocorre quando cálculos grandes impactam no
infundíbulo e/ou ducto cístico erodindo a parede e acometendo o interior do ducto
hepático comum, podemos encontrar hiperbilirrubinemia.
PADRÃO OURO: ultra-som abdominal, com sensibilidade e especificidade de 95%.
Em casos duvidosos a TC ou a cintilografia podem auxiliar.
 APENDICITE AGUDA
- USG: possui sensibilidade de 75 a 90% e sua especificidade é de 86 a 100%. A
TC abdominal tem sensibilidade de 90 a 100% com especificidade de 91 a 99%.
 PANCREATITE AGUDA
- A amilase apresenta-se elevada já nas primeiras horas de evolução do quadro,
habitualmente voltando a valores normais após 48 horas.
- RAIO-X: derrame pleural, coleções, pseudocistose ascite pancreática ou
diagnosticar litíase vesicular, barro biliar e coledocolitíase.
- A avaliação pancreática e sua classificação segundo a gravidade são realizadas
através da TC de abdômen.
- A colangiopancreatografia endoscópica está indicada em casos de obstrução
biliar associado a pancreatites graves e/ou colangites.
 DIVERTICULITE
- RAIO-X: poderá mostrar pneumoperitônio e/ou quadros oclusivos.
- A TC está indicada, quando da ausência de pneumoperitônio no raio-x simples.
- A colonoscopia é contra indicada na suspeita de diverticulite perfurativa.
 DIP

233
Sinais clínicos:
• Dor à palpação em região abdominal inferior
• Hipertermia vaginal
• Febre
• Dor à palpação das regiões anexiais
• Dor à mobilização do colo uterino
• Secreção vaginal ou cervical anormal
• Massa pélvica
• Abaulamento do fundo de saco
• Sinais de irritação peritoneal

 TRATAMENTO

234
TRATAMENTO GERAL
- ANALGESIA
- REPOSIÇÃO VOLÊMICA
- CORREÇÃO DE DISTURBIOS ELETROLICOS
- JEJUM
- ANTIBIOTICO TERAPIA PROFILATICA
- CIRURGIA
VER CAPÍTULO DE ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO

235
Sumário EXTRA

Síndrome da Má Absorção Intestinal ----------------- 237

Abdome Agudo -------------------------------------------- 247

236
Síndrome da Má Absorção Intestinal
Qualquer processo que leve à má assimilação ou aproveitamento inadequado de
um ou mais elementos constitutivos da dieta:
 Carboidratos;
 Proteínas;
 Lipídios;
 Vitaminas;
 Sais Minerais
 Eletrólitos.
 Definições
 Má Digestão: é definida como hidrólise defeituosa de nutrientes do conteúdo
luminal.
 Má Absorção ou Disabsorção: é o defeito de absorção da mucosa por
impedimento do seu transporte.
Entretanto, prática clínica, má absorção é usada para descrever o resultado final de
ambos os processos.
Pode-se ainda classificar:
 Pan Má Absorção ou pandisarbsorção:
Quando um amplo espectro de nutrientes está envolvido.
 Má Absorção Seletiva ou específica:
Quando se apenas um ou uma classe de nutrientes está implicado.
Tais conceitos podem ser úteis no diagnóstico diferencial dessas doenças.
 Fisiologia e Anatomia
 Intestino Delgado
- Mede cerca de 2,5 cm de diâmetro, e seu comprimento é de aproximadamente
3 m em uma pessoa viva, e por volta de 6,5 m no cadáver.
- É dividido em três regiões: duodeno, jejuno e íleo
- Apresenta adaptações da mucosa (pregas, vilosidade e microvilosidades) que
amplificam a superfície de contato em 600 vezes entre o epitélio absortivo e os
nutrientes
 Intestino Grosso
- Mede aproximadamente 1,5 m de comprimento e 6,5 cm de diâmetro
- É dividido em: ceco, cólon ascendente, cólon transverso, cólon descendente,
cólon sigmóide e reto.
 Vascularização
- Existência de uma densa rede de capilares, vênulas e ductos lacteais que
permeiam os vilos intestinais permitindo assim, o aporte de substâncias e a drenagem
dos nutrientes, água e eletrólitos absorvidos pelo epitélio intestinal.
O epitélio é monoestratificado, com ciclo de vida curto (2 dias média). As células
nascem da base das vilosidades e sobem gradualmente para amadure-cimento e
descamação na superfície.
 Digestão
237
• Boca: amilase salivar converte amido em
maltose, maltotriose e α-dextrinas.
• Estômago: a pepsina converte as proteínas em
peptídeos e a lipase lingual e gástrica convertem
alguns triglicerídeos em ácidos graxos, diglicerídeos
e monoglicerídeos.
• Intestino delgado: conclusão da digestão com
esforço coletivo do suco pancreático, bile e suco
intestinal.
 Absorção
A absorção de micro-nutrientes não é igual em
todo o trato digestivo.
Todas as fases químicas e mecânicas da digestão,
da boca até o intestino delgado, são direcionadas com
vista à transformação do alimentos em formas que
possam passar através das células.

 Fisiologia da Digestão
Pode-se entender a fisiologia da digestão, dividindo os processos em 3 fases:
o Fase Intraluminal
o Fase Mucosa
o Fase Absortiva

238
 Fase Intraluminal
Os aminoácidos e os ácidos graxos induzem à liberação de colecistocinina (CCK)
da mucosa do intestino superior  CCK estimula a liberação de enzimas (amilase,
lipase, proteases)
Proteases pancreáticas (tripsinogênio, quimiotripsinogênio, pró-elastase e pró-
carboxipeptidase) são liberadas inativadas e quando chegam no duodeno são ativadas.
Ácido gástrico causa a liberação de secretina pela mucosa, a qual estimula a
secreção de bicarbonato. CCK e acetilcolina potencializa esse efeito estimulador. Essa
neutralização ácida é fisiologicamente importante devido algumas proteínas só agirem
quando em presença de um ambiente básico.
A lipase pancreática cliva os triglicerídeos em ácidos graxos e monoglicerídeos.
Os carboidratos e a maioria das proteínas da dieta são hidrossolúveis e
prontamente digeridos por enzima pancreáticas.
 Fase Mucosa
Temos absorção dos nutrientes em uma grande área de intestino intacto.
As enzima da borda em escova são importantes na hidrólise.
◦ Carboidratos: glicose, frutose e galactose
◦ Proteínas: aminoácidos simples, dipeptídeos e tripeptídeos
◦ Triglicerídeos: ácidos graxos, glicerol e monoglicerídeos
 Fase Absortiva
Os nutrientes são absorvidos ao longo de todo o delgado, com exceção do ferro e
folato e dos sais biliares e cobalamina.
A eficiência da absorção e captação de nutrientes pela mucosa é influenciada pelo
número de células absortivas, pela existência de hidrolases funcionais e proteínas
transportadoras específicas de nutrientes na borda em escova, pelo tempo de trânsito.
 Divisão Fisiopatológica de Má Absorção
O modelo idealizado por Campos oferece uma sistemática que confere
objetividade na abordagem do caso clínico, consistindo em uma ordenação lógica e com
aplicação didática.
 Pré-epitelial: impedimento da hidrólise luminar ou solubilização (órgãos da
digestão)
 Epitelial: impedimento da função da mucosa (hidrólise na mucosa, captação e
empacotamento através do epitélio colunar).
 Pós-epitelial: impedimento à remoção dos nutrientes da mucosa (vasos linfáticos
e estruturas ganglionares mesenteriais).

239
240
 Sinais e Sintomas
Diarréia, cólicas abdominais, flatulência, distensão abdominal, esteatorréias, perda
de peso, fraqueza e parestesias são as manifestações mais comuns do paciente com a má
absorção intestinal.

 Diagnóstico
Consiste em caracterizar a situação observada em cada paciente com a maior
acurácia possível, visando-se a chegar a um diagnóstico definitivo. O diagnóstico das
síndromes de má absorção compreende quatro estágios:
o Diagnóstico primário da má absorção.

241
o Diferenciação entre estados disabsortivos secundários a outros distúrbios
constitucionais ou secundários a procedimentos cirúrgicos e os de origem
alimentar primária.
o O diagnóstico diferencial dos estados disabsortivos devidos à falta de
preparação para a absorção daqueles nos quais as funções absortivas do
intestino delgado parecem anormais
o Diagnóstico diferencial das enteropatias
1 – Diagnóstico Primário de Má Absorção
O diagnóstico de má absorção propriamente dito se baseia no tripé história, exame
físico completo e estudo das fezes do paciente.
2 – Má absorção Secundária a Distúrbios Constitucionais ou Cirurgias
O tratamento destas condições é principalmente dependente do reconhecimento da
doença primária ou devido a operações abdominais.
3 – Diagnóstico Diferencial das Disabsorções por Falta de Preparo à Absorção
Compreende as falhas na secreção gástrica, deficiência de enzimas pancreáticas,
deficiência biliar.
4 – Diagnóstico Diferencial das Enteropatias
 Anamnese
◦ História perinatal, familiar, cirurgias abdominais prévias.
◦ Relação dos sintomas com mudanças do estilo de vida ou estresse
◦ Uso de antibióticos ou outras drogas
◦ História alimentar, apetite, atividade e sono
◦ Manifestações extra-digestivas (cansaço, edema, febre, emagrecimento,
atraso no crescimento)
◦ Número aumentado de evacuações ou volume das fezes, alimentos mal
digeridos, distensão e/ou flatulências, fadiga, perda de peso.
◦ Na maioria dos casos há esteatorréia, mas pode-se apresentar com quadro
de leve distensão, plenitude, meteorismos e flatulência.
 Exame Físico
◦ Distensão abdominal
◦ Baqueteamento digital
◦ Palidez de pele e mucosas
◦ Aftas orais
◦ Eritema nodoso
◦ Espessura da prega cutânea, tônus muscular, cor e textura dos cabelos,
hidratação da pele, expressão facial
 Exames Complementares
São usados para confirmar má digestão e má absorção e, mais importante, ajudam
a identificar a causa. Podem ser divididos quanto a disponibilidade, custos e grau de
invasão. Pacientes com pandisabsorção estabelecida tipicamente têm diversas
anormalidades laboratoriais, ao contrário dos portadores de má absorção isolada que
podem não apresentar qualquer alteração nos exames de rotina.
 Exames Iniciais

242
 Hemograma
 VSH
 Ferro
 Ferritina
 TPA
 Proteinemia
 EPF
 Ph Fecal – abaixo de 5,5 são indicativo de má absorção
 Bioquímica
◦ Triglicérides
◦ Colesterol
◦ Albumina
◦ Eletrólitos Na, K, Cl, BicNA
◦ Ca, P, Mg
◦ Zn
◦ Fe
 Exames Específicos
 Prova da D-xilose
◦ Distinguir causa de má-absorção de origem intestinal daquelas de origem
pancreática.
 Teste de Hidrogênio Expirado
◦ Investigar má absorção dos hidratos de carbono, principalmente lactose,
ou supercrescimento bacteriano no ID.
 Teste de Sobrecarga com dissacarídios (ladose, sacarose)
 Gordura nas Fezes: Sudam, Van de Kamer, esteatócrito
 Alfa-1-antitripsina fecal
◦ Detecção de perda protéica nas fezes
 Dosagem de Eletrólitos no Suor
◦ Verifica o cloro
 Testes Sorológicos
◦ EMA, HIV, VHS, DQ, Igs, etc.
 Teste de Schilling
◦ Verifica a absorção de ácido fólico e vitamina B2
 Testes de Função Pancreática
◦ Teste de provocação de secreção pancreática, teste de bentiromida, teste
de quimotripsina fecal, elastase nas fezes
 Exames de Imagem
 Ultrassonografia de Abdome
 Radiografia Simples
 Estudos radiológicos contrastados com bário
 Colonoscopia
 Biopsia de intestino delgado
 Videolaparoscopia – sendo substituída por laparotomia exploradora

243
 Avaliação Cirúrgica
Eventualmente, esgotados os recursos propedêuticos disponíveis e não se
conseguindo chegar a um diagnóstico etiológico da má absorção, indica-se laparotomia
exploradora. Salienta-se a importância de entendimento prévio entre clínico, cirurgião e
patologista, pois, quase sempre, se trata de afecções tumorais, com ou sem
complicações de urgência.
 Algoritmo Diagnóstico
 Colha anamnese detalhada, incluindo informações sobre uso de medicações,
viagens e alimentos, bebidas ou doces especiais.
 Considere a história familiar
 Observe dicas de má absorção no exame físico
 Exame as fezes em relação a volume, aparência e presença de muco, sangue e
parasitas.
 Colha sangue para rastreamento laboratorial de dicas adicionais
 Se caso exigir prosseguir investigação, siga com os testes específicos.

Manejo e Tratamento

244
Numerosas são as afecções que cursam com síndrome de má absorção intestinal.
O médico necessita de profundo conhecimento da fisiopatologia e da clínica para
diagnosticar corretamente a causa do problema.
O tratamento das doenças que cursam com disabsorção se baseia primeiramente
na identificação do processo.
Em segundo lugar, se há desnutrição calórica/protéica e/ou deficiência de
vitaminas, sais minerais, deve também ser instituído adequado aporte nutricional a fim
de se manter ou restaurar o crescimento normal (reposição entérica ou parenteral).

 Algumas Patologias
 Deficiência de Dissacaridases
 Incapacidade de hidrolisar a lactose em monossacarídeo.
 QC: diarréia osmótica, distensão e cólicas abdominais – permanência da lactose
não digerida com produção anormal de hidrogênio, ácidos lático e acético pela
decomposição bacteriana.
 Diagnóstico: Teste de tolerância a lactose
 Tratamento: Suspender leite e derivados, exceção a iogurtes.
 Doença Céliaca
A Doença Celíaca é causada por uma resposta imunológica inapropriada,
geneticamente determinada, contra uma proteína (GLÚTEN) presente no trigo e a
proteínas similares presentes na cevada, centeio e aveia.
Não deve ser considerada rara em nosso país.
Diagnosticada em qualquer idade
 Fisiopatologia
 Comprometimento do intestino delgado proximal (importante sítio de digestão e
absorção de nutrientes);
 Alterações dos mecanismos específicos de digestão e transporte de nutrientes, de
água e de eletrólitos;
 Redução da área absortiva;
 Consequências: espoliação (privação) de vários nutrientes e aumento de
secreção pelas criptas (desnutrição e diarréia).

245
 Manifestações Clínicas
 Anemia resistente a terapia com ferro por via oral.
 Baixa estatura.
 Infertilidade.
 Osteopenia.
 Lesões bucais.
 Hipoplasia do esmalte dentário.
Diagnóstico
O diagnóstico da Doença Celíaca deve ser baseado em três pilares:
◦ O exame clínico, por meio de anamnese detalhada e exame físico.
◦ Análise histopatológica do intestino delgado e dos marcadores séricos:
(Anticorpo anti-gliadina, anti-endomísio, antitransglutaminase –
determinados no soro de pacientes).
 Tratamento
 Exclusão do trigo, centeio, cevada e aveia (pode ser tolerada em alguns casos).
 Corticóides nas formas intensas da doença por curto período.
 Suplementação vitamínica- ácido Fólico, vitamina B12, cálcio e vitamina D.
 Evitar a lactose na fase inicial do tratamento.
 Tratamento de causa diversas: DM, SIDA, tireoidopatia, infecções intestinais,
pancreatopatias, giardíase, etc.

246
Abdome Agudo
O termo abdômen agudo é amplo e compreende inúmeras situações clínicas.
Alguns autores têm definido abdômen agudo como uma dor na região abdominal, não
traumática, de aparecimento súbito e de intensidade variável associada ou não a outros
sintomas. Geralmente com duração de horas até quatro dias, não ultrapassando sete dias.
Em geral, necessita de intervenção médica imediata, cirúrgica ou não.
Um abdome agudo deve ser suspeito mesmo quando o paciente apresenta queixas
brandas ou atípicas. A história e o exame físico devem sugerir as prováveis etiologias e
orientar na escolha dos exames diagnósticos iniciais. Aliás, como veremos ao longo
deste capítulo, o exame clínico é primordial no diagnóstico dos diversos tipos de
abdome agudo, ao ponto de fazer dos demais exames, em muitos casos, meros
procedimentos complementares
A conduta para o paciente com abdômen agudo deve ser ordenada e completa. O
tratamento adequado de pacientes com dor abdominal aguda necessita de uma decisão
em tempo hábil quanto à necessidade de cirurgia. Esta decisão exige avaliação da
história e do exame físico, exames laboratoriais e exames de imagem. A anamnese e o
exame físico costumam sugerir as prováveis etiologias e orientar a escolha dos exames
diagnósticos iniciais. O médico deve decidir se há exigência de observação em regime
hospitalar, se são necessários exames adicionais ou se já existe indicação cirúrgica
imediata.
Uma grande série de doenças musculares, gastro-intestinais, ginecológicas,
urológicas, vasculares, psicossomáticas, cardíacas, parasitárias, pulmonares e
intoxicações exógenas, dentre outras podem causar dor abdominal e até simular
abdômen agudo.
 Etiologia e Tipos
Em virtude da complexa rede sensorial visceral e parietal dupla que inerva a área
abdominal, a dor não é localizada com tanta exatidão quanto nos membros. Felizmente,
alguns padrões gerais emergem, fornecendo indícios para o diagnóstico. Diferentemente
da dor cutânea, a dor visceral é provocada por distensão, por inflamação ou isquemia,
que estimulam os neurônios dos receptores, ou por envolvimento direto dos nervos
sensoriais (p.ex., infiltração neoplásica).
A irritação direta do peritônio parietal somaticamente inervado (principalmente as
partes superior e anterior) por pus, bile, urina ou secreção gastrintestinal leva à dor
localizada.
O abdome agudo é, portanto, toda condição dolorosa desta parte do organismo,
em geral de início súbito e que requer uma decisão rápida, seja ela clínica ou cirúrgica.
Constitui um dos problemas mais importantes para o médico não só pela frequência
com que ocorre como também pelas dificuldades diagnósticas que pode vir a apresentar.
O conceito de abdome agudo pode ser simplificado como qualquer dor que
acometa o abdome de um indivíduo previamente sadio, durando cerca de 6 horas e
sendo necessário uma intervenção cirúrgica ou clínica.

247
Devido às inúmeras possibilidades etiológicas da dor abdominal não traumática,
são propostas algumas classificações para auxiliar na elaboração dos diagnósticos. As
dores abdominais podem ser classificadas segundo: anatomia, causas abdominais e
extra-abdominais e processo desencadeante.
No entanto, habitualmente os cirurgiões classificam o abdômen agudo segundo a
natureza do processo determinante, em:
 Abdome agudo inflamatório: a dor apresenta uma característica variável,
apresentando uma progressão de acordo com a causa. Geralmente é associada a náuseas,
vômitos, mal-estar geral, febre, sinais de irritação peritoneal (sensibilidade dolorosa à
palpação, abdome contraído ou em tábua, ausência da respiração abdominal, etc). As
principais causas são: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda, doença
inflamatória pélvica, diverticulite aguda.
 Abdome agudo obstrutivo: a dor tende a ser do tipo cólica e o paciente tende
a apresentar um abdome distendido. O que acontece, geralmente, é uma parada de
eliminação de gases e fezes. O paciente pode apresentar ainda náuseas e vômitos. As
principais causas são: aderências (PO), neoplasia de cólon, volvo de sigmóide, bolo de
áscaris, obstrução pilórica, hérnia encarcerada e estrangulada, bridas, corpos estranhos,
cálculo biliar, intussuscepção (entrada de uma alça intestinal dentro da outra). No raio-
X, as alças intestinais apresentam-se dilatadas.
 Abdome agudo perfurativo: é o tipo de abdome agudo que mais causa
peritonite. A dor abdominal é de forte intensidade, fazendo com que apareça o abdome
em tábua. É caracterizado, principalmente, pelo pneumoperitônio e história anterior de
úlcera. As principais causas são: úlcera péptica, câncer gastrointestinal, febre tifóide,
amebíase, divertículos de cólons, perfuração do apêndice, perfuração da vesícula biliar.
 Abdome agudo vascular (isquêmico): dor abdominal intensa relacionada com
história anterior de arteriopatias crônicas, IAM, AVC, claudicação abdominal (dor após
a alimentação). O que acontece é uma eliminação de líquido necrótico causada por
trombose arterial periférica, embolia arterial ou trombose venosa mesentérica. As
principais causas são: trombose da artéria mesentérica, torção do grande omento, torção
do pedículo de cisto ovariano, infarto esplênico.
 Abdome agudo hemorrágico: tende a cursar com dor abdominal intensa,
síndrome hipovolêmica, sinais de irritação peritoneal. As principais causas são: gravidez
ectópica, rotura de aneurisma abdominal, cisto hemorrágico de ovário, rotura de baço,
endometriose, necrose tumoral.
 Abdome agudo ginecológico: referido por alguns autores como sendo uma
modalidade específica da mulher. Contudo, o tema ainda é discutido na literatura tendo
em vista que suas principais causas podem ser, facilmente, enquadradas nas demais
classificações de abdome agudo.
 Abdome Agudo Inflamatório
Abdome agudo inflamatório é caracterizado pela dor abdominal decorrente da
inflamação aguda ou crônica do peritônio causada por agentes diversos (bacterianos,
químicos, físicos), e/ou secundária a uma inflamação prévia de vísceras abdominais
(apendicite, pancreatite, colecistite, enterites). Neste caso, há disseminação e

248
implantação de células inflamatórias no peritônio, caracterizando o quadro. O abdome
agudo inflamatório representa a causa mais frequente de abdome agudo.
 Etiologia
Os principais agentes etiológicos do abdome agudo inflamatório são bactérias
aeróbicas e anaeróbias. Contudo, não há padrão único, mas sim, variável conforme
região, causa, flora hospitalar e centros de cuidados intensivos. De um modo geral, as
bactérias mais comuns no que diz respeito ao órgão acometido são: Esôfago: Gram-
positivas e cândida;
 Estômago: Gram-positivas e cândida;
 Vesícula: enterococos, Gram-negativas, anaeróbios e Clostridium perfringens;
 Intestino delgado: enterobacteriáceas;
 Apêndice: Gram-negativas, E.coli e anaeróbios;
 Cólon e reto: anaeróbios (Bacteroides fragilis, clostridium, cocos anaeróbios) e
enterobacteriáceas;
 Ginecologia: anaeróbios.
As principais causas de abdome agudo inflamatório são: apendicite aguda,
colecistite aguda, pancreatite aguda, doença inflamatória pélvica, diverticulite aguda.
Podemos considerar a apendicite aguda como o protótipo deste tipo de abdome e, sobre
ela, faremos alguns comentários quando necessário.
 Manifestação Clínica
Consiste no quadro clínico menos dramático, quando comparado a outras causas
de abdome agudo. É caracterizado por uma dor branda e contínua, que se torna
intensamente centralizada em uma área bem definida dentro de 1 ou 2 horas. Esta
modalidade de início é mais típica de colecistite aguda e pancreatite aguda.
A dor do abdome aguda inflamatório é caracterizada por:
 Modo de aparecimento e curso: A dor de uma gastroenterite aguda costuma ser
auto-limitada, enquanto, em outras doenças, pode ter caráter progressivo. Considera-se,
como uma regra geral, que para a maioria dos pacientes, as dores abdominais fortes, que
se apresentam em pessoas que antes estavam bem, com duração de até seis horas, são
sugestivas de que o caso exigirá tratamento cirúrgico.
 Localização inicial, mudança de local e irradiação: A dor visceral, como regra,
localiza-se na linha mediana ou em suas imediações, e estará localizada tanto mais para
baixo dessa linha quanto mais distal estiver a lesão no tubo digestivo e em outras
vísceras abdominais.

249
 Na área A da figura 3, correspondente ao epigástrio e imediações, costumam
localizar-se as dores da úlceras gástrica e duodenal, das gastrites agudas, das colecistites
e pancreatites, das obstruções intestinais altas, da apendicite (fase inicial), dos abscessos
subfrênicos, das hepatites agudas e até de afecções supradiafragmáticas, como
pneumonias, angina e infarto do miocárdio.
 Na área B da figura 3, correspondente ao mesogástrio e adjacências,
localizam-se as dores de afecções agudas do intestino delgado (infecções, obstrução,
isquemia, distensão), da apendicite (fase inicial) e da pancreatite aguda.
 Na área C da figura 3, correspondendo ao hipogástrio e zonas limítrofes, e em
todo o baixo ventre, situam-se as dores do intestino grosso (obstrução, isquemia,
distensão, diverticulite, apendicite), de doenças ginecológicas (salpingite, gravidez
ectópica, afecções dos ovários) e urológicas (cistites).
 Quando o peritônio parietal à atingido por um processo inflamatório ou
irritativo agudo, a dor abdominal tende a migrar e localizar-se na região correspondente
à da lesão e ter irradiações mais ou menos características (figura 4).
 Intensidade e tipo: As dores mais intensas costumam ser provocadas pelas
afecções agudas de caráter inflamatório, isquêmico ou obstrutivo. Entretanto, uma
condição estritamente funcional, como o espasmo de uma víscera oca, pode produzir
dor de forte intensidade. A dor “em pontada” ou “em facada” apresenta-se em processos
inflamatórios, que envolvem o peritônio.
 Fatores agravantes e fatores que aliviam: São, principalmente, relacionados a
posições que o doente assume. Pacientes com peritonite movem-se o mínimo possível, e
a deambulação e a trepidação (por exemplo, no automóvel, ao ser transportado ao
hospital) pioram a dor. Nas afecções inflamatórias do retroperitônio, como nas
pancreatites, o paciente tende a fletir o tronco em relação aos membros inferiores ou
pôr-se em posição de cócoras.
 Sinais e sintomas associados: A febre baixa e constante à comum nas condições
inflamatórias. A desorientação e letargia extrema, combinada a uma febre muito alta
(maior que 39ºC), ou a febre oscilante ou com calafrios, significa o choque séptico
eminente. Esta à mais frequente decorrente da peritonite avançada, colangite aguda e
pielonefrite.
Os sinais sistêmicos acompanhantes (taquicardia, taquipnéia, sudorese, choque)
logo suplantam os distúrbios abdominais, e ressaltam a necessidade de reanimação e
laparotomia imediata. Isso pois a sudorese, palidez, bradicardia, hipotensão arterial,
náuseas e vômitos são sinais de que a dor, efetivamente, tem grande intensidade, mesmo
colocando-se à parte os componentes psíquicos que estejam interferindo no quadro
clínico.
Além destes sintomas que sugerem gravidade, outros inespecíficos podem
acompanhar a dor abdominal. Entre eles, destacam-se: anorexia, náusea e vômito,
constipação e diarréia. Estes não possuem valor diagnóstico.
 Diagnóstico
A história e o exame clínico fornecem o diagnóstico em mais de 90% dos casos de
abdome agudo na mulher e em aproximadamente 98% dos casos no homem (os dois
sexos somam cerca de 89% dos casos). Contudo, podemos lançar mão de exames
250
laboratoriais e radiológicos complementares para o diagnóstico de muitas condições
cirúrgicas, para exclusão das etiologias clínicas ordinariamente não tratadas por
operação, e para preparação pré-operatória.
Exames adicionais são aconselháveis apenas se eles tiverem a probabilidade de
alterar ou melhorar significativamente as decisões terapêuticas. No uso mais liberal dos
exames diagnósticos está justificada para os pacientes idosos ou gravemente doentes,
nos quais a história e os achados físicos podem ser menos confiáveis e um diagnóstico
precoce pode ser vital para garantir um resultado bem sucedido.
 Tratamento
Em resumo, o exame clínico (principalmente a palpação do abdome, quando bem
realizada), consiste no procedimento diagnóstico mais fidedigno diante da suspeita de
abdome agudo inflamatório, ao ponto de tornar os demais procedimentos insignificantes
ou, de fato, meros exames “complementares”.
O tratamento do abdome agudo depende, logicamente, da sua causa de base. A
cirurgia, na maioria dos casos, à eleição (daí o sinônimo muito utilizado: abdome agudo
cirúrgico). A confirmação diagnóstica através do exame clínico à suficiente para a
indicação cirúrgica.
 Abdome Aguda Isquêmico (Vascular)
O abdome agudo isquêmico (ou vascular) constitui doença grave, com
mortalidade atingindo 80% na maioria dos estudos. Tal fato se deve ao diagnóstico
quase sempre tardio, e pelo fato de acometer principalmente pacientes idosos, que já
apresentavam várias doenças crônicas por si só graves. Considera-se que, na maioria das
vezes, o diagnóstico só à estabelecido quando o paciente já se apresenta na fase
avançada da doença (caracterizada pela necrose de alças intestinais).
A obstrução aguda das grandes artérias intestinais à considerada uma catástrofe
abdominal, que resulta na morte da maioria das suas vítimas. Considerada uma doença
de idosos por sua forte relação com a aterosclerose e suas consequências cardíacas,
situações essas que acometem mais os senis.
Apesar dos avanços considerados no diagnóstico e conduta clônica e cirúrgica dos
pacientes com isquemia mesentérica aguda, a mortalidade e as complicações tardias
como a síndrome do intestino curto permanecem desalentadoramente elevadas.
 Etiologia
As principais causas de abdome agudo isquêmico são:
 Embolia da artéria mesentérica superior
 Trombose da artéria mesentérica superior
 Trombose da veia mesentérica superior
 Isquemia mesentérica aguda não-oclusiva
 Colite isquêmica
Em se tratando de abdome agudo isquêmico, podemos destacar a isquemia ou
oclusão mesentérica aguda como principal causa e que será a entidade clínica que
servirá como protótipo deste tipo de abdome agudo.
A Isquemia Mesentérica Aguda à uma entidade potencialmente fatal cujo
diagnóstico exige bastante perspicácia por parte do médico assistente. O desafio de

251
detectar o processo isquêmico antes que as alterações irreversíveis se instalem
frequentemente deixa pouco ou nenhum espaço para atrasos e equívocos.
 Fisiopatologia
A fisiopatologia envolve uma lesão isquêmica inicial (o que leva a lesões precoces
na mucosa, tornando-se posteriormente transmurais), perpetuada pelo vasoespasmo
reflexo da circulação mesentérica e completada pela lesão de reperfusão.
Portanto, o mecanismo básico da isquemia intestinal aguda se dá por esta queda
abrupta do fluxo sanguíneo mesentérico por oclusão aguda ou por vasoconstrição
prolongada de vasos mesentéricos.
 Quadro Clínico

De um modo geral, o paciente com abdome agudo isquêmico apresenta,


invariavelmente, dor abdominal intensa, difusa, mal-definida e de instalação rápida
(diferentemente da dor da apendicite aguda). Esta dor apresenta uma desproporção
intensa quando comparada à clínica do paciente. A suspeita diagnóstica é aumentada
quando associamos as seguintes condições: idade (60 ou mais); cardiopatia grave;
arritmia; aterosclerose avançada; abdome distendido e doloroso difusamente.
A depender da fase em que se encontra o paciente, a dor pode se apresentar de
maneira diferente:
 Fase precoce: dor em cólica, espasmódica e relacionada à alimentação. Esta
fase pode ser detectada pela arteriografia.
 Fase tardia: dor intensa, difusa e associação à distensão abdominal e sinais de
choque hipovolêmico e/ou séptico, decorrente da necrose de alças intestinais.
 Abdome Agudo Perfurativo
O abdome agudo perfurativo consiste na condição dolorosa aguda do abdome
secundária a perfurações por processos de natureza traumática, inflamatória ou
neoplásica do trato gastrointestinal ou, então, decorrente da ingestão de corpos
estranhos.
 Etiologia
O abdome agudo perfurativo à considerado uma das causas mais frequentes de
cirurgia abdominal de urgência. Suas principais causas são:
 Úlcera péptica (causa mais comum)
 Neoplasia gastro-intestinal perfurada
 Febre tifóide

252
 Amebíase
 Divertículos do cólon
 Perfuração de vísceras
 Fisiopatologia
De forma resumida, a sua fisiopatologia está relacionada com a perfuração
visceral decorrente de inflamação crônica do trato digestivo, de lesão por corpos
estranhos ou por lesão neoplásica. Esta perfuração causa extravasamento de secreção e,
posteriormente, peritonite química. Em cerca de 12 horas, a peritonite química torna-se
bacteriana, aparecendo sinais de infecção.
 Manifestações Clínicas
A dor tem início súbito, geralmente dramático, já começando de forma intensa e
difusa (embora também possa ser localizada), rapidamente atingindo seu pico. O seu
início súbito diferencia este quadro doloroso do apresentado pelo abdome agudo
inflamatório. Geralmente, a dor exprime um caráter tão alarmante que faz com que o
paciente busque, imediatamente, ajuda médica.
Os pacientes costumam saber, precisamente, a hora exata do início do sintoma. O
problema advém do extravasamento de secreção contida no trato gastrointestinal para a
cavidade peritoneal, o que à traduzido por peritonite.
A dor tipo somática à decorrente da irritação química do peritônio, sendo que,
quanto menor o pH, maior a irritação. Tanto é que, o exame clínico demonstra silêncio
abdominal e rigidez muscular involuntária. A temperatura à normal, e náusea e vômito
podem estar presentes.
 Tratamento
As perfurações viscerais costumam ser divididas em altas (gastroduodenal e
delgado proximal), e baixas (delgado distal e cólon). Para todas elas, de uma forma
geral, o tratamento é cirúrgico
 Abdome Agudo Obstrutivo
O abdome agudo obstrutivo é aquele tipo de condição clínica caracterizada por dor
abdominal decorrente de uma obstrução intestinal, geralmente associada à parada de
eliminação de gases e fezes. O sintoma cardinal no abdome agudo obstrutivo é a cólica
intestinal, demonstrando o esforço das alças para vencer o obstáculo que está impedindo
o trânsito intestinal normal.
 Etiologia
 Causas abdominais:
 Obstrução pilórica
 Hérnia estrangulada
 Bridas
 Áscaris
 Corpos estranhos
 Cálculo biliar
 Volvo
 Intussuscepção
 Causas extra-abdominais:
 Tabes dorsal
253
 Compressão da raiz nervosa
 Fibromialgia
 Manifestações Clínicas
A dor é visceral, localizada em região periumbilical, nas obstruções de delgado, e
hipogástrica, nas obstruções de cólon, intercalada com períodos livres de dor no início
da evolução. Os episódios de vômito surgem após a crise de dor, inicialmente reflexos,
e são progressivos, na tentativa de aliviar a distensão das alças obstruídas. O
peristaltismo está aumentado, exacerbado, e é chamado de peristaltismo de luta.
Este é mais bem caracterizado quando se ausculta o abdome no momento da crise
dolorosa e se manifesta por uma cascata de ruídos. Quanto mais alta for a obstrução,
mais precoces, frequentes e intensos serão os vômitos, menor a distensão abdominal e
mais tardia a parada da eliminação de gases e fezes. Quanto mais baixa a obstrução,
maior a distensão abdominal, mais precoce a parada de eliminação de flatos e fezes, e,
devido ao supercrescimento bacteriano no segmento obstruído, os vômitos, que são
tardios, adquirem aspecto fecalóide.
Febre normalmente não está presente. A desidratação é acentuada pelas perdas
provocadas pelo vômito, sendo pior nas obstruções mais altas.
Com o progredir da doença, ocorre o comprometimento da vascularização do
segmento obstruído, surgindo irritação do peritônio parietal, manifesta por dor somática,
contínua e contratura da parede abdominal, o que geralmente indica sofrimento de alça.
 Abdome Agudo Hemorrágico
O abdome agudo hemorrágico é caracterizado pela dor decorrente da ruptura de
vísceras abdominais. A ruptura espontânea de vísceras parenquimatosas e a ruptura
vascular não são situações comuns, sendo o abdome agudo hemorrágico mais
frequentemente associado ao trauma, pós-operatório e complicações pós-procedimentos
(biópsias hepáticas, por exemplo).
 Etiologia
 Gravidez ectópica rota;
 Ruptura espontânea de vísceras parenquimatosas (baço, fígado, etc.);
 Ruptura vascular espontânea (ruptura de aneurisma de aorta abdominal);
 Cisto ovariano hemorrágico;
 Necrose tumoral;
 Endometriose;
 Pós-operatório.
 Manifestações Clínicas
Nos quadros de abdome agudo hemorrágico, além da dor súbita, chama a atenção
o rápido comprometimento hemodinâmico, com palidez intensa e hipovolemia
acentuada. Apesar da forte dor, não se encontra contratura muscular no hemoperitônio.
Os exames mostram queda progressiva dos níveis hematimétricos.
A ruptura de aneurisma de aorta abdominal acomete geralmente pacientes idosos
do sexo masculino, população na qual a incidência do aneurisma é maior. A
aterosclerose é a causa principal, mas trauma, infecção (sífilis) e arterites são causas
possíveis. A sede mais comum do aneurisma é a aorta abdominal, estando quase todos
abaixo das artérias renais. O risco de ruptura aumenta com o tamanho do aneurisma,
254
sendo baixo nos inferiores a 5 cm (50% dos aneurismas que atingem 6 cm se rompem
em 1 ano).
A apresentação clássica à a dor abdominal difusa, intensa, associada a hipotensão
e massa abdominal pulsátil. Antes da ruptura, o aneurisma passa por um processo de
distensão aguda (dito expansão), o que leva ao estiramento do plexo nervoso
perivascular, gerando dor intensa nos flancos ou no dorso.

VER CAPÍTULO DE ABDOME AGUDO – PASSEI DIRETO


VER APOSTILAS DE ABDOME AGUDO

255
Problemas nas Vias Biliares
 Relembrando anatomia e fisiologia...
A árvore biliar extra-hepática é composta
pela vesícula biliar, ducto cístico, ducto hepático,
resultado da confluência dos ductos hepáticos
direito e esquerdo, e ducto colédoco, formado
pela união do cístico com o hepático. Todos
apresentam origem embriológica comum, o
divertículo hepático.
A vesícula biliar é um órgão piriforme, que
funciona como reservatório de bile, com
aproximadamente 30 ml a 50 ml de capacidade,
que repousa em uma fossa que corresponde ao
plano anatômico que divide os lobos do fígado. A
vesícula é dividida em quatro porções bem
definidas: fundo, corpo, infundíbulo e colo.
O fundo apresenta forma arredondada; é a
parte que geralmente se projeta para além do
fígado, relacionando-se com a parede anterior e o
cólon transverso. Como é a região com menor
irrigação sanguínea, geralmente é o local onde
ocorre a perfuração nos casos de colecistite.
O corpo estende-se do fundo até o
infundíbulo, abrigado pela fossa cística e
recoberto pelo peritônio visceral. O infundíbulo é
a área de transição entre o corpo, largo e o colo,
mais estreito, que desemboca no ducto cístico. No
colo identifica-se uma dilatação sacular, a bolsa
de Hartmann, que geralmente oculta a junção do
colo com o ducto cístico.
O ducto cístico surge no colo da vesícula
biliar, estendendo-se pelo ligamento
hepatoduodenal por 2 cm a 4 cm até unir-se ao
ducto hepático comum, geralmente em um ângulo
agudo, formando assim o ducto colédoco. Seu
lúmen mede em torno de 1-3 mm, mas pode ser
de até 10 mm, neste último caso permitindo que
grandes cálculos penetrem o colédoco.
O ducto hepático comum surge próximo ao hilo hepático, resultado da confluência
do ducto hepático esquerdo, que drena a bile produzida nos segmentos II, III, IV, e o
ducto hepático direito, que drena os segmentos V, VI e VIII. Esta união geralmente é

256
extra-hepática e anterior à bifurcação da veia porta. O ducto hepático comum por uma
distância de 3 cm a 4 cm até a junção com o ducto cístico.
O ducto colédoco (ou ducto biliar comum) estende-se por 8 cm e apresenta
diâmetro médio de 6 mm, podendo sofrer dilatação importante em vigência de
obstrução. Durante seu trajeto, pode ser dividido em quatro segmentos anatômicos:
supraduodenal, retroduodenal, pancreático e intraduodenal.
O segmento supraduodenal tem comprimento de 2,5 cm e cursa na borda livre do
pequeno omento, no ligamento hepatoduodenal, anterior à veia porta e à direita da
artéria hepática própria. O segmento retroduodenal passa posteriormente à primeira
porção do duodeno, anterior à veia cava inferior e lateral à veia porta. O segmento
pancreático estende-se da borda inferior da primeira porção do duodeno até a parede
póstero-medial do duodeno, local onde o ducto penetra a parede da alça.
O ducto biliar comum descreve um ângulo de 90° graus para direita e penetra na
parede do duodeno. O segmento intraduodenal, com comprimento de 2 cm, cursa
obliquamente na parede do duodeno (junto com o ducto pancreático principal). A união
desta porção do colédoco com o ducto pancreático principal pode se dar fora do
duodeno (no pâncreas) ou no interior da parede da alça.
A ampola de Vater é formada pela união do ducto pancreático principal e o
colédoco; apresenta extensão variável, entre 2 mm até 14 mm.
Uma bainha de músculo liso, conhecida como esfíncter de Oddi, envolve a porção
intraduodenal do colédoco e também a ampola de Vater. Estudos manométricos
demonstraram que o esfíncter age de maneira independente da musculatura do duodeno
O triângulo hepatocístico (de Calot) é região anatômica delimitada pelo ducto
hepático comum medialmente, ducto cístico lateralmente e superiormente pela borda
inferior do lobo hepático direito. Em seu interior passa a artéria cística, sendo
fundamental a sua identificação e dissecção para realização de uma colecistectomia
segura.
A vascularização da vesícula biliar se faz através da artéria cística, geralmente
ramo da artéria hepática direita, passando posterior ao ducto cístico até sua bifurcação,
bem próximo à parede do órgão, em ramos anterior e posterior.
A drenagem linfática da porção superior das vias biliares se faz para cadeia
hepática, linfonodos localizados no trajeto da artéria hepática, que se esvaziam nos
linfonodos celíacos; já a porção inferior drena tanto para os linfonodos hepáticos quanto
para os pancreáticos superiores. A vesícula biliar e o ducto cístico drenam para o
linfonodo do ducto cístico (de Mascagni), localizado na junção do ducto cístico com o
hepático comum, sendo importante reparo anatômico para a dissecção durante a
colecistectomia.
As variações anatômicas encontradas nas vias biliares são grandes tanto em
número com em frequência e, por isso, revestidas de enorme importância, já que podem
ser responsáveis por lesões iatrogênicas graves.
Formação da Bile: a bile é uma mistura aquosa isotônica formada por eletrólitos,
proteínas, sais biliares, colesterol, fosfolipídios e bilirrubina.

257
 Colecistite
Colecistite aguda define o desenvolvimento de um processo de inflamação
química da vesícula, que resulta, na imensa maioria das vezes, da obstrução do ducto
cístico por um cálculo (e não de infecção bacteriana).
Geralmente a colecistite aguda se inicia com a implantação de um cálculo no
ducto cístico, que leva a um aumento da pressão intraluminal da vesícula, obstrução
venosa e linfática, edema, isquemia, ulceração da sua parede e, finalmente, infecção
bacteriana secundária. Todo esse processo pode evoluir para perfuração da vesícula,
mais comumente em seu fundo, uma vez que é a porção fisiologicamente menos
perfundida, portanto mais sensível à isquemia.
Nem sempre a obstrução do ducto cístico por cálculo resultará em colecistite, na
maioria das pessoas, ela não acontece, somente alguns “felizardos”.
Atualmente, a teoria mais aceita para a patogênese da colecistite é a de que a
irritação da parede da vesícula pelos cálculos provoque a liberação de uma enzima, a
fosfolipase A2, pelo endotélio da vesícula. A fosfolipase medeia a conversão da lecitina
da bile em lisolecitina, um potente irritante químico, que gerará uma reação inflamatória
na parede vesicular.. A partir daí é que se desencadeia toda a cascata.
Em outras pacientes, que por algum motivo liberem menos fosfolipase (menos
cálculos, endotélio menos “irritável”), poderá se desenvolver a hidropsia de vesícula
(mucocele vesicular), que resulta do acúmulo não inflamatório de líquido em uma
vesícula cuja saída está obstruída por cálculo. Estes pacientes são frequentemente
assintomáticos, não apresentando sinais de inflamação.
A etiologia da colecistite é multifatorial, mas a obstrução do ducto cístico, seja
por cálculo impactado no infundíbulo ou na luz do próprio ducto, ou por edema da
mucosa gerado por estes cálculos, é sem dúvida uma condição fundamental para a
gênese da doença.
Se o cálculo ultrapassar o ducto cístico ou retornar para a vesícula, a cadeia de
eventos se interrompe, e não ocorre colecistite aguda. A bile nas vesículas normais é
estéril, mas as bactérias são um achado comum quando os cálculos estão presentes.
Apesar de a infecção ser um evento secundário, uma complicação, ela acaba
sendo responsável pela seqüelas mais sérias da colecistite aguda: empiema, peruração,
abscesso pericolestático e fistulo enterobiliar.
 Manifestações Clínicas
O paciente típico é uma mulher de meia-idade, sabidamente portadora de cálculos
biliares e que já havia experimentado surtos de cólica biliar.
Uma crise de colecistite aguda começa com dor abdominal, que aumenta
paulatinamente de intensidade, e se localiza, desde o início, debaixo do gradil costal
direito. Entretanto, de forma análoga ao que acontece com a apendicite, a dor da
colecistite aguda pode iniciar-se no epigástrio, e, com o passar das horas, quando o
processo de estende para a superfície peritoneal da vesícula, a dor torna-se localizada
tipicamente no QSD.
A dor da colecistite aguda persiste por mais de 6 horas, e os pacientes podem ficar
esperando que os sintomas desapareçam espontaneamente como costumava acontecer

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antes e os pacientes podem retardar o auxílio medico por vezes em dias. É comum a
referência da dor par a o dorso.
Anorexia, náuseas e vômitos são muito frequentes, mas o vômito raramente é
grave como na pancreatite ou obstrução intestinal. É também comum a presença de
febre baixa a moderada. Febre com calafrios sugere colecistite supurativa ou colangite
associada.
A região subcostal direita está hipersensível à palpação, com defesa muscular e,
ocasionalmente, contratura involuntária local. O exame físico revela o sinal de Murphy
em metade dos pacientes. O sinal de Murphy é onde pede-se ao paciente que inspire
profundamente, e palpa-se a região subcostal direita – se o paciente interromper uma
inspiração profunda quando da palpação, o sinal é positivo, sendo fortemente preditivo
de colecistite aguda.
Só existe massa palpável, correspondente à vesícula distendida e hipersensível,
em 20% dos pacientes – entretanto, este achado é muito importante e confirma a
suspeita diagnóstica.
Cerca de 10% dos pacientes com colecistite aguda apresentam icterícia ligeira.
Exames Complementares e Diagnóstico
Pode ser feito exame laboratoriais (12.000-15.000 leucócitos/mm3; aumento
discreto de bilirrubina, FA e TGO; aumento da amilase sérica), radiografia de abdome,
ultrassonografia (primeiro exame a ser solicitado na suspeita de colecistite aguda, pois é
de fácil realização), cintilografia das vias biliares ( exame mais acurado) e tomografia
computadorizada.
 Tratamento
O tratamento inicial da colecistite é muito parecido com o da pancreatite:
 Internação hospitalar
 hidratação venosa
 analgesia
 dieta zero
 antibioticoterapia parenteral
O tratamento definitivo é cirúrgico, através de colecistectomia. Havia duas opções
quanto à indicação cirúrgica. Alguns preferiam a cirurgia precoce, enquanto outros
adiavam a cirurgia para após algumas semanas de tratamento, na tentativa de “esfriar” o
processo inflamatório.
 Coledocolitíase
Cerca de 90-95% dos casos de coledocolitíase resultam da passagem de um
cálculo formado na vesícula biliar através do ducto cístico (coledocolitíase secundária),
num fenômeno experimentado por cerca de 6-12% dos portadores de colelitíase. No
restante dos casos, ocorre formação de cálculos no próprio colédoco (coledocolitíase
primária), geralmente quando existe dilatação e estase por obstrução crônica, como
estreitamento, estenose ampula, etc.
Os cálculos primários do colédoco resultam da estase e infecção biliar secundária:
são constituídos principalmente por pigmento biliar, devido à desconjugação bacteriana
da bilirrubina.

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O tipo de cálculo ajuda a determinar sua origem: os de colesterol (amarelos) e os
pigmentados pretos são originados na vesícula biliar, enquanto que a maioria dos
pigmentares castanhos se origina nos ductos biliares. A diferenciação entre cálculo
primário e secundário é fundamental para a seleção do tratamento cirúrgico adequado.
 Manifestações Clínicas
O colédoco pode apresentar um ou vários cálculos (até 100!). Em cerca de metade
dos pacientes, estes cálculos passam despercebidos, ou seja, são assintomáticos e
descobertos apenas através de exame complementares. Entretanto, a qualquer momento,
podem provocar sintomas ou complicações.
Os cálculos no colédoco podem determinar obstrução parcial e transitória, e
muitos migram até serem expelidos espontaneamente pela ampola de Vater no duodeno.
Durante tais obstruções passageiras, o paciente pode se queixar de dor do tipo biliar,
idêntica à dor da colelitíase sintomática: dor no quadrante superior direito e/ou
epigastro, contínua, durante menos de 4h, podendo irradiar para a escápula ou dorso.
Esta dor pode ou não vir acompanhada de icterícia, geralmente leve a moderada, além
de colúria e acolia fecal. O prurido não é frequente.
O paciente apresenta surtos transitórios de síndrome colestática e icterícia
flutuante. Este quadro é bastante sugestivo de coledocolitíase e deve ser diferenciado da
icterícia colestática persistente e progressiva, que sugere neoplasia obstruindo vias
biliares.
As complicações podem ser: colangite bacteriana aguda, abscesso hepático
piogênico, pancreatite aguda biliar, cirrose biliar secundária.
 Tratamento
A coledocolitíase deve sempre ser tratada, mesmo se assintomática, pelo risco
existente de complicações potencialmente graves. A conduta é a retirada de todos os
cálculos.
 Colangite
O termo colangite define infecção bacteriana do trato biliar, quase sempre
associada a uma síndrome obstrutiva.
É sabido hoje que as bactérias podem estar presentes no trato biliar, sem que
desenvolva infecção ou sintomas. O que não se sabe é se essas bactérias, na ausência de
sinais e sintomas, podem determinar mudanças patológicas no trato biliar, fígado ou
vesícula.
 Etiologia e Patogênese
O desenvolvimento de colangite necessita de duas condições:
 presença de bactérias no trato biliar
 obstrução biliar parcial ou completa
A origem das bactérias que colonizam o trato biliar é incerta. A teoria mais aceita
é a de que algumas bactérias, vindas do intestino, ganham o sistema porta e alcançam o
trato biliar passando pelo fígado. Quando existe uma lesão, ou mesmo um corpo
estranho no trato biliar, é frequente a contaminação bacteriana. O que se presume é que
a lesão obstrutiva ou o corpo estranho predispõem à colonização e ao crescimento
bacteriano.

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A causa mais comum de colangite é a coledocolitíase, que responde por 60% dos
casos. Assim, a presença de cálculos biliares (sejam primários ou secundários) muitas
vezes é diagnosticada quando da avaliação de um episódio de colangite.

 Manifestações Clínicas
O primeiro a descrevê-la foi Charcot, e por isso seus sintomas cardinais
receberam a denominação de Síndrome de Charcot. Está síndrome é composta por
febre, dor abdominal e icterícia é conhecida como “tríade de Charcot”.
A descrição original faz menção à presença de pus misturado na bile estagnada,
numa importante condição conhecida como colangite supurativa. Reynold descreveu
que, junto com a tríade de Charcot, apresentavam também hipotensão e depressão do
sistema nervoso central. Foi notado também que essa combinação de sintomas ocorria
quando da presença de obstrução completa de um sistema supurado (“pus em alta
pressão”).
A associação da tríade de Charcot com choque e depressão do SNC é conhecida
como pêntade de Reynold, que representa o quadro clínico de uma colangite supurativa
(pus em alta pressão).
A importância da colangite supurativa ou seja, a importância do achado dos
sintomas da pêntade de Reynold vem do fato que esta síndrome é progressiva e fatal,
caso não se realize uma intervenção cirúrgica imediata. A tríade de Charcot, apesar de
aguda, não necessita de cirurgia emergencial.
 Diagnóstico Condição Subjacente
Quando o diagnóstico de colangite aguda é feito, torna-se fundamental a pesquisa
de uma anormalidade do trato biliar. A colangiografia é o teste definitivo e necessário
para que se possa planejar o tratamento, entretanto não deve ser feita até o processo
agudo esteja sob controle. Pacientes com colangite aguda devem ser avaliados por
ultrassonografia.
 Tratamento
Os princípios da terapia da colangite são:
- Controlar o processo séptico (antibioticoterapia)
- Corrigir a condição subjacente (desobstrução biliar)

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