Juristas, filósofos e sociólogos divergem quanto ao modo de
conceituar o direito. Como ciência social que é, o direito só pode ser imaginado em função do homem vivendo em sociedade. Seria impossível conceber a vida social sem pressupor a existência de normas reguladoras das relações entre os homens, determinando o seu comportamento no grupo social.
Qualquer agrupamento humano, por mais rudimentar que seja seu
estágio de desenvolvimento, possui um conjunto de normas, a regular a vida social, obrigatórias para seus componentes. Tais normas são acompanhadas de uma sanção e confundem, em alguns casos, a idéia de reparação com a de vingança. O anseio, contudo, é de punir o infrator. Nas sociedades evoluídas e organizadas politicamente, a sanção parte da autoridade constituída, em vez de se manifestar pela própria reação do ofendido. A norma possui força coercitiva, O que impõe sua obediência. A infração a um preceito cogente provoca uma reação do Poder Público. A palavra direito deriva imediatamente do latim directum. No Direito Romano, o vocábulo utilizado para exprimir o direito era outro: jus-juris, da raiz sânscrita ju, de onde jumentum (animal de carga, cavalo, burro, camelo) e jungere (jungir, atrelar). Mas, enquanto a expressão romana externava com oportunidade a idéia de jugo, isto é, do vínculo que o direito cria entre as pessoas, o designativo directum traz consigo a metáfora de que o direito deve ser uma linha reta, exatamente conforme com a regra. Assim, fundamentalmente, é direito aquilo que está conforme com as leis. Acepções: direito como o justo; regra de direito; poder de direito; sanção de direito. a) o direito como o que é justo: os jurisconsultos romanos já ensinavam que jus est a justitia appellatum, isto é, que o direito provém da justiça. A criação do direito não tem e não pode ter outro objetivo senão a realização da justiça. No ensinamento de Aristóteles, aperfeiçoado pela filosofia escolástica, a justiça é a perpétua vontade de dar a cada um o que é seu, segundo uma igualdade. Assim, a regra de direito, ao conferir um poder de direito, só será direito propriamente dito na medida em que atribuir às pessoas atingidas faculdades e obrigações que, por natureza, lhes sejam próprias. Noutras palavras, na medida em que atender ao direito justo (ex: atribuir o poder familiar ao filho sobre o pai e não ao pai sobre o filho; isso pode ser regra, mas não uma regra justa). b) regra de direito e poder de direito: regra de direito, na acepção ampla, é a ordem social obrigatória estabelecida para 2
regular a questão do meu e do seu. Constitui uma imposição da
natureza das coisas, e historicamente veio surgindo e aperfeiçoando-se gradativamente como fator indispensável ao convívio social. Os juristas também denominam direito objetivo, em contraposição ao direito subjetivo, o qual é constituído do poder de direito, isto é, do conjunto de faculdades que as pessoas têm, conferido pela regra de direito. Daí dizer-se, também norma agendi e facultas agendi.
c) sanção de direito: discute-se se existe ou não direito sem
sanção, isto é, sem a força do poder público ou dos grupos sociais que o torna obrigatório. Parece que a sanção não é da essência do direito, porque não é ela que o torna justo ou injusto. Mas, a nosso ver, é da sua natureza ter sanção, sem o que o direito seria inatuante.
d) conceito: “Direito é o conjunto das regras sociais que
disciplinam as obrigações e poderes referentes à questão do meu e do seu, sancionadas pela força do Estado e dos grupos intermediários” (Limongi França, Instituições, pag 7). No conceito encontram-se os quatro aspectos fundamentais do Direito: a) a norma agendi (conjunto de regras sociais): b) a facultas agendi (que disciplinam as obrigações e poderes); c) o direito como o justo (referentes às questões do meu e do seu); d) a sanção de direito (sancionadas pela força do Estado e dos grupos intermediários).
- segundo Kant, os juristas ainda continuam à procura do seu
conceito de direito: É de Radbruch, contudo, a mais singela das definições: “o conjunto das normas gerais e positivas, que regulam a vida social” (apud Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, parte geral, pag. 1).
Distinção entre o direito e a moral
Na vida em sociedade, estamos sujeitos à observância de
outras normas de procedimento, que não se confundem com as jurídicas. Podem ser simples preceitos de etiqueta (cumprimentar os semelhantes, vestir-se de acordo com as ocasiões, cujo desrespeito não provoca reação do agrupamento humano), ou normas que não se confundem com as jurídicas (gratidão, cortesia, urbanidade, educação etc.). Aparece, assim, a distinção entre o direito e a moral, que constitui um dos mais árduos problemas da filosofia jurídica.
É importante observar que para viver em sociedade, o homem
tem de pautar a sua conduta pela ética, de zoneamento mais amplo do que o direito, porque compreende as normas jurídicas e as normas morais. Conforme observa Serpa Lopes (Curso de Direito Civil, vol. I, pag. 15), não se deve confundir a moral com o direito. Cumpre, entretanto, assinalar-lhes as diferenças e pesquisar o grau de influência entre eles existente. 3
As ações humanas são regidas sob dois aspectos: a parte
subjetiva, correspondente ao campo moral; a parte objetiva, relativa ao campo do Direito. A moral traça as regras de conduta do homem, em relação ao seu próprio eu, mas desta relação do homem com o seu próprio eu nasce em grande parte a sua maneira de conduzir-se na sociedade, o que, necessariamente unida a massa dos indivíduos, não pode deixar de influir na formação da regra de conduta social, que é o Direito. Há determinadas noções de moral que são imprescindíveis à normação de determinados institutos, nos quais a regra moral atua forte e diretamente: por exemplo, a noção de boa-fé e de má-fé nos contratos.
Moral e direito são normas de conduta, que têm um momento de
incidência comum, mas que se diferenciam, quer em razão do campo de ação, quer no tocante à intensidade da sanção que acompanha a norma, quer no alcance ou nos efeitos desta. Serpa Lopes (Curso de Direito Civil, 7ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989, vol. I, p. 15/16), apontando a superioridade hierárquica da moral sobre o direito (a moral foi sempre considerada uma norma superior ao Direito positivo, em razão do que a ordem jurídica pertence à ordem moral, à qual fica subordinada), indica os principais pontos de diferença entre uma e outro: a) a apreciação da moral se projeta sobre o campo individual, nas relações do homem consigo próprio, enquanto o direito se projeta sobre as relações do homem com os seus semelhantes; b) o direito é amparado pela sanção estatal: se é desobedecido, pode receber o amparo da autoridade pública, ao passo que a moral tem como sanção unicamente a própria consciência do indivíduo;
c) enquanto a moral, muitas vezes, abrange obrigações não
atingidas pelo Direito, pois que este não tem por objetivo a perfeição moral, senão pura e simplesmente o padrão médio do bonus pater familias, por outro lado o Direito se distende com as suas normas a um campo absolutamente estranho à Moralr como certas normas de caráter puramente econômico ou de outras espécies de natureza amorfa, como o regulamento de tráfego e tudo quanto se funda sobre a utilidade social; d) a moral afeta a paz interior, enquanto o Direito a exterior; e) a moral não tem valia para quem não a aceita, ao passo que o Direito se impõe, mesmo em face daquele que porventura o ignorar, embora, em determinadas circunstâncias, se admita o erro de direito.
Em suma, embora não se confundam os campos da moral e do
direito, é indiscutível a existência de um entrelaçamento entre ambos. Na verdade, as normas morais tendem a converter- se em normas jurídicas, como sucedeu com o dever do pai de velar pelo filho e com a indenização por acidente do 4
trabalho.
DIREITO OBJETIVO E DIREITO SUBJETIVO
O fenômeno jurídico, embora seja um só, pode ser encarado sob
mais de um ângulo. Encarado como um conjunto de normas que a todos se dirige e a todos vincula, temos o direito objetivo. É a norma da ação humana, isto é, a norma agendi. Encarada como prerrogativa que para o indivíduo decorre da norma, tem- se o direito subjetivo. É a faculdade conferida ao indivíduo de invocar a norma a seu favor, ou seja, a faculdade de agir sob a sombra da regra, isto é, a facultas agendi.
Em outras palavras, conforme leciona Washington de Barros
Monteiro: se eu falo do direito romano, do direito civil em vigor, ou do direito de propriedade como instituição jurídica, a palavra direito representa um conjunto de regras que imprimem à atividade humana certa direção ou a encerram dentro de certos limites. Se, ao revés, falo do meu direito de crédito, ou do meu direito de propriedade, refiro-me a um poder que estende e dilata meu campo de ação sobre pessoas e coisas. Para exprimir a primeira situação, diz-se que a palavra direito é empregada em sentido objetivo, enquanto, para a segunda, ela é utilizada em sentido subjetivo. Direito objetivo é a regra de direito, a regra imposta ao proceder humano, a norma de comportamento a que o individuo deve se submeter, o preceito que deve inspirar sua atuação. É o direito enquanto regra e a cuja observância o indivíduo pode ser compelido mediante coação. Direito subjetivo é poder. São as prerrogativas de que uma pessoa é titular, no sentido de obter certo efeito jurídico, em virtude da regra de direito. A expressão designa uma faculdade reconhecida à pessoa pela lei e que lhe permite realizar determinados atos. O direito de propriedade, assegurado pela Constituição, é preceito de direito objetivo, dirigido a todos, indistintamente. A prerrogativa que dele decorre, para o titular do domínio, de invocar a norma, na defesa de seu interesse, é o direito subjetivo do proprietário. A norma de direito objetivo garante a posse. Assim, se o possuidor for turbado ou esbulhado em sua posse, tem a prerrogativa de ser nela mantido, ou reintegrado. Temos, assim, de um lado o preceito de direito objetivo , a norma agendi, que se dirige a todos. De outro, a prerrogativa individual, isto é, a faculdade conferida ao possuidor de invocar a seu favor e na defesa de seu interesse o preceito geral: facultas agendi. I)
DIREITO POSITIVO E DIREITO NATURAL
5
O direito pode ser concebido sob uma forma abstrata, um ideal
de perfeição. Os homens estão perenemente insatisfeitos com a situação em que se encontram e sua reação é melhorá-la cada vez mais. Assim, o direito positivo é o ordenamento jurídico em vigor num determinado país e numa determinada época (jus in civitate positum); o direito natural é o ordenamento ideal, correspondente a uma justiça superior e suprema.
Realmente, não se pode deixar de reconhecer a existência de
uma lei anterior e superior ao direito positivo. Leis existem que, apesar de não escritas, são indeléveis, jamais se apagam. Sobre elas descansa a vida das comunidades. Elas ordenam o respeito a Deus, o respeito à liberdade e aos bens, a defesa da pátria, e constituem as bases permanentes e sólidas de toda legislação.
Aristóteles, estudando as leis de mais de quinhentas cidades,
concluiu pela existência de certo Direito adotado invariavelmente pelos diversos povos, a par de outro, especial a cada um: “Existe, de um lado, a lei particular, e, de outro, a comum: a primeira varia conforme os povos e se define de modo relativo a eles, seja ela escrita ou não escrita; a lei comum é aquela que é conforme a natureza” (Retórica, I, XIII, 2) .
Observa Caio Mário da Silva Pereira que, fixando-se o jurista
na órbita do direito em si, "é forçado a reconhecer que acima do direito positivo, e sobre este influindo no propósito de realizar o ideal de justiça, ditado por uma concepção de superlegalidade, o direito natural sobrepaira à norma legislativa, e, com este sentido, é universal e eterno, integrando a normação ética da vida humana, em todos os tempos e em todos os lugares. Se alguma vez, sob o império de forças antijurídicas, declina o sentimento do justo, a humanidade supera a crise e retoma o seu caminho, procurando sempre o ideal de justiça, que se radica indefectivelmente na consciência humana" (Instituições, vol. I, pag. 6).
Assim, representa o direito natural o conjunto de princípios
ideais preexistentes e dominantes, universal e eterno, realizando o legislador obra má e injusta, sempre que dele se afasta. Segundo Lafayette, o direito natural é o princípio regulador do direito positivo, o ideal para o qual este sempre tende e do qual tanto mais se aproxima quanto mais se aperfeiçoa.
DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO
o direito objetivo subdivide-se em direito publico e direito
privado. Direito público é o destinado a disciplinar os interesses gerais da coletividade. A ele compete a organização do Estado (Direito Constitucional); a disciplina de sua atividade na consecução de seus fins políticos e financeiros, cuidando da hierarquia entre seus órgãos, das relações com seus funcionários etc. ( Direito Administrativo); a distribuição da Justiça (Direito 6
Judiciário); a repressão aos delitos (Direito Penal). Também
pertencem ao ramo do direito público o direito do trabalho, o direito internacional e o direito eclesiástico.
Direito privado é o conjunto de preceitos reguladores das
relações dos indivíduos entre si. Regula as relações entre os homens, tendo em vista o interesse particular dos indivíduos, ou a ordem privada: relações humanas que surgem dentro do âmbito familiar; as obrigações que se estabelecem de indivíduo para indivíduo, quer oriundas do contrato, quer derivadas do delito, quer provenientes da lei; os direitos reais sobre coisas próprias, ou seja, o domínio, e os direitos reais sobre coisas alheias (superfície, servidões, usufruto, uso, habitação etc.); e ainda as questões que se ligam à transmissão da propriedade causa mortis.
Subdivide-se em direito civi1, disciplinando a atividade dos
particulares em geral; e direito comercial, disciplinando a atividade das pessoas comerciantes. Dentre as normas de direito privado, umas são inderrogáveis e outras não. As primeiras denominam-se cogentes ou imperativas e constituem a chamada ordem pública. Leis de ordem pública são aquelas cuja observância se torna necessária ao interesse geral; qualquer disposição que as contrarie é fulminada de nulidade (casamento, ordem de vocação hereditária, as que reprimem a usura). Não podem ser modificadas pelos particulares. As normas dispositivas são derrogáveis pelas partes. Nelas não há nenhum interesse social a proteger. A relação é dominada pela vontade privada, que pode dispor de modo diferente do previsto pelo legislador. Exemplo: a gratuidade do depósito (CC, art. 628: o contrato de depósito é gratuito, mas podem os contratantes convencionar que o depositário seja gratificado).
FORMAS DE EXPRESSÃO DO DIREITO (“FONTES”)
As formas de expressão do Direito são os modos pelos quais o
direito se exterioriza. É a roupagem de que se reveste para vir à tona dos fatos da vida. Conforme leciona Limongi França, a doutrina tradicional tem-nas confundido com aquilo que impropriamente denomina “fontes” do direito. As fontes do direito, isto é, aquilo de onde provém o direito, são o direito natural e o arbítrio humano. As chamadas fontes formais não são fontes, mas, como preferimos dizer, por se J
tratar de solução mais correta, "formas de expressão do
Direito”, que “são os modos pelos quais o direito, latente na natureza das coisas, à face das necessidades sociais, vem à tona da vida para compor o que se denomina o sistema jurídico” (Instituições, p. 10). Ou, numa definição mais sintética: “os modos de manifestação das regras jurídicas”. 7
Há uma forma fundamental, que é a lei. Todas as demais são
formas complementares: o costume, a jurisprudência, o direito científico, os princípios gerais de direito e os brocardos jurídicos.
Para Washington de Barros Monteiro, fontes “são os meios
pelos quais se formam ou pelos quais se estabelecem as normas jurídicas. São os órgãos sociais de que dimana o direito objetivo" (Direito Civil, vol. I, p. 12), Classifica-as em diretas ou imediatas (a lei e o costume) e indiretas ou mediatas (a doutrina e a jurisprudência).
o art. 4º da LI assim dispõe: “Quando a lei for omissa, o juiz
decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Consagra, portanto, além da lei, a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Limongi França aponta a existência de dois enganos nesse dispositivo legal: a analogia não é forma de expressão do direito, mas simples método de aplicação da lei ou de outra forma; as formas não são apenas as indicadas no art. 4º, mas também várias outras, como a doutrina, a jurisprudência, os princípios gerais de direito e os brocardos jurídicos.
A LEI
Do ponto de vista interno, o conceito de lei leva em conta as
suas origens e os fundamentos de sua obrigatoriedade. Para os Romanos, "a lei é em geral a solene manifestação da vontade do povo (Alexandre Corrêa, Manual de Direito Romano, 1953, pag. 23). No mesmo sentido, mas com outras palavras, Rousseau conceituou a lei, no seu Contrato Social, como sendo a expressão da vontade geral. Já Duguit, ao referir-se ao tema, dizia: “a verdade é que a lei é a expressão, não de uma vontade geral, que não existe, não da vontade do Estado, que não existe também, mas da vontade de alguns homens que a votam. Na França, a lei e a expressão da vontade dos 350 Deputados e dos 200 Senadores que formam a maioria habitual J
na Câmara e no Senado. Fora daí não há mais que ficção e
fórmulas vãs".
Contudo, como bem coloca Limongi França (O Direito, a Lei e a
Jurisprudência, pag. 71) a virtude, como no mais das vezes, está no meio. “A lei não é, pois, fruto da vontade geral, 8
porque, como concebeu Rousseau, é ela, realmente, uma ficção.
Nem apenas o resultado da vontade dos parlamentares que a votam, uma vez que estes de certa forma estão subordinados às imposições da opinião pública, guardando, pois, direta relação com o prosseguimento de suas carreiras políticas”. Portanto, embora indiretamente, o povo atua na elaboração das leis. Relevante, neste aspecto,a iniciativa popular, prevista no art. 61, § 2º, da Constituição Federal. Este é, na verdade, O fundamento político-jurídico da lei. Não o seu fundamento natural que, antes, está na justiça intrínseca do mandamento, bem assim na capacidade para atender aos reclamos das necessidades sociais que o determinaram. Dai dizer Santo Tomás que as leis, quando injustas, não constituem leis, mas corrupção de leis, verdadeiros monstra legum. Do ponto de vista externo, vários são os conceitos de lei. A lei é efetivamente a fundamental das formas de expressão do Direito. A Constituição Federal, na própria declaração de direitos, assevera que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" (CF, art. 5º, inc. II: princípio da leqalidade). Por outro lado, o art. 4Q da LICC prescreve que somente quando a lei for omissa, é que se aplicarão os outros modos suplementares de expressão do Direito. Portanto, a lei é quem nos dá as linhas básicas do sistema e, além disso, é nela que encontramos a grande maioria das soluções dos problemas jurídicos. Para Washington de Barros Monteiro, a lei "é um preceito comum e obrigatório, emanado do poder competente e provido de sanção” (ob. cit., pag. 13). - é um preceito, isto é, norma, regra de proceder; comum, porque se dirige indistintamente a todos os membros da coletividade, sem exclusão de ninguém. - obrigatório: ela ordena, não exorta, nem teoriza. Ninguém se subtrai ao seu tom imperativo e ao seu campo de ação. - emanado do poder competente: se provier de órgão incompetente, perde a obrigatoriedade e, portanto, deixa de ser direito. Esse poder é o poder legislativo, exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (CF, art. 44). O poder executivo colabora na confecção da lei através da sanção, da promulgação e da publicação. Sanção (de sanctum) é o ato pelo qual o executivo manifesta sua aquiescência à lei elaborada pelo legislativo. É elemento essencial à existência da lei. A lei só se torna obrigatória depois de sancionada, promulgada (promulgação é o ato pelo qual o chefe de Estado atesta perante o corpo social a existência da lei, ordenando-lhe o respectivo cumprimento) e publicada (publicação é o meio adotado para tornar a lei conhecida). - provido de sanção (no sentido de coação): a sanção é elemento inseparável do direito e atua de modo direto, constrangendo o indivíduo a fazer o que a lei determina. 9
Embora com outras palavras, mas com os mesmos caracteres,
Limongi França assim conceitua a lei: “Lei é um preceito jurídico escrito, emanado do poder estatal competente, com caráter de generalidade e obrigatoriedade” (Instituições, p. 11).
CLASSIFICAÇÃO DAS LEIS
- no tocante à sua natureza jurídica: substantivas
(materiais ou práticas) são as que, propriamente, de modo substancial, definem os direitos subjetivos (são as leis de fundo); adjetivas (formais ou processuais) são as que estabelecem os meios judiciais de se fazerem valer esses direitosos(leis ou práticas) definem adjetivas meios sãode judiciais forma); asforma); direitos (formais de que, subjetivos ou se propriamente, (sãosão processuais) fazerem valer as as de direitos leis esses modo deestabelecem que substancial, fundo): (leis de os - no tocante à sua origem legislativa: federais, estaduais e municipais. As leis obedecem a uma hierarquia: a lei magna é a Constituição, a lei fundamental. Depois vêm as leis federais ordinárias (leis comuns, emanadas do Poder Legislativo): em terceiro lugar, a Constituição Estadual; em seguida, as leis estaduais ordinárias e, por último, as leis municipais. Pelo mesmo critério de hierarquia, as leis são constitucionais, ordinárias e regulamentares, estas últimas destinadas a desenvolver, no plano administrativo, os preceitos das leis ordinárias; - no tocante às pessoas a que se dirigem (ou critério da amplitude), as leis são gerais, especiais ou individuais. São gerais as que abarcam todo um ramo do Direito (os códigos civil, de processo civil, penal). Especiais aquelas que se ocupam com um aspecto particular do Direito, como as leis extravagantes, isto é, que não fazem parte dos códigos. Individuais as leis cujo mandamento não atinge senão uma pessoa ou um grupo de pessoas (p.ex.: a que concede pensão a determinada pessoa, a que defere autorização a alguém para pesquisa e lavra); - no tocante à sua duração, as leis podem ser: a) permanentes ou estáveis; b) temporárias ou provisórias. Permanente é a que, expressa ou implicitamente, não estabelece termo final para viger. Provisória a que se publica para vigorar durante um certo lapso de tempo (pode ser por um certo tempo ou para determinada situacão, como se dá com as leis de calamidade pública); - no tocante à sua finalidade, as leis podem ser: a) de ordem pública (preceptivas, absolutas, cogentes, coativas, imperativas, impositivas), as que têm por escopo ordenar: as leis de família; b) supletivas (ou permissivas, dispositivas, não cogentes, não coativas) as que têm por escopo suprir: as disposições sobre o risco na compra e venda (CC, art. 492); as partes podem dispor de outra maneira; c) positivas (as que concedem uma faculdade; d) negativas (as que negam uma faculdade – art. 1.521, I: não podem casar os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil); e) autônomas (aquelas cujo 10
mandamento subsiste por si: o art. 74 do CC, que estabelece
quando se dá a mudança do domicílio); f) complementares (aquelas cuja disposição tem por finalidade completar a declaração de vontade dos indivíduos (art. 1.902 do CC); g) integrativa (a que formula um conceito: o art. 1.196 do CC, onde se encerra a definição de possuidor); h) remissiva (a que, ao estabelecer sua regra, se reporta à disposição de outro mandamento: art. 1º, § único, da lei do inquilinato (Lei n. 8.245, de 18.10.91), que faz remissão a outras leis que regulam a locação de imóveis públicos, de vagas autônomas de garagens, apart-hotel e arrendamento mercantil - leasing); i) interpretativa, a que tem por escopo elucidar o mandamento de outra lei (ex: Decreto-lei n 9.760/46, que dispõe sobre os bens imóveis da União, categoria apenas indicada no código civil). - no que concerne à sua conformidade com a lei básica, as leis são constitucionais ou inconstitucionais, conforme estejam ou não em consonância com a Le Maior.
COSTUME
A principal das formas assumidas pela norma jurídica é a lei,
isto é, o preceito jurídico escrito, emanado do poder público, com caráter geral. Segue-se-lhe em importância o costume, também designado pelas expressões usos e costumes, direito costumeiro ou direito consuetudinário.
No direito antigo, devido ao limitado número de leis, o
costume desfrutava de larga projeção, o que ainda ocorre nos países de direito costumeiro, como a Inglaterra. No direito moderno, de modo geral, em razão de suas codificações, o costume tem atuação exígua, embora continue a brotar da consciência países moderno, costume de consciênciade tem popular, desfrutava direito modo de como geral, atuação manifestação larga costumeiro, popular, projeção, emmanifestação exígua, como razão como do odo que decontinue embora asuas direito. ainda Inglaterra. ocorre codificações, direito. a No brotar dao nos direito Por direito consuetudinário, ensina Windscheid, se entende aquele que é usado de fato, sem que o Estado o haja estabelecido. Segundo Ribas, o costume constitui um meio pelo qual o direito, latente na "consciência nacional", se manifesta, num estágio anterior ao da lei e da jurisprudência” (cf. Limongi França, Noções sobre o Costume, RT 359/39). Nas "Instituições", Limongi conceitua o costume como “a regra aceita como obrigatória pela consciência do povo, sem que o poder público a tenha estabelecido”(pag. 14).
Requisitos do costume: atualmente não se exige que o costume
para ter força legal apresente um tempo certo de vigência, como acontecia com a Lei da Boa Razão, que prescrevia o lapso mínimo de cem anos. Basta que ocorra, de modo a perfazer os seus dois requisitos fundamentais: a) o uso inveterado; b) a opinio necessitatis. Noutras palavras, é necessário que o costume esteja arraigado na consciência popular após a sua prática durante um tempo considerável e, além disso, goze da reputação de imprescindível como norma 11
costumeira.
- entre os Romanos, o costume tinha força de lei (costume
antigo ou costume diuturno). No antigo direito luso- brasileiro, as Ordenações Filipinas colocavam o costume em situação análoga à em que se encontrava no Direito Romano. Com a promulgação da Lei da Boa Razão, em 18.08.1769, passou-se a exigir que o costume, para fazer lei, preenchesse as seguintes condições: que não fosse contrário à lei; que fosse conforme a boa razão; excedesse de cem anos.
- a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(Decreto-lei nº 4.657, de 04.09.1942) trouxe, em seu art. 4º, referência explícita a essa categoria jurídica, F
reconhecendo-lhe força atuante “quando a lei for
omissa”....Também há referência ao direito costumeiro no Código de Processo Civil vigente (art. 373), nos seguintes termos: “a parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar". A prova é qualquer das admitidas em juízo: mas, se se tratar de costume comercial, requer certidão das repartições incumbidas do respectivo registro. - atualmente, o costume, para ser observado, deve perfazer os seus dois requisitos fundamentais: o uso inveterado e a "opinio necessitatis”• Washington de Barros Monteiro decompõe esses requisitos em: continuidade, uniformidade, diuturnidade, moralidade e obrigatoriedade.
- em relação à lei, o costume pode apresentar-se numa das
seguintes categorias: praeter legem, secundum legem e contra legem. O costume praeter legem desempenha função supletiva, nos termos do art. 4º da LI. Só intervêm na ausência ou omissão da lei (ex.: o costume relativo ao fornecimento de "vales", a titulo de recibo provisório). - o costume secundum legem é interpretativo (o preceito, não contido na norma, é reconhecido e admitido com eficácia obrigatória). - o costume contra legem não é admitido pelo sistema. Os costumes são admitidos excepcionalmente para suprir lacunas ou deficiências da lei: jamais poderão ser acolhidos pelos tribunais contra preceito legal expresso. Se há lei em vigor que prescreva em sentido contrário não é possível a formação da regra consuetudinária. - o CC refere-se aos costumes em numerosos textos: arts. 372, 569, inc. II, 596, 597, 615 e 965, n. I).
DOUTRINA (ou Direito Científico)
12
Segundo Limongi França, direito científico, também chamado
doutrina c' é o resultado orgânico das indagações e pesquisas dos cientistas do Direito. Seu valor como norma é inegável, pois é absolutamente necessário à integração do sistema, especialmente em setores não codificados ou em fase de transição, como o Direito Administrativo e o Direito Social. O mesmo se diga do Direito Internacional Público.
No direito romano, o caráter normativo da doutrina teve sanção
oficial expressa ao tempo do Principado. A certos jurisperitos eminentes era conferido o jus respondendi ex auctoritate principis. Seus responsa valiam como lei, para as partes e para os magistrados. Atualmente não existe isso. Não obstante, não deixa de ter o direito científico grande significado quer como elemento de produção das leis, quer ainda no que concerne à sua interpretação e complementação. A doutrina se impõe na medida de sua correspondência com a verdade jurídica e é definitiva se se trata de communis opinio doctorum (Limongi, Instituições, p. 17). Aliás, no direito romano, a doutrina consistia na communis opinio dos doutores. O chamado “tribunal dos mortos”, constituído por Teodósio II, tornava vinculativas as opiniões de Papiniano, Paulo, Gaio, Ulpiano e Modestino, sendo que, em caso de empate, prevalecia a opinião do primeiro, arvorado em presidente desse hipotético tribunal. O direito científico é constituído pelo conjunto orgânico dos resultados das indagações dos profissionais do Direito, especialmente daqueles que se dedicaram ex-professo à respectiva pesquisa. No direito romano, estava contido no conceito de jurisprudência. Conforme ensina Washington de Barros Monteiro, "conserva a doutrina, nos dias atuais, apreciável valor. Forma-se ela através dos pareceres dos jurisconsultos, dos ensinamentos dos professores, das opiniões dos tratadistas e dos trabalhos forenses. Por seu intermédio. depura-se e cristaliza-se o melhor critério interpretativo, a servir de guia para o julgador e de boa orientação para o legislador" (ob. cit., pag. 20).
JURISPRUDÊNCIA
Jurisprudência é o conjunto de pronunciamentos Judiciário, num
determinado sentido, a respeito de certo objeto, de modo constante, reiterado e pacífico (Limongi, Instituições, pag. 16).
Não se pode negar o papel que à jurisprudência está reservado
na formação do direito. Vários casos concretos, lembrados por Washington de Barros Monteiro, realçam a importância da jurisprudência: o reconhecimento de filhos de desquitados, após a dissolução da sociedade conjugal (que era vedado pelo art. 358 do CC/1916) decorre de uma série de julgados, que forçou a expedição do Decreto-lei n. 4.737/42 e da Lei n. 883/49; a 13
comunhão de bens adquiridos por estrangeiros, casados sob o
regime da completa separação, ante a presunção de que a mulher havia contribuído com seu esforço, trabalho e economia para a aquisição.
A jurisprudência é obrigatória na medida em que se reveste
das características do costume judiciário. E isto se dá com a aceitação comum, reiterada e pacífica, por parte dos tribunais. Diversificam profundamente os sistemas jurídicos contemporâneos quanto ao seu valor. Para o anglo-saxão, de direito costumeiro, é considerável a sua importância: a parte que tem em seu favor os precedentes judiciários ganhará certamente a demanda. No sistema latino, seu papel é menos significativo. Embora os precedentes constituam precisas fontes de consulta, nem por isso estão os juízes obrigados a segui-los. Por mais reiterada que seja, a jurisprudência não constitui norma imperativa, como fonte normal do direito positivo.
Necessário observar que a Emenda Constitucional nº 45, de 8
de dezembro de 2004, ao introduzir o art. 103-A na Constituição Federal, possibilitou a aprovação, pelo Supremo Tribunal Federal, de súmula com efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário (a súmula é instrumento que sintetiza o entendimento de determinada Corte acerca de uma questão jurídica).
Por último, não se admite a jurisprudência contra legem, o
que importaria em atribuir função legiferante a um órgão jurisdicional.
PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO
De acordo com o art. 4º da LI, "quando a 1ei for omissa, o
juiz decidira o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito""
Discute-se em que consistem esses princípios de direito. Uma
corrente, positivista, afirma que se trata tão só dos princípios esposados expressa ou implicitamente pelo legislador. Outra corrente, a científica estrita, reconhece além destes a possibilidade de recurso a princípios que "correspondem àquele ordenamento imanente às relações da vida". Uma terceira corrente, a científica propriamente dita, esclarece que, juntamente com princípios do ordenamento, aí se incluem os do direito natural. Esta última corrente é a mais correta, pois, como ensina Limongi França, “o bom senso é suficiente para mostrar que as disposições do mesmo ordenamento são impotentes para abarcar todo o complexo das relações sócio-jurídicas" (Instituições, pag. 18). Na verdade, o legislador inseriu, em nossa lei, a expressão “princípios gerais de direito", com o fito pré- ordenado de estendê-los ao Direito Natural (Princípios 14
Gerais de Direito, RT, 2ª ed., pag. 237).
Neste último livro, Limongi França propõe a seguinte técnica
para a aplicação dos princípios gerais de direito:
a) a utilização desses princípios como regra normativa só
pode ser levada a efeito à falta de lei sobre o caso da espécie ou sobre matéria análoga. É necessário também que a questão se não possa resolver de acordo com o direito consuetudinário; b) os princípios aplicáveis não são apenas os que informam o ordenamento e os demais princípios contingentes, senão também os essenciais, ainda que não agasalhados pelo legislador; c) os princípios do sistema escrito preferem aos do direito consuetudinário.
São exemplos de princípios gerais de direito o do
enriquecimento ilícito, por força do qual nemo locupletari potest sine causa, o de que ninguém pode obrigar a outrem, sem fato de outrem, o de que as convenções dos particulares não derrogam a norma de ordem pública etc.
BROCARDOS JURÍDICOS
A Encliclopédia Larousse, referindo o nome alterado do Bispo
de Worms, Burchard (ou Brocardus), como origem da denominação "brocardo”, define-o como “règle de droit exprimée en une forme énergique et concise" (regra de direito expressa de forma enfática e concisa). Na definição do Prof. Limongi França, brocardo jurídico “é a sentença concisa, em meio à qual, de modo elegante e mnemônico, se expressa uma verdade jurídica” (Instituições, pag. 18) . Diríamos que “brocardo jurídico” pode ser conceituado como forma sucinta de enunciar-se uma verdade jurídica evidente, a qual, por isso, dispensa demonstração e se impõe ao entendimento como princípio indiscutível, servindo assim à dedução de conceitos singulares dela decorrentes. o brocardo é também manifestação do direito científico, pois a legitimidade do uso das parêmias jurídicas está ligada à limpidez das fontes de onde são hauridas. Podem trazer excelentes subsídios ao esclarecimento de matéria de solução difícil ou duvidosa, mesmo porque, não raro, consubstanciam máximas que são princípios gerais de direito. São exemplos de brocardos jurídicos (citados por Carlos Maximiliano, em Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª ed.): - exceptio firmat regulam in casibus non exceptis: a exceção confirma a regra nos casos não excetuados; 15
- ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio: onde existe a
mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de direito; - in eo quod plus esta inest et minus: quem pode o mais, pode o menos; - ubi Lex non distinguit Nec nos distinguere debemus: onde a lei não distingue, não pode o intérprete distinguir; - odiosa restringenda, favorabilia amplianda: restrinja-se o odioso; amplie-se o favorável; - acessorium sequitur principale: o acessório acompanha o principal; - verba cum effectu, sunt accipienda: não se presume, na lei, palavras inúteis; ou, literalmente, devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia; - as exceções são de interpretação estrita; - nos casos duvidosos, deve-se preferir a solução mais benigna; - ninguém está obrigado ao impossível.