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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

REGIONAL CIDADE DE GOIÁS


UNIDADE ACADÊMICA ESPECIAL DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
FACULDADE DE DIREITO

HEITOR AMARAL PEREIRA


HENRIQUE FERREIRA ROQUE

“GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA”: AUTORITARISMO E


INSEGURANÇA NA JUSTIFICATIVA DAS PRISÕES CAUTELARES

CIDADE DE GOIÁS
ABRIL DE 2016

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HEITOR AMARAL PEREIRA
HENRIQUE FERREIRA ROQUE

“GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA”: AUTORITARISMO E


INSEGURANÇA NA JUSTIFICATIVA DAS PRISÕES CAUTELARES

Trabalho elaborado para a Disciplina de


Direito Processual Penal IV, do curso de
Direito da Universidade Federal de Goiás,
Regional Cidade de Goiás, sob a orientação da
Prof.ª Drnda. Fernanda Rezek Andery.

CIDADE DE GOIÁS
ABRIL DE 2016

1
RESUMO

O presente estudo apresenta breve análise sobre a decretação de prisão como medida
cautelar justificada pela necessidade de “garantia da ordem pública”, conforme disposição do
art. 312 do Código de Processo Penal. A decretação de prisão para que se garanta a ordem
pública pauta-se, única e exclusivamente, pela compreensão do julgador acerca do que lhe é
exposto, e gera ao indivíduo que teve sua liberdade cerceada, de pronto, aquilo que se pode
considerar como uma antecipação de pena que, na maioria dos casos, sequer condiz com o
delito pelo qual se espera julgamento. Para que se possa falar em reversão deste quadro
autoritário, apenas a aplicação da norma à luz dos princípios de direito, aliada à interpretação
constitucional da norma processual penal é que se abrirá, ao acusado, a porta das garantias de
um Estado Democrático.

Palavras-chave: Prisão cautelar, garantia da ordem pública, direitos humanos, princípios.

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SUMÁRIO

1 – Breve explanação sobre as medidas cautelares......................................................4


1.1 - A prisão como medida cautelar..............................................................4
2 – O autoritarismo presente na justificativa pela “garantia da ordem pública”..............5
3 – O marco garantista na ruptura com o autoritarismo: da crítica à reinterpretação.......7
4 – Conclusão.........................................................................................................9

Referências............................................................................................................10

3
1 – Breve explanação sobre as medidas cautelares

O Processo Penal não admite, como o Processo Civil, um processo cautelar autônomo.
Assim, sendo necessário, a tutela cautelar na esfera processual penal se dá por meio da
aplicação de medidas específicas, trazidas pelo Código de Processo Penal, e também por
legislação especial.
Em matéria ritualística penal, a medida cautelar preza, de modo especial, pela
celeridade, e também pela efetiva aplicação da lei. “A razão de ser desses provimentos
cautelares é a possível demora na prestação jurisdicional, funcionando como instrumentos
adequados para se evitar a incidência dos efeitos avassaladores do tempo sobre a pretensão
que se visa a obter” (LIMA, 2013, p. 770).
Podem, as medidas cautelares, visar à proteção da instrução por meio da tentativa de
resguardo às provas, ao próprio procedimento ou ainda ter o indivíduo como ente processual
passível de sujeição à tutela cautelar. Neste último caso, a tutela cautelar, chamada de medida
cautelar de natureza pessoal, pode ser fundamentada pelas hipóteses trazidas pelo art. 312 do
Código de Processo Penal. São elas: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica,
conveniência da instrução criminal, para que se assegure a aplicação da lei penal, desde que
haja prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

1.1 – A prisão como medida cautelar

A adoção de medidas cautelares de natureza pessoal restringe ou priva a liberdade do


imputado ao longo do período de investigação/instrução processual. Em tese, teria como
objetivo a eficácia processual (LIMA, 2013, p. 771), sacrificando a liberdade do imputado em
detrimento da efetividade da investigação e da instrução processual, desde que haja elementos
suficientes para que a medida seja aplicada.
Trataremos aqui, com especificidade, da aplicação da prisão como medida
acautelatória, e de modo ainda mais objetivo, da prisão sob o argumento de “manutenção da
ordem pública”, previsto no caput do art. 312 do CPP. Tal motivação “acaba por ensejar uma
interpretação por demais extensiva quanto às situações fáticas que poderiam ser incluídas na
sua hipótese de incidência, malferindo, por conseguinte, o princípio da legalidade estrita”
(ROCHA, 2014, p. 10).

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2 – O autoritarismo presente na justificativa pela “garantia da ordem pública”

Diversos – e justificáveis – são os motivos que sustentam a existência de medidas


cautelares no Processo Penal. Ora, economia e celeridade processual são princípios que não
devem ser ignorados, e as medidas cautelares servem a tais princípios – ou deveriam com
exclusividade servi-los, respeitados e garantidos os demais princípios. Aqui, merecem atenção
apenas às medidas cautelares de natureza pessoal, que são aplicadas “contra o imputado
durante as investigações ou no curso do processo, com o objetivo de assegurar a eficácia do
processo, importando algum grau de sacrifício da liberdade do sujeito passivo da cautela”
(LIMA, 2013, p. 771). Apesar da necessidade de se acautelar o processo penal em
determinadas circunstâncias, a constrição da liberdade do indivíduo, ao contrário do que
apresenta o autor acima citado, não se limita à garantia de eficácia processual.
O Código de Processo Penal estabelece as situações motivadoras da prisão preventiva,
que são as seguintes:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da


ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução
criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da
existência do crime e indício suficiente de autoria. (Grifo nosso)

A primeira e a segunda hipótese de cabimento da prisão preventiva não trazem


qualquer parâmetro ou embasamento que não venha a surgir única e exclusivamente da
intenção do julgador em, na situação fática, ordenar a prisão do agente. Logo, não é preciso
uma análise muito profunda para que se perceba que a eficácia processual não
necessariamente é garantida por meio da aplicação de medidas cautelares – especialmente a
prisão. Um instrumento de limitação máxima da liberdade de um indivíduo, cuja aplicação
possa limitar-se à justificativa de “garantia da ordem pública, da ordem econômica”,
transforma a lógica acautelatória num atentado à proporcionalidade, ignorando a adequação
da medida ao fato e a necessidade da medida.
Tal disposição de caráter tão genérico acaba por tentar forçar a adequação de qualquer
justificativa ao princípio da legalidade, pilar tanto do direito material quanto do direito
processual. Transformar a abstração em possibilidade de cerceamento de liberdade: prática
extremamente autoritária. Vale recordar que

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a prisão cautelar fundada na garantia da ordem pública tem sua gênese na
Alemanha nazifascista da década de 1930, período histórico em que o que se
buscava eram exatamente expressões abertas, vagas e imprecisas, que
pudessem ser utilizadas como alicerce para a realização de prisões que
pudessem ser contrárias ao sistema; vale dizer, o intuito era exatamente o de
se obter uma autorização geral e abstrata para prender. (...) No Brasil, o
fundamento da garantia da ordem pública foi inserido no sistema jurídico,
não por acaso, ainda na redação original do nosso Código de Processo Penal,
a qual remonta aos idos de 1941, época em que o nazifascismo ainda estava
em alta e a Segunda Grande Guerra no auge de seus acontecimentos.
(ROCHA, 2014, p. 10)

Inegável burla à legalidade em seu sentido estrito, violando, da lei, sua “condição
taxativa [n]a criação de crimes [e normas processuais], (...) proibindo-se a analogia ou outros
mecanismos que venham a converter o juiz em legislador” (SEMER, 2014, p. 33). Fato é que
abrir a possibilidade de ação dos juízes de forma a permitir que sua justificativa inclua quais
atos ou fundamentos no bojo dos “atentados à ordem pública” os torna suscetíveis ao
bombardeio midiático, ao apelo público, às próprias crenças, às crenças de determinado
grupo... Não é possível que um dispositivo legal se queira de tal forma abrindo tamanha
margem à arbitrariedade estatal escancarada pelo seu representante que ali decide.
Até que se alcance o momento de decisão em sentença, o juiz deve se pautar pelo
princípio da inércia. Não deve protagonizar qualquer dos atos instrutórios, ainda que seja em
nome da própria instrução. Antes disso, deve assumir sua condição de mediador, de mero
espectador.

Neste momento de formação do arsenal probatório, portanto, a posição inerte


do julgador (mediador, espectador) é fundamental, sob pena de influenciar
sua condução e prejulgar o caso antes de encerradas todas as possibilidades
de inserção de elementos de convicção. Encerrada a fase probatória, no
momento da decisão, o magistrado toma para si a palavra das partes,
passando a encenar o personagem principal da trama judiciária.
(CARVALHO, 2015, p. 166).

No entanto, no exercício de sua função, o juiz acaba por se perceber

em função de seu cargo e hierarquia e constrói uma identidade assentada


sobre estas bases. Rechaça os relâmpagos de consciência sobre as limitações
de seu poder (...); não lhe restando outro recurso além de evitar conflitos
com outras agências para preservar sua identidade falsa ou artificial (...) e
também para conservar sua função.1 (ZAFFARONI, 1998. P. 146) (Nossa
tradução)

1
“(...) en función de su cargo y jerarquía y constituye una identidad asentada sobre estas bases. Rechaza los
relámpagos de consciencia acerca de las limitaciones de su poder (...), no le resta outro recurso que evitar
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Desta forma, a atuação do juiz passa a ser viciada, marcada pela ruptura com seu
próprio papel. Contradição exclusiva e escancaradamente autoritária, ignorando a função dos
princípios de Direito que, naturalmente, são garantidores da manutenção da ordem
democrática e da segurança jurídica das decisões (ZAFFARONI, 1998).
A aplicação da prisão como medida cautelar submete o indivíduo à mais grave sanção
estatal, e não deve ser pautada pelo entendimento do juiz por si só, em função de meros
indícios. Ainda assim, sendo os indícios a única fonte do “esclarecimento” do julgador, “tais
indícios devem (...) ser especificados de maneira estável pela lei, e não pelo juiz”
(BECCARIA, 2013, p. 30).

3 – O marco garantista na ruptura com o autoritarismo: da crítica à reinterpretação

A redação original do Código de Processo Penal ainda em vigência, de 1941, trazia a


“garantia da ordem pública” na grafia do art. 313: “Art. 313. A prisão preventiva poderá ser
decretada como garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para
assegurar a aplicação da lei penal”. Em 1967 e 1994 houve alterações que, apesar de mudarem
as disposições, não tocaram no teor das justificativas possíveis à medida cautelar de maior
impacto (por meio das leis 5.349 e 8.884, respectivamente).
A Lei 12.403, de 2011, trouxe novas alterações à redação de diversos artigos do CPP.
Entre as alterações, a grafia do art. 312 passou a vigorar contendo a “garantia da ordem
pública” como possível justificativa à aplicação da medida cautelar de prisão.
Como fora citada, tal modalidade de prisão cautelar passou a integrar o ordenamento
brasileiro por meio do CPP ainda vigente, reforçando o conjunto de medidas autoritárias que o
compõem – fruto do momento histórico de sua elaboração e da construção ideológica em
torno de tal elaboração.
As prisões cautelares representam, atualmente, um grande problema, pelo que somam
do total de encarcerados no Brasil: aproximadamente 41% (SILVA e KOEING, 2016, p. 14).
Agrava o quadro o fato de que tais prisões simplesmente ignoram o estado de inocência
garantido constitucionalmente (art. 5º, LVII, da Constituição Federal de 1988). Nem mesmo

conflictos con las otras agencias para preservar su identidad falsa o artificial (...) y también para conservar su
función”.
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as alterações posteriores à promulgação da Constituição fizeram com que o instituto da prisão
cautelar pautada pela “garantia da ordem pública” fosse revisto. Isso acaba evidenciando que
a) o autoritarismo presente na edição inicial do CPP conta com força suficiente para se
perpetuar; e b) não há interesse majoritário em dar fim à interpretação autoritária dos
dispositivos legais, pautando a interpretação pelo texto Constitucional.
Quanto à permanência do autoritarismo, há que se destacar que a utilização do
argumento de “garantia da ordem pública” representa o mito “sempre presente em regimes
autoritários que se apresentam como Estados de Direito: o de que o processo penal é
instrumento de segurança pública/pacificação social” (CASARA, 2015, p. 194). Não há que
se falar em processo penal enquanto instrumento de segurança pública. Este mito se pauta
pela sempre presente e inflamada manifestação popular, que ignora o caráter humano daquele
que terá sua liberdade confiscada pelo Estado. “O clamor social, em razão da efemeridade que
lhe é ínsita, não pode ser arrimo de prisões cautelares, já que a construção desse clamor (...)
do fato pode esconder interesses outros na segregação de determinada pessoa, algo que nunca
poderá ser avaliado de maneira isenta” (ROCHA, 2014, p. 11).
A interpretação constitucional das normas em combate à interpretação da Constituição
a partir da ótica do ordenamento que a antecedia, especialmente na esfera criminal/processual
penal, por sua vez, é a forma que garantirá o respeito, de modo inafastável, ao princípio da
não culpabilidade.

A estrutura do saber jurídico-penal, segundo Luís Roberto Barroso, padece


da patologia denominada interpretação retrospectiva. Segundo o autor, ‘(...)
as normas legais têm de ser interpretadas em face da nova Constituição, não
lhes aplicando automática e acriticamente, a jurisprudência forjada no
regime anterior. Deve-se rejeitar uma das patologias crônicas da
hermenêutica constitucional brasileira, que é a interpretação retrospectiva,
pela qual se procura interpretar o texto novo de maneira a que ele não inove
nada, mas, ao revés, fique tão parecido quanto possível com o antigo.’
Nesse sentido, lembra Lenio Streck que ‘há certo fascínio pelo Direito
infraconstitucional, a ponto de se ‘adaptar’ a Constituição às leis
ordinárias’.” (CARVALHO, 2015, p. 67)

A interpretação constitucional das normas (aqui o Código de Processo Penal)


garantiria, por meio da atenção aos princípios de Direito, balizares do nosso Estado
Democrático, que o autoritarismo não suplantasse as estruturas democráticas trazidas pelo
nosso texto Constitucional. Viria a coibir, por exemplo, a falta de correspondência entre a
medida cautelar extrema e o crime pelo qual o recluso aguarda sentença.

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Em pesquisa realizada por meio de análise de todas as sentenças proferidas pela
Primeira Vara Criminal de Belém do Pará, no ano de 2014, descobriu-se que 80% dos que
aguardaram sentença preventivamente em regime fechado não receberam como pena a
reclusão em mesmo regime (SILVA e KOEING, 2016, p. 14). Este dado evidencia a ausência
de proporcionalidade na aplicação da medida cautelar de supressão da liberdade. Houve, no
caso exposto, a antecipação de uma pena que sequer viria a existir. “(...) é evidente que a
utilização de uma medida cautelar divorciada da sua função precípua de garantir a efetividade
do processo de conhecimento avilta o princípio da presunção de não culpabilidade,
traduzindo-se por verdadeira antecipação da pena” (ROCHA, 2014, p. 11).

4 – Conclusão

O modelo jurídico adotado pelas sociedades contemporâneas apresenta a legalidade


estrita como fonte de legitimidade, desde a norma e atuação administrativa até a norma e
sanção penal, passando por todos os ordenamentos. Não há que se falar em Direito de
Garantias num contexto em que a legalidade abre margem à insegurança, a atos arbitrários
carregados de autoritarismo e decisões passíveis de justificativa a partir do entendimento que
não se paute por elementos claramente delimitados pelo instituto que os preveja.
Se uma previsão de atos inicialmente acautelatórios assume característica de
imputação de pena pautada pelo simples entendimento de seu julgador, mais uma vez se torna
evidente o autoritarismo existente na composição das normas e, especialmente, na sua
aplicação. A custo de muitas lutas e mobilizações, garantias diversas vieram a integrar o
ordenamento jurídico brasileiro, como a inviolabilidade do estado de inocência até a
comprovação de prática delitiva por sentença condenatória. Apesar disso, a interpretação dos
aplicadores da norma insiste em recordar o momento que antecedeu a inclusão garantista no
conjunto normativo.
Evidente que o ideal seria, sim, a abolição da constrição da liberdade, ainda que para
casos específicos, que devem ser objeto de estudo apartado. Contudo, restando ainda veios em
que correm o ideário retrógrado que sequer recepciona aquilo que já consta como garantia
inafastável, é crucial defender a aplicação garantidora de direitos da norma que é vigente.
Combater autoritarismos antigos com o que se possui, em busca de outras tantas liberdades
necessárias.

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REFERÊNCIAS

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Trad. Paulo M. Oliveira. 1ª Edição. São
Paulo: EDIPRO, 2013.

CASARA, Rubens R. R.. Mitologia Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2015.

CARVALHO, Salo de. Antimanual de Criminologia. 6ª Edição, revista e ampliada. São


Paulo: Saraiva, 2015.

LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói: Ímpetus, 2013.

ROCHA, Diogo Mentor de Mattos. (Re)pensando a garantia da ordem pública como


fundamento idôneo para a decretação de prisões cautelares. Boletim IBCCRIM, Ano 22 –
nº 256. ISSN 1676-3661. Março/2014

SILVA, Adrian Barbosa e; KOENIG, Vladimir. Prisões preventivas pervertidas: a gestão


profética da punição no teatro processual. Boletim IBCCRIM, Ano 24 – nº 279. ISSN 1676-
3661. Fevereiro/2016.

SEMER, Marcelo. Princípios Penais no Estado Democrático. 1ª Edição. São Paulo: Estúdio
Editores.com, 2014.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. En Busca de las Penas Perdidas: deslegitimacion y dogmatica


juridico-penal. Buenos Aires: Ediar, 1998.

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