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ensinar_profissionalmente a pratica de Desenvolvimento de Comunidade impée que se te- nha instrumental teorico-metodoldgico que responda as suas exigéncias. Ocor- fe que o Desenvolvimento de Comuni- Jade nao alcangou ainda um amaduro- simento adequado, surgindo, a partir Jai, algumas sérias dificuldades para muitos que tém sob sua responsabilida- Je 0 seu ensino. A preocupacao deste trabalho é atender a estudantes de graduacao, professores 2 também a pessoas interessadas numa niciaeao tedrico-metodolégica que aju- Je a deflagrar uma pratica de Desenvol- yimento de Comunidade voltada, sobre- udo, para os interesses fundamentais Je sua populagdo usuaria. > objetivo de Maria Luiza de Souza nao 3 dar a.titima palavra sobre 0 assunto ‘porta que o tema seja discutide e con- rontado, produzindo novas experién- sias de arnducéo de-gonhecimentos @ nabilidades, ajudando a chegar ao ne- 2essério amadurecimento da pratica do Dosenvelvimento de Comunidade. BN 5240-0 run My 88: RTEZ € ESRORG Maria L. de Souza |MARIA LUIZA DE SOUZA DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE E PARTICIPACAO i | | Desenvolvimento de Comunidade e Participacao eq Registro: 004520 WAL 09 @e 3 puneies? Asm - S >, , PS an KS ee Maria Luiza de Souza Dados Internacionais do Catalogagao na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Sowa, Maia Luiza de Desenvolvimento de comunidads ¢ participa / Maria Luiza de Sousa. ~ 6.ed.— S50 Paulo, Cortez, 1999, Bibl Peat : Desenvolvimento scl Tatts de Comunidade obsins | e Participacao 307.0981 7-177 36180981 Le Desenvolvit social ~ Brasil dade ~ Desenv so ~ Brasil 3. Ps indicos para catalogo sistematico: 6* edi¢cdo Brasil: Desenvolvimento Brasit L mnunitério Servigo Social 361.80981 nidades: Sociologia 307.0981 307 i 2 3 CORTEZ E€ €DITORA DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE E PARTICIPAGAO Nari Luisa sbe Soa Consetio evivurtal, Adgour Alves Siva, Dilset Adoouata Howetth, Eizabetl de Mello Rich, Munlds Vallelt Lamamoto, Nubuco Kameyani, Rial de Carvalho & Regina Gilli Marsiglia Cupar Sod ©. Coerea Revisde, Suely Hastos 1989 hy Maria Fiza she Sonos Dieites pars ests cage A Ana Gertrudes, gue veio dar a minka vide CORTEZ EDITORS, uma nova dimensao Ruts Barra, 387 Tels WL Stet de felicidade. USDGULAUD Sho Baal SP Inmpresso no Brasil mage de 1999 Insvodsio 1 — Desonvolvimenta de comunidage (DC alaidade © importineia 1. BC. proceso presente aos movimentos seca © & politica cecal 2, DE & impiicazoes teSrieo-nerlobuieas 11 — Atusgio comunitiria e procesto de cooperseia social 1. A sooperafo © o desenvolvimento social 2. A agde comunitinia 3. A agso social 4. A orpanizagao de comunidad IH] — Mdenddade € proceso Wistérice Jo DE 1, DE no contexto Internacional 2.0 DE no Brasi 3, Concergaes e tendénsias atvais do DC 1V A comuatdude — Componente conceitual do DC 1. A comuiniade ¢ sev processo his.6rico 2, As controvérsias da reilidde comuritivia ° 3. DC e comunidate © desenvolvimento — Componente conveitual do DC 1, O esenvolvimento ¢ sett processo hst6rico 2. Fnfoaues ¢ concepcées sobre desenvolvimento 3. Desenvolvimento © DE VI— A particpacio — Componente conceitiat do DC 1. A questie ds participasio 2, A panlcipagio comum a tuo ser husene 66 «9 09 n 16 ~ » st 3. Aspectos pedagiaicos do processo de participacio 4 Componentes do processa pedagseica da. parscipacio Vil — Conjuntura sociat — Movimentos social 1, Os movimentos socinis 2A politics social 3. © encontro polities secial/eavimentos soviais Vill — Atribuigdes profissionais no desenvolvimento comunitétio 1, Coniecimento e anilise da conjuntura social 2. Operacionalizagio des priecipios e divetrizes metodoligicos do DC perante as conjunturas especificas ds comunidades 3. Opemcionalizagio de progiamas de pollies soci] levando om oon fas exiginciae de participagio da populaso usr» 4. Opemeionslizagio da pritiea do DC como meio para fortalecer os ns, us 1 10 movimentos sociale ing IX — Questées gerals da operacionalizacio da pritica 127 1. DC ¢ instituieées do setor miiblico 7 2. Os primeinos cantator com a comunidades 13 X — 0 processo metodolégico do DC . 19 5. Processos pedatGuicos © cirettizes de agi 140 2. Opericies metodolgiens do DC 14 Xd — Instrumentos e téenieas usados ne D 195 1, Aglutinagio documental de infermagies 156 2 Docomentagio 169) 3 Abordagem 182 4. Obscrvagio 184 5. Didlogo © entrevista 184 6. Reunia 188 7. Palestra 190 8. Notiia 192 9. Corts circular 193 10, Recursos sudiovisunis 198 11, Pesquisicagio 201 XU — Estruueas de apoio do DC 207 1. Os centros soci 210 2. Associagies de morudlores 3. 26 3. A lileranga comuniicia az Bibliowresia oT Partimos do prinefpio de que a pratica do desenvolvimento de comunidade (DC), patrocinado ou nao por instituigdes do setor pit blico, pode ser trabalhada numa perspectiva de participagio, popular, pois, historicamente, 0 usuario mais direto dessa prética so as camadas populares Ensinar profissionalmente a prética do DC tomando por base luna tal perspectiva impoe que se tenha um instrumental tebrico-meto- dolégico que responda as suas exigéncias. Ocorre que 0 DC nao sleangou ainda amadurecimento adequado, surgindo, a partir dai, algu- as sérias dificuldades para muitos que tém sob sua responsabilidade © seu ensino, Nao hd diivida que alguns trabalhos vém sendo desen- volvidos com sticesso, porgm, nem sempre sao divulgedos em suas elaboragdes tedricas ou enquanto exercicio pritico. Alguns textos valio: sos tém sido publicados, enfccando um ou outro aspecto do DC; mas, em geral, no chegam a abranger toda sua dindmica, seja nos aspectos s6cio-histéricos, scja nos aspectos tedrivo-mctodoldgicos. Em face das dificuldades de biblicgrafia apropriada para o ensino do DC, algumas pastas foram organizadas ¢ deixadas & disposigio dos alunos com diversas textos mimeografados sobre aspectos gerais ¢ sistemtica de agio do DC, inckusive com relates de algamas experi- @acias, Isso surtia efeito, mas revelowse insuliciente, uma vez que muitos alunos preferiam apropriarse dos textos a fim de poderem refletir melhor e 180s em suas milos para consultas demandallas pela 9 pritica. Outro aspecto de insuficiéncia é que 0 tato de alguns textos nem sempre foi desenvolvido em func do DC e, por isso, alguns va- ios ¢ adaptacdes pessiveis deixavain sempre a descoberto elementos de analise necessétios & compreensio da dindmica social do DC. As ava- liagdee semesirais do material didético usado nas aulas, somadas a certo pensar sobre as possibilidades de trabalhar mais profundamente os diversos temas que constituem o ensino da disciplina, terminaram por motivar a elshoragio de alguns textos, Em fungao dessa motivagio pessetnes @ desenvolver alguns trabalhos dc pesquisa em termes do- cumentais © também em pratices de DC que se desenvolvem no coti- diano cas instituicées do setor piblico e também por iniciativa de setores populares, © desenvolvimento dossss trabalhos sedimentou a decisio de tentar tabalhar todos os temas que constituem, 0 programa da disciplina em seus aspectos teéricos ¢ téenico-meiodal6gicos a fim de facilitar as discussdes e orientacdes exigidas pela prética pedagé- ica do ensino do DC. Em cima da deciséo, veio a questio de por que nfo socializar 0 resultado com outros colegas. Af esté, portamo, © texto. A preozupacio ¢ facilitar o ensiro do DC. Possivelmente, ‘outros colegas professores. tém também suas preocupades, suns for- mulagSes. Seria importante podermos intercambiar nosses experiéneias de ensino, Nos iltimos semestres, utilizamos alguns dos capitulos aqui apresentados sob forma proviséria de apostila. A utilizeczo deles tem sido, sobretuco, em termos de anilise e confronto com textos e expe- ridncias de vérios autores que, de uma ou de outra forma, chegam a cabulhar 0 DC; nao se destinam, portanto, # ser consumidos pelos alunos. © presente trabalho ado esti acabado. Importa ser discutida ¢ canfrontado, de modo a poder produzir experiéneia nova de produsio de conhccimentas ¢ habilidades que ajude realmente a chegar ao ne- cessério amadurecimento tedrico-metodolsgico da pratica do DC. Os primeiros capitulos (Io VII) corespondem & fundamentagio leérica para a formacto profissional do DC, Na nossa. experigncia pedagdgica, sio trabalhados um semestre do ensino de graduacio. Os ltimos correspondem 3s exigéncias de insirumentaliz: nico.metodoldgica e sio trabalhados num sogundo semestre letivo de ensino, A preocupayiio desse trabalho € atender a estudantes de gra- duacdo ¢ também a pessoas interessadas numa iniciacio tedrico-meto- doldgica que ajude a deilagrar uma priitien de DC voltads, sobre- tudo, para os interesses fondamentais de sua populego usuécia, Convém ressaliar que aleuns cap‘tlos foram produzidos a partir de estudlas e reflexes correspondentes a trabalhos de pesquisa que conteram com a valiosa contribuigao dos seguinies Grgdos: PréReitoris lo de Pés-Graduagéo © Pesquisa da Universidade Federal de Seraipe (@OSGRAP); Consellio Nacional de Desenvolvimento Cientifico © Tecnolégico (CNPq) ¢ Instituto de Economia e Pesquisa de Sergipe (NEP) ‘A todos estes drgios, queremps deixar registrado o mais sincere agradecimento. u lvimento de comunidade (DC): atualidade e importancia © desenvolvimento de comunidade & um proceso pedagdgica de agéo junto & comunidades, Historicamente, na pritice desse processo, 4s comunidades sempre se identificaram com os espagos de moradia das populacdes pobres. Na origem, as stias caracteristicas e justificati- vas aponiam 0 rural como espago préprio dessa prética; atualmente, a sua domindncia € © urbano, Um © outro, no entanto, séo espagos privilegiados por ela. De forma mais ou menos profunda, as populagdes se identificam com seus espagos de moradia, Essa identidadle, através de elementes comuns ai presentes, produzem condigées propicias aos mais diversos processos socisis, Fire estes, encontram-se as cuja forga ou significagio maior esté no que se produz como organize- gao social da populagéa. Os movimentos sociais urbancs gerelmenté e destacam entre os processos sociais que, ultimamente, de modo continuo, se fazem presentes nos espagos de moradia, coineidindo nuitas vezes com a propria dindmica das ages comunitérias, Consi- dere-se, por outro lado, que a mobilizacao da populagio, com pro- cessos de organizacéo que por vezes x esttuturam a partir dat, poe em estado de alerta as engrenagens asseguradoras da ordem social sentido, nas areas de moradiz, hoje, destecamse também como pracesso social as apes da politica social, que fazem ampliat cada vor mais a acio do Estado sobre os segmentos msjoritérios de popu- Ingo, Em todas estas situagSes, 0 DC, como processo técnico-metode- légico de ago, tem sido chamado a etuar 8 Historicamente, © DC se dirigiu sempre acs segmentos majorité rios da_populagio como usudtios dirctos dos seus processes de ta batho. Esses segmentos ou camadas populares sio basicamente opera rios industriais, trabalhadores em servigos, camponeses e massa mar- ginal. Também se identifica como um process metodoldgice de agio ditigido & comunidade, © que faz com que muitas yezes ele se come um proceso de agao comunitéria A agiio do DC nos espagos de moradia vem se desenvolvendo quer através du inieiativa do setor pttblica, quer através da iniciativa privada, Ela busca seus estimulos iniciais em procesios sociais que podem ser snalisados sob dois Angulos: 8) © dos movimentos soviais ou da identidade da populagio inte 03 problemis coletivos das areas de moradia que impdem organ zaclo e enfrentamento comum. b) © da politica social que, aproendendo a movimentagio da populagdo em suas dreas dle moradia com tensio social ou possiveis es, define mecanismos de controle que etuam cada vez mais diretamente nessas Areas Soh 0 Angulo dos movimentos sociais, as areas de moradia passaram a ser ércas de mobilizago © organizacao popular, & medida que se agugam as_contradig5es sociais, levando a populagio a um pensar ea um agir em comum diante dos problemas de consumo coletivo que enfrenta, Nessas tiltimas décadas, es contradigdes sociais se aguyam a proporeae que se ampliam os mecmismnos da exploracio capitalista. © capital imobilitio, por exemplo, através de uma dive sidede de mecanismos de especulacso, afasta o trabalhador para areas cada vez mais distantes dos seus locais de trabalho; 0 movimento proprio de centralizagéo do capital, enquanto processo de penetragao © exploracio capitalista no meio rural, impde a expulséo do homem do campo, enquanto a superpopulacio ¢ © desemprego ja se acentusm gtavemenie nos ventros urbanos. As diversas formas préprias de explo- ra¢io do capital 1ém grande repercussfio no meio urbano, onde se vem concentrando a grande maioria populacional do pais. B sobretudo ho meio urbano que os espagos de moradia se tornam suscetiveis de gerar movimentos ¢ Iutas, As limitegdes de espaco fisico, no entanio, Viose fazendo cada vex mais presentes nio 96 no urbano, como tam ‘bém no rural. Além dos limites fisicos desse espago, a falta de condi- Ges minimas de infra-estrutura coletiva, como Agua, luz, esgoto, escola, posto médico, transportes, etc. € sentida por todos ¢, como tal, facile 4 mente passivel de gerar movimentos de enfrentamento em busea de solugdo para tais necessidades, Nessa movimentagao popular, alguns agentes externos se aliam © tentam conteibuir para que ela gere orga- nizacio ¢ se estiuture com uma condicao orépria de empliar as condi- es de cidadania da populagio. O DC nesse processo, contribui como provedimento técnico-metodolégico que ajuda na mobilizaggo © orga. nnizeedo popular em seus enfrentamentos © em suas agoes, Sob o angulo da politica social, as dreas de moradie passam a se destacar pelas proprias exigéncias de consumo formuladas pela Industrializago. Bsta gera, por um lado, oxigéncias de modesnizagao dos habitos € costumes em virtude da ampliagao do consumo dos bens industrializados, por outro, exigéncias de preparagito e eperfeigoamento da mio-deohra em seus aspectos iéenieos e diseiplinares, para pos- sivel ineorporagio da populagio pobre a0 meivado de trabalho. © DC ¢ apreciado ¢ requisitado pelas instituigdes do setcr publico como estratégia desta politica global de modemizacao desenvolvimentiste. No Brasil, esta politics se implementa principalmente no final da dé 0 ¢ inicio de 60. No entanto, é sobretudo a partic da décade de 70 €, mais especiticamente, a partir das formulagoes ¢ diretrizes 9 I PND (Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento), que a eas de moradia passam a ser tratadas com maior destaque pela politica social. © DC € considerado um des metas de trabalho de inter- feréncia nessas reas através da politica social, a qual evoca a parti- cipagao popular como condi¢o importante para se chegar ao desen: volvimento global do pats. DE: proceso presente aos movimentos sociais ¢ & politica social © DC ¢ requisitudo como proceso téenico-metodoldgico de agio, taitio pelos moyimentes sociais como pela politica social. Nessa re- quisigio, explicita ou implicitamente, a participacdo social aparece como questo central. A participagio 6 conteiido hasico do DC, seja na implementagio dos programas da politica sccial ou na implemen taeéo de processos originados dos movimentos socials, No entanto, as perspectivas de um e outro sfo antagénicas e isso faz com que a panticipagio social se coloque como uma das questées basicas do DC. Aqui jé se pode perceber tanto @ atualidade do DC como as questées e contradicdes intimeras em que est mergulhado, recuerendo, por conseguinte, estuds apmado de suas agées, conceitos e diretrizes fundamentals, assim como das prdprias estratégias metodolégicas que 15 utiliza, Na questio da participasio, por exemplo, se poderia atentar para as perspectivas diferentes © contreditérias, que, no entanto, rece: bein a mesma denominagio, Quanto 3 importincia do DC, nfo se pode pensicla isenta dessos mecanismos contraditérios, Uma des suas perspectives, no entanto, € definirse como proceso educativo em fungao de organizagao social da populagao comunitétia para enfrentamento dos seus inieresses e preocupagSes e, conseqiientemente, amplicgao das suas condigdes de Cidadania, Tal importancia pode ser visualizada tanto a partir do DC desencadeado através dos programas de politica social como a partir do DC desencadleado pelos processes proprios dos mavimentos socials. Como a participagdo € elemento baisico a varias concepeoes do DC, é necessério considerar a sua diversidade de significagoes, pois nem sempre se direciona numa perspectiva de valotiza¢io e impul sionamento dos interesscs da populagio usudvia No Ambito da politica social em geral, 0 trago mais comum da patticipacio so as operagées cstruturadas em fungio da aceitagio pelos comunitérios de programas previamente estabelecidos. Particfpar. & estimular-se para assttinir a execugto de acdes previamente determi nadas, assim como para assumir um conjunto de valores de moslerni- dade, incorporando-os ao cotidieno das agées coletivas, Nesse sentido, as solicitapOes que se fazem a0 DC refletem essa perspectiva. le deve instrumentalizar tecnicamente agio profissional, de modo que esse lipo de participacio se: d2 0 mais eficazmente possivel. Ora, © maximo da efiedcia esté em lever o povo & ilusdo de que esté participando quando, de feto, se torna cada vex mais submisso e objeto de devisées Weresses © prescupagdes. A nivel dos movimentos sociais, 0 trago comum da participagzo € 0 exercicio coletive di tomada de decisOes © da gestio das aybes definidas © implementadas pele populacio comunitéria, E, também, © exercicio de anticulagio de forgas sociais comuns, dentro ¢ fora da comunidade, Também aqui as solicitagdes feitas 20 DC refletem essa perspectiva, Ele deve estimular a participagio airayés de exercfcios diversos de reflendio ¢ ago relativas aos interesscs ¢ preocupagées da populacdo, assim como em relacdo as suas condigGes reais € potencizis de organizacia social. Decidir ¢ gerir os eneaminhamentos necessérios ao enfrentamente des interesses comuns significa, também, exercicio de ampliagdo das condigées de cidadania e € iss que se espera de © objetivo de DC. estranthas aus seus As dens de moradia hoje, pelas possibilidades de articulacio dos jnteresies comunildrios, se tornam espaso de exereieio de poder social assim como das condigies de cidadanta. Sein diivida esse exerefeio se depara com a problematica das relagSes de trabalho como uma questéo bésica a ser coletivamente enfreniada. As agdes de enfrentamento pedem, portanto, outtas, que devem ser entendidas na dinimica da totelidede social A partir dessa dinémics, se por um lado as aress de moradia se tornam espages propicios as lutes da populagio, por outro, o simples indicio de que tais lutas yao ocorrer passa a ser referencia para a rea- tualizacfio das fungdes de controle do Fstado perante a populacdo. Cada vox mais a politica social do Estado © os mandatéios das politi cas partidarias chegam as éreas de moraclia, O Estado realiza os seus objetivos de controle nessas reas ndo 56 através de agoes detinidas a partic de politica social, mas sobretuda através dos objetivas perso- nalistas dos scus agentes polttices. Muitas vezes a populegio se orga niza_para reivindicar, apenas obedecendo as oriemtagdes de mando de um ou outro politica, sem atentar para a significagdo de sua Forea social A importéncia do DC nas éreas de moradia € reconhecida; exige, contudo, aniilse erftica de toda esta dinfmica, sob pena de suas aodes se diluftem ou se representarem apenas como agdes aparentes, que nao cocam a dingmica fundamental da dea. Diante dos elementos de controle representados pelas ages do Estado © seus agentes politicos, considerase que tais ages stio defi- nidas tendo como referéacia as lutes ow possiveis Iutes da populayao. Nesse sentido, a conjantura conmunitiris deve ser analisada, sobretudo, fo intento de eneonirar o “novo” que 6 indicador da presenca do poro nessas decisGes. As allemativas de agio cducativa existem podem ser, em principio, percebides através de uma andtise de con juntura que aponte néo s5 0 “novo” das agdes desenvolvidas nas areas, bem come as possiveis forgas sociais intemas © externas capazes de serem acionadas para assumir a direyao deste “novo”, Mesmo a partic da politica social, portanto, os interesses da populeydo néo podem deixar de ser analisados com relagio aos fovos de poder externo e interno que a eles se somam. Em suas contracligées, os espagos de moradia podem se tornar espagos de iransformagéo sovial. 1 nesse sentido qus @ DC passa a ser importante clemento de estude e reflexdo em fungaio da prética pedagdgiea que tom a desempenhar. 17 2. DC ¢ implicagdes tedricometodoldgicas © DC vem se identificando historicamente como um proceso ‘enicometadoldgico de acdo comunitéiria, Enquanto tal, também his ‘oricamente demonstra relacio direta com as demandas do contexte sScia-histérico em que se situa. Nesse sentido, ditvcionar sua pritica em Congo dos usuidrios, que sao as camadas populares, requer refle- es ¢ redefinigdes continuas. O contexio social é dinimico ¢, assim, novos condicionamentos vio sendo implicados nos intetesses © preo cupagdes fundamentais de populagdo usudtia. Cidade © campo hoje se inflacionam de problemas, Pot sua vez, 9 concretizayao cada vez. maior da divisio de trabalho fragmenta a relecdo interme a familia entre ss familias, Nisso se dilui também 0 velho conesito de comunidade. A partir do proprio conceito de comunidade, o DC exige reflexio ¢ redefinicéa dos seus velhos conceitos. Pequenas os médios aglome- trades populacionais podem sor ou nfo ume comunidade, podem ter intemamente, interesses opostos que implicam a existéncia de mais de uma comunidade em uma tinica Ares Outre aspecto € a questéo da identidade facilitada pela vivencie em comum. ssa identidade tende hoje a desaparecer ou se apresenta enfraquscida ante os novos condicionamentos da conjuntura social. Hoje, as fungdes da familia e da comunidade se tornam cada vez mais limitadas © vérias das antigas fungSes sio assumidas por institu difercuciadas, Como diz Braverman, a exploragio do trabalho tem @ yer com estes limites: “A medida que es membros da familia, muitos deles agora tra balhando longe do lar, tomam-se catla vez menos aptos a cuiderem uns dos outros em caso de necessidade, © & medida que os vinculos de vizinhanga, comunidad © amizade sao reinterpretados em uma escala mais estreita para exeluir responsabilidades onerosas.. ." (19775 258), Alpuns elementos de identidade desaparecem, mas apavecem ou tras formas, que requerem tratamento diferencialo; dai o DC requerer continuamente ser repensado ¢ redefinido, Niio é sem razao, portanto, que os movimentos soviais ¢ a politica social vem cada vez mais se efetivando nos espagos de moradia requerendo, assim, reflexdo ¢ anilise dequeles que profissionalm fazem 0 DC, 18 Né dindmica sGcio-histérica, destacamse diversas concepgdes de DC, diferenciedas quanto as sues estraiégias metodolégicas e quanto 103 objetivos a serem atingidos, Ora, como 0 DC 6 sobretudo uma prética, & impossivel aciondla objetivamente sem que inicialmente se tenha uma visio desta problemdtica ¢ um jutzo ou concepedo sobre © instrumental a ser utilizado nessa realidde ‘A telagdo cada vez mais estreita que no Brasil se vem dando entre politica social, movimentos sociais e desenvolvimento de co- munidade como instrument técnico-metodolégico de ag2 comunit ia € indicadora da sua imporléncia na atual conjuntura nacional. Desconhecer as injunpdes dessa conjuntura significa reduzit 0 DC a simples arlificio técnico de intervencio, justificador da prépria re- produgio social. A seqiiGncia dos estudos tem em vista desbraver ca- minhos ¢ contibuir para a caminhada da prética profissional do DC. Esse prdtica, como se pode depreender, é importante sobretudo como estratégia técnico-metodoldgica de ago nas reas de moradia, estirm- lando ¢ contribuindo para que a populagdo encontre meios de supe- ragdo das conifnuas injung6es econémicas, poltticas e culturais a que estéo sujeitas, Estas injungées, movidas inclusive por formas ideols- aticas de submissio, restringem as condigdes de existéncia da popula Go, fazendo com que a pauperizagao exescente seja processo autocon- sentido © autojustificado. Apesar desies condicionamentos, 0 pro- cesso de cidadania da populacdo deve crescer ¢ 0 DC deve ser um dos meios de realizagio desse crescimento. 19 CAPITULO II Atuacao comunitaria e processo de | cooperacdao social © DC é uma forma e um proceso de cooperagde social. Sua stualidade e importineia tém, nesse processo, algumas raizes que pre- isam ser compreendidas para que ele seja assumido om sue sigaifi- cago sécio-histérica, assim como em suas relacdzs similares e/ou antagonicas com outros processos de atuacio comunitéria, (© homem sempre buscou a cooperacdo como forma de superar 2s barreiras naturais © 0s problemas criados pela forma de processa- mento do desenvolvimento social. Nao se tem duividas de que essa cooperagio & também buscada, principalmente nos tempos atuais, como forma de alguns grupos usufruirom mais das ages desenvolvidas por outros. Tragtenberg faz referéncia a formas de covperagdo que terminam por responder a necessidades de afirmegio do modo de produgo eapitalista. Da ccoperagio simples chegr-se 3 coopergio da manufatura © & cooperago da indiistria. Sobre a cooperagao om geral, diz ‘Tragtenberg: “A. cooperagio assume formas diferentes segundo as relaydes sociais existentes; cla ¢ uma quando faz. propriedade comum, ovtra, na relagio senhorio ¢ servo e assume formas especificas ne relagao capital ¢ trabalho” (Tragienberg, 1979: 69) A coopercao a que nos referimes na proposta de DC ¢ a coope- ragio de segmentos da poptlagao que tém interesses e preccuparces comune, dada @ mesma posieio que ccupam no prozesso de produgiio das condig6es materiais da existéncia humana ¢ social. Isso nao signi ai fica desconhecer a existéncia de ouires tendéncias que historicamente se fazem presentes no DC, inclusive com certo dominancia. ‘A cooperagao, como um processo social buscado pelo homem em sua origem, abre caminhos para a formulagéo de mecanismos instru- mentais que fazem dela um proceso complexo também utilizado pelo homem para se defender das barreiras sociais criadas pelo proprio homer, A aco comunitéria € uma forma de cooperagio que tem como objeto e objetivo a superacdo das barreires que, a nivel da comuridade, impedem o desenvolvimento do homem enquanto ser coletivo: Ela se revela um instrumental que se carccteriza pola identificagio de pro- biemas, interesses ou preocupacdes de ordem comum, pela organizagéo para pensar em comum as decisdes sobre os mesmos ¢ pelo desem- penho das ages decidides. Fsse instrumental da ago comunitéria tem sido apropriado em fungao de outras formas de atuayo vom: nitétia que, no fundamental, Ihe sa0 distintas: referem-se a cbjetos © objetives que pouco ot nada tém em comum com os interesses © preocupagdes comunitirios. Historicamente, pode se identificar diver sos processos de atuayao comunitéria que utiliza 0 mesmo instrumen- tal de modo que compreender o DC supie compreender suas relagdes & inter-relagdes com esses processes. Fles implicam as diversas ten- neias que buseam sempre « cooperagio como bandeira justifieativa de progresso e desenvolvimento, Entre cs processos de atuagia com nitéria estreitamente ligados ao processe t€enico-metodolgico do DC distinguemese: — ado comunitatia: ago social; — organizacdo de comunidade, Todos esses processes tém come base de agio a comunidade, AL. guns so anteriores, outros surgiram concomitantemente ao DC, mas, apesar das diferengas existentes, o reconhecimenta social desses pro- cecsos se origina em demandas que sie eomuns a todos cles, Além destes, ¢ importante considerar a existéncia de outras formas de cope: racéo pensadas e articuladas socialmente. 1. A cooperagio e © desenvolvimento social Em face das diferenciacées sociais caracterizadas pela divisio social do trabalho ¢ pela apropriagio ov nio-apropriago privada dos 22 ens de produgio e instrumentas de trabalho, nas sociedades capita- listas distinguem-se tipicamente dois grandes grupos: 1, os que garantem suas condigGes de existéncia através da apro- priagao dos bens de produgta e instrumentos de trabalho; 2, og que garantem sua condi¢ao de existéncia através da venda da sue forga de trabalho, As relagdes entre esses grupos se ceracterizam essencialmente pelo conflito, eujo germe esté implicito na acomodagio de que esses relagBes muitas vezes se revestem. A existencia de condigées, problemas e interesses comuns em cada um desses grupos faz com que a verdadeira cooperagio deixe de cer um elemento caracteristica das rolagée entre sogmentos da populegao de condigées, problemas e interesses antagonicos. bom estabelecer, portanto, que, no seie da sociedade, existem grupos cujas iferenciagées sia tipicas e fundameniais. Nesse sentido, uma comu- nidade se deseavolve ndo s6 & proporgo que se descnvolve a capa- cidade eriadora do homem para superar as barreiras da natureza, mas, sobretudo, & medida que tal capacidade criadota € calocada a servico da superagio das barreiras sociais que impedem diversas segmentos da populago de participarem na definigio dos objetives soviais, de controlar @ operacionalizacao destes abjetivos ¢ de usulruir dos bene- icios do progresso social Cada um dos grupos ou classes contém em si uma série de outros grupos multifuncionais ¢ relativamente abertos, integrados por indi- ‘duos com diferentes condigées de reprodugio da existéncia, mas que tém em comum o modo, a forma de obter essa condigiio de reprodu- Gio, que € a venda da forga de trabalho, A. cooperagiio supée objetivos ¢ interesses comuns no que diz respeito Bs condigdes bésivas de existéncia das camadas populares, ow seja, no que diz respeite & préptia realidade do trabalho como meio ce reprodugio da existéncia. A suposta cooperagio existente entre gru- pos de interesses e objetivos diferenciados © antagénicos nao € mais que uma cooperacio artificial e maseerada © desenvolvimento social implica cooperagao, eo desenvolvimen- to comunitério é um dos meios dessa cooperagdo nevesséria. Entre as idélas © préticas de cooperayao surgidus através dos tempos, nao se pode deixar de reconhecer 0 idealismo de Fourier ao imaginar a criegto de falanges tendo come lagos unificadores © amor, 23 « simpatia e a atragdio natural. As falanges de Fourier eram compostas de 24 2 32 grupos, de 7 a9 pessoas cada um, Para cada falange, doveria existir wm falanstério, isto é, uma habitagdo coletiva onde vive lam os setts membros, Ovéra idéia de cooperaglo sto as oficinas nacionais de Louis Blane, a sorem cquipadas e dirlgidas por associagOes nacionais de trabalhadores que elezeriam os dirigentes, regulamentariam & ind tria e providenciariam a distribuigao de Iucros As idéias de cooperacao de Robert Owen tambem merecem des taque. Preocunade com o desenvolvimento social, formulou a teoria de que o homem esté to sujeito ao meio social am que vive que até mesmo seu cardter € detemminado por ele, Para Owen, deve-se propor cionar ao trabalhedor oportunidade de iniciativa industrial ¢ coope- racéo. Suas idias influenciaram = experitneia dos 28 tecelées de Rochdale que, em 1844, organizaram a primeira socledade cooperativa de consumidores Conforme Small (1965: 341), 0 expirito de cooperaydio se expzessa através de senso de comunidade cada vez mais profundo. Ora, se tal acontece, para ser profundo, ele impSe a oxisténcia de interesses & objetives comuns no que diz respetto aos elementos mais fundamen: ‘ais da existéncia humana: os meias de reprodueao fisica e social do homem, Estes so os principais estimulos da cooperagio. Foram cles que levaram a formulacdo de modos de cooperacio representativos das forgas sociais dos grupos que im suzs condigdes de existéneia baseades na venda da forga de ttabaltio, Entre estes modos, destacam- se o sindieato e o partido, elementos que nao podem ser ignordos pelo profissional do DC, O sindicato tem por base a unio e organizaco dos trabalhadores com objetivo de defesa contra o exploragdo do trabalho da crienga, da mulher e do homem. Seguindo Mabbott (1968), os sindieatos surgiram como associa g6es de empregados organizadlos com 0 objetivo de disporem de uma arma na negociacio com os empregadores compardvel A que os em pregadores utilizam: « demis © sindiceto irabalhista é em geral, concebido como forma de associagio da populasdo trabathadora, tendo em seus objetivos uma perspectiva socialista, A sua estrutura orgénica se baseia no principio da representatividade de individuos especialmente eleitos para repre 24 sentar, ordenar e coordenar os interesses apresentados pela populagao abalhedota que tem atividades comuns, Na sua estrutura de repre- sentatividade, 0 sindicato tem em visia o principio da ciregao coletiva, visto que a diteedo individual corresponde a uma coneepgo indivi dualista, que se afaste da eoletividade. O partido 6 outra forma de cooperacio encontrada pela popula. so para a tepresentacio e defesa dos seus interesses. A origom do partido € remota, sendo conhecido jd na polis aienionse, Nos dias atuais, porém, n&o so mais que 0 produto de uma longa evolugio, conforme diz Lipson (1965: 391), acrescontando que, nessa evolugto, # continuidede nao ¢ menos significativa que a transformagio: “Onde quer que uma suficiente diversidads ocorra enire os inte nesses que compoem uma sociedade, eo sistema politico facilite uma ‘opontunidade para combinarem, os homens congregar-se-fio em grupos ‘ais ou menos formais, mais ou menos eoesos (..) a fim de proteger © que estiver sujeito a riscos e estender a influéncia desses grupos a esferas mais amplas.” (Lipson, 1966: 391). Para Lipson, partido nao € 0 mesmo que um grupo de pressio, spesar de ambos se carscterizarem como assoviagSes de individuos com ebjetivos comuns. Um partido tem funges ¢ propésitos diretamente politicos. Se a politica supde opsio, decisfio © acio ante uma dada realidade, © partido & um meio de arregimentegio de forgas sociais no sentido de fazer com que certas decisoes favordveis a determinados grupos sejam tomaias através da interferéneia dos representantes es- colhidos ¢ embasados na forga de tais grupos. Neste sentido, continua Lipson, a substancia do partido & baseada na sociedade e grande parte da sua forma é baseada no Bstado, A organizagao é a esséncia vital do partido, O poderio de organizagio, no entanto, pode fazer com que © partido se torne inerte, por fazer da orgenizapio um fim © © Sindicato ¢ o pertido continuam sendo formas atuiais de coope- rage. Tem havido, no entanto, crescente ago do Estado para cooptar estas organizacdes quando clas tém como substaneia principal as de- mandas dos trabalhadores, As ages de cooptagio fazem com que 0 sistema de relages de alguns grupos inlernos se aglutinem cada vex mais, enquanto outros passam a assumir as demandas do Estado, transformando-se estes organismos num sistema de correlacio de for 88 em contraposigio. Estas foryas podem pesar mais ou menos em 25 fungio dos seus objetivos explicitos, conforme a consciéncia orgeni- zativa da populacdo em cada uma dessas orgunizagées. Como diz Karl Mannheim (1962: 140), “‘consciénela de classe, em si, nao engendra uma classe atuante, constitui apenas 0 solo para 0 crescimento mais facil de atividades semelhantes, 0 solo favaravel ao desenvolvimento de certos movimentos sociais, os quais, eontudo, por si sés, niio garan tem a vitalidade de uma classe” Os partidos ¢ © sindiceto so exemplos de cooperagéio; as sas organizagSes, porém, nfo sio significativas de uma classe ztuante se de fato cles n&o representarem a apo das forgas daqueles que a cons- tituem. Numa realidade concreta, € previso levar em conta que as foreas soviais da classe trabalhadora est@o continuamente sendo atin: gidas por mecanismos contrérios aos seus interesses. Uma diversidade de instituigoes ¢ ideologias stuam precisamente no seatido de desviar e/ou desestabilizar as forgas organizadas, A classe trabalhadora, apesar de quantitativamente numerosa, possui como mecanismo de poder simplesmente a sua organizacao, Contrariamente, aqueles que detem a posse dos bens ¢ instrumentos de produgao conseguem utilizd-la em fungao da apropriac#o também do dom‘nio sobre es homens, sobre a classe trabalhadora, Vérias idéies praticas sdo institucionalizadas nessa diregao. Tomse, portanto, que a cooperagiio, como tendéncia natural daqueles que tem objetivos ¢ interesses comuns, € perpassada por outros tanios interesses que a confundem e levam até a agdes coalrérias aos objetivos da propria classe, Os interesses dos. grupos mais fracos so muitas vezes institucionalmente apropriados, a fim de converté-los no interesse do grupo mais forte. Em relacao ao partido, diz Gramsci (1978: 22) nbora cada partido seja a expressio de um grupo social, ocorre que, em determinadss condigdes, determinados partidos repre sentam um grupo social na medida em que exercem uma fungao de cequilfbrio e de arbitrage entre os interesses do seu grupo ¢ na medida em que buscam fazer com que o desenvolvimento do grupo repre sentado se prozesse com o consentimento e com a ajuda dos grupos aliados ¢ multas vezes dos grupos decididamente inimigos”. Segundo Gramsei, © Principe, de Maquiavel, na sus existéncia moderna, € representado pelo pariido; © partido polfiico é x primeira célula na qual se aglomeram germes da vontade coletiva que tendem a se tornar universais ¢ totais. 26 Além do partido € do sindicato ha outras formas menos estru. turadas, mas também representatives da cooperagio ¢ da forga soci da populagdo trabathadora. © auxilio mituo entre vizinhos € grupos que moram numa mesma drea é um exemplo, A prontiddo do auxilio ‘mito ou a ajuda mitua & mais presente na populagio em época de crise, E esta ajuda mitua gue vai dar lugar & conceituagio da cha- mada aggo comunitétia. E importante ter presente que a forga social da cooperacio provém da conscigncia de classe social que, seguada Florestan Fernandes (1971; 74), como fendmenos apresenta as seguin- tes manifestagées histérico-sociais: _ a) € um grupo multifuncional ¢ relativamente aberto, consti- tuido por individuos que possem 2 mesma capacidade de disposigao de hens e servigos ecandmicos; 5) em conseqiiéncia da qual os seus componentes compartitham interesses soviais paralelos, reputamnse iguals (apesar de todas as dif rengas manifestas que possam existir entre si), € encaram os compo- nnentes de outros grupos da mesma natureza como ‘superiores’ e tinfe- riores’, deles esperando ou exigindo tratamento equivelonte; ©) © gragas & qual he so gaventides idénticas oportunidades de especializac2o ocupacional, de acumulagéo de riqueza, de distribuigao do Scio, de aquisiedo de prestigio, de participacso da cultura © de exerefeio da autoridade; 4) que por sua yez condieionam e variam com o grau de cons citncia dos interesses © ideals comuns, ..”” © reconhecimento da tradigfo e da perspectiva das agées possi yeis de serem desenyolvidas nas comunidades © pelas comunidades faz com que, em um determinado momento hisiérico, estas agbes sejam valorizadas tedrica e praticamente, surgindo dai a acéo comunitéria, a acio social, a organizagio de comunidade, o desenvolvimento de co- munidade, entre outres praticas que tém a comunidade como unidade de ago e& cooperacto, . Estas priticas comunitérias, no entanto, sio limitadas © earecem de articulagaio com outras préticas de cooperacio representativas di forea social da populago comunitéria, para que adquiram om maior peso em termos de significagio social. Dai a importncia de levar em conta © sindicato ¢ o partido e ouiras formas de organizagao que tém por base a cooperacéo social bastada nos elementos comuns de re- produgdo da existéncia de diversos grupos sociais ar 2. A aco comunitéria Hé uma diferenga enire ayZo comunigiria como progesso técnica metodolégico € ago comunitéria como proceso social espontaneo. Como processo espontiineo,/vai se articulando nas comunidades & me- dida que 02 préprics dosafios da naturcza e 08 sociais vio levando 0 homem @ procurar formas adeguadas de reagdo « eles. Encontrar teis formas significa buscar a cooperacio para a realizagio de aces co- muns em tomo dos problemas comuns que afetam a comunidade Historicamente, a agao comunitéria passa a existir como forma de, em connum, 0 hemem fazer frente as intempéries da natureza ec, posteriormente, aos préprios embaies sociais que se vfo instituciona Tizando, de modo a deixar alguns grupos sociais em situagfo de con: fronto ante a exploragao a que sfo submetidos/ Hla é uma pratica de ajuda méitua ¢ cooperagio que se articula e se opera a partir da comu- nidade. Enftenta 0s desafios sociais a que a populazio comunitéria € submetide, mesmo aqueles que visivelmente afetam de modo indi- vidual um ot outro membro da comunidade. A partir desses desatios 6 que determinadas formas de cooperacio comunitétia, tipo mutirao, caixas de ajuda, etc,, vo se estruturando. / 1A acia comunitiria coma processo social espontineo assume no- vyas varidveis & medida que a familia, unidade bésica da comunidade, jd ndo é mais o centro da produgio material necesséria & sua exis- téncia e que surgem novas formas de exploragao da natureza e dos hens. saciais. VEstas novas formas de exploragio se apresentam com maior vigor com a salidificagio do capitalismo, A dindmiea imperia lista desse proceso de producio ultrapassa as fronteiras do Estado necional, deixando claro que 0 capitalismo nao tem fronteiras, Ao contritio, requer relagées csda ver mais abrangentes, capazes de. possibilitarem formas de exploragéo mais eficazes & sua reprodugéo. Uma das formas de expresso da dinamica capitalista silo as relagces de dominacdo e dependéncia existentes entre os patses, As alteragdes ¢ mudangas que yao se dando no capitalismo atin gem as camadas populares com potenctal sempre meis elaborado de exploracio. Os paises da América Latina, com suas caracterfsticas de dependéncia, tém, sobre a maiorie de seu contingente populzcional, os elementos proprics de explorago interna de cada pals, aliados 203 elementos de exploraedo das suas relagoes de dependéncia, Nossa regiio, « situagao de subdesenvalvimento ¢ dependéncia amplia os problemas soviais ¢, ante @ realidade de erescente comple 28 xidade social, situaedes entes comuins de cooperacdo tendem a se di- luis.“ competigao eo conflito assumem o Iygar da cooperagio em situagdes de interesse imediato ¢ essa realidade tende u ser interiori- zeda pela populagao como caracteristiea comus as camadas popula- res/além das de ignordncia incapacidade, também inculeadas. A ideologia dominante inspira ¢ dé condigGes de sustentagio a essa Tidade, que € aparente, A consciéncia popular é afetatla por essa idso- logia, produzindo muitas vezes individuos atuantes que se encarregamn de fazer a veiculagao da ideologia dominante no seio da sua prépria classe social. Nio se pode pensar, portanto, a consciéncin das cama. das populares como consciéncla pura, © tudo isso ¢ significative, por se tratar de situagdes novas a serem enfrentadas pela ago comunité- ria, Diferentes © continuos condicionamentos fazem agora com que © processo de cooperagio, elemento basico, tonhe de enfrentar, a nivel da aparéncia, dificuldades ¢ justilicativas capazes de bloquear o seu surgimento espontineo. O processo de cocperacio e, mais que isso, organizago da populayae, tornarse, no entanto, cada ver mais necessirio para fazer face as batreires ctiadas, que implicem uma situagio de maior exploragae da populacio atingide. E diante desta realidade que a ago comunitéria passe a ser pensada como processo enico-metodolégice de estimular ¢ animar a populagao comunitéria a refletir sua realidade além da aparéncia ¢ a agir sobre ola de acordo com as exigéncias da realidade desvendada. E todo um proceso eri- tivo de reflexc-agfio que deve ser desenvolvido, de moda que # po- pulagio se posicione e aja objetivamente ante sua realidade concreta, A medida que a agio comunitiria se caracierize como ago caja osigem € a cooperaséo, sua prética chama a atengdo de muitas insti- twigdes, Chama a atengio como instrument, como meio e, nesse son- tido, em geral, a cooperagao é trabalhada como realizagao de cbjetivos nem sempre comuns & populagie comuniéria. A ayo comunitéria recebe, assim, um encargo que, além de nao ester emt sua origem, tira uma de suas caracteristicas fundamentais que & a eooperagdo em fun- io de interesses e preocupaghes basicas € comuns & populagdo comu- nitéria: “Ago comunitaria € resultante do esforgo cooperativo de uma comunidade que toma consciéncis de seus préprios problemas € se organiza para resolyé-los por si mesma, descnvolvendo seus préprios recursos € polencialidades, com a colaboragao das entidades existen- tes” (CBCISS, 1967) 29 A agio comunitésia & resultante do esforgo cooperative de uma comunidade, esforgo tanto mais valiose quanto mais consciente, Ele, no entanto, por vezes, precisa da ajuda externa, tendo em vista que a comunidade cada ver mais se torna dependente de um poder cen- tralizado ¢ de condigdes materiais de existéncia que se se desenvolvem sob 0 controle de alguns grupos socials restritos. A comunidade hoje jf nfo assume fungdes sobre as condigdes de satide, educago, seguranga, comunicacio, producio material, ete. como anti- gamente. Se cla néo mais assume, néio pode, conseqiientemente, 36 com seus pidprios esforgos, responsabilizarse pelos problemas exis: tentes nesses setores expressivos da sui realidade mais global, O organi- zax-se para resolvé-los por si mesma significa, pois, articular-se a nivel da sua prépria forya social, Essa fora social se faz presente dentro ¢ fora da comunidade e tem como aliados todes aqueles com- prometidos som os seus interesses fundamentais. Resolver os proble- mas sociais que se expressam ne comunidede significa resolvé-los. a nivel do poder social que a populagto comunitdria vai articulando, ulilizando recursos sociais existentes, institufdos ou ndo através do Estado, sem, contudo, ser cooptada por interesses antagdnicos. A pré tica social decorrente de toda essa dinamica, que Implica pensar agir, resulta no desenvolvimento dos préprics recursos sociais © poten- ciglidades comunitarias entralizem © Outra concepe#o de ago comunitéria chama « atencéo para a organizagéo social da populaso, apontando, principalmente, para a necessidade de, através dessa orgenizagao, atingit maior grau de con- trole sobre 0 processo de trabalho, distribuiglo de bens materiais pro- duzidos © prestagao de servigos: “Proceso mediante © qual distintos grupos se articalam para levar a cabo ages plancjadas por eles, que tem como objetivo nto s6 0 desenvolvimento dos meios € recursos produtives que se encontram a sua disposigdo (ou que o processo pord 2 disposigfo de tais grupos), mas também conseguir um maior grat de controle de seu provesso de trabalho, da distribuicio dos bens materiais produzides, da prestacto de servigos, que, via instituigées governamentais, de direito Thes cabem”” (into, 1980) Implicita ou explicitaments, a agie comunitéria conserva a caracteristica basiea da sta origem, que ¢ a organizagao © cooperagao conscientes para enfrentamento de problemas ¢ objetives comuns Nisto tambént se distingue de outros processos sociais, jazendo-se esses 30 elementos indicadares basicos para umd rejlexao critica sabre as acdes ditas conunitérias, mas que, na verdade, tm como conseqiiéneia a dissimulagao dos problemas reais da populaggo © 0 seu envolvimento em interesses ¢ objetivos que em esséncia so antagonicos. A aco comunitiria no (eria muito a chamar « atencio das insti- tuigdes socials se nto fosse significativa enquanto exercicio de coope- racdo c organizaczo das camadas populares. Af estd a sua importancia © € nesse sentido que ela, como processo técnico-metodoldgico, se es- trutura € atua, Ante a sua significagdo € que algumas formas de exer- citar essa cooperagio sitio contraditoriamente também buscadas para fazer frente aos problemas de funcionamento social, dando-se As mes- mus 0 nome de agio comunitéria, Em fungio desse proceso, que se corna um tanto exterior as exigénclas da populagio, € importante ue se examine outro proceso, 0 de aco social, assim como suas condi- pies sécio-histéricas, 5. A agao social ‘A egiio social te vozes 6 diseutida no sentido de saber « signifi caggo da conduta humana que impulsiona as agGes. Néio € esta, con- tudo, a significago que se procura, Historicamente, a ago social esté ligada as formas de assisténeia que muitas instituigoes assumem em fungao daqueles Individuos que, devido a obstaculas de idade ou enfermidade fisica, mental ow social Gio consoguem usufruir os bens necessfirios 4 existéncia. O social aqui cem um significado especifico. Como “problema social” especificamse as mes solteiras, os destituidos do lar, as familias-problema e os parias. Este social aparente se agudiza e se amplia enormemente com © movimento da acumulagao capitalista. E em fungto da diminuigio das riscos sociais possiveis de serem desencadeados pela populacio envolvida nestes problemas que a aco social se corporifica como um dos elementos bésicas da politica do Estado e tenta atingir em massa esta populagao, Inicialmente, particulares ¢ religiosos tentam assumir a questo social como uma questi de caridade religiosa. A ampliagiio © complexidade dos problemas, no entanto, que afetam continuamente a ordem social, passam a requerer a presenca do Estado, que assume formas de aco j@ existentes e cria outtas tantas. Com © avangar do capitalismo, 0 Estado se moderniza ¢ assume novas fungdes. J4 no se pe em destaque tio-somente sua fungi de St defesa da soberania nacional. A crdem interna agora passa a ser prescupayio bésica, A multiplicagac dos problemas impée presenga do Estado e dos seus instrumentes de coagao junto as camadas pop lares, que se colocam como alvo desses problemas. O Estado, no entanto, aos poticos, aprende que tratar os problemas seciais como problemas de policia ¢ colecar a populaggo stingida contra si mesmo © cle precisa da sua adesao, A agao social e, posieriormente, a politics social séo instrumentos que ele pode utilizar na busca de legitimidade A ago social passa a ser pensaila ¢ elaborada por alguns agentes nao s6 a nivel conceitual, mas também a nivel metodoldgico. Nesse sentido, pode-se considerar alguns dos seus conceitos: " (1) agao consciente, geralmente com bese num planejamento com a qual se pretende influir positivamente num ambiente social” (Smith, 1962). * (...) proceso dinémivo que impulsiona 0. progresso social através de disposicdes legislativas ow de outms natureza, devidemente planejadas ¢ coordenadas, visando alcangar resultados em massa” (CBCISS, 1962: 62). Como se vé, ha uma preocupagio na agio social que é alcangar resultados em massa © atingir o maior mimero posstvel de individuos. AS disposigdes legislativas sto utilizadas, ¢ as agdes em geral sic planejadas e racionais. A ago social é definida pelo Estado ou pelo seu contexto institucional © néo pola populagdo a sec atingide. O obje- tivo da ayo, no gersl, nao ¢ atender a0s objetivos da populagao e, sim, aos objetivos de controle da ordem social Os primeiros embeies da revolugiio industrial capitalista, que culmina com a primeira grande crise mundial, impcem o despertar do Estado para o social. Para uns, o problema social era provenieste da degradagio da personclidade humana c, por iss, 0 mesmo tinha de ser resolvido individualmente, Para outros, 0 problema social desper- tado era proveniente da falta de reformas socisis adequadas, reque- rendo, portanto, ayo do poder piblice. B nesse sentido de reforma que algumas experiéncias privadas de acio junto aos problemas sociais sho posteriormente assumidas pelo Estado. ‘A agao social se coloca na perspectiva daqueles que consideram que 0 problema social deve ser resclvido através de reformas imple mentadas pelo poder piblico, Ela € sobretudo uma politica de ago assumida pelo Estado; no entanto, € mzis quie isso, & também o modo de implementagio desta politica 32 Coma mac de agiv, a ago social esté extreitamente ligada & filosofia do bensestar social dos paises cconomicamente desenvolvidos. Nestes, a aciio social essume uma conotagdo diferente da cono- dada ao deseayelvinento, visto que st dirige a potses industria zados. “Uma parte dos recursos assim criados seria utilizada para financiar servigos sociais para todos ¢ ajuda social aos desfavorecidos (..) €um fardo imposto ao desenvolvimento econdmico” (Dasgupta, 1979: 3) Desenvolvimento aguti é pensaco como insirumento operecicnal das ugdes nevessirias As regides subdesenvolvidas. O desenvolvimento ditige especialmente aos paises ndo-ndustrializados. Deseavelvimento “é um método de mudange, introduzido nas antigas colonias para clevar o padrao de vida de seus povos ao nivel de seus antigos divigentes (. ..). Ago Social c descrvolvimento sic expresses adotadas para indicat ndo apenas dois métedos de mudan- ca: (..) esies métodos dizem respeito a dues cultures mundizis dis fintes: numo, o bemestar & a verdadeira preocupacio; na outra, © desenvolvimento (ornowse © principal motor da vida” (Dasgupta, 1979: 1). A diferenga existente ¢ sutil, uma yez que, s¢ © desenvolvimento se dirige & populagao pobre, também este estado de pobreza seria encontrado nos paises indlustrializados caso se extinguisse 0 Estedo- Providéncia, 0 Estado do bemeestar social. Ambos nfo Ievam em conta as vondigGes estrulurais da pobreza, Com isso, tanto um came outro em camo preocupacad maior a crlagao de condig6es de controle para gerentia da ordem social. Como diz Dasgupta (1979: 17), “os plunejadores foram bem in fencionados; eles tentaram ajudar os desfavorecides. Mas 0 impert smo no passedo fizera a mesma coisa, assumindo como dever @ tarefa de lovar os frutos da civilizagao As culturas pagis, précienti ficas © prérenascentistes. As boas intengSes nem sempre levam « bons resultados” Como métoda, @ questio da agio social ¢ encontrar meios efica de realizagio dos programas definidos fora de populagao a que se desiina, Estes metas, contudo, sao sempre artificiais, fora da popu lacio, por se tratarem de contetides definidos fora dos seus interesses objetivo. Enquanto idéia, a agao social lem a ver também com a organt zagio de comunidade que surge nos Estados Unidos com 0 objetive de realizar 0 bemestar social 35 4. A organizagtio de comunidade A arle ot 0 processo de organizagéo de conunidade surge como aglo emlnentemente urbana, A preocupacdo era a reconstrucao da pe- quena comunidade que se desestrufurara com os novos modas de orga- nizagéo da produgao, Mais especificamente, com a revolugio. urbano- industrial, a familia jé nd desempenba as antigas fungGes de organi- zagao econdmica da ptodugio, de iniciacao profissional dos filhos. Os padres e normas de comportamenta e relacianamento sia desarti- culados. Com a economia urbano-industrial de moldes capitalistas, a po- pulagio se concentra nas cidades @, af, as situngdes de desorganizagio © miséria se tornam cada vez mais evidentes © passivels de reagces contra @ ordem social estabelecida, Nao se levando em conta as causas de desestrutusagio da com nnidade, tentamese encontrar meios de aproximagtes © relacionamento entre as homens: recursos sociais, disposigoes normatives, programas de acéo que desperiem e estimulem a recanstrugaa da comunidade com vistas ac bem-e:tar social, Murray Ross (1964: 14), referindo-se a vétios autores, diz que “todos eles considera as relagées interpessonis e distantes da ci- dade como fatores que contribuem para a incapacidad: do homem encontrar seguranga no mundo ocidental: solidac, ansiedade, depres- i, neuroses S40 generalizadas ¢ atingem profundamente o homem em seu esforco para aleangar dignidade, estabilidade ¢ felicidade”. ‘As colocagoes de Murray Ross acrescentam aos problemas sociais os de cardter psicossocial provenientes da civilizagéo urbsno-indus- trial. Em relaeio_ aos problemas apontados por Murray Ross, ja no inicio do século XX se encontram trabslhos com idéntica preocupagio. Em 1902, hé 0 trabalho de Georg Simmel, A metidpole e a vids mer al, Em 1906, 0 de Robert Park: A cidade: sugestoes para a investiga eGo do comportanento humao no meio, Em 1921, 0 de Max Weber. A cidede. Fm 1938, 0 de Louis Wirth, O urbanisino como moto de Nesses trabalhos, privilegiase # dimensfo ecokigiea, demogrética & Psicocultural. E sio estas dimensées que norteario as formulagées da organizagao de comunidade como processo que se preccupa com a realidade comunitéria de determinada frea geogréfica. Estes formu- 34 aces, em alguns autores, denotam uma ago que se dirige aos pro- blemas de relagdes entre grupos. “Me Millen afitmava que « Organizacao de Comunidade envolve relagdes nos grupos e entre os grupos, a fim de aleangar integragio progressiva na vida comunitéria.” Mais ov menos dentro desta preoeupagio, diz Kennath Pray que © objetivo central da organizagio de comunidad: é “facilitar 0 pro- jgtesso atval de ajustamento soclal das pessoas através do desenvol- viento € uso construtive das relagbes socials... (CBCISS, 1972: 8) ‘AS preocupagdes para com ss formulagdes da organizagio de comunidade, no entento, atingem também outras dimensdes, como & de Dunham, que diz ser a organizagio de comunidade "(...) a arte ou processo de siscitar ¢ mantor ejustamento entre recursos & neces. sidade de bem-estar social, num campo geogritico, ou campo especial de servico” (CBCISS, 1972: 7) Além de dimensio assumida, ainda cm suas pesquisas, Dunham identifica nove categorias diferentes de praticas de organizagio de comunidade: “planejamento de bem-estar social ¢ saiide, operacio de caixas comunitérias (...) administragéo de intercambio de servigos soviais, promagdo de programas cm campos especializados, pesquisa, relagées piblicas, andlis: © promogao da legislaggo e ensino da Orga- nizaggo de Comunidade” (CBCISS. 1972: 11). Como se pode depreender, estas nove formas de pritica de orga nizagéo de comunidade estéo intimamente relacionadas & ago social Murphy coneebia a agio sovial como uma técnica utilizada na prética da organizagio da comunidade, Jé Murray Ross questionava a yeli- dade da imposigao das metas de acto social do profissional sobre a comunidade. O Tato 6 que a orxanizacio de comunidade surge como ago a ser desencadeads junto aos males do processo de industrializa- gio existentes nos pafses ditos desenvolvides. Nas diversas colocagées, fiea patente a preceupagao com o ajuis- tamento social da comunidade, Os determinants desta ago so enter didos na forma positivista dos fatos aparentes movidos por uma con- eopedo humanista em que coloca as intengdes de altruismo ¢ solida riedade como odjetivos a serem alcangados em fungay da solugio dios problemas socialmente criados. Enquanio metodologia de ago, a organizagio de comunidade se aproxima da educacio social, a qual tem sew surgimento ¢ evolucéo com as ctitieas que se fazem & educagio formal como edueagio Ti 35 vresca ¢ separada da prépria realidade social. Desenvolvendo-se a sociabilidade, a solidariedade © a preocupagio para com o benvestar social se estaria atingindo o cerne dos problemas. A partir da Primeiza Guerra Mundial, 0 nos social, jé evidente na descstruturagio da familie, da comunidede ¢ nas necessidades sociais que se ampliam ante a desvalorizagio da forga de trabalho concentracao das riquezas, & assumida coma preocupagio, prineipal- mente por causa dos desafios estimulados pela Revolugio Russa. Com preceupacto, é que muitos trabalhos voluntariamente ditigidos as comunidades passam a ser sistematicamente estruturados e socialmente reconhecidos como respostas necessévias aos gritantes problemas A organiizacio de comunidade tem sua origem nos Estados Unidos com a preocupagdo de reconstrugiio da pequena comunidade nos paises industrializados, J4 0 DC tem sua origem na Europa, parti- cularmente na Inglaterra, a partir de preocupagdes dirigidas as col6- nias africanas. A conjuntura s6cio-histériea, das realidades onde se operam esses processos possui diferences bisicas. Em termos estru= urais, ne entanto, a problemética central € a da exploraedo capitalista que, com suas diferengas conjunturais, se faz presente nas camadas populares, seja nos pafses de capital monopalista, seja nos dependentes. ‘A ago comunitéria © a ago social sdo formas origindtias de aedo nas comunidades. A primeira, de iniciativa da propria comuni- dade. A segunda, de iniciativa publica, dirigida @ essas mesmas co munidades, ‘A acdo comunitéria continua um processo atual e necessério. Em face das transformagées sociais © novas exigéncias conjunturais, os elementos instrumentais de sua prética sio trabalhados em fungao da sistematizagdo de algumas diretrizes téonico-metodoldgicas que ajudem 8 stiperar os novos problemas a serem eafventados. Como tal, a agiio comunitéria se identifica com 0 DC enquanto processo pedagdgico de descobrimento da realidade social objetiva e de agao sobre esta. ‘A ago soviel, em suas disposigées logislativas © diretrizes de gio identifica-se, de um lado, com a poittica social e, de outro, com a perspectiva instrumental do DC, na qual este é buscado como meio de viabilizar a operacianalizacao da politica social. Essa perspectiva, na pritica, alimenta a reprodugio social ‘A organizagao de comunidade se origina nos Estados Unidos ¢ penetra na América Latina desde a déada de 40. As motivagdes dessa regido, no entanto, clevam-se sobretudo em fungio do DC, cuja 36 secteristica 6 ser um processo de trabalho assumido pela iniciative publica, ditigide &s reas subdesenvolvidas © especialmente as dreas rurais, A organizagio de comunidade tem como caracteristice ser um proceso divigido ao meio urbano, as regiGes urbanas industrializadas ©, em geral, assumido pola iniciativa privada, Seja a agio comunitiria, agao social ou organizagao de comuni- dade, a base de acho é a comunidade, Alguns aspectos da dinamica de prépria realidade social sio evidenciados, seja qual for a termino: logia. As demandas socials em fungdo desses processos mostram aspec- tos comuns, assim como diretrizes de ago para responder @ essas demandas. © DC, quer em termos de demandas, quer em termos de respostas, mostra-se historieamente vineulado do forma estreita a todos esses processos. Nesse sentido, compreender @ DC supde compre- ender todas estas formas de acto. 37 CAPITULO Ill Identidade e processo hist6rico do DC © processo de ago comunitiria, como jé considerado, em sua for- mulegio espontfinea apresenta certa engrenagem metodokigica, & a partic do reconhecimento ¢ valorizagio dessa engrenagem que muitos ‘outros processos que tém a comunidade como referencia passam a ser criados e valorizados. ‘A organizes da popalagao comunitéria paca que esta desenvolva determinadss ages € ponto central para tel reconhecimento e valo- tizagio. Na sade publica, par exemplo, o dr. Charles Edward A Winslow, em 1920, considera que cs esforgos organizades da comu nidade sio peca fundamental. Para ele a sate pablica assim se define “Ba cigneia a arte de prevenir a doenga, profongar @ vida € promover a saide © a eficiéncia fisica e mental através dos esforgos organizedos da comunidade" (CBCISS, 1965: 37). Os esforcos da comunidade constituem requisite fundamental para que os bloqueies que impedem as condigSes necessivias de saiide pablica scjem desufiadas e enfrentadas. A educagio de adultos € processo considerado necesssrio no de senyolvimento social ¢ busca os esfergos organizados da comunidade para que tal educsedo se realize Desenvolvimento ce comunidade € ago comunitiria € nesta ago encontra sua origem como proceso que tem por base o enirentamento dos interesses © preocupagées da populagic comunitéria, O reconhe. 38 cimento oficial do DC, no entanto, se fax valorizando sobretudo, ou Sdo-somente, a instrumentalidade possivel de ser detetada nas agdes comunitirias — a mobilizagno da populaeao; a organizacéo em torno de determinada motivacdo: 0 desenvolvimento coletivo de determi nadas agdes sio elementos possiveis de ser detstados como instrumen- talidade metodoldgica da ago comunitérla, Ocorre, no entanto, ave, a0 destacer a instrumentalidade da dindmica dos interesses e pre” cupaeses que Ihe dao sentido, ela passa a ser nada mais que umn con. junto de sttificios usados para consoguir objetives diversos e alheios 403 interesses fundamentals da comunidade, Esfavela-se assim o ver~ dadeiro sentido éa agéo comunitaria, 4 identidade e 0 provesso his- {érico do DC, por este motivo, estio entremeados de uma trajet6ria de eaminhos ¢ discuminhos em diego a uma agio verdadeiramente comunitéria. Nao se pode, no enranio, entender DC atual sem enten- der esta trajetéria que continua presente aos dias aluais da sua pritica 1, DE no contexto internacional © foverno da Ingleterta € 0 primeira a se interessar pelo DC “A expresso desenvolvimento de comunidade foi utilizada pela primeita vez pelo Governo Briténica em 1942 com 0 objetivo de auxi- liar os paises a se prepararem para a Independéneia. A expressio foi assim definida: um movimento destinado a promoyer a melhoria de vida de toda populagao comunitéria com a participssiio ativa ¢, se possivel, por iniciativa da comunidade, mas se esta iniciativa niio surgir espontaneamente, por meio do emprego de téenicas que a fagam. surgir ea estimulem a fim de assegurar sua resposia aliva e entusiasta do niovimento, ..” (CRCISS, 1962:.24) Revela-se na preocupacio do governo britinico para com as suas colénias a manutencAo des relagdes até entia existentes, Estimul hes f independéncia n@o significa romper relaySes, mas mudar as estra- leglas dessas relagdes.-Alids, como diz Octavio Tanni (1971: 93): “Desde a Primeira Guerra Mundial e em especial depois da Se- gunda Guerra Mundiel, as nagdes dependentes entram em perfodo novo de sta histéria. Devido & crise do eapitelismo, 0 surgimenio de nagSes socialistas © os colapsos internes das societlades do tipo colonial, as chamadas nagées ‘subdesenvolvidas’ comecam @ proporse o futur em novos termas" 40 cia capitalista, de dominagio ¢ de lideranga sobre estes pafses que passam a propor a si mesmos um fulure em novos termos, chama a atengéo e preocupa as grandes poténcias. Além disso, 0 sur gimento das nagées sovialistas indica outra direco de lideranga. Esse contexte de preocupagSes condiciona a iniciativa da Inglaterra, assim somo @ erlieay de programas de ajuda externa por parte de outros paises ditos desenvolvidos, O encaminhamento e prestacdo dessa aiuds impée que se pense e formule um processo apropriada e eficaz de libe regio desses recursos. Ante essa demande, os elementos instrumentals da eetio comunitétia sto detetados e passam a compor a concepetto que se formula para essa metodologia necesséria de trabalho que ter mina sendo identificada como DC. © DE passa a compor o quedro de referéncia das estratégias que se buscam para a agiio de um pals sobre outros A educagio comunitéria, como um ramo da educayao social, para alguns agentes, & 0 caminho necessério para que os paises ditos sub- deseavolvidos se estimulem a criar condigdes para um desenvolvi- mento sal. O crescimento econdimico © o progressa tecnoligica/ sto colocadas como objetivos maiores a serem alcangados por esse desenvolvimento, Em fungao desses objetivos os valores e praticas de modernidade devem ser estimulados tomandose como pardmetio 4 realidade dos paises desenvolvidos. ‘A compreensia do processo de reconhecimento oficial do DC supe a compreensio do contexto politico ¢ ideolégico da época, nesse sentido, tem-se a considerar — a chamada guerra fria entre pefses capitalistes c socialistas; — a onda de nacionalisms assumido pelos pafses subdesen- volvidos; — 0s conflitos sociais internos ¢ extemos presenies aos diversos paises subdesenvolvidlos, pondo em questio a ordem social estabelecida; - 08 missiondrios educndores que, nas aldeias ¢ comunidedes, se ocupam dos ensinamentos de oficios a meninas e meninos. Estes ensinamentos demonstram as possibilidades de uma visio amplieda sobre outros grupos; — as idéias humanistas de Gandhi que. em 1937, apresenta um plano de edueagio bésiea a ser operado nas comunidades. 4 A educseio social, de acordo com Gandhi, se processa através de programes variades de educagao de adultos que levem em conta os problemas basicos da existéncia humans, © contexto ideoldgico assegura a perspectiva politica do DC con forme as propostas dos grupos dominantes. Por outro lado, no se pode perder de vista que 0 angulo politico assegurado basela suas determinagées na dinémica estrutural do capital monopolista que tem, entre as suas caracteristicas, as relagées de dependéncia, Os paises subdescnvolvides, aldin dos problemas de estrutura interna, tém a con- siderar como elemento de sue realidad: o fenémeno da dependéncia fem relagio aoe paises desenvolvidos, ow paises de capital monopolista Apés @ Segunda Guerra Mundial, 0 governo americano promove ‘extense programa de assisténcia téenica aos paises pobres e, em espe cial, aos da Ameética Latina. Ante es preocupagdes desenvelvimentisias de &poca, @ ONU se empenhs em contribuir para a sistematizagio divulgeodo de estratdgias estimuladoras de desenvolvimento para esses paises. Tais esttatégias se justificam como medida para solucionar 0 complexo problema de integrar os esforgos da popuilago aos planos tegionais © nacionais de desenvolvimento econémico e social. Enire estas estratégias ou propostas de ajuda esté o DC. J. Handerson, diretora do Bureau de Assuntos Scciais das Nagdes Unidas, na XI Conferéncia Intemacional de Servigo Social que se realizow no Brasil em 1962, falundo sobre as taefas das NagSes Unidas tno campo social, diz “Consticui em curar os males da guerra — cuidar das criangas sem. Jares, dos famintos e incapacitados. . Apés trés anos, contudo, 8 me- dida que a devastagio causada pelo iiltimo conflito mundial comegou a diminuir, as condigdes de pobreza cronica, do analfabetisme ¢ das moléstias, nas éreas menos desenvolvidas do mundo, comecaram a clamar por atengiio geral (...) Em 1948, nosso primeira. representante indiana na Comissio Secial solicitou @ incluso, em nosso programa de trabalho, de um esiudo acera de méiodo da auto-ajuda para elevar 0 padrao de vida nas aldeias rurais, Isso provacou baa reseptividade em todos os patses que, por tradigao, confiam na iniciativa © no minimo de interfer esiatal mas atividades dos seus cidades, em particular na vida eco- 1962: 74) némica e social” (CBCI 42 Diz ainda Jiilia Handerson que, em 1951, a idéin de centros comunitérios egipcios pele primeira vez chamou a atengao da Comissae Social como um instrumento de trabalho social © rural. Na ONU, as diversas propostas de trabalho comunitécio para as dreas subdesenvolvidas sto, 2 partir de 1955, denominadas de- senvolvimento comunitério ¢, segundo Julia Henderson, 0 exemplo indiano de programas comunitérios em ambito nacional faz com que certo mimero de pafses passem a solicitar a assisténcia das Nagdes Unidos nese setor. Na América Latina, as preocupagdes da ONU para com as areas subdesenvolvidas se aliam 2 preocupacdes da OEA e do governo americano, Expandese, assim, © DC no final da década de 50, numa spectiva de modemizagdo dos diversos setores ce vida das popu- ages subdesenvolvidas, Esta expansiio traz coma conseqiiéneia a aber- ura de um mercado de consumo para os produtos industrializados © a modernizacdo da maode-obra para preenicher as exigéncias do mer- cado de trabalho peneteado pelo capital monopolista. Nessa regiio a problematica propria de peretracao do capital monopolista tende a ser projetada coma problema cultural da populagae. © reconhecimento oficial do desenvolvimento comunitétio € umn importante elemento para a sua institucionslizacdo, Nas justificativas © discursos que sfio formulades, a porspectiva ¢ a do reconhseimento © valorizagdo da agdo comunitaria; @ nivel da pritica, no entanto, a tendéncia dominante ¢, to-somente, por em destaque a sua instru: mentelidade desligada da demanda comunitiria, A demande pri- Aileglada € aquela que respond: as exigencias de medernizacio e desenvolvimentisme que algumas nagdes tentam implementar. Apesar da tendéneia dominante assumida pelo DC, algumas préticas retomam # dinimica da acio comunitéria como caracteristica basica desse pro- cesto metodoligico de ago nas comunidades: As contrailigdes préprias da dinamica social levam 0 DC « assumi historieamente algumas diferentes ¢ conflitantes tendéncias. Essas ten déncias se expressam a partir de conjunturas socials determinadas. Daf que compreender a prética do DC supde compreender a conjuntura na qual cla se situa © se desenvolve. Numa tentative de aproxima dessa realidade, se tentard levar em conta, sobretudo, a situscio bra- sileira da origem © evclugio desse processo téenico-metodoligico de ‘wabalho. 43 2. 0 DE no Brasil © trabatho comuniuirio enquanto processe téenico-metodolégico chega ¢0 Brasil na décade de 40. A sua disseminacio enquanto pratica entretanto, somente se inicia do Final da década de 50 para o inicio da década de 60. A organizacao de comunidade antecede 6 DC no Brasil, & um processo de trabalho que so institucionaliza nos Estades Unidos © dota, como condigao de prdtica, a organizacao © estruturagao de grupos ¢ servigos institucionais de bemestar social. Em 1944, a Escola de Servieo Social de So Paulo inaugura, em seu eurrleulo, a disct plina Organizacio de Comunidade que, posteriormente, passa a Int grar o curricule das demais escolas de Serviga Social do pais A preoeupagao para com uma metodologia de trabalho de aleance comunitirio esti ligada & perspectiva de reforma que alguns agentes sociais véem como condigio de soluio para a probleniética social Alguns consideram que, trahalhando 6 individuo, a personalidade, se chegatia a resolver a problemética social, Outros cunsideram que s6 através de politica de reformas sociais se poderia atingir 0 Amago dos problemas sociais. A organizagio de comunidade coloca-ce como mecanismo instrumentalizador dessa politica de reformas. sosiais, O rio liberal-populista ¢ também cooperativiste das décadas de 40 ¢ 50 no Brasil favorece a valorizagio desse processo de trabalho que, hho entanto, de imediato nado chega a ter grande destaque enquanto pratica. Aos poucos, no entanto, a comunidade passa a ser valorizada como unidade bisice d> desenvolvimento ¢, com isso, sobretude aivaves da Lgreja, se implementa uma série de experiéneias isoladas de tabalhos comunitévios A organizagao de comunidade se destaca enquanio pritica através da organizacao de fichérios centrais de obras assistenciais da comu- nidade, destinados a racionalizagio dos servigos sociais a sevem pres- tados & populagao carente, ¢ também através de experiéneias isoladas de mobilizagao comunitiria © organizagio de grupos destinados ao encaminhamento de solugdes pata alguns problemas comunitarios. Estas experiéneias so patrocinadas, sobretudo, por instituigies de inieiativa privada. As escolas de Servigo Social sao responsaveis pela formacio do profissional de DC e silo pioneiras na introdugio ° dissominagio inicial at das idéias © sistemstieas de “ages destinadas aos trabalhos comuni- érios. Outras inicialivas © realizaySes, no entanto, somam-se a essa Perspective. Em 1949, realize-sc no Brasil © Semindrio Interamericano de Riucagao de Adultos e nele algumas experiéncies de trabalhos comu- nitérics sao apreciados e discutidos. A CENER — Campanha Nacional de Educagio de Adultos — assume posteriormente a discussio dessas experiéncias como meio de criar condigdes para sua realizagao no Brasil © DC passa a ser discutide no Brasil, sobretudo a partir de alguns eventos de natureza internacional aqui realizados, como método de trabalho destinado as regiées subdesenvolvidas. Nao st pode orga- nizar a comunidade sem que esta possua os recursos necessirios de desenvolvimento, Este é um argumento que no Brasil sc usa a favor do DC. A questto terminoldgica ¢ alyo de algumas discusses, mas enfim 0 DC aos poucos assume 0 lugar da organizacio de comunidade. A educagio de adultos © a problemética de subdesenvolvimento do meio rural séio duas questdes basieas que buscam no DC uma ‘égin de superagio. E em face, sobretudo, da questdo agriria, que na década de 50 comega a ser elemento de discusso no cenério politica brasileiro, pa dévala de 50, 0 Servigo Social Rural, Este, junto com 10 Norte-Americana de Cooperacao ‘Técnica no Brasil, promove, em julho de 1960, © Seminério Nacional sobre Ciéncias Sociais ¢ Desenvolvimento de Comunidade no Brasil No dusenvolvimento do processo histérico do DC, du brasileiras merecem destaque — a regifo Sul ¢ a Nordeste Na regido Sul destaca-se principalmente 0 Rio Grande do Sul, onde, desde o inicio da década de 50, se realizam inimetos semiindrios, ros qnais 0 DC é tema basico das dliscussdes. A téenica de seminétio emina sendo assunida como Instrumente privilegiado das idéias do DC e também como instrumento deflagrador desse proceso, Essa experiéneia 6 assumida também por alguns outros Estados, tornando-se ica basica das estratégies de hata do DC. Segundo Krug, os semindrios de DC nfo se apresentayam como simples técnica, tinham cumho politico, intencionalidade: “Desde 0 Seminario de 1957 que os Assistentes Sociais dentro € fora da Faculdade de Scrvigo Social vinham tentando fazer propostes s rogides assim o semindrio caracteri 45 de cunho politico. Estas propostas no sé visavam a um trabalho di- reto com a populagaio, mas a uma ago coordenada do governo junto a0 povo. Assim € 0 projeto de Lei n.” 78, de 1957, oriundo da Assembléia Legislativa © assessorada por Assistentes Sociais, que vi sava,a eriagao da Secretaria de Estado dos Nogécios da Satide © Asistencia Social numa linha de coordenacdo, eficiencia ¢ vficécia, O projeto nao foi aprovado, mas em 1959 0 novo,zovernador do Estado, engeaheiro Leonel de Moura Brizola, eria a Secretaria do Trabalho ¢ Habilitagzo com quase as mesmas atribuigdes entio pretendidas pelo projeto de 1957” (Krug, 1982: 30) , S Conyém frisar que no DE o Rio Grande do Su também se des- taca pela preocupacdo em agilizar uma bibliografia basica que con- tribua também para os trabalhos comunitarios no Brasil. Nesse sentido, a PUC de Porto Alegre publica 0 livto de Murray G. Ross, Organizacao da comunidade, ¢ cria em 1962 a revista Selecées de Servico Social, onde também © DC é privilegialo. A par dessa bibliografia, convém frjsar o movimento de economia e humanismo, de Lebret, que influen- cia cs profissionais do DC no Rio Grande do Sul e no Bros Na regido Nordeste, 0 DC esté estreitamente vinculado ao meio rural No contexto brasileiro, no final da década de 50 ¢ inicio de 60, a questio agréria & alva de grandes tens6es e conilites sociais, de mandando, sobretudo, « necessidade urgente de uma reforma agraria de base, O Servico Social Rural, no entanto, atravessa esta questio ¢ assume a problemitice rural como problematica a sor sesolvida pela edlueagao social do homem rural, pela intradugaa de novas tecnologias, pelo desenvolvimento da socialidade entre os grupos que compdem as comunidades rurais. O DC € tomado como metodologia basica de ra balho c algumas experiéncias pioneiras so desenvolvidas em Araruama (Rio de Janeiro), Valinhos (S20 Paulo) ¢ Camocim de Sio Félix (Pernambuco). Estas experiéncies sila tomadas como base para o de- senvolvimento de varias outras, Ante conjuntura dé tensées que se apresenta nas dreas rurals brasileiras, principalmente no Nordeste, e ante 0 espaco politica que 0s poucos a populagio rural val ganhands no cenérig politico ‘a clon, a alengao de algumus instlvigdes se volta para. o rural, em especial, a Igreja. Junto com jovens da Agdo Catdlica, algumas dio- 46 cebem também © apoio de SIA — Servigo de Informagio Rural do Ministérlo da Agricultura, No Rio Grande do Norte, jé antes de 1950, a Tpreja tenta algumas acdes isoladas em funcao do encaminhamento de solugées para a problemética da populacio rural. A ériagio do SAR — Servigo de Asistencia Rural —, em dezembro de 1949, € um marco para o reconhecimento das agdes ai desenvolvidas. A Juventude Caiélica ou Ago Catélica tem papel destacado na criagiio do SAR. Por sua vez, os empreendimentos dirigidos & problemética rural des- pertam © interesse por uma metodologia de trabalho que possibilite lidar com essa problematica, coincidindo com a disseminagao que se faz do DC através de alguns semindrios e congressos. realizados no Brasil Entre outros, realiza-se no Brasil o I Seminério Latino-Americano de Desenvolvimento de Comunidade em 1951. Em 1961, realiza-so 0 Segundo Congresso Brasileiro de Servigo Social, cuja temédtica central 6 “Desenvolvimento Nacional para o Bem-estar Social”, a qual se sub- divide em temas referidos a DC. Em 1962, realizese no Brasil a XI Conferéncia Internacional de Servigo Social, com temética voltada para “Desenvolvimento de Comunidedes Urbanas e Rurais”, Esse clima de seminérios ¢ congressos € meio de difuso para 0 DC que, sta vez, encontra contexto econémico, politico ¢ social favordvel ao seu reconhecimento institucional, Conyém destacar, nessa ambiéneia de dilusdo de idéias, a contribuigao de alguns profissionats, néo s6 na difusfio, mas também nas elaboragdes € sustentacto do processo de DC no Brasil: Helena Iracy Jungueira, Maria Lucia Carvalho da Silva, Hebe Goncalves, Seno Cornely, Matia Virginia Gomes da Silva © No final da décacla de 50, novos elementos passem a determinar © contexto econémico e politica brasileiro, eriando condigdes para que o DC passe a ser pensado também em fungie da problemética urbana, As novas forcas ligadas ao capital monopolista que penetra no pais a partir do govemo de Juscelino Kubitschek, passam 9 te querer dos orgiios publicos uma politica de modernizacao dos valores e atitudes da populacao. de modo @ ampliar o mercado de consumo € instrumentalizar técnica ¢ disciplinarmente © mercado de trabalho disponivel. A comunidade € um meio importante para disseminacao dessa politica, nfo s6 a nivel de mudanca de valores, mas também de atitudes @ serem assumidas pela populagao 47 © DE, em algumas préticas, tenta assumir as demandas da po- pulagio, inserindose ¢ refercando os processos de mobilizagio & articulagao que se desenyolvem com 9 apoio de algumas instituicdes de iniciativa privada, Em outras, no entanto, ele se faz inteiramente submisso is demandas de controle das tensées ¢ conflitos sociais exis tentes ¢/ou passiveis de serem deflagrados Em termes oficiais, nfio se pode deixar de considerat as reco. mendagdes do Conselho Econdmico © Social em relazio & importdineia do trebulho comunitdrio; a politica de articulagao e preparo técnica de profissionais para o DC assumida por alguns programas da OBA; assim como as programagdes do Ponto IV nos Estados Unidos. © DC, no Brasil, assume novas perspectivas a partir de 1964. A desmobilizacdio da massa trabalhedora, dos intelectuais e estudantes & s fragilidade da burguesia nacional fazom com que estes saiam da cena politica, deixendo a Iideranga do cendrio politico nacional s6- bretudo a burguesia associada ao capital internacional, acs teenocrat © aos militares. Rstas mudangas no cendrio politico impdem rede- finigdes para © DC que, nas instituigées do setor piblica, passa a se estruturar como tecnologia executiva da politica social governamental « nivel das comunidades locais de viveneia da classe trabalhadora. Ao profissional do DC cabe, sobretudo, a implantagao de programas pre- determinados, tendo que para tal possuir instrumento metodolégico adequado. Esta exigéneia faz. com que se passe a dar énfase a técnicas de pesquisa, projeto e planejamento. A prética destas técnicas, no entanto, em geral pouco tém a ver com o pritica dos trabelhos co- munitérigs desenvolvides. Entéo, em geral, 0 DC se aproxima mais Ge uma acto de procedimentos burocréticos administeativos em fun da prestagio de alguns servicos sociais 4 comunidades A prdtiea do DC identificese ora com artificios © pesquisas, jetos, programas e planos, ore com a executio de processo buro- de administragio de programas nas areas comunitévias ou li beragio de recursos nessas dreas. Como tal ele € requerido como processo tenico de implementacéo das politicas de governo dinigidas 3s camadas populares, principalmente desempregados, subempregados © 08 empregados cujo poder aquisitivo dos salérios impde depen- déneia dineta dos recursos essistenciais que yao sendo criados pelo Estado para essa populagZoXPor sua ver, os limites dos recursos puiblicos em relagdo & demanda inepdent av profissional a criagdo de antificios de selecto daqueles que procuran os programas, assim como artijicios que assogurem relagées continuas do programa da ins 48 sitaigao com aqueles grapos ndobeneficiados pelos recursos rmateriais @ servigos especificos ojerecidos A politica eeendmica favorecedora do grande capital amplia 0 empobrecimenio dos segmentos majoritéries da populagio, conseqien- femente, os problemas residuais oriundos' dessa politica originam as diretrizes e determinacées da politica social. Assim, sobretudo a partir de 1975, a politica social descobre as areas de moradia como objeto de suas diretrizes de ago e com isso muitos dos seus programas se di: sigem a essas éreas. Aliés, desde 1970, a nivel do setor publice, as comunidades sia postas em evidéncia, através da criacio da Coorde- nagio de Programes de Desenvolvimento de Comunidade (CPDC). A CPDC € criada através da Portaria 114 do Ministério do Interior em 4 de setembro de 1970, Essa coordenacao é criada com 0 intuito de jonalidade dos programas de DC a nivel local, estadual, regional ¢ nacional, assegurar a unidade ¢ Ao longo dos anos que sucedem 1964, apesar do autoritarismo do Estado, ouja ideolegia c praticas se expandem através das instituigées aublicas, n&o faltam Centativas de retomada dos interesses © preo- pardes dos segmentes majoritérios da populagio como objeto de prética, O autoritarismo, contraditoriamente, gesta ages comunitérias, muitas delas estimuladas © apoindas pela Tgreja; gesta também uma série de outros movimentos que igualmente serio apotados por dit verses setores da sociedade civil. Estes movimentos estimulam aquelas priticas de DC que, apesar de pouess ¢ isoladas, nunca deixaram de colocar 0s interesses © preoeupagies da populags em primeiro plano. Se havia pouca criticldade sistemética nessas priticas, havia no entanto compromisso que, de certo.modo, induzia 4 existéncia de ume intuicéo tica em relsefo a elas. ‘Com as preocupagées da pritica voltadas para cs interesses preo- pagdes dos segmentos majoritérios da populacdio, a CPDC-Non atrayés dos agentes protissionais.da regido, tonta refletir a significagto social do, desenvolvimento pretendido com os programas de DC, desvendando-se assim muitos elementos ideolégicos contraditérios. Algumas dessas reflexes si0 trabalhadas também a nivel nacional, tentendose assim encontrar melos de levar os programas de DC a nivel de setor piiblico a responderem de fato aos interesses € preo- cupagées da populagdé usuaria. A CPDC, no entanto, eve uma vida curta, Em 1973, 0 Ministério do Interior extinguit a CPDC e eriow a UPDC (Lnidade de Coordenagia de Programas de Desenvolvimento de Comunidade), vinculada & Coordenagio de Desenvolvimento Geral 49 do referido Ministério. Fssa unidade, no entanto, também teve vida curta, no chegando sequer a ser conhecida pela maioria dos pro- sionais do DC, Em 1,’ de julho de 1975, através do Decreto-lei no 73,922, cria-se mais um programa que tem como referncia as co: munidades. Trata-se do Programa de Centros Sociais Urbanos (CSU). Entre os seus objetivos, colocase 0 da partivipagio dos habitantes das cidades no processo de desenvolvimento. De certo modo,..6 a questi do somatério de esforgas do povo e do governo que se tenta evidenciar, Fica implicita nessa preocupagio uma concepsio de Estado benfeitor, faccdor de Justiga, necessitando para tal do reconhecimento do povo, Como tal, paras implementagao desses programas, a exis géncia € @ de um DC que tenha por base essa mesma concepsio. O programa CSU estimula também, a nivel de Estades ¢ municipios, a erlagdo de projetos locais como meio do poder puidlico fazer-se efe tivamente presente junto as camadas populares. A pauperizagio cresvente da populago © os desafios que ela impoe a ordem social refoream também a presenca do poder pilico entre as camadas populares através de progremas emergenciais. Esses mecanismos tendem a se revestir de processo educative, tendo como bandeira © discurso da participagéio, sendo a comunidade 0 cendrio baisico de todos esses programas, projetos ¢ diretrizes politicas. Busca-se a DC, entio, como instrumento operacional das agdes a serem ai de- senvolvidas, ou das justificativas que se dariam a tais ages. No Ambito dos draos regionais de desenvolvimento, alguns pro- jetos especiais enfatizam também © DC come uma das esiratégias de trabalho, No Nordsste, o Projeto Sertanejo, 0 Pélo Nordeste, 0 Pro- jeto Baixa Renda e outros que, enfatizando a questio da participagio, buscam © DC como meio. Os projetes referidos dio hoje lugar aa chamado Projeto Nordeste, financiudo pelo Banco Mundial e que apre: senta, entre as diretizes de uabalhio, a participagio social. retriz. invoca a questo do DC que, por sua vez, gera discussdes que poem a descoberto uma série de coniradigées. © DC no Projeto Nor deste é ume estraitgia a permear ay definigdes, decisoes ¢ operacio- nalizagio das agdes de desenvolvimento nele previstas, ou simples programas 2 lado de outros tantos de desiaque maior? O que se percebe € que no Projeto Nordeste a perspectiva de DC termina por se definir como um simples segmento de agdes denominadas “Apolo a pequenas comunidades”. Até © Banco do Brasil hoje se langa como agente do desenvol: vimento comunitério através da criagio de FUNDEC em 1983 (Funda 30 do Desenvolvimento de Programas Cooperatives ou Comunitirios de Infra-Estraturas Rurais) “Objetivamente, buscaré 0 FUNDEC criar condigdes para a ex- pansie dos niveis de produgae ¢ emprego para reducao dos fluxos mi gratrios, através das melhorias das condigdes de vida da populaga. Manifestamo-nos, portanto, empenhados no sentido de o Banco do Brusil assumir este nove papel, de agente do desenvolvimento co- tunitério” (Colin, 1985). Néo se pode negar que o cenério politico brasileiro vem sofrendo alteragies que se refletem nos propdsitos de aco do setor publico junto is camadas populares. Os movimentos sociais tm a ver com estas alteragdze, mas, por sua vez, sfio formes de manifestagdo das contradigoes que se geram na dinamica estrutural da soctedade, © atual momento politico brasileiro apresenta algumas condigées, propfcias a certo exercicio de democracia, Exercicio no sentido de parlicipaclo nas decisoes que afetam mais de perto 0 cotidiano das comunidades; no sentido de democratizagio des instituiges, para que se coloquem a servigo dos interesses das camadas populares. ‘Tais condigées podem, 0 entanto, assumir também perspectiva de acomo- aco para as camadas populares. “Por que lutar se @ gente jé con segue as coisas com facilidades?” Esse € 0 depoimento dado por alguns moradores de uma vomunidade que se éesinteressa de ir a uma outra comunidade, receber a sacola de alimentos (programa emer- gencial), vez que na stia if recebe 0 sopao, que vem pronto, sem huma necessidede de destocamento nem de trabalho para o pre paro do alimento. © cenério do atual momento politico brasileiro & muito contra ditério, posto que, se de um lado se abrem perspectivas para movi- mentos de organizacio popular, por outro, retira-se das organizacées que sc formam @ perspectiva de lutas. As assaciagées de moradores, por exemplo, multiplicam-se hoje no Brasil a cada dia, Essas associagSes tm 0 sentido de organizagio social da populugio, exersicio de luta em fungdo de participagdo efetiva em suas condigdes basicas de exis- téncia, A prética da maioria dessas associacées, no entanto, contradiz ral perspectiva, Tal contradicdio passa agora a ser veforgada ante o programa nacional do leite para as criangas, instituido pela Nova Repiiblica, As associagées tornamse meios de distribuigtio ow repasse das medidas assistenciais criadas pelo governo, Jé alguns presidentes de 31 associagdes exigem como ‘condigio de acesso ao kite a filiagio & associagdo. Da mesma forma, muitos sindicatos, principalmente os rurais, ‘se transformaram et instituigio de prestagdo de servigos, ou seja, assiscéncia médica, em Tugar de arregimentagao da fora social do trubathador ¢ exercicio de luta na reivindicagio des seus direitos, Nese sentido 6 que a maioria das associagdes de moradores passa a ser mais um érgio nas méos do Estado do que associaedes represent tivas do. poder popular em funcio do enfrentamento dos. seus resses © preocupayses, A comunidade é 0 cendrio das associagdes dos moradores, assim como da maioria dos movimentos sociais urbanos © de muitos pro- gramus © projetos emenados do setor publico. O DC, como instru mental ténico-metodo¥égico de acto nas comunidades, coloca-se tam- 'bém no momento come alvo de intimeras demandas. Ante as demandas contraditerias que se fazem presentes ao DC, 0 profissional, mais do Que nunea, tem um pepel histérico a realizar Cabe 0 profissional do DE o desencadeamento de um processo pedagdgico que implique © descobrimento da realidade, o desmasca- ramento ideolégico dos discursos, das propostas © das muitas préticas que, longe da participagdo, induzem a populecdio a maior subse vitneia © aceitagio de sua condigae de explorada, O profissional, no entanto, também esté mergulhado em too esse conteste e, por con- seguinte, a stia acfio requer, antes de tudo, a descoberta de si préprio como eidadao, como profissional ¢ como forga social que representa € gue se coloca ot nao com disposiedo de alianga com as camadas populares, Essa ¢ a prépria perspectiva da acdo comunitéria, que tem no DC 6 seu instrumental peclagdgice. Como tal, a ques DC sao os interesses © preoeupagoes da populagio comunitéria, E ela que precisa ser analisada ante as entraves apresentados pela propria conjuntura da sociedade brasileira Ke. 3. Concepeses e tendéncias atuais do DC © movimento hisiérico no qual se faz presente 0 DC vai reve- lando diferentes tendércies © concepgdes que dificultam a apreensio de identigade do DC, se buscada como uma entidade autonoma des- ligada de toda essa dingmica. ssa identidade como realidade autonoma & iluséria 92 Em seu processo histérieo, o DC apresenta algumas tendéncias que se mostram dominantes, Aqui se tentaré analist-las no sentido de que a sua identidade seja de alguma forma apreendida, sem desconte: cimento dlas suas implicagées sécio-histéricas. César Rodrigues. em sew lives Andlisis conceptual del desarrollo de comunidad aponta vinte © Cinco diferentes definiedes conhecidas entre os anos de 1948 e 1961 Os anais da XI Conferéncia Internecional de Servico Social, realizeda no Brasil om agosto de 1962, apresentam uma séric de outras tanias definigoes que continvam se multiplicanéo a cada ano, Entte as de- finigdes conhecidas, pode-se aprender trés diferentes enfoques de prética: — 4 DC cama proceso dirigido de intervencAo externa nas co- munidades em fungéo de um melhor nivel de vida; — 0 DC como process ditigida em fungaa do somatério de esforgos povo/governo; — © DC como proceso pedagdgico de autonomizaciio das ca- ‘madas populares © enfrentamento dos interesses © preocupa- Ses da populagéo comunitéria, 3.1, © desenvolvimento de comunidade como proceso dirigido de intervengao externa A definigio apresentads pelo ICA, em 1956, relrata elementos que so bisicos a diversas. concepgdes que tomam o DC como pro- cesso ditigido de ajuda externa 2 estimulacao e animacéo da populacio para o desenvolvimento préprio da comunidades a que pertence: “O desenvolvimento de comunidade € 0 termo usado para des- erever a téenied que tém adotado muitos governs para ensinar a populagao rural ¢ para fazer mais efetivo o uso das iniciativas locais fe energia, para incrementar a produgfo e alcangar um melhor nivel dle vida” (Rodrigues, 1970; 70). Na década de 50, muitos organismos intemacionai se sentir responsivels pela prestagao de ajuda © asistencia paises “‘subdesenvolvidos”. Em fungio da operacionalizaedo desta au de, a comunidade, om muitos programas, ¢ tomada como nidade bi- sice de trabalho. Ela passa @ ser pensada como base necessdria &s ages requeridas pelos mesmos. A introdugao de novas téenicas, va lores © costumes por vezes, se faz diretriz importante destes programas, 33 Levando em conta tal diretsiz, a cultura do povo passa a ser objeto de muitos estudos © discusses. © respeito & culsura local é um prin- cipio que se conelui como importante, Mas, ao mesmo tempo, também se conch que a cultura tradicional impede a penetracio do progresso. Ante esta realidade concluida, o DC & um precesso técnico de agi irigida gue, partindo do reconhecimento da cultura local, tenta ope- ar mudancas nessa cultura como condicdo facilitadora e necessdria a0 progresso e desenvolvimento. Nas discussées que se fazem sobre 0 context préprio do DC, os problemas estruturais da sociedade nto chegam a ser colocados, ocorrendo o mesmo com o processo de depen- déncia, fenémeno préprio do desenvolvimento monopelista do capital A visio parcial empfrica com a qual a realldade social € tratada abie caminito a todo um conjunto de mecanismos de dominagao. Nesse sentido, s proposta do DC tende contribuir mais a um projeto de dominaciio que a um projete de liberasio das camadas populares, A visio desenvolvimentista que se tenta levar as comunidades privilegia © crescimento esondmico ¢ © progtesso téenico dos quais as camadas poptilares participam como agentes diretos, mas no usufruem dos seus resultados © beneficios. A condigéo de exploragio © subordinagdo a que estas camadas estéo submetidas nao Ihes permitem acesso a es, © desenvolvimento como erescimenio econdmice ¢ questionado jd na década de 50. Os impulsos desenvolvimentistas, contraditoria mente, revelam avancos consideraveis no crescimento do Produto In- terno Bruto (PIB) ¢ no desenvolvimento e uso da tecnologia, sobrettdo em algumas regides do pais, mas, em relagao popullagio majoritiia, os indicadores sio de pauperizacdo continua ¢ ereseente, Tal realidede faz. com que se levante & questo do desenvolvimento social. O desen- volvimento passa a ser pensado nio sé cama ereseimento, mas ten bém como bemastar social para toda a populagio. As condigGes para este bemestar Km, portant, de ser. promovidas. O Estade deve se preocupar em estimular a solugao dos problemas sociais, mas, por outro lado. a populagio deve eolaborar, cooperar com o Estado para gue fais problemas resolvides se constituam meios necessérios ao crescimento € desenvolvimento global do pais. Esse € 0 novo pen sar sobre o desenvolvimento, 0 que vai influenciar também novo pensar schre 0 DC. 5.2, © DC como somatério de esforgos povo/governa A India € 0 primeito pais que tanga oficéalmente um programa nacional de DC (1952), A ONU, jf vollada para as preocupagdes do 34 desenvolvimento social, estuda as experiéneias de DC jé existentes © em 1955 emprega oficialmente, pela primeira vez, a expresstio “de- senvolvimento de comunidade” para designar determinados processes dixigidos de trabalhos comunitérios, Em 1956, apés patrocinar ¢ estudar experiéneia de urabalho dessa natureza, chega a um acordo quanto & sua concepgao para oD “Desenvolvimento de comunidede ¢ proceso através do. qual os esforgos do préprio povo se unem com as autoridades govermamen- tais com o fim de melhorar as condigdes econémicas, soviais € culturais das comunidades, integrar estas comunidades na vida nacional ¢ capaci ticles a contribuir plenamente para o progresso do Pats” (CBCISS, 1962: 25). A definigao apresentada pela ONU aveita internacionslmente. © apoio deste organismo a programes ¢ experiéncias de DC eontribui pare essa aceitagio, Mais uma vez, a comunidade & considerada uni- dade bisica do desenvolvimento © se tem como pressuposto a capa cidade de aperfeicoamento e autodeterminacgo do homem. B mediante essa capacidade que se gera a expectativa de mudanga da comunidade em si, Também, a medida que a populagto comunitéria se une entre si @ a0 Fstado, os caminhos do desenvolvimento. nacional estar assegurados. Av poptlagio comunitéria € dada a incumbéncia de nB0 si desenyolver a sua comunidade, mas também responsebilizarse pelo desenvolvimento de seu pais novos problemas surgiclos no contexto do DC levam a ONU, em 1958, 2 rever a definicfo apresentada em 1956: “Desenvolvimento de comunidade € o proctsso através do qual © préprio povo participa da planejamento e da realizagio de progras mas que se destinam a elevar 0 padre de suas vidas, Isto implica a colaboragdo indispensivel entre os governes © © povo para tomar efi- eazes os esquemas de desenvolvimento visiveis © equilibrados” (CBCISS, 1962: 25) © povo, no novo conceits de DC, 6 chamado @ participer ¢ pla- nejir. F uma nova perspective de pritica que se abre. A participacso € estimulada, no entanto, a nivel da execucio: o desenvolvimento eco- némico continua sendo privilegiado ¢, nesse processo, o homem & meio € objeto. © homem ¢ visto como potencial econémico; quando traba- thado devidamente. toma-se capital humano que impuisionaré o de- senyolvimento da sociedade. 35 A dicada de 60 & considerada pela ONU como a do desenvol- vimento, sendo que @ homem, enquanto recurso ou capital humano, € a condigio basica desse desenvolvimento. Entra aqui 0 DC como um dos mecanismos de acdo sabre 0 potencial do homem, conside- rando sus exisiéneia comunitéria ¢, portanto, agindo @ partir dessa realidad, A sade, u educagio © a habitagéo so condigovs necesséirias para que 0 homem se faca cada vez mais produtivo, Tais preblemé ticas so pensadas @ nivel da realidade econdmica. As demandas de participagio e planejamento entram também nessa mesina _mecd nica, parucipar dentro de condigoes ja predeterminadas, 0 que sige nifica participar executando decisdes tomadas em outras instancias de realidade & em cutra instineia de preocupagdes ¢ interesses. A propria concepgao de DC, implicando somatério de esforcos povo-governo, num contexto em que a correlacio de forgas impoe que governo e Estado, realizem, sobretude, os interesses do grupo do- tninante, sugere exame e questionamentos de tal proposta. A prépria concepcao de Estado e de sociedade esté em jogo. Sem uma elarificasio objetiva de ambos no faz seatido pensat ¢ DC como instrumento técnico-metodoldgico que implique o somatério acima referido ou a participagio e planejamento por parte da populagiio comunitér Consciente ou inconscientemente, levando em conta toda essa ga- ma de implicagdes, observase, no deeorrer do proeesso histérico do DC, um conjunto de concepgdes que © realgam continuamente como meio de autonomizacio ¢ enfrentamento das preocupagdes ¢ interesses da populaydo comunitéria, 3.3. O DC como processo de enfrentamento das preoeupagses © resses da populagio: comunitaria Toms-se como referéncia a delinicéo de Howard W. Beers, um dentee outros que destacam ¢: déncia. Em geval, tals defini ta preocupagio na diregio dessa ten tem como fundamento pressupostos humanistas que, no entanto, se redefinem com as contribuigde cincias soviais no desenvolvimento que vai alcangande. “Desenvolvimento de comunidade € um método, um processo e fim em si mesmo. & um método do ajuda as comunidades locais para fazé-las mais conscientes de suas nevessidades, para apreciar seus Te- cursos em forma mais realista, para organizar-se a si mesmo e a seus recursos em tal forma que satisfacam algumas das necessidades por 36 meio dos projetos de ago ¢ ao mesmo tempo adguirem atitudes, expe Hencias € destreza cooperativas para repetir este processo uma e outra ver por iniciativa propria” (Rodrigues, 1970: 76) © conceito apresentado exige certos esclarecimentos; no entanto, pereebe-se que cla tende a valorizar a Acio Comunitéria e © proceso, de autonomizagao das camadas populares. © DC, tendo sta origem na agio comunitéria, fundamenta-se, principalmente, nos interesscs © preocupayées di populagao comuni tiria, O desenvolvimento social, no entanto, raz implicagées comple- Xas para o trato desses interesses © preocupagdes. Nesse sentido, 0 DC, como processo de estimulagdo & apalo As agdes comunitérias, re- quer certo grau de elaboracdo técnica e ciemiticn. A tentativa de apropriagao institucional do DC em fungio da reprodugéo da ordem social nao sufoca por inteiro a sua identidade de processo de 2 ria, A sua histérie & repleta de ambi lidades e, por conseguinte, também a sua identidade conta com ambigtidades que, no entanto, estao referidas & perspectiva politica propria a sua nutureza soci © DC, instrumental técnico-metodoldgico a servico da populaciio usuiria direta, ov seja, das camadue populares, tem uma perspective politica Tentando esvlarecer um pouco mais essa perspectiva, assim se considera “Desenvolvimento de comunidade é um processo pedagégico de organizagdio social da populagao comunitiria, através do qual esta populacdo consegue ampliar as suas condigdes de consumo individual e coletivo, assim como de controle vobre estas condigées, ariculando: se crescentemente para @ participagao em niveis mais amplos da socie- dade © sobretudo naqueles que dizem respeito & problematica funda mental das camadas populares”, Como proceso pedagégico, © DC supde agées educativas expli- itadas teoricamente com base na prética, assim como prineipios de acio norteadores da prética de acordo com os objetivos a serem atin gidos. Quando se diz que © DC como proceso pedagégico foge aus ditames de um proceso formal de agdes « serem rigidamente obser vadas, tem-se também a preocupacio de nfo se definir 0 DC como processo de ayes espontiineas. fF nesse sentido que © DC pressupde 37 toda uma explicitasio conceitual e metodolégica dos elementos envol- vidos em sua prin © DC supoe a organizagao da populaciio, pois é através desta que se dé a reflexdo © acdo sobre a sua realidade cotidiana, Por sia vez, 0 processo de orgsnizagio da populegio para a descoberta do que fazer © para o desempenhe dos enirentamentos necessttios também um processo de desenvolvimento comunitirio. © que € entdo essa comunidade que se faz objeto da pritica do DC co que & esse desenvolvimento em fungéo do qual essa prética deve ser desenvolvida? Sao questées a setem explicitadas como con- digdo necesséria a uma acio efeliva © critica ante a dinimica da CAPITULO IV A comunidade -Componente conceitual do DC © DC pode ser considerado como um estégio de desenvolvimento no qual se enconira uma comunidade, Como tal, & um pro Mas pode scr tembém instrumento pedagégico de trabalho para esti- mulagao desse desenvolvimento. Numa ou noutra situagao, a comunt- dale € objeto privilegiado des considerages de anilise & avaliagio des condigdes de intervengao © mudanga a serem operadas por ese processo. O que é, entdo, essa comunidade que, auma ou noutra con digo, 6 enfocada de modo privilegiado? Nao € tao simples examinar € asstimir posiggo sobre tal questo, uma ver que, além dos enfoaues diferenciados em que € tratada, hd também a considerar as anilises ¢ discussdes que falam sobre a inenisténcia de sua realidade substantive identificadora da substéncia propria da realidede comunitéria, Em ue pese os seus diferentes e, mesmo, contraditérios enfoques, © tam- bém as suas possiveis imprecisées, é a comunidade clemento béisico no processo metodolégico do DC e como tal precisa ser compreendida. 1. A comunidade e seu processo histérico © sentido histérieo de comunidade guarda relecdo com a con- copeiio grege de cidade. Segundo Kalina © Kovadloff, os gregos do séeulo VII © VI antes ée Cristo, mas também os que viveram em Aienas entre os séculos V e IV antes de Cristo, conceberam a polis cemo uma conninidade, isto é, uma organizago cujes assuntes eram 39 de interesse coletiva. Segundo os referidos autores, é possivel afirmar que: “A polis foi lugar onde © homem chegeva aser cle mesmo, Assim, para os gtegos, multo mais do que o Iugar do trabalho, isto é, da produsdo, a polis foi o ambito de encontio interpessoal, do dislogo © das colebragées. .. Ele pode estar referida tanto & vida comunitit em termos politicos, cullurais © morais como econdmices” (Kalina © Kovadloff, 1978; 30-1) A urbs romana id no tem o sentido da polis groga, uma ver que a0s poucos os eidadéos comevaram a perder sua identidade concreta, que € substituida pela identidede juridica, © cidadao j4 nfo conhece 5 seus prdprios concidadios, nem a sua propria cidade. A urbs roma nna, no entanto, perde sua importineia com a queda de Roma, para reaparecer em seguida, a partir do século XI. “Aproximadamente no sécule XI, a tirbs renasce, efrundada por uma muralha, cuja fung%o era antes conter as agressées dos invasores. Uma ver consolidada a protegdio contra as IncursGes © as imposigyes forineas, os amtesiios, camponeses ¢ pescadores locals, donos de pri- vilégics arreeadados a0 venhor fevdal, reuniam-so numa foira semanal ou quinzenal, ¢ acabaram por se instalar de maneira permanente mam lugar que possuia incontéveis vantagens para rele se viver” (Kalina © Kovadloff, 1978: 36). A cidade medieval ¢ 0 nova cardter que adquite a partir do ve nascimento do coméreio passa a scr 0 lugar da transagio, do inter cambio € do edleulo, Tanto a urbs romana como a cidade medieval perderam o sentido de identidade e valorizagao social do homen existente na polis grega A identicade, 0 sentimenta de nés, 0 interesse coletive 48m vealce na polis grege © se identifica com algumas concepgdes de comunidattes gue aparecem no século XX. Por outto lado, 0 niimero limitado de habitantes, os mites de espazo Fisica da urbs romana e da cidade me ieval yao enfatizar © enfoque espaciel dado por outras concepgees. © rural s6 mais recentemente passou a sor elemento de iden- tidade para algumas consepydes de comunidade. A distancia e disper- sio resultantes das préprias cargcteristicas da economia rural n&o enconiravam os possiveis elementos de aproximagiio, encontro de rela: gdes © interesses comuns existentes nes cidadles antigas ¢ medicvais. Contraditoriamente, 0 desenvolvimento das cidades e, sobretudo, as chamedas metrépoles diluiram @ antiga concepgio de cidade. As con- 60 cepgées de comunidade que tomam como referéncia os limites de pago fisieo ¢ as possibilidades de relagd desde as suas formulagoes, passives de questionamentos. ©. surgimen: to das metudpoles e o desenvolvimento do meio rural a nivel de iden- s popul determinado es- page Tisice fizcram com que o reales da identidade comunitéria Fosse irazida para o meio rurel ice a face silo, nesse sentilo, tifieagio possivel de com: No séoulo atual, onde a questiio da comunidade vem a emergir, os préprios condicicnamentos sécio-histérieos de cada soctedade, om particular, yao alterando 0 contexto urbano € rural e tormando can: plexa uma dejinicdo objetiva de comunidade, £ sobretudo a partit da revoluego urbano-Industrlal que © fend- meno comunidade vem & baila, A desiniegracio nas relagdes sociais tradicionais dos aglomerados humanos das reas urbanas faz despertar a questo da comunidade, As relagdes sociais capitalistas que permeiam © conduzem a revolugae urbanoindustrial desestruturam as antigas relagdes assim como as antigas funeGes cristalizadas na vida de rela- foe entre os homens em seus aglomerados. Desiaca-se agui a famflia, que € desestruturada em suas antigas fungées, bem come @ chamada comunidade, em suas Fungdes de controle & seguranga social, O desen: volvimento das forcas produtivas presentes & revolucdo industrial eria a dissolugao de antigos lagos de autoridade ¢ poder existentes no seio da comunidade, deslocando-os paca a engrenagem de relagdes que se estrutura na empresa. A crise propria de toda esta mudanga de rela- ges chama a atengio para as necessidades de “reconsttugio da pe guena comunidade”. A partir de 1920, a comunidade passa a ser unia questo sujeita 4 continues estudos e indagagses, sobretuida nos Esiados Unidos. Jo: seph K. Hast, E. C. Lindeman, Bessie A. MeClenahan, Welter W. Petit, Jesse F, Steiner € outres Sa apontados como estudiosos da co: munidade e de modos de intervengdo junto & mesma, A esse modo de intervengdo dése 0 nome de organizagio de comunidade. Muitos desses esttides tomam por base as Works socioligicas ¢ pslcolbgicas existen= Ja nessa época, também, muitos autores tinham cons- ncia de que a comunidads, como realidede de solidariedade, covsa € unilicada, era mais um ideal a ser atingido, Nos diferentes autores, podem-se encontrar semelhancas € diferengas des elementos substanti- vos que fazem a realidade empirica da comunidad. Segundo Lindeman, comunidade é uma associagio de grupos, em- bora muito ratamente aja como um todo. Posicilo semelhante é a de él Newsteter, que concebe a comunidade como uma assovingfo de grup em interagio (Debates Sociais, n” 1: 4 © 7) Para Maclver, comunidade consiste em um circulo de pessoas que vivem juntas, que permanesem juntas, de sorte que buscam na ste OU aquele interesse em particulier, mas um conjunto inteiro de interesses, suficientemente amplo ¢ completo de moclo a abranger suas vidas Maclver a define “como tea de vida comum — aldeia, cidade, distrito, comarca ¢ reas maiores” (in Ferreira, 1968: 7 ¢ 9). Arleen Johnson tem também posigio semethante, pois considera comunidade como “um grupo de pessoas reunidas em qualquer area geogtéfica, grande ow pequena, que tenham interesses comuns, reconhecidos ou reconhectveis no campo de bem-estat social” (Debates Sociais, n.° 1: 3). Outta concepgao tradicional de comunidade € encontrada Gurvitch, que a considera uma forma de sociabilidede. “A comuni dade ¢ a forma de sociabilidade resultante do equilibrio entre a duas forgas exeridas pelo conjunto sobre os participantes — a atragio in- terior ¢ a pressdo exterior” (in Ferreira, 1968: 15), Ante a realidade social, as concepgdes apresentadas 12m sido alvo de anélises ¢ oriticas diversas, dando lugar a novas concepedes, que buscam encontrar seus elementos de identificagiio om uma realidede possivel de ser identificada ‘Terese Porzecanski assume a posigtio de Searon de Quintero ao dizer que se chegou atualmente estabelecer uma distinego entre o que se pode chamar de comunidade real ¢ comunidade potencial. Se- gundo cles, o reconhesimento dessa diferenga ndo exime os assistentes sociais de chegarem a uma defini¢ao operacional do termo comunida- de, de determinar quais sZo os elementos cuja presenga permitivia diag. nosticé-l Segundo ‘Teresa Porzecanski, uma comunidade se identifies atra- vés dos diversos grupos subcullurais que integram uma mesma classe social. A partir da localizagdo e insercio em grupos subculturais de classe, podem obter-se os elementos de construgao da conunidade rea. Diz ela: “Bm definitivo, temos que deixar de falar de sreas geogrifiens como comunidades, ¢ apesar de que todo grupo social esté assentado em uma rea, destacar 0 dmbito de repercussio social como pesstvel comunidade real 62 Portanto, supomos que: comunidade real 6 6 Ambito subcultural dentw do qual hé ou é possivel obter uma repercussdo participativa se se aplica 0 procedimento eonhecido como Organizacao ¢ Desenvol vimento de Conmnidade” (Porzecanski, 1972: 58) Para Tereza Porzecanski interessa mais a exisiéncia de um ambito humane que a existéncia de um mbito geogréfico. Ambito hnmano no sentido de diferentes subgeupos de uma mesma classe social que, como tal, tém interesses © objetivos comuns. Rssas consideragdes ¢ posigaio servem de base as principais ot Licas que so faites aos diversos coneeitos tradicionais de comunidade. Eles no atentam para as contradigdes antagdnicas existentes na socie- dade que se particularizam, sobretudo, entre grupos de classes sociais diferentes ou antagénicas. © realee A solidariedade, coesia e exis. téncia de interesses comuns, desconhecendo esta realidade, tendo a conduzir a acao social promovida ou a ser promovida & reproducdo da ordem social 2, As controversias da realidade comunitaria © desenvolvimento soctil ¢ a complexidade crescente dos proble- tas sociais continuam trazendo A baila a importancia da comunidade como walidade social de coesio e solidariedade entre os homens a set resgatada a partir dos seus nticleos de vivéncia e existéncia. As coneepeées tradicionais de comunidade, Ievando em conta uma reilidade hoje nio-existente, criam a miragem de um lugar irreal, onde tcdos se entendiam, se completayam ¢ auxifiavam mutuamente e sentiam-se felizes uns com os outros. “Reconstruir a pequena comu nidade” € tentar retomar estas antigas qualidades de vida social. Por outro lado, mais recentemente, também a ideologia desenvolvimentista © nacionalista pressupe © homem néo sé responsivel pelo desenvol- vimento do seu pais. "A comunidade” 6 0 niicleo bisico ¢ meio de estimular @ implementar estes niveis de desenvolvimento. Nestas for- mulagdcs, no entanto, a sociedade € pensada téosomente como con- junto de fungdes a realizar ¢ em realizacio, independentes das deter- minagdes estruturalmente dadas. Como isso, 0 ideal de comunidade se afasta das condigdes reais da sociedade ¢ contribui para o seu falsea- mento, © trabalho comunitério tem sido cada vez mais realgado como base para o desenvolvimento de varias propostas de ago social. Em 63 muitas propostas, no entanto, a problemitica social se apresenta como resultante de comportamentos isolados © desviados dos valores de desenvolvimento do homem © da sociedale. E nesse sentido que a ugao comunitéria passa a ser tida como proposta de agentes extemnos com © abjetivo de conduzir a homem & observancia de tais valores. Um problema bisico, conseqiiéncia desta ayio, € nao s6 a consideragio do homem como objeto, mas também o distanciamento dos interesses © Preocupecdes prdprias a que esse & conduzido. A inexisténcia de uma andlise critica quanto A concepeio de comunidade passa a ser uma das condigdes para que o real s¢ja concebidla de forma enganosa e, dentro desta concepeao, as agdes sociais sejam conduzidas. A comunidade ndo ¢ realidade autsnoma que possa se waducir ‘em clementos distintos da propria sociedade na qual se situa, A socie- dade, ne entanto, se expressa em sittagdes sociais diversas, algumas das quais assumem caracteristicas especificas. A comunidade € uma dossas situagdes. Nesse sentido, a compreensio da sua realidade supoe a comprvensao da realidade social global. Por" sua vez, também as suas particularidades préprias atuam sobre essa realidade, No dia-adia, a comunidade € discutida ¢ representada com as mais diversas conotagdes das qu A. B, Leaper a) (1 & muitas vezes usada como sindnimo impreciso da so: Siedade: is algumas so apontadas por Robert b) (3 € também usada como ume categoria de pessoas (...) a comunidade catélica (...); ©) (..) como referéncia politics mais ampla (...) a Comuni- dade Beondmien Européia (...)s ©) (...) como sindnimo adjetiva do social (...) assisténcia eo- munitiia, agio comunitéria (. 5 ©) (...) para referir-se a uma area limitada de moradia identi- ficada como tal pelas pessous que ai vivem quanto & residéncia co- ‘mum, inieresse comunitario” (CBCISS, 1979: 10-1), Dentre os significados apresontados, 0 tiltimo © que mais pre clsamente tem percorrido a trajetoria histérica do DC. Essa trajetéria pGe em destaque uma concepcio de comunidade na qual a drea geo: sréfica, enquanto érca comum de vivéucia de pessoas € grupos, & realgada € considerada operacionalmente, Um outro aspecto histérico 4 considerar nas comunidades referidas 90 DC 6 a caracterfstica de ot caréncia e pobreza da sua populagao. Mais um aspecto a considerar é que, no DC, a preocupagio com 0 coneeito de comunidade se carac- tetiza mais como preceupagao operacional, tendo como referéncia sem- pte os grupos © subgrupos que moram ou convivem num determinado espaco social. Destacar as dreas de moradia ¢ a dinémica dos seus grupos © subgrupos levando em conta innteresses € preacupardes comuns como indicadores da realidade comunitaria é de certo modo complicado. E complicade tendo em vista que as condigdes comuns de existéncia possibilitudoras de expressdes de interesses © agdes comuns tém sido cada vez mais diluidas pelo desenvolvimento complexo ¢ explorador das relagdes capitalistas de produgao. No campo tense a considerar & exploragao ¢ expulsdo cada vex mais agrossiva do homem pelo capi- tulismo agrério, No urbano, 0 desenvolvimento do capital imobilidrio com suas formas proprias de especulagao e exploragio fazem do espago urbana uma realidede imacessivel & maioria da populaedo. A continua Ista por um espago forge a continua mobilidade da populasio, tor- nando fragels as relagdes de amizade, solidatiedade © cultura entre os diversos subgrupos de classes que convivem num mesmo espago seogrdfico, de fundamental importineia considerar essa reatidade Contraditéria pois ela influi decisivamente om situagdes possiveis de enfrentamento dos interesses dessa popttlagdio. Nao se pode deixar de considerar também que os grupos € subgrupos que compdem uma mesma classe social so permeados por formas de acho e ideologias que reforcam e reproduzem a desigualdade social. Nao desconhecendo a complexidade do real de levar om conte as novas situagSes de identidade que a prépr diaistica do cotidieno vai eriando nessas devas entie os grupos socials de interesses e preocupagSes fundamentais semelhantes A heterogeneidade de tradigées ¢ histérias de vida condiciona: las pelas situagoes conjunturais que vao se impondo ao homem & perpassada par situagdes comuns a nivel das condicdes mais gerais de reproduyao da existéncia. Nesse sentido, a vivénein comum de neces sidades cotidianas determinadas por essas condigdes de existencia situagdes de identidade que fazem com que a sirea de moradia ago se reduzat simplesmente a locais-dormitirio € locals de consume. As questOes comuns de transporte, habitaedo, creche, instituicdes bi sicas do educagio, savide © lazer recomp5em a unidade da populagio porque buscam outras raizes histéricas mais profundas, que stio as raizes das eondigées de exploragio do homem Cam base nessa reali- 65 dade € que a area de moradia € ident ficada no DC como objeto de tabalho, como comunidade 3. DO ¢ comunidade © DC é uma pritica que se efetiva om uma dade realidade a qual se dd 0 nome de coniunidade. Para tal, ¢ de fundamental importéncia que se tenha presente uma concepgio operacional de comunidade que seje coerente com os ebjetivos dessa pratica Para MeMillem, os diversos conceitos de comuidade tém apt cegiio propria e, por isso, © profissional néo deve aceiter nenhum com exclusividade (in Debates Sociais, n° 1: 6). Acontece que dife- rentes definigdes nao significam simplesmente a exploragio de enfo ques diferenciados de uma mesma realidade, mas, sobretuds, avitudes idcolGgivas diferentes € divergentes ante essa walidade. A questao da comunidade ne DC ado ¢, por conseguinte, conhecer grande nsimero de concepgdes para incluir ou exeluie, Uma concepesio lie abarque ou inclia diversas outras termina por scr generalizante, onde tudo pode ser ideniifieade como comunidade, mas ao mesmo tempo nada é co- monidage No DC, as aglomeragdes humanas situadss numa dada base te Hhiorial constituem uma comunidade na medida em que a organizecdo do cotidiano leva a ctiagdo de canais particulares de expressio, assim como eria velagdes que, de modo limitado, cumprem diversas fungdes. A comuinidade € 9 cocidiane dos individues e grupos que partilham de condigdes sociais comuns ¢, face a elas, organiza o seu ambiente de relagdes dentro de uma dinfmica prépria. Como diz Carlos Urrutia, © cotidieno ¢ aquilo que virewla o homem em sua dimensdo particular © om seu ser social, 0 qual necessariamente néo ocorre todos os dias (Urrutia, 1985: 37) A érea de moradia, mesmo nos limites arbitrérios que possui, significa uma primeira aproximagao pare que o contexto cotidiane de relagdes entre grupos e subgrupas de uma mesma classe social seja identifiead. A substineia da comunidade nao esti no aspecto fisico da dren de moradia. mas no conjunio de relagdes © inter-relagdes, de poderes © vontrapoderes que se estruturam, tomande como referénela a infra esirutura fisica © social da area que, por sua vez, tem suas determin: Ges nas estruturas fundamentais da sociedade. A comunidade 6, par 66 tanto, forma particular de expresso da prépria soviedade. Come tal, compreendéla supe compreender a sociedade global e mais os ele- mentes de sua particularidade propria Os elementos de particularidade propria definidores da comuni: dade séo os interesses © preocupagées comuns dos grupos ¢ subgrupes que conyivem numa mesma area €, além disso ou sobretudo, séio mar- cados por condicées comuns de existéncia a nivel das condigses de produgao ¢ reprodugio material da sociedade. Uma mesma rea d> moradia pode abrigar mais de uma comu- nidade se os interesses ¢ preocupagdes dos grupos ¢ subgrupos af exis: tonics tiverem por base condigSes existenciais diferentes como estru, ura de produgio de bens materiais da sociedad. Mesmo quando a fra de moradia serve de hase a grupos ¢ sub grupos de uma mesma classe social, os limites da comunidade podem ser inferiores ou ultrapassar as prOptias fronteiras fisicas arblirdtias da referida area, Segundo Teresa Porzecanski, os limites da comuni dude nfo esto nas fronteiras fisieas ou administrativas da area, mas rng grity de repercussio participativa dos grupos e subgrupos de classe que sz identiticam em terms de interesses ¢ preocupagoes, Nesse sen: tido, € fungio do DC ampliar as fronteiras da comunidede, ajudando ou Conttibuindo para que os grupos e subgrupos de classe de dade rea de moradia ampliem a repercussio paticipativa dos seus enfren. Lamentos, conforme interesses ¢ preacupagces identificados ¢ 2 serent identifieados, A identificagio de uma comunidade teal, 02 seju, de grupos ¢ subgrupos que a nivel de classe social e da sta dtea de moradia possu ‘em interesses e objetives comuns, pode ser trahalhada a partir de uma concepgao mais ampla © genérica de comunidade cue, como tal, aiente para tais elementos. Eo que Joao Guedes Pinto chama de fio operacional do termo comanidade: “A palavra comunidate denota, operecionalmente, uma popule bao que habita uma determinala poredo de territério, com cujo nome se identifies, e que, por viver e conviver nels, dlesenvolve alguma coisa em comum” (Pinto, 1980) Numa érea geogréfica, local de moradia, hé certos niveis de iden: tidade entre grupos e subgrupes que cobrem ox servem de identidade de interesses ¢ preocupacdes para diferentes classes. Fsses clementos de identidade, no entanio, nem sempre tocam inte-esses fundamentais, Nesse sentido, a partir dessa concepeao operacional se tem de it adi ante para identifisar o nivel dos interesses fundanentais que caracte or rizam tal porgao de tervitéric no qual pade haver mais de timta come nidede, A parle dessas consideragoes & que se supae ¢ anya ie dss consdergas ¢ gue se supde como comenidade Conjunto de gruipos ¢ subgrupos de wna mesma classe social, gure ‘ene interesses & preocapacdes comuns sobre condigées ile sivéncia no espago de moradia e que, dedas as suas condigoes fundamentais de existéncia, tendem a ampliar continuamente o imbito de sepereussdo dos seus interesses, preocupaydes e wafrentamentos comuns Ao se iniciar uma prética de DC. a realidede comunititia como lal é, sobretuda, realidade a ser descoberta. Dada a dindmica propria da socisdade capitalista, casa realidede nem sempre se apresenta de mody uparente, Descobrir a reatidade comunititia dos espagos de moradia © contibuir para ampliar a repercussho patticipativa dos que fazem esta vealidade portanto, fungio bésiea do DC. 6 O desenvolvimento -Componente conceitual do DC © deseavolvimento & o objetivo a ser alcangudo pelo trabalho comunitério enquianto processo pedagdgico. Nesse sentido, nao se pode pretender acionar profissionalmente a pratica do DC sem que se tenha presente uma bese inicial de compreensdo sobte @ desenvolvimento, a qual pode ser repersada ¢ retrabalhada a partir da propria prética, © DC, conforme expressit & propria terminologia, tem como ob- jetivo a ser alcancado 0 desenvolvimento da comunidade, Nas consi- ceragdes de alguns autores, coloce-se como estratégia de agio para o cesenvolvimento, processo global; |4 para outros, esse desenvolvimento E pensado de forma parcial e setorizada, Dai vem a importancia de uma clariticagéo da questo do desenvolvimento: ne DC 1, © desenvolvimento ¢ seu proceso histérico [A questao do desenvolvimenio come preocupayto social aparece mais precisamente quando, a partir dos meados do séeulo XIX, 0 ca- pitalismo assume novo impulso em suas forgas produtivas © em si formas de exploracZo. O capitalismo amplia suas formas de acto ¢ ce estrutura sobretudo como capitalismo industrial, e nao mais simpl mente mercantil, © desenvolvimento capitalista, om suas formas diver sificadas de exploracio, vai aos poucos deixando a descoberto a exis- téncia de uma diviséo internacional do trabelho no qual se poem em 69 destaque nagoes industrializadas ¢ nagdes nao-industrializadas, ow nae es de “artigos cotoniais”, Sobre esta realidade soto-historica diz Paul Singer (1971: 49-50): “Aqueles paises que participaram pioneiramente da revolugdo industrial submeteram os demais pafses a uma divisdo internacional do trabalho, feita em fungao das necessidades dos paises que sé se indus- Grializaram em fungio dos recursos naturais des paises nfio descnvol- vidos.” No inicio deste século, as crises e contradigées internas dos paises ndo-industrializados, reforgades pelas contradig6es acarrretadas peli divisio internacional do trabalho & pela propria erise do capitalismo no final do séeulo X1X, chamam a atengiio dos paises industrializa- dos, Chamam a atenc&o também porque a Revolugao Russe © 0 sttt~ gimento do regime socialista predispée as naydes de economia colonial @ assumirem novas atitudes em face do seu préprio destino, As contradi¢des de ordem politica © econdmica trazem & baila # questo do desenvolvimento ¢ subdesenvolvimento que. infetizmen- te, tende a assumir mais uma dimensio ideolégica de jusiificativas € afirmagées dos pafses industrializados sobre os nao-industtializados. As formulagdes sobre 0 desenvolvimento ¢ subdesenvolvimento pouco m as condlig&es causais deste tiltimo. Fala-se cm subxlesenvol vimento como uma realidade a ser entendida por efeito de compara. G40 com a realidade dos paises desenvalvidos. Por exemplo: subdesen- volvides s40 aqueles paises que tém nivel de vida inferior aos Estados Unides, Canadé, Australia e Europa Ocidental, O subdesenvelyimento € definido também pelo nivel médio de renda per capita, pelo Produte Interno Bruto, pelo indice de alfabetizagio, mortalidade infantil, ete, Nas formulagdes sabre 0 desenvolvimento, colocase come pro: blema bisivo do mundo atual os obsticulos gue impedem a sia imple- mentayio nos paises subdesenvolvidos. Esses obstdculos, no entanto, sao atribuidos sempre # problemas de atraso cultural e de incapaci dade dos paises subdesenvolyidos. Nessas formulagoes constroem-se as justificativas de intervencao dos paises ricos nos paises pobres. A ques- Go do desenvolvimento cria, como tal, bases politicas legitimadoras da dominagao de alguns paises. Na América Latina, nas décadas de 50 e 60 florescem intimeras agéncias internacionais de ajuda aos paises subdesenvolvides © com isso as relagdes de dominagdo © dependén a sfo cada yex mais alicer 70 gadas. No Brasil, para Juscelino Kubitschek, a ajuda dos paises yolvidos wos subdescnvelvides € politiamente importunte, tendo vista os perigos sociais que a miséria pode oferecer a ordem social. “A politica amerivana de desenvolvimento econdmico-sovial ee inieiou no ano de 1958 ¢ significou uma nova cra para a América Latina, O Presidente do Brasil Juscelino Kubitschek, propés a ‘Opera- gto Panamericana’ ¢ através dela ume vigorosa campanha contra 0 subdesenvolvimento” (Greia, 1965: 24). Segundo Miriam Limoeiro (1977; 207), a perspectiva mais geval da ideologia juscelinista é “mudar dentro da ordem para garantir a ordem” Como os parametros de desenvolvimento sao buseados na indus- ttializagdo, toda questéo maior de superagio do desenvolvimento passa a girar em torno das concligdes possiveis de industrializagéo, Segundo Kubitschek, com a industrializagdo chegase & tiqueza que se esten- derd a todos. | Na América Latina, es questées do desenvolvimento sao tan reforgadas pela ideologia nacionalista ‘O nacionalismo preiende ser uma ideologia global, incluindo 0 industrialismo © 0 internacionalismo... © projelo fundamental do nacionalismo era, portanto, o de transformar 0 pats semivolonial em uma verdadeira nacho independente. A industrializacio seria 0 meio fundamental de se levar « cabo esta transformagio” (Pereira, 1980: 100-1) Se, entre 0s paises subdesenvolvidos, a questiio do desenvolvimen- to tem como enfoque privilegindo a industrializagao, gntze os desen- volvidos a questio 6 a ajuda externa eo trato dos problemas de atraso cultural, 0 que se traduz em levar os paises subdesenvolvides a assur mirem os valores de modernidade desses paises. No Brasil, além do nacionalismo, outras ideologlas, como © vos mopolitismo 6 liberalismo, justificam as preocupagdes para com a industrializagao e 0 econémico como questdes bisieas do subdesenvol. vimento. © Estado assume tal proposta de desenvolvimento ¢ define sua politica de modo a dar condigdes de operacionalidade e observin- cia a ela, A criacho de condigées de avesso & pencivagio do capital monopolista ¢ a ideologia desenvolvimentista fazem parte, portanto, da politica do Estado em fungio do desenvolvimento nacional. n De aeordo com as priticas ¢ concepgdes mais comuns, desenvol- yimetto é sindnimo de crescimento evonémico c, nesses lcrmos al mento & de ere s Neases terms alguns paises subdesenvolvidos sav mareados por mudangas sensiveis que se expressem no Produto Interno Bruto ¢ na renda per capita. Ao lado dlesse crescimento, no entanto, erescem também as contradigSes, pois @ grande maiorin da populagio, além de nao ser beneficlads por esse erescimento, passa a vivenciat formas mais ampliadas de exploracto. Tais contradigoes impoem que se modernize 0 conccito de desenvolvi. mento, que passa a ser focalizado a nivel do econdmico ¢ do social. © econdmico se expressando através do crescimento economic ¢ do Progresso tecnoldgico aleangado. O social se expressando em um con. junto de servigos sociais estimulados, apoindos ou mesmo patrocinados pela Fstade com 0 objetive de diminuir « distancia social entre os diversos grupos da populagao, Os enfoques e concepcdes de desenvol- vimento se apresentam nao s6 de forma diversificada, mas também contraditéria, 2. Enfoques ¢ concepedes sobre desenvolvimento A concepeiio mais comum, ¢ também coerente com as préiticas © politicas estimuladas pelo Estado, € a de que desenvolvimento é erescimento econdmico © progresso tecnolégicos, Essa conceneio tem suas bases na economia clissica que, segundo Octavio anni, a des- peito de ter sido reformulada, “guarda, ainda na atualidade, a mesma compreensao da dinamica e da totalidade histérien “Tratase de uma explicagiio que concebe o sistema econémico como sutdnomo € suscetivel de dinamizar-se internamente dependendo da ordenacao, ponderagzo e aceleragao dos seus componentes basicos, Para Adam Smith ou Ricardo, o desenvolvimento seria, no fundamen. lal, © resultado de uma integragao dinimica da divisto do trabalho, @ acumulacao de capital © a inovaeio técnica” (Ianni, 1971: 94), Ne concepeao apresentada, a questio da estrutura social © das relagSes de classe nfo 6 tocada; nesse sentido, a maforla das concep- es de desenvolvimento sto variagdes que, no fundamental, se en- contram sem nenhum antagonisino. Rostow, por exemplo, em sew livre Etapas do desenvolvimento ecoudmico, explica 0 subdesenvolvimento com estigio, uma passagom para o desenvolvimento, O subdesenvol- vimento € 0 estigio primitivo, a pertir do qual se chega ao moderno, 72 Os tebricos da CEPAL exploram uma série de varidveisi mas a t6nica S sempre a do erescimento econémico. Diz 0 professor Anibal Pinto (1962: 8), por exemplo, que, em termos mais gerais, “o desenvolvi- mento econGmico nko ¢ outra coisa que 0 processo de crescimento de um pais”, Os niveis de renda per capita, as mudangas no critério de produgio © a harmonia no sistema de desenvolvimento econdmivo & distribuicdo social dos produtos do processo so elementos de classi- Ficagio que ele mostra para a compreensio du eoneepgio que apre senta. Para a superacio do subdescnvolvimento, a CEPAL destaca so- bretudo a industrializagdo, o progresso tecnoldgico, incluindo também a necessidade de aumentar os salérios dos trabalhadores, Diz Fernando Henrique Cardoso que, na década de 50, 0s textos cepalinos propunham, com grande empenho, 0 apelo ao capital es- trangeiro — de preferéncia sob a forma de empréstimos intergoverna- mentais — para promover a rapida industrializacao; propunham tam- hém uma politica fiscal adequada e alteragdes substanciais no regime de propriedade da terra, propugnando por uma ago coordenadora da Estado na condugiio do desenvolvimento nacional (Cardoso, 1980: 9) As variagdes de tonica e estratégias que sto dadas ao desenvolvi- do sistema econémico criam, como con- mento como processo prépi seqiitncia, variadas politics de implementagdio, Nese sentido, en- quanto para uns algumas reformas séo de fundamental importincia, para outros @ questo se traduz em agdes a nivel monetrio. Segundo Octavio anni, é "como se a estrutura de poder, a luta de classes, as téenicas de controle das atividades politicas dos homens, 0 quadro ins- titucional ¢ outros fendmenos © processos fosscm sempre secundétios” (anni, 1971). Em suma, as mais diversas teorias sobre o desenvolvimento ca- minham sempre na reafirmagio do econémico. As vatiagées dessas teorias terminam por explorar a necessidade de produtividade da forga de trabalho. & nesse sentido que os indices de crescimento e progresso tecnolégico, que passam a caracterizer muitos paises como em desen- volvimento, nfo chegam a tocar as condigdes de pobreza e¢ miséria de considerdvels contingentes da populagao. Estes contingentes cha- mam a atengao tao-somente pelas preocupagdes com a manutencho da ordem social, pelas necessidades de expanséo do mercedo de consumo 13 na visto do creseimento econdmico ¢ também pela necessidade de ca- pacitagio de mio-de-obra para responder 8a exigéneias tecnoldgicas do desenvolvimento evondmico. © desenvolvimento & repensade muito mais no sentido de uma exploragio do homem como recurso, como objeto, do que propriamente como um proceso a servigo do homem. A educagéo e a savide so icios de valorizagéo de tal recurso, Conforme Lubin et alii (1965: 1): “A viqueza de uma nagde depende, em ultima andlise, da capa- cidade produtiva ¢ dos niveis de educagdo de seu povo. A velocidade da expanséo social ¢ econémica fica, em grande parte, subordinada d taxa de formagio de capital humano. Assim, 0 investimento no deset- yolvimente do homem deve ser uma das principais preocupacées de foda nagio que espera progredir no mundo moderno” A questio do desenvolvimento, na América Latina, ja no final da década de 50, passa a ser estreitamente vinculada & peroepoao do homem como recurso econdmico, a ser trabalhado em fungio do processo de desenvolvimento evonémico. Dentro dessa perspectiva, que correspond também a perspectiva desenvolvimentisia, se justifica que @ populagée de um pafs, quando em condigdes plenas de inseredo no processo de desenvolvimento (candigées de satide, educagao, capacita da mio-de-obra), nao apenas se benelicia com os resultados do desenvolvimento econdmico, como desempenha papel especial em sua consecuedo (Lubin ef alii, 1965), Como recurso humano, 0 homem passa a ter um tratamento especial no processo de desenvolvimento, tratamento que o colaca na posigo de insumo basico, ou seja, na posigio de objeto ¢ néo do sujeito que & Com esta estratégla de recursos humanos garante-se 0 aumento di produtividade fisica da forca do trabalho, que passa a ser um elemento mais eficaz na acumulagio do capital. Essa perspectiva ile valorizegio do homem mobiliza setores como educacio, sade ¢ preparagdo da mao-deobra para que assumam essa pritica como dire 'eiz basin de suas ugdes, O homem precisa wr saiide para poder produzir bem; precisa ser educado de modo a transformar suas poten: cialidades em recursos plenos; precisa ser habili ado © continuamente aperfeisoado para poder colucarse integralmente a servigo do desen- volvimento, A capacitagio de recursos humanos passa a ser outra perspectiva importante © se traduz como valorizacio social, sd que esta se deve fazer em fungio do econémico, : ™ Auiavés de algumas préticas, sobretudo do setor piblico, se pode Uepreenier que desenvolvimento social é a mobilizagio e dinamizacdo de condigdes de educagao, saiide, lazer e serviges sociais em geral, de modo a dotar a populacéa de condigdes basicas de insercio no provesso de desenvolvimento econdmico. A preocupagao com o “social” vai implicar a divisio desenvolvi- mento evondmico/desenvolvimento social, que compartimenta a reali dade da estrutura de poder, das relagdes de classe, assim como de ou- wos processos relacionados, que definem a dindmica da esfera ecand- mica. Essa realidale requer uma explicagdo que alcance a realidade social em sua totelidade, requer uma explicagdo dialética, Segundo Octavio Tanni, na explicagao dialéticn © homem surge como senhor do seu futuro, ainda que, para ser construido, este deve se. concretizar sobre 0 trabalho acunmulado pelas geragdes anteriores. Partinda das condigdes de existéncia propiciadas pels vigéneia de um dado sistema sovial de produgao, os homens podem construir 9 seu fucuro, optar em face de alternativas garantidas pela sua liberdede ¢ pelas configu rages do presente (lanni, 1971: 100-1). © livro de Marshall Wolfe, Desenvolvimento: para que e para quem?, levanta questées sérias sobre © proprio significado do desen- yolvimento, © desenvolvimento ¢ crescimento econdmico, dependendo da resposta a0 para que e para quem. Se a preocupacéo é a implemen- taco de um proceso que responda aos anseios de uma pequens parcela da populago, entao, de fato, desenvolvimento. pode ser con- siderado ereseimento eeondmica Acontece que a preoeupecao com as questoes do desenvolvimento surge exatamente por conta das contredigées que se expressam nas situagGes de pobreza de alguns paises em relaggo a outros, ou da maioria das camadas da populagio em rela¢o a algumas poucas pri- vilegiadas. A pre, © desenvolvimento € uma questio que diz respeito a todos os cidadsios © crescimento econdmico ¢ o progresso tecnolégico so fundamentais esse processo; nfo apenas porque se definem em fungio das neces- sidades da populagao em geral nao em fungao de alguns poucos privi- legindos. Dai as interrogagdes de Marshall Wolfe: Desenvolvimento: Jo & portanto com um processo global, pois para que e pare quem? Como processo global ¢ dirigido a todas as camadas da populagéo, © desenvolvimento € de fato uma questie @ ser explicada levando em. 75 conte a estrutura de relagées da sociedade a nivel do econdmico, do politico ¢ do cultural. Como tal, a implementagao do politicas om fungao do desenvolvimento implica ayes nos diversos niveis dessa es: teucura: implica levar em conta a estrutura de classes da sociedade ¢ a estrutura de poder e de legitimacio da prépria realidade social Ja aqui se pode deproender que, no DC, desenvolvimento é cres- cimento eeonomico e progresso tecnolégico, no entanto, definido, con- trolado e dirigido pela populagio ¢ em fungio dessa populagio, Nesse sentido, ¢ desenvolvimento €, sobretudo, Ideal a ser alcangado, O nivel de realidade em que ele se encontra & definido a partir de condigées histSrieas préprias 3 populugées de cada pais, regido ou locatidade © € a partir dat que ele se amplia, A medida que 0 cresci- mento econdmico ¢ 0 desenvolvimento eenolégico sto pensedos, geridos por grupos sociais cade vex mais numeroses ¢ abrangentes, 0 processo do desenvolvimento avanga e se aproxima do ideal. Assim & um proceso global, mas que pode set pensado e imple- mentado tanto numa pequena comunidade, como numa nacido. O res: gate da condi¢ao do homem como sujeito e como pacticipe das defin ges, do controle © usuftuto do progresso social é uma estratégia bé sica nesse processo. 5. Desenvolvimento ¢ DC Desde © inicio da década de 60 © por muitos anos, 0 DC no Brasil (eve como referencia a concepeao de desenvolvimento asst mida por Lebret em seu Movimento de Economia e Humanismo. A perspectiva & a da existéncia de um desenvolvimento global que retine as seguintes caracteristicas: — desenvolvimento harménico © indivisivel; — desenvolvimento autopropulsive ou auto-sustentavel; — desenvolvimento democréticy com participagae popular; — desenvolvimento humanista e solidério. Segundo © padre Lebret, “desenvolvimento 6 a passagem de uma populagao determinada de uma fase menos humana a uma mais hi mana, ao ritmo mais rapide possivel, ao custo financeiro © humano © menos elevado possivel, tendo em vista a solidariedade entre todas as populagdes" (Lebret, 1967) 76 A concepefio de Lebret assumitt, no DC, funedio valorativa € de justificacio de agéas, sem que estas fossem analisadas para que pw esgem ser percebidas suas implivagGes operacionais enguanto conccito. Alids, muitas concepgdes discutidas em Tungz0 do DC nao chegam a ser pensadas © traduzidas em termos operacionais © de uma com- preensie do cotidiano, Nesse sentido, nio eonseguem ter uma fungio transformadora enquanto elemento da pritica No DC o desenvol tinuo caminhar, Nao existe uma situagéo em que o desenvolvimento possa ser consitlerada pronto, acabado, Desenvolvimento 6 processo continuo de eringio do homem ante os desafios sociais que enfrenta na comunidade. F proceso que supde a ago do homem no usufruir do progresso social, assim como no dofinir e gerir esse progresso em fungo das suas necessidades humanas mento 6 consicerado como processo em con- O desenvolvimento supée, portanto, respostas aos interesses dos diversos segmentot da populagio em scus anscios nao s6 de sobrevie véncia material, mas também de criagio © produgao continua da sociedade; supée a conquists de maior producao e de progresso tec- noligico pelo conjunta da sociedade. O desenvolvimento, como tal extrapola a realidade comunitéria © se define como desenvolvimento dv homem e da sociedade, colocande-se como um ideal x ser cotidiee namente conquistado. Ele & um processo wt6pico, considerando-se como utépico aquilo que diz Paulo Freire (1979: 27) Para mim utépico nao ¢ 0 irrealizavel; a ulopia nao € 0 idea- lismo, € a dialetizacdo dos atos de denunciar © anunciar, 0 ato de denunciar a estrutura desumanizante ¢ de anunciar a estrutura hue manizante Cada pais, cada regifo, cada drea especifica encontrase numa situagio propria de desenvolvimento, E « partir desta situa proceso precisa evangar. Compreender a situagao prdpria de desen yolvimento em que se enconira um determinado contexto supde com- preendé-[o historieamente, dialeticamente e estruturalmente. Nio exis: tem modelos prefikadas para © avangar do processo de desenvolvimen fo, uma ver que es condigoes prOprias de cada contexto supsem tan bém condicdes préprias para o seu avancar, Em toda e qualquer sit io, emiretanto, o desenvolvimento supse que todo e qualquer cldadio se encontra em condicaes de pensar, decidir ¢ agir sobre a sua reatidade social, sobre o sew destino, O confronto deste suposto com as condi. ees cotidianas existoneiais do homem revela a longe caminhada que 7 se tem a fazer, sobretudo através de exercicios continuios de pensar © agit sobre a prdpria realidade cotidiana © sobre « realidade mais geral na qual este cotidiano esta implicado, Pensar 0 desenvolvimento € pensar sempre 0 relative, pois nto existe realidade de desenvolvimento absoluta e acabada, O que sc pode & ovaliar a existéncia de um proceso mais amplo ¢ profundo a partir de critérios de participacto ampliada da populacdo nas decisoes © gestio das agdes conseqiientes; avaliar « capacidade etiadora do ho: mem, na produgito dos enfrentamentos em fungio dos desatios da natureza @ dos desafios sociais. Nesse sentido, 0 processo de desenvol- vimento é também processo de participacto. 8 A participacao -Componente conceitual do DC ‘A participagao, componente do DC, requer ser examinada como pracesso social ¢ também em alguns elementos pedagdgicos posstveis de interferir em sua realidade social, Uma realidade indiscutivel & a de que a participacdo 6 processo existencial conereto, se produz na dindimica da sociedade e se expressa na pidpria realidade cotidiana dos diversos segmentos da populagio. Estimular o avangat desse processo implica ter compreensao clara sobre ele ¢ também sobre a propria realidade social na qual se processa. 1, A questilo da participasiio Uma questo muito presente, © que requer ser compreendida his oricamente, € que multas priticas © discursos intiulados de parvici- pacio nfo sio mais que processos de dominagdo e, por conseguinte, processos de eontrapanticipaedo, Historicamente, € importante considerar alguns aspectos do dis- curso da participaedo, sobretudo aqueles estimulados ¢ apreciados pelo poder pablico. Estes aparecem ja apés um certo desgaste do que até entdo & chamado de desenvolvimento. © desenvolvimento, reduzido Zo-semente a variéyeis de ordem econdmica, é denunciado pelas préprias contradigGes saciais que tra- zem & tona situagdes de miséria © pobreza, quando, per outre Indo, 79 se anuncia © aumento do Produto Interno Bruto e da prépria renda per eapita do pais. A adesio a um enfoque complementat de desenvol- vimento, denominado desenvolvimento social, € tentativa de minimizar 9 aumento da distancia social gerada pelo crescimento eeonémico im- plementado, $6 que esta adesio se define a partir de wma perspective curative © nfo a partir de uma compreensio da realidade do desen- yolvimente enquanto realidads social Na perspectiva curativa, a preocupaydo maier 6 para com a or dem social: que cla se mantenhe e facilite © proprio desenvolvimento econdmico. A patticipacto aparece como fendmeno eapaz de estimular © suscitar 2 atengio e a acto di popiilares na consecugio das poliiicas e propostas de desonvolvimeato eeonSmiee, Como tal, aparece basicamente como agi pedagdgica a ser deflagrada, requerendo a agao de agentes externas. Estimular a participagio da populacio se trad em acdes do tipo: ~ wabathar os motivos individuais da populagdo através de re- cursos psicossociais: ~ vrabalhar a realidade cultural da populagéo através da intro: dugao de novos valores © padres de comportamentos. No Brasil, os noves projetos exondmicos que se implantem no pais @ paniir do governo Kubitschek implicam politicamente a re finigo de formas mais eficazes de dominagio, A dominago se sobretudo através da aecitagde e & mais plena e maior quanto mais as idcologias © pidticus politicas em geral levam os segmehtos majori- Larios da populagio a aceitarem a deminago ¢ a exploracao, F nesse sentido que se eneontrs, nas camadas populares, grande parcela da populaco que acefta © gosta de ser dominada e explorada, Esta acei laciio vai de encontro 2 natureza de ser criador e sujeito da histéria, prépria do homem, & uma cringdo da sociedade © assim precisa ser desvendada para que © homem resgate a sua eondigio de ser partici- pant. Em face da desigualdade social criada pela propria dindmica das relades soviais « nivel da produco das condigdes matetiais de exis Aneia da sociedale, esta, para se manter desigualmente estruturada, requer todo um processo de deminagao. Tal provesso se esconde atra- v¥és de raupagem de compreensdo © benevoléneia para com as pret cupagSes c necessidades das camadas populares, Ele se vealiza através de varios instrumentos, entre os quais as diversas formas de educa institucionalmente eriades. Atrayés da educegio, ttabalhese a aceite 80 gio das pessoss. Por sua vez, esse modo de agao essume diversas formas e terminologiss, como por exemplo, participagio social, Esse processo equivocado a0 qual se di o nome de perticipacio pode ser identifieado, sobretudo, no exame de suas préticas Como processo equivocado de participagdo torna-se tanto meis eficaz quanto mais suscita e provoca na populcio predispasigao para — consentimento ¢ aquisiedo de novas atitudes de aceitacao para com os valores de modernidade da sociedade em detriment dos prdprios valores, preccupagdes © interesses; — angistia © sentimento de culpa om yirtude de expeciativa de defasagem existente entre ela prépria e © seu meio social; — absorgio de habitos e costumes que © mercado de consumo vai criando, apesar de as condicdes sociais permanecerem as {— mesmas, Hoje em dia, a participagito € linguagem comum nas diversas camadas da populagio em gue pese existirem interesses © preacupa- ges vontraditérias © antagénicas entre aqueles que fazem a3 classes iundamentais da sociedade. Nesse sentico, assumir a perspectiva da participacio exige, antes de qualquer cutra atitude, que s2 exami- nei patticipagio por qué? Em fungao de quem? O que & mesmo participagao?- 6 2. A participarao comum a todo ser humano “1A participagio ¢ processo social que existe Independente da. ine terferéncia provocads por um ou outro agente externo. ‘A patticipagfio 6 0 préprio provesso de eriago do homem a0 pensar ¢ agir sobre os desafios da natureza © sobre os desatios sociels, nos quais ele proprio esié situado. Como tal, & um proceso dinamieo © contraditérie, O homem é criador por natereza; no entanto, en- quarto ser social, nasce j4 num contexto historicamente dado, Encon tra em tal contexto um conjunto de relacoes ¢ instiluigdes que o fazem. coupar posigées que independem de decisdes prdprias, assumindo, inchasive, determinado sistema de pensar ¢ agir. A participagao nfo 4 wma quesi@o do pobre, do mis ou do marginal; € questio y aser refletida e enftentada por todos os grupos socials que nao che- gam a penetrar as devises que dizem respeito as suas condigdes bisi- ens do exist Angulo, a participagto, longe de ser politica de reprodugao da orem, & sobretudo, questzo social, ei, Por e Bt prias contradigdes socials desafiam o homem como ser crlador ¢ este Coma consciéneia da sua realidade social assume posigées de desatio e enfrentamento. Os grupos privilegiados criam mecanismos no sentido de que os seus interesses e preocupagdes sejam ussumidos ecmo inte- resses © prooeupagdes de todos os segmentos da sociedade; as contra. ligdes sociais, no entanto fazem que os grupos nao-privilegiados se descubram como explorados e, assim, passem a reagit. Quando © profissional pens a participagao como fendmeno do usuario da sua prética © se exclui dessa realidade, contribui para a reproducao do social. Enquanto profissional, vive a problemética da io, uma vez que muito pouco define © decide sobre as con! digdes instituclonais de sua propria pratica. A participacio, portanto, nao € 86 questiio do usuétio. Alids, como jé colovado, # participagio & processe social. “(...9 € 0 restitado da agao de forgas socisis que se constituem como tals a partir de determinantes muito diversos: de classe, de grupo, de genero, ginivos; etc... As Forgas sociais. constitutivas da participagio no necessariamente se definem em primeira instancia em termos de classe, ainda que em seu desenvolvimento possam apa- recer interesses © eonsciéncias classistas que venham a manter 0 pro- cesso" (CELATS, 1985: 87) A participago supde a eriagéo do homem para o enfrentamento dos desafios sociais. Esse processo de criagdo e enfrentamento resulta em daa realidade de consumo ou usulruto de bens, assim como numa dada realidade de fungdes e decisées que caracterizam fins s0- ciais a serem aleangados. Essa realidade pode ser de dondncia da situagiio du maiorla populacional cujas condigoes de participagio nao chegam sequer ao usuftuto de condigdes bésicas de repro existéni E nesse sentido que se la de participacio popular “E uma participacdo coletiva como produto da conjugagio de interesies sociais que fazem possivel 0 surgimento de stias organizagox constitufdas como um meio que possibilite a anélise, reflexdo e o pla- cjamento de suas acdes, orientadas pelos fins que perseguem, para a satisfagdio de suas necessidades..." (CELATS, 1985; 179) Para Dalmo Dallati, todos os individuos tém 0 dever de partici par da vida social ¢ este dever tem dois fundamentos: bm primeito lugar, a vida social, necessidade bsisien dos seres humanos, é uma constante trova de bens © servigos, ni havendo uma 82 86 pesson que nao receba alguma coisa de outros; em segundo Inga se muitos ficarem em atitude passiva, deixando as decisdes pura outros, um pequeno grupo mais parlicipacio ow consciontizagio. Esse proceso pode ser mais ou menos desenvolvido, nao importa; o fata & que ele existe, e & a partir da realidade em que ele se encontra que se pode considerar as agdes a serem desenvolvidas como conseientes, capazes de assumir um carter educative em Fungo do processo de participagso Na perspectiva aqui apresentada, nao cabe a afirmagdo de que se vai a ume comunidade conscientizar a populagao, Um primeiro as- pecto a considerar € sobre 0 que conscientizar? Um segundo & que ninguém conscientiza ninguém. A consciGneia & sempre a consciéncia de alguma coisa. A populagio pode estar além das expectativas de conscientizacao que tem como profissional. A perspectiva € de que profissional 6 educando e educador ao mesmo tempo, da mesma for. mma que @ populagae faz com que & conscientizagao se torne muito mais 90 lum process comum que vai sendo assumido pelos diversos agentes, todos como sujeito do processo Ue participacao e consclentizagio. F conveniente distinguir 0 processo de conseientizagio de pro- cess0 de inculeagdo © manipulasic. A certeza do profissional de ir & comunidade para conscientizar levanta a questo: nfo se estaria confundindo conscientizagao com inculcagio? © processo de inculeagao nao requer nenhuma consideragéa an- terior quanto as peculiaridades © particularidades sociais da. popula- sao a ser trtbalhada, Patte-se sempre do principio de que a populagao fom sempre as mesmas necessidades e elas so tantas que quslquer agiio em seu beneficio € importante. E muito comum que, no desen- rolar desse processo, se conclua sempre que a populayao € realmente incapaz, ignorante e apatica, “ninguém quer mesmo nada”, Nesse pro- cess0, 0 profissional nfo se dé conta das diversas formas de expressio das reagdes aprescntadas pela populagéo ante o autoriterisme © ime posigao a que € submetida, redetinindo esses processos de reacio de acordo com os valores ideolégicos assumidos. F comum, no proceso de inculcagio © fazerse presente as solicitagdes do. profissional e 0 aecitar que as regras do jogo apresentadas sejam consideradas como proceso de conscientizagio. E eomum também encontrar, nos rela: tos de trabalho de alguns profissionals, avaliagoes que dao conta de que 0 profissional conseguitt levar a populaga0 @ se conscientizar. O que se pode supor & que a conscientizacio defendida referese a algun valor ou a alguma pratica predeterminada que 0 técnico de anteinfo pretenclia inculear na populseao. Sobre a conscientizacao coma um proces: diz Paulo Freire (1979: 27) “A conscientizagao, como atitude critica dos homens na historia, hao ferminard jamais se os homens, como seres que atuam, continuam aderindo a um mundo farto, ¢ ver-sefo submersos numa nova obscuri= dade. 0 continuo & dinamico, A conscientizagio, que se apresenta como um processo num de terminado momento, deve continuar sendo processo no momenio se- guint, durante o qual s realidade transformada mostra um novo perfil”. Como diz Panto Fi faz do mundo, & posigao normel, fundamental nao ¢ a posigio eritica, eire, na aproximagio espontinen que © hemem 91 mas a posicdo ingénua. A conscientizagio implica que ultrepassemos a csfera espontinea de apreensie da realidade para ehegarmos @ uma esfera eritica, A importineia do proceso educative « ser desenvelvide pelo profissional esta em fazer esta ulirapassagem. Entre os diversos meca- nismos pedagégicos de agio a serem utilizados pelo profissional esta 0 didlogo. Este supée um processo de troca, através do qual elementos de globalidade ¢ de particularidade yao s¢ confrontando ¢ construindo. como proceso critica de pensar © transformar a realidade, ‘A ampliagio da percepefio leva a populagio @ apreender uma diversidade de angulos e justificativas sobre a realidade social capaz de levé-la a formulacdo de novo pensar sobre esta realidade. Ea partir dos juizos criticos que se represcntam através da refle- Xa0 ¢ conlronlo com a realidade, que se apreende que a problematica de determinados grupos sociais, no fundamental, € uma problemé. tica comum e, como tal, supde ages comuns. A perspectiva dialética de compreensao da realidade nao pode deixar de ser considerada, para que se chegue ® apreensio das suas condigdes objotivas e, assim, a posigdes ante as mesmas, A conscientizacdo que se expressa s6 no discurso & incompleta io fecunda, dai ela supor sempre um provesso de organizaso social para cnfrentamento da realidade. A organizagio social & uma eonse- quéncia propria do proceso de consciemizacao, 4.2. © provesso de organizagao sovial A conscientizacio se expresse na a¢ao e supde acto coletiva. Nesse sentido, a organizacio social & um requisite bésico As agées necessd- rias do préprio proceso de participagao. Isso nao significa deseo nhecet a importancia social de muitas agoes individuais, que se tor- nam contribuigdes decisivas no desencadear da participacao social Em termos individuals, a patticipagdo significa uma constante busca dos melhores caminhos bem como o aproveitamento de todas 5 oportunidades para conseientiear os outros © para cobrat a patti- cipagzo de todos” (Dallari, 1983: 45-4). A participagio social, ante as implicagées contraditérias da rea- lidade social, supoe, no entanto, agdes coletivas articuladas consciente- mente enquanto forga social em fumgao de objetivos claros definidos pela populagao, 92 “A forga do grupo compensa a fraqueza do individuo. Isso tem do demonstrado através da histéria, nus mais diversos lugares © nas mais diferentes nagoes” (Dallari, 1983: 45-4). Conseientizasio ¢ orgmnizagao, pois supoe tomada de atitude que implica a compreensao da forga social da populagdo quando articulada e organized. Por sua yez, organizagio & conscientizagio, pois a po- ulacao projeta, avalia e confronta sua forga social cama dindmi da realidade social. As novas atitudes tomadas, as novas aliangas que vio garantindo, reforgando ¢ amplianda a forga social s40, ao mesmo cempo, conscientizacio organizacao, Qs elementos apresentados tém indicagies suficientes para que se diferencie a organizagao do processo de grupalizagao e dos de mobi- lizacho. A. grupalizagio supOe arregimentacio de pessoas sem implicar consciéncia critica sobre a realidade, nem sobre a forca social repre- sentada por elas e pela populacio quando articulada e estimulads para objetives que sio do seu interesse A grupalizagio geralmente assume caracterfsticas formais ¢ se apresenta através de estruturas organizadas, obedecendo muito mais @ critérios artificiais de organizacae formal que a necessidade sentida pela populagao. As estruturas sao, em geral, uma tentativa de repro- ducdo das outras formas existentes na sociedade A mobilizagiio supde, também, arregimentagao de pessoas em. toro de objetivos apresentados por outros grupos sociais, objetivos paves de sensibilizar temporariamente a populacio sem, contuda, chegar a agir sobre clas para reflexiio e agao sobre o set cotidiano. A jobilizagiio © a grupalizacio, contudo, podem langar elementos que predisponham a populacdo a uma posterior reflexdo e ado sobre 0 seu cotidiano, &, nesse sentido, sfio processos valiosos que podem de sembucar cm organizagao social “O instrumento prineipal para agio comunitétia & a (...) orga izago social; nio entendida como simples estrutura formal, mas como articulagao consciente, permanente, dinémica, dos grupos de wma po- pulagao, ao redor de interesses comuns, objetives reais, mas pereebidos voletivamente, que alimentam agGes coordenadas © que buscam sa: tisfazer a esses interesses coletivos” (Pinto, 1980: 11) A organizagao, como se percebe, supde conscientizaguo ¢, por sua vez, é meio para que esse processo se amplic. Articnlagdes internas © externas o nivel individual, grupal o institucional sio elementos pré- 93 prios da organizagio social, enquanto expresso da forga social da populacia. F através dessas articulagdes que se chega a formas con: eretas de enirentamento da realidade, jo para as condigies existenciais da A organizagao social é também provesso qute se dé em situa Ges concretes c, nesse sentido, temese que Ievar emt conta os interesses dla poptlagao dentto de uma realidade historicamente dada. E importante que « populagio se organize © niv 36 a partic de objetivos bem definidos, mas também de todas as possiveis implicagoes que o enfrentamento desses objetivos supdem. A ayaliggito de realidade social concreta da populayio frente aos objetivos € importante para que se tenham presentes os recursos ne- cessirios a eles, evitando surpresas e frustracées, A andlise © avaliagto da realidade social coneteta ¢ importante, sobretudo para evitar que os fracassos venham a ser motives de recuo © esfacelamento do processo de organizayo cxistente. E esie processo continuo de reflendo sobre a realidade ¢ formas de enfrentamento que distingue a organizseao da grupalizacao e da mobilizevao. Numa comu- nidade pode existir uma diversidade de grupos sociais formalmente bem estruturados, mas socialmente insignificantes enquante expressiio de poder social presente & populagdo. A organizacio social como processo pedagégica, supée 0 exame das forgas internas ¢ externas que attam na diregio dos interesses © preacupacoes comunitarias; supoe o exame das aliangas que se faze com # populacdo, da significaedo dessas aliangas e das implicagdes: supée, também, a compreensio dos adversirios para que se tenham presentes ox adversdrios principais © aqueles que s6 cincunstancial- mente se colocam como adversities; e, ainda um exame das condigoes necessérias para que os adversérias circunstanciais passem para o [ado dos aliados, ampliando assim a forga social da populagao. © didlogo, individual ow gnipal, & elemento fundamental para o processo de organizagio ¢ através dele deverse tcr claro os objetivos principais da aco, os intermedidrios e os imediatos. A clareza na dimensio deve ser continuamente retomada a fim de que os motives imediatos ¢ circunstanciais da aco nfo venham a atropelar os objetivos principais © dimensionamento claro desta vealidale € fundamental para que 0 processo de organizacao avance como resposta aos interesses da populacio. 94 4.3. O proceso de capacitagio A sociedade cria ¢ rectia continuamente novas estratégias de teprodugdo social, implicitas em legislagées espeeiicas que vio sendo criadas; em noves aliangas que se fazem © destazem, em novos servi- 0s sociais eriados ow novas formas de liberagdo dos ja existentes, ou ainda através de instituigdes espeeificas que se justificam como res- posta as exigéncias da problemética social. E através deste eriar © re criar que, muitas vezes, 0 proceso de organizacao da popwlagao, ja adiantado, € apropriado, desviado ou simplesmente deserticulado. E nnesse sentido que a participagio supée um proceso continuo de capa. citaedo cla populae#o para que, em conjunto, se descubram também novas formas de reavaliagdo social em seus enfrentamentos. Essa re lualizagdo supde, por sua vez, capacitagso para anflise © avalingio continua da conjuntura social, a fim de poder situar-se na prépria dinémica das foryas soctais que se v8 fazendo presentes & sua rea: fidade mais. préxima, “Capecitagdo & um processo em que a populagio passa a assumir gradatlvamente 0 seu préprio processo de conscientizacao e organizagao © se torna capaz de estender « stia experiéneia ao todo social, pene- tvando mais a fundo na esséncia dos problemas ¢ eaplando as contr dligaes sociais a que esté submetida, Como tal, pereebendo mais a es stncia da sua realidade social, tenta encontrar novos modos de agi que respondam mais diretamente aos seus problemas” Souza, 1982: 134) A capacitagio como processo pedagézico supée estimulecio & (oramento 2 papulagio, para que esta tenha meios de apreensio continua da reulidade social ¢ soba analisé-la, situando os scus inte- vesses, assim eomio as novas injungdes € redefinigio dos eanais de co- Munieagdo que sustentan a ergenizagao, Supde também instewmentali- zacio da populayao para elaboraciio sistemitien dos projetes reforg dores das reivindicagSes, para u realizagio de pesquisas necessérias €0 embasamento de suas lutas, para crlacdo v utilizagao de instrumentos necessirios de comunicapao com os diversos grupos sociuis que a com- per, para conhecimenios das leis ¢ politieas que the dizem respeito A capacitagao die respeito também as relacdes da populagao com as Instituigoes, © que requer compreensio da politica intema ¢ externa dessis instituigdes. A capacitagéo & um processo em que as experiéncias realizadas servem de base para a implementagda das novas. & nesse sentido que if se pode prever as exigtnetas ¢ condigdes materiais ¢ institusionais de 95 certas reivindicagées, Outro aspecto @ considerar na capacitagio é 2 divisio de trabalhos de modo a se assegurer a agio de todos; a ad ministragao das ages é também outro elemento de capacitayio, pols exercita © controle ¢ avaliagao coletiva das agoes. A capacitagio arregimenta suas bases em algumas estruturas de apoio do tipo associagSes locais, regionais © nacionais ou outras ent dades representatives. Esias esttuturas de apoio podem requerer uma base material que, no entanto, nfo se confunde com os objetivos prin: cipais das ages a serem desenvolvidas pela pepulagio de conformidade com seus interesses & preacupagses. A capasitacdo corresponde, sobretudo, ao proceso de implemen tagfio de novas ages definidas a partir da avaliagio de experiéacias jd descnvolvidas © nas quais se fazem presentes os provessus de cons cientizacao © capacitacao Como se pode depreender, a cons. sapacitagio nao so mais que elementos de um mesmo processo que, no todo, formam 0 processo da partivipagdo. E na implementagio cons. ciente e sistemdtice desses processos que @ participasio social se sorna essencial ao préprio DC e ao desenvolvimento global 96 JLO Vil Conjuntura social -Movimentos sociais e politica social A realidade comunitiria, objeto da acto do DC, é parte de ume conjuntura mais ampla e, por sua vez, dentro dos limites da sua es trutura bisica © social, possul também conjuntura propria. A conjuntura social, caracterizada como conjunto de atores & correlagdes de forgas presentes a determinado momento hist6rico, & representada, sobretudo, tomando por base determinade cenério, ne qual se fazem prosentes acontesimentos diversos No cendrio da realidade brasileira, o sistema social dominante, tende por base relngdes socinis capitalisias, & cada vez mais poderoso ¢ a8 principais Forgas atuantes ultrapasseam as frontelras do nacional © so também ultrapassadas por forgas internacionsis. Nesse sentido. conhecer © analisar a conjuntura sccial brasileim supde lever em conta as articulagdes que estéo além dos limites do seu proprio cend- fio, Por sua vez, analisar outras conjunturas menores, em Ambito local ou regional, supte Ievar em conta © jogo de forgas preseutes & conjuntura brasileira A comunidade se constitui cenitio onde um conjunto de atores expressam relagdes © correlagdes de forgas que a identificam como realidade especifica, mas, a0 mesmo tempo, implicada em dispasigdes presentes a uma conjunture mais ampla, cuja realidade tem sues de- terminacdes na prdpria estrutura social. Conhecer a realidade comu- nitévia a sev teabalhada implica conbecer a sua conjuntura sovial. E oF nesse sentido que se faz necessiria a anslise dessa realidade enquanto conjuntura “A anilise de conjuntura deve lever om conte as articulagbes dimensdes locais, regionais, nacionais ¢ Internacioneis dos fenémenos, dos acontecimentos, dos atores, das forgas sociais. A importéncia dos elementos na andlise “de conjuntura degende de cada situagdo da relago cu posigdo num contexto mais amplo e mais permanente” (Souza, 1984: 16-7), A comunidade € parte do cotidieno da populacio e, como tal, expressi a reagio desta ante a sua prépria realidade social mais am: pla, a realidade das relagdes socials capitalistas dominantes no pais, Sobre estas, diz. Castells “ (...) a realidade do desenvolvimento capitalista avancou, co mo regra geral, paralelamente 20 desenvolvimento do movimento ope rério © democritico, ¢ com a conquista por este dltimo — ao menos em determinados paises — de liberdades politicas e de garantias so- ciais no concernente ao nivel de vida. Desembocamos deste modo ua enigéneia social historicamente definida de uma serie de diritos & Vide (...) arrancados & burguesia e aos aparelhos de Estado e eujo teatamento social, & medida que transcore o tempo, se faz cada vex ais coletive © interdependente” (Castells, 1985: 6) No Brasil, a consolidagio do desenvolvimento urbano industrial pde em evidénela a chamada questio social, que se define « partir da consciéncia social da classe trabalhadora quanto a sua realidade ¢ quanto aos seus dircitos sociais. A questde soctal, no entanto, faz com que o Estado reatualize suas funcdes até entdo caracterizadas mais pelo exercicio do eontrole ¢ da reprossdo. A eriagio da Justiga do Trabalho, da Previdéneia Social e de condigoes para reconhecimento e legali- zacio dos sindicatos é indicativa dessa reatualiza realidade do Estado, diz Castells (1985; 8) io. Alids, sobre essa “Ante o desenvolvimento deste novo campo de contradigées, assis- times a um intento de gestio ¢ de previsio destes problemas através de um conjunto de medidas, instituicdes ¢ préticas que constitnem 0 que poderia denominar-se o sistema de planificagio urbana através da qual o aparato do Estado pretende (...) superar os contradigdes e apaziguar os conflitos, em nome de uma nacionalidade técnica através da qual poderiam conciliar-se imteresses sociais divergentes”. 98 No Brasil, a partir da década de 30, 0 Estado assume um conjunto de politicas que interferem diretamente mo cotidiano das camadas po- pulures, € alos politicos so continuamente redefinidos. Avonteee que também ¢s trabalhadores, em seus movimentos e lutes, detinem e rede finem os seus canais de enfrentamento. Alguns destes so sumamente contradiséries. O sindivato, por exemplo, 6 canal dos mais importantes para veiculagao das agbes ¢ relvindicayoes do trabalhador mas, ao mes- mo tempo, € penctrado pelo Estado, ume vez que esta vinewlado wo Ministérie do Trabalho. © trahalhador tenta também outros canais de uta, como a imprensa, © partido, outros tipos de associagées, se bem que € 0 sindicato 0 seu canal Ge [uta mais Importanie, A comunidade, atraygs das diversas formas de associaedes que apresenta nas tltimas Usoadus, tom sido tomada como base de agio ¢ reivindicagto de divei- (os ¢ coniligdes bésicas ce vide por parte des camadas populates. [A comunidade expressa 0 cotidiano da populagio, sobretudo nas contradigSes que, ne consumo, roflotem as suas condigSes de trabalho. essus condigées influem na vide da comunidade a qual, por sua vez, influi também na realidade de trabalho, ambas fazendo 0 cotidiano de populagdo. O conjunto das relagées presentes a este cotidiano feito sobeetudo por clementos da conjuntura mais ampla, entre os quais se destacam os movimentos socials © a politica social, Nesse sentido, estudar e analisar a conjuntura social da realidade que é objeto do processo pedagégico do DC supée, sobretudo, analisar a di- tuamica da politica vocial ¢ dos movimentos sociais nessa realidade, 1.Os movimentos sociais Movimentos sociais sio formas de enfrentamento das contradi- es sociais quie se expressam em reagSes coletivas a algo que se apte senta como bloqueio ou aftonta aos interesses ¢ necessidades coletivas de determinado grupo social Entic os diversos estudos recentes averca dos movimentos sociais, alguns se distinguem pelo cnfoque da totalidade. Outros atentam, so- bretudo, para particularidades, relagdes e correlagies manifestas no cotidiano das lutas populares, Para Castells, © que se tom até agora sobre mavimentos sociais é uma reflexiio em curso que trata de cons- suis uma teoria sobre os mesmos. Para Alain Touraine “Qualquer que seja a abordagem mais ttil, 6 essencial é que um movimento social/s6 existe se combinar tais dimensbes: classe, nago, 99 modernizagio, ou, mais exatamente/ se fala em nome de uma classe contra outra, em neme da nagio contra a estrangeiro dominante, em nome da modernizagio ¢ da integragio contra a tradigéo € scu bitola- mento;’ (Touraine, cm Albuquerque, 1977; 42). sa hltin Tovraine tem em sua andlise uma perspective de toulidade social, também encontrada nas preocupagdes de Castells ao falar sob movimentos socials urbanos: “ne G...) para comprecndet o desenvolvimento ¢ © significado dos movimenios sociais arbanos dentro do capitalismo avangado em geral, € necessitio situé-los, por-um lado, com relago A Iégiea estrutural do sistema e } sua expresso na crise urbana; por outro, com rela e de hegomonia da burguesia monopolisia no scio do Estado e as caracteristicas atuais da luta politica na dupla perspectiva da de- moeracia e do socialismo” (Castells, 1980: 20) As formulagdes tedricas sobre os movimentos sociais comegam a aparecer na década de 70, iniciando-se na Franca ¢ itradiando em segttida por diversos outros paises. Tanto na teotia como na pritica esses movimentos sé hoje tema de relevaneia ¢ interesse das mais sliversas categorias sociais, revelando tendéncias as mais diversas ambi- ailidades. B nesse sentido que pensar os movimentos sociais requer um pensar eritico © dinamico A importancia dos movimentos sociais esid no papel que eles passam a desempenhar no processo de organizagio popular. Esse pro- so acontece & medida que a populaco supera as saidas indlividuais © recorre @ alternativas coletivas, Todo um eonjunto de situagies de vida passa a ser percebido em seus aspectos comuns coletivos e, como tal, passa a ser descoberto em sets aspectos sociais. A populagio, liber- tando-se da culpa pessoal introjetada pelos valores soviais dominantes, passa a perceber a realidade do social e tembém a descobrir meios de enfrentamento coletivos para enfrentar a problemsatica soctal Os movimentos socials sao, pois, um tipo novo de associativisme © organi social, que amplia sua importineia & medida que se urticula com os meies j& conhecidos de enfrentamento da populacao lrabalhadora, Esses movimentos, em suits formas de lute e enirenti- mento, podem ser — moyimentos operirios; — movimentos surais; — movimentos urbanos. 100 Em seus aspector gerais, os movimentos soviais se expressam airavés de formas variadas de enfrentamento dos problemas eotidianes, tais como: passeaias, saques, comités contra © desemprego, vomissoes de fabricas, invades, quebras-quebras, associagdes diversas, ete. O desencedear de um movimento tem como suposte: — a materializagiio das contradigSes sociais) — a existéncia de ama relagiio; — a exisidneia de objetivos « realizar; — a existéncia de formas estratégicas de enfrentamento; & — a existancia de confronta entre classes. Felando sobre os movimentos sociais urbanos, diz Orlando Soenz que a sua teoria tem obtide muitos avangos, sendo possivel em todo movimento distinguir os seguintes elementos: 0 contetido estrutural, a base social, o ambiente territorial, a organizagéo, as reivindicagaes, a forga social, as agées, os adversaries, as reagdes, @ linha politica € os efeitos (Soenz, 1985: 104) E importante que se tenham elementos de andlise a nivel das manifestagdes que acarrem no cotidiano, uma vez que € a partir do cotidiano que se pode aprender © que caracteriza o movimento social como processe que responde & proprie dinamica da tolalidade social As expressécs manifests dos processos de movimenios sociais por vezes correspondem a mobilizagoes geradas por grupos heteroge- neos. Por exemplo, as mobilizagdes especificas do negro, do indio, da muther, Nao hd diividas que esses movimentos assumem suas peculia- ridades, mas também estio atravessados © permeados pela caracteris- tica de classe dos sous membros. Mesmo mobilizacdes interclassistas do tipo daquelas ditigidas aos problemas do consumo, aos problemas ecoldgicos, 4 defesa do patriménio, ete, podem ajudar as camadas po: pulares a despertarem para a realidade de sua cidadania, Em primeiro lugar, a mobilizagio ajuda a despertar a solidariedade, Referindo-se ‘aos movimentos ecologistas diz Magdalena Baron (1985: 38): “Existe neles potencislidade suficiente para despertar_ um pro- excco de formagée de ama autoconsciéncia coletiva, O movimento nas- ce a partir de um problema local, imediato, concrete, ¢ seu desenvol- vimento tende a ampliar as reivindicagoes « esferas mais amplas da realidade social; assim, nfo esto intimamente ligados com 0 fend- meno que inicio a mobilizagio” 101 Entre as representacoes dos movimentos sociais, € 0 movimento Popular urbano © que mais se caracteriza como fendmeno préprio da atualidade, merecendo, portanto, algum destaque. Estes movimentos esto ligados, sobretudo, & instéincia da reprodugao, Af esté um espago novo de associagao e exereicio do poder popular, residinda também a sua importancia na dimenséo que assume de fazer a relagéo repro- ducio/produgao. Movimento Popular Urbano é 0 esforgo coletivo e organizado da populace pobre na tentativa de solucionar a seu favor as contradigées engendradas pelo desenvolvimento urbuno capitalista Os referidos movimentos respondem 2 problemas cotidienos das reas urbanas, especialmente aquelas caracterizadas como éreas de moradia. Os problemas de transporte, égua, luz, creche © moradia estéo na ordem dos enfrentamentos prineipais que expreseam tais mo- vimentos. Como os enfrentamentes se situam, em geral, na area do consumo coletive, questo importante & a relagio entre os chjetivos mediatos serem aleancgados e os objetivos mediatos de organizagiia social da prdpria populagdo, Uma ultrapassagem dos objetivos ime- diatos para objetivos mediatos pode se dar através dos segutinies indi- cadores: — existéncia de processos continuios de articulagao © organizagiio social a partir dos objetives imediatos a serem alcangedos; — exereicia de deciso © conirole nas agses defi das exigncias do consumo coletive da area; — presenga politica da populacdo nas instituigdes da frea e na quelas que, pelas suas fungdes © objetivos, esto relacionadas em fungéio Os movimentos populares urbanos, por se caracterizarem pela defesa da satisfayao das necessidades basicas ¢ qualidade da vida his- loricamente conquistadas, supdem exercicias de organizagio e controle que tém a ver com os enfrentamentos requeridos pelas relacdes de produgao. A grande importancia dos movimentos sociais urbanos esta ho exerefcio de organizacio ¢ enfrentamento que se dé em geral a partir dos problemas do consumo, Inicialmente, @ que aparece € a questo imediata a ser resolvida; porém, jf & medida que esta questo consegue superar conscientemente as solugdes individuais © descobri: @ nocessidade de saidas coletivas, a organizagao passa a tomar a die mensao necessaria de um movimento social. 102 ites das manifostagdes coletivas Ll, Fragilidades © Os movimentos populates requerem percepgo © andlise, nae quais a conscigncia que se tem das suas manifestacdes vé além daguela espontinea, normalmente existente nas saidas individuais encontradas es desenvolvidas estrategicamente. pata os problemas, Requerem ag Requerem, objetivos claros quanto go que se pretends aleangar. Eles encontram sua identidade na hist6ria de lutas da populagéo, na sua trajetéria, As deseontinuidades no curso da histéria sio elementos da prépria trajet6ria, que supdem praticas de lutas e resisténcias nem sempre reconhecidas publicamente. Esses elementos preeisam ser con siderados para que nfo se venha a minimizar esses movimentos, ow simplesmente identifici-los como sendo uma forma qualquer de mani- estagio caletiva ow comosio social Nao se deve minimizar as movimentagdes © mobifizagoes popula- cos, mas ao mesmo tempo é preciso ser suficientemente critico para nao se cair no “festival dos movimentos socials” onde toda © qualquer movimentagio passa a ser computada como reagao de classe, como modo de enfrentamento das contradigdes sociais fundamentais. F ne: ses equivocos que se encontram as fragilidades ¢ limites prineipais de todo esse eneantamento que € dado hoje aos movimentos sociais. As fragilidades ¢ limites dos movimentos sociais se expressam sobretudo polas tendéneias dominanies que muitas vezes passam a caracterizar fas movimentagSes_manilestadas 1. A redugio dos mavimentos sociais a simples movimentacées em busca de condigdes de consume, euijos Jinimos se esgotam & me dida que © intento conseguido. Esta realidade Ihes da um carter meednico, por vezes, contrério & sua propria signifieagao social, Nao se pode desconhecer que populugio vive hoje problemas urgentes de consumo, tendo mesmo que apelar para solugdes imediatas. A fra- gilidade esti cm reduzir a movimentagio a um abjetivo imediato, out a agées isoladas, 2. A tendéncia de algumas movimentaySes comunitirias reconsti tuirem os caminhos tradicionais do associativismo, reduzindo as orga- nizages sociais a organizagdes formais, a eanais de reprodugio da propria ordem social, Muilas associagoes de moradotes, de amigos de bairro, clubes de mies, associngdes de pais ¢ mestres, grupos de jo- vens, etc, tendem a esta formalizagdo, apesar de identifieados como 103 clementos manifestos de movimentos sociais. Os abuixo-assinaclos tam: bem se colocam nesse mesmo nivel, quando nao acarrelam nenhuma implicagio a nivel de reflexao ou da aco da parte dos que assinam, 3. A tendéncia ao corporativismo ou a manifestacdes de deter minados grupos sociais, que passam a constituir as suas lutas fechados om si mesmos, tentandy retirar do Estado o ma ‘atentar para a problemética maior da sociedade dade iximo do proveito, sem As lutas da universi- - estudantes, professores — tém sempre nesta tendéncia uma caracterfscica dominante. 4. A tendéncia populista, que coloca todas as camadas sociais ‘ho mesmo barca, com os mesmos problemas, deseonhecendo a proble- mitica de classe da sociodade, assim como mentais, as suas contradigoes funda 5, A tendéncia das camadas populares se fazerem presentes aos movimentos levadas pelo costume de obedecer oxdens, do Estado através das instituigs. ia + passam a obedecer a ordens de alguns grupos que tudo comandam e tudo decidem £ importante que as manilestag z S nas quiais se fazem presontes (ais tendéncias sejam observadas © analisadas, nao para ignoriclas em sua importaneia enquanto processo social, mas pele para que se possa des- ‘88 suns poteneialidades como manifestagoes possiveis de se tor- harem expressoes verdadeiras de movimentos socinis, 1.2, Aspectes histéricos dos movimentos sociais no Brasil No Brasil, 08 segmentos majaritirios da populagiio foram eon: dicionados sempre a uma posigio de suburdinagdic, De inicio foi a populagao nativa, levada a subordinagae aos colonizadores portugueses em seguida, a populagio negra © também gtande parte dos imigran- tes europeus Examinando ¢ tentando reconstituir « histérie desses camadas majoritérias da populagéo um efemente nove que se pode depreender, nao figurante na historiogralia mais comum, so as Iitas ante minacio a que so submetidas. Sao inimeras do- > as formas de reagio da populacio nativa. Entre es negros, podese destacar a Reptiblica dos Palmares, esiabelecida no Estado dle Alagoas. Entre os imigrantes, ae Formas de reagao eontavam inclusive com a experitucia curopéia, los onde a histéria de Iutas dos trabalhadores é bem mais antiga, A com solidagio do trabalho urbane © a ampliagio dos aglomerados urbanos no inicio do século XX fizeram com que as lutas dessa populacgo aleangassem tuma expressiio maior na articulagio e nas condigées de aglutinagdo, Essay lutas, no entanto, passaram a conviver com fases continuas de ascenséo ¢ depressio, apesar de sempre presentes & socie dede brasileira, * (...) nos anos de 1905-1908, dase a formagao da federacéo operiria de Sao Paulo ¢ se realiza 0 Primeiro Congreso Opersivios ovorrem duas grandes greves em Santos (1905-1908), a geeve ferro- viéria da Paulista, a greve generalizeda de maio de 1907 em Sao Panto, a paralisagio dos sapeteiros na capital da Repiiblica (1906)"" (Fausto, 1976: 135). Boris Fausto, om sou livro Trabathio urbano e conftito sacial apre- senta todo um conjunto de agdes € lutas desenvolvidas pela populagao trabalhadora na Primeira Repiblica. Edgard Carone (1984), em Mo- ‘nento operdrio wo Brasit, também realga a disposigiio de Iutas da populagéo trabalhadora em face da sua realidad: de exploragio e do- minagaa Os controntos, as Iutas que destacam os movimentos seciais na atualidade, tém a ver com a historia de jutas da populacdo trabatha- dora. No Brasil esta historia tem um dos seus capitulos importantes a partir da Segunda Repitblics, quando consolidacio da economia ur- bano-industrial fex com que esas lulas passassom a fazer parte do cendrio politico do pais. £ a epoca em que as lutas passam a ser gestadas com certa consciéneia de classe ¢ nfo como forma instintiva © parcializada de reagéo. A problemitica maior da populagio trabar thadora passa a ser reconhecida como problemétiva coletiva, que, pot tanto, deve ser enfrentada eoletivamente. Como meio de enfrentamen- w coletivo, tenrse como lugar privilegiadlo o sindicato "Fra através da organizagao sindical e de suas hutas que se pen- seve tocar a contradigGo principal do sistema cupitalista 6, portanto, © ataque a partir desta trincheira era chave prineipalmente para a mu- danea do sistema” (Queiroz, 1985). © que surgiu de novo a partir do final da década de 60 foi a descoberta de que néo € tée-somente o sindicato que se coloca como chave para os enfrentamettos coletivos da populagéo trabalhadora ante as contradigées sociais. 105 A degeneragao das condigées de trabetho da populagao traha- Ihadora c/a baixa erescente do poder aquisitive dos salérios, assim como os condicionamentos politicos a que foi submetida esia popula. Gio, impuseram a descoberta de novos caminhos para as suas lutas nfo s6 no Brasil, mas em toda a Amétiea Latina Nas iiltimas décadas, © Brasil alcangou um ritmo acelerada de erescimento econdmico. A politica econdmica do pais favoreceu este ritma, estimulando @ industrializagdo através da entrada do capital monopolista permitindo o estabslecimento de toda uma teenologia poupadora de mio-de-obra © favorecedora da acumulagto capitalista. Por outro lado, teve-se coma resultado a pauperizago cada vez maior da populagdo, manifestada na faixa erescente de desempregados © na reducao também crescente do poder aquisitive dos salétios. “Malgrado jé ser 0 citavo pals do mundo eapitalista, em termos de produto industrial, no Brasil os saldrios so baixissimos, mesma quando comparados as sociedades de incipiente industrializagéo" (Kowarick, 1984: 65), A pauperizacio tem a ver também com a penetragio do capita Jismo no campo, Esta penetragio tem, como conseqiiéneia, a concen: ‘ragdo da estrutura fundiéria em grandes propriedades, a monocultura a penetragio de tecnologia poupadora da méo-de-obra © as novas for. mas de relagdes de trabalho que supdem a expropriagao da terra € dos instrumentos de trabalho sujeitando 0 homem & expulsiio do cam- po, vindo este « somar-se aos desemprogados ¢ subempregados da dre urbana. Em 1940, 60% da populagao morava na cidade. Atualmen- te a siluacdo se inverteu e a problemdtica social se agudiza nas éreas urbanas, uma vez que af se concentram cada vez mais a pauperizagaio © a miséria, No urbano, a agudizagdo da problematica social ¢ reforgada ta bem pelas novas formas de exploragao do solo. A especttlagio mo! hidria, resguardada pelo Estado através da politica estimmuladora de investimentos urbanos, influiu no prego do solo urbano. Por outro Indo, deve-se ainda considcrar as empresas de construgao civil, que condicionam os altos pregos de moradia. ‘Tem.se, portanto, a nivel de proeosso econdmice, de um lado a valorizagao excessiva dos bens necessdrios & reprodugao da existéneia humana, ¢, de outro, a excessiva desvalorizago do trabalho. Para retomar 0 poder aquisitive dos salirios, os trabslhadores ampliam suas los. horas de trabalho ¢ incorporam novos membros da familia, a mulher, 9s filhos menores, ete. Perante a realidade eeonémica do trabalhador, ainda se tem a considerar a sua realidade politica, coneretizada através das suas rele- ges com o Estado. Para garantir a plena realizago da capital, 0 Estado, na década de 60, institui uma série de mecanismos de repres- 10, desestabilizando as diversas organizagdes e repriminds toda e qual- quer manifestagdo originéria dessa classe. Foi nessas condig6es de exploracdo, pauperizagao € repressio que, nfo s6 no Brasil, mas também em toda a América Latina, os movie ments socials passarain a se gestar como noves formas de tocar contradicéio fundamental da classe trabalhadora. B esses movimentos im tido, na maioria das vezes, como ponto de partida, os problemas coletivos do consumo. “Nestas condigées, as grandes mobilizagées populares so, na América Latina destes dias, mais pela defesa da satisfagao das neces- sidades bisicas da qualidade de vida que historicamente 0 povo havia conquistado que pelas reivindicagdes sindicais, Por esta razdo o lugar natural dessa mobilizagéo popular passou a ser prioritariamente o hairro”” (Queiror, 1985: 28). A emergéncia dos movimentos populares deve ser compreendida também em seus pontos de apoio, destacando aqui o papel da Igreja © de ouiras instituigées da sociedade civil. Estas instituiges vo von= tribuindo como ponto de apoio ajudando na descoberta dos espacos necessirios de confrontos ¢ enfrentamentos que materializam os mo: vimentos socials, Nesse sentido, os bairros © os espagos de moradia ttm sido locais privilegiedos para esse apoio. Na dindmica evolutiva dos movimentos socials, 0 Estado tem desempenhado varios papéis, considerando principalmente que estes imovinentos supaem relagio de confronto, enjo alvo é sempre o Estado ‘A compreensio dos movimentos sociais nao pode, portanto, ser con- siderada como fendmeno parte em relagdo ao Estado, “Para aprender os movimentos seciais urbanos hoje, nfo se pode minimizar as transiormagdes ecotridas no seiv do aparelho es: fatal nos tiltimos anos, O Estado a partir dos meados da década de 70 passa a responder acs movimentos através da implementacio de politicas sociais globais que gorum por sua vez expectativas de de. manda” (Jacobi, 1984: 72) 107 No Brasil, a partir da segunda metade da déeada de 70, 0 Estado assumiu posigao mais flexivel umte as eamadas populares, criandose também alguns espages para a solidificagao dos mecanismos de reagao social que se vinham gestando nos titimas anos da década de 60. A propria derrota do partido do governo nas eleigdes de 1974 fez o Estado apereeber-se do seu distanciamento ante a sociedade civil, € isso levou « novo direcidiamento da sua politica sociel Entre as possibilidaces das manifestagSes colotivas — apesar de suns fragilidades — um aspecto a considerar so as oportunidades de articulegéo © organizagao social possivels de serem criadas a partir do proprio Estado. Enfim, 0 stado nao se define como um bloco monolitico do poder, mas como uma correlagdo de forgas consticuida (ainbém pelas camadas populares, Além do mais, os movimentos soviais, como elementos da sociedade civil, nfo conseguem desenval- ver suas acdes de forma estanque em relagdo ao Estado © suas insti suigdes, assim como ndo se pode pensar limites rigidos do Estado dante da sociedade civil. Em tese, 08 movimentos soziais trubalham sobre o legitimo, © 0 Estado, sobre o legal, Nesse sentido, muitas reivindicaydes tem as suas Fespostas necessérias logo institucionalizadas pelo Estado. Ocorre que © processo de legalizacio de niitas reivindicagdes, por vezes, tem sido dado come meio de dispersar a populagio, nao sendo posterior mente © mesmo levado A prética, Deste modo, a luta das camadas populares tem-se orientado para o cumprimento nfo sé do legitimo, mas também do legal. Esta dindmica continua das yelagies Estado-so- ciedade deve ser compreendida para que se possa tet uma compreen. so real dos movimenios popuilares. As agées e redefinigdes do Estado através da politica social estao estrcitamente vineuladss aos movimen- los sociais, ¢ estes, por sua vez, ndo podem ser devidamente compre- endidos se se minimizam as transformagées que vio ocorrendo no seio do aparetho estatal 2. A politica social A politica social tem sua origem estreitamente ligada ao desen- volvimento urbano industrial. Este desenvolvimento acentua as con- twatligSes sociais © essas, por sua vez, fazem emergir a chamada cons- cigneia de classe dos trabalhadores, Além dos problemas de explora. gio do trabalho, outros passum a somerse aos jé vividos pela 108 populagio majoritiria e, diante deles, essa populagao passa a reagir cetizando © que }é na Europa era tratado como questéo social Perante ela, 0 Estado se redeline em stas fungdes © passa a utilizar uma série de mecanismos institucionais de controle. preocupando-se com a politica social, até entéo fora de seu ambito de interesses. Pensar a politica social ¢ pensar a prépria dindmica conjuntural do Estado brasileiro a partir da Segunda Republica, Com o desen yolvimento urbanc-industrial © a consolidagao da questdo social, o Estado ja ndo mais ignora a problemdtica social. As fungdes repressi- vas exercidas na Primeira Reptiblica anie a problematica social emer- gente so redefinidas em te1mos de mecanismos de disciplinamento entre os quais se coloca a politica social As redefinigées © reatualizagées do Estado vio se precessando vontinuamente, & medida que as forgas sociais dominantes yao. im- pondo novas exigéncias de controle ¢ disciplinamento, Com politica de abertura ao capital monopolista na década de 60 o Estado amplia suas fungées, passando a identificar-se pelo planejamento. As institui ges a cle relacionadas passam igualmente # valorizar os planos © projetos que, em geral, nada tém a ver com a pratica desenvolvida, © Estado assume, posteriormente, também as funcdes de produtor, preenchendo os vaaios do sistema de produgio, Passa a responsabili zarse pela produgSo daqueles bens que requerem alto grau de inves timento © que nao so rentéveis a curto prazo. No exercicio das fun- sGes de produtor, o Estado associa-se ao capital monopolista, © que az com que suas politicas em geral se dirijam cada yez mais @ defesa desse capital. Num primeira momento, 0 capital monopoliste penetra no pais, associando-se ao nacional; em seguida este se associa ao proprio Estado produtor. A consolidagéo do capitel monopolista e 0 sistema de dependéneia politica e economica que se estrutura em relagao & metrépale fazem com que o Estado minimize suas fungies de regulagaio econémica e redefina de modo mais acentuado os scus mecanismos de disciplina- mento das camadas populares, Esses mecanismos diigem-se as camadas populares, mas respondem As exigéneias de desenvelvimento do capital Nao 6 sem razdo que o Estado assume, cada vex mais, um ter de ambigiiidade em suas politiens sociais. Fé nesse context de ambigtiidade que se coloca a politica social. O Fstado utiliza a politica social naa sé em funcio do discip namento € criagdo de espages politicos para o pleno desenvolvimento 109

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