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ISBN 978-85-66789-24-9

VULNERABILIDADE,
OBRIGAÇÕES E DIREITOS
DA PERSONALIDADE

IDDM
EDITORA
O Mestrado em Ciências Jurídicas e o Curso de Direito da Unicesumar promovem o III Con-
gresso Internacional de Direitos da Personalidade e IV Congresso de Novos Direitos e Direitos
da Personalidade, sob o tema "Direitos da Personalidade de Minorias e de Grupos Vulnerá-
veis".

Trata-se da terceira edição de um evento internacional que debate os direitos da personali-


dade, tanto no que se refere aos novos direitos e aos limites da sua proteção na atualidade,
quanto nos mecanismos jurídicos e extrajurídicos, políticas públicas e ações judiciais voltadas
a sua concretização, juntamente com a quarta edição do evento nacional de Novos Direitos
de Direitos da Personalidade, que neste ano realizar-se-ão concomitantemente promovendo a
integração de discente, docente, pesquisadores e profissionais das mais diversas áreas do co-
nhecimento.

O evento se justifica, primeiramente, em razão da temática dos direitos da personalidade ser


abordada de forma inédita pelo Mestrado em Ciências Jurídicas da Unicesumar, e, por propor-
cionar uma cooperação internacional através do amplo diálogo e aproximação entre pesquisa-
dores brasileiros e estrangeiros sobre as inovações normativas, institucionais, jurisprudenciais
e as mais recentes literaturas na área.

Quanto ao alcance, o evento justifica-se por propiciar a difusão de conhecimento entre os


pesquisadores, professores, mestrandos, doutorandos e estudantes da graduação. Além disso, o
evento será aberto ao público e a toda a comunidade científica do Brasil e do exterior, que será
convidada a participar com envio de artigos científicos, painéis, exposição de arte e minicursos.
VULNERABILIDADE, OBRIGAÇÕES E
DIREITOS DA PERSONALIDADE

IDDM
EDITORA

Coordenadores:
Prof. Dr. Cleber Sanfelici Otero (UniCesumar)
Prof.ª Me. Fernanda Moreira Benvenuto (UniCesumar/UEM)
Prof. Dr. Nilson Tadeu Reis Campos Silva (UEM/UENP)

PRIMEIRA EDIÇÃO
MARINGÁ – PR

2017
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

OTERO, Cleber Sanfelici;. BENVENUTO, Fernanda Moreira; SILVA,


Nilson Tadeu Reis Campos.
D541e Vulnerabilidade, Obrigações e Direitos da Personalidade.
Cleber Sanfelici Otero; Fernanda Moreira Benvenuto; Nilson
Tadeu Reis Campos Silva. 1. ed. - Maringá, Pr :
IDDM Editora, 2017.
171 p.;

1. Vulnerabilidade. 2. Direitos da personalidade. 3. Obrigações.


I. Título.
CDD 22. ed.344
ISBN 978-85-66789-24-9

Rosimarizy Linaris Montanhano Astolphi –Bibliotecária CRB/9-1610

Todos os Direitos Reservados à

IDDM
EDITORA
Rua Joubert de Carvalho, 623 – Sala 804
CEP 87013-200 – Maringá – PR
Copright 2017 by IDDM Editora Educacional Ltda.

CONSELHO EDITORIAL
Prof. Dr. Alessandro Severino Valler Zenni, Professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5969499799398310

Prof. Dr. Alexandre Kehrig Veronese Aguiar, Professor Faculdade de Direito da Universidade de Brasília
(UnB).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/2645812441653704

Prof. Dr. Fabrício Veiga Costa, Professor da Pós-Graduação Stricto Sensu em Proteção em Direitos Funda-
mentais da Universidade de Itaúna.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/7152642230889744

Prof. Dr. José Francisco Dias, Professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus Toledo.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/9950007997056231

Profª Drª Sônia Mari Shima Barroco, Professora da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/0910185283511592

Profª Drª Viviane Coelho de Sellos-Knoerr , Coordenadora do Programa de Mestrado em Direito da


Unicuritiba.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4609374374280294
PREFÁCIO
Eventos, livros e artigos, podem, de uma ou de outra forma, ser autorreferência. Neste sen-
tido, inicia-se o presente prólogo dizendo que, observado em todos os seus aspectos, o presente
livro materializa a autorreferência de um evento, do conjunto de capítulos que o totaliza, e da har-
monia da obra em si mesma.

Resultado do III Congresso Internacional de Direitos de Personalidade, e do IV Congresso de


Novos Direitos e Direitos da Personalidade, realizados conjuntamente pelo Programa de Pós-gra-
duação Stricto Sensu em Direito e pelo Curso de Direito do Centro Universitário de Maringá, duran-
te os dias 26, 27 e 28 de setembro de 2016, este livro corporifica a maturidade científico-jurídica
dos autores dos trabalhos que foram apresentados perante o GT1 que se desenvolveu durante o
evento, e cujo nome original dá título ao livro.

Neste sentido, importante dizer que o evento contou com o protagonismo de professores e
profissionais, do Brasil e do exterior, que proferiram palestras relacionadas à temática dos Direitos
da Personalidade, associada aos Novos Direitos, Minorias e Grupos Vulneráveis. Ademais, merece
especial alusão a presença do público, formado por mais de mil e quinhentas pessoas que presti-
giaram todas as atividades promovidas no decorrer dos dias de sua realização.

Em relação ao livro que ora se apresenta, transcendental subscrever que a atualidade dos
Direitos da Personalidade e dos Novos Direitos está a exigir reflexões que dimensionem, de um
lado, o papel do Estado, do Direito e da própria sociedade, e de outro, os mecanismos de defesa e
garantia jurídica e extrajurídica, as políticas públicas e as ferramentas que estão disponíveis à sua
concreção.

Por isto, capital enaltecer que, as páginas que seguem, oferecem o mais moderno e aguçado
pensamento científico sobre o tema, pois tanto acirram o debate acadêmico sobre pontos contro-
vertidos, como elucidam dúvidas, e provocam indagações que determinam a necessária continui-
dade da discussão jurídica sobre questões ainda carentes de consolidação pelo Direito pátrio.

Os organizadores da obra, outrora Coordenadores do Grupo de Trabalho que acolheu a apre-


sentação verbal das produções intelectuais aqui concentradas, fazem jus ao nosso particular aplau-
so, pois lograram reunir o resultado de pesquisas que percorreram, com maturidade acadêmico-
-científico, todas as particularidades de cada assunto que perfaz um a um dos capítulos do livro.

É deste modo que, na qualidade de Coordenadores do evento, cumpre-nos dizer que este
livro não pode, sob qualquer hipótese, permanecer adormecido nas prateleiras de uma biblioteca.
Tanto o seu conteúdo, como o trabalho científico que deu guarida à produção literária que se colo-
ca à disposição do leitor, conclamam que o mesmo circule pelo universo acadêmico, seja utilizado
como ferramenta de consulta, e adotado como referência obrigatória nas pesquisas implementadas
pela influência, ou inspiração, dos assuntos retratados nesta obra.
1 Grupo de Trabalho.

6
Finalmente, estendemos um efusivo e afetuoso agradecimento para todos os que colabora-
ram para o sucesso do III Congresso Internacional de Direitos de Personalidade, e do IV Congresso
de Novos Direitos e Direitos da Personalidade. Aos Organizadores da obra, subscrevemos a grati-
dão pela diligência, tanto na Coordenação do GT, como no adensamento dos artigos. Aos autores
de cada um dos capítulos, assinamos um portentoso parabéns pelo brilho de sua pesquisa, e pela
plenitude de seu manuscrito.

José Eduardo de Miranda, Ph. D.


José Sebastião de Oliveira, Ph. D.
Valéria Silva Galdino Cardin, Ph. D.

7
SUMÁRIO

VULNERABILIDADE, OBRIGAÇÕES E DIREITOS DA


PERSONALIDADE

O IDOSO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: SOB A PERSPECTIVA DE GRUPO


VULNERÁVEL
INTRODUÇÃO  12
A DIGNIDADE HUMANA  13
O IDOSO  19
CONCLUSÃO22

DISCRIMINAÇÃO HOMOFÓBICA: UM ATENTADO AOS DIREITOS DA


PERSONALIDADE DAS MINORIAS E GRUPOS VULNERÁVEIS
INTRODUÇÃO26
MINORIAS E GRUPOS VULNERÁVEIS  27
DIREITOS DA PERSONALIDADE 33
CONCLUSÃO38
REFERÊNCIAS40

DIGNIDADE HUMANA, MÍDIA E IDEOLOGIA: ENTRE A MANIPULAÇÃO MIDIÁTICA E


LIBERDADE INDIVIDUAL
INTRODUÇÃO42
DIGNIDADE E LIBERDADE: UMA PERSPECTIVA ONTO-TELEOLÓGICA 43
MÍDIA E SOCIEDADE DE CONSUMO: A INFORMAÇÃO MIDIÁTICA COMO MERCADORIA  46
A MÍDIA COMO INSTRUMENTO IDEOLÓGICO DE DOMINAÇÃO 48
A COISIFICAÇÃO DO SER E A DERROCADA DA LIBERDADE HUMANA 51
CONCLUSÃO  54
REFERÊNCIAS56
SUMÁRIO

ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA – ALTERAÇÕES CONCERNENTES ÀS


TEORIAS DAS CAPACIDADES ANTE AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS
INTRODUÇÃO58
CAPACIDADE CIVIL: BREVE ANÁLISE HISTÓRICA 59
PRINCIPAIS DIREITOS CONSTITUCIONAIS ASSEGURADOS
PELA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS
DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA 60
DIREITO À IGUALDADE 61
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 61
CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS
COM DEFICIÊNCIA E LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO
DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA – ASPECTOS GERAIS 62
CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS
DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA 63
LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA –
ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA 63
CONCLUSÃO  67
REFERÊNCIAS68

DANOS MORAIS DECORRENTES DO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL


INTRODUÇÃO71
CONTRATOS72
DANO MORAL 76
CONCLUSÃO  84
REFERÊNCIAS85
SUMÁRIO

DANO MORAL DECORRENTE DA LESÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE:


DIFICULDADE NA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO
INTRODUÇÃO87
BREVE HISTÓRICO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 88
DAS CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 90
DANO MORAL E O ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL
ACERCA DA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO 92
CONCLUSÃO  96
REFERÊNCIAS97

DA ALIENAÇÃO PARENTAL: ASPECTOS JURÍDICOS E PSICOLÓGICOS


INTRODUÇÃO99
DESENVOLVIMENTO100
DA PROTEÇÃO A CRIANÇA E ADOLESCENTE 100
DOS ASPECTOS JURÍDICOS E PSICOLÓGICOS DA ALIENAÇÃO PARENTAL 103
CONCLUSÃO110
REFERÊNCIAS111

CYBERBULLYING: O ASSASSINATO MORAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM


REDE
INTRODUÇÃO114
DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTES: SERES EM FORMAÇÃO 115
O ADVENTO DAS NOVAS TECNOLOGIAS E O USO
PELAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES 117
CYBERBULLYING E A VULNERABILIDADE INFANTO JUVENIL NO MEIO VIRTUAL 119
MEDIDAS PROTETIVAS AO CYBERBULLYING  122
CONCLUSÃO126
REFERÊNCIAS127
SUMÁRIO

PRINCÍPIOS SOCIAIS COMO PRINCIPAL MOTOR DE REVISÃO DOS CONTRATOS


CIVIS DAS PESSOAS EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE ECONÔMICA
INTRODUÇÃO130
OS DIREITOS DE PERSONALIDADE E OS PRINCÍPIOS SOCIAIS  132
A REVISÃO CONTRATUAL NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO:
DO LIBERALISMO AOS PRINCIPIOS SOCIAIS 133
A UNIÃO DO DIREITO CONSTITUCIONAL COM O PRIVADO:
A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO COMO ELO DE LIGAÇÃO ENTRE OS CONTRATOS E OS
DIREITOS DE PERSONALIDADE 134
PRINCÍPIOS CLÁSSICOS E SOCIAIS DOS CONTRATOS:
UM APERFEIÇOAMENTO DO DIREITO CONTRATUAL 137
OS PRINCÍPIOS SOCIAIS COMO PRINCIPAL MOTOR
DE REVISÃO DOS CONTRATOS CIVIS PARA A PROTEÇÃO
DOS DIREITOS DE PERSONALIDADE NO DIREITO CIVIL 140
CONCLUSÃO141
REFERÊNCIAS142

PROTEÇÃO À INTIMIDADE E PRIVACIDADE FRENTE AOS CADASTROS


CONSUMERISTAS
INTRODUÇÃO145
CONTEÚDO E ESTRUTURA DA PROTEÇÃO À INTIMIDADE 146
BANCOS DE DADOS CONSUMERISTAS: DISCIPLINA NO CÓDIGO
DE DEFESA DO CONSUMIDOR 150
CONSUMISMO DESENFREADO E CADASTROS DE DADOS
CONSUMERISTAS: ANÁLISE CRÍTICA AO SISTEMA 152
CONCLUSÃO154
REFERÊNCIAS155
SUMÁRIO

A LIBERDADE RELIGIOSA E OS SEUS LIMITES DIANTE DO DIREITO À VIDA


INTRODUÇÃO  157
1 O ATENTADO CONTRA A VIDA NAS RELIGIÕES
AFRO-BRASILEIRAS E INDÍGENAS EM RELAÇÃO AOS MAIS FRÁGEIS E VULNERÁVEIS 158
2 O DIREITO À VIDA E A LIBERDADE RELIGIOSA 161
CONSIDERAÇÕES FINAIS 166
REFERÊNCIAS168
O IDOSO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: SOB A
PERSPECTIVA DE GRUPO VULNERÁVEL

Camila Cristina de Oliveira Dumas


Mestre em Ciências Jurídicas pelo UniCesumar - Centro Universitário Cesumar. Especialista em Ciências Criminais
pela UEM. Professora de direito Empresarial, Ciências Políticas e Estágio Real na UNIPAR – Campus Paranavaí-PR.
Advogada em Paranavaí-PR. Endereço eletrônico: camiladumas2015@gmail.com.

Luis Carlos Mucci Júnior


Mestrando em Ciências Jurídicas pelo UniCesumar – Centro Universitário Cesumar. Pós Graduado em Direito Civil
e Processo Civil pela Instituição Toledo de Ensino de Presidente Prudente. Advogado. Endereço eletrônico: mucciju-
nior@hotmail.com.

RESUMO: O estudo aborda não apenas a dignidade da pessoa humana, mas, sobretudo a questão social do idoso,
o avanço da medicina que proporciona maior longevidade as pessoas de um modo geral, a vulnerabilidade do idoso
quando deixarem o mundo produtivo do trabalho passando a conviverem com uma nova realidade, o reconhecimento
jurídico da vulnerabilidade dessas pessoas como um avanço buscando preservar não só a saúde física e mental, muito
mais ainda conservar a dignidade da pessoa idosa em todos os seus segmentos. Diante de uma sociedade capitalis-
ta e ocidental, os valores e princípios são construídos com base na produtividade, e como o idoso passa a não mais
produzir, começa a ser desvalorizado junto à sociedade. O trabalho é que permite o habito saudável de existir, já que
o trabalho que dignifica o homem, lhe da um lugar na sociedade e no interior da família. É na aposentadoria que o
cidadão passa a precisar muito mais do apoio da família, já que perde o papel que exercia dependendo muito mais de
seus familiares, e fora da família não é diferente já que o idoso precisa ter um convívio em sociedade onde ele tenha
afeto e compreensão de amigos e colegas, não basta desejar uma vida longa, mas com qualidade e satisfação. Existe
uma ligação entre a qualidade de vida do idoso com uma vida ativa o que é da maior importância, pois aqueles que se
abstêm desses relacionamentos têm uma vida mais curta e com menos saúde, filhos e netos são esteio para o idoso.

PALAVRAS-CHAVES: Idoso. Dignidade. Pessoa Humana. Grupo Vulnerável.

INTRODUÇÃO
Este artigo tem por escopo demonstrar que a dignidade da pessoa humana é inerente a
condição humana, que se trata de um macroprincípio do qual se extraem princípio e valores in-
dispensáveis, veja: a liberdade, a autonomia privada, a cidadania, a igualdade, a alteridade e a
solidariedade, e muitos outros que se difundem pelo ordenamento jurídico em vigor ou ainda pelo
contexto social.

A inércia dos poderes legislativo e executivo que estão sucumbindo frente ao judiciário que
utiliza na prática da jurisdicidade e do ativismo judicial para combater a inércia de ambos os pode-
res citados.

Neste artigo o princípio da dignidade da pessoa humana é como uma ferramenta mestra, e
vai servir para contribuir na solução de conflitos jurídicos advindos das incertezas nos julgamentos
dos casos atinentes ao idoso.

O presente estudo utiliza, em regra, o método teórico, pois pressupõe a busca do conheci-
13
mento pelo levantamento de leis, doutrinas e princípios gerais de direito, demonstrando como os di-
reitos da personalidade podem ser aplicados aos seres humanos que buscam melhores condições
de vida, como o idoso, fulcrados na dignidade da pessoa humana.

O instrumento de pesquisa foi o método bibliográfico, fazendo um percurso em que o primeiro


capítulo trata da dignidade da pessoa humana e histórico da dignidade, constando quão antigas
são as prerrogativas inerentes à condição humana e a dignidade da pessoa humana.

No segundo capítulo, apresentamos os direitos da personalidade, sua evolução histórica, os


direitos da personalidade no ordenamento jurídico brasileiro, as características dos direitos da per-
sonalidade e o surgimento dos direitos da personalidade em ordenamentos jurídicos estrangeiros.

No terceiro capítulo, falamos do idoso, da questão social, da qualidade de vida, dos direitos,
da vulnerabilidade, da desaposentação.

1- A DIGNIDADE HUMANA
A dignidade é um macroprincípio, do qual se extraem princípio e valores indispensáveis, veja:
a liberdade, a autonomia privada, a cidadania, a igualdade, a alteridade e a solidariedade, e muitos
outros que se difundem pelo ordenamento jurídico em vigor ou ainda pelo contexto social.

Cleide Aparecida Gomes Rodrigues Fermentão esclarece que:


A dignidade humana “é qualidade intrínseca da pessoa humana, é irrenunciável e
inalienável” entendendo dessa forma que a dignidade humana não é uma criação
estatal que pode ser concedida ou retirada já que existe em cada pessoa como algo
que lhe é inerente. Assim, a dignidade humana pode e deve ser reconhecida e pro-
tegida pelo ordenamento jurídico.

[...]

A dignidade humana é inerente a cada pessoa, está ligada de modo íntimo e ne-
cessário, inseparável. Estabelecer um conceito de dignidade humana, é buscar os
meios necessários para tornar o princípio efetivo. (informação oral).1

Como dito alhures a pessoa humana é o centro do direito, e o princípio da dignidade é o que
da o fundamento do sistema jurídico. O Artigo 3º, da Constituição Federal almeja uma sociedade
livre, justa e solidária, assim a dignidade é o alicerce mínimo do ordenamento jurídico pátrio.

Carmem Lúcia Antunes Rocha diz que a dignidade antes de ser a pedra de toque primordial
de todo ordenamento jurídico, ela era um instituto de direito natural, que está presente até mesmo
antes do ser vivo nascer, não é necessário nenhum ato para que seja declarado “ser digno”:

Dignidade é o pressuposto da idéia de justiça humana, porque ela é que dita a condição su-
perior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana independe
de merecimento pessoal ou social. Não se há de ser mister ter de fazer por merecê-la, pois ela é

1 Aula ministrada no Curso de Mestrado em Direito do Centro Universitário de Maringá – CESUMAR, na disciplina
14 de Normatividade Contemporânea e a dignidade da pessoa humana. Maringá, 18.06.2011.
inerente à vida e, nessa contingência, é um direito pré-estatal.2

Essa idéia vem sendo estudada e difundida há tempos, sendo na atualidade o maior dos atri-
butos e por seu turno indispensável para a humanidade, hodiernamente as reações civis ganharam
uma despatrimonialização, ou ainda uma reforma do direito, com a intenção de colocar o ser huma-
no no centro de todo o direito e as demais coisas em um segundo plano.

José Carlos Teixeira Giorgis esclarece:


A conversão da família em espaço de realização da efetividade humana marca o
deslocamento da função econômica-politica-religiosa-procracional para nova função:
a repersonalização das relações civis que prestigia a pessoa mais que o patrimô-
nio, é a recusa da coisificação ou reificação da pessoa, para ressaltar sua dignidade.
A família é o espaço por excelência da repersonalização do direito3.

No âmbito familiar o ser humano exercita a noção de dignidade, perde o adereço os bens e o
patrimônio, dando azo a um dos ensinamentos de Jesus em Mateus Capítulo 6, versículo 19.

Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões
minam e roubam4;

Dentro do contexto da humanidade faz-se necessário um histórico da dignidade a partir de


quando emergiu a dignidade da pessoa humana na vida do ser humano.

1.1 - HISTÓRICO DA DIGNIDADE

Consabido a noção de dignidade é fruto de inegáveis lutas constantes, ocorridas após gran-
des batalhas e guerras onde se havia disputa de poder, entrementes, não se tem o marco primor-
dial de sua existência havendo divergência a cerca disso.

Antigamente a dignidade na Grécia era medida de acordo com a posição social o sujeito, ape-
nas os cidadãos poderiam participar da pólis, enquanto os escravos eram coisas.

Cleide Aparecida Gomes Fermentão mostra como a dignidade era vista na antiguidade: “No
pensamento filosófico e político, na antiguidade clássica, a dignidade da pessoa humana corres-
pondia à posição social ocupada pelo homem em determinada comunidade. No pensamento estói-
co, a dignidade era tida como a qualidade que o distinguia das demais pessoas”.5

Alguns estudiosos atribuem o nascedouro da dignidade na Declaração Universal dos Direitos


Humanos, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Uni-
das em 10.12.1948. Após o fim da segunda guerra mundial, a Declaração Universal foi um marco
2 ANTUNES ROCHA, Carmem Lúcia. O princípio da dignidade humana e a exclusão social. In: Anais do XVVI
Conferência Nacional dos Advogados – Justiça: realidade e utopia. Brasília: Conselho Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil, 2000. v. I. p. 72.
3 GIORGIS, José Carlos Teixeira. Arqueologia das Famílias: da Ginecocracia aos Arrajos Plurais. Revista Brasi-
leira de Direito das Famílias e Sucessões. Porto Alegre: Magister, n. 17, p. 61, ago./set. 2010.
4 Biblia Sagrada – Nova Versão Internacional, 1993, Mt.6
5 FERMENTÃO, Cleide Aparecida Gomes Rodrigues. Direito e Axiologia – O valor da pessoa humana como fun-
damento para os direitos da personalidade. Revista Jurídica Cesumar – Mestrado. Maringá, v. 7, n. 1, p.72, jan./jun.
2007. 15
histórico da humanidade, com o fim de impedir os horrores vivenciados na segunda guerra mundial.

Para evitar chacinas e carnificinas humanas surgiram instrumentos de defesa contra ações e
tratamentos degradantes ao ser humano, ou seja, Organização das Nações Unidas, e Declaração
Universal dos Direitos Humanos.

Outros juristas entendem que a dignidade teve seu reconhecimento antes mesmo da vida de
Jesus Cristo, já que se o ser humano teria sido criado à imagem e semelhança de Jesus, homem e
mulher, seria assim um ser dotado de dignidade.
“E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher
os criou”6.

Veja que não há consenso em relação da data da origem da dignidade perante os povos da
humanidade, entrementes, só a título de registro existiam algumas Constituições que já previam a
dignidade antes mesmo da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

A Carta Magna de João Sem-Terra de 1215, como a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão de 1789, proveniente da Revolução Francesa, tiveram influencia e participação na coloca-
ção da dignidade no carrear da história, entretanto, a Declaração Universal dos Direitos Humanos
de 1948, que traçou os contornos da dignidade a nível internacional após as barbaridades viven-
ciadas na Segunda Grande Guerra:
“A Carta Magna, de 1215, da Inglaterra, constituiu o ser humano como fim do direito,
limitando o poder dos governantes e garantindo direitos próprios ao homem. O status
jurídico da pessoa, porém, foi realmente consagrado, na ordem internacional, com
as Declarações de Direitos surgias no final do séc. XVIII, que ficou conhecido como
o século das Declarações.

Destaca-se, nesse período, a Declaração dos Diretos do Homem e do Cidadão, da


França, de 1789, resultante dos princípios da Revolução Francesa, que alavancou a
defesa dos direitos individuais e a valorização da pessoa humana e da liberdade do
cidadão. O indivíduo era tratado como cidadão, com direitos e deveres e ao Estado
foram estabelecidos limites. No seu preâmbulo, o documento destaca que a ignorân-
cia, o esquecimento e o menosprezo dos direitos do homem são as únicas causas
dos males públicos e da corrupção dos governos.

Após as Grandes Guerras, fazia-se necessária a proteção dos direitos fundamentais


dos cidadãos em âmbito internacional e de caráter universal. Elaborou-se, então, a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10.12.1948, como ideal comum a
ser atingido por todos os povos e nações”. 7

A Constituição Republicana da Itália em 1947 no seu artigo 3º, já fazia menção ao termo dig-
nidade. 8

Em 1949, a Constituição da República da Alemanha, no art. 1.1 proclamou a dignidade: “A

6 Biblia Sagrada – Nova Versão Internacional, 1993, Gn.1.


7 SPINELI, Ana Cláudia Marassi. Direitos da Personalidade e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana Re-
vista Jurídica Cesumar – Mestrado. Maringá, v. 8, n.2, p.376, jul./dez. 2008.
8 ITÁLIA. Constituição de República de 1947, art. 3º: “Tutti i cittadini hanno pari dignitá sociale e sono eguali da-
vanti ala legge, senza distinzione di sesso, di razza, di língua, di religione, di opinioni politiche, di condizioni personali
16 e sociali”..Disponível www.edscuola.it/archivio/norme/leggi/costituzione.h...
dignidade do homem é intangível. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todo o poder público”.9

Cleide Aparecida Gomes Rodrigues Fermentão assevera:


Foi a lei fundamental da Republica Federal da Alemanha que, em primeiro, erigiu
a dignidade da pessoa humana em direito fundamental, estabelecendo no seu art.
1º n. 1: A dignidade humana é inviolável. Respeitá-la e protegê-la é obrigação
de todos os Poderes estatais. A Alemanha, após o Estado nazista ter praticado a
barbárie contra a dignidade humana, tinha o dever moral de normatizar o respeito e
a proteção à dignidade humana.

[...]

No Brasil, a recente história de torturas e de desrespeito à pessoa humana, pratica-


das no período da regime militar, levou o constituinte brasileiro a incluir a dignidade
da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado democrático de direito,
dispondo no inc. III do Art. 1º da Constituição promulgada em outubro de 1988: A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito
e tem como fundamentos. III – a dignidade da pessoa humana.

O reconhecimento da dignidade humana como princípio, pelo Constituição de 1988,


entre outras, fez gerar a concepção antropocêntrica do direito contemporâneo. 10

Todas as Constituições após esses acontecimentos que tivessem como base fundamental o
Estado democrático de direito deveriam inserir a palavra dignidade como palavra de ordem.

Ainda segundo Cleide Aparecida Gomes Rodrigues Fermentão “o que deve ser considerado
na teoria Kantiana é que ao tratar o homem como um fim em si mesmo, além de não prejudicar
ninguém, deve-se fazer o máximo para melhorar a vida do outro, trazendo condições dignas”.

Diante da magnitude da dignidade da pessoa humana, como sendo o princípio dos princípios,
a norma das normas, Fernanda Borghetti Cantali acena e esclarece em casos de colisões de direi-
tos.

Veja que o caso concreto que vai definir pela proporcionalidade o direito fundamental que irá
prevalecer.

2 DIREITOS DA PERSONALIDADE

A Constituição da República Federativa do Brasil tem como princípio fundamental a dignidade


da pessoa humana, visando garantir a proteção da própria pessoa, quando todos os direitos funda-
mentais falharem, eleva a pessoa como fim e fundamento do direito.11

Direitos e garantias fundamentais expressos no artigo 5º da Constituição Federal emanam


9 ALEMANHA. Constituição da República de 1949, art. 1º.1. Disponível em: <http://www.uni.leipzig.de/~leite/wiki/
Direitos_B%C3%A1sicos_da_Constitui%C3%A7%C3%A3o_Alem%C3%A#_Art%C2%BA_1_a_19#Artigo_1.C2.B0>.
10 FERMENTÃO, Cleide Aparecida Gomes Rodrigues. Direito e Axiologia – O valor da pessoa humana como fun-
damento para os direitos da personalidade. Revista Jurídica Cesumar – Mestrado. Maringá, v. 7, n. 1, p. 76, jan./
jun. 2007.
11 Miranda, Jorge. Manual de direito constitucional: direitos fundamentais. Coimbra: Editora Coimbra, 1993, tomo
IV, p. 166. 17
da dignidade da pessoa humana que tem escopo de proteger o desenvolvimento da pessoa, e por
essa razão a pessoa é o maior bem da ordem jurídica, o seu fundamento e seu fim.

Segundo Carlos Alberto da Mota Pinto: os direitos da personalidade agem sobre a vida da
pessoa, sua saúde física, sua integridade física, sua honra, sua liberdade física e psicológica, seu
nome, sua imagem, a reserva sobre a intimidade da vida privada, caracterizando um “círculo de
direitos necessários; um conteúdo mínimo e imprescindível da esfera jurídica de cada pessoa”. 12

Direitos da personalidade é uma categoria de direitos subjetivos com fundamento da dignida-


de da pessoa humana, atribuindo gozo e respeito do seu próprio ser, em todas as esferas sejam
físicas ou espirituais.13

2.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE.

A tutela jurídica a personalidade da pessoa humana e os direitos que dela decorre, traduz os
chamados direitos da personalidade.

No direito romano nem todos eram detentores da capacidade jurídica, pois esta era limitada
aqueles que apresentassem o conjunto de status: status libertatis, status civitatis e o status fami-
liae, os últimos dependiam do primeiro.
Quem não possuísse liberdade, não possuía nenhum outro status, a exemplo dos
escravos que, não possuindo liberdade, não sendo cidadãos e nem podendo consti-
tuir família por meio das justas núpcias, não tinham personalidade, apesar de serem
seres humanos.14

Escravos não tinham direitos da personalidade, da mesma forma que estes direitos são reco-
nhecidos hoje, eram reduzidos a res e não considerados personas.

Ao passo que estrangeiros tinham sua capacidade jurídica limitada, reduzida.

Já os dependentes do paterfamilias que era o chefe, administrador e sacerdote da família,


também de igual modo não tinham a personalidade reconhecida.
No direito de Roma, a personalidade não decorria da lei nem esta lhe servia de subs-
trato. Pelo simples fato de nascer ser humano adquiria a personalidade, possuindo-a
tanto o homem livre como o escravo.

Era um caput, também, isto é, mais uma cabeça existente no seio do grupo social.
Desta forma, não devemos visualizar a pessoa para o Direito romano segundo nossa
concepção atual, pois ambas diferem substancialmente.15

Embora a capacidade fosse concedida de forma diversa e não inerente a todas as pessoas,
Roma preservava os direitos da personalidade de forma isolada diversamente do que acontece na
atualidade.

12 Pinto, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil. Coimbra: Editora Coimbra. 1996, p.87.
13 Pueche, José Enrique Bustos. Manual sobre bienes y derechos de la personalidade. Madri: Dykinson, 1997.
14 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 15.
18 15 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 20.
São Tomas de Aquino dizia que a pessoa é um ser dotado de substancia individual, com
dignidade. Além dele, outros aceitavam a ideia de valorização do individuo com base na dignidade
humana. 16

Após a “revolução dos barões contra o Rei João-Sem Terra” e o desenvolver do liberalismo
na Inglaterra, é que as ideias de proteção da pessoa humana começaram a ter força, pulso, até a
intangibilidade dos direitos fundamentais do homem, no final do Séc. XVIII.17

Influenciada pelas conquistas liberais em 1776, na América do Norte, surgiu a Declaração de


Direitos do Bom Povo e a Declaração de independência das treze colônias inglesas. 18

Em uma mesma direção na França com a Revolução de 1789, houve a promulgação da


Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, levada por princípios políticos-filosóficos que
davam valor aos direitos do homem, 19dando destaque à preservação dos direitos dos indivíduos,
apenas no aspecto individualista, reconhecendo que havia Direitos Naturais20.

2.2. DIREITOS DA PERSONALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO


BRASILEIRO

No direito brasileiro embora existisse previsão dos direitos da personalidade desde a Consti-
tuição de 1891, tinha um cunho iminentemente politico, e de forma alguma representava a proteção
da pessoa em si.

O Código Civil de 1916 era iminentemente patrimonialista, muito embora tenha feito previsão
de direitos naturais, não mencionava expressamente os direitos da personalidade, o que ficou a
cargo da doutrina.

Com a 2ª Guerra Mundial, e vinte anos de ditatura militar no Brasil, a busca pela dignidade
da pessoa humana tomou uma grande proporção talvez imensurável, sobretudo se considerarmos
que a Constituição de 1969 consagrava uma séria de direitos individuais e sociais negados com a
vigência do AI-5.
Pouco importa tenha o texto da Carta outorgada de 1969 consagrado longa lista de
direitos individuais e sociais: tudo isso se reduz a cinzas com a simultânea vigência
do AI-5. Um Estado onde o Congresso vivia sob a ameaça permanente das cassa-
ções, um Poder Legislativo e constituinte que existem enquanto consintam os titula-
res dos poderes absolutos emanados do AI-5 e onde a magistratura não tem as suas
tradicionais garantias, é um Estado absolutista. Tratava-se de um Estado-governo
que não se subordinava ao Direito, ao contrario, produzia e mantinha o anti-direito.
Nessa perspectiva, certo é que em época de ditadura militar no Brasil não havia
Estado de Direito; consequência disso é que não existia nem a efetiva consagração,
nem a efetiva tutela dos direitos da personalidade.21

16 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 23.
17 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 25.
18 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 25.
19 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 25.
20 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da personalidade e sua tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 25.
21 OLIVEIRA, José Lamartine Correa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. O Estado de Direito e os Direitos da
Personalidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 20/21. 19
Assim passando a dignidade a ser alicerce e valor fundamental do sistema jurídico brasileiro,
a Constituição Federal de 1988 tutela direitos que se desdobram e decorrem do princípio da digni-
dade da pessoa humana, veja que a maior parte dos direitos da personalidade são tratados como
direitos e garantias fundamentais, daí podemos concluir que o ser humano passou a figurar no
centro do ordenamento jurídico brasileiro.

É certo que existe um rol de direitos da personalidade expresso na Constituição Federal, toda-
via, não se limitam e não estão adstritos apenas aqueles positivados em 1988, pois com a edição
do Novo Código Civil, em 2002, os direitos da personalidade ganharam destaque e posição nos
artigos 11 a 21, inclusive com capitulo próprio.

Por fim, o artigo 11 do Novo Código Civil demonstra as características dos direitos da perso-
nalidade, merecendo destaque a intransmissibilidade, irrenunciabilidade e limitação voluntaria de
seu exercício, salvo quando autorizado por lei. 22

3 – O IDOSO
Em todo o mundo está ocorrendo mudanças, e a população esta ficando mais velha, por conta
dos avanços científicos na área médica, assim como as melhorias na condição de vida de um modo
geral.

O reconhecimento jurídico da vulnerabilidade das pessoas idosas representa um grande


avanço, na medida em que busca preservar não só a saúde física e mental dessa classe, mas tam-
bém de conservar a dignidade da pessoa idosa em todos os seus segmentos.

Como diz Ana Paula Ariston Barion Peres:


O Estado em suas diferentes esferas de atuação – administrativa, legislativa e judi-
cial tem o dever de combater as situações de vulnerabilidade, e a sociedade, com o
auxílio dos meios de comunicação cabe fiscalizar seu desempenho.23

Os idosos e as instituições procuram manter um perfeito relacionamento entre capital e traba-


lho com relação a quem já deixou o mundo do trabalho, são incapazes de se adequar a esta nova
realidade, e ter noção de como administrar essa nova ordem dentro de uma grande e insuperável
desordem.

Edgar Morin:
A primeira vista, o céu estrelado impressiona por sua desordem, um amontoado de
estrelas, dispersas ao acaso. Mas o olhar mais atento, aparece a ordem cósmica,
imperturbável – cada noite, aparentemente desde sempre e para sempre, o mesmo
céu estrelado, cada estrela no seu lugar cada planeta realizando seu ciclo impecável.
Mas vem um terceiro olhar, vem pela injeção de nova e formidável desordem nessa
ordem; vemos um universo em expansão, em dispersão, as estrelas nascem, explo-
dem, morrem. Esse terceiro olhar exige que concebamos conjuntamente a ordem e
a desordem; é necessário a binocularidade mental, uma vez que vemos um universo

22 CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da Personalidade: disponibilidade relativa, autonomia privada e dignida-
de humana. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p.94.
20 23 PERES, Ana Paula Ariston Barion. Proteção aos idosos. Curitiba: Juará, 2007.
que se organiza desintegrando-se.24

Traçando uma nova ótica de compreensão do problema, somos levados a repensar o papel
não apenas do Estado, da sociedade e da família em relação à pessoa idosa, dividindo a solida-
riedade entre poderes público e privado no que diz respeito à pessoa idosa, isso em relação a sua
vulnerabilidade em relação a aspectos sociais, políticos e econômicos que surgem quando a pes-
soa idosa deixa o mundo do trabalho, sendo assim apresentada uma nova realidade.

Vivemos em uma sociedade capitalista e ocidental que tem os valores firmados na produtivi-
dade, e como o idoso passa a ser improdutivo, ocupa a partir de então uma posição marginalizada,
já que não produzindo riqueza deixa de ter valor reconhecido na sociedade.

Simone de Beauvoir:
A pior morte de um indivíduo é quando perde o que forma o centro de sua vida, e que
faz dele o que realmente ele é. Aposentadoria é a palavra mais repugnante da língua.
Seja por escolha ou imposição do destino, a palavra aposentar-se é abandonar as
nossas ocupações – essas ocupações que fazem de nós o que somos – equivale
descer ao túmulo.25

Na aposentadoria é muito comum a depressão da pessoa idosa, já que passa a necessitar de


apoio da família, para que assim possa continuar vivendo de forma harmoniosa, com equilíbrio, no
entanto, se o relacionamento familiar não for bom, com conflitos pode gerar retrocesso na vida do
idoso com isolamento, tristeza e depressão.

Fora da família o idoso precisa conviver com afeto e compreensão, tendo amigos para trocar
experiências, sentimentos, pensamentos, fazendo e aprendendo a cada dia, dando um sentimento
de utilidade para viver com longevidade, prazer e qualidade de vida.

Ana Maria Viola de Souza:


O aumento rápido da população idosa, cuja longevidade dos indivíduos atua como
fator derivado de novas técnicas medicinais e pela baixa fecundidade e baixa mor-
talidade, demonstra a real necessidade por parte do legislador para a elaboração de
leis que atendam à realidade brasileira reivindicada pela nossa sociedade.26

Simone de Beauvoir:
“A velhice não é uma ladeira que todos descem com a mesma velocidade. É uma su-
cessão de degraus irregulares onde alguns despencam mais depressa que outros”.27

O idoso precisa ter qualidade de vida e saúde, tendo um prazer de estar vivo e continuar a
fazer parte do ambiente em que vivia.

É necessário ligar a qualidade de vida do idoso com a sua vida ativa e contato social, assim a

24 MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução de Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2005.
25 BEAUVOIR, Simone de. A velhice. Tradução de Maria Helena Franco Monteiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1990.
26 SOUZA, Ana Maria Viola de. Tutela Jurídica dos Idosos: A Assistência e a Convivência Familiar. São Paulo:
Alínea, 2004.
27 BEAUVOIR, Simone de. A velhice. Tradução de Maria Helena Franco Monteiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1990. 21
família, os filhos e netos representam o esteio emocional do idoso e consequentemente sua melhor
finalidade de vida e manutenção de saúde tanto física quanto psicológica.

Marco Aurélio Dias da Silva:


[...] O importante é que o individuo permaneça ativo e “ligado” ao mundo e ao que
acontece a seu redor. Há muitos séculos, ao dissertar sobre a velhice, Galeno acon-
selhava aos velhos “aquecer e umidificar o corpo; tomar banhos quentes; beber vi-
nho e, principalmente, manter-se ativo.28 “

Na humanidade os primeiros trabalhos eram manuais, mas com o desenvolvimento tecnoló-


gico surgiram novos instrumentos para melhor e mais rápida execução da atividade humana, vis-
lumbrando que desde a pré-história o trabalho era visto como uma mera subsistência, contudo nos
dias de hoje assume um papel importante na organização produtiva.

O trabalho é uma forma de socialização, e o seu fim com aposentaria provoca uma mudança
na vida do idoso que perde esse relacionamento anterior, tendo a solidão e a desvalorização en-
quanto pessoa.

Faz-se necessário estimular o idoso a continuar com suas atividades, para então desfrutar de
uma vida digna, uma das saídas poderia ser a aprovação da Lei da Desaposentação que embora
tenha sido aprovada na Câmara e no Senado Federal, foi vetada pela Presidente sob alegação de
abalar o sistema previdenciário, havendo o julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

Demonstrando a vulnerabilidade do idoso, foram editadas diversas leis, com legislação pro-
tetora nos moldes da Constituição Federal de 1988, repito com reconhecimento da vulnerabilidade
da pessoa idosa. Em 1/10/03, foi sancionado o Estatuto do Idoso (Lei 10.741), preservando direitos,
igualdade e dignidade.

Para resguardar a dignidade da pessoa idosa, há a premente necessidade de reconhecer


juridicamente a vulnerabilidade da pessoa idosa.

O estatuto resguardou ao idoso o direito ao exercício de atividades profissionais, coibindo


qualquer tipo de descriminação por motivo de idade. Veja que nos programas de financiamento
publico ou financiados com recursos públicos, o idoso tem direito a 3% das reservas de unidades
residenciais. Gratuidade dos transportes públicos urbanos e semiurbanos aos maiores de 65 anos
existem previsão de 5% de vagas em estacionamentos públicos ou privados.

O reconhecimento jurídico da vulnerabilidade do idoso é um avanço e que não pode ser asso-
ciado com uma incapacidade, já que o idoso teve ter direito a uma vida digna, sem ser discriminado
ou marginalizado.

Nos termos do Estatuto e da legislação brasileira o envelhecimento é um direito da personali-


dade e sua proteção é um direito social, nos moldes do artigo 8º. da Lei 10.741/03.
Art. 8º O envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito
social, nos termos desta Lei e da legislação vigente”.29

28 SILVA, Marco Aurélio Dias da. Quem Ama Não Adoece. 4.ed. São Paulo: Best Seller, 1994.
22 29 Artigo 8º da Lei 10.741/03.
Os direitos sociais contemplados na Constituição são desfavoráveis as pessoas idosas, quan-
do se fala em educação poucos idosos tem direito a educação no Brasil, a saúde em que pese ser
um direito de todos e dever do Estado, o sistema único de saúde está sucateado e os planos de
saúde aumentam em demasia as prestações de modo a fazer com que a pessoa idosa saia do
plano de saúde.

Quanto ao trabalho não existe regra ou lei que estabeleça reservas de vagas para pessoa
idosas seja em concurso publico ou particular, o que ocorre como, por exemplo, com os deficientes
(Artigo 37 da Constituição Federal e Lei 8.213/91). Como dito alhures deve se pensar no instituto
da desaposentação.

Trabalhadores mais velhos podem assumir papel de mentores ou gestores dos novatos.

Outra forma de inserção do idoso é voltarem para escola, pois assim criam uma nova rede de
amizades, novos relacionamentos e informações tendo preparo em tudo que forem realizar.

Norberto Bobbio:
Estou próximo dos 83 anos. Cheguei sem perceber, e sem ao menos por um ins-
tante prever à idade da velhice, que outrora era chamada a idade da sabedoria.
Antigamente, quando o escoar do tempo era menos acelerado, as transformações
históricas eram mais lentas. Hoje não são mais. Nas civilizações tradicionais o velho
sempre representou o guardião da tradição, o depositário do saber da comunida-
de. Anatole France dizia que os velhos amam demais as próprias ideias e por isso
são um obstáculo ao progresso. Para garantir o progresso, os povos primitivos os
comiam. Ou então os colocavam nas academias, o que é uma forma de embalsa-
ma-los. O progresso técnico, em especial científico tecnológico, é tão vertiginoso e,
mais ainda, irreversível, que o velho, não dispondo mais de elasticidade mental para
acompanha-lo, corre o risco de ficar para trás. Entre a crescente rapidez com que
nosso conhecimento se transformam, e a crescente lentidão do velho no aprendiza-
do, há um irremediável contraste. Consideramos que a história progride quando há
transição do velho para o novo, e regride quando o velho opõe resistência ao nasci-
mento do novo. Segundo a tradicional analogia entre o ciclo de uma civilização e o
ciclo da vida, a decadência de uma civilização coincide com a sua velhice. A velhice
do homem como de uma civilização é o crepúsculo que anuncia a noite.30

É de bom alvitre lembrar que em Santos nos anos de 1988 pela Secretaria de Assistência
Social parceira da Secretaria da Educação um projeto denominado “Projeto vovô sabe tudo”. Os
idosos a partir desse projeto passaram a interagir com os jovens, contando suas historias, cuidando
de hortas, ensinando e aprendendo uns com os outros.

4 – CONCLUSÃO
Veja que a dignidade da pessoa humana pelos estudiosos não tem um consenso de quando
surgiu alguns acreditam que teria surgido com a Declaração dos Direitos Humanos em 1948 pós-
-segunda guerra mundial, outros por seu turno acreditam que a dignidade surgiu antes mesmo da
vinda de Cristo, quando Deus disse que o homem era sua imagem e semelhança, portanto, um ser
digno, interessante que além da dignidade ser inerente ao ser humano, o que significa dizer que

30 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 23
não há como perder essa dignidade, com o passar dos anos, com a evolução da medicina a popu-
lação de um modo geral tende a envelhecer, logo, a razão do idoso ser tratado com mais dignidade
ainda.

A dignidade da pessoa humana é inerente à condição humana, que se trata de um macroprin-


cípio do qual se extraem princípio e valores indispensáveis, veja: a liberdade, a autonomia privada,
a cidadania, a igualdade, a alteridade e a solidariedade, e muitos outros que se difundem pelo or-
denamento jurídico em vigor ou ainda pelo contexto social.

O envelhecimento é um direito da personalidade e sua proteção um direito social.

A inércia dos poderes legislativo e executivo que estão sucumbindo frente ao judiciário que
utiliza na prática da jurisdicidade e do ativismo judicial para combater a inércia de ambos os pode-
res citados, como ocorre no caso da desaposentação a ser julgado pelo STF, um mecanismo que
pode reinserir o idoso no mercado de trabalho.

O princípio da dignidade da pessoa humana é como uma ferramenta mestra, e vai servir para
contribuir na solução de conflitos jurídicos advindos das incertezas nos julgamentos dos casos ati-
nentes ao idoso.

Diante de todo o ensaio mostrou-se importante e necessário à inserção da pessoa idosa


possibilitando uma integração justa e humana de um mundo do qual também faz parte, através
de um retorno ao mercado de trabalho com a desaposentação, ou retorno aos estudos, dando
palestras experientes, sendo gestores ou organizadores de pessoas mais jovens, para que assim
possam conquistar dignidade e respeito, em uma sociedade ocidental e capitalista e de consumo
pós-moderna, o seu devido lugar, não se prendendo apenas na proteção Constitucional, o Estatuto
do Idoso, e outras leis e decretos, que na realidade sem um efetivo esforço de sua participação, da
sociedade, da família, do Estado, culmina em uma letra morta esquecida no papel.

REFERÊNCIAS

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VASCONCELOS, Pedro Pai de. Direito da personalidade. Coimbra: Almedina, 2006.

THE ELDERLY AND THE HUMAN PERSON DIGNITY: UNDER THE


VULNERABLE GROUP PERSPECTIVE
ABSTRACT: This study addresses do not only the human person dignity, but especially the elderly social
issue, the medicine advancement that generally provides greater people longevity, the elderly vulnerability
when they left the productive world of work going to live with a new reality, the legal recognition of the vul-
nerability about these people as a breakthrough seeking to preserve not only the physical and mental health
much still preserve the elderly dignity in all its segments. Before a capitalist and western society, values and
principles are built based on productivity, and how the elderly becomes does not produce he begins to be
devalued in society. The work is that it allows the healthy habit to exist, as the work that dignifies man, it of
a place in society and within the family. It is in retirement that citizen happens to need much more support
from family, as losing the role he plays much more depending on their families, and outside the family is not
different as the elderly must have a friendly atmosphere in society where he has affection and understanding
of friends and colleagues, do not just want a long life but with quality and satisfaction. There is a link between
the elderly´s life quality with an active life which is of utmost importance, for those who eschew these relation-
ships have a shorter life and less health, children and grandchildren are the mainstay for elderly.

KEY-WORDS: Elderly. Dignity. Human. Vulnerable group.

26
DISCRIMINAÇÃO HOMOFÓBICA: UM ATENTADO AOS
DIREITOS DA PERSONALIDADE DAS MINORIAS E GRUPOS
VULNERÁVEIS

Robson Aparecido Machado


Mestrando em Ciências Jurídicas pelo Unicesumar – Centro Universitário Cesumar. Graduado em Direito
pela Faculdade Barretos-SP (2014). Advogado em Barretos-SP. Endereço eletrônico: robsonbarretos@adv.
oabsp.org.br

Horácio Monteschio
Doutorando em Função Social do Direito pela FADISP – Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo. Mestre em
Ciências Jurídicas pelo UniCesumar - Centro Universitário Cesumar (2014). Graduado em Direito pela Unioeste –
Universidade do Oeste Paulista (1995). Advogado em Curitiba-PR Endereço eletrônico: h.monteschio@uol.com.br.

RESUMO: Este artigo tem por escopo analisar as minorias e os grupos vulneráveis no sentido de conceituá-los, bem
como traçar os pontos divergentes e convergentes destas categorias. Ainda que a imprecisão de definição destas
categorias deixem margens para uma discordância doutrinária e jurisprudencial, certo é que, na prática, ambas as ca-
tegorias sofrem discriminação e intolerância por parte da sociedade. Desta forma, independentemente, se as pessoas
LGBT pertençam à categoria das minorias ou dos grupos vulneráveis elas necessitam de uma proteção especial por
parte do Estado, já que a discriminação por motivação homofóbica viola o princípio da dignidade da pessoa humana,
bem como viola, sobremaneira, os direitos da personalidade, como o direito à vida privada, direito à honra e à ima-
gem. Nessa linha de raciocínio, o princípio da igualdade, também é violado, pois em sua dimensão formal exige-se que
todas as pessoas sejam reconhecidas com a qualidade de sujeito de direito e, com relação a dimensão material, esta
deve ser garantida através de políticas públicas com o fito de combater as discriminações de todo tipo, aumentando a
participação das pessoas LGBT no processo político, acesso à educação e à justiça, captação de empregos, corrigindo,
assim, toda forma de desigualdade.

PALAVRAS-CHAVES: Minorias. Grupos Vulneráveis. Homossexualidade.

INTRODUÇÃO
O estudo das minorias e dos grupos vulneráveis, sobretudo, sob a ótica internacional de
proteção da ONU, é de extrema importância para que se possa reconhecer os direitos destes gru-
pos humanos em situação de vulnerabilidade. Em que pese não ser tarefa fácil a definição destes
grupos, já que uma parte da doutrina os trata como sinônimos, se perscrutará as características
comuns e distintivas dos grupos minoritários e dos grupos vulneráveis.

A ONU até hoje não conseguiu uma conceituação para minorias que fosse satisfatória para a
doutrina e reconhece os direitos apenas das minorias étnicas, religiosas e linguísticas, denomina-
das de minorias tradicionais, porém, isto não significa que os grupos vulneráveis foram ignorados
pela ONU.

Uma das principais dificuldades em se conceituar as minorias de forma universal reside em


ajustar de forma aceitável os interesses dos Estados e dos grupos envolvidos nessa celeuma.
27
É cediço que os direitos da personalidade tanto das minorias quanto dos grupos vulneráveis
são constantemente violados. Em razão disto, a imprescindibilidade de uma proteção estatal
através ações afirmativas, ou seja, políticas públicas que tem o objetivo de corrigir as desigualdades
presentes na sociedade.

Por fim, as pessoas LGBT sofrem todo tipo de preconceito e discriminação diante da hetero-
normatividade exercida no Brasil, o que viola o princípio basilar da dignidade da pessoa humana
e seu consectário, o princípio da igualdade. Assim, na busca de se reconhecer direitos de discri-
minação positiva permanentes para as pessoas LGBT visando a proteção da dignidade individual
de cada integrante deste grupo, se faz necessário enquadrá-los como grupo minoritário ou grupo
vulnerável.

1 – MINORIAS E GRUPOS VULNERÁVEIS

1.1 – DEFINIÇÕES E CONCEITOS DE MINORIAS E GRUPOS VULNERÁVEIS

A sociedade é composta de pessoas ligadas por características físicas, culturais, sociais,


econômicas, religiosas que, em virtude de sua vulnerabilidade social, não tem voz e necessitam de
tutela especial dos direitos humanos. Assim, em um conceito clássico de democracia pode-se dizer
que é a vontade da maioria, porém, esta é uma visão apenas quantitativa, já que qualitativamente,
democracia é o regime das minorias, pois, somente na democracia é que as minorias podem e
devem ser ouvidas.

Nas palavras de Muniz Sodré, democracia é o palco das discussões sociais onde as minorias
têm voz ativa:

Eu disse primeiramente “voz”. É um significado subsumido, por exemplo, no modo como os


alemães entendem maioridade e menoridade. Em Kant, maioridade é Mündigkeit, que implica li-
teralmente a possibilidade de falar. Münd significa boca. Menoridade é Unmündigkeit, ou seja, a
impossibilidade de falar. Menor é aquele que não tem acesso à fala plena, como o infans.31

Na doutrina, as pessoas marginalizadas, sem voz e sem vez, ora são tratadas como grupos
vulneráveis – que têm seus direitos humanos mais facilmente violados -, ora são referidas como
minorias – consideradas inferiores e discriminadas pelos grupos majoritários.

Assim, na visão de Anjos Filho32, poderia se classificar as minorias como espécie de grupos
vulneráveis em sentido amplo. Desta forma, grupos vulneráveis em sentido amplo seria um gênero
ao qual pertenceriam pessoas com deficiência, idosos, mulheres, homossexuais, favelados, crian-
ças, minorias étnicas, religiosas e linguísticas, índios, dentre outros. Estes grupos vulneráveis em
31 SODRÉ, Muniz. Por um conceito de minoria. In: PAIVA, Raquel; BARBALHO, Alexandre (Orgs.). Comunicação
e cultura das minorias. São Paulo: Paulus, 2005, p. 12.
32 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Minorias e Grupos Vulneráveis: uma proposta de distinção. In: ROCHA,
J. C. de Carvalho; HENRIQUES FILHO, T. H. P.; CAZZETA, U. (Coords.). Direitos Humanos: desaios humanitários
contemporâneos: 10 anos do Estatuto dos Refugiados (Lei n. 9.474, de 22 de julho de 1997). Belo Horizonte: Del
28 Rey, 2008. p. 342.
sentido amplo se dividiriam em duas espécies: minorias e grupos vulneráveis em sentido estrito.

Corrobora com este entendimento de distinção entre minorias e grupos vulneráveis, no qual
uma minoria é sempre um grupo vulnerável, o professor espanhol, José Maria Contreras Mazario,
citado por Marcelo dos Santos Bastos, ainda que o contrário não seja possível:

[minorias] son aquéllos que sufren una discriminación y se caracterizan por ser una sección no
dominante de la población de dos Estados. Desde esta caracterización teórica, las mimorías y os
grupos vulnerables formarían uma única y misma categoría. Sin embargo, a nuentro entender, una
minoría es siempre um grupo vulnerable, entendiendo por tal um grupo no dominante o subordina-
do de la sociedade, pero no sucede lo mismo al contrario, esto es, no todo grupo vulnerable es uma
minoría, ya que pueden no tener características éticas, religiosas o lingüísticas, que sus miembros
no se sientan unidos a dictos elementos distintivos como configuradores de su propria identidad o,
en fin, que tengan ningún elemento de permanencia o de lealtad al Estado em que vivem. Ello lleva
a excluir del ámbito de proteción de la minoría a grupos tales como los refugiados, los asilados [e
los extanjeros].33

Ressalta-se que as minorias sempre estiveram presentes em toda sociedade e, no Brasil,


de modo especial através de uma cultura escravagista, já que desde a colonização portuguesa
utilizou-se a mão de obra indígena, depois os escravos negros e no começo do século passado os
imigrantes.

Porém, esta questão de minorias passou a ser tratada pela Liga das Nações no período entre
as duas grandes guerras mundiais, principalmente, em razão das atrocidades ocorridas durante a
Segunda Guerra Mundial, com o reconhecimento da dignidade da pessoa humana.

Assim, diante da necessidade de um sistema internacional de proteção dos direitos humanos


das minorias, com base na dignidade da pessoa humana, a qual é supedâneo de todo ordena-
mento jurídico pós-positivista, a ONU não conseguiu ainda chegar num denominador comum que
agrade a todos sobre uma definição clara de minorias.

O primeiro instrumento normativo da ONU que tratou sobre minorias, ainda que não a concei-
tuasse, foi o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966, porém, tratou de modo ge-
nérico o reconhecimento de direitos de grupos minoritários, conforme disposto no artigo 27, deste
documento:

Artigo 27 – “Nos Estados em que haja minorias étnicas, religiosas ou linguísticas, as pessoas
pertencentes a essas minorias não poderão ser privadas do direito de ter, conjuntamente com ou-
tros membros de seu grupo, sua própria vida cultural, de professar e praticar sua própria religião e
usar sua própria língua”

Em 1977, o relator especial da Subcomissão das Nações Unidas para a Prevenção da Discri-

33 MAZARÍO, José Maria Contreras. Las Naciones Unidas y la Protección de las Minorias Religiosas: de la tolerân-
cia a la interculturalidad. Tirant monografías. España, Universidad de Sevilla Pablo D’Olavide, 1997 apud BASTOS,
Marcelo dos Santos. Da Inclusão das Minorias e dos Grupos Vulneráveis: uma vertente eficaz e necessária para a
continuidade da ordem jurídica constitucional. Revista Brasileira de Direito Constitucional-RBDC, n. 18. jul./dez.
2011. Disponível em: http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-18/RBDC-18-039-Artigo_Marcelo_dos_Santos_Bastos_
(Da_Inclusao_das_Minorias_e_dos_Grupos_Vulneraveis).pdf. Acesso em: 03 ago. 2016. 29
minação e Proteção das Minorias, Francesco Capotorti, apresentou uma definição para minorias,
baseada no aspecto quantitativo, que até hoje é muito utilizada:
[...] um grupo numericamente inferior ao resto da população de um Estado, em posi-
ção não dominante, cujos membros – sendo nacionais desse Estado – possuem ca-
racterísticas étnicas, religiosas ou linguísticas diferentes das do resto da população
e demonstre, pelo menos de maneira implícita, um sentido de solidariedade, dirigido
à preservação de sua cultura, de suas tradições, religião ou língua.34

No Brasil, a Ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmem Lúcia Antunes Rocha, entende
que o aspecto quantitativo não é fulcral na definição de minorias, já que a proteção jurídica dos
grupos minoritários deve levar em consideração o tratamento desigual e discriminatório destas
pessoas:

Não se toma minoria no sentido quantitativo, senão no de qualificação jurídica de grupos con-
templados ou aceitos com um cabedal menor de direitos, efetivamente assegurados, que outros,
que detém o poder (...) a minoria, na prática de direitos, nem sempre significa o menor número de
pessoas. Antes, nesse caso, uma minoria pode bem compreender um contingente que supera em
número (mas não na prática, no respeito etc.) o que é tido por maioria.35

Com efeito, em 18 de dezembro de 1992, a Assembleia Geral das Nações Unidas, através da
Resolução 47/135, da Declaração sobre os Direitos de Pessoas que pertençam a Minorias Nacio-
nais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas, explicitou os direitos do artigo 27, do Pacto Internacional,
porém, também não definiu minorias.

Nessa esteira, a ONU em 1994, recomendou à Comissão de Direitos Humanos a criação de


um grupo de trabalho no sentido de se encontrar uma definição de minorias. Em 1997, Stanislav
Chernichenko, membro da Subcomissão de Prevenção de Discriminação e de Proteção de Minorias
das Nações Unidas, apresentou uma proposta sobre alguns requisitos norteadores das minorias,
porém, que não fosse uma obrigação legal, mas sim flexível, que servisse apenas como um guia.

1.2 ELEMENTOS QUALIFICADORES E CARACTERÍSTICOS DAS MINORIAS

Todas estas propostas elaboradas pela ONU, juntamente com demais estudos elaborados por
antropólogos, pela doutrina, jurisprudências e outros organismos internacionais permitem determi-
nar alguns elementos que caracterizam as minorias. Em geral, são apontados quatro elementos
objetivos: o diferenciador; o quantitativo; a nacionalidade e a não-dominância, bem como um ele-
mento de natureza subjetiva, a solidariedade.36

Com relação ao elemento diferenciador (aquele que qualifica a minoria), este exige que em
cada pessoa do grupo minoritário haja uma determinada característica, de forma estável, que o
distinga do grupo majoritário. Assim, a ONU considera para fins de proteção dos direitos humanos

34 COELHO, Fábio Alexandre. A idade mínima para a inscrição no regime geral de previdência social e os
direitos dos índios. Disponível em: http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/bh/fabio_ale-
xandre_coelho.pdf. Acesso em: 04 ago. 2016.
35 COELHO, Fábio Alexandre. Op. cit. Acesso em: 04 ago. 2016.
30 36 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Op. cit. p. 350-351.
os elementos diferenciadores da etnia, religião e língua.

Já o elemento quantitativo parte do pressuposto que os grupos numericamente majoritários


não necessitam da proteção especial. Desta forma, nem todos os grupos numericamente inferiores
devem ser, necessariamente, protegidos.

O elemento da nacionalidade sofreu algumas alterações já que levava em consideração a


condição de nacional ou cidadão como requisito para minoria. O Comitê de Direitos Humanos em
interpretação do artigo 27 do Pacto Internacional sobre Direitos civis e Políticos, reconhece os di-
reitos a grupos minoritários que sem encontram dentro dos limites territoriais, independentemente
de serem cidadãos ou nacionais.

A não-dominância consiste que o grupo minoritário, para ter direito a proteção especial, não
pode estar em uma situação de domínio do processo político. Grupos que exercem o poder político,
ainda que numericamente pequenos, estão em situação de destaque na sociedade.

Ademais, o elemento subjetivo da solidariedade significa uma vontade coletiva das pessoas
pertencentes ao grupo de preservar as características que os distinguem das demais pessoas, ou
seja, a preservação do elemento diferenciador.

De outro lado, o professor Antonio Celso Baeta Minhoto37, discorda em alguns pontos com
Anjos Filho e apresenta cinco características das minorias: incapacidade de autoproteção; deman-
dantes de especial proteção estatal; vulnerabilidade social; distanciamento do padrão hegemônico
e opressão social.

Em primeiro lugar, os grupos minoritários, via de regra, se mostram incapazes de se protege-


rem a si próprios e aos seus interesses de maneira autônoma, em níveis e graus diferentes.

Exatamente pela incapacidade de autoproteção, de autonomia e articulação na busca de


seus interesses, os grupos minoritários necessitam de atenção especial por parte do Estado. Esta
demanda estatal se dá através de mecanismos, instrumentos, estruturas com o fito de oferecer as
mesmas oportunidades de grupos majoritários.

Para definir vulnerabilidade social, Minhoto cita Muniz Sodré:


[é] caracterizada pelo fato do grupo minoritário “não ser institucionalizado pelas re-
gras do ordenamento jurídico-social vigente” e que, por isso, mas não somente por
isto, ”pode ser considerado ‘vulnerável’ diante da legitimidade institucional e diante
das políticas públicas, Donde sua luta por uma voz, isto é, pelo reconhecimento so-
cietário de seu discurso”.38

Assim, pode haver em determinadas épocas, a inserção ou exclusão de grupos em situação


de vulnerabilidade social.

O distanciamento do padrão hegemônico é outra característica das minorias e gera efeitos ne-

37 MINHOTO, Antonio Celso Baeta. Da escravidão às cotas: a ação afirmativa e os negros no Brasil. Birigui-SP:
Boreal, 2013. p. 3-10.
38 Por um conceito de minoria. In: PAIVA, Raquel; BARBALHO, Alexandre (orgs.).Comunicação e Cultura das
Minorias. São Paulo: Paulus, 2005. apud MINHOTO, Antonio Celso Baeta. Da escravidão à cotas: a ação afirmativa
e os negros no Brasil. Birigui-SP: Boreal, 2013. p. 5-6. 31
fastos aos componentes deste grupo. É uma ação involuntária e automática por parte da sociedade
majoritária que independe de qualquer conduta das pessoas dos grupos minoritários.

Estas minorias, por estarem fora de um padrão imposto pela sociedade majoritária, seja so-
cial, comportamental, moral, estético, psicológico, econômico são excluídas, discriminadas e mar-
ginalizadas, o que as tornam incapazes de uma autoproteção e, em razão disto, necessitam de
uma proteção especial estatal.

Nesse sentido, as pessoas transexuais, travestis, transgêneros, homossexuais e bissexuais


são exemplos da fuga deste padrão social denominado de heteronormatividade e sofrem todo tipo
de preconceito, discriminação e homofobia.

A característica da opressão social pode se apresentar de forma mais violenta ou mais bran-
da, conforme a lição de Antonio Celso Baeta Minhoto:39
Há exemplos extremos de opressão social em face de grupos minoritários, como os
ciganos, negros, homossexuais e judeus na vigência do regime político nazista na
Alemanha na primeira metade do século XX. [...] Podemos encontrar minorias como
os curdos, acossados pela Turquia e quase dizimados pelo Iraque na vigência do
governo de Saddam Hussein, vivendo, assim, uma situação de luta por sua própria
existência como povo, assim como podemos nos deparar com os presos afegãos da
prisão de Guantánamo, em Cuba, oprimidos pelo modo intenso e só recentemente
observados como sujeitos de direito. São exemplos pungentes e extremos. Mas há
também situações de opressão mais branda, mais sutil e nem por isso menos rele-
vantes, como os imigrantes bolivianos na Argentina ou a comunidade árabe-muçul-
mana na França, especialmente em Paris, ambos grupos objeto de opressão social
e forte segregação.

Por fim, para Minhoto, “minoria é um segmento social, cultural, ou econômico vulnerável, inca-
paz de gerir e articular sua própria proteção e a de seus interesses” e, em razão das características
apresentadas acima necessitam de uma proteção especial estatal.40

1.3 MINORIAS E GRUPOS VULNERÁVEIS: ASPECTOS COMUNS E


DISTINTIVOS

Nesta linha de raciocínio, Anjos Filho41, destaca alguns aspectos comuns tanto para minorias
quanto para os grupos vulneráveis em sentido estrito: a) Desnecessidade dos componentes dos
grupos serem nacionais ou cidadãos do Estado em que se encontram; b) ambos são grupos não-
-dominantes; e c) Incidência de vulnerabilidade.

Um exemplo de grupo vulnerável em sentido estrito não composto por nacionais, mas que
carecem de proteção especial nos termos dos direitos humanos são os trabalhadores migrantes.

Além disso, aqueles que têm o domínio político, ainda que sejam numericamente inferiores,
não são enquadrados como vulneráveis, já que são elites político-econômicas. Antropologicamen-
te, a condição de minoria decorre da relação de dominância e subordinação. Assim, a maioria é o

39 MINHOTO, Antonio Celso Baeta. Op. cit. p. 8.


40 MINHOTO, Antonio Celso Baeta. Op. cit. p. 9.
32 41 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Op. cit. p. 357-358.
grupo dominante, enquanto que a minoria é o grupo dominado.

Ademais, Anjos Filho, entende que para fins de especial proteção dos Direitos Humanos, além
da condição de não-dominância, as minorias e os grupos vulneráveis em sentido estrito, também
devem estar em condição de vulnerabilidade.

Com efeito, nem toda fragilidade é considerada uma vulnerabilidade, já que as fragilidades
são protegidas por mecanismos tradicionais, ao passo que a vulnerabilidade implica em necessida-
de de proteção especial de direitos humanos.

De outro lado, Anjos Filho, aponta alguns aspectos distintivos entre minorias e grupos vulnerá-
veis em sentido estrito: a) Quanto aos elementos numéricos; b) quanto ao elemento diferenciador;
e c) Quanto ao elemento solidariedade. 42

As minorias, conforme projeto da Convenção de Proteção das Minorias elaborado pela Co-
missão Europeia da Democracia para o Direito, em 1991, é um grupo numericamente inferior ao
resto da população de um Estado.43

Já essa exigência de inferioridade numérica não se aplica aos grupos vulneráveis em sentido
estrito, pois estes podem ser numericamente majoritários. Um exemplo de necessidade de proteção
especial para grupos vulneráveis numericamente superiores foi no regime apartheid, regime de se-
gregação racial adotado de 1948 a 1994 pelos sucessivos governos do Partido Nacional na África
do Sul, no qual os direitos da maioria dos habitantes foram cerceados pelo governo formado pela
minoria branca, assim, diante da vulnerabilidade constituía um grupo vulnerável em sentido estrito
e não uma minoria.

Com relação ao elemento diferenciador há distinções entre minorias e grupos vulneráveis em


sentido estrito. De acordo com o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966, em seu
artigo 27, e a Declaração Sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou
Étnicas, Religiosas e Linguísticas de 1992, os direitos ali reconhecidos não abrangem todos os gru-
pos vulneráveis, mas, tão somente, as minorias étnicas, religiosas e linguísticas, que ao lado das
minorias nacionais são chamadas comumente pela doutrina de minorias históricas ou tradicionais.

A cultura é o principal componente deste elemento diferenciador característico das minorias,


sobretudo na minoria étnica, pois a cultura étnica se manifesta através das tradições, língua e re-
ligião.

Desta forma, não é a natureza física (cor, idade, gênero) que qualifica uma minoria. A natureza
física é um elemento diferenciador dos grupos vulneráveis em sentido estrito, bem como as opções
derivadas da personalidade individual (homossexuais, travestis, simpatizantes de ideologias polí-
ticas) e aspectos socioeconômicos (pobres, favelados, presidiários, desempregados, sem-terra).

Outra característica distintiva entre minorias e grupos vulneráveis em sentido estrito é que nas
minorias há necessariamente uma estabilidade do elemento diferenciador, já nos grupos vulnerá-
veis em sentido estrito podem ser permanentes (negros, mulheres) ou temporários (presidiários,

42 Ibid. p. 359-366.
43 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Op. cit. p. 350. 33
desempregados, refugiados).

Com relação à solidariedade, esta é de suma importância para a distinção entre minorias e
grupos vulneráveis em sentido estrito. Para tanto, deve-se levar em conta a proposta de definição
de minorias elaborada pelas Nações Unidas através de Capotorti, Dêschenes e Chernichenko, que
“expressamente exigem que o grupo em questão deseje, ao menos implicitamente, a manutenção
de seus elementos diferenciadores” 44

Diante destas explanações, as pessoas LGBT não se enquadram como minorias, na visão
mais restrita elaborada por Anjos Filho, o qual leva em conta o elemento diferenciador da ONU que
reconhece os direitos apenas das minorias étnicas, religiosas e linguísticas, as quais são denomi-
nadas pela doutrina de minorias tradicionais. Com este raciocínio, as pessoas LGBT pertenceriam
aos grupos vulneráveis em sentido estrito.

Em contraponto, diante da interpretação de Baeta Minhoto, as pessoas LGBT possuem as


características das minorias, a saber: incapacidade de autoproteção; demandantes de especial
proteção estatal; vulnerabilidade social; distanciamento do padrão hegemônico e opressão social.

Infelizmente, no Brasil, apesar das constantes evoluções com relação a garantia de direitos e
liberdades fundamentais, ainda vive-se sob a égide de uma ordem heterossexual, mesmo que de
forma subjetiva. Assim, quando homossexuais, transexuais, lésbicas, travestis e outras pessoas
desviam desse padrão de heteronormatividade sofrem todo tipo de discriminações, hostilidades,
violências físicas e morais.

As pessoas LGBT estão incluídas no conceito de minoria social, já que são incapazes de ge-
rir seus próprios interesses e estão distantes do padrão social (heteronormatividade), bem como
sofrem graus variados de opressão social e por tudo isto necessita de uma proteção especial por
parte do Estado.

Nesse sentido é incontestável que a classe de pessoas pertencentes a esta minoria social de-
nominada de LGBT necessita de uma maior proteção estatal. Diante de toda esta violência sofrida,
seja de ordem física, verbal ou moral, essas pessoas necessitam, além de uma proteção na esfera
cível, de uma tutela penal que criminalize tais atos.

2 – DIREITOS DA PERSONALIDADE

2.1 CONCEITO, ORIGEM E EVOLUÇÃO

Os direitos da personalidade são inatos à pessoa humana. “O direito da personalidade é um


direito subjetivo, de caráter não patrimonial, que visa, na verdade, tutelar a própria pessoa humana,
a sua dignidade e integridade”.45

44 ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Op. cit. p. 362.


45 CARDIN, Valéria Silva Galdino; BENVENUTO, Fernanda Moreira. Do Reconhecimento dos Direitos dos Transe-
34 xuais como um dos Direitos da Personalidade. Revista Jurídica Cesumar – Mestrado. Unicesumar, Maringá (PR),
Quanto à origem dos direitos da personalidade, é cediço que desde a antiguidade existem
relatos, de forma isolada, de sua manifestação e, nas palavras de Elimar Szaniawski, “as origens
mais remotas da existência de categorias jurídicas destinadas a tutelar a personalidade humana
são encontradas nas hybris grega e na iniura romana”46

Com efeito, na Grécia Antiga, em seu ordenamento jurídico já havia a aplicação do princípio
da personalidade do direito, todavia, atingia somente as relações entre os cidadãos gregos ou entre
eles e os estrangeiros. O direito geral de personalidade adquiriu forças somente apenas entre os
séculos Iv e III a.C, reconhecendo que cada pessoa era portadora de personalidade, bem como de
capacidade jurídica. A tutela da personalidade humana, nesta época, possuía uma natureza jurídica
exclusivamente penal diante, por exemplo, de uma lesão corporal, difamação ou estupro.

Destaca-se que com a influência de alguns filósofos, principalmente Aristóteles, intensificou-


-se o pensamento de igualdade entre as pessoas e a busca do bem comum como escopo da socie-
dade grega. Com esta visão, a tutela da personalidade humana adquiriu consolidação e passou-se
a reconhecer um “único e geral direito de personalidade em cada ser humano, firmando-se, desta
maneira, a noção de uma cláusula geral protetora da personalidade de cada indivíduo, representa-
da pela hybris”.47

Embora os direitos da personalidade tenham se manifestado na anrtiga Grécia, a doutrina


clássica atribuiu aos romanos a elaboração da teoria jurídica dos direitos da personalidade. Para
os romanos, “a expressão personalidade restringia-se aos indivíduos que reunissem os três status,
a saber: o status libertatis, o status civitatis e o status familiae”.48

Nesse sentido, os escravos não eram considerados cidadãos, senão objetos, coisas, por-
tanto, não tinham personalidade e não era considerado sujeito de direitos. Não possuíam o status
libertatis e por serem considerados “coisa” sobre eles poderiam se constituir propriedade, usufruto,
penhor.

Somente os cidadãos possuíam a capacidade jurídica plena, do contrário, não era considera-
do romano por não possuir o status civitatis. “Em 212 a.C., o Imperador Caracala outorgou o status
civitatis a todos os habitantes do império, à exceção dos peregrinos deditícios”49 (indivíduos expul-
sos de Roma, tornaram-se persona non grata e não poderiam pisar em Roma).

Além dos requisitos de liberdade e cidadania, para que se possuísse a personalidade (capaci-
dade jurídica plena) era necessário o status familiae. A família romana era subordinada ao paterfa-
milias, na qual o pai era o chefe, o administrador e o sacerdote da família. Somente o paterfamilias
possuía plena capacidade jurídica e era chamado de suiuris (autonomia de qualquer poder familiar),
enquanto que os demais familiares tinham a capacidade jurídica reduzida e eram denominados de
alieni iuris. Sobre a tutela da personalidade humana em Roma, Szaniawski, afirma:

v. 13, n. 1, 2013. Disponível em: http://periodicos.unicesumar.edu.br/index.php/revjuridica/article/view/2899/1896.


Acesso em: 09 Ago 2016.
46 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos de Personalidade e sua Tutela. 2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005. p. 23.
47 Ibid. p. 25.
48 SZANIAWSKI, Elimar. Op. cit. p. 25.
49 Ibid. p. 27. 35
[...] já havia em Roma a tutela da personalidade humana através da actio iniurariam,
que assumia a feição de uma verdadeira cláusula geral protetora da personalidade
do ser humano. Todavia, esta proteção não apresentava, nem poderia oferecer uma
tutela da pessoa na mesma intensidade e no mesmo aspecto que hoje, principal-
mente devido à diferente organização social daquele povo, distante e desprendido
da visão individualista que possuíamos de nossa pessoa, à completa ausência de
desenvolvimento das pesquisas médicas e biológicas que possuíamos na atualidade
e à inexistência de tecnologia e aparelhos que viessem a atacar e a violar as diversas
manifestações da personalidade humana.

Conforme os ensinamentos de Szaniawski, pessoa, no pensamento de Santo Tomás de Aqui-


no “é aquilo que é revestido de dignidade. O acréscimo do elemento dignidade à pessoa representa
o acréscimo das obrigações da pessoa”.50 O conceito de pessoa, fundamentada na dignidade e na
valorização do ser humano, inspirou todo o pensamento da Idade Média.

No final do século XVII, através do liberalismo, a proteção da pessoa humana passa a ser
reconhecida pelo Estado. O liberalismo, que se desenvolveu na Inglaterra, em razão da monarquia
parlamentarista, controlava e limitava o poder do rei através do parlamento, o qual era um órgão
que representava a soberania popular.

Estes ideais liberais chegaram até a América do Norte e foram inseridas na Declaração de Di-
reitos do Bom Povo da Virginia, em 1776, bem como nas demais constituições das antigas colônias
inglesas. Também, na Declaração de Independência das treze colônias inglesas, em 04 de julho de
1776 e na Constituição dos Estados Unidos da América, em 1787 foram inseridos os princípios de
liberdades e direitos fundamentais e a proteção da pessoa humana.

Nesta linha de pensamento, a França, em 1789, inspirada pelos filósofos Rosseau, Montes-
quieu e Voltaire e com a derrocada da monarquia absolutista, institui o Estado liberal com funda-
mento no individualismo. Neste mesmo ano, promulga a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão.

Sequencialmente, outras tantas Declarações tiveram como base a Declaração de 1789, com
destaque para a Declaração Universal dos Direitos do Homem, votada pela Assembleia Geral da
ONU, em 1949.

No século XX, em razão principalmente das duas grandes guerras mundiais, tem início uma
transformação econômico social que abala as estruturas jurídicas consolidadas no direito civil clás-
sico. Assim, com a transformação do Estado liberal em Estado social, a Constituição torna-se o
núcleo jurídico estatal e com princípios e regras dispostas em seu bojo passa a regular as relações
sociais.

Com efeito, o ser humano passa a ser o centro do sistema jurídico-axiológico com a ordem
jurídica “protegendo sua dignidade e garantido-lhe o livre desenvolvimento da personalidade. Daí
consistir o direito de personalidade em um direito subjetivo de categoria especial, de proteção e de
respeito a todo ser humano”. 51

50 Ibid. p. 36.
36 51 SZANIAWSKI, Elimar. Op. cit. 57.
2.2 A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE DAS PESSOAS LGBT

O preconceito e a discriminação atentatória contra as pessoas LGBT violam os direitos da


personalidade, sobretudo a honra e a vida privada. Insta mencionar que a doutrina divide-se com
relação aos direitos da personalidade, já que para os pluralistas existem diversos direitos da per-
sonalidade que devem estar positivados no ordenamento jurídico, em contrapartida, os monistas
afirmam que deve haver um direito geral de personalidade, o qual deve incluir todos os bens e inte-
resses jurídicos concernentes à personalidade, ainda que não estejam expressos no ordenamento
jurídico.

No Brasil, ainda que não haja previsão para uma tutela geral dos direitos da personalidade,
pois o Código Civil brasileiro prevê uma proteção específica para alguns direitos da personalidade,
a Constituição Federal instituiu o princípio da dignidade da pessoa humana com assistência integral
à pessoa.

Nesta seara, a Dignidade da Pessoa Humana, considerada o cerne dos direitos fundamentais
com previsão no inciso III, do artigo 1º, é o fundamento para uma cláusula de tutela geral da per-
sonalidade.

Ademais, um dos objetivos constitucionais é “promover o bem de todos, sem preconceito de


origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, conforme elencado no
artigo 3º, inciso IV. Diante destas garantias constitucionais, pode-se considerar que após o direito à
vida, o direito fundamental mais importante é o direito a não ser discriminado, sob pena de violação
da dignidade da pessoa humana.

Ainda, o princípio da dignidade da pessoa humana é o supedâneo dos direitos humanos fun-
damentais, já que permeia todo o ordenamento jurídico constitucional, portanto, a personalidade
de uma pessoa é tutelada pela dignidade. Assim, a discriminação e o preconceito por motivação
homofóbica viola o princípio basilar da dignidade da pessoa humana, pois todos têm direito de ser
diferente e desenvolver suas particularidades, bem como de não sofrer violência física ou moral por
fugir da heteronormatividade.

Neste diapasão, pode-se dizer que, o princípio da dignidade da pessoa humana suporta tam-
bém uma cláusula geral de tutela ao livre desenvolvimento da personalidade o que remete ao res-
peito da orientação sexual e identidade de gênero de cada pessoa. Destaca-se que a vida digna
não é mais uma possibilidade, é um imperativo para que se assegure a igual liberdade e a livre
igualdade de todos os homens. 52

2.3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O princípio da dignidade da pessoa humana perpassa pela religião, já que o homem é a ima-
gem e semelhança de Deus e como Deus é digno o homem também tem dignidade. Também na
filosofia a dignidade humana está na valoração moral e na posição social ocupada pelo indivíduo

52 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O Direito à Vida Digna. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p.13. 37
na sociedade.

Para o último grande filósofo da era moderna, Immanuel Kant, o homem deve ser tratado
como fim e não como meio e em razão de seu valor o homem tem dignidade e não preço.

No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço,
pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de
todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade.53

Ressalta-se que o princípio da dignidade da pessoa humana tem por objetivo promover o livre
desenvolvimento da pessoa, bem como tolher qualquer degradação ou tratamento desumano.

Deste modo, Luiz Alberto David Araújo, acrescenta que a busca pela felicidade é o desejo
perene do homem e ele tem este direito garantido pelo princípio da dignidade da pessoa humana:
[...] ao arrolar princípios como o do Estado Democrático, o da dignidade da pessoa
humana e o da necessidade de promoção do bem de todos, sem qualquer preconcei-
to, o constituinte garantiu o direito à felicidade. Não o escreveu de forma expressa,
mas deixou claro que o Estado, dentro do sistema nacional, tem a função de promo-
ver a felicidade, pois a dignidade, o bem de todos, pressupõe o direito de ser feliz.54

2.4 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Destaca-se que um dos princípios consectários da dignidade da pessoa humana é o princípio


da igualdade. Este princípio está positivado na Constituição Federal em seu artigo 5º, caput, toda-
via, esta é apenas uma igualdade formal que não garante que todos tenham as mesmas oportuni-
dades ou até mesmo uma participação social.

Em contrapartida, a igualdade material ou substancial visa tratar não somente de forma igual,
mas tratar de maneira desigual os desiguais, já que somente vedar a discriminação não garante a
efetiva igualdade.

2.4.1 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE FORMAL E MATERIAL DIANTE DAS PESSOAS LGBT

O princípio da igualdade formal, ou seja, a igualdade perante a lei, “exige que se reconheça
em todos, independentemente da orientação homo ou heterossexual – a qualidade de sujeito de
direito: isto significa, na prática, não identificá-lo com a pessoa heterossexual”.55

Assim, diante do princípio da igualdade existe a discussão no tocante a discriminação por


orientação sexual perante duas formulações: a reivindicação dos direitos dos homossexuais e o
direito à diferença. Todavia, estas formulações não se encaixam na igualdade formal, já que a
equiparação entre os homossexuais e os heterossexuais culminaria no crescimento desta discrimi-
53 KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. São Paulo: Abril, 1974, p. 234.
54 A Proteção Constitucional do Transexual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 74.
55 RIOS, Roger Raupp. O Princípio da igualdade e a discriminação por orientação sexual: a homossexualida-
de no direito brasileiro e norte-americano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 129.
38
nação, pois, desta forma, partiria do pressuposto que o heterossexual é o paradigma de sujeito de
direito.

Também, com relação ao direito à diferença, no plano formal do princípio da igualdade, é visto
de forma discriminatória em face da orientação sexual, já que quando se postula a diferença parte
do pressuposto que os heterossexuais são os iguais e os homossexuais, os diferentes.

De outro lado, o princípio da igualdade material visa tratar igualmente os iguais e desigual-
mente os desiguais, na medida de sua desigualdade. “Consequência disto, no domínio específico
da orientação sexual, é a imposição de tratamento igual sempre que não se apresentarem razões
suficientes para justificar a desigualdade de tratamento.”.56

Uma das formas de garantia desta igualdade material são as ações afirmativas, ou seja, políti-
cas públicas que tem por objetivo combater discriminações de todo tipo, aumentando a participação
das minorias no processo político, acesso à educação, emprego, corrigindo, assim, toda forma de
desigualdade.

Como exemplo paradigma de combate à discriminação em razão da diversidade sexual tem-


-se a vizinha Argentina que publicou a Lei de Identidade de Gênero o que permitiu à estas pessoas
uma visibilidade com “acesso à educação, à saúde e ao trabalho sem discriminação em razão de
sua sexualidade, promovendo assim a diversidade entre todos os cidadãos e cidadãs”.57

No Brasil, as pessoas LGBT ainda continuam na invisibilidade à espera de legislações que


garantam uma igualdade material que combatam a discriminação homofóbica e transfóbica, con-
forme as resoluções da ONU e da OEA que reconhecem os direitos LGBT como Direitos Humanos.

CONCLUSÃO
O trabalho de pesquisa em questão é de fulcral importância para se chegar próximo a um
conceito de minorias e grupos vulneráveis, bem como analisar os pontos comuns e divergentes
entre essas categorias.

O estudo aprofundado sobre as minorias elaborado pela ONU é recente, já que com as atro-
cidades nazistas durante a Segunda Guerra mundial, sobretudo com os grupos vulneráveis de
judeus, homossexuais, ciganos, acendeu-se o sinal de alerta na luta pelos direitos humanos e
iniciou-se uma transformação no pensamento jus-positivista com ênfase a dimensão axiológica na
elaboração das normas jurídicas.

Diante desta necessidade, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em 1949,
votou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a qual trouxe à baila os direitos fundamen-
tais e a dignidade da pessoa humana como fundamento das constituições de muitos Estados de-
mocráticos.
56 Ibid. p. 135.
57 SÁ NETO, Clarindo Epaminondas de. Diversidade Sexual: direito humano ou direito a ser humano?. Erechim-
-RS: Deviant, 2015. p. 128.
39
Assim, em 1966, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, foi o primeiro instrumento
normativo a tratar sobre o tema minorias, todavia, se limitou a reconhecer os direitos apenas das
minorias étnicas, religiosas e linguísticas.

Porém, somente em 1977, a ONU apresentou uma definição para minorias, baseada no as-
pecto quantitativo, a qual até hoje é bastante utilizada. As características são: a) grupo numerica-
mente inferior; b) não dominância; c) membros nacionais do Estado; d) apresentar características
étnicas, religiosas ou linguísticas diferentes do restante da população; e) solidariedade.

Desta forma, o professor Robério Nunes dos Anjos Filho, em sua obra citada no presente tra-
balho, de acordo com os moldes característicos e restritivos que a ONU trata as minorias em seus
documentos, classifica as minorias como espécie de grupos vulneráveis em sentido amplo. Assim,
ele adota o conceito de grupos vulneráveis em sentido amplo como gênero e como espécies desta
categoria as minorias e os demais grupos vulneráveis em sentido estrito.

Ainda traça alguns aspectos divergentes como o elemento quantitativo, o elemento diferencia-
dor (etnia, religião e língua) e a solidariedade que estão presentes nas minorias, mas que para ele
não são características dos grupos vulneráveis em sentido estrito.

Com efeito, os grupos vulneráveis em sentido estrito são caracterizados pela natureza física
(cor, idade, gênero), pelas orientações derivadas da personalidade individual (orientação sexual,
identidade de gênero, simpatizantes de ideologias políticas) e por aspectos socioeconômicos (con-
dição social, presidiários, desempregados, sem-terra).

De outro lado, as minorias possuem características religiosas, étnicas ou linguísticas diferen-


tes da população majoritária e tem como objetivo, através do elemento subjetivo da solidariedade,
conquistar igualdade formal e material com a maioria.

Nessa linha de raciocínio, a população LGBT se enquadra nos grupos vulneráveis em senti-
do estrito. Todavia, na visão de outros doutrinadores, entre eles, Antonio Celso Baeta Minhoto, as
pessoas LGBT possuem as características das minorias, já que são incapazes de se protegerem,
necessitam de proteção especial estatal, possuem vulnerabilidade social, estão distantes do pa-
drão hegemônico social (heteronormatividade) e sofrem uma opressão social.

As pessoas LGBT necessitam de uma proteção especial estatal por intermédio de políticas
públicas que visem oferecer oportunidades diferenciadas, já que sofrem todo tipo de discrimina-
ções, intolerâncias e violências por desafiarem o padrão heterossexual da sociedade o que tam-
bém afrontam os direitos da personalidade, seja na intimidade ou na honra destas minorias.

Conclui-se que o princípio da igualdade, consectário do princípio da dignidade da pessoa hu-


mana, tanto em seu aspecto formal quanto material, exige a igualdade de tratamento e, em certos
casos, até o tratamento desigual, como é o caso de ações afirmativas (discriminação positiva) para
as pessoas LGBT.

40
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ROCHA, J. C. de Carvalho; HENRIQUES FILHO, T. H. P.; CAZZETA, U. (Coords.). Direitos Huma-
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SZANIAWSKI, Elimar. Direitos de Personalidade e sua Tutela. 2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo:
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41
HOMOPHOBIC DISCRIMINATION: AN ATTACK OF PERSONALITY RIGHTS
FROM MINORITIES AND THE VULNERABLE GROUPS
ABSTRACT: The purpose of this article is to analyze the minorities and the vulnerable groups to conceptualize them
as well as to outline the points of diverging and converging of these categories. Although the inaccuracy of definition
of these categories leave margins for doctrinal and jurisprudential disagreement, it is certain that, in practice, both
categories suffer discrimination and intolerance by society. Thus, regardless if LGBT people belong to the category of
minorities or vulnerable groups they need special protection from the state, since discrimination by homophobic moti-
vation violates the principle of the dignity of the human person and violate greatly, personality rights such as the right to
privacy, right to honor and image. In this line of reasoning, the principle of equality is also violated, because in its formal
dimension is required that all people are recognized by the quality of the subject of law and with respect to material
dimension, it must be ensured through policies public with the aim to combat discrimination of all kinds, increasing the
participation of LGBT people in the political process, access to education and justice, capture jobs, correcting thus all
forms of inequality.

KEY-WORDS: Minorities, Vulnerable Groups. Homosexuality.

42
DIGNIDADE HUMANA, MÍDIA E IDEOLOGIA: ENTRE A
MANIPULAÇÃO MIDIÁTICA E LIBERDADE INDIVIDUAL

Diogo Valério Félix


Mestre em Ciências Jurídicas, área de concentração Direitos da Personalidade e seu alcance na contemporaneidade,
pelo Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR (2010); Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Ma-
ringá - UNICESUMAR (2008). Advogado militante na cidade de Maringá/PR e região. Professor do curso de Direito da
Faculdade Cidade Verde – FCV, e, Centro Universitário de Maringá - UNICESUMAR. E-mail: adv.diogofelix@hotmail.
com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7549347112132551.

Diego Fernandes Vieira


Graduando em Direito pelo UniCesumar – Centro Universitário Cesumar, Maringá – PR. Pesquisador de Iniciação Cien-
tífica do UniCesumar, PIC –UniCesumar. Endereço Eletrônico: diego.vieira_180@hotmail.com.

RESUMO: O objetivo desde estudo é revelar a problemática da autônoma da vontade em razão do controle ideológico
realizado pelas mídias, que são controladas pelo e o capital, apresentando a crise do homem contemporâneo em sua
concepção onto-teleológica enquanto proposta de dignificação do Ser. Atacando tal problemática pelo método teórico,
e o método lógico-dedutivo, que através de analises tanto sociais como filosóficas é possível enxergar a massificação
de uma ideologia que não visa o bem individual e coletivo, mas uma ideologia capitalista que beneficia somente alguns
grupos economicamente superiores, resultando na clara crise da dignidade da pessoa humana, que proporciona um
movimento inverso ao da dignificação, qual seja o da coisificação. Diante do processo de massificação, o homem tor-
na-se algo descartável em nossa sociedade que impõem uma “utilidade” a cada um, e esta utilidade esta intimamente
ligada em sua capacidade de consumo. Observa-se, assim, que a mídia como influenciadora e formadora de opiniões
tem sido usada pelos detentores do capital para disseminar uma ideologia de massa, alienando as pessoas, com o
intuito de lucratividade, e submetendo desta forma a indignidade humana, pois é ceifada um dos seus pilares, a liber-
dade humana.

PALAVRAS-CHAVE: Controle Ideológico, Liberdade, Manipulação Midiática.

INTRODUÇÃO
A essência humana e sua dignidade estão a cada dia que passa mais relativizada e utilitária
na sociedade capitalista em que se encontra. Sendo que a mídia possui um grande papel nesta
relativização e manipulação da liberdade humana.

A mídia e os meios de comunicação em massa, influenciam a população desde seu surgimen-


to com o nascimento da imprensa no fim do século XIV, por Gutenberg (1390-1468), possibilitando
assim o crescimento e divulgação de informações em larga escala. Com o passar do tempo tal téc-
nica se desenvolveu e se aprimorou no quesito alcance, surgindo deste modo a mídia eletrônica,
representada pela TV, rádios, internet, entre outras.

Entretanto, deve-se ater a ideia de que os meios midiáticos possuem uma propriedade e
interesses próprios. E estas pessoas detentoras do capital, que tem poder sobre os meios de co-
municação em massa, os utilizam de acordo com as suas vontades e interesses, manipulando a
população em sua maioria, retirando a liberdade em seu sentido lato sensu de toda a comunidade
que de forma direta ou indireta esta sujeita a mídia.
43
E é pelo “bombardeio de informações que a mídia impõe ao homem contemporâneo, o que
influência direta e indiretamente no seu modo de viver e dificulta-o a fazer escolhas de forma autên-
tica”58. Retirando sutilmente a liberdade de cada indivíduo, manipulando a coletividade de acordo
com os interesses dos donos do capital. Que desvirtuam o real intuito do que teria que ser a mídia.
Mas como Thomas Hobbes sustenta “a natureza humana é regida pelo egoísmo e pela autopreser-
vação”59, logo o homem é o maior inimigo do próprio homem.

Mas na contemporaneidade, a força não é medida por qualidade físicas e nem por habilidade
de caça ou luta, nos dias atuais a força do homem é medida pelo seu capital, pela sua influência
pelos demais, podendo se utilizar de qualquer ferramenta para se conseguir poder e mais poder.

Portanto a mídia se tornou uma ferramenta de alienação de massa, para suprir os interesses
individuais de um grupo, transformando os homens em nada, retirando a sua dignidade, a sua liber-
dade para a construção de seu próprio Eu, afrontando diretamente não só direitos já consolidados
em nossa sociedade, mas desumanizando a ser humano em seu mais amplo sentido.

1 DIGNIDADE E LIBERDADE: UMA PERSPECTIVA ONTO-TE-


LEOLÓGICA
Inobstante a construção de uma teoria que tem por finalidade a contemplação do homem em
todas as suas dimensões humanas, ou seja, daquele conjunto de bens que dotam o ser humano
da qualidade de pessoa, desenvolvida a partir do reconhecimento da dignidade da pessoa humana
e da liberdade enquanto valor, cumpre apontar, no presente trabalho, como os instrumentos ideo-
lógicos de dominação acabam por promover a nihilificação do ser, na medida em que dignidade e
liberdade encontram-se inteiramente tolhidas, dada a incapacidade de emancipação do Ser para
além do capital.

Assim, a abordagem da mídia como instrumento de dominação e sua relação com a perspec-
tiva da tutela da personalidade jurídica depende de uma análise, ainda que preliminar e superficial,
do reconhecimento da dignidade da pessoa humana pelo ordenamento jurídico, seja enquanto
princípio, seja enquanto valor, em especial das condições materiais em que o Direito reconhece o
atendimento do respectivo postulado jurídico.

Respectiva identificação se revela necessária a fim de poder constatar se o Direito, ou teorias


jurídicas, as quais buscam a dignidade humana, podem ser manipuláveis ao ponto de proporcionar
o movimento inverso ao da dignificação, qual seja, o da coisificação.

A concepção dignidade passa a ter uma conotação primordial na existência do homem, tendo
em vista que a própria dignidade é o valor que está consubstanciado na natureza do homem. O
homem passa a ser a medida de todas as coisas, um fim em si mesmo. Então a própria ideia de
58 DA SILVA, Ellen Fernanda Gomes; DE BARROS SANTOS, Ms Suely Emilia. O impacto e a influência da mídia
sobre a produção da subjetividade. 2009. p.5. Disponível em: <http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_
XVENABRAPSO/447.%20o%20impacto%20e%20a%20influ%CAncia%20da%20m%CDdia.pdf>. Acessado em: 05
ago. 2016.
59 MALMESBURY, Thomas Hobbes de. Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. Tra-
44 dução João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva, v. 4, 1983.
dignidade deve estar em consonância com a ideia da natureza do homem, na medida em que após
a era das luzes, o homem passa a ser a medida e fim de todas as coisas.

Considerando que o homem é Ser-Para, ou seja, apresenta-se como potência que deve tor-
nar-se ato, e mesmo que seja atraído pelo Valor, diga-se, realização e construção em dignidade,
pode negar-se à realização como homem por emprego equivocado de sua liberdade, deparando-se
com a nadificação enquanto ser.60

Neste sentido, a própria noção de liberdade, bem como seu emprego, dão sentido a revelação
e reconhecimento da dignidade do homem, pois a liberdade pode trazer sua redenção, recolocan-
do-o em sua jornada rumo à sua transcendência, ou mantê-lo rumo e/ou junto ao nada.

O valor liberdade é quem imprime a trajetória da existência do homem. Da mesma maneira


que pode tornar o homem nada, como já visto, quando ausente de consciência de sua utilização,
também pode conclamá-lo a sua dignificação, tornando-se obra boa em rumo ao Criador, a partir
de seu agir ético.

Jacques Maritain ensina que o agir ético supõe mais do que controle às paixões e questões
atinentes à matéria e a vitalidade, requestando concorrentemente, mínimas condições de cidada-
nia, para, então, propiciar-se ao homem o encontro com o sentido da vida enquanto convívio, dan-
do-lhe de dignidade enquanto pessoa61.

Neste mesmo sentido, Alessandro Zenni62 ensina que:


O dever ser jurídico coincide com o próprio dever ser humano. Elementar a concep-
ção de dinamismo no ser, uma pulsão natural do homem, esse ser que é causa e fim
em si mesmo. O homem, escoimado de sua liberdade, é ser material, causalidade
pura, sem poder conjecturar a ideia de fim, enquanto que pesando em Bem, como
fim, o homem atraído pelo valor, põe sua liberdade diante da convocação de seus
fins, podendo aceitá-los ou negá-los no que convergirá para sua defeicação ou nihi-
lificação.

O valor liberdade, então, é notado como uma condição sine qua non para os demais valores,
indispensável na realização do homem enquanto formação de sua própria natureza de ser humano,
e consequentemente de sua dignidade.63

Veja-se, então, que a liberdade em sentido filosófico é a ponte para o reconhecimento por
parte do homem dos demais valores que o tornam humano, a qual é formada através do processo
personificação que o homem realiza ao longo de sua existência, posto que o homem é um ser para,
construindo-se em dignidade.

Neste sentido, percebe-se que a concepção e fundamentação da dignidade do homem in-


tegral está calcada sob duas dimensões da mesma realidade essencial do homem, partindo dos
fundamentos da ontologia e teleologia (fundamentação onto-teleológica), ou seja, daquilo que o

60 ZENNI, Alessandro Severino Vallér. A Crise do Direito Liberal na Pós-Modernidade. Porto Alegre: Antonio
Sérgio Fabris Editor, 2006 p. 104.
61 MARITAIN, Jacques. Elementos de Filosofia I: Introdução Geral à Filosofia. 18 ed. Rio de Janeiro: Agir,
2001. P. 167.
62 ZENNI, op. cit., p. 107.
63 Ibidem. 45
homem “é” no já de sua existência, mas não se firma nela; projeta-se teleologicamente em direção
ao seu fim humano último, ou seja, a realização de sua dignidade. Resumidamente, a dignidade
dita a todo homem, sendo o supremo princípio de “ser aquilo que é”, de realizar ao longo de sua
existência aquilo que não é plenamente.64

Esta noção de dignidade é concebida a partir da fundação realista e metafísica dos direitos
humanos, feita, ainda, em decorrência da noção da realidade ôntica do homem, para chegar, de-
pois, à sua realidade teleológica.65

A dignidade, em seu sentido mais latto, trata-se da essência do homem, ou seja, a caracte-
rística que torna o homem humano, ontologicamente falando, é aquilo que ele é. Todavia, cumpre
estabelecer, que não basta a definição ontológica para definir que vem a ser dignidade, posto que
o homem não é somente aquilo é, mas também, aquilo que deve ser, devendo-se, fazer, também,
um resgate teleológico da dignidade humana.

Portanto, segundo as lições de José Francisco de Assis Dias, a dignidade é o que ontologi-
camente somos e teleologicamente devemos ser. É enquanto fundamento dos direitos humanos,
aquela dimensão essencial do homem, ontologicamente radica de sua natureza, e, teleologicamen-
te, posta como meta para o homem ao longo de sua existência.66

Tendo em vista que o homem é marcado (onto-teleologicamente) pela dignidade, sendo por
isso considerado humano, há uma projeção de fim e valor na medida em que o respectivo axioma
determina ações de caráter protetivo do mesmo, tanto materiais quanto formais, a fim de se tutelar
a dignidade do homem, estabelecendo princípios essenciais de toda a espécie humana.

Assim sendo, a dignidade não é somente uma propriedade essencial da natureza do homem,
consubstanciando em um núcleo axiológico inalienável, mas também, principalmente, quando se
deixa conhecer através da intelecção desta natureza mesma e se apresenta como fim último de
todo homem. Como asseverado por José Francisco de Assis Dias, todo homem tende naturalmente
a ser sempre e, cada vez mais humano.67

Só a dignidade onto-teleologicamente entendida, comum a todos os homens, explica a exis-


tência de alguma coisa a compartilhar, a comunicar e, sobretudo, da qual a pessoa é individuali-
zada. A presença da dignidade no ser humano é o que torna os homens membros não só de uma
mesma espécie bio-genética, mas de uma mesma comunidade, qual seja, a família humana. As-
sim, como este componente natural é presente em todo homem, torna todos iguais em dignidade,
apesar de suas legítimas diferenças.68

Se o homem é o fim e a medida de todas as coisas, a tutela de sua dignidade represente o


fim último da sociedade como um todo, pois uma sociedade justa, fraterna e solidária realiza-se,
somente, com o reconhecimento e respeito à dignidade transcendente do Ser Humano, tanto no
plano material quanto espiritual, devendo, ser, inclusive, matéria de reconhecimento e tutela por
64 DIAS, José Francisco de Assis. Direitos Humanos: fundamentação Onto-teleológica dos Direitos Huma-
nos, Maringá-PR: Unicorpore, 2005, p. 241.
65 Ibidem.
66 Ibidem, p. 242.
67 Ibidem, p. 246.
46 68 Ibidem.
parte do direito em relação ao Estado.

Assim sendo, a liberdade individual e coletiva deve ser protegida, por ser um pilar estruturan-
te da dignidade, mas nas últimas décadas com o desenvolvimento dos meios midiáticos tem-se
violado tal direito, traves das informações ideológicas de um grupo, de mensagens subliminares
que tentem a manipular seus receptores, de tamanha a forma que nem ao mesmo percebem que
sua liberdade esta sendo retirada, privada, em razão do encanto e sedução que a mídia usa para
aprisionar seus receptores.

2 MÍDIA E SOCIEDADE DE CONSUMO: A INFORMAÇÃO MI-


DIÁTICA COMO MERCADORIA
Desde o nascimento todos os indivíduos estão sujeitos a influência da mídia sejam elas quais
forem, que de forma agressiva bombardeiam a sociedade com inúmeras informações, ligadas a
todos os tipos de conhecimento e áreas relacionadas a vida das pessoas. Pode-se entender que a
mídia fornece um produto/ serviço, pois a pessoa física que se encontra exposta a essas informa-
ções “dadas’ pela mídia, “consumindo” estas informações, assim de forma análoga sujeita as prá-
ticas deste fornecedor que é a mídia, seja ela televisiva, editorial, online, e entre outras. “Pode-se
que o texto midiático pode ser consumido em vários lugares e tempos diferentes.”69

Entendendo-se assim que todos os receptores de forma análoga estariam enquadrados na


definição de consumidor do art. 2º da lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC),
pois são pessoas físicas, que “utiliza produto ou serviço como destinatário final”70, pois consumem
de fato estas informações como destinatários finais, se incorporando a sua psique.

Colocando assim todos os meios midiáticos e suas ferramentas como fornecedores, pois de
fato fornecem informações sejam qual for a sua natureza, fornecem um produto que é consumido
pelos receptores aonde quer que estejam. Sendo que em alguns casos, em razão da natureza des-
tas práticas midiáticas atingem pessoas que nem mesmo querem consumir tal “produto”, fornecido
pelas mídias.

Assim sendo o receptor/ consumidor de fato possui as mesmas vulnerabilidades que o con-
sumidor protegido pelo CDC, além de possuir uma outra, a vulnerabilidade biológica ou psíquica.
Pois como já pacificado tais vulnerabilidades são qualidades inerentes ao consumidor frente ao
fornecedor.

A vulnerabilidade técnica se dá pela “ausência de conhecimentos específicos em relação às


características do produto ou serviço que está adquirindo, ficando sujeito a vontade dos fornece-
dores, tendo como única garantia a confiança na boa-fé da outra parte”71. O receptor não possui

69 DE OLIVEIRA, Daniele. A Mídia E A Manipulação Da Opinião: Um Casamento Amigável?. Entremeios, Revista


de Estudos do Discurso. V1, n1, jul/2010. p.1 Disponível em: <http://ojs.univas.edu.br/index.php?journal=revistaen-
tremeios&page=article&op=view&path%5B%5D=22>. Acessado em: 05 ago. 2016.
70 BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Codigo de Defesa do Consumidor). Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acessado em: 06 ago. 2016.
71 MELO, Ana Cláudia Dias de. A Nova Técnica De Sedução Do Consumidor: Neuromarketing E A Hipervulne-
rabilidade Do Consumidor. 2012. Repositório UNICEUB. p.36. Disponível em: <http://repositorio.uniceub.br/hand- 47
qualquer conhecimento sobre as informações muitas vezes transmitidas, não sabe como elas são
obtidas, se estas são verdadeiras, ou se foram mostrados só o que os donos do capital que coman-
dam a mídia querem que mostre.

Já na vulnerabilidade jurídica é evidente a sua existência, pois a grande parte da sociedade


não possui conhecimento jurídico, não sabe como lutar pelos seus direitos, não sabendo muitas
vezes que possui direitos. Nesta vulnerabilidade se fala que o receptor é manipulado, tendo sua
dignidade violada e sua liberdade retirada, e nem mesmo percebe tal ato cometido pela mídia, não
podendo nem ao mesmo lutar por seu direito.

A vulnerabilidade socioeconômica “decorre da superioridade econômica do fornecedor ou


daquela decorrente de monopólio ou da essencialidade do serviço”72, logo a grande parte da socie-
dade é economicamente inferior a este grupo detentores do capital que comandam a mídia, tendo a
nítida desproporção, não podendo falar de maneira alguma no princípio da isonomia nesta relação
entre as pessoas receptoras e a mídia.

Existente também nas relações de consumo a vulnerabilidade informacional, elencada por


Cláudia Lima Marques73, que diz:
O que caracteriza o consumidor é justamente seu déficit informacional, pelo que não
seria necessário aqui frisar este minus como uma espécie nova de vulnerabilidade,
uma vez que já estaria englobada como espécie de vulnerabilidade técnica. Hoje,
porém, a informação não falta, ela é abundante, manipulada, controlada e, quando
fornecida, nos mais das vezes, desnecessária.

Contudo o STJ entende que a vulnerabilidade deve ser vista nos aspectos técnicos, fáticos
(ou econômicos) e jurídicos, e sendo demonstrando esta vulnerabilidade poderá ser aplicado o
CDC. Mas como já se sabe a sociedade está em frequente evolução, suas técnicas e tecnologias
se desenvolve cada dia mais, então não seria errado entender que as práticas agressivas e calcula-
das da mídia atingem diretamente o psíquico de cada indivíduo, que não possuindo qualquer noção
sobre as informações transmitidas pela mídia estão sujeitas a ela e aos seus abusos.

Paulo Valério Dal Pai Moraes defende que existe além de todas as vulnerabilidades já citadas
a chamada vulnerabilidade biológica ou psíquica, que faz o consumidor virar um escravo de dese-
jos criados para que as pessoas tenham.
[...] os interessados na sua estimulação se valerão de todas as técnicas para aflorar
necessidades, criar desejos, manipular manifestações de vontade e, assim, gerar
indefinidas circunstâncias que poderão ter como resultado o maior consumo e, em
grau mais perverso, inclusive obrigar ao consumo de produtos ou serviços inadequa-
dos.74

E não só criando desejos, mas moldando seus sonhos, limitando suas capacidades, restrin-
gindo a sua liberdade criativa e crítica sobre sua própria vida, rebaixando a pessoas a objetos, a

le/123456789/337>. Acessado em: 05 ago. 2016.


72 Ibid, 2012, p.37.
73 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, p. 329.
74 MORAES, Paulo Valério Dal Pai. O Código De Defesa Do Consumidor: Princípio Da Vulnerabilidade No
48 Contrato, Na Publicidade, Nas Demais Práticas Comerciais. Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 152.
coisas que podem ser domesticadas para agirem e quererem aquilo que a mídia, o manipulador
impõe a sociedade.

A mídia se aproveita desta vulnerabilidade psíquica inerente a todo ser humano, para manipu-
lá-lo, molda-lo desde sua infância nos moldes em que os donos do capital querem, do jeito de que a
mídia coloca que deve ser. E esta manipulação decorre do abuso de poder que as mídias possuem,
e o seu grande alcance no mundo globalizado em que vivemos, agindo o manipulador (a mídia)
em prol de seus interesses particulares e contra os interesses dos que são por ele manipulados
(sociedade, pessoas físicas inseridas no contesto social).75

Van Dijk defende que:


[...] a manipulação é um fenômeno social – especialmente porque ela envolve inte-
ração e abuso de poder entre grupos e atores sociais – é um fenômeno cognitivo,
porque a manipulação sempre implica a manipulação das mentes dos participantes,
e é um fenômeno discursivo-semiótico, porque a manipulação é exercida através da
escrita, da fala e das mensagens visuais.76

E é por estas vulnerabilidades, principalmente a psíquica, que toda sociedade que está sub-
metida as estas práticas midiáticas devem ser entendidas como consumidores destas informações,
e que as mídias são fornecedoras diretas de um produto/ serviço, pois além de visarem o lucro, são
empresas organizadas detentoras de tecnologia e estão inseridas na sociedade, e disponibilizam
seus produtos/ serviços no mercado de consumo.

Léa Freire coloca que, nos casos em que a própria mídia é fornecedora, será contra ela que
terá que se voltar os prejudicados, e tais casos devem ser tratados como um direito difuso ou co-
letivo e o Ministério Público ou alguma associação de defesa do consumidor, tendo que agir em
defesa não só de um consumidor, mas de toda a coletividade, tendo a legitimidade para propor uma
Ação Civil Pública contra a mídia-fornecedora do conteúdo enganoso (ou abusivo) que é veiculado
a esta.77

3 A MÍDIA COMO INSTRUMENTO IDEOLÓGICO DE DOMINA-


ÇÃO
Restando identificada a concepção da pessoa humana a partir da conclamação dos valores
da dignidade e da liberdade, sobretudo no que tange à concepção onto-teleológica do Ser, cumpre
trazer ao debate, diante da inserção do homem na sociedade de consumo, como as ideologias
assumem a “ideia” de interesse comum, tornando-se, assim, em instrumentos de dominação e
coisificação do homem.

A mídia já passou por vários estágios de desenvolvimento que se deu em razão do desenvol-

75 DE OLIVEIRA, Daniele. A Mídia E A Manipulação Da Opinião: Um Casamento Amigável?. Entremeios, Revista


de Estudos do Discurso. V1, n1, jul/2010. p.8 Disponível em: <http://ojs.univas.edu.br/index.php?journal=revistaen-
tremeios&page=article&op=view&path%5B%5D=22>. Acessado em: 05 ago. 2016.
76 DIJK, Teun A. van. Discurso e poder. São Paulo: Editora Contexto, 2008.
77 FREIRE, Léa. Comunicação e Direitos de Consumidor. Eco-Pós. v6, n.1, janeiro-julho, pp. 153-157. Disponível
em: <https://revistas.ufrj.br/index.php/eco_pos/article/viewFile/1149/1090>. Acessado em: 07 ago. 2016. 49
vimento econômico dos países e da sociedade. Tendo sua criação um ideal glorificante, e positivo
para todas as pessoas.

A utilização de meios de comunicação de massa como o rádio e a televisão e posteriormente


a chegada da internet, foram e continuam sendo determinantes para novos desenvolvimentos e no-
vas propostas de divulgação da informação. Esse conjunto de ferramentas e recursos tecnológicos
coloca a disposição do cidadão meios de comunicação como televisão a cabo ou um computador
conectado a internet, que possui uma quantidade nunca antes imaginada de informações e de ser-
viços diferenciados.78

Sendo que a própria Constituição Federal assegura do Direito de Informação a todas as pes-
soas, que tem tal direito efetivado através das mídias que são detentoras das informações. Tendo
os detentores da informação deveres em relação a sociedade, pois é através da informação que
as pessoas podem se desenvolver como pessoas, pensarem e se realizarem na sociedade em que
vivem. É válido ressaltar, o pensamento de Karl Marx em relação a este ideal que a imprensa, a
mídia possuía em seu cerne.

A imprensa livre é o olhar onipotente do povo, a confiança personalizada do povo nele mes-
mo, o vínculo articulado que une o indivíduo ao Estado e ao mundo, a cultura incorporada que
transforma lutas materiais em lutas intelectuais, e idealiza suas formas brutas. É a franca confissão
do povo a si mesmo, e sabemos que o poder da confissão é o de redimir. A imprensa livre é o es-
pelho intelectual no qual o povo se vê, e a visão de si mesmo é a primeira confissão da sabedoria.79

Com tudo, cumpre destacar que Marx é um homem de seu tempo, motivo pelo qual a respec-
tiva reflexão não espelha os tempos contemporâneos, onde a mídia é utilizada como ferramenta de
manipulação da massa, controlando a através da mídia, se utilizando de tal ferramenta ao invés da
força, pois os detentores do capital, aqueles que possuem a propriedade dos meios de produção,
o que incluir a informação, acabam por se confundir com o próprio Estado, pois, sendo este uma
instituição fictícia, depende duma composição, o que revela o caráter ideológico das proposições
estatais capitalistas, na medida em que o interesse privado, qual seja, o do capital (proprietário
dos meios de produção) assumem a roupagem de interesses comuns, subvertendo a finalidade da
mídia pensada por Marx.

Retirando a neutralidade, e sendo a mídia determinada pelos interesses dos proprietários ou


dos quem neles anunciam. Se tornando um elemento de manipulação de grupos internacionais e
nacionais que só permitem a transmissão daquelas mensagens que possam reforças sua ideolo-
gia.80

Incutindo de forma sutil uma ideologia de massa, uma ideologia que este grupo de capitalistas
querem que a população tenha em relação a realidade em que vivem.

78 MIRANDA, Gustavo Lima de. A história da evolução da mídia no Brasil e no mundo. Repositório UNICEUB.
2007, 08. Disponível em: <http://repositorio.uniceub.br/bitstream/123456789/1265/2/20266495.pdf>. Acessado em: 06
ago. 2016.
79 MARX, Karl. A Liberdade de Imprensa/ Karl Marx: tradução de Cláudia Schilling e José Fonseca, Porto Ale-
gre: L&PM Pocket, 2001, p.65.
80 GARCIA, Nélson Jahr. Propaganda: Ideologia E Manipulação. Ebooksbrasil. v27. 2000, p.44. Disponível em:
50 <http://rfp.org.uk/textos/filo_n.jahr_propaganda_ideo_manip.pdf>. Acessado em: 06 ago. 2016.
É necessário que a população possua um conjunto de ideais reais em relação a sua existência
e sobre a realidade social em que vivem para que se obtenha uma ideologia. Sendo formada por
três ideias básicas, representação, valores e as normas. A representação são ideias relacionadas a
realidade, já os valores são ideias a respeito de como deverias ser a realidade, e por fim as normas
são aquelas ideias que visam o que deve ser feito para transformar a realidade ou mantê-la nas
mesmas condições que se encontra.81

E a mídia é uma grande influenciadora para a formação de ideologia para a sociedade, e


sendo esta utilizada por um grupo de capitalistas que só visam interesses próprios, tentam, através
da mídia, moldar uma ideologia para as classes existentes na sociedade, para que as massas pen-
sem, ajam, e vivam da maneira que melhor os interessa. Realizando através da mídia o chamado
“controle ideológico” das massas.

Sendo através do controle ideológico que o emissor manipula todas as formas de produção, e
difusão de ideais, garantindo a exclusividade na emissão das suas próprias. Procurando assim evi-
tar que exista a possibilidade de que os receptores, as pessoas venham a produzir outra ideologia
que os governe contra os interesses do emissor.82

Como já se sabe o melhor meio de se difundir tal controle, se dá pela mídia seja ela de qual
natureza for, pois o seu alcance se encontra cada vez maior, e quanto mais pessoas atingidas por
esta ideologia de massa, menos pessoas iram contra as vontades deste grupo de capitalistas, e
mais pessoas irão “contribuir” para o seu enriquecimento.

Neutralizando de forma eficaz a capacidade e senso crítico dos receptores, se utilizando de


situações que envolvam o emocionalmente, que diminuem tal qualidade. Envolvendo desta forma
as pessoas com tamanha intensidade através dos meios midiáticos que as hipnotizam, fazendo
elas ficarem mais sugestivas às mensagens que recebem, as ideias que são propostas.

Permitindo disseminar, de forma persuasiva, para toda sociedade internacional e nacional, às


ideias deste grupo de capitalistas. Pois é por meio da mídia que estas passam a ser transmitidas
para a sociedade e seus cidadãos, impregnando em todas as pessoas, e sendo transmitida assim
para os filhos e consecutivamente, para que estes ingressem no contexto social, sempre indo
conforme os interesses da classe ideologicamente dominante, os detentores do capital, o grupo
dominante economicamente.

O bombardeio de informações, dados, e ideias impostas pela mídia para o homem, influencia
diretamente em seu modo de vida, impedindo-o de fazer escolhas, de se autodeterminar de forma
autentica e livre. Sendo os manipuladores da passa adquiriram outra abordagem para realizarem o
controle, ao invés de punição, nos hipnotizam utilizando-se da nossa própria sede por prazer.

Os colonizadores e seus opressores sabem que a relação de domínio não está fundada ape-
nas na supremacia da força. Passado o tempo da conquista, soa a hora do controle dos espíritos.
E é tanto mais fácil dominar, quando o domínio permanece inconsciente. Daí a importância da
persuasão clandestina e da propaganda secreta, pois, a longo prazo, para todo império que deseja
81 GARCIA, Nélson Jahr. Propaganda: Ideologia E Manipulação. Ebooksbrasil. v27. 2000, p.15. Disponível em:
<http://rfp.org.uk/textos/filo_n.jahr_propaganda_ideo_manip.pdf>. Acessado em: 06 ago. 2016.
82 Ibid, p.17. 51
durar, a grande aposta consiste em domesticar as almas, torná-las dóceis e depois subjugá-las.83

E é assim que a mídia impõe de forma adocicada o que devemos ser, para que assim ocorra
a manipulação da massa, para os interesses de determinado grupo. “Por meio de tais práticas, a
mídia, torna os seres os humanos seus reféns, reconstruindo e modelando suas subjetividades.”84

4 A COISIFICAÇÃO DO SER E A DERROCADA DA LIBERDADE


HUMANA
Com o advento da modernidade, engendrada pelo progressismo político e a obliteração do
modelo artesanal pelo processo industrial, verificou-se a transformação não só da estrutura política
e econômica, mas inclusive, do modus vivendi do homem moderno.

A subversão dos valores, aliada à nova sistematização do modo de manutenção da vida


humana, acabará por gerar transformações substanciais na existência do homem a partir do seu
processo de personificação enquanto ser imanente de liberdade, consciência e dignidade.

Assim, o projeto de transcendência, que tem sido traçado a partir do binômio ser e dever ser,
sendo este entendido como a tomada de consciência entre a relação da própria existência ontoló-
gica e o existir teleológico, concebida a partir da compreensão das relações do homem, intrinseca-
mente ligada ao exercício de sua liberdade, inicia sua construção com a conscientização do homem
acerca de seu existir ontológico.

Na pós-modernidade, ou também chamada modernidade de terceira fase, como difundem


os sociólogos e filósofos contemporâneos85, a liberdade que galgou passos, inicialmente como
consciência que o homem tem de si mesmo, sendo compreendida como ausência de limites e de
coação, fazendo por traçar o sentido negativo de liberdade86, posteriormente como alavanca e ação
prestacional grupal em prol dos hipossuficientes e limitados87, veste-se como ação uniforme, algo
bem diverso do sentido igualitário, mas como prète a porter, todos com as mesmas características,
atônitos e guiados, seguindo a mesma trajetória.88

Evidente que o estágio inicial do processo de liquidez do homem tem como aspecto primeiro
a relativização e subjetivação dos valores. Associa-se a isso a isonomia formal na comunicação
das vontades, que se supõe igual a todos, desde que haja cumprimento de um papel social, como
em uma técnica de engajamento social. E o direito, por derradeiro, distribuindo as funções sociais,
seus direitos e deveres, neutraliza toda a possibilidade de os seres humanos responsabilizarem-se
pelos seus atos e escolhas.

83 SANTOS, Suely Emilia de Barros; SILVA, Ellen Fernanda Gomes da. O impacto e a influência da mídia sobre a
produção da subjetividade. 2015. p. 05. Disponível em: < http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_XVE-
NABRAPSO/447.%20o%20impacto%20e%20a%20influ%CAncia%20da%20m%CDdia.pdf>. Acessado em: 05 ago.
2016.
84 Ibid.
85 ZENNI, op. cit., p. 13.
86 Ibidem, p. 29-30.
87 ZENNI; OLIVEIRA. Op. cit., p. 78.
52 88 ZENNI, op. cit., p. 43.
Segundo as lições de Alessandro S. V. Zenni:
[...] sendo o homem consciente de si mesmo e livre para agir, pode desempenhar o papel
que bem entender, surgindo, por via de consequência, a sociedade complexa e desagregada,
funcionalmente diferenciada, imprescindindo de uma organização [...]89

Sob a ótica do sociólogo alemão Niklas Luhman, já na modernidade, sobretudo com


a sociedade pós revolução industrial, rompeu-se a ideia de bem referida ao indiví-
duo, que, apesar de tornar-se dependente da consciência de cada um, o subjetivis-
mo da vontade se separa do subjetivismo da razão e da ciência, culminando com um
corte entre consciência ética e verdade.90

Ou seja, o exercício da liberdade será conduzido a partir da tomada de consciência, mas que,
separada da verdade e da própria natureza do homem, gera mecanismos capazes de propiciar
distúrbios sociais.91

A figura da sociedade produtiva na afirmação do homo faber, conduz ao homo economicus, e


todas as ciências passam a ser meios para um fim comum de prosperidade financeira, que, ao final,
continua concentrada. De qualquer maneira, o sistema – estrutura ou faber – coopta a sociedade
no seu âmago, no processo de produzir e consumir, no sentido mais pleno possível, dos bens, ser-
viços, até a imagem e as ideias.92

Enfim, estas possibilidades, engendradas pela sociedade de consumo, corrompem com a


concepção de liberdade, bem como, com a da existência ontológica do homem. Ser é ter. A liber-
dade manifesta-se com a aquisição dos bens de consumo impostos como condição de reconhe-
cimento como ente pertencente ao meio social. A liberdade, mais do que nunca, é sinônimo de
possibilidade de aquisições materiais.

Inolvidável que alhures, na arquitetura do Manifesto do Partido Comunista, Marx concebe a


liberdade, perante o sistema capitalista, como a possibilidade de comprar e vender. Esta liberdade
se expressa a partir do exercício das possibilidades traçadas pela sociedade de consumo, as quais
se sucedem continuadamente, gerando a ideia de descartável, tanto do que se produz quanto em
relação a quem consome, agravando-se pelo fato de que o reconhecimento social somente se con-
fere a quem tem capacidade de consumo.93

Nesta perspectiva, não há limites aos desejos, há a sensação de que tudo lhe é permitido e
nada seja obrigado, perdendo a noção completa de limites e nos eventuais conflitos com os outros
seres percebe-se a si como único e exclusivo, individualista, detentor de direitos absolutos, sem
noção de hierarquia ou superioridade.94

Zygmunt Bauman aponta que a rapidez e eficiência na produção tecnológica aliada com a
ideia de consumo faz eclodir enorme insegurança no ser humano no tocante ao mercado de tra-
89 ZENNI, op. cit., p.30.
90 LUHMAN, Niklas. Sociologia do Direito I. [trad. Gustavo Bayer]. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro,
1983.
91 ZENNI, op. cit., p.31.
92 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Liberdade de Fumar. Privacidade. Estado. Direitos Humanos e outros
temas. São Paulo. Manole, 2007, p. 539.
93 BAUMAN. Zygmunt. Modernidade Liquida. Tradução Plínio Dentzien. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editor,
2001, p. 28 e seguintes.
94 Ibidem, p. 47 53
balho, bem como abre-lhe possibilidades de consumo de bens que se sucedem continuadamente,
sendo este o fator determinante à perspectiva do descartável, tanto do que se produz quanto em
relação a quem consome, agravando-se, ainda, respectiva circunstância, pelo fato de que o reco-
nhecimento social é conferido, somente, a quem tem capacidade de consumo.95

A otimização estrutural da produção massificada se solidifica pela comunicação cibernética do


consumo, cambiando e integrando sobremodo as esferas dos espaços públicos e privados. Público
passa a ser o marketing difundido na imagem da televisão ou na publicidade da internet, passando
a manipular a opinião, chegando no âmbito privado sem que o sujeito saia de seu recôndito mais
íntimo.96

De fato, a sociedade consumista revela-se por um amontoado de seres individuais manipula-


dos e uniformizados que não fruem liberdade, sequer no sentido negativo. O direito a trata a partir
do enfoque do homo economicus e para preservar o sistema incólume do caos, da-lhe um sentido
funcionalista, seja para garantir a gestão econômica da sociedade complexa, em visão política, seja
para manter a ordem sistêmica. Mas a pessoa enquanto valor perseguido pelo jus foi neutralizada
e imunizada pelas decisões legislativas e judiciais.97

Alessandro S. V. Zenni descreve que a consequência desta deturpação, é a criação de uma


sociedade de massa, onde os diversos seres humanos cedem à aglomeração, passa-se da repro-
dução à produção, do estatuto ao contrato, da emoção ao cálculo.98

Esta teia em que modernidade de terceira fase foi arremessada, gera um sentimento de im-
potência e perplexidade próprio de um ser nihilista, ilhado, solitário, que procura desfrutar o prazer
momentâneo, cultuar os bens externos, diante do fatalismo e incerteza do futuro em um mundo de
vida desigual.99

A sociedade do consumo passa a ser composta por um amontoado de seres individuais,


manipulados e uniformizados, que não fruem liberdade, sequer no sentido negativo. O enfoque
econômico acerca do homem lhe confere um sentido funcionalista, garantindo a gestão econômi-
ca da sociedade complexa, por intermédio de uma visão política, bem como para manter a ordem
sistêmica capitalista.100

Nesta perspectiva, o ser massificado é informo, não tem personalidade e se mostra indigno.
A autonomia da vontade passa a ser utópica, restando neutralizada por completa, uma vez que, ao
consumir, o sujeito ocupa seu papel do meio social, reconhecendo e fazendo-se por se reconhecer
como membro pertencente a esse meio.101

Inegavelmente a existência humana busca sentido ao perfazer-se, conclamando os valores


ontológicos e teleológicos dignificantes de sua natureza, que, uma vez ignorados, conscientemente

95 Apud ZENNI, op. cit., p. 10069-10093.


96 FERRAZ JUNIOR, op. cit., p. 548.
97 NEVES, Castanheira. O Direito hoje e com Que Sentido. O problema atual da autonomia do direito. Lisboa.
Instituto Piaget, 2002, p. 67.
98 ZENNI, op. cit., 47.
99 Ibidem, p. 48.
100 NEVES, op. cit., p. 68-69.
54 101 ZENNI, op. cit., p. 47 et seq.
ou não, acabam por gerar o sentido contrário, ou seja, o desvalor, pondo o homem em profunda
angústia e tornando sua via anódina.

A liberdade conotada nos contratos de massa diz com uma aposta de riscos mínimos, algo
que poderia ser precisado pela lógica simbólica, equações matemáticas, enfim, pelo recurso tecno-
lógico que a cibernética oferece.102

Se a dignidade humana evoca como conteúdo jurídico a emancipação em autonomia e liber-


dade, o ser massificado e descartável da pós-modernidade está anódino e derrelicto.103 Construção
de uma sociedade justa, fraterna e solidaria, como princípio fundante do Estado democrático não
passa de utopia. O personalismo ético que constitui a dignidade humana não brilha no objeto des-
cartável a que foi transformado o homem pós-moderno.104

Em síntese, a proposta de um Estado Democrático no plano político construído para edificar


a pessoa humana no plano ético recruta um direito em perspectiva transdisciplinar, como o é a pró-
pria noção de ser do homem105.

Mas se nos albores da história se tecia a transdisciplinariedade entre direito, política e ética,
na pós-modernidade as propostas valorativas positivadas no texto constitucional sob a veste do
Estado democrático não passa de discurso adiáforo.106

Isso porque o direito, ao tratar de dignidade humana, cinge-lhe conteúdo relacionável com
o mínimo existencial, no sentido de permitir-se ao ser o acesso ao consumo, sem sequer haver
liberdade de escolha ou recusa a adquirir, como dito supra. A análise econômica dos fenômenos e
do próprio direito aniquila a possibilidade de o homem se personalizar e transcender, tolhendo-lhe
o sentido da vida.107

CONCLUSÃO
Entendido a realidade em que as pessoas vivem hoje, uma falsa realidade criada pela mídia
para alienar as pessoas, controlar a massa. Existindo de fato um controle sobre o que somos como
seres humanos. Não se possuindo mais na contemporaneidade uma real dignidade, uma verdadei-
ra liberdade, pois não se tem o poder de se auto determinar, não possuindo uma liberdade sobre
sua própria vida. Pois o grupo dominante, os manipuladores, realizam um domínio sobre a massa,
impedindo que criem ideias que divergem de seus interesses, se utilizando assim da mídia para se
alcançar seus interesses próprios.

A mídia é uma arma poderosa vertical e concentrada nas mãos daqueles que controlam o
fluxo de informações, “os detentores do saber”; como agente formador de opiniões e criador-re-
produtor de cultura, a mídia interfere, forma e transforma a realidade, as motivações, os modos de
102 FERRAZ JUNIOR. Tercio Sampaio. Estudos de Filosofia do Direito. Reflexões sobre Poder, a Liberdade, a
Justiça e o Direito. 3ª Ed., São Paulo. Atlas, 2.009, p. 143.
103 ZENNI, op. cit., p. 56.
104 Idem, op. cit., p. 10069-10093.
105 Ibidem.
106 Ibidem.
107 Ibidem. 55
pensar e de agir do homem.108

Existe o Direito de informar, de ser informar e de ser informado (Direito de Informação), a sua
essência está ligada ao compromisso com a verdade, com a transparência e com a imparcialida-
de, tento como finalidade ser um direito individual de expressão coletiva. Tipificado no art. 220, §
1º e no § 2º da Constituição Federal, sendo um direito inerente à condição de vida em sociedade,
atribuindo desta forma deveres aqueles que detém o poder da informação, responsáveis por sua
remissão aos diversos setores da sociedade109. Porém este direito é usado pela mídia que é a
detentora das informações com um interesse particular de um grupo, que possui uma finalidade
vil para toda a sociedade, se aproveitando da vulnerabilidade das pessoas que se comparam aqui
com o consumidor.

Desta forma pode-se dizer que o ser humano não possui mais uma liberdade no Estado de
Direito, em razão de toda essa teia manipuladora feita para o controle social da massa. Tendo a
nítida violação a dignidade da pessoa humana, da coletividade, que tem sua subjetividade moldada
a partir de interesses particulares de um grupo dominante.

Sendo necessário que mesmo a mídia não poder ser censurada ou “contida”, deve o Estado
entende-la como fornecedora, e responsável por seus atos que atentam contra toda uma coletivida-
de e sua liberdade. Pois a mídia não pode ser uma ferramenta de controle ideológico, ela deve ser
uma ferramenta social, que visa o desenvolvimento e distribuição de informações para a sociedade,
sem ter uma finalidade egoística que é a alienação da massa.

Ficando-se claro que o homem está cada vez mais coisificado, cada vez mais submetido a
nada, nesta sociedade que atribui um significado uma finalidade utilitária a financeira a tudo inclu-
sive a ele mesmo. Não existindo mais um verdadeiro significado de dignidade humana e liberdade
nos dias atuais, pois a mídia que é utilizado pelos donos do capital lucram significativamente com
tal situação da massa.

É preciso que a sociedade não se deixe influenciar pelas mídias. Recuperem a sociedade
um senso crítico, e saibam que por traz de todas as mensagens passadas existe um interesse.
Pois se as pessoas conseguirem diferenciar e buscar qual é a verdadeira realidade em que vive
poderá começar a se libertar desta teia midiática, e voltar a ser um mínimo existencial, de liberdade
e dignidade.

108 SANTOS, Suely Emília de Barros; SILVA, Ellen Fernanda Gomes da. O impacto e a influência da mídia sobre a
produção da subjetividade. 2015. p. 03. Disponivel em: < http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_XVE-
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109 SAMPAIO, Marília Meira Costa. Direito Fundamental à Informação. Disponível em: <http://www.conteudojuridi-
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HUMAN DIGNITY, MEDIA AND IDEOLOGY: BETWEEN MEDIA HANDLING


AND PERSONAL FREEDOM

ABSTRACT: The goal from the study is to show that both the dignity of the human person, as their freedom were taken,
due to the ideological control carried out by the media and capitalists who control it. No further if you want freedom of
choice or refusal to purchase products or services. Increasing the understanding of homo economicus in contemporary
society is to be, placing the human being as a means to achieve profitability, the media objectifies the very meaning of
humanity, removing the being which is the most inherent in their freedom. Attacking this problem by theoretical method
and the logical-deductive method, that through both social analysis as philosophical can see the mass of an ideology
that is not about the individual and collective good, but a capitalist ideology that benefits only a few higher-ranking
groups economically. Resulting in clear manipulation of human dignity, providing an inverse movement to the dignity,
which is the objectification. Making the massiveness be the man something disposable in our society that impose a
“utility” to each, and this utility is closely linking in their consumption capacity. Concluding so the media as influential
and forming of opinions has been used by equity holders to disseminate a mass ideology, alienating people, with the
profitability of order, and submitting this form human indignity, it is mowed one of its pillars, human freedom.

PALAVRAS-CHAVE: Freedom, Ideological Control, Media Manipulation.

58
ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA – ALTERAÇÕES
CONCERNENTES ÀS TEORIAS DAS CAPACIDADES ANTE
AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS.

RESUMO: O Estatuto da Pessoa com Deficiência, vigente desde janeiro de 2016, dá os seus primeiros passos, reper-
cutindo, ainda, em dilemas doutrinários quanto aos seus aspectos procedimentais e consequências fático-jurídicas. O
Estatuto, em linhas gerais, visa promover a inclusão das pessoas com deficiência, sua participação de maneira mais
efetiva em todos os campos da sociedade, rechaçando toda e qualquer forma de discriminação, de modo a assegurar
o direito à igualdade, à dignidade da pessoa humana, à educação, à saúde, entre outras garantias, bem como, a fim
de estabelecer transformações em toda a sociedade. Não obstante, com o objetivo de concretizar referidos direitos,
reestruturou-se o instituto civil da capacidade, estabelecendo-se a plena capacidade civil às pessoas com deficiência.
Neste último ponto, há muitos questionamentos entre os juristas acerca de seus desdobramentos na realidade brasi-
leira, assim, este trabalho teve por objetivo analisar se a inclusão vislumbrada pela lei, por si só, surtirá efeitos nesta
sociedade. Outrossim, a nova disposição legal merece atenção especial, verificando se os atos praticados pelas pes-
soas com deficiência, os quais passam a ser considerados válidos, implicam em maior vulnerabilidade destas pessoas
à golpes ou sanções decorrentes de suas condutas ou se cumprem a intenção de incluí-los no convívio. Para tanto,
utilizou-se de bases e referenciais teóricos, e, quanto à interpretação, o método dedutivo como preponderante.

PALAVRAS-CHAVE: Capacidade; Deficiência; Inclusão.

INTRODUÇÃO
O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015) trouxe inúmeras
mudanças quanto ao tratamento dado pelo ordenamento jurídico às pessoas portadoras de defi-
ciência.

Digno de nota são as alterações acerca da capacidade civil, as quais geraram grande reper-
cussão entre doutrinadores e juristas brasileiros. Nesse quesito, o novo dispositivo legal reformou
os artigos 3º e 4º do Código Civil Brasileiro, suprimindo do texto legal a incapacidade absoluta –
ressalvada a hipótese do menor de dezesseis anos – e aumentando as possibilidades quanto à
incapacidade relativa.

Uma das principais justificativas trazidas pela doutrina para referida mudança foi atender ao
artigo 3º da Convenção de Nova York – promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de
2009 – o qual estabelece como princípios gerais a igualdade, a não discriminação das pessoas com
deficiência, e sua inclusão com independência, ademais, o artigo 4º da referida Convenção prevê
a modificação ou revogação de dispositivos legais que ensejam discriminação contra pessoas com
deficiência.

No entanto, a Carta Magna brasileira promulgada em 1988, institui como direito fundamental
a igualdade, ou isonomia. Esta garantia não implica apenas em uma igualdade formal (tratamento
igualitário a todos), mas em uma conotação material, substancial (tratamento diferenciado aos de-
siguais no limite de suas desigualdades).

Assim, o objetivo desta pesquisa insta em analisar eventuais conflitos que possam vir a existir
em decorrência das determinações do Estatuto da Pessoa com Deficiência, ante algumas garantias
59
e direitos fundamentais resguardados pela Constituição Federal, bem como os possíveis desdobra-
mentos dessas alterações legais. Para tanto, recorreu-se a bases e referenciais teóricos, utilizando
na interpretação o método dedutivo como preponderante.

CAPACIDADE CIVIL: BREVE ANÁLISE HISTÓRICA


Preliminarmente, faz-se mister conceituar capacidade civil. A esse propósito, o ilustre jurista
Carlos Roberto Gonçalves110 preleciona “(...) capacidade é a medida da personalidade, pois para
uns ela é plena e, para outros, limitada”. Segundo Flávio Tartuce, a capacidade civil plena implica-
ria em capacidade de direito (gozo) somada à capacidade de fato (exercício), nesse sentido, todas
as pessoas têm a capacidade de direito, existindo algumas peculiaridades quanto ao exercício da
capacidade, ou seja, “todas as pessoas têm a primeira capacidade, o que pressupõe a segunda,
em regra, uma vez que a incapacidade é exceção.”111

Consoante a dicção de Maria Helena Diniz a aptidão para “... adquirir direitos e contrair de-
veres na vida civil, dá-se o nome de capacidade de gozo ou de direito.”. Além disso, afirma que a
capacidade pode sofrer restrições legais – incapacidades, com base em fatores como o tempo, ou
mesmo por insuficiência somática (deficiência mental).112

O ordenamento jurídico brasileiro estabelece, como regra geral, que toda pessoa é capaz de
direitos e deveres na ordem civil, ex vi do artigo 1º do atual Código Civil.113

No Brasil foram diversos os dispositivos legais que disciplinaram o instituto da capacidade ci-
vil. O revogado Código Civil dos Estados Unidos do Brasil de 1916 já estabelecia algumas normas
acerca deste regime. Instituía na sua Parte Geral que todo homem detinha capacidade para atos
da vida civil, e fixava como exceções a incapacidade absoluta – para ‘menores de dezesseis anos’;
‘loucos de todo o gênero’; ‘surdos-mudos’ incapazes de exprimirem sua vontade; e, ‘ausentes,
declarados por ato judicial’ – e a relativa – quanto aos ‘maiores de dezesseis anos e menores de
vinte e um anos’; ‘mulheres casadas, enquanto subsistir a sociedade conjugal’; os ‘pródigos’; e os
‘silvícolas’. 114

De modo geral, o Código Civil de 1916 apresentava eminente tratamento desigual, até mesmo
injusto a determinadas pessoas, pois havia naquela sociedade inúmeros preconceitos de ordem
social.

Com o advento do Código Civil de 2002, à luz dos direitos e garantias fundamentais vigentes
a partir da Constituição Federal de 1988, deu-se uma nova roupagem às incapacidades absoluta e
relativa. No texto promulgado em 2002 a incapacidade absoluta referia-se aos sujeitos ‘menores de
110 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. 12. ed.. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 95.
111 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6. ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: MÉTODO, 2016.
p. 74.
112 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil. 29. ed.. São Paulo:
Saraiva, 2012. p. 163/220.
113 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 03 jul. 2016.
114 BRASIL. Lei nº. 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em: <
60 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071.htm#art6>. Acesso em: 03 jul. 2016.
dezesseis anos’, àqueles que não tiverem o necessário discernimento para prática dos atos da vida
civil devido à enfermidade ou doença mental, e aos que por causa transitória não puderem exprimir
sua vontade; enquanto que a incapacidade relativa aplicava-se aos ‘maiores de dezesseis e me-
nores de dezoito’, aos ‘ébrios habituais’, os ‘viciados em tóxicos’, aos que, ‘por deficiência mental,
tenham o discernimento reduzido’, aos ‘excepcionais, sem desenvolvimento mental completo’, e
aos ‘pródigos’. 115

Sucedeu-se após alguns anos, a edição do Decreto nº. 6.949, de 25 de agosto de 2009, pro-
mulgando a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada em
Nova York no ano de 2007, que foi ratificada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legis-
lativo nº 186, de 09 de julho de 2008.

Destarte, em meados de 2015 o legislador pátrio instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pes-
soa com Deficiência – Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015),
com o fim primordial de atender às determinações da Convenção Internacional sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, bem como, visando “assegurar e a promover, em condições de igual-
dade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando
à sua inclusão social e cidadania” e determinando alterações significativas na teoria da capacidade
civil. 116

Em suma, a evolução dos direitos e garantias fundamentais, bem como a proteção internacio-
nal dada aos direitos humanos, em especial aos direitos das pessoas com deficiência, reafirmam a
necessidade de inclusão das pessoas com deficiência, de modo que o Estado assegure os direitos
debatidos nos instrumentos legais e que toda a sociedade se mobilize para acolher essas pessoas.

PRINCIPAIS DIREITOS CONSTITUCIONAIS ASSEGURADOS


PELA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS
DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
A Constituição de 1988 dedicou-se especialmente a estabelecer o dever do Estado em asse-
gurar o exercício de direitos e garantias a todos, reafirmando o Estado Democrático de Direito. Por
conta desse caráter protetivo é reconhecida internacionalmente, e recebeu a alcunha de ‘Constitui-
ção Cidadã’.

Imprescindível se faz a existência dos direitos constitucionais, eis que a Constituição Federal
é a norma que se encontra no ápice de todo o ordenamento jurídico, e é suporte para todas as
demais leis. Nesse deslinde, os direitos individuais previstos no artigo 5º da Constituição consti-
tuem-se direitos fundamentais do homem enquanto indivíduo, caracterizados por sua inviolabilida-
de e imutabilidade, vez que equivalem a cláusulas pétreas por força do artigo 60, §4º, inciso IV, da
Constituição Federal. Pode-se citar como exemplos destes direitos individuais o direito à vida, à
115 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm >. Acesso em: 03 jul. 2016.
116 BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência
(Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/
L13146.htm>. Acesso em: 29 mai. 2016. 61
liberdade, à segurança, à igualdade, além de outros versados pela Constituição.

A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi recepcionada
pelo ordenamento jurídico brasileiro na forma de Emenda à Constituição, eis que foi aprovada em
cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, na forma prevista pelo artigo 5º, §3º, da Constituição Federal.117

Respectiva convenção internacional constitui-se importantíssima para normatizar a necessi-


dade de se assegurar a inclusão de pessoas com deficiência e fundamentou-se essencialmente
no direito de igualdade e na dignidade da pessoa humana, os quais serão esboçados nos itens
seguintes.

DIREITO À IGUALDADE
A Constituição Federal em seu artigo 5º, caput e inciso I, institui que todos são iguais perante
a lei, independente do gênero, nacionalidade ou mesmo de qualquer outra forma de segregação
individual ou de determinado grupo de indivíduos. Respectivo dispositivo constituiu-se um extraor-
dinário avanço para os direitos humanos fundamentais, pois a evolução da sociedade em geral
já percorreu momentos de exclusão de negros, mulheres, estrangeiros, pobres, além de diversas
outras minorias que ficavam à margem das garantias e da participação social.

Nas palavras de José Afonso da Silva, referida garantia figura-se como signo fundamental da
democracia, eis que a Constituição de 1988 consagra o Estado Democrático de Direito. 118

Na literatura clássica, Aristóteles associa a ideia de igualdade ao ideal de justiça, no sentido


de dar a cada um o que é seu.119

Em que pese a gama de entendimentos doutrinários acerca do assunto, a corrente majoritária


analisa isonomia, igualdade, não meramente em seu sentido formal, mas sim em seu aspecto subs-
tancial, como brilhantemente pondera Puccinelli: “... a função da lei é justamente a de discriminar,
diferenciar, enfim, de estabelecer tratamento díspar às pessoas que se encontram em posições
distintas”120 e que o problema estaria em estabelecer os limites dessa diferenciação.

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA


A dignidade da pessoa humana figura como um dos princípios fundamentais do Estado De-
mocrático de Direito da República Federativa do Brasil, e pressupõe a concretização de inúmeros
direitos para sua eficácia. Não há consenso quanto ao que seria uma existência digna, alguns juris-
tas fazem referência a parâmetros mínimos de subsistência – alimentação, saúde, educação; para
117 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: de 5 de outubro de 1988. Organi-
zação de Alexandre de Moraes. 37.ed. São Paulo: Atlas, 2013. 482 p.
118 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 36. ed.. São Paulo: Malheiros Editores, 2013. p.
213 et. seq.
119 ARISTÓTELES. Éthique à Nicomaque, V, 6, 1131ª, apud SILVA, José Afonso, Ibidem, p. 215.
62 120 PUCCINELLI JÚNIOR, André. Curso de Direito Constitucional. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 218.
outros, referida garantia vai além e só se efetivaria com a satisfação de um sentimento subjetivo de
dignidade.

José Afonso da Silva conceitua dignidade da pessoa humana como um “valor supremo que
atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”. 121

Canotilho e Moreira asseveram que:


Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamen-
tais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorati-
va que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma ideia
qualquer apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade hu-
mana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direi-
tos sociais, ou invocá-la para construir ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual,
ignorando-a quando se trate de garantir as bases de existência humana. 122

Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana, por vezes de difícil conceituação pela doutri-
na, constitui-se um valor fundamental para garantir as bases de existência humana, e implica em
diversos outros direitos para que possa ser concretizada.

Representam exemplos destes direitos o direito à convivência familiar, ao exercício da pater-


nidade, ao desenvolvimento de atividade laboral, à saúde, à educação, além de inúmeros outros
essenciais para uma existência digna.

CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS


PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E LEI BRASILEIRA DE INCLU-
SÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA – ASPECTOS GERAIS
A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei Brasileira
de Inclusão da Pessoa com Deficiência foram cruciais para a nova disposição dos direitos destas
pessoas no sistema jurídico pátrio, assentando-se na necessidade de inclusão delas no convívio
social, de modo a participarem de forma igualitária da sociedade sem qualquer distinção ou discri-
minação.

Lourival Serejo leciona que: “A maior distinção da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, é
quanto aos princípios da isonomia e da dignidade da pessoa humana e sua imediata eficácia no
processo de inclusão social.”123

Nesse passo, cabe analisar os aspectos gerais desses dispositivos legais, frente as suas prin-
cipais mudanças quanto aos direitos e garantias das pessoas com deficiência.

121 SILVA, José Afonso. op. cit., p. 107.


122 CANOTILHO e MOREIRA, 1991, p. 58-59, apud, SILVA, José Afonso, op. cit., p. 107.
123 SEREJO, Lourival. O Estatuto da Pessoa com Deficiência e sua repercussão no Direito de Família. [Editorial].
Revista IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família, Edição 24, p.12-15, dez. 2015/jan. 2016. 63
CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DAS
PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
O Decreto Legislativo nº 186 de 09 de julho de 2008 tornou o Brasil signatário da Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual somente foi promulgada pelo
Decreto nº. 6.949, de 25 de agosto de 2009.

O supracitado documento internacional discorre em seu artigo primeiro acerca de seus prin-
cipais objetivos que em suma subsistem em promover, proteger e assegurar o exercício pleno dos
direitos humanos pela pessoa com deficiência, bem como, promover o respeito pela dignidade
destas pessoas.124

Ainda, no tocante ao artigo 1º da Convenção, considerar-se-á:


Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de na-
tureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualda-
des de condições com as demais pessoas.125

Outrossim, merecem destaque os itens consagrados pela Convenção que dizem respeito à
obrigação dos Estados em adotar medidas administrativas, legislativas e de qualquer natureza que
visam assegurar seus objetivos, a conscientização da sociedade, a acessibilidade, o direito à vida,
à igualdade e não-discriminação, proteção da dignidade, bem como modificar e revogar dispositi-
vos ou práticas que impliquem em discriminação das pessoas por conta de sua deficiência, dentre
outros direitos.126

Destarte, a Convenção visa ampliar a participação das pessoas com deficiência em socie-
dade, de maneira garantir a liberdade para constituir família, para casar, exercer livremente poder
familiar, paternidade, participar da vida política e pública, do esporte, da cultura, ter direito ao traba-
lho em igualdade de oportunidades. Contudo, não regulamenta como se dará o sustento do casal e
da prole recém-constituída, quem serão os responsáveis por este sustento, ou mesmo se o Estado
daria subsídios a essas famílias.

LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊN-


CIA – ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
No ano de 2015 o legislador com o objetivo de acatar as disposições da Convenção Interna-
cional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência editou a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência – Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015).

O ilustre doutrinador Zeno Veloso expõe que “A Lei n. 13.146/2015 veio quebrar um antiquís-

124 BRASIL. Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Dispo-
nível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso em: 30 jul. 2016.
125 Idem.
64 126 Idem
simo entendimento: o que relacionava e vinculava deficiência mental com incapacidade jurídica.”127.

Inicialmente, foi proposto pela Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3.638/2000 com o
propósito de alterar a Lei nº 8.742, de 1993, e criar o Estatuto do Portador de Necessidades Espe-
ciais, mas este foi arquivado e anexado ao Projeto de Lei nº 7.699/2006. Desse modo, o Projeto de
Lei nº 7.699/2006, apresentado em 21 de dezembro de 2006, tramitou por volta de nove anos de
intensos debates, e findou com a promulgação da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Defi-
ciência – Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.

Como já mencionado, inúmeras foram às mudanças trazidas pelo dispositivo legal, merecen-
do destaque a opinião de Pablo Stolze: “(...) o Estatuto traduziu uma verdadeira conquista social,
ao inaugurar um sistema normativo inclusivo, que homenageia o princípio da dignidade humana
em diversos níveis.”.128

Corroborando com redação dada ao Código Civil, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência deu uma atenção especial à capacidade em relação aos atos no Direito de Família pra-
ticado por pessoas com deficiência, consoante se extrai do seu artigo 6º:
Art. 6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I - casar-se e constituir união estável;

II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informa-
ções adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou


adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.129

Nesse diapasão impende destacar o que aduz Flávio Tartuce: “Em suma, no plano familiar há
uma expressa inclusão plena das pessoas com deficiência.” 130. Em que pese o novo dispositivo
traçar parâmetros inclusivos em relação à formação de famílias por pessoas com deficiência, ques-
tiona-se como se dará o sustento e manutenção desses novos modelos familiares, em razão da lei
nada dispor a respeito e considerando a plena capacidade dessas pessoas e sua autonomia para
decidir questões quanto ao exercício ou não do trabalho.

127 VELOSO, Zeno. Estatuto da Pessoa com Deficiência. Uma Visão Crítica. Disponível em: <http://www.flaviotartu-
ce.adv.br/artigos_convidados>. Acesso em: 03 ago. 2016.
128 GAGLIANO, Pablo Stolze. É o fim da Interdição?. Disponível em: <http://pablostolze.com.br/>. Acesso em: 03
ago. 2016.
129 BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência
(Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/
L13146.htm>. Acesso em: 29 mai. 2016.
130 TARTUCE, Flávio. Alterações do Código Civil pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Re-
percussões para o Direito de Família e confrontações com o Novo CPC. Primeira Parte. Disponível em <http://www.
flaviotartuce.adv.br/artigos/1>. Acesso em: 06 abr. 2016. 65
Além das transformações ora citadas, insta mencionar aquelas concernentes à tomada de
decisão apoiada e a curatela. Quanto à tomada de decisão apoiada, a Lei nº 13.146/2015 inseriu
ao Código Civil o artigo 1.783-A, propondo referida medida como o processo no qual a pessoa com
deficiência indica pelo menos duas pessoas, as quais lhe prestarão apoio nas decisões sobre atos
da vida civil. O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido diretamente ao juiz pela pes-
soa a ser apoiada e delineará os limites do da atuação dos apoiadores. 131

No tocante à curatela, disciplinada nos artigos 84, 85, 86 e 87 do Estatuto da Pessoa com
Deficiência132, será aplicada como medida protetiva extraordinária e afetará somente os atos de
natureza patrimonial e negocial. Ainda, a medida será aplicada pelo juízo por meio de sentença
expondo as razões e fundamentações que motivaram sua declaração. Paulo Lôbo preleciona que
referida medida têm caráter protetivo, e não de interdição de exercício de direitos. 133

Todavia, algumas alterações abarcadas pela supracitada lei, tornaram-se sem efeito com a
vigência do Novo Código de Processo Civil (Lei Nº 13.105, de 16 de março de 2015), assevera
Flávio Tartuce que foram vários os “atropelamentos legislativos pelo Novo CPC”. O renomado dou-
trinador relata ainda que o Estatuto das Pessoas com Deficiência alterou o Código Civil no sentido
de substituir o processo de interdição pelo instituto da curatela, entretanto o Código de Processo
Civil – que encerrou seu período de vacatio legis após o início da vigência do Estatuto – revogou
expressamente aquele dispositivo de cunho material. Outrossim, o CPC somente prevê o processo
de interdição. Tartuce orienta para a necessidade de uma reforma na nova lei processual. 134

Ainda, acerca da curatela e da capacidade plena das pessoas com deficiência, o ínclito pro-
fessor José Fernando Simão faz severas críticas, apontando efeitos desastrosos devido à discre-
pância entre realidade fática e as propostas do Estatuto.135

Em meio às ponderações de Simão insta transcrever in verbis as que seguem:


[...]

Plena capacidade do enfermo ou deficiente mental

[...]

II – Sendo o deficiente, o enfermo ou excepcional pessoa plenamente capaz, não


poderá ser representado nem assistido, ou seja, deverá praticar pessoalmente os
atos da vida civil. Mas há um problema prático: apesar de o Estatuto ter considerado
tal pessoa capaz, na vida cotidiana tal pessoa não consegue exprimir sua vontade.
131 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 03 jul. 2016.
132 BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência
(Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/
L13146.htm>. Acesso em: 29 mai. 2016.
133 LÔBO, Paulo. Com avanços legais, pessoas com deficiência não são mais incapazes. Disponível em: <http://
www.conjur.com.br/2015-ago-16/processo-familiar-avancos-pessoas-deficiencia-mental-nao-sao-incapazes>. Acesso
em 03 ago. 2016.
134 TARTUCE, Flávio. Alterações do Código Civil pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Re-
percussões para o Direito de Família e confrontações com o Novo CPC. Segunda Parte. Disponível em <http://www.
flaviotartuce.adv.br/artigos/1>. Acesso em: 06 abr. 2016.
135 SIMÃO, José Fernando. Estatuto da Pessoa com Deficiência causa perplexidade (Parte I). Disponível em
<http://www.conjur.com.br/2015-ago-06/jose-simao-estatuto-pessoa-deficiencia-causa-perplexidade#_ftnref1>. Aces-
66 so em 03 ago. 2016
Há pessoas que por fatores físicos são incapazes de manifestar sua vontade, mas
passam a ser capazes por força da nova lei.

Assim indago: qual o efeito prático da mudança proposta pelo Estatuto? Esse des-
compasso entre a realidade e a lei será catastrófico. Com a vigência do Estatuto, tais
pessoas ficam abandonadas à própria sorte, pois não podem exprimir sua vontade e
não poderão ser representadas, pois são capazes por ficção legal. Como praticarão
os atos da vida civil se não conseguem fazê-lo pessoalmente? A situação imposta
pelo Estatuto às pessoas que necessitam de proteção é dramática. Trouxe, nesse
aspecto, o Estatuto alguma vantagem aos deficientes? A mim, parece que nenhuma.

[...]

III – sendo o deficiente, o enfermo ou excepcional pessoa plenamente capaz, terá


uma outra desvantagem em termos jurídicos: a prescrição e a decadência correrão
contra ele.

[...]

Com a vigência do Estatuto esse contrato [realizado por pessoa com deficiência] passa a ser,
em tese, válido, pois celebrado por pessoa capaz. Para sua anulação, necessária será a prova dos
vícios do consentimento (erro ou dolo) o que por exigirá prova de maior complexidade e as dificul-
dades desta ação são enormes.136 (grifou-se).

A corroborar com o exposto acima, Zeno Veloso expõe acerca dos negócios jurídicos rea-
lizados por um deficiente com completo comprometimento de seu discernimento ou mesmo por
portadores de mal de Alzheimer que “são casos em que não me parece que essas pessoas este-
jam sendo protegidas, mas, ao contrário, estão à mercê da sanha dos malfeitores, podendo sofrer
consideráveis e até irremediáveis prejuízos.”.137

Ademais, acerca especificamente da curatela Stolze preconiza “um novo sistema que, vale
salientar, fará com que se configure como “imprecisão técnica” considerar-se a pessoa com defi-
ciência incapaz. Ela é dotada de capacidade legal, ainda que se valha de institutos assistenciais
para a condução da sua própria vida.”.138

Contudo, Simão indica que a curatela seria inútil e não daria a devida proteção à pessoa com
deficiência, eis que esta é considerada plenamente capaz, assim caberia ao juiz fixar em sentença
se o curador representa ou assiste ao deficiente139. Além disso, o juiz também deve dizer em que
atos a assistência ou a representação seriam necessárias.

A corroborar com o exposto acima, a nova lei impõe que serão delimitados pelo juiz em sen-
tença os poderes do curador, os quais deverão relacionar-se exclusivamente a aspectos patrimo-
niais e negociais, devendo atender às necessidades do curatelado definidas após a avaliação de
equipe multidisciplinar, não atingindo direitos ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à
136 Idem.
137 VELOSO, Zeno. Op. Cit..
138 GAGLIANO, Pablo Stolze. Estatuto da Pessoa com Deficiência e sistema jurídico brasileiro de incapacidade
civil. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/41381>. Acesso em: 03 ago. 2016.
139 SIMÃO, José Fernando. Estatuto da Pessoa com Deficiência causa perplexidade (Parte II). Disponível em
<http://www.conjur.com.br/2015-ago-06/jose-simao-estatuto-pessoa-deficiencia-causa-perplexidade#_ftnref1>. Aces-
so em 03 ago. 2016. 67
privacidade, à educação, à saúde, ao voto e ao trabalho, podendo, ainda, ser revogada a curatela
a qualquer tempo.

Além disso, quanto ao voto, na sistemática anterior os Tribunais Regionais Eleitorais – TREs
eram comunicados nos casos de interdição para que procedessem a suspensão ou perda dos
direitos políticos dos absolutamente incapazes, na forma estabelecida pelo artigo 15, inciso II, da
Constituição Federal. Hoje, em razão da nova sistemática instituída pela Lei Brasileira de Inclusão,
que vai ao encontro, por exemplo, do Provimento CRE nº 2, de 13 de abril de 2016, editado pela
Corregedoria Regional Eleitoral do Pará, não haverá mais essa anotação para suspensão ou per-
da, a pessoa com deficiência somente indicará sua deficiência no Requerimento de Alistamento
Eleitoral, no entanto, é obrigada ao exercício do voto, devendo, na impossibilidade de compare-
cimento, apresentar justificativa ao Juízo Eleitoral, como estabelece o artigo 6º, caput e §3º do
supracitado Provimento140. Nesse sentido, indaga-se qual será a solução para aqueles que não
têm condições de exercer direitos políticos, ou mesmo se estes sofrerão a sanção de multa pela
ausência de justificativas, eis que, como já discorrido acima, a curatela somente atingirá questões
atinentes a atos negociais e patrimoniais, não incidindo sobre questões personalíssimas ou mesmo
o direito ao voto.

CONCLUSÃO
Por derradeiro, ante as considerações acima, nota-se que a Lei nº 13.146, de 06 de julho de
2015 incorporou ao ordenamento jurídico normas com o fim de proteger as pessoas com deficiên-
cia, de evitar tratamento discriminatório, assegurando o exercício pleno e equitativo de todas as
garantias e direitos fundamentais dessas pessoas. Neste quesito, foi aplaudida por muitos juristas,
à vista de seus objetivos louváveis, no entanto extrai-se que o estatuto apresenta algumas incon-
sistências.

Assim, a inclusão não pode acontecer por iniciativa da lei em uma sociedade despreparada.
Deve, antes de tudo, suceder mudanças em toda sociedade, desde medidas implantadas pelo
Estado para garantir às pessoas com deficiência o acesso às mesmas oportunidades que os de-
mais indivíduos, bem como que a sociedade em geral esteja preparada e apta para conviver e
relacionar-se sem nenhum obstáculo com aquelas pessoas, pois são raros os indivíduos que não
possuem deficiência que leem braile, ou se comunicam pelo sistema de libras, por exemplo. A alte-
ração legislativa por si só não é capaz de incluir pessoas com deficiência em uma sociedade que
não está preparada para acolhê-las.

Há dois extremos entre a doutrina, no entanto deve-se ponderar: a essência da Lei Brasileira
de Inclusão é imprescindível, vez que a sociedade brasileira ainda apresenta uma intensa margina-
lização das minorias, por vezes excluídas do convívio social, ora discriminadas, ora desprezadas.
Ainda, deve-se sopesar que o Estatuto, embora apresente cunho eminentemente inclusivo, deixou,

140 PARÁ. Corregedoria Regional Eleitoral. Provimento CRE Nº 2, de 13 de abril de 2016. Dispõe sobre o atendi-
mento adequado à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida e da instalação de seções eleitorais espe-
ciais no âmbito do estado do Pará. Disponível em: <http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tre-pa-informativo-csjd-
68 -abril-2016>. Acesso em: 20 ago. 2016.
em determinados pontos, a pessoa com deficiência vulnerável, suscetível a golpes ou sanções de-
correntes de suas condutas.

Em meio a essas inúmeras opiniões divergentes e amplos debates doutrinários, é necessário,


primordialmente, que os tribunais desenvolvam medidas mitigadoras com o propósito de dirimir
eventuais conflitos entre a realidade fática e a legislação, apontando, inclusive, a indispensabili-
dade de pontuais alterações legislativas para assegurar os direitos fundamentais da pessoa com
deficiência abarcados pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Nessa senda, verifica-se que cabe ao Estado adotar instrumentos que garantam a concreti-
zação da igualdade, por vezes incorrendo em meios diferenciados para cada pessoa, frente aos
limites de suas desigualdades, para garantir isonomia de oportunidades. Assim, deve-se atentar
aos fatores pessoais de cada indivíduo, suas limitações e especificidades acerca da sua condição
mental, física, bem como aqueles que dizem respeito ao grupo de indivíduos, de forma a concre-
tizar os princípios constitucionais da igualdade de tratamento e da dignidade da pessoa humana,
eis que determinadas matérias se pautam no ser humano, sobre o qual não cabem generalizações.

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70
STATUTE OF THE PERSON WITH DISABILITY - CHANGES CONCERNED TO
THE THEORIES OF CAPABILITIES IN VIEW OF THE CONSTITUTIONAL AND
LEGAL GUARANTEES

ABSTRACT: The Statute of the Person with Disability, valid since January 2016, takes its first steps, reflecting also in
doctrinal dilemmas as to its procedural aspects and factual and legal consequences. The Statute, in general, aims to
promote the inclusion of people with disabilities, their participation in all fields of society in a more effective way, rejecting
all forms of discrimination, to ensure the right to equality, human dignity, education, health, among other guarantees, as
well as in order to establish changes in the whole society. Nevertheless, in order to materialize these referred rights, it
was restructured the institute of the civil capability, establishing full civil capability for people with disabilities. On this last
point, there are many questions among the jurists about its consequences in the Brazilian reality, therefore, this study
aimed to analyze if the inclusion envisioned by the law, by itself, will produce effects in this society. Furthermore, the
new legal provision deserves special attention, by checking if the acts performed by people with disabilities, which will
then be considered valid, result in a higher vulnerability of these people to coups or penalties arising from their conduct,
or if they cumply the intention to include them in the social conviviality. In order to do that, it was used of bases and
theoretical references, and, in the interpretation, the deductive method as predominant.

KEYWORDS: Capability; Disability; Inclusion.

71
DANOS MORAIS DECORRENTES DO DESCUMPRIMENTO
CONTRATUAL

Danielle Regina de Lima Coelho


Graduada em Secretariado Executivo Trilíngue pela Universidade Estadual de Maringá. Acadêmica do Curso de Di-
reito do Centro Universitário Cesumar – UNICESUMAR, Maringá – PR. Bolsista PIBIC/ Fundação Araucária. Bolsista
IC/UniCesumar. danielle@limacoelho.com

Tatiana de Freitas Giovanini Mochi


Mestre em Direito pela UniCesumar. Professora na UniCesumar. Advogada em Maringá – PR. tatifgi@hotmail.com

RESUMO: Este trabalho tem por objetivo demonstrar a ocorrência de danos morais ante ao descumprimento contra-
tual. Para isso, discorrer-se-á acerca da teoria geral dos contratos, previsto em nosso ordenamento jurídico, elencando
seus princípios gerais e, neste tópico, adentrando à obrigatoriedade dos contratos enquanto força de lei. Em seguida,
será abordado o descumprimento contratual e seus efeitos. Em uma próxima etapa apresentar-se-á a definição de
dano moral, a possibilidade de reparação do dano moral no âmbito das relações contratuais e a desmistificação do
mero dissabor. A metodologia de apresentação está dividida em tópicos e o conteúdo a seguir busca propiciar um fácil
entendimento acerca do assunto.

PALAVRAS-CHAVE: Contrato. Descumprimento. Dano.

INTRODUÇÃO
O trabalho ora apresentado tratará da existência de danos morais na hipótese de descumpri-
mento contratual, utilizando de um método que busca o entrelaçamento da doutrina e da jurispru-
dência.

Inicialmente serão apresentados conceitos e princípios gerais dos contratos, dentre estes, os
da autonomia da vontade, supremacia da ordem pública e obrigatoriedade do contrato, com parti-
cular ênfase ao princípio da obrigatoriedade.

No momento seguinte, estabelecer-se-á um vínculo entre o desrespeito aos princípios anali-


sados e as consequências no inadimplemento contratual, tais como mora, juros e perdas e danos.

Abordadas as questões preliminares, passa-se ao tema propriamente dito, que é a existência


de danos morais no descumprimento contratual. Objetiva-se ponderar que os danos morais estão
presentes quando a lesão ao indivíduo ocasionada pelo inadimplemento contratual extrapolar a
esfera do mero dissabor.

Por fim, através de posicionamentos doutrinários e análise dos julgados dos Tribunais Supe-
riores, busca-se esclarecer o que seria o mero dissabor para, então, concluir sobre a incidência ou
não de danos morais no descumprimento contratual.

72
1. CONTRATOS
A palavra contrato origina do latim contractus e tem o sentido de convenção, pacto, acordo
de vontades. É um acordo entre duas ou mais pessoas, as quais assumem obrigações para uma
determinada finalidade141.

Para Clóvis Beviláquia, contrato é “o acordo de vontade de duas ou mais pessoas com a fina-
lidade de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direito”142.

Na definição de Orlando Gomes, “contrato é, assim, o negócio jurídico bilateral ou plurilateral,


que sujeita as partes à observância de conduta idônea à satisfação dos interesses que regula-
ram”143.

Então podemos dizer que contrato é negócio jurídico bilateral que gera obrigações para am-
bas as partes, as quais convencionam, por consentimento mútuo, a dar, fazer ou não fazer alguma
coisa, constituindo, modificando ou extinguindo um direito.

Prevê o Código Civil, em seu artigo 104, que para um contrato ser válido, é necessário que
as partes sejam capazes, que o objeto seja lícito, possível e determinado ou determinável, que a
sua forma seja prescrita ou não defesa em lei e que haja acordo de vontades entre as partes144, ou
seja, consentimento recíproco.

1.1. PRINCÍPIOS GERAIS DOS CONTRATOS

Em uma adaptação à leitura de Orlando Gomes, pode-se dizer que são três os princípios mais
significativos que regem a teoria geral dos contratos: autonomia da vontade, o da boa-fé e o da
força obrigatória145.

Ainda de acordo com Orlando Gomes, a autonomia de vontade significa que o consentimento
das partes em contratar deve ser livre de quaisquer vícios, ou seja, deve haver liberdade de esco-
lher o tipo de contrato, o seu objeto, suas condições, etc.

Para Silvio Venosa, a liberdade de contratar significa que as partes podem escolher o conteú-
do do contrato e, até mesmo, a modalidade de contrato146.

Maria Helena Diniz afirma que este princípio é tão importante que basta o simples acordo en-
tre as partes para gerar efeitos na esfera jurídica, por este o elemento responsável por sua criação
e validade no direito147.

141 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 05.
142 BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil anotado. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1916. p. 245.
143 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 10.
144 BRASIL. Código Civil. 2002.
145 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 22.
146 VENOSA, Silvio Salvo. Direito civil: Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. São Paulo: Atlas,
2008. p. 405.
147 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - Responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
p. 27. 73
Todas as relações jurídicas do ordenamento jurídico pátrio, não apenas os contratos, devem
pautar-se sobre a boa fé, a qual de acordo com Carlos Roberto Gonçalves, divide-se em boa-fé
objetiva e boa-fé subjetiva148. Esta se refere ao íntimo do indivíduo, como ele acha que está agindo.
Aquela se refere ao que se espera de ético por parte do indivíduo, o que o coletivo entende por
ético.

Paulo Brasil Dill Soares esclarece o significado da boa-fé objetiva ao conceituar:


Boa-fé objetiva é um ‘standard’ um parâmetro genérico de conduta. Boa-fé objetiva
significa, portanto, uma atuação ‘refletida’, pensando no outro, no parceiro atual,
respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos,
agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem
excessiva, gerando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo
contratual e a realização de interesses das partes.149

Pereira diferencia a boa-fé subjetiva da objetiva: em sua concepção subjetiva, corresponde


ao estado psicológico do agente; enquanto que a boa-fé objetiva se apresenta como uma regra de
conduta, “um comportamento em determinada relação jurídica de cooperação”150.

No Código Civil, o princípio da boa-fé encontra previsão no artigo 422: “os contraentes são
obrigados a guardar [...] os princípios de probidade e boa fé”151.

Para Arnaldo Rizzardo, “é notório que sem a boa-fé dentro da relação contratual, o consenti-
mento das partes se torna viciada e suscetível de anulação do contrato”152.

Por fim, cabe destacar a obrigatoriedade dos contratos, o qual devido à suma importância do
tema para o presente trabalho, será melhor explanado em tópico específico, a seguir.

1.1.1. OBRIGATORIEDADE DOS CONTRATOS

O princípio da obrigatoriedade dos contratos também recebe outros nomes: força obrigatória
dos contratos, pacta sunt servanda, força vinculante dos contratos, intangibilidade dos contratos
ou, ainda, obrigatoriedade das convenções. É um princípio que encontra seu fundamento de exis-
tência na vontade que faz nascerem os contratos.

Para Giogi Giorgio, há diversas teorias que explicam a força obrigatória dos contratos, entre-
tanto a doutrina majoritária153, dentre eles Orlando Gomes acredita que essa obrigatoriedade existe
devido ao próprio princípio da autonomia de vontade, afinal, uma vez que as partes convencionam
as obrigações de um contrato de forma livre, mútua, consentida, elas devem se obrigar a cumprir

148 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 34.
149 SOARES, Paulo Brasil Dill. Princípios básicos de defesa do consumidor: Institutos de Proteção ao Hipossufi-
ciente. São Paulo: LED, 2001. p. 219.
150 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: Contratos. Vol. 3. 11. ed. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 2003. p. 20.
151 BRASIL. Código Civil. 2002.
152 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 23.
153 GIORGIO, Giorgi. Teoria de las obrigaciones em el derecho moderno, trad pela Red. Da Revista General de
Legislacion y Jurisprudencia, apud BESSONE, DARCY. Do contrato. Teoria geral. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p.
74 19.
o que pactuaram154.

Além disso, cabe destacar o fundamento da segurança nas relações jurídicas, uma vez que
um contrato afeta interesses de terceiros. Assim, as partes que se obrigam perante um contrato
devem cumpri-lo sob pena de serem compelidas forçosamente através das sanções previstas no
próprio contrato e, principalmente, na lei155.

Em falando de lei, entende Reynaldo Ribeiro Daiuto que o contrato é lei entre as partes, o cha-
mado pacta sunt servandae, pois se fora celebrado cumprindo todos os requisitos e pressupostos
de validade, as cláusulas tomam força obrigatória156.

Devido à obrigatoriedade dos contratos, surge a intangibilidade dos contratos, por meio do
qual nem mesmo o juiz pode revisar o conteúdo de um contrato, sequer as partes podem libertar-se
do contrato mediante um ato unilateral. O que pode ocorrer é uma intervenção judicial para decla-
ração de nulidade ou resolução do contrato, mas não a modificação de seu conteúdo157.

Cabe ressaltar, apenas, que o princípio da obrigatoriedade não é absoluto, uma vez que sofre
grande limitação no princípio da função social do contrato.

O Código Civil, em seu art. 421 prevê que “a liberdade de contratar será exercida em razão
e nos limites da função social do contrato”158, exigindo assim uma harmonização dos interesses
privativos dos contraentes com os interesses de toda a coletividade.

Discorre Luiz Guilherme Loureiro que o contrato não deve gerar enriquecimento sem causa
para uma das partes, que o objeto avençado em contrato deve ser respeitado de forma a evitar o
abuso de poder econômico e a relação desigual entre os contratantes, tendo a função social do
contrato um objetivo equitativo de distribuição de riquezas159.

Já Nelson Nery Junior esclarece que, por ser a função social uma cláusula geral, o juiz in-
terpretará o que significa essa “função social” com valores jurídicos, sociais, econômicos e morais
diante de cada caso concreto160.

Sendo assim, a função social do contrato se dá na amplitude do Direito e dos interesses cole-
tivos, e não apenas no interesse individual.

1.2. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL

As obrigações, em regra, são criadas para serem cumpridas na forma, tempo e lugar previa-
mente estabelecidos. Sendo assim, o inadimplemento contratual nada mais é que o descumpri-

154 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 40.


155 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - Responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
p. 118.
156 DAIUTO, Reynaldo Ribeiro. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1995. p. 49.
157 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 43.
158 BRASIL. Código Civil. 2002.
159 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Contratos no novo Código Civil. 2. ed. São Paulo: Método, 2004.
160 NERY JÚNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil anotado e legislação extravagante. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 75
mento da obrigação pactuada.

É importante expor a hipótese de inadimplemento involuntário por parte do devedor, onde ele
deixa de cumprir o contrato por motivos externos à sua vontade, como por casos fortuitos ou de
força maior161.

O Código Civil traz a previsão de caso fortuito e força maior no artigo 393, entretanto não há
diferenciação nos conceitos de caso fortuito e força maior, pois se entende que os termos devem
ser tratados como sinônimos em decorrência da identidade dos efeitos que apresentam, ou seja,
imprevisibilidade. “O que é indiscutível é que tanto um como outro estão fora dos limites da culpa”162.

Contudo, estas hipóteses não serão abordadas, pois o foco do estudo é o inadimplemento
voluntário.

O Código Civil aborda duas possibilidades de inadimplemento contratual: absoluto e relativo.


Nesta, mesmo descumprida a obrigação principal, ainda interessa ao credor a sua realização, ain-
da que seja após a data inicialmente acordada. Naquela, a prestação da obrigação principal não
interessa mais ao credor, sendo assim ela poderá ser convertida em obrigação de indenizar163.

O inadimplemento absoluto culmina em perdas e danos, pois o objeto da obrigação será


convertido, necessariamente, na indenização cabível. Por outro lado, no segundo caso, a mora sig-
nifica apenas o retardamento da prestação convencionada, de modo que o devedor ainda poderá
realizá-la satisfatoriamente em outro momento, sem prejuízo da indenização necessária, caso haja
algum dano proveniente da demora.

A questão da reparação ao credor é explanada por Maria Helena Diniz:


Pelos prejuízos sujeitar-se-ão o inadimplente e o contratante moroso ao dever de re-
parar as perdas e danos sofridos pelo credor, inserindo o dano como pressuposto da
responsabilidade civil contratual [...]. A responsabilidade civil consiste na obrigação
de indenizar, e só haverá indenização quando existir prejuízo a reparar164.

José de Aguiar Dias afirma que havendo violação de uma norma, independente de sua espé-
cie, impõe-se o dever de reparação165.

1.2.1. EFEITOS GERADOS PELO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL

De acordo com o Código Civil, quem infringe um dever jurídico, provocando um dano a ou-
trem, será obrigado a indenizar pelo prejuízo causado. Infringir um dever jurídico significa cometer
certa infração a deveres previstos numa relação contratual (responsabilidade contratual) ou em
determinada norma (responsabilidade extracontratual)166.

161 TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das obrigações. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 323.
162 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 65.
163 ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5. ed. São Paulo: 1980. p. 163.
164 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - Responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
p. 398.
165 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 26.
76 166 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 101.
Com efeito, é necessário que se estabeleça uma relação de causalidade da ação e o mal
causado, ou na feliz expressão de Demogue, “é preciso esteja certo que, sem este fato, o dano não
teria acontecido167. Assim, não baste que uma pessoa tenha contravindo a certas regras, é preciso
que sem esta contravenção, o dano não ocorreria”.

Dentre os efeitos causados pelo inadimplemento contratual, os principais são a mora, as per-
das e danos e os juros.

Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, a mora pode ser provocada pelo
devedor (mora solvendi) ou pelo credor (mora accipiendi) e caracteriza-se pelo retardamento cul-
poso da obrigação, ou seja, se não houve culpa, não há mora168.

Perdas e danos é o equivalente ao prejuízo suportado pelo credor em virtude do devedor não
ter cumprido, total ou parcialmente, a obrigação, expressando-se num montante de dinheiro corres-
pondente ao desequilíbrio sofrido pelo prejudicado. Consiste na diferença entre o estado atual do
patrimônio e o estado que o teria se o fato danoso não tivesse ocorrido. Pode ser material - prejuízo
de cunho patrimonial - ou moral - que atinge o íntimo do indivíduo169.

Já os juros representam o rendimento do capital, os frutos civis produzidos pelo dinheiro.

Carlos Roberto Gonçalves ilustramente define que indenizar enseja a reparação integral do
dano causado à vítima170, ou seja, o objetivo de uma indenização será restaurar, sempre que possí-
vel, a situação ao statu quo ante (estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito).
Como nem sempre é possível recompor este estado originário, busca-se uma compensação sob a
forma de indenização.

2. DANO MORAL
Existem diversas definições doutrinárias para o dano moral, dentre elas merecem especial
atenção a de Maria Helena Diniz, a qual estabelece que o dano moral é “a lesão de interesses não
patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo ato lesivo”171.

Carlos Roberto Gonçalves afirma que:


Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É
lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade,
intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1o, III, e 5o, V e X,
da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame
e humilhação172.

Ensina Sérgio Cavalieri Filho que o “dano moral existe in re ipsa”, sendo proveniente do pró-
167 DEMOGUE, René. Traité des obligations en general, vol. IV, n.º 366.
168 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: obrigações. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 315.
169 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997. p. 171.
170 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 18.
171 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - Responsabilidade civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
p. 84.
172 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 359. 77
prio fato ofensivo, portanto, provada a ofensa está evidenciado o dano moral “à guisa de uma pre-
sunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras de experiência comum”173.

O dano moral encontra seu principal fundamento jurídico na Constituição Federal, em seu
artigo 1º, III, o qual traz como direito fundamental a dignidade da pessoa humana, direito este que
se pretende proteger com o instituto do dano moral, além do artigo 5º, V e X, os quais garantem,
respectivamente, o direito de resposta e a inviolabilidade dos direitos personalíssimos, além da
indenização pelo dano moral, material ou à imagem, decorrentes da violação174.

No mesmo sentido, o Código Civil traz em seu artigo 12 a seguinte redação: “pode-se exigir
que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem pre-
juízo de outras sanções previstas em lei”.

Como se vê, havendo afronta a algum direito da personalidade, seja ela concretizada ou ape-
nas uma ameaça, o ordenamento jurídico resguarda o direito à reparação do dano.

Ainda no Código Civil há a possibilidade de pleitear a indenização pelos danos sofridos, ainda
que exclusivamente morais, através do artigo 186.

O Código de Defesa do Consumidor também traz, em seu artigo 6o, VI e VII, a garantia básica
de prevenção e reparação pelos danos morais sofridos pelo consumidor lesado por ato ilícito do
fornecedor175.

Percebe-se que a discussão acerca da possibilidade de reparação do dano moral encontra-


-se superada, afinal o referido instituto está bem consolidado atualmente no ordenamento jurídico
brasileiro.

Aliás, para Stocco tamanha é a relevância desta consolidação, que o entendimento majori-
tário, tanto da doutrina, quanto da jurisprudência pátria, é a de que não há necessidade de provar
o dano moral, mas apenas de comprovar a existência do fato danoso, o que por si só já restaria
evidenciado o dano moral e a indenização que desta decorre176.

Assim decidiu o Tribunal:

Indenização - Dano moral - Prova - Desnecessidade. “Não há falar em prova do dano mo-
ral, mas, sim, na provado fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam.
Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação do art. 334 do Código de
Processo Civil”.177

A indenização por dano moral possui caráter punitivo e preventivo. Punitivo pois busca retri-
buir os danos passados, e preventivo porque se pretende, assim, evitar danos futuros.

173 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 79.
174 BRASIL. Constituição. 1988.
175 BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. 1990.
176 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997. p. 171.
177 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível 753811220098260224 SP0075381-
12.2009.8.26.0224, Relator: Orlando Pistoresi, Data de Julgamento: 18/01/2012, 30ª Câmara de Direito Privado,
Data de Publicação: 18/01/2012. Disponível em <http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21066140/apelacao-apl-
78 -753811220098260224-sp-0075381-1220098260224-tjsp>. Acesso em 06 ago. 2016.
Martins-Costa e Pargendler afirmam que o termo punitive damages seria correspondente a
uma indenização punitiva, a qual é a soma em dinheiro concedida àquele que sofreu a lesão, em
valor expressivamente superior à compensação do dano, buscando a punição do agente ofensor e
a prevenção contra a prática de novos ilícitos178.

André Corrêa Andrade é tão adepto de tal teoria, que defende que a indenização punitiva tem
fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, inciso III, da Cons-
tituição Federal de 1988179.

O relator Desembargador Artur Arnildo Ludwig, na apelação cível nº 70013361043, do TJ-RS,


adota o caráter punitivo como critério para quantificar o valor da indenização e prevenir nova lesão
de direito.

Assim também decidiu o relator Desembargador Nagib Slaibi, na apelação cível nº 0336530-
44.2008.8.19.0001, do TJ-RJ, sendo favorável à indenização punitiva, citando inclusive que esta
função punitiva é adotado há muito tempo pelo sistema commom law nos Estados Unidos.

Maria Helena Diniz, ao tratar o dano moral, diz que:


A reparação tem sua dupla função, a penal constituindo uma sanção imposta ao
ofensor, visando a diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido,
visto que o bem jurídico da pessoa (integridade física, moral e intelectual) não pode-
rá ser violado impunemente, e a função satisfatória ou compensatória, pois como o
dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provo-
cando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao
prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada180.

Ainda nesta matéria, o Desembargador Pinheiro Lago, na ocasião do julgamento da Apelação


Cível número 90.681/8, no TJMG, com muita propriedade asseverou em seu voto que

O ressarcimento por dano moral, não objetiva somente compensar à pessoa ofendida, mas
também, sobre outra ótica, punir o infrator, através da imposição de sanção de natureza econômi-
ca, em benefício da vitima, pela ofensa à ordem jurídica alheia.

Verifica-se, portanto, que a indenização por dano moral possui dois objetivos, quais sejam
punir o agente infrator para que novas lesões não sejam perpretadas, assim como reparar o dano
causado ao indivíduo lesado, ainda que não seja possível retornar ao status quo ante em se tra-
tando de danos aos direitos da personalidade, mas serveria como forma de amenizar o sofrimento
daquele que sofreu o dano.

178 MARTINS-COSTA, Judith; PARGENDLER, Maria Souza. Usos e Abusos da Função


Punitiva (punitive damages e o direito brasileiro). Revista do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça
Federal. Brasília. n. 28, p. 15-32, jan./mar. 2005.
179 ANDRADE, André Gustavo Corrêa. Dano moral e indenização punitiva. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 176.
180 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro - Responsabilidade civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
p. 248. 79
2.1. DANO MORAL NO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL

É pertinente afirmar que o dano moral quase sempre decorre de relações extracontratuais,
como em um acidente de trânsito, uma publicação que ofende a honra de alguém, um equipamento
que falha em seu funcionamento e atinge alguém, etc.

Entretanto, analisando a jurisprudência pátria, verifica-se que cada vez mais é frequente o
ajuizamento de ações pleiteando dano moral por descumprimento das relações contratuais, con-
forme se pode verificar nos julgados abaixo:

AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE VALORES C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS. TRANS-


PORTE DE MÓVEIS. MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DANOS MATERIAIS E DESCUMPRI-
MENTO CONTRATUAL REVELIA. DANO MORAL EXISTENTE NA ESPÉCIE. SENTENÇA CON-
FIRMADA. RECURSO NÃO PROVIDO.181

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CASO CONCRETO. DANO MORAL. CA-


DASTRAMENTO EM ÓRGÃO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM
JUDICIAL. DEVER DE INDENIZAR EXISTENTE. MAJORAÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA NE-
CESSÁRIA. JUROS DESDE A CITAÇÃO. RELAÇÃO CONTRATUAL. APELAÇÃO DA AUTORA
PROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ PARCIALMENTE PROVIDA182.

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL.


INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. DÍVIDA EXISTENTE. DESCUMPRI-
MENTO CONTRATUAL POR PARTE DO AUTOR/RECORRENTE. INSCRIÇÃO LEGÍTIMA. RE-
CURSO IMPROVIDO183.

Como já visto, o descumprimento contratual ocorre quando uma das partes deixa de cumprir
com sua obrigação, com a sua prestação no contrato.

Em regra, conforme prevê o artigo 394 do Código Civil, nas hipóteses de inadimplemento
contratual, o devedor responde por perdas e danos184. Entretanto, cabe ressaltar que o dano moral
não se configura em todo e qualquer caso de descumprimento contratual. É preciso que haja uma
lesão grave com repercussão na esfera íntima do segurado.

Não basta que o indivíduo sofra um aborrecimento, uma chateação, é preciso que um direito
personalíssimo seja lesado, que o indivíduo tenha sua dignidade abalada, um desrespeito aos seus
direitos da personalidade, tais como a honra, a imagem, o nome, dentre outros.

181 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso Cível: 71004815882 RS, Relator: Gisele Anne
Vieira de Azambuja, Data de Julgamento: 25/04/2014, Quarta Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário
da Justiça do dia 29/04/2014. Disponível em < http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/118238523/recurso-c-vel-
-71004815882-rs>. Acesso em 06 ago. 2016.
182 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível: 70052780590 RS, Relator: Léo Romi
Pilau Júnior, Data de Julgamento: 19/09/2013, Décima Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Jus-
tiça do dia 27/09/2013. Disponível em < http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113245764/apelacao-civel-ac-
-70052780590-rs>. Acesso em 06 ago. 2016.
183 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso Cível: 71004300265 RS, Relator: José Antônio
Coitinho, Data de Julgamento: 08/11/2013, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do
dia 14/11/2013. Disponível em < http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113411759/recurso-civel-71004300265-rs>.
Acesso em 06 ago. 2016.
80 184 BRASIL. Código Civil. 2002.
André Gustavo Correa de Andrade exemplifica:

A falta de pagamento de uma dívida em dinheiro pode constituir mero aborrecimento quando
o devedor não paga em razão de dificuldades financeiras, ou quando de boa-fé discorda da exis-
tência da dívida ou do seu montante. Caracterizará dano moral, porém, quando o devedor, podendo
pagar o débito ou cumprir sua obrigação, não o faz por malícia ou por inconsideração para com o
credor. A conduta abusiva do devedor será, então, determinante para a própria configuração ou, ao
menos, para a reparabilidade do dano moral, consistente no abalo “psicológico” ou “emocional” do
credor.185

Neste sentido, é o que decidiu reiteradamente o Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊN-


CIA. SEGURO-VIAGEM. DANOS MORAIS. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. INOCORRÊN-
CIA EM REGRA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO CARACTERIZADA. RECURSO DESACOLHI-
DO. I - Como anotado em precedente (REsp 202.504-SP, DJ 1.10.2001), o inadimplemento do
contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em
regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade186.

PLANO DE SAÚDE DEMORA NA REALIZAÇÃO DE CIRURGIA MERO DESCUMPRIMENTO


CONTRATUAL QUE NÃO GERA DANO MORAL - NEGATIVA DA RÉ FUNDADA EM INTERPRE-
TAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL INEXISTÊNCIA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL VEXATÓ-
RIA OU HUMILHANTE - SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO187.

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE


SEGURO DE VEÍCULO. PAGAMENTO PARCELADO PELO CARTÃO DE CRÉDITO. ÚLTIMA PAR-
CELA NÃO DEBITADA NA FATURA. COBERTURA DO SEGURO SUSPENSA. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL
NÃO GERA DANO MORAL. SÚMULA Nº 75 DO TJ/RJ. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO A
QUE SE DÁ PROVIMENTO, NA FORMA DO ART. 557, § 1º - A, DO CPC188.

Tamanho é o entendimento dos Tribunais neste sentido, que o TJ/RJ editou Súmula vinculante
a respeito: “Súmula 75 do TJ/RJ: O simples descumprimento de dever legal ou contratual, por ca-
racterizar mero aborrecimento, em princípio, não configura dano moral, salvo se da infração advém
circunstância que atenta contra a dignidade da parte”189.
185 ANDRADE, André Gustavo Corrêa de Andrade. Dano moral e indenização punitiva. Rio de Janeiro: Forense,
2006. p. 7.
186 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial: 338162 MG 2001/0102554-9, Relator: Ministro SÁL-
VIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Data de Julgamento: 20/11/2001, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação:
DJ 18.02.2002 p. 459. Disponível em < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/298142/recurso-especial-resp-
-338162-mg-2001-0102554-9>. Acesso em 06 ago. 2016.
187 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação: 50228120098260565 SP 0005022-81.2009.8.26.0565,
Relator: Neves Amorim, Data de Julgamento: 15/05/2012, 2ª Câmara de Direito Privado, Data de Publi-
cação: 18/05/2012. Disponível em < http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21726932/apelacao-apl-
-50228120098260565-sp-0005022-8120098260565-tjsp>. Acesso em 06 ago. 2016.
188 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Apelação: 1367202020108190001 RJ 0136720-
20.2010.8.19.0001, Relator: DES. ANDRE ANDRADE, Data de Julgamento: 14/06/2012, SETIMA CAMARA CI-
VEL. Disponível em <http://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22002535/apelacao-apl-1367202020108190001-rj-
-0136720-2020108190001-tjrj>. Acesso em 06 ago. 2016.
189 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Súmula 75. Disponível em <http://www.conteudojuridico.com.br/
sumula-organizada,tjrj-sumula-75,7151.html >. Acesso em 06 ago. 2016. 81
Sérgio Cavelieri Filho explica que o inadimplemento contratual por si só não tem o condão de
agredir a dignidade humana, exceto se seus efeitos, em razão da natureza do negócio, exorbitarem
ao normal190.

Além destas previsões e considerações acerca do dano moral na incidência de descumpri-


mento contratual perante as regras do Código Civil, também é bastante crescente no Poder Judi-
ciário a demanda de ações pleiteando danos morais nas relações de consumo.

Aliás, o Código de Defesa do Consumidor prevê em seu artigo 6o que “são direitos básicos
do consumidor [...] VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vista à prevenção ou
reparação de danos patrimoniais e morais”191.

Nos Tribunais, verifica-se a mesma linha de pensamento a respeito da não existência de da-
nos morais pelo mero descumprimento contratual nas relações de consumo:

CIVIL. CDC. CONTRATO DE SEGURO DE AUTOMÓVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AU-


SÊNCIA DE JUSTIFICATIVA PARA A NÃO COBERTURA ABRANGENTE. DANOS MATERIAIS
EXISTENTES. DANO MORAL INCABÍVEL. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. RECUR-
SO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE. SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE.
DANO MORAL IMPROCEDENTE192.

CONSUMIDOR. COMPRA PELA INTERNET DE PASSAGENS AÉREAS. CANCELAMENTO


VIA CALL CENTER. NÃO EFETIVAÇÃO DO ESTORNO DOS VALORES NO CARTÃO DE CRÉ-
DITO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. REPETIÇÃO EM DOBRO. INCIDÊNCIA DO ART. 42
DO CDC. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA PARA AFASTAR OS
DANOS MORAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO193.

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.


CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO DE INTERNET BANDA LARGA. PRESTAÇÃO DEFEITUOSA DO
SERVIÇO CONTRATADO. INCIDÊNCIA DO CDC. DANO MORAL. DESCUMPRIMENTO CON-
TRATUAL. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS. 1- Incidên-
cia do CDC: descabida, no caso, ante a não-qualificação dos autores como destinatários finais do
serviço contratado. Não-verificação do conceito de consumidor dado pelo art. 2º do CDC. 2- Danos
morais: não configurados, na hipótese, por tratar-se, antes, de mero descumprimento contratual.
Ausência de demonstração de ofensa à honra objetiva da pessoa jurídica demandante e à honra
subjetiva do também autor. 3- Juros de mora: incidentes a partir da citação, por se tratar de respon-
sabilidade civil contratual. Literalidade do art. 406 do Código Civil e do art. 219, “caput”, do CPC,
a teor do qual a citação constitui em mora o devedor. 4- Honorários advocatícios: possível a sua
190 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 80.
191 BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. 1990.
192 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. ACJ: 63012720108070006 DF 0006301-27.2010.807.0006,
Relator: WILDE MARIA SILVA JUSTINIANO RIBEIRO, Data de Julgamento: 29/03/2011, PRIMEIRA TURMA RE-
CURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DO DF, Data de Publicação: 08/04/2011, DJ-e Pág.
169. Disponível em < http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18712442/acao-ci-vel-do-juizado-especial-acj-
-63012720108070006-df-0006301-2720108070006>. Acesso em 06 ago. 2016.
193 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso Cível: 71004654232 RS, Relator: Vivian Cristina
Angonese Spengler, Data de Julgamento: 26/03/2014, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário
da Justiça do dia 28/03/2014. Disponível em <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/114685419/recurso-civel-
82 -71004654232-rs>. Acesso em 06 ago. 2016.
compensação, nos termos da Súmula n.º 306/STJ. Apelo desprovido194.

JUIZADO ESPECIAL. CDC. COMPRA DE PRODUTO. DEMORA NA MONTAGEM. DESCUM-


PRIMENTO CONTRATUAL. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E PROVI-
DO. 1. A PEQUENA DEMORA DO FORNECEDOR EM MONTAR O PRODUTO ADQUIRIDO PELO
CONSUMIDOR CARACTERIZA MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL, CUJOS DISSABO-
RES NÃO ENSEJAM A INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. 2. PRECEDENTES195.

Desta forma, resta evidenciado o entendimento jurisprudencial majoritário acerca da inexis-


tência do dano moral em casos de inadimplemento contratual, a menos que tal inadimplemento
caracterize uma afronta à dignidade da pessoa humana do indivíduo lesado.

3.2. MERO DISSABOR

Aparentemente é fácil conceituar o dano moral, mas o que se configura ou não no instituto do
dano moral é um pouco mais complexo do que se imagina e, na falta de critérios objetivos, essa
questão vem se tornando tormentosa na doutrina e na jurisprudência.

Atualmente, o Poder Judiciário está sobrecarregado de diversos pedidos inócuos e extrema-


mente oportunistas que são resultados de um subjetivismo em relação ao direito de indenizações.

Viver em sociedade pressupõe a divergência de idéias e opiniões, o que muitas vezes gera
conflitos de interesses. Entretanto, não é justificativa para se reparar toda e qualquer situação de-
sagradável, pois há um nível de inconvenientes e desgostos que o ser humano deve tolerar. É ne-
cessário que a pessoa lesada demonstre que o ato danoso tenha ultrapassado a esfera daquilo que
deixa de ser razoável, que ocorreu uma efetiva ofensa à dignidade da pessoa humana enquanto
direito da personalidade, extrapolando a mera frustração ou dissabor.

Assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer descon-
forto ao outro contratante - e normalmente o traz - trata-se, em princípio, do desconforto a que todos
podem estar sujeitos, pela própria vida em sociedade196.

A propósito do tema, pertinente é destacar a lição do eminente Desembargador Sergio Cava-


lieri Filho, que fornece a exata matiz da questão:

194 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. AC: 70054383427 RS, Relator: Umberto Guaspari Su-
dbrack, Data de Julgamento: 27/06/2013, Décima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justi-
ça do dia 01/07/2013. Disponível em <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/112916448/apelacao-civel-ac-
-70054383427-rs>. Acesso em 06 ago. 2016.
195 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. ACJ: 225615720118070003 DF 0022561-57.2011.807.0003,
Relator: LUIS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 14/02/2012, 2ª Turma Recursal dos Juizados Espe-
ciais do Distrito Federal, Data de Publicação: 08/03/2012, DJ-e Pág. 273. Disponível em < http://tj-df.jusbrasil.com.br/
jurisprudencia/21353096/acao-ci-vel-do-juizado-especial-acj-225615720118070003-df-0022561-5720118070003-tjdf>.
Acesso em 06 ago. 2016.
196 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp: 338162 MG 2001/0102554-9, Relator: Ministro SÁLVIO DE
FIGUEIREDO TEIXEIRA, Data de Julgamento: 20/11/2001, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ
18.02.2002 p. 459. Disponível em < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/298142/recurso-especial-resp-
-338162-mg-2001-0102554-9>. Acesso em 06 ago. 2016. 83
Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do
indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, abor-
recimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, por-
quanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os
amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper
o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano
moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos197.

Percebe-se que não há um conceito doutrinário acerca do mero dissabor, o que se tem é uma
construção jurisprudencial que permite dizer que o mero dissabor abrange situações que beiram à
normalidade, ao aceitável na vida em sociedade, que, ainda que causem desconforto ao indivíduo,
não abalam significativamente o íntimo da pessoa, a sua dignidade, a sua honra, isto é, seus direi-
tos da personalidade.

Os Tribunais vêm decidindo solidamente acerca da inocorrência de danos morais em descum-


primento contratual fundado em mero dissabor, conforme segue:

RECURSO INOMINADO. FALHA EM TRANSFÊRENCIA BANCÁRIA. DESCUMPRIMENTO


CONTRATUAL. DANO MORAL INOCORRENTE. Descabe condenação por dano moral quando
não configurada ofensa a atributo pessoal da parte autora. RECURSO NEGADO198.

RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. MERO DESCUMPRI-


MENTO CONTRATUAL. DANO MORAL INOCORRENTE. SENTENÇA MANTIDA. A parte autora
pede provimento ao recurso, para reformar a sentença que julgou parcialmente procedente a pre-
sente ação indenizatória, postulando a procedência do pleito indenizatório por danos morais. Con-
figurada a hipótese de mero descumprimento contratual, incapaz de gerar ofensa aos direitos de
personalidade da parte. Mero dissabor e aborrecimento. Danos morais inocorrentes. SENTENÇA
MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO199.

RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. MERO DESCUMPRI-


MENTO CONTRATUAL. DANO MORAL INOCORRENTE. O autor pede provimento ao recurso,
para reformar a sentença que julgou parcialmente procedente a presente ação indenizatória. Má
execução dos serviços de fechamento de sacada com vidro temperado e instalação de box. Con-
figurada a hipótese de mero descumprimento contratual, incapaz de gerar ofensa aos direitos de
personalidade da parte. Mero dissabor e aborrecimento, decorrente da relação de consumo. Danos
morais inocorrentes. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO200.
197 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 78.
198 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. (Recurso Cível: 71004570958 RS, Relator: Fabiana Zilles,
Data de Julgamento: 12/08/2014, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia
13/08/2014). Disponível em <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/133711535/recurso-civel-71004570958-rs>.
Acesso em 08 ago. 2016.
199 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. (Recurso Cível: 71005858451 RS, Relator: José Ricardo de Bem Sanhu-
do, Data de Julgamento: 23/02/2016, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia
25/02/2016). Disponível em <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/308539984/recurso-civel-71005858451-rs>.
Acesso em 08 ago. 2016.
200 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. (Recurso Cível: 71005809769 RS, Relator: José Ricardo
de Bem Sanhudo, Data de Julgamento: 26/01/2016, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário
84 da Justiça do dia 28/01/2016). Disponível em <http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/301440470/recurso-civel-
Analisando o conteúdo exposto acima, percebe-se que o inadimplemento contratual já é, de
certa forma, previsto nas relações contratuais, portanto o seu mero descumprimento não gera dano
moral, mas sim meros dissabores que os indivíduos estão sujeitos na vida em sociedade. Para ul-
trapassar as barreiras do mero dissabor, é necessário que se atinja o íntimo da pessoa em um grau
de lesão que realmente importe ao Direito.

CONCLUSÃO
Os contratos podem ser entendidos como um acordo de vontade entre duas ou mais pessoas,
com o objetivo de criar, modificar ou extinguir direitos. Dentre seus princípios norteadores, a obriga-
toriedade imposta aos contratos destacou-se como o mais importante a ser analisado, afinal uma
vez que as partes convencionam as obrigações de um contrato de forma livre, mútua e consentida,
elas devem se obrigar a cumprir o que pactuaram.

Tal obrigatoriedade apresenta-se como uma força coercitiva imposta às partes contratantes,
sendo que o seu descumprimento gera o inadimplemento contratual, o qual ocorre quando uma
das partes contratantes deixa de cumprir com sua obrigação, lesando a outra parte, seja em danos
materiais e/ou morais.

Dentre os efeitos gerados pelo descumprimento contratual, puderam ser verificados a mora,
os juros, e a possibilidade de reparação por perdas e danos. A mora caracteriza-se pelo retarda-
mento culposo da obrigação, os juros representam os frutos civis produzidos pelo dinheiro, en-
quanto as perdas e danos são o equivalente - expresso em dinheiro - ao prejuízo suportado pelo
credor em virtude do devedor não ter cumprido sua obrigação. Quando este prejuízo for de cunho
patrimonial, será dano material, e quando atingir o íntimo do indivíduo, será dano moral.

Os danos existem pelo simples descumprimento contratual e estão previstos no próprio Có-
digo Civil, entretanto não será passível de reparação toda e qualquer situação desagradável, pois
há de se considerar um certo nível de tolerância por parte do ser humano. É necessário que o dano
ultrapasse a esfera daquilo que deixa de ser razoável.

Assim, foi possível verificar e concluir que há um entendimento doutrinário e jurisprudencial


consolidado acerca da inexistência de danos morais no inadimplemento contratual quando se tratar
de mero dissabor. Isto, pois, o mero dissabor não é suficiente para atingir o íntimo do indivíduo e
causar-lhe aflições injustas, pelo contrário, são situações corriqueiras as quais são previsíveis na
vida em sociedade.

-71005809769-rs>. Acesso em 08 ago. 2016. 85


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STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência.


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VENOSA, Silvio Salvo. Direito civil: Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. São
Paulo: Atlas, 2008.

MORAL DAMAGES DUE TO NONCOMPLIANCE OF CONTRACTS


RESUMO: This work aims to demonstrate the occurrence of moral damages incurred in noncompliance of contracts. To
do so, it will discourse about the general theory of contracts, inserted in our legal system, listing their main principles,
and in this topic, it will enter in obligation of contracts as law imposition. After, it will be approached the noncompliance
of contracts and its effects. In a next step, it will introduce the definition of moral damages, the possibility of repairing of
moral damages in scope of contractual relationship and demystifying mere displeasures. The method of presentation is
divided into topics and the content below provides an easy understanding of the subject.

PALAVRAS-CHAVE: Contract. Damage. Noncompliance.

87
DANO MORAL DECORRENTE DA LESÃO AOS DIREITOS
DA PERSONALIDADE: DIFICULDADE NA FIXAÇÃO DO
QUANTUM INDENIZATÓRIO

Danielle Regina de Lima Coelho


Graduada em Secretariado Executivo Trilíngue pela Universidade Estadual de Maringá. Acadêmica do Curso de Di-
reito do Centro Universitário Cesumar – UNICESUMAR, Maringá – PR. Bolsista PIBIC/Fundação Araucária. Bolsista
IC/UniCesumar. danielle@limacoelho.com

Valéria da Silva Galdino Cardin


Pós doutora em Direito pela Universidade de Lisboa. Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifí-
cia Universidade Católica de São Paulo. Professora da Universidade Estadual de Maringá e da UniCesumar – Centro
Universitário Cesumar. Advogada no Paraná. Endereço eletrônico: valeria@galdino.adv.br

RESUMO: Este trabalho tem por objetivo analisar a dificuldade acerca da fixação do quantum indenizatório na inci-
dência de dano moral decorrente da lesão aos direitos da personalidade. Para atingir tal objetivo, faz-se necessário
compreender a extensão dos direitos da personalidade, os quais encontram previsão constitucional, tais como a honra,
a dignidade, a intimidade, dentre outros. A dificuldade de sua compreensão e a carência de mecanismos de tutela aos
direitos da personalidade ensejou uma maior discussão doutrinária e jurisprudencial no âmbito do Direito Civil hodierno.
O Código Civil de 1916 já tratava do tema, entretanto somente com o Código Civil de 2002 houve a previsão expressa
de indenização pelos danos morais decorrentes da lesão aos direitos da personalidade, o que será amplamente abor-
dado nesta pesquisa. Apesar da previsão do tema em nosso ordenamento jurídico, não há qualquer norma constitu-
cional ou infraconstitucional que discipline a fixação do quantum indenizatório. Deve o critério de fixação ser prefixado
ou o juiz deve arbitrar de forma livre de acordo com o caso concreto? Para chegar a uma conclusão, serão analisadas
diversas obras, além de pesquisas jurisprudenciais a fim de se verificar qual o posicionamento dos Tribunais acerca
do tema.

PALAVRAS-CHAVE: Dano. Personalidade. Indenização.

INTRODUÇÃO
Viver em sociedade, principalmente no panorama atual de conflitos e divergências de opiniões,
pressupõe a obediência a determinadas regras, não apenas aquelas previstas no ordenamento ju-
rídico, mas também as de ordem moral. Espera-se que as pessoas ajam honestamente para que
não causem prejuízo aos demais. Entretanto, nem sempre isso ocorre e, ao causar prejuízo, está
se violando o direito de outrem.

Um dos propósitos do Direito é a proteção ao patrimônio, seja ele material ou moral. Na hipó-
tese de sua violação, ocorre um dano a alguém e, neste caso, o Direito deve entrar em ação para
buscar o método mais efetivo de reparação deste dano.

A reparação dos danos visa o retorno ao statu quo ante da coisa lesada, então caso um objeto
seja danificado, por exemplo, bastaria repará-lo ou substituí-lo por um novo. Por ser algo certo e
determinado, é possível mensurar o seu valor original e o valor dos danos sofridos. Nos casos de
ofensa à honra, à imagem, da perda de uma vida, trata-se de direitos da personalidade, os quais
são um direito imaterial, personalíssimo, sem possibilidade de reparação ou substituição.
88
Para hipóteses de danos aos direitos da personalidade, o que se busca é uma compensação
em pecúnia para, como o próprio nome já diz, compensar, aliviar ou amenizar o sofrimento causa-
do. Contudo, surge uma nova indagação, pois como quantificar este sofrimento? Existem critérios
objetivos para fixação do quantum indenizatório? Tais questionamentos são objeto desta pesquisa,
a qual contará com auxílio de consultas doutrinárias e jurisprudenciais atuais para encontrar uma
resposta.

1 BREVE HISTÓRICO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE


Os Direitos da Personalidade possuem uma história recente, ainda não muito explorada. Isto,
pois, ainda na Grécia não se falava em tutela aos direitos da personalidade, mas em direitos con-
forme a condição social. Sequer se reconhecia a figura da pessoa, o que se via eram as máscaras
utilizadas nos teatros como uma noção de pessoa. O que os gregos buscavam era o status, cada
pessoa tinha seus direitos norteados conforme sua posição social. Era preciso ser um guerreiro,
um líder, um grande herói, para que as pessoas fossem consideradas individualmente em sua sub-
jetividade201.

Segundo Washington de Barros Monteiro,


A palavra pessoa advém do latim persona, emprestada à linguagem teatral na anti-
guidade romana. Primitivamente significava máscara. Os atores adaptavam ao rosto
uma máscara, provida de disposição especial, destinada a dar eco às suas palavras.
Personare queria dizer, pois, ecoar, fazer ressoar. A máscara era uma persona, por-
que fazia ressoar a voz da pessoa202.

Com a chegada da Idade Média e o começo da era cristã, os pensamentos modernos come-
çam a se consolidar, os valores e direitos do ser humano passaram a ser vistos com maior atenção,
contribuindo para o início da contemporaneidade. Graças ao Cristianismo, o qual pregava que
Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, este homem seria naturalmente um ser humano
portador de personalidade e dotado de direitos e valores.

É nesta fase que se reconhece a dignidade da pessoa humana e dá-se início à tutela dos
direitos da personalidade.

Maria Helena Diniz entende que


Para a doutrina tradicional “pessoa” é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos
e obrigações, sendo sinônimo de sujeito de direito. Sujeito de direito é aquele que é
sujeito de um dever jurídico, de uma pretensão ou titularidade jurídica, que é o poder
de fazer valer, através de uma ação, o não cumprimento do dever jurídico, ou melhor,
o poder de intervir na produção da decisão judicial203.

O primeiro diploma a fazer constar previsões legais acerca dos direitos da personalidade foi

201 CAMPOS, Diogo Leite de. Lições de Direitos da Personalidade. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coim-
bra, vol. 57, p. 134, 1991.
202 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral. 39 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 61
203 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: 1. Teoria Geral do Direito Civil. 29. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p.
143-144, v. 1. 89
a Lei Romena, de 1895204. Em seguida, outros códigos passaram a tratar do assunto, tais como o
Código Alemão, de 1900, o Código Civil Suíço, de 1907 e o Código Italiano, de 1942, o qual tratou
com mais profundidade sobre o tema.

No Brasil, todas as constituições federais tutelavam os direitos da personalidade, inclusive a


Constituição Federal de 1988 que diz, em seu artigo 5º, inciso X, em rol meramente exemplificativo:
“são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”205. Mas foi com o
advento do atual Código Civil que o tema ganhou destaque e um capítulo exclusivo, compreenden-
do os artigos 11 a 21206.

Pode-se citar como exemplos de direitos da personalidade, o direito à vida, afinal todo ser
humano possui o direito indisponível à vida, sendo proibida a pena de morte. Ainda, o direito à li-
berdade, enquanto todos têm o direito de serem livres, de ir e vir livremente; o direito à integridade
física e psíquica, sendo proibidas a agressão física, a coação física e a coação mental; o direito de
autoria, sendo as criações intelectuais (obras literárias, científicas e artísticas) um direito indisponí-
vel do autor, excluído o aproveitamento industrial ou comercial.

Também merecem ser citados outros exemplos, tais como o direito à honra, devendo-se res-
peitar a fama, o caráter, a reputação que a pessoa possui frente aos demais indivíduos; o direito
à identidade pessoal, já que toda pessoa tem direito ao nome, o qual é composto pelo prenome e
pelo sobrenome; e o direito à privacidade, o qual compreende vários outros direitos, tais como o
direito à imagem, à vida privada, ao sigilo e à intimidade.

Percebe-se que o rol de direitos da personalidade é meramente exemplificativo, não exaus-


tivo, além das diversas possibilidades de desdobramentos que um mesmo direito pode abranger.
Claramente são embasados sob o princípio da dignidade da pessoa humana, princípio este consi-
derado como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988.

Prova disto pode ser encontrada no Enunciado 274 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho
de Justiça Federal, o qual diz:

Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são ex-
pressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, inc. III, da Constituição
(princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode
sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação207.

Para Ingo Wolfgang Sarlet, pode-se compreender a dignidade da pessoa humana como
[...] a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando,
neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a
pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como
venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável,
além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos

204 FRANÇA, Limongi Rubens. Institutos de proteção à personalidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 57, n. 391, p. 22,
mai. 1968.
205 BRASIL. Constituição, 1988.
206 BRASIL. Código Civil. 2002.
207 BRASIL. Conselho de Justiça Federal. Disponível em <http://daleth.cjf.jus.br/revista/enunciados/IVJornada.pdf >. Acesso em
90 05 abr. 2016.
da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos208.

Resta claro o entendimento acerca da não taxatividade dos direitos da personalidade no or-
denamento jurídico pátrio, conferindo a tais direitos uma superioridade normativa em busca da
efetividade da tutela da dignidade humana.

2 DAS CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS DA PERSONALI-


DADE
Analisando brevemente o surgimento histórico dos direitos da personalidade, percebe-se que
foi necessário primeiro reconhecer o ser humano enquanto pessoa para então se falar em perso-
nalidade e, em consequência, em direitos da personalidade.

Para o ordenamento jurídico, pessoa é um ente suscetível de direitos e obrigações que, ao


nascer com vida, já adquire personalidade. Esta, por sua vez, é uma qualidade intrínseca de todo
ser humano, um atributo que confere direitos à pessoa.

O significado da palavra “personalidade” pode ser encontrado no próprio dicionário: “quali-


dade de pessoa; caráter essencial e exclusivo de uma pessoa; aptidão reconhecida pela ordem
jurídica a alguém para exercer direitos e contrair obrigações”209.

Para Pontes de Miranda210, a personalidade não é um direito do ser humano, mas uma quali-
dade que lhe confere direitos.

Independente de vontade ou de qualquer requisito, a personalidade nasce com a pessoa, é


inerente a ela. É o que reforça os ensinamentos de Caio Mário da Silva Pereira, ainda que a pessoa
não tenha consciência dos fatos, simplesmente por existir ela é dotada de personalidade211.

Desta forma, diante de tamanha importância, o ordenamento jurídico tutela os direitos da per-
sonalidade, direitos estes que são inatos, essenciais ao ser humano desde a sua concepção até
a sua morte e, sem tais direitos, a pessoa não atinge a sua plenitude de sobrevivência, conforme
Flávio Tartuce212.

Os direitos da personalidade são subjetivos e compreendem a proteção à integridade física,


tais como a vida, alimentos e o corpo, à integridade intelectual, tais como a liberdade de pensamen-
to, autoria artística, dentre outros, e à integridade moral, tais como a honra, o nome, a imagem, o
segredo profissional.

Para Maria Helena Diniz213, os direitos da personalidade são direitos subjetivos da pessoa
para defender aquilo que lhe é inerente: integridade física, intelectual e moral.

208 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 60.
209 MICHAELIS, Dicionário. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portu-
gues-portugues&palavra=personalidade>. Acesso em: 02 fev. 2016.
210 MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1974, Tomo III, p. 216.
211 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Contratos. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 142, v. 3.
212 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 2. ed. São Paulo: Método, 2012, p. 87.
213 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Responsabilidade Civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 135. 91
Na definição de Rubens Limongi França, “os direitos da personalidade são as faculdades
jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim da sua pro-
jeção essencial no mundo exterior”214.

Portanto, pode-se dizer que os direitos da personalidade são aqueles direitos fundamentais
inerentes à própria pessoa, direitos estes que decorrem da natureza do ser humano, sem os quais
não seria possível ter uma vida digna.

Ressalta-se que os direitos da personalidade são absolutos, uma vez que o titular do direito
poderá protegê-lo de quem quer que seja, ou seja, são direitos oponíveis erga omnes, impondo-se
à coletividade o dever de respeitá-los. São, ainda, vitalícios os direitos da personalidade, pois nas-
cem e morrem com a pessoa215.

Além disso, como já mencionado, os direitos da personalidade são inatos, pois, ao contrário
de outros direitos que o ser humano adquire em determinado momento, eles são inerentes a todo
e qualquer ser humano.

Os direitos da personalidade no Código Civil encontram-se dispostos em capítulo próprio “Ca-


pítulo II - Dos Direitos da Personalidade”216, cujo objetivo é a efetiva proteção do indivíduo.

Os artigos 11 a 21 do Código Civil apresentam hipóteses não taxativas de direitos da persona-


lidade “de forma que, estabelecendo a proteção da matéria através de enunciados gerais, englobou
todos os direitos da personalidade”217. Exemplificativos, pois não são apenas os direitos elencados
nos referidos artigos que tratam da tutela da personalidade.

De acordo com o texto legal, assim como nas lições de Pontes de Miranda218, os direitos da
personalidade são intransmissíveis, irrenunciáveis, imprescritíveis e inalienáveis, ou seja, ainda
que o indivíduo tenha vontade de renunciar a algum direito da personalidade, isto não é permitido
devido ao seu caráter vitalício.

Para Edilson Pereira Nobre,


Os direitos da personalidade notabilizam-se por serem: a) de natureza extrapatri-
monial, embora o seu maltrato possa implicar reflexos econômicos; b) direitos ab-
solutos, com eficácia erga omnes, pois o seu respeito é imposto a todos (Estado e
particulares); c) irrenunciáveis, não podendo o seu titular deles abdicar; d) intrans-
missíveis, restando inválida a sua cessão a outrem, mediante ato gratuito ou onero-
so; e) imprescritíveis, uma vez que o transcurso do tempo, sem o seu uso pelo titular,
não lhe acarreta a extinção.219

Atenção especial merece o art. 12, o qual diz: “pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão,
a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas
214 FRANÇA, Rubens Limongi. Instituições de Direito Civil. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 1033.
215 FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil – Teoria geral. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 105.
216 BRASIL. Código Civil. 2002.
217 ELESBÃO, Elsita Collor. Os direitos da personalidade no novo Código Civil brasileiro. CASTRO, Adriana Mendes Oliveira
de. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 16.
218 MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1974, Tomo III, p. 216.
219 NOBRE, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio da dignidade da pessoa humana. Revista de Informação Legislati-
va. Brasília, n. 145, p. 191, jan./mar. 2000.

92
em lei”220. Isto significa que primeiro deve-se tentar impedir que o dano ocorra através de medidas
preventivas para somente depois efetivar medidas repressivas para reparação do dano ocorrido.

Portanto, é possível verificar que o ordenamento jurídico disponibiliza meios para que se bus-
que a cessação da ameaça ou lesão, mas caso isso não ocorra, o sujeito que sofreu o dano terá
direito à indenização do prejuízo sofrido.

O objetivo principal da reparação do dano é que a coisa retorne ao statu quo ante, porém nos
direitos da personalidade, devido à sua natureza extrapatrimonial, isto não seria possível, sendo,
portanto, necessário que a indenização ocorra em forma de pecúnia, invocando-se a reparação por
dano moral.

Para Cristiano Chaves de Farias,


É certo e incontroverso que a honra, a privacidade e demais bens jurídicos da
personalidade de uma pessoa não comportam avaliação pecuniária. Não são
susceptíveis de aferição monetária. Entretanto, uma vez violados tais bens jurídicos,
independentemente de causar prejuízo material, surge a necessidade de reparação
do dano moral caracterizado, como forma de diminuir o prejuízo da vítima e
sancionar o lesante, inclusive com o caráter educativo (preventivo) de impedir novos
atentados221.

Desta maneira, adentra-se ao estudo do dano moral para compreender os critérios utilizados
na fixação do quantum indenizatório.

3 DANO MORAL E O ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL


ACERCA DA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO
O dano moral ocorre quando o ato de determinado indivíduo causa dor profunda no bem estar
psíquico de outra pessoa222. É a lesão extrapatrimonial ao direito da personalidade, um sentimento
de aflição injusta ao ser humano que fere sua dignidade.

Está previsto na Constituição Federal de 1988, conforme o art. 5º, inciso X: “são invioláveis
a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização
pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”223.

Diz ainda o Código Civil, em seu artigo 186, que “aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,
comete ato ilícito”224.

Portanto, percebe-se que a previsão de reparação do dano moral está relacionada ao come-
timento de um ato ilícito. E conforme preleciona Maria Helena Diniz,

220 BRASIL. Código Civil. 2002.


221 FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito civil – Teoria geral. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 106.
222 SANTOS, Antonio Jeová. Dano Moral Indenizável. 5. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2015. p. 63.
223 BRASIL. Constituição. 1988.
224 BRASIL. Código Civil. 2002.

93
O ato ilícito é praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo
individual. Causa dano patrimonial ou moral a outrem, criando o dever de repará-lo
(Súmula nº 37, STJ). Logo, produz efeito jurídico, só que este não é desejado pelo
agende, mas imposto pela lei. Para que se configure o ato ilícito, será imprescindí-
vel que haja: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência; b) ocorrência de dano patrimonial ou moral,
sendo que pela Súmula nº 27 do STJ serão cumuláveis as indenizações por dano
material e moral decorrentes do mesmo fato; c) nexo de causalidade entre o dano e
o comportamento do agente. A obrigação de indenizar é a consequência jurídica do
ato ilícito, sendo que a atualização monetária incidirá sobre essa dívida a partir da
data do ilícito (Súmula nº 43 do STJ).225

Ato contínuo, Américo Luiz Martins menciona que:


(...) a bem da verdade, alerta e corrige Eduardo Zannoni que o dano moral não é a
dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a
vítima do evento danoso, pois esses estados de espírito constituem a consequência
do dano. O Direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles
que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima teria
interesse reconhecido juridicamente. Os lesados indiretos e a vítima poderão recla-
mar a reparação em razão de dano moral, embora não peçam um preço para a dor
que sentem, mas tão somente, que lhes outorguem um meio de atenuar, em parte,
as consequências da lesão jurídica por eles sofrida. Por isso se diz que o dano moral
direto consiste na lesão a um interesse que visa à satisfação de um bem extrapatri-
monial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal,
a liberdade, a honra, a intimidade, o decoro, a imagem) ou nos atributos da pessoa
(como o nome, a capacidade, o estado de família). E o dano moral indireto consiste,
por sua vez, na lesão a um interesse tendente à satisfação de bens jurídicos patri-
moniais, que produz depreciação a um bem extrapatrimonial (por exemplo, a perda
de coisa com valor afetivo) 226.

Para Pablo Stolze, a reparação do dano traz um equilíbrio às partes, objetivando o retorno ao
estado anterior da coisa lesada. Contudo, quanto aos direitos da personalidade, por se tratarem de
algo abstrato, imaterial, a reparação não alcança o retorno ao statu quo ante, ela apenas procura
compensar e amenizar a lesão sofrida227.

Maria Helena Diniz afirma que, em regra, essa reparação ocorre sob a forma de pecúnia como
forma de compensação dos sentimentos negativos228.

Contudo, ainda há um grande questionamento sobre a valoração do dano moral e a dificulda-


de na fixação do quantum indenizatório, pois não existem normas específicas acerca do assunto,
inexiste um tabelamento a seguir de parâmetro nos julgamentos.

Em se tratando de reparação por um dano moral, não há como se mensurar quantitativamente


a extensão do dano, justamente porque não é possível avaliar objetivamente o valor da dor, da afli-
ção, da angústia, então é preciso que a indenização seja arbitrada de forma a amenizar os efeitos
do dano causado ao sujeito.

225 FIUZA, Ricardo; DINIZ, Maria Helena; SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al. Novo código civil comentado. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 184.
226 SILVA, Américo Luís Martins da. O dano moral e sua reparação civil.1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 59.
227 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. Resp. Civil. Ed. Saraiva, 2011, p.47.
228 DINIZ, Maria Helena. A Responsabilidade Civil por Dano Moral. São Paulo: Revista Literária de Direito, 1996.

94
O Superior Tribunal de Justiça entende que o dano moral serve de “recompensa à vítima de
sequelas que carregará ao longo de toda a sua vida e efeito pedagógico ao causador do dano” 229.

Desta forma, o magistrado deve agir com extrema prudência na estipulação do quantum de-
beatur de acordo com cada caso concreto, utilizando-se de alguns métodos para auxiliar a traçar
um determinado valor para a indenização pecuniária, quais sejam: ouvir as partes, analisar as pro-
vas minuciosamente e verificar a condição socioeconômica das partes. Neste ponto, deve-se evitar
o enriquecimento ilícito daquele que receberá a indenização, mas, ao mesmo tempo, ela não deve
ser ínfima a ponto de não apresentar impacto naquele que causou o dano, o que o levaria possivel-
mente a cometer novas lesões.

É nesse sentido que Maria Helena Diniz preleciona:


Na reparação do dano moral, o magistrado deverá apelar para o que lhe parecer
equitativo ou justo, agindo sempre com um prudente arbítrio, ouvindo as razões das
partes, verificando os elementos probatórios, fixando moderadamente uma indeni-
zação. O valor do dano moral deve ser estabelecido com base em parâmetros ra-
zoáveis, não podendo ensejar uma fonte de enriquecimento, nem mesmo simplório
ou simbólico. A reparação deve ser justa e digna. Portanto, ao fixar o quantum da
indenização o juiz não procederá a seu bel prazer, mas como um homem de respon-
sabilidade, examinando as circunstâncias de cada caso, decidindo com fundamento
e moderação.

Neste sentido, ainda, o Desembargador Fernando Carioni decidiu:

A indenização por danos morais deve ser fixada com ponderação, levando-se em conta o aba-
lo experimentado, o ato que o gerou e a situação econômica do lesado; não pode ser exorbitante,
a ponto de gerar enriquecimento, nem irrisória, dando azo à reincidência230.

Corrobora o julgado do Desembargador Luiz Carlos Freyesleben, o qual cita que o valor da
indenização deve servir para amenizar a dor psíquica causada ao lesado e, também, deve apresen-
tar um caráter pedagógico ao infrator, reprimindo-o de comer novas lesões231.

Carlos Alberto Bittar afirma que o juiz deve fixar os danos morais de acordo com o caso con-
creto com prudência e equilíbrio232. E é o que se percebe no Recurso Especial 1171680/PB:

Em relação à indenização por danos morais tem-se insubsistente a sua condenação no caso
presente, uma vez que o dano moral tem por objetivo reparar lesão a tributo da personalidade,
qualificado pela noção de dor, sofrimento psíquico, imagem, reputação e etc., não podendo se
estender à coletividade em geral pela indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da
ofensa objeto de reparação233.
229 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp: 1189465 SC 2010/0068468-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de
Julgamento: 26/10/2010, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/11/2010. Disponível em <http://stj.jusbrasil.com.br/
jurisprudencia/17359886/recurso-especial-resp-1189465-sc-2010-0068468-4>. Acesso em 08 set. 2015.
230 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível de Porto Belo, rel. Des. Fernando Carioni, Terceira Câ-
mara de Direito Civil, j. 20.04.2009. disponível em <http://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18223210/apelacao-civel-ac-
-751771-sc-2009075177-1/inteiro-teor-18223211>. Acesso em 22 fev. 2016.
231 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível de Criciúma, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, Segunda
Câmara de Direito Civil, j. 15.03.2007. Disponível em <http://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19850380/apelacao-civel-ac-
-181098-sc-2011018109-8/inteiro-teor-19921835>. Acesso em 22 fev. 2016.
232 BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 92.
233 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1171680/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado
em 19/10/2010, DJe 23/11/2010. Disponível em <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/17696572/recurso-especial-resp- 95
Acerca do tema, Teresa Ancona Lopes de Magalhães assevera que

A ofensa derivada de lesão a um direito da personalidade não pode ficar impune


e, dentro do campo da responsabilidade civil, a sua reparação tem que ser a mais
integral possível para que, caso não possam as coisas voltar ao estado em que se
encontravam antes, tenha a vítima do dano, pelo menos alguma satisfação ou com-
pensação e, dessa forma, possa ver minorado o seu padecimento234.

Ao estipular a fixação do quantum, é necessário que o magistrado atente-se aos princípios da


proporcionalidade e razoabilidade, para que demonstre em sua decisão uma motivação lógica que
o levou àquele valor, permitindo uma maior segurança jurídica. Senão, veja o presente julgado do
TJ-MG:

Quanto ao valor da indenização por dano moral, ressalte-se que o Juiz deve levar em consi-
deração, quando do arbitramento, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, além do
caráter pedagógico da condenação, no sentido de inibir eventuais e futuros atos danosos. O valor
da indenização deve ser condizente com as circunstâncias do caso e com os parâmetros desse
Tribunal. Assim, a condenação não deve ser aquém, de forma que não sirva de repreensão para
quem tem o dever de pagá-la, nem além, que possa proporcionar o enriquecimento sem causa de
quem recebe a indenização235.

Verifica-se, assim, que não há um critério objetivo a ser seguido na fixação do quantum de-
beatur em ações de reparação de danos morais, cabe aos julgadores estabelecerem a reparação
competente a seu livre arbítrio. É o que confirma Christino Almeida do Valle:

Prevalece o livre arbítrio do magistrado, conforme a doutrina e a jurisprudência. Ele fixa a


pena, com o seu critério subjetivo quando se trata de direito penal, como de resto, estabelece o
quantum indenizatório na condenação dos danos ressarcitórios de ordem patrimonial. Aí é impor-
tante e vasto o critério do magistrado, porque ele leva em conta a equidade e as circunstâncias que
rodeiam cada caso e quantia a ser fixada deve corresponder à lesão, mas não equivalente por ser
isso impossível236.

Em que pese o magistrado fazer-se valer do seu livre arbítrio na fixação do quantum indeniza-
tório, essa prerrogativa não pode ser utilizada de forma irrestrita, sem critérios ou limites. A decisão
deve ser fundamentada na condição social do indivíduo que sofreu o dano, na gravidade da ofensa,
na repercussão social do dano e, também, na capacidade solvendi do agente causador.

É o que decidiu o Relator Nelson Schaefer Martins em Apelação Cível, conforme segue:
O valor do quantum indenizatório deve atender aos critérios de razoabilidade e pro-
porcionalidade e entrelaçar-se com a situação econômica daquele que causou o
dano material e moral puro, o juiz deve atentar para os motivos, as circunstâncias e
as consequências da ofensa, bem assim para a situação de fato e o grau de culpa
com que agiu o ofensor. Nessas circunstâncias, define-se o valor da compensação

-1171680-pb-2009-0238330-0>. Acesso em 22 fev. 2016.


234 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez de. O Dano Estético. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1980.
235 BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Cível: 10024061994596001 MG, Relator: Márcia De Paoli Balbino,
Data de Julgamento: 21/02/2013, Câmaras Cíveis Isoladas / 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 04/03/2013. Disponível em
<http://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/114780297/apelacao-civel-ac-10024061994596001-mg>. Acesso em 19 set. 2015.
236 VALLE, Christino Almeida do. Dano moral: doutrina, modelos e jurisprudência. Rio de Janeiro: AIDE, 1996, p. 22.
96
em consonância com a proporcionalidade e equivalência ao dano sofrido. Ao mesmo
tempo em que se impõe ao ofensor uma sanção, aplica-se pena de caráter pedagó-
gico que iniba a reiteração da mesma prática lesiva237.

É certo que no ordenamento jurídico pátrio não existem previsões acerca do quantum inde-
nizatório a ser estabelecido nas sentenças por danos morais decorrentes da lesão aos direitos da
personalidade, o que impõe ao Poder Judiciário a tarefa de fixar, de forma proporcional e razoável,
o quantum indenizatório que amenize a dor do lesado e leve em consideração as situações fático-
-probatórias de cada caso concreto.

CONCLUSÃO
A história recente do direito reconhece e confere uma maior tutela aos direitos da persona-
lidade, os quais podem ser entendidos como a proteção aos direitos intrínsecos e inatos do ser
humano, tais como o direito à vida, à honra, ao nome, à liberdade, dentre outros.

Quando o indivíduo tem algum direito da personalidade lesado, surge ao infrator o dever de
reparar o dano causado, dano este que, devido à sua natureza extrapatrimonial, não pode ser
mensurado. Desta forma, enseja-se uma adequada mensuração da indenização, a qual ocorrerá
na forma de pecúnia, pois ela se apresenta como uma maneira de amenizar o sofrimento da vítima.

É cediço o entendimento da busca por uma indenização justa e próxima da realidade dos
fatos, na busca do resgate da dignidade. Quando se trata do dano material, basta quantificar o
prejuízo ocorrido no patrimônio do lesado. Entretanto, o mesmo não ocorre no dano moral, o qual
não se mede monetariamente.

Assim, foi possível verificar que ainda não há consenso sobre os critérios de fixação do quan-
tum indenizatório. O que se percebe é que não há critérios objetivos, mas que subjetivamente se
pode tentar chegar a um valor justo.

Estes critérios, pautados na análise do caso concreto, da condição social da vítima, da gra-
vidade do dano e da capacidade solvendo do infrator, auxiliarão o julgador no estabelecimento do
quantum indenizatório, sempre restrito aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Restou claro, ainda, que os magistrados concordam com o entendimento doutrinário a respei-
to da finalidade da reparação por danos morais, qual seja o seu duplo caráter: compensatório para
a vítima e punitivo para o ofensor, uma vez que se busca um alívio ao sofrimento do lesado e uma
sanção ao ofensor.

237 TJ-SC - AC: 692257 SC 2009.069225-7, Relator: Nelson Schaefer Martins, Data de Julgamento: 27/08/2010, Segunda
Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível n. , da Capital / Estreito. Disponível em <http://tj-sc.jusbrasil.com.br/
jurisprudencia/18297918/apelacao-civel-ac-692257-sc-2009069225-7>. Acesso em: 05 dez. 2016. 97
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______, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Responsabilidade Civil. 19 ed. São Paulo:
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VALLE, Christino Almeida do. Dano moral: doutrina, modelos e jurisprudência. Rio de Janeiro: AIDE, 1996.

98
MORAL DAMAGES DUE TO PERSONALITY RIGHTS INJURY: DIFFICULTY IN
FIXING THE REPARATION QUANTUM

RESUMO: This work aims to analyze the difficulty concerning the fixing of the quantum in the incidence of moral dam-
age resulting from injury of personality rights. To reach this purpose, it is necessary to understand the extent of personal
rights, which are forecast in Federal Constitution, such as honor, dignity, privacy and others. The difficulty of under-
standing and the lack of protection mechanisms of personality rights gave rise to a greater doctrinal and jurisprudential
discussion within the actual Civil Law. The 1916 Civil Code had already dealt with the subject, but only with 2002 Civil
Code there was an express forecast for moral damages resulting from injury of personality rights, which will be widely
covered in this study. Despite the theme being in Brazilian legal system, there is no constitutional or infra-constitutional
law that establishes the quantum of the reparation. Should the criteria be prefixed or should the judge arbitrate freely
according to the case? To get to a conclusion, it will be analyzed many literature, besides of commom law research, so
it will be possible to verify the position of Tribunals.

PALAVRAS-CHAVE: Damage. Personality. Reparation.

99
DA ALIENAÇÃO PARENTAL: ASPECTOS JURÍDICOS E
PSICOLÓGICOS

Leticia Carla Baptista Rosa


Doutoranda em Função Social do Direito pela FADISP. Mestre em Direito pelo Centro Universitário Cesumar. Docente
do ICETI da UniCesumar. Professora da Graduação em Direito da Faculdade Metropolitana de Maringá. Endereço
eletrônico: profleticiarosa@gmail.com

Maria Clara de Souza Crefaldi Barbosa.


Graduada em Direito pelo Centro Universitário Cesumar. Pós-graduanda em Direito Civil, Processo Civil e Direito do
Trabalho pelo Centro Universitário Cesumar. Endereço eletrônico: mcrefaldi@yahoo.com

RESUMO: A alienação parental irá ocorrer com a dissolução da família e quando um dos genitores agirem em deso-
bediência da lei, no sentido de criar falsas ideias sobre ooutro genitor a fim de afastar a criança e o adolescente do
mesmo e nesta condição pode ser o pai a mãe irmãos, avós tios etc e isto são dolorosas porque é ato praticado por
quem o adolescente sente amor. Destarte ocorrerá a síndrome da alienação parental, pois a forma tentada de afas-
tamento se consumará e o menor de fato ficará distante do genitor fazendo com que o amor que a criança sente pelo
seu genitor seja diminuído. Entretanto ocasionaram na criança e no adolescente diversos tipos de traumas, bem como
problemas psicológicos conjuntamente com, medo, raiva, tristeza enfim a criança rejeitara o genitor e com isso irá ocor-
rer o afastamento, portanto, o genitor alienador não se importa com o que irá ocasionar durante toda a vida da criança
e do adolescente. Nossa legislação Brasileira proíbe a pratica da alienação parental e age como forma de proteger
os interesses da criança e do adolescente punindo quem pratica tal ato, cuida do melhor interesse da criança e do
adolescente trazendo o mesmo para uma zona de conforto e de direito garantido perante a sociedade e com relações
firmes e prazerosas com seus genitores.A alienação parental por sua vez é uma prática utilizada pelos pais no ato da
separação e que deve ser acabada, pois, de certa forma isso acaba afetando a vida toda da criança e do adolescente.

PALAVRAS-CHAVE: Alienação Parental, Criança; Família.

INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre aspectos jurídicos e psicológicos causados pela alienação
parental, demonstrando como a alienação parental ocorre nas famílias e qual a conseqüência desta
para a criança e o adolescente.

Entretanto, almeja abordar assuntos diversos relacionados à família e apontar que em sua
estrutura antigamente era a figura patriarcal que vigorava, então, o pai como sendo o provedor da
família e neste caso a mãe é que ficava em casa cuidando dos filhos.

Com o passar dos tempos à sociedade se desenvolveu e a figura da mulher não foi mais
considerada extremamente frágil, esta então foi equiparando-se ao homem em direitos e deveres.

Com esta situação surgiram acontecimentos na vida das pessoas como, por exemplo, a se-
paração entre os cônjuges causando problemáticas como a alienação parental que por sua vez se
concretiza devido o fim da relação que é marcada por ódio, vingança para fazer com que ocorra a
separação entre o alienado e a criança e o adolescente.

100
Observa-se diante desta situação que a alienação parental causa um problema psicológico
em que o alienante se utiliza da prática de desconstituição da figura do alienado e coloca de forma
mentirosa falsas memórias em face do menor, fazendo que estas práticas que estão sendo utiliza-
das pareçam verdades e conseqüentemente colocam o menor contra o genitor que é atualmente
responsável por ele, tirando-lhe do mesmo o interesse de conviver com o seu responsável.

Contudo, este trabalho vem demonstrar que com esta prática reiterada da população se faz
necessária à intervenção do estado que tem como objetivo de reduzir e até mesmo que não ocorra
isto, pois, com a alienação parental prejudica a saúde mental da criança, também afeta o seu de-
senvolvimento afetivo psicológico em relação ao outro, bem como poderá trazer sérios transtornos
psicológicos durante toda a vida.

Neste sentido, este estudo apresenta sobre a proteção da criança e do adolescente frente
a esta problematização, bem como abordar o papel da criança e do adolescente na família atual,
tendo um comparativo com a família na era da antiguidade na contemporaneidade e pós- moder-
nidade.

Ademais explora a evolução no poder de família e expõe os aspectos e a prática da alienação


parental, que enseja a síndrome da alienação parental.

Por fim, o presente estudo se dará por consultas bibliográficas que terão como partida pes-
quisas em livros bem como artigos científicos, teorias, leis gerais, e consultas em sites específicos.

1 DESENVOLVIMENTO

2 DA PROTEÇÃO A CRIANÇA E ADOLESCENTE

2.1 PRINCÍPIOS DE PROTEÇÃO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

Vale ressaltar que surge um princípio recente como sendo o principio da Proeminência do
Interesse do Menor em relação ao dos pais. Este é utilizado em declarações internacionais que
se trata em relação dos direitos dos menores sendo que visa presumir o abuso parental contra o
menor.238

Anteriormente, a criança não recebia proteção como nos dias de hoje, e isso se deve a nossa
constituição federal que nos coloca frente a esta para que seja acolhida pelo estado e pela família,
por consequência isto deve ser de forma inalterada, destarte como nos coloca a constituição fede-
ral.

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente

238 PONTIFÍCIO, Conselho para a família. Léxico da família: Francesco D’Agostino. Termos ambíguos e contro-
versos sobre família, vida e aspectos éticos. 2010. p 381. 101
e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao la-
zer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.239

A vista disso percebe-se que a criança tem proteção íntegra não só do Estado, mas também
da família em si e da coletividade em que esta posta, logo, a criança e o adolescente devem ter
proteção de maneira semelhante no sentido que de hipótese nenhuma poderá haver diferenciação
entre as mesmas, significa que seus direitos devem ser totalmente respeitados e que não poderá
ocorrer violação. Diante disso, fica evidente que a família deve preservar a criança e o adolescente
na acepção que a preservação do seu desenvolvimento seja física e mental seja completo, isso
porque a criança e o adolescente são vulneráveis e necessita de amparo até que haja evolução
repleta de sua essência.240

Dessa forma, analisa-se que antigamente o maior poder era do pai sobre os filhos, agora nos
dias atuais esta obrigação de cuidado dentre outras atribuições para com a acriança se estende
para a mãe também, entretanto cabe aos dois pais e mãe a responsabilidade sobre a evolução e
cuidado para com os filhos.241

Assim sendo, existe uma prioridade em relação à criança e o adolescente, que a proteção
destes deve ser de modo completo, íntegro visto que esta se encontra no Estatuto da Criança e do
Adolescente 242.

Nos dias atuais mudanças significativas ocorreram em relação aos direitos dos pequenos,
pois, neste aspecto de proteção se destaca o melhor interesse da criança, consequentemente, a
criança e o adolescente se encontram em pleno desenvolvimento abarcado de necessidades que
antes não era visto com prioridade, não tinha vez, nem era um ser visto como sujeito de direitos.243
Veja-se:
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente representa importante
mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais, em que o filho deixa de ser
considerado objeto para ser alcançado a sujeito de direito, ou seja, a pessoa humana
merecedora de tutela do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade compa-
rativamente aos integrantes da família de que ele participa.244

Importante ressaltar que o melhor interesse da criança coloca a mesma em primeiro plano
frente diversa situações familiar, como por exemplo, um litigio de guarda ou até mesmo alimentos.
Este princípio contribui para que estas sejam tratadas com dignidade, justiça, igualdade protegendo
e defendendo a criança e o adolescente perante a sociedade e que dessa forma venha a ter um
desenvolvimento completo amparado pelo poder judiciário bem como proteção familiar e social.245
239 Brasil, Constituição Federal, São Paulo, 2014, p 59.
240 TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2009, p.141.
241 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 4. ed . São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.48.
242 Art.1 Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
243 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito Civil: Famílias.5.ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p.70.
244 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da.Princípios constitucionais de direito de família. São Paulo: Atlas,
2008, p.81.
102 245 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 4. ed . São
Veja-se o que preceitua os artigos 3° e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art 3° a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes á pessoa


humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se lhes, por lei ou por
outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condição de liberdade e de dignidade.246

Art 4º é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegu-


rar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes á vida, á saúde, á alimentação á
educação, ao esporte, ao lazer, á profissionalização, á cultura, á dignidade, ao respeito, á liberdade
e á convivência familiar e comunitária.247

Não obstante, a análise destes artigos sobreavisa que a criança e o adolescente dispõem de
viabilidades de progresso, que a evolução das mesmas devem ser constante e por completo, e
seus responsáveis proporcionar condição de atender as necessidades vigentes destes bem como
permitir que os mesmo venha a usufruir da liberdade e dignidade que lhe é conferida.

2.2 DO PAPEL DA CRIANÇA E ADOLESCENTE NA FAMÍLIA ATUAL E A


EVOLUÇÃO DO PODER FAMILIAR

A criança e o adolescente possuem papel importante na família, não somente por conta das
conquistas referentes aos direitos adquiridos, mas considerados como parte da família, dignos de
proteção e amparo que contribuem para a formação da sociedade bem como a modificação e trans-
formação cultural da sociedade.248

Já citado anteriormente sabe-se que somente o pai era considerado chefe da família sendo
possuidor de mando parental, era aquele quem amparava e sustentava a família e que nos dias
vigentes divide essa função com a mãe que agora também possui soberania e poder de mando
no sentido de contribuir para a alimentação, enfim, para o apoio de crescimento de toda família. 249

Desde os tempos antigos, pode-se analisar que as transformações surgiram para o melhor
da criança e do adolescente, contudo o papel dos membros da família mudou e contribuiu em todo
o processo de crescimento familiar, pois, antes a responsabilidade versavam somente com uma
pessoa, os direitos e deveres eram essenciais e próprios da figura paterna, este não tinha chance
de repartir as responsabilidades, devido a cultura social, a sua posição era mesmo de autoridade,
e hoje esta atribuição é conferida as duaspartesa figura paterna e materna, assim eles agem em
responsabilidade conjunta, as obrigações perante a criança e o adolescente passaram a ser dua-
lista, agem de forma similar.250

Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.74.


246 BRASIL. Lei n° 8.069, de 13 de Julho de 1990. Diário Oficial {da} República Federativa do Brasil, Brasilia DF, 13
Jul.1990. Disponível em :http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069Compilado.htm. Acesso em:12jul.2016.
247 BRASIL. Lei n° 8.069, de 13 de Julho de 1990. Diário Oficial {da} República Federativa do Brasil, Brasilia DF, 13
Jul.1990. Disponível em :http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069Compilado.htm. Acesso em:12jul.2016.
248 CUNHA, Rodrigo Pereira da.Direito de família: uma abordagem psicanalítica. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense
2012, p.70
249 DIAS, Berenice Maria. Manual de direito das famílias.9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p.40
250 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito Civil: Famílias.5. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 17-18 103
Com esta nova forma de família permite que a sociedade tenha uma base para toda formação
pessoal, pois, com essa divisão de papeis entre o homem e a mulher possibilita que a criança e o
adolescente tenha a proteçãonão só destes mais do Estado e da sociedade em geral.Pode-se per-
ceber que em nossa Constituição Federal é considerado criança aqueles de 0 a 12 anos e aqueles
conceituados adolescentes são com idade de 12 e 18 anos. Contudo, fica evidente que o papel da
família é relevante e que sempre valoroso no entendimento que esta proporciona proteção no de-
senvolvimento da criança e do adolescente e que para que ocorra o seu desenvolvimento completo
esta deve ser abarcada de amor, compreensão, e ter um ambiente que proporcione autoconfiança
bem como garantia de princípios morais materiais. 251

Interessante é o apontamento de Luciano Alves Rossato sobre a importância dos laços fami-
liares:
O direito à convivência familiar tem fundamento na necessidade de proteção a crian-
ças e adolescentes como pessoas em desenvolvimento, e que imprescindem de
valores éticos, morais e cívicos, para complementarem a sua jornada em busca da
vida adulta. Os laços familiares têm o condão de manter crianças e adolescentes
amparados emocionalmente, para que possam livre e felizmente trilhar o caminho da
estruturação de sua personalidade.252

Por fim, o autor revela que o poder familiar sustenta e dá suporte para a formação da per-
sonalidade da criança e do adolescente e que o seu desenvolvimento moral e pessoal bem como
valores que são levados para a vida toda depende especificamente do amor, do dever do compro-
metimento e da dedicação de seus protetores, os pais, estes que estão na condição de garantidor
da criança e do adolescente.253

3 DOS ASPECTOS JURÍDICOS E PSICOLÓGICOS DA ALIENA-


ÇÃO PARENTAL

3.1 DO CONCEITO E DA PRÁTICA DA ALIENAÇÃO PARENTAL

A alienação parental sobrevém no ano de 1985 com o psiquiatra Richard Gardner, os estu-
dos feitos deste analista denotam que a alienação constitui-se de lavagem cerebral profunda que
abrange a consciência o subconsciente e o inconsciente que atinge os pais e a alienação da criança
e do adolescente, contudo, essa prática utilizada pelos genitores afeta dentro do ser da criança.254

É caracterizada a alienação parental no momento e circunstâncias em que um dos genitores


predispõe de maneira incentivadora a criança ou o adolescente a desaceitar o outro progenitor,
nesta condição pode ser o praticante o pai ou a mãe, que tenta incansavelmente persuadir a criança

251 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito Civil: Famílias.5.ed. São Paulo: Saraiva, 2014, , p.26-27
252 ROSSATO, Luciano Alves; Lépore, Paulo Eduardo; Cunha, Rogério Sanches. Estatuto da criança e adoles-
cente comentado. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 165.
253 Ibidem, p.165.
254 GARDNER, Richard.Recent Trends in Divorce and Custody Ligation.AcademyForum, New York, v.29, n.2, p.3-
104 7,1985.
a libertar e a se permitir a abandonar a convivência com o outro genitor e estas tentativas são cada
vez mais angustiantes e chegando a ser dolorosa para quem esta ouvindo porque é operada por
uma pessoa que a criança e o adolescente sente amor.255

Quando correndo a dissolução matrimonial, e consequentemente orompimentofamiliar, insta-


lará entre os até então cônjuges o sentimento de raiva, ódio, vingança por conta do relacionamento
frustrado, necessitando assim um deles ou ambos a atuação de palavras ou ações negativas sobre
a criança. No entanto, aquele que atém a aguarda do menor utilizarade mentiras, calúnias, criadas
para interferir de forma contrária na formação psicológica da criança, com afinalidade de diminuir a
relação existente com o outro genitor, é assim que transcorre aalienação parental.256

Diante disso, o alienador que detém a guarda do menor não se importa com o que poderá
causar, abusando de sua responsabilidade que é de proteger, manter a integridade física e psicoló-
gica da criança, tornando esta prática cada vez mais duradoura, prova essa que pesquisas indicam
que 80% dos filhos de pais separados já sofreram alienação parental e ainda apontam que mais de
20 milhões de crianças convivam com esse tipo de violência.257

É sabido que a figura do alienador poderá ser pai ou mãe ou até mesmo quem detém a guar-
da do menor, e nesta condição de “alienador guardião”, buscará vários caminhos para deturpar a
imagem do outro genitor educando o menor com sentimentos de ódio não se preocupando com
as consequências advindas dessa destruição moral psicológica feita na mente da criança. Ainda
nesta, acarretará a separação do filho com o menor colocando nele um sentimento devastador de
destruição, valendo-se de inverdade ditas então pelo alienador.

Muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, quando um dos cônjuges não consegue
elaborar adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição, de traição, surge um de-
sejo de vingança que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito
do ex- parceiro. Nada mais do que uma “lavagem cerebral” feita pelo guardião, de modo a compro-
meter a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não
aconteceram conforme a descrição dada pelo alienador. Assim, o infante passa aos poucos a se
convencer da versão que lhe foi implantada gerando a nítida sensação de que essas lembranças
de fato aconteceram. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre o genitor
e o filho. Restando órfão do genitor alienado, acaba se identificando com o genitor patológico, pas-
sando a aceitar como verdadeiro tudo que lhe é informado.258

Isto posto, pode-se analisar que a alienação parental denota um afastamento do filho de um
dos genitores instigado pelo outro. Bastam dizer então, que esta prática estende-se aos avós, ir-
mãos, tios etc.259

Uma pesquisa feita pelo IBGE no ano de 2002, demostrou números que 91% dos casos de
alienação parental são cometidos por mulheres, e deve destacar de que mesmo com estes núme-
255 SILVA, Denise Maria Perissinida.Guarda compartilhada e a síndrome da alienação parental. Campinas:
Autores associados, 2010, p.55,56.
256 FIGUEIREDO, Fábio Vieira. Alienação Parental- São Paulo: Saraiva, 2011 p 46.
257 PALERMO, Roberta. Ex Marido, Pai presente: dicas para não cair em armadilha da alienação parental-São
Paulo: Mescla,2012. p. 20.
258 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 6. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2010, p.456.
259 FIGUEIREDO, Fábio Vieira. Alienação Parental. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 46. 105
ros presente nas pesquisas apontam também que os avós, tios, amigos da família, psicólogos ou
até mesmo advogados também podem instalar a síndrome na criança, isto é, praticam o ato por
interesse, pode ser na destruição familiar ou qualquer outro motivo.260

Roberta Palermo nos explica que o descobridor da alienação parental Richard Gardner foi um
professor da Clínica Infantil da Universidade de Psiquiatria da Criança e do Adolescente e que mes-
mo Por volta de 1985e que desde a descoberta da alienação parental e até hoje suas teorias ser-
vem de parâmetros para o mundo todo inclusive em sentenças judiciais. Assevera ainda que com
seus estudos e teorias demostra-se que a presença do alienador com a criança traz sérios danos
psicológicos na mesma, sendo que a prática inserida na criança como mentir, inventar emoções,
forjar sentimentos, utilizar-se da lavagem cerebral e até mesmo a alegação de abuso sexual, afeta
em nível elevada o emocional da criança sem contar o constrangimento por ela sofrido.261

Em se tratando da prática da alienação parental o genitor Alienante se utiliza de artifícios ver-


bais para com o menor demostrando que as intenções são sempre em beneficio de sua segurança
e seus cuidados, prevenindo-o de qualquer mal que possa vir acontecer. Entretanto, este genitor
por sua vez esta agindo de maneira premeditada para que possa a vir ficar sempre no controle da
situação e acaba se utilizando de comportamentos contrários aos que foram ditos pelo mesmo fa-
zendo assim por excluir o outro genitor da vida do filho.262

Observe-se que quando o alienador age se utiliza de inúmeros meios como, por exemplo, não
comunica ao outro genitor sobre eventosrelacionados à vida do filho, pode ser na escola, ou mé-
dico ou até mesmo em comemorações, decide mudanças sobre a vida dos filhos, sem precedente
consulta ao outro cônjuge como,por exemplo, escolha ou mudança de escola, de pediatra.263

Ainda nessa linhaintervém nas visitas controlandoos horários, organiza diversas atividades
para o dia de visitas, para que o menor perca o interesse de ir.Além de todas as ações o alienador
pratica a alienação de modo a atacar a relação entre filho e o outro genitor manipulando a crianças
com recordações, motivos ou fatos ocorridos que levem ao estranhamento com o outro genitor,
obriga a criança a optar entre a mãe ou o pai, fazendo-a tomar partido no conflito, faz a criança de
espiã da vida do ex-cônjuge, quebra, esconde ou cuida mal dos presentes que o genitor alienado
dá ao filho,diz ao menor que o outro genitor é pessoa perigosa, denigre a imagem do outro geni-
tor, se utiliza de comentários deselegantesdos presentes comprados pelo outro genitor ou mesmo
sobre o tipo de lazer que ele oferece ao filho, criticando-o na parte financeira e atéprofere falsas
acusações de abuso sexual, uso de drogas e álcool.264

Quando se utiliza da prática do ato da alienação parental em analise com a legislação vigente

260 SILVA, Denise Maria Perissinida.Guarda compartilhada e síndrome de alienação parental: o que é isso?
Campinas: Armazém do Ipê, 2009. p. 54.
261 PALERMO, Roberta.Ex Marido,Pai presente:dicas para não cair em armadilha da alienação parental-São Pau-
lo: Mescla.2012 p. 16.
262 BUOSI, Carolina de Cássia Francisco. Alienação Parental: uma interface do direito e da psicologia.Curitiba:
Jurua, 2012 p. 79.
263 DIAS. Maria Berenice. Coordenação. Incesto e Alienação Parental, realidades que a justiça insiste em não
ver. 2007. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2008. p.105.
264 DIAS. Maria Berenice. Coordenação. Incesto e Alienação Parental, realidades que a justiça insiste em não
ver. 2007. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2008. p.106.
106
o direito fundamental da criança e do adolescente é abalado visto que, tornam-se inteiramente inu-
tilizado nas relações com o genitor e com o restante da família, arruinando os deveres de tutela e
guarda da criança causando abuso moral deixando o genitor de fazer valer a autoridade parental.265

3.2 DA SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL

Há tempos atrás a síndrome da alienação parental não existia, pois, a sociedade tinha uma
visão de conservar o casamento, a família, e nestas condições separação era somente com a mor-
te. Mais tarde com as mudanças sociais, culturais, a separação poderia ser realizada, assim o filho
ficaria sob a guarda da mãe e ao pai somente o pagamento da pensão alimentícia e a convivência
com os filhos através das visitas estipuladas, já causando no filho uma mudança difícil.266

Entretanto, ao passar dos anos os conflitos se tornaram e se tornam ainda cada vez mais difí-
cil na ruptura do casamento, pois as consequências são desastrosas porque normalmente os filhos
são usados e neles instalados a síndrome da alienação parental.

Síndrome da Alienação Parental é denominada pela instalação psíquica advinda de conse-


quências psicológicas por conta dos conflitos gerados após o divórcio, comprometendo a saúde
mental dos filhos que naquela família se encontra. Essa síndrome da alienação parental é conheci-
da no mundo todo, um assunto polêmico porque traz sérias consequências psicológicas no menor
ou adolescente, visto que compromete toda a vida do ser afetado.267

O genitor que pratica a alienação controla o filho em todos os aspectos, ditando o ritmo da
vida da criança sem lhe dar opções de como agir em situações cotidianas do dia a dia até excluir
o contato do filho com o outro genitor. Nisso, os comportamentos de como o de retirar a criança
do arredor do genitor as queixas do ex companheiro para denegri-lo para o filho vem ter o ato de
apresentar falsas ideias, denúncias de abusos físicos, psicológicos ou sexual com a finalidade de
excluir o laço que ainda existe entre pai e filho.268Segundo Richard:
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece qua-
se exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifesta-
ção preliminar é a campanha denegri tória contra um dos genitores, uma campanha
feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combi-
nação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação,
doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando
o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da
criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Paren-
tal para a hostilidade da criança não é aplicável.269

265 PALERMO, Roberta. Ex Marido, Pai presente: dicas para não cair em armadilha da alienação parental-São
Paulo: Mescla.2012 p 18.
266 PAULO, Beatrice marinho. Alienação parental: identificação, tratamento e prevenção, Revista Brasileira de
Direito das Famílias e Sucessões, Belo Horizonte, v 19dez/jan.2011.p 08
267 MOTTA, Maria Antonieta Pisato. SAP:Identificação Sua manifestação no Direito de Família Intervenções Possí-
veisSíndrome de Alienação Parental e a tirania do guardião. Porto Alegre: Equilíbrio, Pág35. 2008.
268 Ibidem .p 36
269 GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP) 2002 Tradução para o português por Rita Rafaeli . Disponível em: http://www.alienacaoparental.com.br/textos-
-sobre-sap-1/o-dsm-iv-tem-equivalente> Acesso em: 06/08/2015. 11h57min.
107
Nota-se que esta prática se torna uma tortura psicológica para com o menor, ainda mais
preocupante é, pois a maioria das pessoas que compõe asociedade em si ainda não conhece a
síndrome alienação, tampouco outros profissionais. 270

Portanto, a síndrome refere-se a um distúrbio que acontece muitas vezes por conta das dis-
putas judiciais pela guarda da criança e os sintomas da síndrome da alienação parental é a falta
de segurança, isto porque aquele que é odiado pelo outro genitor pode ter concedido empenho e
se dedicado na educação da criança e do adolescente proporcionando um relacionamento de ca-
rinho, afeto, amor de forma reciproca. Neste aspecto, vem à consequência que é o do sentimento
de medo, isto porque a criança sente por abandonar o genitor. Sabe-se que na maioria das vezes
é a figura paterna que abandona o lar, e isso na cabeça da criança o pai esta rejeitando o filho e o
abandonando e ainda esta demonstrando para ele que se este o abandonou, o outro também pode
abandonar então na cabecinha desta é seguro que fique na companhia do genitor que o acolheu. 271

Entretanto, percebe-se que a situação em que encontra-se a criança é totalmente desgastan-


te e confusa para o mesmo, pois não saber ao certo o que se fazer e que decisão tomar se se afasta
ou se aproxima, aí esta instalada o desespero na criança e no adolescente.

3.3 DOS ASPECTOS E CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS DA ALIENAÇÃO


PARENTAL

A alienação parental por sua vez, enseja consequências comprometedoras na criança e no


adolescente bem como, no genitor alienado, trazendo efeitos devastadores para a vida das vítimas
inclusive no âmbito psicológico. As consequências corriqueiras desta prática são várias na qual
a criança desenvolve problemas psicológicos podendo até desencadear transtornos psiquiátricos
durante toda a sua vida, sem contar os efeitos que acarretam na saúde emocional das vitimas da
alienação como, por exemplo, depressão acarreta melancolia, desânimo tristeza, ansiedade,in-
quietação, e pânico. Estes problemas se estendem até na vida escolar, pois o rendimento do edu-
cando é péssimo, a baixa autoestima sem razão aparente prosperam. Outros sintomas ocorrentes
são os transtornosrelacionados à identidade ou a imagem da criança e do adolescente, pois trans-
corre uma dificuldade de adequação em ambiente social normal e até sentimento de insegurança.

Os efeitos da Síndrome podem se manifestar ás perdas importantes –morte de pais, fami-


liares próximos, amigos etc. Como decorrência, a criança (ou o adulto) passa a revelar sintomas
diversos: ora apresenta-se como portadora de doenças psicossomáticas, ora mostra-se ansiosa,
deprimida,nervosa e, principalmente, agressiva. Os relatos acerca das consequências da síndrome
da alienação parental abrangem ainda depressão crônica, transtorno de identidade, comportamen-
to hostil, desorganização mental e, ás vezes, suicídio. É escusado dizer que, como toda conduta
inadequada, a tendência ao alcoolismo e ao uso de drogas também é apontada como consequên-
cia da síndrome.272
270 BUOSI, Carolina de Cássia Francisco. Alienação Parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Jurua, 2012 p 60.
271 GARDNER, Richard. Recent Trends in Divorce and Custody Ligation.AcademyForum,New York, v.29, n.2, p.3-
7,1985.
108 272 FONSECA, Priscila Maria Pereira Corrêa da.”Síndrome da Alienação Parental.Pediatria, São Paulo, n28,v3,
Pode-seanalisar com as exposições dos sintomas, a alienação parental pode prosseguir por
anos, consequências essas que instalará no menor no aspecto mental e também no campo com-
portamental. Isto não ocorre sealgum dia estaprática se reparar, mas, isto só pode vir acontecer-
quando o filho tornar-se consciente, isto é, quando ocorrer o distanciamento dopai guardião. Ob-
serva-se a afirmação de Fonseca sobre o assunto:
Essa alienação pode perdurar anos seguidos, com gravíssimas consequências de
ordem comportamental e psíquica, e geralmente só é superada quando o filho con-
segue alcançar certa independência do genitor guardião, o que lhe permite entrever
a irrazoabilidade do distanciamento do genitor. 273

Outro efeito resultante de consequências da alienação causadas na criança aparece como


“medo, insegurança, comportamento hostil, falta de organização, e dificuldades em tarefas diá-
rias.”274

Ressalta-se que quando um dos genitores, por questões pessoais com o ex- conjugue, apro-
veita de seu filho como meio de ocasionardor e retirar da criança um dos genitores que também a
ama, ocorre consequências intensas, profundas a ponto de ser prejudicial no desenvolvimento da
própria criança e do adolescente e do genitor afastado. 275

3.4 DAS POLÍTICAS DE INTERVENÇÃO ESTATAL

É conhecido que os pais por seu dever no sentido de atribuir educação e todos os cuidados
para com os filhos deve basear-se-ão sempre no melhor interesse da criança na parentalidade
responsável, posto que, os mesmos tem a obrigação de preservar os direitos da criança e do
adolescente, então, para oferecer e demonstrar proteção o Estado de Direito busca bloquear esta
prática realizada pelos genitores de aspecto configurado sendo tipificada e formalizada em face da
sociedade. 276

Consequentemente para evitar essa prática eis que surge a lei, protegendo e tentando ampa-
rar o menor e até mesmo o genitor que também sofre pelas ações do alienador. A lei n° 12.318/2010
preconiza que:
“Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da
criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós
ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vi-
gilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este”.277

2006.p. 162.
273 FONSECA, Priscila Maria Pereira Corrêa da.”Síndrome da Alienação Parental.Pediatria”, São Paulo, n28,v3,
2006.p. 163.
274 DIAS. Maria Berenice. Coordenação. Incesto e Alienação Parental, realidades que a justiça insiste em não
ver. 2007. São Paulo: Editora Revista dos tribunais, 2008. p.104.
275 BUOSI Carolina de Cassia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Juruá, 2012, p.59.
276 BUOSI Carolina de Cassia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Juruá, 2012, p.116.
277 BUOSI Carolina de Cassia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Juruás, 2012, p.17.
109
O conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que tem como objetivo a proteção
integral da criança e do adolescente, aplicando medidas e expedindo encaminhamentos para o juiz
é o Estatuto da Criança e do Adolescente, este é o marco legal e regulatório dos direitos humanos
de crianças e adolescentes, posto isto, cuida com a integridade psicológica destes, conjuntamente
com a lei n° 12.318/2010 que regulamenta a execução e realiza composição nas relações familia-
res no sentido de proteção pelo desenvolvimento psicológico da criança e do adolescente.278Ade-
mais, além da proteção do Estado já se tem conhecimento que os pais têm o dever de proteger os
filhos em todas as situações em que estes vive, inclusive manterem o vinculo de afetividade mesmo
se estes não estão mais unidos. Entretanto, destaca Fabio Vieira Figueiredo e Georges Alexandris:
A relação afetiva entre pais e filhos deve ser preservada ainda que a relação entre os
pais não esteja mais estabelecida na forma de uma família, ou mesmo jamais tenha
se constituído, tendo como principais alicerces os laços de afetividade, respeito, de
considerações mútuas.279

Destarte, sabe-se que de que a alienação parental acaba por se perfazer na atuação de um
dos genitores, isto porque o progenitor que executa a pratica da alienação parental usurpa da con-
fiança e segurança que a criança e o adolescente dispõe neste, fazendo com que todas as ações
que o outro faça venha a ser reprovada, por conseguinte oportuniza que a criança obtenha a figura
do outro genitor totalmente denigrida, contudo, esta realização de lavagem cerebral automatica-
mente promove que a criança constata insegurança neste e aconteça o desligamento e o abandono
do genitor que hora fora alienado. 280

Portanto, perante o obstáculo em designar os reais motivos que ocorre o desempenho da


alienação parental, o legislador foi preciso e cria rol que apresenta exemplos das práticas pelo
alienador que caracteriza a execução da alienação parental com o intuito de promover o amparo
com fundamento de concretizar o melhor interesse da criança e do adolescente, posto que tenha
privado a sua familiaridade com o então, genitor que esta sendo prejudicado.281

Operar a alienação parental, sem dúvidas golpeia o direito que detém a criança e o ado-
lescente de coabitar e frequentar a vivência em família, harmonia esta que tem a obrigação dos
genitores de ser prazerosa e sem nenhum vício, isto é que a relação dos pais devem ser a melhor
possível afastando os problemas da ruptura do vinculo amoroso entre ambos e ter devoção pelo
filho, ofertando afeto para o mesmo, justo neste momento conturbado que estão passando. Posto,
a alienação parental edifica abuso moral contra a criança e o adolescente, pois, esta prática acaba
por deixar que o genitor alienante não cumpra com os deveres que são obrigatórios de respon-
sabilidade parental, e com isto é capaz de surgir a responsabilização de esfera civil e a de esfera
criminal, podendo vir a ocorrer a modificação da guarda, além de intercorrer a perda da mesma.282

278 MACHADO, Isadora Vier, MOCHI, Tatiana de Freitas Giovanni. Da proteção da integridade psicológica no
âmbito familiar brasileiro: novas perspectivas de compreensão e intervenção.p.3.acesso em: 13 jul. 2016.
279 FIGUEREDO, Fabio Vieira, ALEXANDRIS, Georges. Alienação parental: aspectos materiais e processuais da
lei 12318/2010. São Paulo: Saraiva, 2011, p.43.
280 BUOSI Carolina de Cassia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Juruás, 2012, p.120.121
281 FIGUEREDO, Fabio Vieira, ALEXANDRIS, Georges. Alienação parental: aspectos materiais e processuais da
lei 12318/2010. São Paulo: Saraiva, 2011, p.53
282 Ibidemp.63,69,77
110
Os parâmetros com o objetivo de suprimir e represar a conduta da alienação parental é con-
cernente de exemplos, certo que outros parâmetros podem ser utilizadas pendendo da magnitude
do acontecido, para mais, perante o princípio da instrumentalidade do processo, o togado pode ex-
por-se decritérios majorados que inclinam-se para pugnar e abrandar as anomalias que a alienação
parental origina.Contudo, procura agregar a convivência sadia entre a criança e o adolescente e o
progenitor que também sofreu a alienação parental. Evidente que o modelo de regras exercidas pe-
losórgãos judiciário não obstante é determinada em vertente da pena, porém, goza do propósito de
salvaguardar a estabilidade emocional juntamente a formação psicológica física e moral da criança
e do adolescente, a fim do judiciário agir com medidas regidas por proteção destes, e assegurar a
criança e o adolescente o direito ao convívio familiar, de modo integral com concepção valorativa,
e eminentemente respeitável.283

CONCLUSÃO
Devido ao fim do relacionamento dos genitores poderá ocorrer a alienação parental. Os res-
ponsáveis pela criança ou adolescente usam os mesmos como meio de vingança com o intuito
que os filhos se afastem de um dos genitores e com isso ocasionara o sofrimento e diversos tipos
de danos, pois, uma vez que a criança e o adolescente estão em fase do desenvolvimento físico e
psíquico.

O poder judiciário por sua vez intervém para que esta situação seja diminuída, isto, que deve
este proteger a criança e o adolescente buscando o melhor interesse dos mesmos, porque os geni-
tores nesta situação não conseguem se entender e acabam praticando o ato da alienação parental.

A criança e o adolescente por serem sujeitos de direitos fundamentais precisam da proteção


fundamental especial, isto é que sejam desenvolvidos em ambientes adequados, de modo tranquilo
e no seio familiar pois, é ali que serem de fato seres de respeito e possuíram educação de modo
geral, terão crescimento físico e psíquico saudável condizente com o que expressa a lei de ter ple-
na proteção e desenvolvimento completo.

Salienta-se que este tratamento deve ser mesmo se os pais não estão convivendo juntos.
Deveram ser oferecidas para a sociedade as intervenções do Estado com politicas públicas para
estabelecer para todos que o que é melhor para a criança e assim obter atendimentos tanto para
os pais quanto para os filhos de modo efetivo para que possa amenizar a pratica da alienação pa-
rental bem como proibir a mesma. a lei 12318/2010 tenta minimizar o problema, mas, o trabalho
com as famílias devem ser constantes para se chegar a o objetivo que é de não colocar a criança
e o adolescente como meio de vingança evitando danos físicos e psicológicas para os pequenos
buscando o desenvolvimento saudável e colocando o melhor para os filhos sempre, protegendo as
famílias e preservando-as.

283 BUOSI Carolina de Cassia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba:
Juruás, 2012, p.133
111
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113
PARENTAL ALIENATION : LEGAL AND PSYCHOLOGICAL
ABSTRACT

The parental alienation will occur with the dissolution of the family and when one of the parents act in defiance of the
law, in order to create false ideas about the other parent in order to avoid the children and adolescents of the same
and this condition may be the father mother brothers, uncles, grandparents etc. and this is painful because it is an act
performed by the teenager who feels love. Thus occurs the syndrome of parental alienation, for the attempted form of
removal shall be accomplished and the lowest in fact will be far from the parent making the love that the child feels for its
parent is diminished. However caused in children and adolescents various types of trauma and psychological problems
together with fear, anger, sadness finally the child rejected the parent and this will occur clearance, therefore the alien-
ating parent does not care about what will lead throughout the child’s life and adolescents. Our Brazilian law prohibits
the practice of parental alienation and acts as a way to protect the interests of children and adolescents punishing those
who practice such an act, looks after the best interests of the child and adolescent bringing it to a comfort zone and right
guaranteed before society and with firm and pleasant relationships with their parents. The parental alienation in turn is
a practice used by parents in the act of separation and should be finished because, in a way that ends up affecting the
life of children and adolescents

Keywords: Parental alienation ; child ; family.

114
CYBERBULLYING: O ASSASSINATO MORAL DE CRIANÇAS
E ADOLESCENTES EM REDE

Tatiana MannaBellasalma e Silva


Mestre em Ciências Jurídicas pelo UniCesumar - Centro Universitário Cesumar, especialista em direito processual civil
pela UNIVEM, graduada pela UEM-Universidade Estadual de Maringá. Docente da EMAP – Escola da Magistratura
do Paraná, núcleo de Maringá e FAMMA – Faculdades Metropolitanas de Maringá. Endereço eletrônico: bellasalma@
uol.com.br

Gisele Sanchez Falkowski


Pós graduanda do Curso de Especialização em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná – EMAP, Ma-
ringá – PR. Graduada em Direito pelo UniCesumar – Centro Universitário Cesumar. Endereço eletrônico:gifalkowski@
gmail.com

RESUMO: Em tempos remotos a criança era coisificada e com o passar dos tempos ela foi ganhando proteção, como
com o advento da proteção às crianças da lei do ventre livre e outras até que se alcançou a proteção conferida pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Recentemente, crianças e adolescente ganharam uma perspectiva maior
do que apenas proteção, elas têm sido percebidas como detentoras de direito como cidadãos. Em pesquisas realizadas
em diversos países, percebeu-se que os infantes são o maior público atuante na internet, e, em virtude da ‘chuva’ de
informações constantes que há na rede, crianças e adolescentes devem ser orientados, além de protegidos, a fim de
garantir tanto um bom uso quanto a diminuição de incidência do cyberbullying. O Estado, através da Lei do Marco Civil
e outras legislações, e pesquisadores, através de estudos e artigos científicos, vem se preocupando e atuando para
garantir às crianças e adolescentes que não tenham seus direitos mais íntimos violados na rede. Utilizou-se no estudo
o método teórico bibliográfico, consistente na pesquisa doutrinária e de artigos e documentos virtuais.

PALAVRAS-CHAVE:Criança e adolescente; Cyberbullying;Vulnerabilidade.

INTRODUÇÃO
A criança e o adolescente, com o passar dos anos, passou de mero objeto de especulação de
adultos para sujeitos de direito, sendo protegidos pela sociedade e pelo Estado em todas as áreas
da vida, inclusive na mais recente, o meio virtual, tutelando e instruindo os infantes para o bom uso
da internet, com vistas a prevenir e coibir violações dos direitos das crianças e adolescentes.

Quando ocorre o cyberbullying, são feridos os direitos da personalidade da pessoa humana,


e, para uma criança ou adolescente, que está em desenvolvimento, as afrontas do bullying são de
grande monta para sua saúde num todo, com um agravante de ordem psicológica, que pode vir a
ser irreversível e impedir seu desenvolvimento como ser humano pleno.

A vítima do bullying, ocorrido no meio virtual, têm seu sofrimento de forma redobrada, pois
esta não consegue ter tranquilidade nem mesmo em sua casa, visto que as informações ou dados
divulgados na internet alcança um número incontável de pessoas de forma muito rápida, e sem
controle algum no que pertinem as publicações de terceiros em meio online.
115
Mesmo que hajam leis recentes que visam garantir um melhor controle e reprimenda de atos
atentatórios contra o ser humano e leis que visam garantir a proteção integral de crianças e adoles-
centes, tais medidas por si só não foram suficientes, e para isso, busca-se a tutela jurisdicional do
Estado, seja de modo cautelar, seja com um processo, sendo o meio mais eficaz de fazer cessar
ameaça ou sofrimentos causados pelo cyberbullying é o quanto antes possível, pelo motivo de que
com a proliferação de informações há internautas que salvam conteúdos em seus dispositivos ele-
trônicos e, posteriormente, tornam a fazer as postagens de conteúdos que foram até retirados da
rede por ordem judicial.

Empregou-se no presente estudo o método teórico bibliográfico, consistente na análise doutri-


nária, bem como de materiais disponibilizados virtualmente que versam sobre o tema.

1 DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTES: SERES EM


FORMAÇÃO
No mundo contemporâneo, crianças e adolescentes podem contar com um sistema de prote-
ção integral aos seus direitos fundamentais inato a qualquer ser humano, além de alguns direitos
especiais relativos à sua condição de sujeito de direitos em desenvolvimento.

Para que o Brasil chegasse aos modelos normativos atuais, que disciplina sobre Direitos da
Criança e do Adolescente no Brasil – Lei 8.069/1990, Estatuto da Criança e do Adolescente – an-
teriormente passou-se por um processo de desenvolvimento normativo que se teve início com a
Lei do Ventre Livre (1871), conforme menciona Macedo284, avançou no século XX com o chamado
Código de Menores (1927), ao qual foi considerado como o primeiro da América Latina capaz de
consolidar leis e decretos que davam relevo à questão do menor de idade.

A criança e o adolescente na ótica menorista, a tempos atrás, eram meros objetos de toda
uma ideologia de proteção. Já na ótica atual, a criança e o adolescente são compreendidos como
indivíduos em si mesmo, que estão em desenvolvimento, fazendo-os como protagonistas de suas
próprias histórias no meio social.285

No que diz respeito aos direitos da criança e adolescente Macedo pontua:

O objetivo de um direito novo que contemple a possibilidade de construirmos a criança e o


adolescente enquanto sujeitos de direito significa não visualizá-los como seres simplesmente re-
ceptores de garantia; é acima de tudo, um processo de edificação de suas autonomias.286

Ainda, com o fundamento de que crianças e adolescente são cidadãos atuantes e que care-
cem de cuidados especiais, Macedo afirma:
(...) a criança e o adolescente são merecedores de direitos próprios e especiais, que,
em razão de sua condição específica de pessoas em desenvolvimento, estão a ne-

284 MACEDO, Sérgio Diogo Teixeira de. Crônica do negro no Brasil. Rio de Janeiro:Record, 1974. p. 113- 114.
285 VERONEZE, Josiane Rose Petry. Os Direitos da Criança e do adolescente: construindo o conceito de sujeito ci-
dadão. In: WOLKMER, Antônio Carlos; LEITE, José Rubens Morato (Orgs). Os “novos” direitos no Brasil. São Paulo:
Saraiva, 2003, p. 32
116 286 MACEDO, Sérgio Diogo Teixeira de. Crônica do negro no Brasil. Rio de Janeiro:Record, 1974. p. 113- 114.
cessitar de uma proteção especializada, diferenciada, integral.

O surgimento de uma nova legislação que tratasse seriamente dos direitos da infância e da
adolescência era de caráter imprescindível, pois havia uma necessidade fundamental de que estes
passassem de “menores” para a de cidadãos.287

Vale salientar um dispositivo de grande importância, qual seja, o Princípio 2º, da Declaração
dos Direitos da Criança, a qual foi adotada pela Assembleia das Nações Unidas, em 20 de novem-
bro de 1959 e ratificada pelo Brasil, através do artigo 84, inciso XXI, da Constituição Federal, que
assim traduz:
Princípio 2º A criança gozará proteção social e ser-lhe-ão proporcionadas oportuni-
dades e facilidades, por leis e outros meios, a fim de lhe facultar o desenvolvimento
físico, mental, moral, espiritual e social, de forma sadia e normal e em condições de
liberdade e dignidade. Na instituição das leis visando este objetivo levar-se-ão em
conta, sobretudo, os melhores interesses da criança288.

Na Constituição Federativa, o caput do art. 227289, traz ao nosso ordenamento de forma clara
os direitos da criança e do adolescente, como também o dever o Estado e da família de proteger as
crianças e adolescentes de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, cruel-
dade e opressão, incluindo-se então o bullying em rede de forma exemplificativa.

Nesse mesmo diapasão, colaborando com a lei maior, em 1990 nasceu o Estatuto da Criança
e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), um completo documento garantidor de direitos, que disciplina e
instrui condutas com a finalidade tutelar essa área social. Portanto, no momento em que estamos
abarcados por sistemas de leis, cabe ao sistema político jurídico criar meios para dar efetividade as
normativas protetivas. De acordo com o entendimento de Veronese:

A criação do referido Estatuto, destinado, especificamente, às crianças e aos adolescentes,


revela a preocupação do legislador e, acima de tudo, da sociedade em proteger integral e priorita-
riamente os interesses dos infantes, de forma a permitir o pleno desenvolvimento de suas capaci-
dades físicas e intelectuais, necessárias para a realização de suas aspirações. 290

Com a mesma finalidade, a doutrina da proteção integral fundiu-se num metaprincípio que
orientam sistema constitucional e vai de encontro nas normas do Estatuto a sua realização plena
e objetiva, integrando, ao lado das normas internacionais de proteção aos direitos humanos, um
verdadeiro sistema de proteção dos direitos de crianças e adolescentes291, ao qual ganhou espaço
no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente292.
287 MACEDO, Sérgio Diogo Teixeira de. Crônica do negro no Brasil. Rio de Janeiro:Record, 1974. p. 113- 114.
288 Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente, Acesso em 13 de set de 2016. Disponível em: http://www.
educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/documentos/0004.html
289 (...) é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente e ao jovem, com absolu-
ta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à digni-
dade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
290 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos da Criança e do Adolescente. São Paulo: LTr, 1999. p. 55
291 ROSSATO, Luciano Alves. Estatuto da Criança e Do Adolescente Comentado. São Paulo: Revista dos Tribu-
nais, 2010. p .80
292 Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 117
Há, ainda, o princípio da dignidade da pessoa humana, que está expresso no artigo 1º, inciso
III, da Constituição Federal293 como um princípio fundamental, fornecendo ao sistema jurídico o
seguinte conteúdo substancial de proteção e tutela da pessoa humana.

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, foi posto no ordenamento jurídico brasileiro


em atenção aos princípios constitucionais a fim de fazer cessar as ameaças aos direitos das crian-
ças e adolescentes – como sugerido pela Doutrina da Proteção Integral e princípios da Convenção
Internacional dos Direitos da Criança, para respaldar e reivindicar do Estado políticas de prioridade
dos interesses das novas gerações. A partir de então, a infância passa ser entendida não como um
objeto de medidas protetivas, mas se reconhece, a partir disso, a criança como sujeito de direitos.294

Desta feita, depreende-se, portanto, que a adoção dos mencionados princípios chama aten-
ção para proteção da criança e do adolescente, conduzindo o ordenamento para o melhor interesse
da criança respeitando os ideais de liberdade, respeito e dignidade. Veronese295afirma, que tal es-
trutura protecionista inaugura uma nova prática social, perpetrada pela sociedade civil organizada e
uma nova prática institucional, que não é mais aquela de repressão e vigilância do Estado, mas sim
concentrada na capacidade do Estado de garantir, no campo das políticas públicas, a adequada
efetivação dos direitos da criança e do adolescente.

2 O ADVENTO DAS NOVAS TECNOLOGIAS E O USO PELAS


CRIANÇAS E ADOLESCENTES
É inato ao ser humano o poder e a vontade de comunicar-se e, o conhecimento de que se dá
através das interlocuções interpessoais são de grande valia até mesmo para proteger os preceitos
que garantem a vida plena. A tutela dos princípios da pessoa humana deve ser o maior foco da
tutela política de comunicação, com vista diferenciada aos novos protagonistas e coadjuvantes da
era digital – as crianças e adolescentes296.

No Brasil não se tem informações estatísticas no que se refere ao acesso a internet por crian-
ças e adolescente, mas estima-se que eles sejam responsáveis pela maior parcela dos acessos
à rede mundial de computadores. Informações recentes denotam que mais de 20 milhões de pes-
soas acessam diariamente a Internet com os mais diversos interesses e necessidades, vez que ela

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer cir-
cunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formu-
lação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacio-
nadas com a proteção à infância e à juventude
293 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa
humana.
294 A Convenção representa um consenso de que existem alguns direitos básicos universalmente aceitos e que são
essenciais para o desenvolvimento completo e harmonioso de uma criança. Representa em definitivo, o instrumento
jurídico internacional mais transcendente para a promoção e o exercício dos Direitos da Criança.(PEREIRA,Tânia da
Silva (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente:estudossóciojurídicos. Rio de Janeiro:Renovar, 1992.
295 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os Direitos da Criança e do Adolescente. São Paulo: LTr, 1999. p. 64
296 BORGES, Donaldo de Assis, Crianças e adolescentes na internet: a responsabilidade dos pais ou responsáveis.
2015. Disponível em: http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/educacao/criancas-adolescentes-na-internet-responsa-
118 bilidade.htm. Acesso em 17 de ago de 2016.
se tornou intermediária de relações pessoais e comerciais.297

Segundo Evelyn Eisenstein e Susana Estefenon:


no mundo atual as crianças e os adolescentes vivem em dois mundos, quais sejam:
aquele que todos conhecemos, o mundo real, e o mundo digital ou virtual, que pare-
ce muito mais interessante e surpreendente, oferecendo aventuras, oportunidades, a
busca pela autonomia, mas também, perigo e riscos à saúde. O espaço cibernético,
o mundo da internet e a velocidade da comunicação se tornaram o “lugar vivo de ver-
dade” onde todos se encontram, aprendem, jogam, brincam, brigam, trocam fotos,
ganham dinheiro, começam e terminam amizades e namoros.298

Diante da nova esfera de vida – a digital – muito se questiona se esse “BUM” de informações
são benéficas ou maléficas, sendo que acredita-se que quando o uso da internet é realizado para
o fim de pesquisas científicas estas fazem crer ser um bom intermediador para o bem. No entanto
abre-se o questionamento se o conteúdo que está em rede é material confiável ou não e, ainda,
se a criança e o adolescente estão preparados para discernir o bom do ruim, o certo do errado.
O mais indicado é que crianças e adolescentes tenham o acompanhamento de adultos – pais ou
responsáveis, educadores, etc, para conduzi-las no melhor uso da internet, pois caso contrário esta
ferramenta pode ser um mal.299

O professor, Ulysses Doria Filho, em seu artigo publicado pela Sociedade Brasileira de Pe-
diatria classifica os principais riscos a que crianças e adolescentes estão expostas ao navegar pela
Internet, são eles:

• Exposição a material inapropriado: sexual – milhares de fotos, vídeos mostrando toda


sorte de perversões, violento, odioso, que encoraje atividades perigosas ou ilegais, ideo-
lógicos, vulgares etc.

• Agressões físicas: a criança pode passar informações “online” que coloquem em risco a
sua segurança assim como a de sua família, por exemplo, fornecendo dados pessoais
como seu nome, colégio onde estuda, endereço, profissão dos pais, características de sua
casa, marcando encontros etc.

• Legais e financeiros: há também a possibilidade de cometer crimes como realizar compras


- de passagens, bens de consumo etc - com o cartão de crédito de outra pessoa, movimen-
tar aplicações e contas bancárias, participar de leilões, jogar em cassinos virtuais, invadir
sites sem permissão etc.

• Oportunidade de experimentar jogos extremamente violentos e inclusive de fazer “down-


load” de versões para demonstração.

297 BORGES, Donaldo de Assis, Crianças e adolescentes na internet: a responsabilidade dos pais ou responsá-
veis. 2015. Disponível em: http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/educacao/criancas-adolescentes-na-internet-res-
ponsabilidade.htm. Acesso em 17 de ago de 2016.
298 EISENSTEIN, Evelyn e ESTEFENON, Susana B., Geração digital: riscos das novas tenologias para crianças
e adolescentes. 2011. Acesso em 17 de ago de 2016. Disponível em:http://revista.hupe.uerj.br/detalhe_artigo.as-
p?id=105
299 BORGES, Donaldo de Assis, Crianças e adolescentes na internet: a responsabilidade dos pais ou responsá-
veis. 2015.. Disponível em: http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/educacao/criancas-adolescentes-na-internet-res-
ponsabilidade.htm. Acesso em 17 de ago de 2016 119
• Exposição a uma comunidade praticamente infinita, incontrolável: embora a maioria das
pessoas navegando pela WWW seja bem intencionada, muitos não o são, podendo tratar-
-se de ladrões, assassinos, pedófilos, traficantes e usuários de drogas, membros de seitas
e ordens diversas, de “gangs”, que exploram a violência, o sexo, o jogo, as drogas e os
vícios em geral300.

No entendimento de Augusto de Cury, no que diz respeito a ter um cuidado especial com
crianças e adolescente, limitando-os no acesso de todo e qualquer conteúdo afirma que:“[...]não
estamos defendendo que das crianças se escondam de temas essenciais intimamente ligados às
questões da vida, da sexualidade, da morte, da violência e das drogas”.301

Prossegue ainda de que se trata de: ‟proporcionar espetáculos de acordo com a capacidade
da criança, em cada faixa etária, de assimilar estas informações de modo que elas não lhe façam
dano” 302.

Diante do que demonstrado pode-se afirmar que o uso da internet por crianças e adolescen-
tes pode ser considerado tanto algo bom quanto algo ruim, a depender do conteúdo que se busca
bem como a orientação dos pais ou responsáveis que é ministrada às crianças e adolescentes303.

3 CYBERBULLYING E A VULNERABILIDADE INFANTO JUVE-


NIL NO MEIO VIRTUAL
O cyberbullying vem ocorrendo por atos de violação a vários direitos da personalidade no
meio virtual que é comparado ao bullying convencional (termo em inglês que quer dizer “intimidar”,
“amedrontar”). O dicionário Priberan caracteriza o bullying como “Conjunto de maus-tratos, amea-
ças, coações ou outros atos de intimidação física ou psicológica exercido de forma continuada
sobre uma pessoa considerada fraca ou vulnerável”.304

Sobre a conduta do cyberbullying, Ana Beatriz Barbosa Silva descreve:


Os avanços tecnológicos também influenciam esse fenômeno típico das interações
humanas. Com isso novas formas de bullying surgiram através da utilização dos
aparelhos e equipamentos de comunicação (celular, Internet), que são capazes de
difundir, de maneira avassaladora, calúnias e maledicências. Essa forma de bullying
é conhecida como ciberbullying [...].305

300 FILHO, Ulysses Doria; Promoção de segurança da criança e do adolescente frente a mídia (TV e internet). Dis-
ponível em: http://www.sbp.com.br/img/documentos/doc_promocao_seguranca.pdf. Acesso em 17 de ago de 2016.
301 CURY, Muniretallii (Coords.). Estatuto da Criança e do Adolescente: comentários jurídicos e sociais. 2ª ed. São
Paulo: Malheiros, 1992.p. 127
302 CURY, Muniretallii (Coords.). Estatuto da Criança e do Adolescente: comentários jurídicos e sociais. 2ª ed. São
Paulo: Malheiros, 1992.p. 127
303 BORGES, Donaldo de Assis, Crianças e adolescentes na internet: a responsabilidade dos pais ou responsá-
veis. 2015. Disponível em: http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/educacao/criancas-adolescentes-na-internet-res-
ponsabilidade.htm.Acesso em 17 de ago de 2016.
304 PEIXOTO, Erick Lucena Campos. A responsabilidade civil na internet e os direitos da personalidade sob a ótica
do direito civil constitucional. 2015. Disponível: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/vwk790q7/14fhSEn-
Gx24lQBF5.pdf. Acesso em 15 de ago de 2016.
305 SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. p. 24
120
Para essa autora o cyberbullying é o bullying realizado na internet.Quando se esquadrinha a
temática do bullying em rede, nota-se que sua importância é tamanha ante a amplitude dos danos
e vítimas que esta pratica vem depredando em razão do livre e simultânea fluidez de dados trans-
mitidos, que faz com que e informações se propaguem quase que na velocidade da luz, atingindo
quantia incontável de internautas. Conjuntamente a esse fluxo intenso de informações, onde todo
conteúdo que é divulgado em rede, sejam imagens, vídeos, fotos, palavras e recados postados em
redes sociais – como Instagram, Facebook, Snapchat, Twitter, dentre outras é espontaneamente
percebido pelas outras pessoas que estão navegando na internet, bem como conseguem armaze-
nar as informações obtidas na internet para poder propagar, mencionadas informações sem que
haja nenhuma administração da disseminação de dados na internet.306

Nesse sentido, Pereira Júnior esclarece que “o excesso, quando leva ao ferimento de valores
como a dignidade humana e honra, carece de tutela jurídica.” 307 E complementa ainda que “não
são poucos os que encobrem, sob a máscara da “liberdade de expressão”, verdadeiros abusos.”308

Quando mencionada questão é posta sob a análise do Estado, pode-se perceber foi dado
atenção aos direitos fundamentais da criança quando lê-se a garantia do art. 5º de que diz:

nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discrimina-


ção, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por
ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais309

Desse modo, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso X, determinou a inviolabi-
lidade da vida privada, da honra e a imagem das pessoas, e ainda assegura o direito à reparação
por dano material ou moral que decorrer de sua transgressão.

Observa-se, portanto, a preocupação em proteger as pessoas contra as ingerências que lhes


causam dor e sofrimento.

O artigo 17, do Estatuto da Criança e do Adolescente, prevê: “visando a manutenção da inte-


gridade física, psíquica e moral” da criança e do adolescente, entretanto, quando estes sujeitos são
vítimas do cyberbulying o que se percebe é a evasão escolar, doenças físicas e doenças graves de
ordem psicológica310.

Sequer no conforto de seu lar o infante se sente seguro contra as ameaças do cyberbullying,
pois com a internet as intimidações não têm barreiras311. O artigo 18 do ECA312 declara os valores

306 SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. p. 24
307 PEREIRA JÚNIOR, Antônio Jorge. Direitos da criança e do Adolescente em face da TV. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 26
308 PEREIRA JÚNIOR, Antônio Jorge. Direitos da criança e do Adolescente em face da TV. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 26
309 VIEIRA, Cecy; Richter, Daniela, O enfrentamento do cyberbulling a luz do constitucionalismo contemporâneo:
uma analise de sua possibilidade jurídica. 2012. Disponível em: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=-
17d63b1625c816c2. Acesso em 15 de ago de 2016.
310 BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de julho de 1990. Rio de Janeiro:
Imprensa Oficial, 2002.
311 STEFANO, Isa Gabriela de Almeida, Bullying na Escola. Acesso em 12 de ago de 2016.Disponível em: http://
ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=14757
312 “(...)velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano,
violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”. 121
de proteção integral.

E, nesse mesmo diapasão, Maldonado entende que a prática do bullying tanto na sua mo-
dalidade real quanto na modalidade virtual expõem o sujeito a dor da rejeição, do rebaixamento
enquanto ser humano e da vergonha, que “pode permanecer durante anos prejudicando a vida da
criança” e levando a comportamentos extremos.313

As informações que veiculam por meio eletrônico estão cada vez mais acessíveis seja porque
há um crescente consumo de computadores ou seja porque a cada dia mais vem aumentando o
uso dos smarthphones com acesso a internet e, por conseqüência, as comunicações de forma a
agredir o outro ser humano também se proliferou através das postagens ou de compartilhamento
das mensagens de rede sociais que agridem o ser nas mais diversas esferas do ser humano. Há
também websites que oferecem até ambientes para criação de páginas pessoais, como exemplo,
cita-se os “blogs”.314

Maldonado cita o exemplo de uma Organização Não Governamental criada em 2005, a Safer-
net Brasil, quando menciona sobre questões de auto proteção em rede, pois esta ONG se preocupa
com as vulnerabilidades de crianças e adolescentes na internet, informando o seu uso consciente e
responsável. Cita a também, que em 2009, a citada ONG realizou pesquisa com 732 pesquisadores
e 2159 alunos a respeito do que pensam sobre a “segurança da rede”. Dos resultados destaca-se:

26% dos educadores conheciam casos de ataques de cyberbullying entre os alunos de suas
escolas; 99% dos professores consideram dever da escola discutir medidas de segurança com
seus alunos, embora 50% deles considerem que não dispõem de informações suficientes para rea-
lizar este trabalho. Entre os alunos, 12% declaram ter namorado ao menos uma vez pela internet e
11% confessam ter publicado suas fotos íntimas, embora 33% reconheçam que conheçam amigos
que já sofreram ataques de cyberbullying.315

Outro dado importante e que chama a atenção do uso racional do cyber espaço é de uma
pesquisa realizada pelo do Departamento de Educação - EUA, que efetuou uma pesquisa no ano
de 2006, onde foi atentado que “cerca 25% dos infantes entre 3 e 5 anos de idade já utilizaram a
internet, sendo que cerca de 1/3 dos alunos que freqüentam o pré escolar também já fizeram o uso
dessa modalidade de tecnologia em rede”316. O uso extemporâneo da internet por crianças e ado-
lescentes é alvo de preocupações constantes de estudiosos por causa da amplitude de informação
a que as crianças e adolescentes estão sujeitos.317

Em especulação científica executada na Europa, mais especificamente na Suécia, quando


indagado o fator predominante de influência para atitudes revoltosas de infantes, prevaleceu, em
313 MALDONADO, Maria Tereza. Bullying e Cyberbullying: o que fazemos com que fazem conosco? São Paulo:
Moderna, 2011. p. 74
314 TEIXEIRA, Gustavo. Manual Antibullying: para alunos, pais e professores. Rio de Janeiro: BestSeler, 2011. p.
44
315 MALDONADO, Maria Tereza. Bullying e Cyberbullying: o que fazemos com que fazem conosco? São Paulo:
Moderna, 2011. p. 81
316 SRTASBURGER; V. C; WILSON, B.; JORDAN, A. B. Crianças, adolescentes e a mídia. Tradução Sandra Mall-
mann. Porto Alegre: Penso, 2011. p. 322
317 VIEIRA, Cecy; Richter, Daniela, O enfrentamento do cyberbulling a luz do constitucionalismo contemporâneo:
uma analise de sua possibilidade jurídica. 2012. Acesso em 15 de ago de 2016. Disponível em: http://www.publicadi-
122 reito.com.br/artigos/?cod=17d63b1625c816c2
primeiro lugar o uso de tóxicos com 90% (noventa por cento) de influência, e em segundo lugar, a
televisão e a internet como fatores de interferência relevante comportamental, sendo que mencio-
nadas conclusões foram semelhantes quando houve a submissão de testes similares nos Estados
Unidos da América, porém neste último, primeira e segunda colocação se invertem, tamanha é a
interferência da internet na vida dos infantes318.

Portanto, quando trata-se de cyberbullying, a acessibilidade é uma das chaves mais podero-
sas para tal modalidade de violação dos direitos da personalidade em rede, e também a mais difícil
de reparar tanto por causa da amplitude da divulgação de dados e informações quanto pela dificul-
dade em reparar os danos, que por vezes são de ordem psicológica, ou ainda, quando há a repre-
sália na web, os infantes tendem a esconder o fatídico de seus pais e/ou responsáveis por causa do
temor de que os pais ou responsáveis restrinjam o uso da internet, computador e smathphones.319

4 MEDIDAS PROTETIVAS AO CYBERBULLYING


Diante de tantas afrontas ao direito da personalidade do ser humano, em especial à perso-
nalidade de criança e adolescentes, é crescente o número de pesquisas a fim de fazer cessar ou
diminuir práticas que submetem a inferiorização da dignidade, da personalidade e auto estima dos
seres humanos que ainda nem chegaram a maturidade. Diante disso é que o mundo jurídico busca
procedimentos práticos para coibir as práticas do cyberbulying.

Segundo Marcel Leonardi:


(...) é cada vez maior o interesse da comunidade acadêmica, dos governos e da
sociedade em geral sobre questões jurídicas relacionadas à internet”, pois a “Rede
modificou o modo como vivemos e interagimos”, motivo pelo qual defende a exis-
tência de “uma nova maneira de interpretar o sistema jurídico quando se pretendem
solucionar adequadamente os problemas trazidos pela internet.320

O mesmo autor traz a baila questões atinentes a tutela Estatal e suas propostas de prevenção
e proteção para as problemáticas que ocorrem no meio virtual, quando expressa:

A internet não exige apenas novas soluções jurídicas para os novos problemas, ela também
afeta a maneira como os problemas e as soluções jurídicas devem ser analisados. Ao romper
com paradigmas jurídicos tradicionais e desafiar os mecanismos convencionais de tutela, a Rede
representa um dos principais objetos de estudo dos doutrinadores preocupados com essa nova
realidade social. A principal dificuldade, portanto, é oferecer propostas de soluções eficientes para
os problemas práticos que se apresentam, reconhecendo as limitações do sistema jurídico. [...] Exi-
ge-se que o jurista reveja as premissas de sua dogmática, reconhecendo as mudanças decorrentes
da globalização e adotando as medidas úteis ou necessárias, de modo a acompanhar a revolução
econômica e tecnológica321.
318 SETZER, Valdemar W. Setzer, Efeitos Negativos dos meios eletrônicos em crianças, adolescentes e adultos.
2014. Acessado em 14 de ago de 2016. Disponível em: http://www.ime.usp.br/~vwsetzer/efeitos-negativos-meios.
html
319 FELIZARDO, Aloma Ribeiro. Cyberbulling na velocidade da luz. EditoraWillen Books. São Paulo. 2010
320 LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na internet. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 32-34
321 LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na internet. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 39 123
Cristiano Becker Isaia acredita que o sistema atual e o que ainda virá, é decorrente de uma
série de transformação sociológica e jurídica que é percebida por nossos governantes e conduzido
ao ordenamento jurídico pátrio para orientar a população322:

Ao prognóstico da legalidade, o Estado Democrático de Direito agrega o qualitativo da busca


pela igualdade da comunidade, o fazendo através de sua vinculação a uma ordem constitucional
que organize democraticamente a sociedade através de um complexo sistema de direitos e garan-
tias fundamentais individuais e coletivos, o qual vê na justiça social a condição de possibilidade
na correção de desigualdades. Por isso é que o adjetivo “democrático” se justifica em razão da
superação de um Estado de direito meramente formal a um Estado que estampa ao concretizar a
justiça social, pretendendo fazê-lo a partir da consolidação.A lei do Marco Civil, tanto quando ainda
se discutia seu projeto – Lei nº 2.126 – quanto após sua finalização – Lei nº 12.965 – objetivaram
na resolução de conflitos, bem como na prevenção de futuros conflitos em rede.323

Ainda, no que diz respeito ao artigo 7º da Lei 12.965 de 23 de abril de 2014 – Lei do Marco
Civil – trouxe muitos direitos aos internautas, tal como a tutelados direitos da personalidade que
foram expressos nos incisos I, quando garante a inviolabilidade da intimidade e da vida privada,
sua proteção e reparação por danos de ordem tanto material quanto de ordem moral que decorrem
de atitudes que corrompem citados direitos; já no inciso II, há a garantia a inviolabilidade e sigilo do
fluxo de suas comunicações pela internet, exceto quando realizada por meio de ordem judicial, nos
moldes da lei; e, ainda em seu no inciso III, a salvaguarda da quebra de privacidade e sigilo de suas
conversas privadas armazenadas, exceto por determinação de ordem judicial.324

Mesmo com tantas garantias trazidas pela Lei do Marco Civil, há uma crítica realizada pelo
pesquisador Erick Lucena Campos Peixoto quando trata da responsabilidade civil no corpo da men-
cionada lei que é tratada no Capítulo III, seção III da Lei quando declara no artigo 18, que o prove-
dor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo
gerado por terceiros. O artigo 19 menciona a intenção de proteger a liberdade de expressão e
impedir a censura, o provedor de aplicações de internet e, excepcionalmente será responsabiliza-
do no âmbito cível ante danos advindos de conteúdo gerado por terceiros se, “após ordem judicial
específica”, não iniciar medidas, tornar inacessível o material identificado como agressor, salvo
disposição legal em contrário. De outro modo, contrariando a correnteza da pratica contrária de
alguns julgados já mencionados no corpo do presente projeto, em que dos provedores de internet,
já entendeu diversos tribunais do Brasil que o provedor precisa aderir a obrigação por não toma-
rem as medidas preventivas assecuratórias aos usuários da internet em qualquer modo online que
seja. Ainda, o artigo 21, informa a responsabilidade dos provedores quando o conteúdo é gerado
por terceiros este responderá de forma subsidiária pela violação de direitos e será responsabiliza-
do “subsidiariamente” pela “violação da intimidade” decorrente da divulgação, sem autorização do
divulgado “após recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal”, quando
322 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 43 e 49
323 PEIXOTO, Erick Lucena Campos. A responsabilidade civil na internet e os direitos da personalidade sob a ótica
do direito civil constitucional. 2015. Disponível: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/vwk790q7/14fhSEn-
Gx24lQBF5.pdf. Acesso em 15 de ago de 2016.
324 PEIXOTO, Erick Lucena Campos. A responsabilidade civil na internet e os direitos da personalidade sob a ótica
do direito civil constitucional. 2015. Disponível: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/c178h0tg/vwk790q7/14fhSEn-
124 Gx24lQBF5.pdf. Acesso em 15 de ago de 2016.
não age de forma diligente dentro de seus limites técnicos.325

Ante causídicos notórios pretéritos ocorridos, o legislador acabou por restringir a violação à in-
timidade fazendo menção de nudez ou de sexo.Dessa forma, o sujeito que é vítima de violação que
não sejam especificamente referente a nudez ou ao sexo aparentemente fica sem amparo legal
para sua situação específica, carecendo levar seu constrangimento até o judiciário para discuti-la.
As ofensas ao direito da personalidade não podem ser restringidas apenas as de cunho sexual, o
cyberbullying em suas diversas esferas têm os mais graves danos para o ser humano, principal-
mente aqueles – crianças e adolescentes – seres que estão a se desenvolver326

Se por um lado há preocupação com a privacidade das crianças e dos adolescentes, bem
como do respeito dentro das relações familiares da igualdade dos membros, respeito mútuo, au-
tonomia, tomada de decisões a partir da participação dos membros essas também se estendem
quanto a tomada de decisão para o uso da internet, principalmente porque, na grande maioria das
famílias o computador do infante é localizado no quarto deles e, como visto anteriormente há a
necessidade de que os pais detentores do poder familiar, de maneira compreensível fiscalizem e
controlem o acesso de seus filhos menores à internet a fim de proteger e orientar os menores das
práticas de violações que ocorrem no meio virtual.327

As medidas cautelares tem sido o instrumento capaz de atender as necessidades de pessoas


que tiveram seus direitos violados e precisam que, de modo eficaz, seja retirado conteúdo, informa-
ções, dados ou outros materiais da circulação virtual, o conteúdo que traz consequência negativa
ao direito da personalidade de outrem – bullying virtual. Sabe-se que as medidas cautelares são
extremamente preparatórias e sendo necessário um procedimento principal (ordinário), que tem
por objetivo a satisfação de direitos. O objetivo primário do procedimento cautelar é prevenir, sendo
um intermediador para garantir o objeto sobre o qual será instaurada a ação processual principal328.

Neste sentido Cristiano Becker Isaia329 menciona:

O procedimento cautelar serviria para tutelar o processo principal, seja de conhecimento ou


de execução, e não o direito subjetivo em situação de risco ou destinado, após a concessão da
cautela, à declaração ou à satisfação pela ação principal, esta de ordem definitiva.

O atual conceito de jurisdição ainda não permite, a incidência da actioromana, que prima por
“segurança” e “certeza” na pretensão jurisdicional de mérito, pois acredita que tal segurança deve
vir somente com a sentença, que acaba por impedir que o magistrado disponha de procedimento
de cognição sumária e passe para a decisão de mérito. Desse modo, a tutela jurisdicional vigente
325 PEIXOTO, Erick Lucena Campos. A responsabilidade civil na internet e os direitos da personalidade sob a ótica
do direito civil constitucional. 2015. Acesso em 15 de ago de 2016. Disponível: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/
c178h0tg/vwk790q7/14fhSEnGx24lQBF5.pdf
326 PEIXOTO, Erick Lucena Campos. A responsabilidade civil na internet e os direitos da personalidade sob a ótica
do direito civil constitucional. 2015. Acesso em 15 de ago de 2016. Disponível: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/
c178h0tg/vwk790q7/14fhSEnGx24lQBF5.pdf
327 PONTES, Luis Paulo dos Santos; Entre o dever de vigilância e o direito a privacidade da criança e do adoles-
cente. 2015. Acesso em 15 de ago de 2016. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/publicacoes/66fsl345/e703oo-
gw/52TaVnqB78q54uP4.pdf. Acesso em 15 de ago de 2016.
328 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Processo de Execução e Cumprimento de
Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 45. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. 2 v. p. 490
329 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e a
busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 264. 125
está consolidada no entendimento que cabe ao juiz localizar a vontade da lei, quando incumbido de
prolatar sentença final, sem admissão de resolução do mérito liminarmente330

O próprio vínculo entre racionalismo e ordinariedade pressupõe que as decisões que não se-
jam acobertadas pelo manto da sentença final, aquela oriunda do silogismo entre premissa maior
e menor, sejam decisões puramente processuais. Não podem alcançar o direito material. Trata-se
de um raciocínio compreensível na medida em que a jurisdição processual moderna foi construída
pela ficcionalização de que ao juiz incumbiria o encontro, em processo civil, da verdade (ou vonta-
de) da lei, o que logicamente pressupunha ocorrer no instante da declaração do direito após ampla
produção probatória da causa.331

No que tange a influência e aplicação da hermenêutica processual, o mesmo autor finaliza a


discussão:
Este é o momento de se construir uma jurisdição processual apta a contribuir com
os anseios populares de um Estado verdadeiramente democrático, que possibilite o
protagonismo da Constituição como uma forma eficaz a constituir o resgate dos di-
reitos sociais e da democracia, através de um processo que aproxime procedimento
e substância.

[...]

É justamente neste ponto que a hermenêutica filosófica assume um papel de extrema


importância no discurso jurídico. Suas influências no direito e, para este estudo, no
processo civil, revelam-se pela tentativa de libertação do pensamento jurídico (e da
processualística contemporânea) apegado ao paradigma da filosofia da consciência
de raiz cartesiana. Ela torna possível, no âmbito do processo civil, apropriar-se de
uma filosofia voltada ao mundo prático, para o mundo da vida, para o direito subjetivo
material discutido em juízo”.332

Há corrente doutrinária que defende a tese de que precisamos transpor o modelo lógico pro-
cessualista, a adentrar com a técnica de entendimento do que está por trás da letra da lei sob
análise do magistrado. Mencionado rompimento, no âmbito de prática cível, a fim de proteger de
forma adequada as relações sociais que sejam calcadas na internet e por ela ocorrem violações,
em principalmente no que tange a “compreensão de um processo que leve em conta a participação
do intérprete no processo de construção dos atos jurisdicionais a partir de sua condição de ser-no-
-mundo”333. Ao seguir esta linha no plano jurisdicional o aporte hermenêutico, será possível então
alcançar uma proteção procedimental desraigado do sistema processual que seguem a letra fria
da lei.

Quando o assunto é internet, quanto mais cedo providenciar as medidas processuais cabí-
veis, melhor será o resultado processualístico, em se tratando de cyberbullying, visto que se for
necessário fazer a retirada de materiais, informações ou dados do cyber espaço, mais ampla será

330 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 264- 265.
331 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 351
332 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 342
333 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
126 a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 264- 266
a eficácia da tutela pretendida, ainda que esta não seja total. Diante disso, Leonardi. acredita que,
ante as particularidades da internet, “deve-se compreender que a tutela específica no âmbito da
Internet é, em realidade, a possível e não a tutela perfeita”.334

Nesse sentido Juliana Camargo de Maltini:

Portanto, é imprescindível a tutela preventiva, denominada de tutela inibitória, na proteção


da privacidade frente à Internet, uma vez que consiste na tutela jurisdicional adequada às novas
situações jurídicas. Entretanto, se pode deixar de lado os provimentos reparatórios, já que a tutela
preventiva não pode ser efetivada sempre. Porém, é necessário esclarecer que tais medidas re-
paratórias são mecanismos secundários, somente recorríveis quando não for possível proteger o
direito através da tutela preventiva.335

Em suma, o que se propõe hoje, diante da ineficácia e ausência de regulamentação espe-


cífica de matérias, por ora se utilize os critérios batizados pela doutrina quanto à interpretação da
limitação voluntária dos direitos da personalidade, abrindo-se possibilidade de tutelas reparatórias
e inibitórias em caso de má utilização dos dados do internauta.Qualquer que seja a decisão anterior
a sentença final, essa seria uma previa processual, ou seja, nela não se discute o mérito da causa.

Através dos instrumentos processuais de tutela objetiva-se ao Juiz-Estado apreciar e decidir,


tendo por base a verossimilhança nas alegações, dentro das possibilidades jurídicas da ocasião
sem que vincule-se o juízo a declarar, por meio de sentença, a vontade da lei.336.

Isto posto, ante as novas realidades sociais, no enfrentamento processual das situações de-
correntes da prática de bullying em rede, o processo civil deve se adequar para conceder eficiência
na tutela dos interesses dos ofendidos, dentro de ambientes processuais democráticos, aos moldes
do Estado Democrático de Direito, ajustando-se à realidade contemporânea.

CONCLUSÃO
Com o presente trabalho pretendeu-se demonstrar que ante a gravidade do cyberbullying se
faz necessário adotar medidas eficazes, tanto de prevenção quanto de inibição de atos que violam
os direitos da personalidade da pessoa humana, em especial, das crianças e dos adolescentes,
tendo vista que são seres em desenvolvimento e não possuem maturidade para suportarem deter-
minadas situações de constrangimento, prejudicando assim seu desenvolvimento integral.

Para que a criança e o adolescente tenham uma ‘vida saudável’ no meio virtual mostrou-se
indispensável a orientação de pais, responsáveis, ou ainda, de professores a fim de conduzir os
infantes a fazer filtragem de conteúdos que sejam apropriados para sua idade e maturidade emo-
cional e intelectual.

334 LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na internet. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 339
335 MALTINI, Juliana Camargo de. Tutela Inibitória e Internet: O Processo Civil aplicado na Proteção da Privacida-
de. In: CONPEDI. (Org.). Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI. Brasília: Fundação Boiteux, 2008. p. 190.
Acesso em 15 de agosto de 2016.
336 ISAIA, Cristiano Becker. Processo civil, atuação judicial e hermenêutica filosófica: a metáfora do juiz-instrutor e
a busca por respostas corretas em processo. 2. ed. rev. e ampl. Curitiba: Juruá, 2011. p. 349 127
Demonstrou-se que por vezes, diante de falta de instrução ou cuidado, crianças e adolescen-
tes acabam por ser alvo de bullying na internet e esse ato traz danos, irreversíveis ao seu desen-
volvimento pleno e sadio. Ainda, foi noticiado que crianças e adolescentes não relatam que são
vítimas de cyberbullying porque temem que os pais ou responsáveis retirem ou restrinjam o uso de
aparelhos eletrônicos.

Ademais, quando crianças e adolescentes levam ao conhecimento dos pais ou responsá-


veis que foram vítimas do bullying na internet, busca-se medias judiciais para tentar coibir os atos
atentatórios contra a dignidade da criança e do adolescente, sendo um dos meios mais eficazes,
quando o interessado age pretendendo a tutela do judiciário o quanto antes possível, pois, quanto
mais cedo é a busca, por exemplo de uma tutela inibitória, mais eficiente será a medida de retirar
determinado conteúdo da internet.

As questões oriundas do âmbito virtual interferem sobremaneira nas vidas dos envolvidos,
sendo que o Direito precisa apresentar respostas eficazes àqueles que sofrem afrontas neste mun-
do. O reflexo do mundo virtual é absurdamente real, e quando se trata de crianças e adolescentes
as consequências são mais contundentes ainda. Aqueles que sofrem com o cyberbullying passam
pelo assassinato moral, uma vez que são expostos e execrados em rede, o desdobramento de tal
agressão é por vezes irreversível e compromete o pleno desenvolvimento do envolvido.

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CYBERBULLYING : MORAL MURDER OF CHILDREN AND TEENAGERS IN NETWORK

RESUMO:In ancient times the child was reified and with the passage of time it has gained protection as with the advent
of protecting the children of the free womb law and others until it reached the protection afforded by the Child and Ad-
olescent - ECA. Recently, children and adolescents gained a greater perspective than just protection, they have been
perceived as having rights as citizens. In surveys conducted in several countries, it was realized that infants are the most
public active on the Internet, and, because of the ‘rain’ of the information that is in the network, children and adolescents
should be targeted, and protected in order to ensure both good use as the decreased incidence of cyberbullying. The
State, through the Marco Civil Law and other laws, and researchers, through studies and scientific papers, has been
concerned and working to ensure that children and adolescents who do not have their most intimate rights violated on
the network. It was used in the study bibliographic theoretical method, consisting of doctrinal research and articles and
virtual documents.

PALAVRAS-CHAVE:Child and teenager; cyberbullying; Vulnerability.

130
PRINCÍPIOS SOCIAIS COMO PRINCIPAL MOTOR DE
REVISÃO DOS CONTRATOS CIVIS DAS PESSOAS EM
SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE ECONÔMICA

Charles Kendi Sato


Docente do curso de graduação em Direito da Universidade Paranaense. Mestre em Direito pela Universidade Estadual
de Maringá. Advogado. e-mail:chalresksato@gmail.com

Luciana Souza Fante


Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas do Centro Universitário Cesumar de Maringá – UNI-
CESUMAR. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes – UCAM.
Aperfeiçoamento em Direito e Processo do Trabalho pela Associação dos Magistrados do Trabalho – IX Região –
AMATRA IX. Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Maringá (1995). Docente do Curso de Graduação
em Direito da Faculdade Cidade Verde de Maringá – FCV e do Centro Integrado de Ensino de Campo Mourão – CEI.
Advogada. e-mail: lucianafante@gmail.com.

RESUMO: O presente trabalho visa apresentar os Princípios Sociais dos Contratos como o principal motor revisional
do Direito Civil, absorvendo ou substituindo outras teorias ou formas de revisão contratual, e desse modo possibilitar a
inserção dos direitos de personalidade e sua proteção na teoria contratual. Tal constatação deve-se ao fato de que os
princípios sociais, por serem cláusulas gerais, permitem interação com o Direito Constitucional e dos direitos de perso-
nalidade e com isso limitar ou adaptar a vontade das partes a valores e princípios constitucionais de caráter genérico
e abstrato, que permitem ao Juiz, em um caso concreto, possibilitar fazer justiça. O direito privado, no Brasil, sempre
teve uma conotação liberal com possibilidade de revisão bastante restrita, basicamente. A Teoria da Imprevisão e as
excludentes de responsabilidade civil eram as hipóteses aceitas, o que contrasta com o momento atual, com ampla
possibilidade de se revisar os pactos celebrados pelas partes pela observância dos princípios sociais.

PALAVRAS-CHAVE: Princípios-sociais; revisão; contrato.

INTRODUÇÃO
Os direitos de personalidade e os princípios sociais podem fazer com que o direito contratual
possa ser modificado em determinados casos concretos para se poder fazer justiça e restabelecer
o equilíbrio contratual entre as partes.

Com a vigência do Novo Código Civil de 2002, a teoria contratual foi dotada de novos princí-
pios que limitam a liberdade de contratar: A função social do contrato e a boa-fé objetiva surgem
para desempenhar esse papel. Com isso, implantou-se no Direito Civil a possibilidade de limitação
da vontade expressa no contrato, o que significa dizer que, eventualmente, a vontade pode ser
adaptada a determinado balizamento externo, medida sem precedentes no Direito Civil Brasileiro.

Mas doutrina e jurisprudência ainda não vislumbraram a real magnitude da introdução dos
princípios sociais no Direito Civil. Os princípios sociais têm sido utilizados ainda de forma um tanto
quanto restrita para a revisão contratual, uma vez que estes permitem a revisão contratual sem
precedentes, com a efetiva possibilidade dos contratos sofrerem influência de valores e princípios
constitucionais. 131
Não se entra no mérito se a influência constitucional no direito privado é salutar ou não, pois
um modelo nitidamente liberal está se modificando com a possibilidade de influência externa no
domínio da vontade individual das partes. A ingerência estatal em assuntos da alçada privada tem
seu custo normalmente expresso na menor rentabilidade financeira ou na restrição de determi-
nados negócios jurídicos. O apelo ao social seguramente não se coaduna com ideais liberais de
diminuição da ingerência do Estado e respeito à autonomia da vontade.

De início far-se-á uma paralelo entre os direitos de personalidade e os princípios sociais, após,
serão analisadas as antigas formas de revisão contratual na vigência do Código Civil de 1916, com
a verificação da aplicabilidade da Teoria da Imprevisão, tão pouco utilizada anteriormente, porque
seus requisitos elevavam-na praticamente aos mesmos requisitos da constatação do fortuito ou for-
ça maior. Os mesmos requisitos anteriores foram mantidos no Novo Código Civil e até ampliados,
o que deixou suas hipóteses de aplicabilidade ainda mais restritas

Posteriormente, o fenômeno da constitucionalização do Direito Civil será apresentado pela


utilização dos princípios sociais. A visão de que os princípios sociais constituem-se em janelas (ou
elo de ligação) para que princípios e valores constitucionais, bem como aos direitos de personalida-
de, possam ser aplicados no direito privado. Constitui em uma novidade que não era ou não deveria
ser propriamente novidade, já que a Constituição Federal é anterior à promulgação do Código Civil
de 2002.

De qualquer modo, a possibilidade efetiva do direito contratual ser influenciado pela Consti-
tuição tornou-se em realidade, ou melhor, está se cristalizando cada vez mais entre os operadores
do Direito. Se isso é danoso ou não à segurança jurídica demandada pela sociedade atual não se
sabe ainda, mas é de se constatar que a aplicação dos princípios sociais está em franca ascensão.

É inegável que o direito privado não podia continuar se esquivando dos princípios e valores
constitucionais. A adoção das técnicas das cláusulas gerais como modelo para a possibilidade de
limitação da vontade dos contratantes aperfeiçoou o direito contratual moderno. Não que isso tenha
revogado os princípios clássicos do direito contratual, mas sim a noção de que a vontade contratual
não é mais absoluta e ilimitada.

Por último, o artigo apresentará os princípios sociais como principais motores de revisão con-
tratual das relações civis e permeabilização e proteção dos direitos de personalidade, pois a utiliza-
ção das cláusulas gerais possibilita que o contrato possa ser revisado para se atender ou se fazer
justiça à determinada situação jurídica concreta. Os princípios sociais, em um futuro próximo, irão
substituir ou absorver as outras hipóteses de revisão contratual, deixando em desuso outras previs-
tas no Código Civil, possibilitando-se uma melhor proteção dos direitos de personalidade.

132
OS DIREITOS DE PERSONALIDADE E OS PRINCÍPIOS SO-
CIAIS
Existem certas circunstâncias que surgem na vida, que apesar de não poderem ser conside-
radas como fortuito, pois previsíveis, são absolutamente notáveis sob o ponto de vista da dignidade
da pessoa humana e os direitos obrigacionais. Cite-se, por exemplo, o caso de um idoso que aco-
metido por câncer terminal não consegue adimplir seu contrato de locação, não obstante o locador
ser abastado e proprietário de vários imóveis.

Pelo rigorismo formal da Lei é de se esperar que o Juiz determine a desocupação do imóvel
independentemente de se levar qualquer consideração com relação ao drama pessoal que o inqui-
lino moribundo está a passar.

A teoria contratual insculpida no pacta sunt servanda não pode estar alheia a tais situações, há
de se possibilitar que a dignidade da pessoa humana possa ser resguardada, ainda que de forma
provisória ou até mesmo de forma paliativa, de modo a se preservar os direitos básicos inerentes
ao ser humano. No exemplo, poder-se-ia abrir negociação de parcelamento das dívidas vencidas
e um alongamento das dívidas vincendas segundo a capacidade de pagamento do idoso ou outra
medida que pudesse preservar os direitos inerentes à pessoa humana do locatário.

Interessante destacar que doutrina e jurisprudência ainda não se aperceberam de forma in-
tensa que já existe mecanismo jurídico que pode ser facilmente utilizado para tais fins. Os princípios
sociais dos contratos constituem em janelas que admitem a permeação dos direitos de personalida-
de na teoria contratual, de modo que se possa fazer tanto quanto possível justiça ao caso concreto.

Nesse contexto, os direitos de personalidade surgem como uma garantia mínima dos direitos
individuais, de modo que a humanidade possa pelo menos minimizar os danos as pessoas em si-
tuação extrema de miséria e destruição, como ocorreu durante a Segunda Grande Guerra337.

O fato é que na aplicação da Lei, quer seja por influência da Constituição, quer seja pelo Có-
digo civil, “...a dignidade da pessoa humana continua, talvez mais do que nunca, a ocupar um lugar
central no pensamento filosófico, político e jurídico, do que dá conta a sua já referida qualificação
como valor fundamental da ordem jurídica ...”338, de modo que o Juiz não deve ficar alheiro a pos-
sibilidade de se resguardar em um caso concreto direitos básicos humanos, ainda que o contrato
celebrado entre as partes diga o contrário.

Conforme se verá abaixo, a possibilidade de revisão contratual baseada unicamente na teoria


clássica dos contratos é por demais restrita, haja vista que o modelo anterior visava unicamente
a satisfação do credor independentemente das circunstâncias que acarretaram a inadimplência.
Questões atinentes à dignidade da pessoa humana, normalmente, não são levadas em considera-
ção por ocasião da prolação da sentença. Na verdade, a prática indica que os juízes de forma geral
não adentram nesses motivos e se limitam a aplicação literal da Lei.

337 PIOVESAN, Flavia. Temas de direitos humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 4.
338 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal
de 1988. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p.38.

133
Mas é por notório que existem casos que a mera aplicação da Lei não traz justiça ao caso
concreto e a permeação dos contratos pelos princípios sociais é saudável para o equilíbrio da so-
ciedade e a possibilidade de se fazer justiça ao caso concreto.

A REVISÃO CONTRATUAL NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO:


DO LIBERALISMO AOS PRINCIPIOS SOCIAIS
Revisar um contrato até a promulgação do Novo Código Civil era um tabu quase inexpugnável
pelos contratantes. Uma vez celebrado o contrato, as partes ficavam de tal forma vinculadas que
praticamente se admitia a escusa do cumprimento obrigacional por caso fortuito ou força maior, ou
seja, somente com intervenção divina ou política que o vínculo poderia ser relativizado. Essa dog-
mática rígida contratual é fruto histórico do liberalismo que prosperou no Brasil a partir do século
XIX. A Revolução Francesa, com seus princípios liberais, foi fonte para o Direito Civil. O Código de
Napoleão trouxe a noção de que o contrato faz lei entre as partes, o que tornou os pactos celebra-
dos extremamente rígidos, não obstante a existência de circunstâncias contrárias aos interesses
sociais e culturais.

Na vigência do Código Civil de 1916, doutrina e jurisprudência procuraram atenuar os efeitos


da rigidez contratual. Efetivamente, o Código Civil foi construído a partir da noção de que os contra-
tos possuem força vinculante e devem necessariamente serem cumpridos sob pena de execução,
ou seja, a Lei Civil deu prevalência ao pacta sunt servanda.

Ocorre que a excessiva rigidez a que os contratos estavam submetidos possibilitou o surgi-
mento de uma teoria, segundo a qual em alguns casos o cumprimento do contrato causava esforço
além do normal em seu cumprimento. Para atenuar os efeitos da força obrigatória dos contratos,
buscou-se na chamada cláusula rebus sic stantibus, que pode ser entendida como a “manutenção
do status quo da época da contratação” (LYNCH, 2009), ou seja, as mesmas bases contratuais,
presentes no momento da contratação devem estar presentes no momento da execução do con-
trato.

Mas é bom se frisar que a revisão contratual, na vigência do Código Civil de 1916, nunca foi,
nem de longe, regra que pudesse corrigir eventuais desequilíbrios da prestação, pelo contrário,
a rigidez contratual caracterizou o período, fazendo com que eventuais modificações contratuais
fossem escassas, ao ponto de se considerar que a cláusula rebus sic stantibus quase que pareava
com as hipóteses de se reconhecer caso fortuito e força maior.

Bem tentou o Legislador dar um ar de modernidade ao Novo Código Civil, quando expressa-
mente previu a Cláusula, já que antes a construção era doutrinária ou jurisprudencial. A cláusula re-
bus sic stantibus mereceu atenção do Código Civil, que trouxe a chamada Resolução por Onerosi-
dade Excessiva, no seu artigo 478: “...Se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente
onerosa [...] em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir
a resolução do contrato.”. Ocorre que, não obstante, a boa intenção do legislador em abranger a
teoria da imprevisão para um número maior de hipóteses revisionais, seus requisitos tornaram sua
134
aplicação excessivamente restritiva.

Qualquer dos requisitos para aplicabilidade da teoria da imprevisão já impõe restrição à re-
visão contratual mas, quando exigidos em conjunto, tornam a revisão contratual pela onerosidade
excessiva de aplicabilidade quase nula.

A grande dificuldade da aplicação da clausula rebus sic stantibus, na vigência do Código Civil
de 1916, sempre foi a constatação de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. A maioria da
jurisprudência rejeitava a aplicação da cláusula, porque todas as coisas são mais ou menos previ-
síveis. Tal requisito foi repetido expressamente no art. 478.

Os contratos civis ressentem de um sistema semelhante ao do Código de Defesa do Consu-


midor, consubstanciado no inciso V, do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor: “a modifica-
ção das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em
razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”. Nota-se que a exigência
vem a ser a prestação ter se tornado excessivamente onerosa em razão de fatos supervenientes,
não se fazendo menção a acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, nem à extrema vanta-
gem para outra parte.

No vácuo da teoria da imprevisão e do Código de Defesa do Consumidor, surge o Código Civil


de 2002 que trouxe os chamados princípios sociais dos contratos, que mudaram drasticamente a
possibilidade de revisão contratual, especialmente quando houve a junção de princípios e valores
constitucionais com princípios sociais dos contratos e “com a evolução da teoria contratual, que lhe
confere uma concepção social, rompe-se com o dogma da vontade absoluta e da igualdade formal,
como instrumento de justiça contratual.” (CORDEIRO, 1999, p.126)

Mas a resolução do contrato deve ser evitada tanto quanto possível. Pelo princípio da pre-
servação do negócio jurídico, o pacto original deve ser preservado, adaptando-se apenas os fatos
supervenientes que levaram o contrato a se tornar excessivamente oneroso, de modo a buscar
o restabelecimento do equilíbrio contratual, pois o contrato “...está sujeito à influência de fatos e
circunstâncias exteriores, que lhe insere em um dinamismo que escapa, por vezes, até mesmo ao
controle dos contratantes” (GOMES, 2012, p. 147).

Dessa forma, o ímpeto liberal que dominou o Código Civil de 1916 fica restrito pelo surgimento
de novos princípios que limitam a vontade dos contratantes, fazendo com que os direitos da perso-
nalidade possam ser respeitados nos contratos celebrados entre as partes.

A UNIÃO DO DIREITO CONSTITUCIONAL COM O PRIVADO:


A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO COMO ELO DE LIGAÇÃO
ENTRE OS CONTRATOS E OS DIREITOS DE PERSONALIDA-
DE
Até a promulgação do Código Civil de 2002, a possibilidade de revisão das relações contra-
tuais era bastante restrita, conforme visto no tópico anterior, mesmo estando vigente a Constituição
135
Federal com caráter nitidamente social, pautada por princípios como da justiça social e dignidade
da pessoa humana.

Esse descompasso foi suprimido com o novo Código Civil com os princípios da eticidade e
socialidade e, por consequência, estabelecendo que os direitos individuais devem compor com os
interesses da coletividade que se está inserido, de modo que não deve prevalecer o interesse par-
ticular quando interesses sociais gerais forem violados. O novo Código recebeu novos parâmetros
na teoria contratual que anteriormente eram estranhos ao direito privado, e esse é o resultado da
feitura do código ser pautada pela eticidade e socialidade (REALE, 2002).

A aplicação das normas constitucionais ao direito privado não significa propriamente definir
quais artigos da Constituição Federal são aplicáveis no Direito Civil, mas sim tratar de superar a
segregação entre a Constituição e a lei civil, redefinindo os institutos privados contratuais segundo
os parâmetros constitucionais.

Na verdade, a lei civil de 2002 fez convergência entre princípios e valores constitucionais e os
princípios do direito privado. Essa nova noção de que relações particulares podem ser revistas não
foi imediatamente incorporada pelos operadores do direito. Ainda hoje, a aplicação dos princípios
sociais é relativamente tímida pelos julgadores. Mas deve-se observar que a modificação da lei civil
pautada em princípios da eticidade e socialidade não é uma novidade propriamente, uma vez que
já vigia a atual Constituição desde 1988.

E, de fato, a Constituição de 1988 trouxe mudanças dramáticas no pensamento liberal con-


substanciado no Código Civil de 1916 e nas Constituições de 1824 e 1891. Hodiernamente, os
contratos estão sujeitos a regramentos constitucionais de tal magnitude que visam a proteger de-
terminados grupos de pessoas (como os consumidores), bem como a novos princípios, como o
da função social dos contratos, que limita o princípio da autonomia da vontade, possibilitando ao
magistrado a revisão de cláusulas contratuais que não atendem aos anseios sociais.

O Código Civil de 1916 teve influência liberal. Na seara civil até a vigência do Código Civil de
2002, houve um hiato de quase um século em que o princípio da autonomia da vontade dominou
quase que absolutamente, sendo que somente com a promulgação da Constituição de 1988, com
seu ideal de justiça social, que novas e inovadoras ideias alcançaram os pactos particulares.

Mas não foi de imediato com a promulgação da Constituição de 1988 que os contratos co-
meçaram a ter nova dinâmica. Na verdade, a teoria contratual foi se modificando aos poucos de
acordo com os ideais sociais. Conforme os princípios constitucionais, que foram compreendidos e
estudados, pode-se estabelecer com o tempo os limites da autonomia da vontade.

O Código Civil de 2002 trouxe a inovação das chamadas cláusulas gerais, que consistem em
um mandato ao juiz para desenvolver o direito apoiado em princípios (SCHREIBER, 2011, p125),
ou seja, são normas cujo conteúdo deve ser preenchido em cada caso concreto para sua adequa-
ção ao ideal de justiça. Efetivamente, os artigos 421 e 422 do Código Civil são cláusulas gerais apli-
cáveis aos contratos, permitindo-se que valores e princípios constitucionais permeiem o universo
privado. Mas, a adoção dos princípios sociais no direito contratual não é unanimidade. A doutrina
estrangeira “observa que a adoção da função social do contrato civil é fonte de insegurança jurídi-
136
ca, pois permite a modificação contratual segundo valores éticos ou sociais [...]” (KONDER, 2010,
p. 87). E, de fato, a permissibilidade do juiz poder modificar os contratos, segundo cláusulas gerais,
se efetivamente constituir-se em prática disseminada, a insegurança nos pactos pode ser gerada
no seio social, abalando-se, desta forma, o princípio da autonomia da vontade e da obrigatoriedade
dos contratos. Mas, se isso vai acontecer ou não somente o tempo dirá.

A Constituição de 1988, em seu art. 170, traz os princípios gerais da atividade econômica, ou
seja, “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por
fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social [...]”, nota-se que se
faz alusão à chamada justiça social para orientar a ordem econômica.

É de se observar que não constam princípios liberais a informar a Ordem Econômica


brasileira, pelo contrário, constata-se que expressa alusão à função social da propriedade, defesa
do consumidor, defesa do meio ambiente, redução das desiguales regionais e sociais e busca
do pleno emprego. Também não se verifica que a República Federativa do Brasil tenha como
fundamento valor liberal, preza-se pela cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais
do trabalho e da livre iniciativa.

Logo a seara contratual deve se adaptar à Constituição Federal de modo a inserir princípios
constitucionais no direito contratual, de modo a se valorizar: função social da propriedade; defesa
do consumidor e meio ambiente; redução das desigualdades regionais; busca do pleno emprego;
respeito pela cidadania; respeito pela dignidade humana e respeito pelos valores sociais do traba-
lho e da livre iniciativa.

O Código Civil de 2002 não faz alusão expressa aos princípios e fundamentos constitucionais
acima mencionados, mas traz o art. 421: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos
limites da função social do contrato.”, dispositivo civil que está correlacionado à Constituição Fede-
ral. Como observa Paulo Lôbo (2002), a função social é a principal inovação do direito contratual
e talvez de todo o Código Civil,na medida em que será possível a proteção da parte mais fraca na
relação contratual.

O contrato, portanto, é o instrumento pelo qual a justiça social deve permear as relações in-
dividuais, nesse sentido a função social da propriedade liga-se à função social do contrato, sendo
a função social do contrato o instrumento pelo qual os princípios gerais da atividade econômica
(a função social da propriedade, livre concorrência, defesa do consumidor e meio ambiente etc.)
(LOBO, 2002, p. 189-190),e os fundamentos da República Federativa do Brasil permeiam as rela-
ções entre os particulares.

A respeito disso, Lorenzetti (2010),aduz que a função social pode ser entendida como a ade-
quação do vínculo privado à justiça social, sendo que na prática representa que os particulares
terão limitação em contratar, tendo em vista os ditames sociais previstos na Constituição. Mas é de
se notar que a liberdade de contratar não se torna inexiste, e sim limita, permanecendo latente os
princípios clássicos do direito contratual.

Uma das grandes novidades do Código Civil de 2002 foi a adoção das chamadas cláusulas
gerais, que constituem, no dizer de Costa (1998), as janelas, pontes e avenidas de princípios va-
137
lorativos que adentram as relações individuais, possibilitando ao magistrado um amplo aspecto de
medidas para adequar a vontade das partes à função social do contrato.

Assim, os princípios e valores constitucionais encontraram de forma renovada uma entrada no


direito privado, permitindo que, por meio do contrato, diversos temas, que antes eram estranhos as
relações contratuais, possam adentrar o Direito Civil. Como pondera Tartuce (2002), da interação
entre Constituição pode-se apontar que cada vez mais os contratos estão sofrendo influência direta
de princípios e fundamentos constitucionais, de tal sorte que essa interação torna visível a revisão
dos contratos por onerosidade excessiva, desproporção e injustiça social, e nem podem os contra-
tos violarem interesses metaindividuais ou interesses individuais relacionados com a proteção da
dignidade humana.

Não obstante a limitação da liberdade contratual, o contato em nada perdeu sua relevância,
uma vez que as pessoas continuam ainda contratando tanto quanto antes, no dizer de Hironaka
(2002), “o contrato não caiu em desuso nunca e, por isso, permanece vivo, sua força revela sua
indispensabilidade no trato das relações jurídicas e da mantença da segurança.” Logo o contrato
continua sendo o sustentáculo do direito privado, apenas que a liberdade contratual tornou-se mais
restrita ante os princípios sociais.

Ocorre que os princípios sociais têm ganhado cada vez mais relevância junto aos Tribunais de
Justiça e Superiores, de sorte que, cada vez mais, os contratos têm sido revisados sob a ótica da
função social do contrato, que a nosso ver representa uma tendência que apenas está na curva as-
cendente, ainda distante do topo de sua aplicabilidade, conforme cada vez mais se constata, o que
implica na possibilidade de defesa dos direitos de personalidade junto aos contratos celebrados.

PRINCÍPIOS CLÁSSICOS E SOCIAIS DOS CONTRATOS: UM


APERFEIÇOAMENTO DO DIREITO CONTRATUAL
Muitos operadores do direito ainda não se aperceberam que a revisão contratual do Direito
Civil pode e deve ser realizada à luz dos princípios sociais, especialmente o da função social do
contrato. Não obstante a existência na lei civil da Teoria da Imprevisão, seus requisitos são por
demais excludentes para se abarcar a maioria dos casos que ofendem a noção de justiça social,
eticidade e socialidade. Então, a partir da promulgação do Código Civil de 2002, os contratos que
possuem desiquilíbrio contratual ou até mesmo que ofendam a dignidade humana podem ser mo-
dificados pelo Judiciário.

Princípio, no sentido jurídico, significa os requisitos primordiais instituídos como base de um


determinado instituto, são os alicerces que dão fundamentos a uma determinada teoria. Na seara
contratual, temos alguns princípios que dão musculatura à teoria contratual e que torna o contrato
um instituto essencial para a promoção das necessidades sociais por meio da segurança que um
vínculo obrigacional traz. Tais princípios são chamados de clássicos, cuja origem, no Brasil, provém
do liberalismo advindo das Constituições de 1824 e 1891 e do Código Civil de 1916. Os princípios
clássicos continuam a informar a teoria contratual moderna, sendo que, em última análise, trazem
138
segurança jurídica para aqueles que pretendem fazer um negócio jurídico e, se houver inadimplên-
cia, fazer valer o pacto celebrado.

São princípios clássicos principais do direito contratual: autonomia da vontade, obrigatorie-


dade dos contratos, relatividade dos efeitos do contrato e boa-fé, que até o ano de 2002 reinavam
quase que absolutos no Direito Civil.

O contrato, entretanto, sofreu um chacoalho notável após a Constituição de 1988 e Código


Civil de 2002, que introduziram princípios e fundamentos baseados em valores que antes eram
desconhecidos pelo direito privado. É de se notar que os novos princípios não tornam sem efeito
os antigos. Pelo contrário, está plenamente atual, tendo em vista a necessidade de se dar segu-
rança jurídica aos contratantes e à própria sociedade. Vale, então, dizer que o pacta sunt servanda
está vigente e os contratos fazem lei entre as partes, vinculando a vontade dos que participam do
negócio jurídico, de tal sorte que a inadimplência gera o direito à execução do contrato, no que
concernem as obrigações contratadas.

Mas, havendo desequilíbrio contratual que acarrete um sacrifício além do normal no adimple-
mento do contrato, pode-se socorrer dos princípios sociais para o restabelecimento do equilíbrio
das prestações.

Os princípios sociais dos contratos que foram introduzidos pelo Novo Código Civil e tem por
finalidade limitar os princípios individualistas e liberais que foram adotados pelo Código Civil de
1916, rompendo a tradição do pacta sunt servanda e a obrigatoriedade dos contratos, que vigeu
por quase cem anos no direito brasileiro.

Contudo, não obstante a limitação que os novos princípios trazem para o contrato, é de se
observar que estes devem se harmonizar com os princípios tradicionais do direito contratual. Não
se trata de uma demanda entre os princípios, mas sim de delimitação dos princípios clássicos, de
modo a adaptá-los à nova realidade social e legal vigente no Brasil.

Os princípios sociais são três: função social do contrato, equivalência material e boa-fé ob-
jetiva. O princípio da função social do contrato foi introduzido em nosso sistema legal por meio do
artigo 421 do Código Civil e estabelece que: “A liberdade de contratar será exercida em razão e
nos limites da função social do contrato”. Imprescindível para o entendimento do artigo 421 que
este tem a característica de ser cláusula geral, ou seja, “Formulações contidas na lei, de caráter
significativamente genéricos e abstratos, cujos valores devem ser preenchidos pelo juiz, autorizado
para assim agir em decorrência da formulação legal da própria cláusula geral [...].” (NERY JUNIOR,
2014, p. 162). Logo são normas genéricas em branco que, diante das vicissitudes de um caso con-
creto, autorizam o julgador a encontrar uma solução que melhor se adeque àquele caso específico.

As cláusulas gerais possuem função instrumentalizadora porque vivificam o que se encontra


contido, abstrata e genericamente, nos princípios gerais de direito e nos conceitos legais indeter-
minados, como ocorre com o princípio da função social do contrato, que consiste em uma cláusula
geral, de conceito aberto que deve ser instrumentalizado com princípios e fundamentos constantes
da Constituição Federal.

139
Por outro lado, o conceito do princípio da função social do contrato fica prejudicado ante sua
generalidade advinda do fato de ser cláusula geral¸ cujo conteúdo teórico é indeterminado. Mas
essa indeterminação conceitual é que vem a ser sua principal virtude, pois “Somente um sistema
jurídico composto por cláusulas gerais, flexível e capaz de recepcionar a evolução do pensamento
e do comportamento social seria capaz de conferir ao mesmo tempo a ordem e a segurança jurídi-
ca[...]” (MELLO, 2002, p. 143).

Por não ter conteúdo específico sem um caso concreto que acompanhe a função social do
contrato de forma genérica, pode-se atribuir ao princípio a defesa de garantias constitucionais da
dignidade humana, da função social da propriedade, proteção do meio ambiente, proteção da or-
dem econômica, liberdade de concorrência, etc. Enfim, defende-se a eticidade e a socialidade da
comunidade, segundo valores e princípios previstos na Constituição Federal (LEONARDI, 2012).

O contrato, nesse sentido, deve ser entendido como o instrumento pelo qual os fundamentos
e princípios constitucionais de justiça social serão concretizados na ordem econômica, sendo que a
função social da propriedade é o duto pelo qual os princípios e fundamentos constitucionais aden-
tram os pactos individuais (REALE, 2002).

O Princípio da boa-fé objetiva é outra cláusula geral introduzida no Direito Civil por meio do
artigo 422: “Os contratantes são obrigados a guardar assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e boa-fé.” Importante observar que a boa-fé não é facultativa,
mas uma obrigação que se impõe a todos que participam do contrato. Também é necessária, em
cada negócio jurídico celebrado, a eleição de um homem-médio como padrão de conduta para os
contratantes, de modo a se perquirir o que as partes são obrigadas a fazer diante de uma situação
concreta.

Por ser uma cláusula geral, do mesmo modo que a função social do contrato, permite-se ao
juiz preencher a norma abstrata de forma a fazer justiça ao caso concreto, segundo o comporta-
mento que o homem médio teria. Dessa forma, não é possível haver enumeração taxativa de situa-
ções que seu conteúdo possui (RODRIGUES, 2001).

Por meio da boa-fé objetiva, criam-se deveres jurídicos anexos ou de proteção. A observância
da boa-fé objetiva, por ser obrigatória, a criação de deveres para as partes, ainda que estas não
os desejem. Pode-se dizer que os contratantes devem observar entre si a lealdade, assistência,
informação e confidencialidade. Cumpre dizer, como se disse acima, que a enumeração é apenas
exemplificativa, ante o fato do princípio ser cláusula geral (FARO, 2009), o que possibilita sua apli-
cação a mais variada sorte de tipos contratuais.

Por último, a boa-fé objetiva possui função delimitadora do exercício de determinadas obriga-
ções. Os princípios constitucionais da ordem econômica e os fundamentos da República Federa-
tiva do Brasil devem estar presentes nos contratos individuais celebrados, de modo que a boa-fé
objetiva impõe ao juiz delimitar os direitos subjetivos segundo os ditames constitucionais retro men-
cionados. Com efeito, as chamadas cláusulas leoninas carreadas de onerosidade excessiva não
podem ser consideradas como legais, pois ferem os ditames constitucionais mencionados.

140
O princípio da boa-fé objetiva diferencia-se da boa-fé subjetiva. A boa-fé objetiva é cláusula
geral que visa adequar o comportamento dos contratantes segundo o de um homem médio, de
modo a fornecer interpretação social adequada ao caso concreto, impor deveres jurídicos às par-
tes, ainda que não contratados, e delimitar direitos individuais. Já a boa-fé subjetiva é considerada
como sendo a “concepção psicológica da boa-fé” (NERY JUNIOR, 2014), traduzindo-se em uma
situação psicológica de acreditar ou ignorar algo. A boa-fé subjetiva, portanto, é regra de interpre-
tação da vontade expressa nos contratos celebrados.

Assim é de se verificar que os princípios sociais não revogaram princípios clássicos, tão ne-
cessários a dar segurança jurídica aos contratantes e à sociedade. Na verdade, apenas os amol-
dam a uma nova realidade social e jurídica.

OS PRINCÍPIOS SOCIAIS COMO PRINCIPAL MOTOR DE REVI-


SÃO DOS CONTRATOS CIVIS PARA A PROTEÇÃO DOS DIREI-
TOS DE PERSONALIDADE NO DIREITO CIVIL
Como se viu anteriormente, os princípios sociais constituem uma das principais, senão a prin-
cipal evolução do Novo Código Civil, com amplo aspecto de utilização nas mais variadas causas
envolvendo uma relação contratual.

Ocorre que a Constituição Federal já vigia desde 1988, sendo que os valores e princípios
constitucionais obviamente são os mesmos desde a promulgação da Constituição Federal. Mesmo
entre os doutrinadores, os princípios sociais não chegaram a despertar os doutrinadores civis e
constitucionais (TEPEDINO, 2002). Foi como se o direito a revisão estivesse escondido nas entra-
nhas da Constituição Federal.

Com o passar do tempo, contudo, desenvolveu-se a noção de Direito Civil Constitucional, que
culminou com o Novo Código Civil de 2002 que, com a adoção das cláusulas gerais, possibilitou
o norteamento constitucional do direito privado, e em especial a proteção da dignidade da pessoa
humana, bem como outros atributos da personalidade.

A doutrina, de forma geral, no que tange ao tema revisão contratual, pauta-se pela verificação
do cabimento ou não da teoria da imprevisão, prevista no art. 478 do Código Civil ou em uma das
hipóteses dos artigos, 479 e 480 contratual, conforme debatido anteriormente, não são eficientes
o suficiente para dar aos contratantes a possibilidade de se revisionar o contrato de forma a se
corrigir eventuais defeitos que a relação contratual possa ter. Conforme se viu, a Teoria da Imprevi-
são possui o mesmo defeito desde o tempo em que não era positivada na vigência do Código Civil
de 1916, que é a exigência da extraordinariedade e imprevisibilidade do acontecimento, além de
outros requisitos que praticamente a afastam de qualquer evento que não possa ser classificado
como fortuito.

Mas a doutrina tem, ainda, que se ponderar de forma objetiva que a função social do contra-
to pode ser utilizada como forma de revisão contratual, tomando consciência de sua importância

141
no tema, reconhecendo que os princípios sociais tem logrado espaço cada vez mais abrangente
(BARROSO, 2015), mas sem tocar ou se aprofundar na questão da possibilidade de revisão con-
tratual ampla (BRANCO, 2013).

É de se apresentar os princípios sociais como principal meio de revisão contratual previsto


no Código Civil, pois abrangem uma ampla gama de possibilidades para a revisão contratual,
permitindo ao juiz, por meio da utilização das cláusulas gerais, fazer, tanto quanto possível, justiça
ao caso concreto.

Na jurisprudência, tem sido constatado um aumento expressivo na utilização dos princípios


sociais pelos magistrados que, conhecendo e dominando o assunto, tem-se apercebido da possi-
bilidade de se ter uma solução para o caso concreto que se põe em litígio.

Os princípios sociais bem se amoldam à necessidade social de revisar contratos manifesta-


mente contrários aos desígnios da justiça e paz social, mas não como mais uma forma de se revi-
sar, e sim como o principal meio de revisão contratual, praticamente deixando em desuso as outras
hipóteses de revisão previstas no Código Civil.

Logo, é de se afirmar que os princípios sociais são o principal motor de revisão contratual do
Código Civil que, num futuro não distante, a doutrina e a jurisprudência deverão reconhecer tal fato
e dessa forma possibilitar uma melhor proteção aos direitos de personalidade.

CONCLUSÃO
Conforme exposto, é possível asseverar que os direitos de personalidade podem permealizar
o direito civil de forma a possibilitar a revisão dos contratos por meio dos princípios sociais.

É inegável que os princípios sociais, consubstanciados na função social do contrato e na


boa-fé-objetiva, possuem relevância no direito contratual moderno, quer seja pela delimitação da
vontade dos contratantes, quer seja pela possibilidade de modificação de cláusulas contratuais
contrárias aos valores e princípios sociais.

O que é novidade é que a função social dos contratos e a boa-fé-objetiva estejam se tornando
a principal forma de revisão contratual do direito privado, ou seja, estão se tornando o principal mo-
tor de revisão contratual do Direito Civil, absorvendo ou colocando em desuso outras possibilidades
de revisão.

E isso possibilita que os direitos de personalidade possam adentram o clássico direito con-
tratual e possibilitar a modificação de cláusulas contratuais de modo a poder se fazer justiça a um
determinado caso concreto.

142
REFERÊNCIAS
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144
THE SOCIAL PRINCIPLES ASTHE MAIN REVIEW ENGINE OF CIVIL CONTRACTS

RESUMO: The present work aims show the Social Principles of Contracts as the main revisional engine of Civil Right,
absorbing or replacing other theories or contractual review forms and and thereby enable the insertion of personal rights
and their protection in the contractual theory. This find is because the social principles, for being general clauses, allow
interaction with the Constitutional Right and personality rights and with they, limit or adapt the parties will to values and
constitutional principles of generic and abstract character, which allow the Judge, in a concrete case, make justice in
this case. The private right in Brazil always had a liberal connotation, with very limited review possibilities. Basically,
the Unpredictability Theory and the civil responsibility exclusionaries were the accepted hypotheses, in contrast with
the current moment and its ample possibility to review the pacts made by the parties by observing the social principles.

Keywords: Social principles, review, contract.

145
PROTEÇÃO À INTIMIDADE E PRIVACIDADE FRENTE AOS
CADASTROS CONSUMERISTAS

Marcos Claro da Silva


Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas “Antônio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente/SP. Especialis-
ta em Direito Civil e Processo Civil e especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela mesma instituição. Mestrando
do programa de Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina – PR. Oficial de Registro Civil e Tabelião de
Notas em João Ramalho-SP. Endereço eletrônico: marcosclaro@unitoledo.br.

Tânia Lobo Muniz


Doutorado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Docente associada da Universidade Estadual
de Londrina – PR (níveis mestrado e graduação). Endereço Eletrônico: lobomuniz@gmail.com

RESUMO: Este texto discute, de maneira breve, a prática empreendida por fornecedores de produtos e serviços no que
diz respeito aos cadastros de consumidores formados em seus bancos de dados e a consequente distribuição dessas
informações a outras sociedades empresárias. De início, para esclarecer a proposta central deste artigo, analisa-se a
garantia constitucional que assegura a todos o direito de conviver em sociedade com a sua intimidade resguardada.
Fixadas tais ideias, examina-se a disponibilidade dessa garantia fundamental pelos seus titulares, bem como os meios
que autorizam a mesma. Em seguida, aprecia-se os bancos de dados de consumidores e as regras jurídicas que os
regulamenta. Por fim, procede-se avaliação crítica do instituto, que permite a troca de informações dos consumidores
entre fornecedores de produtos e serviços, como hoje se encontra regulado no Código de Defesa do Consumidor, para
chegar à conclusão de que da forma como hoje se formam os bancos de dados existe uma deficiência na legislação de
regência, o que acentua ainda mais os abusos cometidos por fornecedores de produtos e serviços.

Palavras-Chaves: Direito à Intimidade. Direito do Consumidor. Bancos de Dados. Troca de Informações.

INTRODUÇÃO
A modernidade tem trazido – e isso vem sendo discutido diuturnamente - novos desafios à
ciência jurídica. A velocidade das informações, a agilidade na celebração de contratos, a desmate-
rialização dos negócios jurídicos, são alguns desses aspectos.

Dentre esses novos paradigmas surge o tema que aqui se discute: os cadastros consumeris-
tas e a propagação dessas informações entre aqueles que fornecem produtos e serviços.

A celebração de contratos de consumo, notadamente compras realizadas pela internet, exi-


gem cadastro prévio daqueles que pretendem adquirir os produtos ofertados pelo meio empresarial.

Esses cadastros contêm uma gama variada de informações – valiosas aos fornecedores de
produtos e serviços – tais como as preferências pessoais (musicais, esportes que pratica, hobbys
etc.), os produtos que já foram comprados, as pesquisas efetuadas em sítios da internet, dos con-
sumidores que integram esses cadastros
146
É exatamente por conta desses fatores que existe valor agregado a tais informações, situação
que gera um balcão de negócios envolvendo esses bancos de dados, pois é interessante aos
fornecedores de produtos e serviços a garantia de acesso a esses referenciais.

As grandes sociedades empresárias auferem lucros de dois lados: vendendo essas informa-
ções – algumas têm por objeto principal essa prática -, assim como aquelas que adquirem esses
informes, as quais pulverizam o consumidor com anúncios ligados às suas preferências pessoais.

O ingresso em qualquer rede social, uma pesquisa realizada num site de buscas, uma compra
efetuada pela internet, são situações que integram o cotidiano de qualquer pessoa. Quem se vale
desses serviços, entretanto, desconhece que seus dados serão vendidos e são surpreendidos,
quase que no mesmo instante que efetuam uma pesquisa na internet, com um anúncio vinculado
à sua busca.

Essa constatação ganha relevo porque, além de ser afim à garantia constitucional da intimida-
de, está diretamente ligada às normas de proteção e defesa do consumidor.

Isso decorre, sem sombra de dúvidas, do crescente acesso aos meios de comunicação, fa-
cilitando a integração dos consumidores ao meio cibernético, além da recente desaceleração da
economia -, situação que aumentou o poder de compra dos brasileiros.

Assim, no panorama mencionado, torna-se importante discutir e, principalmente, propor pro-


postas legislativas a fim de controlar esses bancos de dados consumeristas, além de garantir o
sigilo da navegação na rede mundial de computadores, de forma a preservar o direito à intimidade.

Há regulamentação desses bancos de dados no Código de Defesa do Consumidor (CDC),


contudo, do modo como é levada a efeito, permite-se que os dados consumeristas sejam compar-
tilhados de forma arbitrária, violando sobremaneira a intimidade dos consumidores, afigurando-se,
por conta disso, como prática abusiva.

Surge a necessidade de se examinar a implantação desses bancos de dados, os meios pelos


quais estas informações são vendidas, a possibilidade de vincular anúncios relacionados com as
preferências/pesquisas realizadas pelos consumidores, para o fim de impor limites e garantir que
nenhuma prática abusiva seja perpetrada.

A par disso, será de grande importância para os fins pretendidos neste trabalho a análise
das normas que hoje regulamentam esses bancos de dados, além dos meios pelos quais são eles
implementados, além da sua forma de utilização, para então considerar os reflexos inerentes às
normas de proteção e defesa do consumidor.

1 CONTEÚDO E ESTRUTURA DA PROTEÇÃO À INTIMIDADE


Para formar adequadamente o raciocínio que será empreendido, é necessário analisar a pro-
teção constitucional que é conferida à intimidade, para se chegar aos limites impostos aos bancos
de dados consumeristas.
147
De forma inicial, cabe salientar que a garantia ao direito de intimidade é encartada pela Cons-
tituição Federal, precisamente no inciso X, do artigo 5º, consignando que são invioláveis a intimida-
de, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas339.

É preciso encarar a noção de intimidade para precisar o seu conteúdo jurídico e estabelecer
adequadamente a proteção que essa garantia dá aos sujeitos. Essa análise deve enxergar primeiro
o sentido semântico do vocábulo intimidade.

Intimidade, segundo Aurélio Buarque de Holanda (2012) significa qualidade de íntimo; vida
íntima, particular; privacidade; trato íntimo. Em linhas gerais quer significar fatos e acontecimentos
privados, os quais o ser humano guarda para si e não tem interesse algum em sua divulgação.

Nessa primeira aproximação, do conteúdo da proteção à intimidade, fica claro que esses fatos
não podem ser divulgados ou utilizados sem o consentimento do titular desse direito.

Todo homem necessita de certo repouso no desconhecimento de sua vida pessoal para convi-
ver em sociedade e produzir adequadamente aquilo que dele se espera, pois, determinados fatos,
caso revelados, podem levar o ser humano à mais inconsequente loucura.

Essa necessidade de manter determinados fatos sob o manto da intimidade é que fez exsurgir
a proteção conferida pela Constituição a esse status, perfazendo, desta forma, a principal finalidade
do instituto.

Pontes de Miranda (2000, p. 209) observa que o direito à intimidade compreende a ideia de:
Resguardar as pessoas dos sentidos alheios, principalmente da vista e dos ouvidos
de outrem; pressupõe ingerência na esfera íntima da pessoa através de espionagem
e divulgação de fatos íntimos obtidos ilicitamente.

Examinando o conteúdo do direito à privacidade por esse viés, chega-se à conclusão de que
o sujeito tem o direito de se ver só, sem a intromissão de pessoas em sua vida íntima, em outras
palavras, as informações inerentes a determinada pessoa devem ser controladas por ela mesma.

Deste modo, não é lícito que alguém se valha de suas liberdades para interferir na vida pri-
vada de determinado sujeito, constituindo essa afirmação a principal limitação atribuída ao meio
social pela garantia fundamental em questão.

Ressalte-se, ainda, que o direito à intimidade consolida os direitos da personalidade, na medi-


da em que a reclusão interna do sujeito o leva a refletir e a se preparar parar novos desafios.

Diante destas necessidades é que reluz a estrutura da garantia fundamental da privacidade,


sedimentando verdadeiro direito público subjetivo àqueles que se encontrarem em território nacio-
nal.

339 Constituição Federal de 1988, artigo 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros, e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade nos termos seguintes:
[...]
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização
148 pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Isso porque, a qualificação dada ao estado de intimidade do sujeito – de se encontrar livre
de quaisquer interferências em sua vida privada, bem como nos fatos que lhes digam respeito -,
lhe atribui verdadeiro estado, sujeitando aqueles que o violarem às consequências previstas pelo
ordenamento.

Por conta desse raciocínio é que se conclui que o direito à intimidade, quando atacado por
qualquer desautorizado, abrirá a pretensão para o ofendido em se ver reparado, na linha do que
preceitua a parte final do inciso X, do artigo 5º, da Constituição Federal.

É nesse cenário que surge o conceito inerente ao direito de intimidade, tido como direito
subjetivo conferido aos sujeitos de se verem livres de qualquer interferência em sua vida privada,
garantindo-se indenização a eventuais lesões a esse estado (MENDES, 2013, p.282).

Corroborando as deduções acima delineadas, Tércio Sampaio Ferraz Jr. (1992, p. 77), enten-
de que esse direito é:
[...] um direito subjetivo fundamental, cujo titular é toda pessoa, física ou jurídica, bra-
sileira ou estrangeira, residente ou em trânsito no país; cujo conteúdo é a faculdade
de constranger os outros ao respeito e de resistir à violação do que lhe é próprio;
isto é, das situações vitais que, por só a ele lhe dizerem respeito, deseja manter para
si, ao abrigo de sua única e discricionária decisão; e cujo conteúdo é a integridade
moral do titular.

Analisando o direito fundamental de maneira mais estrita, Gilmar Ferreira Mendes (2013, p.
283) conceitua a garantia da seguinte forma:
O direito à privacidade, em sentido mais estrito, conduz à pretensão do indivíduo de
não ser foco da observação por terceiros, de não ter os assuntos, informações pes-
soais e características particulares expostas a terceiros ao público em geral.

Em linhas gerais, a garantia à vida íntima e privada consigna a ideia de que todo homem deve
ter reservado espaço íntimo para desenvolver plenamente a sua personalidade, situação que é
reconhecida e consequentemente resguardada pela Constituição Federal.

Há muito tempo se reconhece, nos mais diversos ordenamentos340, a importância da garantia


fundamental de proteção à intimidade, para preservar o sujeito de intromissões indesejadas em sua
vida privada.

Diversos documentos consagram a evolução história dos direitos fundamentais, dentre eles
o direito à privacidade, sendo os mais importantes a Magna Carta da Inglaterra de 1215, as Decla-
rações Americanas de Direitos em diversos Estados em 1776, além da Declaração de Direitos do
Homem e do Cidadão na França, no ano de 1789 (MORI, 2004, p. 17).

No entanto, há de se admitir que, atualmente, diante da viralização de informações na inter-


net, e a consequente distribuição desenfreada de qualquer conteúdo, o direito de intimidade deve
ser revisitado, para tornar sua estrutura consuetudinária ao panorama social que se aventa.

340 Nos Estados Unidos da América, o direito à privacidade foi cunhado de Warren e Brandeis, quando, em 1890,
escreveram artigo intitulado Right to Privacy, já se preocupando com novas tecnologias, como as máquinas de foto-
grafia e o nascimento dos grandes jornais (BRANDÃO, 2013) 149
Daí porque, principalmente quando se fala em cadastros de dados consumeristas e a conse-
quente propagação das informações que pertencem aos consumidores na rede mundial de com-
putadores, é importante discutir o direito de intimidade e privacidade e garantir efetivamente o seu
respeito em tais relações.

Em outro campo deve-se discutir os limites impostos à garantia fundamental da privacidade,


notadamente a restrição que pode ser aposta a esse estado com o consentimento do indivíduo
titular desse direito, já que deve haver, para distribuição de informações dos consumidores, autori-
zação para tanto.

Obviamente nenhum direito fundamental pode ser objeto de renúncia plena, situação que, se
admitida, cercearia totalmente o seu exercício, provocando consequências e prejuízos imprevisí-
veis.

Há dissenso, segundo aponta Gilmar Ferreira Mendes (2013, p. 280), a respeito da necessi-
dade do consentimento a ser dado pelo indivíduo ser expresso ou tácito, discussão a qual não se
atenta neste trabalho, tendo em conta que o consentimento do consumidor deve ser expresso para
que seus dados possam ser divulgados.

Admite-se, no sistema jurídico brasileiro, a publicização de informações pessoais dos sujeitos


quando estes autorizarem essa divulgação, situação que limita o direito à intimidade e está diame-
tralmente ligada ao objeto central deste escorço.

Essas considerações introdutórias são necessárias para balizar o que será discutido, já que o
direito à intimidade é ligado ao fornecimento de dados de consumidores. Não há como negar que
esse direito é violado quando fornecedores entregam esses dados a um sem número de pessoas
sem qualquer consentimento daquelas as quais se referem.

Preservar a intimidade frente ao uso da internet é tarefa árdua que deve ser devidamente
encarada por quem estuda o Direito, para que a realidade social não descambe e passe a descon-
siderar os anseios individuais.

A situação é agravada quando se utiliza dados pessoais íntimos com o objetivo de massificar
o consumo, propalando anúncios das mais diversas naturezas com base nas informações forneci-
das pelos próprios consumidores.

Esse tipo de propaganda pode ocasionar diversos prejuízos sociológicos, levando ao con-
sumismo desenfreado, o endividamento compulsório, influenciando sobremaneira na autonomia
de vontade – já tão mitigada em relações de consumo - que deve nortear toda e qualquer relação
contratual.

Ante a utilização irracional das informações passadas pelos próprios consumidores para en-
gendrar anúncios, chega-se ao ponto de se dizer que os consumidores são obrigados a consumir,
pois atingem um estado de consciência no qual acreditam que realmente necessitam daquele pro-
duto, mesmo que não precisem.

150
É nesse ponto que surge a imposição de se revisitar o conceito de privacidade/intimidade
para alcançar essas situações e impedir que consumidores se tornem vítimas de suas próprias
preferências.

Após essas conclusões, é importante analisar a estrutura normativa dos bancos de dados
consumeristas estabelecida no Código de Defesa do Consumidor, o que será feito no próximo ca-
pítulo.

2 BANCOS DE DADOS CONSUMERISTAS: DISCIPLINA NO CÓ-


DIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Os cadastros e bancos de dados de consumidores lidam com um dos mais importantes direi-
tos da personalidade: o nome. Inevitavelmente toda pessoa possuirá nome como seu sinal desig-
nativo gozando da proteção que é dada pelo ordenamento jurídico ao instituto.

O Código de Defesa do Consumidor disciplina, nos seus artigos 43 a 44, a formação dos ban-
cos de dados consumeristas bem como os cadastros de consumidores. Antes de tratar do cadastro
de consumidores é importante diferenciá-lo dos bancos de dados.

Nos cadastros de consumidores a fonte da informação é o próprio consumidor conquanto nos


bancos de dados os informes são realizados pelos fornecedores. Outra distinção é a finalidade de
ambos, pois os cadastros de consumidores têm por fim formar um perfil do consumidor enquanto
os bancos de dados visam subsidiar o fornecimento de crédito (MARQUES, 2004, p. 283).

Especificada as diferenças, passa-se a tratar dos cadastros de consumidores, objeto central


deste trabalho. A principal funcionalidade dessa espécie de arquivamento é formar um perfil do
consumidor, de modo a subsidiar os fornecedores para a celebração de futuras vendas.

Para a formação desse cadastro de consumidores é necessário consentimento de quem for-


necerá os dados, já que essa prática influi diretamente nos direitos da personalidade e na intimida-
de das pessoas. Essa necessidade decorre da proteção constitucional dada a esses valores.

A regulação do Código de Defesa do Consumidor estabelece que esses dados formadores do


perfil de quem irá consumir devem ser utilizados somente por quem os colheu. Entretanto, essas
informações contêm grande valor comercial, e são repassadas entre fornecedores de produtos e
serviços a fim de potencializar o consumo.

Além disso, há empresas que têm como objeto principal o fornecimento desses dados. Cite-
-se a título de exemplo o Google, entidade especializada em buscas na internet, a qual associa a
pesquisa efetuada pelo consumidor e automaticamente vincula anúncios afins àquela busca quase
que instantaneamente.

Sobre essas evidências, Têmis Limberger (2007, p. 196), conclui que:


A necessidade de proteger o cidadão juridicamente se origina no fato de que os da-
dos possuem um conteúdo econômico, pela possibilidade de sua comercialização.
Devido às novas técnicas da informática, a intimidade adquire outro conteúdo, uma 151
vez que se tenta resguardar o cidadão com relação aos dados informatizados. Um
cadastro pode armazenar um número quase ilimitado de informação. Assim, o indi-
víduo que confia seus dados deve contar com a tutela jurídica para que estes sejam
utilizados corretamente, seja em entidades públicas ou privadas. Os dados traduzem
aspectos da personalidade e revelam comportamentos e preferências, permitindo
até traçar um perfil psicológico dos indivíduos.

Nessa mesma linha de raciocínio, e também como exemplo, as redes sociais armazenam as
preferências dos consumidores e vendem esses dados para a publicação de anúncios similares.

Percebe-se que, no estágio atual, os consumidores já estão habituados a essa prática, forne-
cem seus dados e consentem com essa transmissão concordando com termos intermináveis que
lhes são submetidos.

Portanto, os dados entregues pelos consumidores de forma autorizada a essas entidades


acabam sendo repassados ante o seu valor de comércio, sem que o consumidor seja cientificado
dessa circunstância.

Ademais, os dados que são distribuídos na internet ganham liberdade incontrolável e passam
a um estágio no qual não mais voltarão ao desconhecimento, em outras palavras, após as trans-
missões eletrônicas impossível que o consumidor mantenha o sigilo daqueles dados seus, vale
dizer, nunca mais serão íntimos.

Trazendo as lições do acima deduzido para um contexto maior, pode-se dizer que essa cir-
cunstância viola o sistema implantado pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o con-
sumidor é levado a distribuir indiscriminadamente seus dados, configurando prática abusiva nos
termos daquele.

Ora, não é permitido, da forma como hoje se faz, que o consumidor se armadilhe e seja sub-
metido a anúncios vinculados às suas preferências pessoais, além disso, é forçado a consumir,
violando, conforme já se disse, a autonomia da vontade na celebração contratual.

A respeito dos cadastros de consumidores, Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin


(1997, p. 329), ensina que:
O vocábulo ‘banco de dados’ carreia a idéia de informações organizadas, arquivadas
de maneira permanente em estabelecimento outro que não o do fornecedor que dire-
tamente lida com o consumidor; ali ficam, de modo latente, à espera de utilização. A
abertura do arquivo no banco de dados nunca decorre de solicitação do consumidor.
Muito ao revés, é inteiramente feita à sua revelia. Finalmente, não é o arquivista o
destinatário das informações armazenadas, mas, sim, terceiros, sendo ele mero veí-
culo para circulação destas.

É necessário, consoante dispõe os artigos 43 e 44341 do Código de Defesa do Consumidor,

341 Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadas-
tros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas
fontes.
§ 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil
compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos.
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao
consumidor, quando não solicitada por ele.
152 § 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata
que haja consentimento expresso para que os dados sejam utilizados.

Em breve síntese essa é a estrutura dada aos cadastros de consumo disciplinada pelo Código
de Defesa do Consumidor, a qual não abrange todas as situações cotidianas, principalmente no
que concerne à navegação na internet.

3 CONSUMISMO DESENFREADO E CADASTROS DE DADOS


CONSUMERISTAS: ANÁLISE CRÍTICA AO SISTEMA
Vive-se hoje numa sociedade de consumo. Todo aquele que possua condições para tanto
celebrará, ao menos uma vez ao dia, um contrato regido pelo direito do consumidor.

Diante do momento pelo qual a sociedade moderna passa, a incomensurável aceleração


vivida pelo homem além da incrível ascensão dos meios de comunicação, surgiram inúmeras pos-
sibilidades para se consumir. A sociedade hoje é da informação.

Nesse panorama os dados de consumidores são processados e avaliados pelos mais diver-
sos setores, com tecnologias cada vez mais avançadas. A tendência, ante a legislação consume-
rista vigente, é que o direito à intimidade dos consumidores sucumba.

Da forma como estabelece o código não há proteção suficiente aos consumidores. Há a ne-
cessidade de inserir o dever de informação, para que se esclareça verdadeiramente as funções do
cadastro ao qual determinada pessoa passará a pertencer.

Surge também desse panorama a necessidade de regulamentar o tratamento desses dados,


os meios pelos quais são compartilhados, para que esse processo se torne mais seguro e viabilize
a identificação dos responsáveis no caso de danos à intimidade dos consumidores.

De outro lado, deve haver preocupação também com a autorização a ser dada pelo consumi-
dor, somente permitindo-se a transmissão de dados entre fornecedores caso haja expressamente
autorização para tanto.

Ainda, quanto à publicidade que é dirigida ao consumidor por intermédio desses dados, é ne-
cessário que ele expressamente consinta em ser alvo dessas práticas (envio de e-mails com anún-
correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das
informações incorretas.
§ 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são
considerados entidades de caráter público.
§ 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos
Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito
junto aos fornecedores.
§ 6o  Todas as informações de que trata o caput deste artigo devem ser disponibilizadas em formatos acessíveis,
inclusive para a pessoa com deficiência, mediante solicitação do consumidor. 
Art. 44. Os órgãos públicos de defesa do consumidor manterão cadastros atualizados de reclamações fundamenta-
das contra fornecedores de produtos e serviços, devendo divulgá-lo pública e anualmente. A divulgação indicará se a
reclamação foi atendida ou não pelo fornecedor.
§ 1° É facultado o acesso às informações lá constantes para orientação e consulta por qualquer interessado.
§ 2° Aplicam-se a este artigo, no que couber, as mesmas regras enunciadas no artigo anterior e as do parágrafo
único do art. 22 deste código.
153
cios, robôs vinculadores de anúncios), e não seja compulsoriamente submetido a esse tratamento.
Além disso, deve se disponibilizar ao consumidor maneiras efetivas de evitar que essas práticas se-
jam levadas a termo, estabelecendo punições àqueles que descumprirem as determinações legais.

Ademais, a regulação também deve abranger as formas pelas quais o consumidor terá aces-
so aos dados fornecidos, possibilidade de correção dos dados ali presentes, além de consignar
adequadamente meios para que o cadastro seja excluído a critério do consumidor.

Nesse passo, e apresentando a necessidade de regular o tratamento desses dados, Laura


Schertel Mendes (2014, p. 60) estabelece que:
Não obstante, entende-se que o caminho ideal para se assegurar o direito básico
do consumidor à proteção de dados seria a positivação desse direito no Código de
Defesa do Consumidor. Assim, consideramos adequado e de extrema relevância o
projeto de atualização do Código de Defesa do Consumidor [...]

Continua a articulista assentando suas premissas na necessidade de inserção de dispositivos


no Código de Defesa do Consumidor (2014, p.60):
Nesse sentido, à luz de todo o exposto, entendemos que seria importante a inserção
de dois dispositivos legais no Código de Defesa do Consumidor [...] Enquanto um
artigo poderia regular, de forma geral, o tratamento de dados pessoais nas relações
de consumo, um segundo dispositivo abordaria, especificamente, as medidas de
segurança a serem adotadas pelo responsável pelo banco de dados. Os seguintes
preceitos poderiam nortear essa regulação:

1. Como princípio geral de uma norma sobre o processamento de dados nas rela-
ções de consumo, é importante prever que o tratamento de dados pessoais seja
realizado de forma transparente e de acordo com a boa-fé;

2. Regra básica para a coleta, o processamento, a transferência ou o uso dos dados


pessoais deve ser o consentimento expresso informado do consumidor, salvo se in-
dispensável para a execução do contrato ou de uma obrigação legal do fornecedor;

3. Em relação às atividades de marketing direto, é importante estabelecer o direito do


consumidor de não receber qualquer comunicação relativa a oferta ou publicidade de
produtos ou serviços para os quais não tenha dado seu consentimento;

4. A regulação deve prever também os direitos do consumidor de acesso aos dados


pessoais armazenados, de retificação dos dados incorretos ou não atualizados e de
cancelamento dos dados que tenham sido coletados de forma ilegal ou cujo consen-
timento tenha sido revogado por ele;

5. É fundamental prever regras a respeito do tratamento de dados sensíveis, tais


como os dados que revelem a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, filo-
sóficas ou políticas, ou os referentes à saúde e à vida sexual, de modo a proteger o
consumidor contra os riscos de discriminação e estigmatização.

Nessa linha de raciocínio conclui-se que a necessidade de regular essas novas dimensões é
extremamente importante e preservará o direito à intimidade consagrado constitucionalmente.

O consumidor, diante do cenário atual, se vê massacrado pela massificação que o entorna


quando acessa a internet, o que leva ao consumismo em massa, violação do direito de intimidade
154
dos consumidores, além de impingir diversas ofensas aos seus direitos da personalidade.

Nesse passo, a proteção ás informações dadas por consumidores merece atenção especial e
demanda análise rápida, para não se sobrepor ao direito de intimidade de todos e extinguir definiti-
vamente os anseios íntimos necessários ao desenvolvimento regular de todo ser humano.

CONCLUSÃO
Várias foram as conclusões aqui obtidas, as quais serão salientadas nas linhas que seguem.

Num primeiro momento, procurou-se precisar o conceito do direito à intimidade, para o fim de
nortear os preceitos centrais deste trabalho, analisando também a estrutura da garantia fundamen-
tal em questão, chegando-se à conclusão de que ela nasceu para proteger os sujeitos daqueles
que pretendam interferir na esfera íntima de cada ser.

É dessa forma que a garantia fundamental à intimidade pode ser entendida como direito
subjetivo que guarnece ao sujeito o respeito ao segredo das informações íntimas relativas à sua
imagem, assegurado o direito de indenização caso haja violação a esse estado.

O direito à intimidade se relaciona de forma central com os cadastros de dados dos consumi-
dores, já que há a manipulação de dados que, em princípio, deveriam estar sob o manto da priva-
cidade, extrapolando, entretanto, o controle de quem terá acesso a tais informes.

Segundo as premissas estabelecidas, há uma desvalorização do direito à intimidade frente à


construção dos bancos de dados consumeristas, e essa desvalorização acontece na mesma velo-
cidade em que as informações são propagadas na rede mundial de computadores.

Assim, a respeito ainda do direito à intimidade, é necessário que o consumidor consinta ex-
pressamente quando o referido direito poderá ser relativizado, caso contrário vedada está a utiliza-
ção das informações por ele prestadas.

Nesse aspecto, o atual estágio de regulação desses bancos de dados no Código de Defesa do
Consumidor não satisfaz o panorama social moderno. Isso porque, o CDC não abarca de maneira
abrangente todas as situações que podem advir dessas relações e deixa claros aptos a propiciarem
abusos por parte de quem manipula esses dados, causando constrangimentos e aborrecimentos
cotidianos a um sem número de consumidores.

Por fim, discutidas e propostas inserções no Código de Defesa do Consumidor, de maneira a


regulamentar satisfatoriamente essas relações e a formação estrutural desses cadastros (tais como
a necessidade de consentimento do consumidor para a inserção de seus dados nesses cadastros,
o estabelecimento de meios aptos a identificar quem se utiliza dos mesmos, a possibilidade de se
desvincular de qualquer meio de marketing associado a essas preferências, além da proteção de
dados que possam causar preconceito ou estigmatização social), é de se destacar, como conclu-
são primordial, que o cenário atual sugere as referidas alterações, consignando que incida sobre
as atividades empreendidas na internet determinado controle, pois os dados insertos nesse meio
estão sempre sujeitos à se dispersarem, causando danos irreparáveis. 155
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WARREN, Samuel D.; BRANDEIS, Louis. The right to privacy. Harvard Law Review, n. 5, 1890

156
PROTECTING PRIVACY AND PRIVACY AHEAD TO CONSUMERS REGISTERS
ABSTRACT: This scientific outline discuss, briefly, the practice undertaken by suppliers of goods and ser-
vices in respect of records of consumers supplied to them and the consequent distribution of these data to
other commercial companies. At first, to clarify the central purpose of this Article shall be examined to ensure
that constitutional guarantee everyone the right to live in society with its sheltered intimacy. Such fixed ideas,
will pass-analysis of the availability of this fundamental guarantee for their holders, as well as the means that
allow the same availability. Then far shall be analysis of consumer data banks, and the legal framework that
regulates these banks. Finally, will be making a critical analysis of the institute that allows the exchange of
information among consumer products suppliers and service as today is regulated in the Consumer Protec-
tion Code.

Key Words: Right to Privacy. Consumer Law. Databases. Information exchange.

157
A LIBERDADE RELIGIOSA E OS SEUS LIMITES DIANTE DO
DIREITO À VIDA342

Lorena Barbosa de Mello


Acadêmica do curso de Direito do Centro Universitário Cesumar (UNICESUMAR) e bolsista de Iniciação Científica da
Fundação Araucária. Membro do Grupo de Pesquisas (CNPq) Internacionalização do direito: dilemas constitucionais e
internacionais contemporâneos. E-mail: lorenamello8@gmail.com

Daniela Menengoti Ribeiro


Professora do Programa de Mestrado em Ciências Jurídicas e da graduação em Direito do Centro Universitário de
Maringá (UNICESUMAR). Coordenadora/Líder do Grupo de Pesquisas (CNPq) Internacionalização do direito: dile-
mas constitucionais e internacionais contemporâneos. Pesquisadora do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e
Inovação (ICETI). Doutora em Direito-Relações Econômicas Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC/SP) com período de pesquisa (doutorado sanduíche) na Université Paris 1 - Panthéon-Sorbonne,
França. Mestre em Direito-Relações Internacionais, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com período
de pesquisa no Mestrado em Integrazione Europea da Università Degli Studi Padova, Itália. E-mail: daniela.ribeiro@
unicesumar.edu.br

RESUMO: A presente pesquisa científica sobre a fundamentação ontológica da liberdade religiosa e do direito à vida,
encontra sua justificativa no próprio estado atual da investigação filosófica jurídica em torno dos direitos fundamentais.
Através de referenciais teóricos, é possível estabelecer que a liberdade religiosa, constituída como um direito funda-
mental, em alguns casos acaba por violar a vida daqueles que se encontram num quadro de vulnerabilidade. Tratar-
-se-á do problema do sacrifício humano em culturas afro-brasileiras e indígenas, e do conflito entre o direito à vida e à
liberdade religiosa.

PALAVRAS-CHAVES: Liberdade religiosa; Direito à vida; Direitos fundamentais.

INTRODUÇÃO
Fatos históricos conhecidos mundialmente nos mostram como a vida das minorias e dos
vulneráveis foi violada, desde as atrocidades ocorridas durante a inquisição na idade média, até o
holocausto no Séc. XX. Após as duas Guerras Mundiais, grandes nações se reuniram para colocar
um fim à barbárie que vinha se perpetuando contra a vida humana.

Uma das soluções encontradas pela Sociedade Internacional para contornar esse problema,
foi a criação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, 1948, que traz as seguintes palavras
“art. 3º Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal’’.

Assim como a vida, a liberdade são direitos garantidos a todos, porém, quando a liberdade
religiosa é exercida sem responsabilidade, ou seja, quando acaba por eliminar uma vida inocente,
tendo como “pretexto” a livre prática de cultos religiosos que sacrificam seres humanos como forma
de oferenda; ou também determinam a forma de viver das pessoas, cabe ao Estado, através de
342 Este trabalho é fruto das pesquisas realizadas pela acadêmica Lorena Barbosa de Mello, bolsista da Fundação
Araucária, junto ao Programa de Iniciação Científica do Centro Universitário de Maringá (UNICESUMAR), e contou
158 com a orientação da Daniela Menengoti Ribeiro.
legislação adequada, colocar o direito à “vida” acima do direito fundamental à “liberdade”. Sendo
assim, tocar-se-á em um ponto crucial para a Teoria dos Direitos, ou seja, o permanente conflito
entre direitos igualmente fundamentais.

Tendo como base os preceitos legais, tanto no âmbito internacional quanto nacional, é ga-
rantido o direito à vida e à liberdade religiosa. Mas as questões que se põe são as seguintes: Qual
direito deve prevalecer em caso de conflito? Até onde vai a liberdade religiosa e de que forma o
Estado pode intervir quando esta liberdade acaba por violar um bem maior, a vida?

O problema da relação entre a “liberdade religiosa” e o “direito à vida” torna-se merecedor


de uma pesquisa jurídico científica, quando o apelo a tal liberdade sem limites, pode conduzir à
violação da vida ou da integridade física e psíquica de pessoas inocentes. Trabalhar-se-á em três
momentos distintos, primeiramente, far-se-á uma análise da questão religiosa indígena no Brasil,
deixando clara a existência real do problema do sacrifício humano; depois, em um segundo mo-
mento, trabalhar-se-á novamente com a questão do problema do sacrifício humano, no que tange
à questão religiosa afro-brasileira; em um terceiro momento, trabalhar-se-á os fundamentos filosó-
ficos, jurídicos e antropológicos dos direitos à vida e à liberdade religiosa, analisando como esses
direitos entram em conflito quando fala-se em “direitos constitucionais”.

1 O ATENTADO CONTRA A VIDA NAS RELIGIÕES AFRO-BRA-


SILEIRAS E INDÍGENAS EM RELAÇÃO AOS MAIS FRÁGEIS E
VULNERÁVEIS
Por ser um país de grande extensão territorial e ter como marca principal a mistura de raças e
culturas, o Brasil apresenta inúmeras religiões. Algumas formas de culto dentro das religiões afro-
-brasileiras e indígenas acabam por violar o direito à vida daqueles mais frágeis e vulneráveis, que
se concretiza através do sacrifício humano.

É importante destacar o entendimento de que os rituais indígenas se constituem como


verdadeiros rituais religiosos, em razão da sua vinculação espiritual. Nesse sentido, tanto os rituais
afro-brasileiros quanto os praticados em tribos indígenas serão tratados como “religiosos”.

Trabalhar-se-á esse problema religioso e cultural dentro da população indígena Yanomami343,


que pratica o sacrifício de crianças por inúmeros motivos; no que tange a questão religiosa afro-bra-
sileira, mostraremos o real problema existente dentro da religião Umbanda.

1.1 YANOMAMIS E O SACRIFÍCIO DE JOVENS E CRIANÇAS

Sabe-se que os indígenas habitam o país antes da chegada dos primeiros colonizadores em
1500, entretanto, grupos como os Tupis e alguns grupos Tapuia praticavam atos de canibalismo;

343 O etnônimo “Yanomami” foi produzido pelos antropólogos a partir da palavra yanõmami que, na expressão
yanõmami thëpë, significa “seres humanos”. Essa expressão se opõe às categorias yaro (animais de caça) e yai (se-
res invisíveis ou sem nome), mas também a napë (inimigo, estrangeiro, “branco”). 159
esses atos estavam relacionados à questão religiosa, pois os índios acreditavam que ao ingerir a
carne do sacrificado iriam obter toda a coragem e a habilidade dele.

Segundo Eduardo Bueno,


A vítima era capturada no campo de batalha e pertencia àquele que primeiro a hou-
vesse tocado [...] O carrasco desferia um golpe de tacape na nuca da vítima [...] A
seguir, o cadáver era assado e escaldado, para permitir a raspagem da pele. (BUE-
NO, 2012, p. 22-23)

A prática, acima, demonstra que mesmo com o passar dos séculos alguns grupos indígenas
ainda realizam esse tipo de sacrifício, mesmo que não consista mais em antropofagia, os sacrifícios
rituais de cunho religiosos violam a vida humana.

Os Yanomamis são povos que habitam a região da floresta amazônica na fronteira do Brasil
com a Venezuela. Atualmente há, dentro da floresta amazônica, cerca de 35 mil Yanomamis. Os
dados segundo o DSEI344 Yanomami, Sesai-2011, no Brasil são 19.338 Yanomamis que habitam os
Estados de Roraima e do Amazonas (Enciclopédia Escolar Britannica, web, 2016)

De acordo com Moscoso (2010, p. 26) “A tribo manteve sua cultura ilesa por causa das difi-
culdades de acesso à região [...]. Portanto, quase não houve aculturação que comprometessem
os costumes”. Partindo desse viés, é possível ver que por serem povos que tiveram pouco contato
com outras culturas, ainda apresentam como prática comum o sacrifício de jovens e recém-nasci-
dos que, devido a vários fatores, não são aceitos pela mãe e nem pela tribo.

Pode-se caracterizar esse sacrifício, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, como
infanticídio (homicídio de crianças), pois quando as mães dão à luz os bebês acabam retirando
suas vidas pelos seguintes motivos: por nascerem com alguma deficiência; por nascerem gêmeos,
pois as mães e a tribo acreditam que um dos recém-nascidos é um espirito mal; também, por gra-
videz indesejada e fruto de adultério.

Segundo reportagem exibida pelo Fantástico (2014), em Caracaraí, uma cidade situada no
Estado de Roraima, com pouco mais de 19 mil habitantes, a prática do infanticídio ainda é verifica-
da:
As mulheres vão sozinhas para a floresta. Lá, depois do parto, examinam a criança. Se
ela tiver alguma deficiência, a mãe volta sozinha para a aldeia [...] dependendo da tribo
e acabam sendo envenenados, enterrados ou abandonados na selva. Uma tradição co-
mum antes mesmo de o homem branco chegar por lá, mas que fica geralmente escondi-
da no meio da floresta. (FANTASTICO, 2014)

O trecho acima mostra como a prática é realizada e como é possível perceber que as vítimas
não passam de crianças que se encontram num estado de fragilidade e vulnerabilidade. Segundo a
mesma reportagem, foram apresentados os números de homicídios na cidade de Caracaraí:
344 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) foram criados pela Lei nº 9.836 de 24 de setembro de 1999 e
correspondem a unidades de responsabilidade sanitárias federais de uma ou mais terras indígenas. A Lei dispõe so-
bre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes e dá outras providências, além de instituir o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. (PLANALTO.
Lei nº 9.836, de 23 de setembro de 1999, web, 2016)

160
O autor do levantamento feito para o Ministério da Justiça, o pesquisador Júlio Jacobo,
da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, não tinha ideia da prática. [...] “E
começamos a ver que realmente era uma cultura indígena meio não falada, meio oculta”,
diz o pesquisador. [...] Caracaraí, no interior de Roraima, se transformou no município
mais violento do Brasil. São 210 homicídios para cada 100 mil habitantes. A média nacio-
nal é 29 homicídios para cada 100 mil habitantes. (FANTASTICO, 2014)

Tal problema não aflige somente a sociedade não indígena, mas também as próprias mães
indígenas que em alguns casos não querem retirar a vida de seus bebês e ficam sob a coação da
tribo que vê o recém-nascido com uma limitação física ou psíquica como um “peso” para a mãe e
para a aldeia; além disso, tem o caso dos bebês que são frutos de adultério ou que nascem gê-
meos, considerados “amaldiçoados”.

A religião indígena é uma extensão de sua cultura, pois traz consigo a crença em espíritos; no
entanto, a questão deixa de ser tão somente “cultural” a partir do momento em que um bem maior
– a vida do inocente – torna-se, do ponto de vista jurídico, inferior em relação à liberdade religiosa.

1.2 RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA E O SACRIFÍCIO HUMANO

Dentro de algumas religiões afro-brasileiras ocorre a prática de sacrifícios em seus cultos,


sem que se tenha em vista as consequências negativas que podem acarretar à sociedade como
um todo, em razão da violação de direitos fundamentais consolidados. Isso se dá pelo abuso do
poder de Religião, sendo que a consequência desse abuso, muitas vezes, acarreta a violação da
integridade psíquica e até mesmo o fim da vida dos próprios integrantes da Religião ou de terceiros,
sem pensar nos possíveis problemas que surgirão a partir daí.

Pode-se esperar que, apesar de cada religião ter sua própria hierarquia de valores, ou seja,
a forma como ela exerce seu culto, esteja de acordo com o ordenamento jurídico ao qual essa co-
munidade esteja subordinada. Assim, os integrantes de religiões afro-brasileiras devem respeitar o
que a lei brasileira estabelece.

Diferente do que ocorre com os indígenas, que vivem em situações de isolamento cultural,
sendo ainda considerados pela lei brasileira como silvícolas345, portanto, incapazes perante o direi-
to pátrio, os pertencentes às religiões afro-brasileiras estão inseridos na sociedade. Sendo assim,
esses têm o dever de conhecer os preceitos legais, e, portanto, são conscientes dos ilícitos que
cometem.

Dentro das religiões afro-brasileiras, tratar-se-á, neste capitulo, da Quimbanda (lado oculto da
umbanda), em razão dos relatos de uso de magia negra e sacrifício humano presentes nos rituais.

Para que se possa entender por que ocorre o fenômeno do sacrifício humano dentro dessa
religião há a necessidade de que se análise algumas características relevantes. A religião Umban-
da teve seu início entre as décadas de 1920 e 1940, tendo como marco a mistura de elementos
de outras religiões, entre elas o sincretismo hindu-cristão guiado pelo espiritismo Kardecista de
origem europeia e tradições advindas do catolicismo (GAARDER; HELLERN; NOTAKER, 2001,
345 Art. 4º, parágrafo único do Código Civil: “A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial”. 161
p.324-325).

Antes de tudo, é preciso deixar claro que a Umbanda tem, em sua essência, a prática do
bem e da caridade, estando situada ao lado “direito” da Religião, enquanto a quimbanda situa-se
do lado “esquerdo” em contraposição à Umbanda. Segundo Gaarder, Hellern e Notaker (2001) “O
Candomblé é a mais poderosa matriz negra da umbanda. Dele a umbanda herdou o que ela tem de
básico e de luxo, seu traço afro fundamental: o panteão aos orixás [...]”. Os orixás são forças da na-
tureza, semelhante a deuses, cada devoto tem um orixá, sendo que esse orixá, muitas vezes, não
pode ser caracterizado inteiramente como bom ou mal. Há orixás que estão relacionados ao lado
sombrio da Umbanda, a Quimbanda, conhecidos como espíritos das trevas; no caso aqui o “exu”,
sendo considerado um orixá que tem uma ligação com espíritos diabólicos (GAARDER; HELLERN;
NOTAKER, 2001).

Os exus são considerados espíritos irresponsáveis, ou seja, são espíritos sombrios e maus,
sendo que muitas vezes quem está possuído pelo espírito mau, acaba por praticar atos violentos
(da doença à desordem). Os trabalhos de magia negra pertencentes à Quimbanda (lado oculto
da Umbanda) são realizados contra terceiros, pelo próprio homem movido por um interesse torpe,
vislumbrando vantagem encima dos mais frágeis e vulneráveis.

Por mais que essas práticas, relacionadas ao lado oculto da religião, sejam reprovadas so-
cialmente, ainda há aqueles que persistem em realizá-las; segue abaixo um caso de magia negra
ocorrido no Brasil:
Casal confessa tortura de menino em rituais de magia negra, diz delegada: Eles foram presos
nessa terça-feira 23 de fevereiro de 2016; filhas do casal assistiam aos rituais. [...] Con-
forme a delegada, o casal disse que adotou a criança em maio de 2015 já com a intenção
de sacrificá-la em rituais de magia negra e que as agressões também aconteciam em
outras situações. [...] O menino tinha queimaduras no rosto, um dos braços quebrados,
ferimentos nos olhos, no saco escrotal e vários hematomas. A córnea de um dos olhos
foi atingida e ele ficou cego. A visão do outro olho pode ficar comprometida. (Pavão e
Castro, 2016).

O fato ocorreu na cidade de Campo Grande, no Estado de Mato Grosso do Sul, onde as au-
toridades policiais reconheceram os tios da criança, que disseram estar possuídos pela entidade
espiritual e torturavam o sobrinho de quatro anos e oito meses com o intuito de benefícios finan-
ceiros. Nesse caso, pode-se observar como a violação da integridade física e psíquica de terceiros
está associada à prática religiosa, principalmente àqueles que de alguma forma se encontram mais
vulneráveis.

2 O DIREITO À VIDA E A LIBERDADE RELIGIOSA


O direito à vida está diretamente relacionado ao imperativo religioso, ético e jurídico “Não
matarás”, quinto mandamento do decálogo. Para ser eficaz, esse imperativo deve ser válido em
sentido absoluto, deve ser “categórico” porque a vida humana é o valor primordial enquanto condi-
ção para todos os demais valores; ou dito em outras palavras, é um imperativo categórico por que:

162
- “categórico” é o valor da vida que esse imperativo pretende proteger;

- impõe um dever perfeito em vista de proteger o valor primordial da vida humana, comum
a todos os indivíduos humanos, da fecundação à morte natural;

- não tem outros argumentos para impor-se senão a sua própria força, porque o “dever”
vai cumprido por princípio, independentemente das suas razões, sem nenhuma consideração das
circunstâncias em que vem vez por vez aplicado;

- porém, ele não prescreve outra conduta que aquela assumida por livre decisão no respei-
to do dever.

Nem mesmo a legítima defesa pode ser considerada como sendo uma “exceção” nem uma
“derroga” a tal imperativo, que pretende ser categórico. Se este imperativo admitisse derrogas ou
exceções, não poderia ser qualificado como absoluto, categórico; seria somente um “princípio” rela-
tivo, condicionado pelas circunstâncias do agir humano: ao máximo seria um imperativo hipotético.

O princípio vim vi repellere licet não autoriza matar, afirma somente que se “pode” utilizar
força defensiva proporcional – vim vi – para repelir a força ofensiva sofrida. Não diz ser lícito matar
para repelir o agressor: isto sim seria uma verdadeira e própria “exceção” e “derroga” ao imperativo
“Não matarás”. O “dever” que o princípio vim vi repellere licet impõe-nos não é de matar o agres-
sor, mas somente de defender a própria vida e aquela dos outros – valor primordial – caso venha
ameaçada, “repelindo” o agressor com força proporcionada; mesmo que, desta ação defensiva,
resultasse a morte de tal agressor (DIAS, 2011).

Portanto, nem mesmo o “dever” de defender a vida própria e alheia não constitui uma
“exceção” ao princípio “Não matarás”, pois na legítima defesa não se visa matar diretamente o
agressor. Sua morte seria uma consequência acidental de uma ação inevitável, um caso-limite.
Conclui-se, que a vida humana, enquanto direito primordial porque conditio sine qua non de todos
os demais direitos da pessoa, inclusive da liberdade religiosa, é “o” direito por excelência de “todos”
os indivíduos humanos; não de alguns privilegiados ou daqueles melhor desenvolvidos. Mas de
todos os indivíduos que compartilham da mesma humanidade: a dignidade humana.

Consequentemente, o dever de “Não matar” também obriga a “todos”, inclusive ao Estado


enquanto é uma “estrutura” a serviço do indivíduo humano. O Estado civil foi constituído para satis-
fazer as necessidades de um poder supra individual, capaz de garantir a todos os indivíduos huma-
nos a observação de todas as leis; impedindo o uso individual e indiscriminado da força; eliminando
o estado de guerra de todos contra todos e instaurando, assim, um estado de paz. É a antítese do
status naturae: substitui o reino da guerra com o reino da paz (DIAS, 2011).

O Estado Civil é, assim, uma construção racional que se contrapõem ao “irracional” estado
natural no qual se encontrava o Homem. Para dar vida ao Estado civil e sair, assim, do estado de
“morte” – cada indivíduo renunciou ao direito sobre todas as coisas e à força para reivindicá-lo. Em
seguida a esta renúncia, ao indivíduo entrado numa convivência civil, isto é, tornado súdito de um
Poder Soberano, não permaneceu nenhum outro direito natural além do primordial direito à vida.
Que o direito à vida seja irrenunciável, deriva da lógica mesma da convivência civil: os indivíduos
163
humanos instituíram o Estado civil para fugir da ameaça permanente de morte violenta que carac-
terizava o Estado natural, isto é, para salvar a própria vida.

A lei natural indica aquilo que é bom ou mal em vista “de” e em relação “a” um dado fim. O
problema fundamental para a compreensão da lei natural remete-se à posição e à compreensão
do problema do “fim”. O fim supremo do Homem, a partir do ponto de vista utilitarista do qual se
põem Th. Hobbes é a paz. O Homem que no status naturae era “indivíduo”, constituindo-se o status
civile se torna essencialmente “objeto” do Poder ou, ao máximo, torna-se sujeito “passivo”: torna-se
cidadão, parte de um Povo (HOBBES, 2003).

Se for possível reconhecer nesta relação Povo-Indivíduo, Estado-Cidadão, um sujeito “ati-


vo”, este não é o “Indivíduo-cidadão” com os seus direitos originários, mas sim o “Povo-estado”,
enquanto totalidade na qual o Indivíduo desaparece como sujeito de direitos. Já que, nessa relação
política Povo-Indivíduo, o único direito natural que permaneceu ao Indivíduo humano que se torna
“cidadão”, foi o primordial direito à vida; o “Povo-estado”, enquanto sujeito-ativo na relação cons-
tituinte do status civile, para garantir sua própria sobrevivência, diz ao “Indivíduo-cidadão”: “Não
matarás”.

O “Indivíduo-cidadão”, enquanto sujeito-passivo, também para garantir sua própria sobre-


vivência individual e não ser “anulado” como a parte em relação ao “todo”, diz ao “Povo-estado”:
“Não me matarás”.

O problema do conflito entre o direito à vida e a viver do “Indivíduo-cidadão” e o direito do


“Povo-estado” à própria conservação, em última análise, é um problema exclusivamente “moral”. O
primeiro pacto estabelecido entre o “Povo-estado” e o “Indivíduo-cidadão” é o pacto de mútua não
agressão, ou seja, de “não matar” e de “não ser morto”. Para os que creem em “um” Deus, o im-
perativo “Não matarás” é fruto de uma certeza que se funda na crença da existência de um “único”
Juiz Supremo, capaz de dar um juízo absoluto; de outro modo se desencadearia a fera selvagem
que o Homem é (BOBBIO, 2004).

Aquilo que faz com que a norma primária – o imperativo em si – seja um dever perfeito é o
fato de existir uma norma secundária, dirigida a um juiz que estabelece as consequências da sua
não observação, determinando que se deva cumprir tal norma primária, tal imperativo jurídico; pu-
nindo o seu transgressor: o delinquente.

No caso do imperativo “Não matarás” enquanto dever ético-racional, a norma secundária


não é dirigida nem a um Juiz com faculdades judiciais, nem a “um” Deus, que punirá o transgres-
sor no além-túmulo; é dirigida à consciência mesma do Sujeito ético, enquanto Indivíduo humano
racional e livre, capaz de consciência e de autoconsciência (DIAS, 2005).

A punição do transgressor do imperativo é a perda da dignidade humana: quem mata desce


abaixo do nível das feras. Segundo I. Kant, os imperativos categóricos são possíveis porque a ideia
da liberdade faz de nós membros de um mundo inteligível. Porque nos reconhecemos “também”
como membro do mundo sensível, nossas ações “devem” ser conformes à autonomia da vontade.
E esse “dever categórico” representa uma proposição sintética a priori, enquanto, além da nossa
vontade afetada por desejos sensíveis, tem-se ainda a “ideia” da nossa vontade mesma, mas como
164
vontade prática pura, pertencente ao mundo inteligível, e esta contém, segundo razão, a condição
suprema também da primeira (KANT, 2003, III).

O “dever” de obedecer a um imperativo categórico, do ponto de vista prático, confere ao


Homem uma dignidade que veta de tratá-lo como um puro meio. Nisto consiste a racionalidade do
Homem; isto conecta a segunda fórmula do imperativo, apresentada por I. Kant na sua Fundação
da metafísica dos costumes, 1785, à primeira fórmula que exprime o caráter formal da ética do de-
ver, a saber: Age segundo aquela máxima que podes querer que se torne uma lei universal.

Segundo I. Kant somente o homem se representa o dever de agir por dever, ainda quando
de fato não conseguisse fazer calar a sua inclinação. Só o Homem é sujeito a pressões psicológi-
cas que podem “subjugar” completamente a sua vontade; só o Homem é capaz de pensar-se, ape-
sar disto, obrigado a vencê-las: só o Homem é capaz de pensar como um dever absoluto o dever
de ser livre (KANT, 2003).

Com isto encontramos a terceira fórmula do imperativo categórico kantiano: sê livre; que
justifica a segunda fórmula: respeita em cada homem a humanidade como um fim; através da pri-
meira fórmula: age prescindindo de tudo aquilo que é ligado ao caro eu e, portanto, livremente.

Para Kant, obviamente, o imperativo categórico é sempre um só; propriamente não é nem
mesmo elaborável. Não é representável como uma fórmula cognoscitiva capaz de se tornar uma
técnica. É representável, porém, como sentido do dever numa consciência. Por isto ele chamou de
fato da razão a presença da Lei moral na mente.

Alguns “imperativos”, como vimos, ordenam somente enquanto condição para conseguir
aquilo que já se deseja. Se quisermos exprimir o imperativo “Não matarás” como categórico, não
podemos dizer Não matar “se” ou Não matar em vista “de”. Kantianamente, diremos somente “Não
matar” e basta, ou seja, categoricamente; sem uma hipotética condição nem circunstância, nem
finalidade além do dever mesmo: sem enunciar nenhuma condição sob a qual a prescrição valha
ou não valha.

Já no sistema hobbesiano o imperativo “Não matarás” ou “Não me matarás” dependia da


finalidade da paz: fim último da constituição da Sociedade Civil por parte dos indivíduos que renun-
ciaram à própria liberdade em vista de proteger o bem primordial da própria vida; em vista de pôr
fim ao Estado de guerra contínua de todos contra todos (HOBBES, 2003).

Ainda podemos precisar que é possível afirmar o imperativo “Não matarás” como “categóri-
co” e, ao mesmo tempo, dar-lhe uma fundamentação; desde que não lhe seja dado uma finalidade,
como no sistema hobbesiano: a paz. Tal fundamento não pode ser outro que a vida humana en-
quanto é o valor humano primordial. O imperativo “Não matarás” é categórico porque “categórico”
é o valor da vida que ele entende proteger (DIAS, 2011).

165
2.1 A LIBERDADE RELIGIOSA

Tanto a liberdade religiosa quanto o direito à vida são direitos garantidos constitucionalmente.
Segundo a Constituição do Brasil, 1988, art. 5º, caput, “Todos são iguais perante a lei, sem distin-
ção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

O artigo supracitado apresenta tanto o direito à vida quando à liberdade (religiosa); em um


primeiro momento vemos que esses dois direitos apresentam um mesmo grau hierárquico.

Por mais que ambos direitos se encontrem no mesmo patamar da Constituição, compreen-
de-se que a vida se encontra acima de todos os demais direitos, tratando dessa ideia entende-se
que sem o direito à vida não há como gozar de outros direitos que a própria Constituição garante
principalmente a liberdade (aqui a religiosa).

Partindo desse contexto vemos que, nem sempre, o direito à vida é respeitado; ainda que o
ordenamento jurídico garanta esse bem, pois os fatos descritos no capítulo anterior deixam claro
que o direito fundamental à vida vem sendo violado devido a liberdade religiosa.

Alexandre de Moraes diz que:


Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e
coletivos consagrados no art. 5° da Constituição Federal, não podem ser utilizados
como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco
como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal
por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro
Estado de Direito. (MORAES, 2003, p. 60)

Através dessas reflexões, pode-se entender que há uma limitação para o uso das garantias
fundamentais, sendo que elas não podem ser utilizadas para a realização de atos que vão contra
a ordem social, sendo que nesse caso, o direito fundamental à liberdade de religião serve como
pretexto para suprimir o direito à vida, violando a dignidade humana.

O direito à vida é garantido a todo ser humano, independente de sua classe, crença ou raça.
Todos são dignos de tê-lo. Quando se aborda o termo digno, pode-se entender que:
A expressão dignidade humana é o reconhecimento de um valor. É um princípio mo-
ral baseado na finalidade do ser humano e não na sua utilização como um meio. Isso
quer dizer que a dignidade humana estaria baseada na própria natureza da espécie
humana, a qual inclui normalmente manifestações de racionalidade, de liberdade e
de finalidade em si, que fazem do ser humano um ente em permanente desenvolvi-
mento na procura da realização de si próprio. (BARCHIFONTAINE, 2006, p.434-440)

A partir dessas reflexões, entende-se que a dignidade humana é um princípio moral dotado
de valor e em estreita relação com a natureza do homem. Contudo, o que talvez mude essa ideia
é o fato de que o seu valor é extremamente relativo para cada homem. O ato de valorar está ligado
ao que o homem conhece e, em se tratando de liberdade religiosa, cada um valora sua religião da
forma que acredita estar certa, mesmo que ela venha a violar a vida de alguém.

166
Por mais que cada um valore sua religião da forma que compreende ser melhor, não se pode
esquecer que existem valores que são imprescindíveis para a existência humana, como a valora-
ção da vida, da integridade física e psíquica do ser humano. A corrente universalista moderada, em
contraponto à relativista cultural e religiosa, é a que melhor se molda nesse contexto, pois intervém
em certas culturas e religiões para que bens imprescindíveis para a existência humana, como a
vida e a integridade física, não pereçam.

As questões culturais passam necessariamente pela discussão doutrinária do relativismo e do


universalismo, ou seja, a construção de uma teoria justificadora dos direitos humanos pressupõe
superar o desafio das contradições dessas duas correntes.

Neste sentido, o relativismo, conforme Barreto (2010, p. 239), consiste em afirmar que:
[...] não existe possibilidade de que se possa satisfazer de forma igual e equânime as
exigências de bem-estar de todos os seres humanos, isto porque os seres humanos,
no entendimento relativista, não são semelhantes em nenhum aspecto que comporte
generalizações. Esse argumento resulta de uma constatação antropológica, isto é,
a existência na humanidade de diferentes valores, hábitos e práticas sociais, que se
expressam sob variadas formas culturais.

Já o argumento universalista, pressupõe não ficar prisioneiro de uma unificação da moral.


Neste sentido é que a construção do argumento do “mínimo universal” passa pelo reconhecimento
de que é possível chegar-se a algumas características comuns dos seres humanos, que servem de
fundamento para estabelecer-se uma sociedade sedimentada nos laços de solidariedade e edifica-
da através do diálogo intercultural. (BARRETO, 2010, p. 239)

Nesse sentido, para solucionar o problema proposto, adota-se uma corrente universalista mo-
derada, qual seja, a de entender que há direitos universais, porém, desde que a vida e a integridade
física sejam preservadas, não se pode impor uma cultura sobre a outra, oprimindo sociedades mais
fracas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Notadamente, o Estado deve incumbir-se do problema das mortes causadas em decorrên-
cia da Religião, sendo assim, apontar-se-á possíveis maneiras, tanto nas religiões afro-brasileiras
quanto nas indígenas, para salvar e manter a vida dos que se encontram em risco de ter sua vida
violada.

Tendo como base as noções de crime, é possível dizer que aqueles que retiram a vida ou le-
sionam a integridade corporal de terceiros em rituais religiosos ou de magia devem ser punidos de
acordo com o código Penal Brasileiro, pois tais práticas são ilícitas. A prática do sacrifício humano
nesses rituais de magia acaba por violar o bem jurídico maior: a vida.

O sacrifício humano pode ser qualificado como “delito material” porque é uma conduta que
fere a estrutura da Sociedade, pois matar alguém é uma conduta reprovada por toda a Sociedade;
e como “delito formal”, pois se dá pelo tipo penal previsto pelo art. 121 do Código Penal Brasileiro.
167
Ademais, de acordo com a Constituição Brasileira, 1988, um cidadão não pode eximir-se de co-
nhecer e respeitar a lei. Neste sentido, os fiéis de religiões afro-brasileiras, que praticam sacrifícios
humanos, devem ser punidos de acordo com o Código Penal.

No que tange ao sacrifício humano em tribos indígenas, cumpre mencionar em razão da sua
alienação a outras culturas, devem ser orientados quanto ao bem maior da vida. Como o problema
do sacrifício humano de bebês Yanomamis ocorre dentro de uma tribo mais reservada, com traços
culturais fortes e sem contato com uma cultura exterior à sua, não seria, no entanto, o caso de pu-
ni-los, de acordo com a Lei Penal.

Para que os sacrifícios deixem de existir nessa tribo é preciso que o índio receba um acon-
selhamento, uma orientação sobre não matar os recém-nascidos. Há quem seja contrário a essa
intervenção, acreditando que certas culturas devem ser intocáveis, pois, caso contrário, perderão
suas “raízes”.

Com base no universalismo moderado pode-se justificar a necessidade de uma intervenção


em sua cultura, pois não seria justa a punição de um indígena por aquilo que ele nem acredita ser
errado. A adoção desta corrente como resposta às inquietações mostra-se mais adequado ao tema
proposto no presente trabalho, pois a intenção não é pôr fim aos costumes praticados em ambas
as religiões e sim evitar que elas, através de suas práticas, violem a vida de inocentes.

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REFERÊNCIAS
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de, São Paulo, v. 30, n. 3, p.434-440, set. 2006.)

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Tribunais, 2005.

RELIGIOUS FREEDOM AND ITS LIMITS BEFORE THE RIGHT TO LIFE


ABSTRACT: This scientific researtch abaout the ontological fundamentation of religious liberty and the right to live has
its justification on the actual state of the philosophical juridical investigation around the fundamental rights. According
to some theoretical references, it is possible to establish that the religious liberty, constituted as a fundamental right, in
some cases ends by violating the lives of those who find themselves in a situation of vulnerability. The problem of human
sacrifice in afro-Brazilian and indigenous cultures will be discussed as well as the conflict between the right to live and
the right to religious liberty.

KEY-WORDS: Religious liberty; Right to live; Fundamental rights.

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