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Sobre o argumento

Jean-Luc Godard

Quando se diz que o cinema é melhor ou que o vídeo é melhor, fazem-se


duas afirmações opostas e não se põe a questão do que é um filme. Existe
uma cena ideia ligada ao cinema, depois de retomada pela televisão, que
consiste em dizer que a imagem realizada com a câmara de cinema será a
imagem do filme. Com o vídeo, pensou-se por um momento de modo
diferente, porque o vídeo passa em continuo uma imagem que na realidade
não existe, no sentido em que se tem de produzi-la a partir daquela que o
monitor nos mostra. É uma ideia estúpida, a de ver antes de falar, ou, em
todo o caso, a de ver um pouco enquanto se fala. Sobretudo, se se percebe que
não se tem necessariamente vontade de ver. «Vimos» assim Passion tantas
vezes que a uma cena altura este mecanismo nos impediu de fazer coisas
diferentes. Se vemos que a nossa noiva se foi embora, não nos resta nada
senão chorar... Em contrapartida, é exactamente nesse momento que se pode
escrever um romance. Mas o filme está feito. Portanto, pode-se fazer um
filme. Esta é a relação cinema-vídeo: servimo-nos daquele que chega
primeiro e do outro que chega depois, para fazer a terceira etapa subsequente.
Hoje, é impossível produzir um argumento. Mesmo na América, parte-se
de um romance, ou então de um remake. Até os políticos têm dificuldade em
produzir argumentos! Para Passion não existia qualquer argumento escrito,
mas muitíssimos documentos: uma fita vídeo, uma banda sonora, um
tratamento. Era preciso contar o argumento a partir da pintura e da música
Era preciso chegar a um texto que permitisse «reunir o rebanho».
Gostei muito de Hammett porque é um filme, em muitos aspectos,
semelhante a Passion. Ambos partem do visível, Para mim, era uma opção:
num orçamento de seis milhões de francos, gastamos cerca de três em
argumento visível, Fabricamos cenas vídeo para encontrar aquilo que havia a
fazer, em vez de escrever um argumento à beira mar com uma folha de papel
e um lápis. Este modo de produzir fisicamente um filme, de investir dinheiro,
levou Passion à catástrofe, dado que a equipe não me seguiu até ao fundo
desta pesquisa, quer por cegueira, quer por um excessivo temor de me
confrontar, quer por quaisquer outras razões.
O argumento de Passion encontra-se entre os argumentos mais caros da
história do cinema. Só o enquadramento do cenário de Coppola custou trinta
mil dólares. Para esse enquadramento, um enquadramento de argumento,
fomos a Los Angeles e alugamos o set e a equipa de Coppola um sábado,
durante as filmagens de One from the heart. Mas para mim era importante:
havia tempos que não punha os pés num estúdio, ou melhor, nunca o tinha
feito. Queria ver como me sentia num estúdio. É certo que era um estúdio
americano, mas os estúdios americanos estão na origem de todos os outros
estúdios. Em suma, era um primeiro contacto, porque também o cen6grafo de
Coppola, Dan Tavoularis, deveria ter trabalhado no meu filme. Eu mandara
fazer nos Zoetrope Studios um projecto das cenografias e dos respectivos
custos. Por exemplo, queda reconstruir um quadro de Rubens, A queda dos
malditos, em que se vêem qualquer coisa como quinhentos corpos nus que
caem no vazio. Rodei esta sequência em vídeo ainda que depois, não a tenha
montado em Passion. Realizou-ma um indivíduo que, nem sequer era
cen6grafo, que se chamava Pete e que descobriu o mo(o de a realizar. Não
seda, porventura, a melhor forma. E a força dos americanos, para quem a
palavra impossível não existe.
A diferença entre mim e Coppola no uso do vídeo está no facto de que eu
me propunha investigar com as imagens, em vez de com a escrita, enquanto
ele fez primeiro um argumento escrito, depois rodou-o em super-oito, em
seguida em Polaroid, em vídeo VHS, em vídeo U-Matic e, por fim, em
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película. E, se a sua tentativa falhou, não foi por acaso, porque com todas
aquelas imagens à sua disposição, e todos aqueles desenhos, havia mil filmes
possíveis e ele realizou o milésimo primeiro. Construíra um número
execessivo de imagens. Também eu, de resto, mas pesquisei muito com as
imagens. Ele, porém, fez demasiadas imagens sem pesquisar
suficientemente.
Coppola queria fazer do seu estúdio uma casa, com todos os seus amigos,
com a ideia de que todos deveriam morar no estúdio; aquilo que eu queda era
fazer da minha casa um estúdio, pequeno, mas que fosse um estúdio. Com
Coppola havia este ponto invertido, esta ideia muito utópica.
Na realidade, ele trabalhava exactamente como tantos outros que fazem
cinema com o controlo vídeo da imagem, o vídeo não era usado para se
conformar à imagem, mas apenas como verificação, apenas supertecnologia.
E quando rodava o seu filme, nem sequer ali estava; permanecia na régie
móvel, a dirigir como um feiticeiro, sem nunca ver o seu filme; e isto no final
virou-se contra ele, A certa altura, observei, e isso irritou-o, que quando se
unem duas imagens de um filme com um acréscimo, habitualmente isso
permite que uma «corrente» passe pelo filme, e este continue.
Enquanto no seu caso, pelo contrário, se produziu uma soldadura, com as
sobras, as rebarbas do metal. Tudo aquilo que havia nas imagens saía,
escoava-se, e no filme, por fim, não havia mais nada - foi um fracasso.
Enquanto antes, havia muito: vi o material rodado e era magnífico. Mas não
se mantinha, escoava-se. Esta é a critica que farei ao seu filme.
O argumento vídeo está também presente em Prénom Carmen; está
mesmo presente quando o não faço: mas serve para pensar. Existe nisto uma
grande diferença entre mim e os técnicos: eles não conseguem pensar, se não
há um texto; mais ainda, um texto muito descritivo, tipo «ele entra, fecha a
porta e deita-se na cama com ar abatido». Se a informação é diferente, uma
frase que, em vez disso, é uma música ou uma pintura, não a produzem.

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