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a questão soteriológica
Kwabena Donkor, Ph.D.
Biblical Research Institute, Washington, DC.
Resumo: O presente artigo trata da nature- Emanuel, “Deus conosco”.1 Seus seguido-
za de Cristo à luz da doutrina da salvação. res tinham uma crença firme de que nele
O autor avalia as conexões soteriológicas haviam encontrado o próprio Yahweh. A
envolvidas na rejeição pela igreja cristã de reflexão neotestamentária sobre essa ex-
algumas das principais heresias cristoló- periência e suas implicações conduziu à
gicas dos primeiros séculos. Em seguida, opinião de que Ele é tanto Deus quanto
demonstra como a compreensão da obra Salvador (2Pe 1:1). Tão comumente era
salvífica de Cristo ajuda a definir se sua Jesus avaliado como Messias ou Cristo,
natureza era a que Adão possuía antes da que a palavra “Cristo” se tornou um nome
queda (pré-lapsariana) ou depois da mes- pessoal.2 Era a asserção dos escritores do
ma (pós-lapsariana). A conclusão do traba- Novo Testamento de que Jesus de Nazaré
lho emerge da análise de textos bíblicos e de é divino.
Ellen G. White referentes ao assunto, bem
como do significado e implicações de certos A convicção inequívoca dos escrito-
termos e expressões centrais à discussão. res do Novo Testamento no que concer-
ne à divindade de Jesus encontrou um
Abstract: This article deals with the destino diferente entre as mentalidades
nature of Christ in the light of the sal- judaica e grega. Algumas pessoas de
vation doctrine. The author evaluates herança judaica, com uma estrita for-
the soteriological connections involved mação monoteísta, evoluíram em seu
in the rejection by the Christian church pensamento chegando a manter o que
of some of the main Christological her- tem sido chamado de opinião adocio-
esies of the first centuries. Next, it dem- nista. Esta concepção, defendida pelos
onstrates how the understanding of the ebionitas, “compreendia a Jesus como
salvific work of Christ helps to define um mero homem que, por escrupulosa
whether his nature was that of Adam had observância da lei, foi justificado e con-
before the Fall (pre-lapsarian) or after it seqüentemente se tornou o Messias”.3
(post-lapsarian) the conclusion of the Por outro lado, a mentalidade grega,
study emerges of the analysis of bible imbuída de racionalismo, imaginava
texts and references of Ellen G. White o aparente paradoxo divino-humano
on this topic, as well as the meaning and em termos metafísicos. Para eles, era
implications of some central terms and importante decidir sobre a identidade
expressions to the discussion. ontológica de Jesus de Nazaré. Essas
preocupações gregas reforçam as várias
Introdução opiniões docetistas. Segundo o ponto
de vista docético, o Cristo divino não
É muito evidente nas Escrituras que os tinha um corpo humano real; era apenas
seguidores de Jesus o reconheciam como uma aparência, um fantasma; sendo que
20 / Parousia - 1º semestre de 2008
Cristo morreu, então Ele não era Deus, enfatizava a divindade de Jesus a ponto
e se Ele era Deus, então não morreu. de obscurecer a distinção entre a divin-
dade e a humanidade.
Essas objeções judaicas e gregas re-
sultaram em grandes heresias no início
da história do pensamento cristão. De- A controvérsia ariana
sejo examinar brevemente quatro dessas
primitivas heresias para fazer uma obser- A controvérsia ariana, desencadeada
vação significativa: o acompanhamento por Ário, um popular presbítero da igreja
das controvérsias resultou em concepções de Alexandria (falecido em 335 d.C.), cen-
particulares de salvação. Faço esta obser- tralizava-se nas idéias expressas por ele
vação com o objetivo de explorar como que pareciam refletir as opiniões da escola
essas duradouras controvérsias podem antioquina de pensamento. Ário, compro-
animar o debate dentro da comunidade de metido com a idéia grega filosoficamente
fé adventista. A hipótese subjacente ao en- influenciada de que Deus é indiferencia-
foque que estou aqui seguindo é a de que do, argumentava que Jesus, o Filho ou Lo-
a discussão cristológica na comunidade gos, tinha de ser uma criatura e, portanto,
adventista pode ser iluminada prestando- deve ter tido um princípio. Como ele se
se mais atenção aos respectivos pontos de expressa,
vista soteriológicos. o que afirmamos e pensamos e temos en-
sinado e continuamos ensinando; que o
A natureza de Cristo na história Filho não é congênito, nem parte do con-
do pensamento cristão gênito em nenhum sentido, nem é ele deri-
vado de alguma substância [...] e antes que
Tenho observado que as controvérsias fosse gerado, ou criado, ou nomeado, ou
estabelecido, ele não existia, porque não
sobre a natureza de Cristo foram acompa-
era congênito. Somos perseguidos porque
nhadas por opiniões particulares de sal- afirmamos que o Filho tem um princípio,
vação. Realmente podemos afirmar que mas Deus é sem princípio.4
as implicações soteriológicas dos vários
pontos de vista mantidos sobre a natureza Portanto, o ponto de partida de Ário é
de Cristo alimentavam as controvérsias ontológico, significando que termos como
cristológicas. Testarei esta observação o “Filho” não devem ser interpretados
reexaminando as quatro grandes contro- para definir a natureza essencial de Jesus.
vérsias da história cristã. Antes de fazê-
lo, devo observar que as tendências ado- A conexão soteriológica. O principal
cionista e docetista já haviam se consoli- opositor de Ário, o pai da igreja Ataná-
dado em duas escolas de pensamento: as sio, revelou em sua oposição que, embora
cristologias antioquinas e alexandrinas, Ário argumentasse a partir de uma pers-
respectivamente. Essas duas escolas cris- pectiva ontológica, a essência do debate
tológicas dominantes estavam no centro era soteriológica. Atanásio afirmava que
dos debates cristológicos. A escola antio- a salvação só pode ser trazida à humani-
quina, originada em Antioquia, Síria, pa- dade por alguém que é verdadeiramente
rece ter sido influenciada pela mentalida- Deus.5 É verdade que a opinião particular
de judaica, onde a humanidade de Jesus de Atanásio quanto à salvação, em que a
era enfatizada exageradamente a ponto humanidade é participante da natureza di-
de negar a sua divindade. A cristologia vina, estava na essência do seu argumen-
alexandrina, porém, que se originou em to; contudo, a posição central da questão
Alexandria, um centro de cultura grega, da salvação para o debate cristológico é
A natureza de Cristo: a questão soteriológica / 21
inegável. Devemos lembrar-nos de que a curou; é o que está unido à sua divindade
Igreja rejeitou o ponto de vista de Ário no que é salvo.”7 O ponto de vista de Apo-
Primeiro Concílio Ecumênico (325 d.C. linário foi rejeitado no Segundo Concí-
em Nicéia), decidindo que Jesus era gera- lio Ecumênico (em Constantinopla, 381
do do Pai e da mesma substância do Pai. d.C.), confirmando a posição nicena.
O concílio, portanto, reconheceu a divin-
dade de Jesus. A controvérsia de Nestório
qual, por sua vez, não é uma condição do implicações a favor da salvação. Em ou-
ser mas jaz inteiramente na ação humana. tras palavras, embora as controvérsias pa-
Devido a esse dom, o indivíduo poderia recessem centralizar-se no “ser” de Jesus,
teoricamente atingir a perfeição. Nestório em última instância, a questão significati-
viu essa perfectível substância humana re- va era como esse “ser” se relacionava com
velada em Jesus. O homem Jesus empre-
a nossa salvação. Como pode esta conclu-
gou a dotação natural da graça sem falhar.
Este exercício de sua livre vontade efetuou
são trazer algum esclarecimento sobre o
a união voluntária entre Jesus e o Logos.9
problema da natureza de Cristo no atual
pensamento adventista? É possível que,
afinal de contas, o debate cristológico seja
A controvérsia eutiquiana realmente um assunto acerca de opiniões
sobre salvação?
Êutiques, nome pelo qual é conhecida
a controvérsia, acusou Nestório de dividir A natureza de Cristo no pensamento
Jesus em duas naturezas. Sua própria so-
adventista
lução era insistir em que Jesus possuía so-
mente “uma natureza” (donde, monofisis- O debate cristológico entre os adven-
mo), natureza que, afinal, nem era humana tistas tem se dividido nos termos de se
nem divina. O eutiquianismo foi rejeitado Jesus, ao tornar-se homem, assumiu uma
no Quarto Concílio Ecumênico, realizado natureza “caída” ou “não caída”12 [pré
em Calcedônia em 451 d.C., e as duas na- ou pós-lapsariana]. Como nas primeiras
turezas de Jesus foram reconhecidas sem controvérsias da igreja apostólica, o de-
confundir, mudar, dividir ou separar a bate sobre a natureza de Cristo parece
ambas.10 centralizar-se no “ser” de Cristo, que as
A conexão soteriológica. O que é im- opiniões antagônicas esperam estabele-
portante para o propósito deste debate fo- cer baseadas na exegese de textos rele-
ram as repercussões de Calcedônia com vantes. Todavia, ao contrário dos mais
respeito à salvação. Os monotelistas, antigos debates, as posições “caída” e
baseando-se em Calcedônia, concluíram “não caída” do pensamento adventista
que Jesus tinha somente uma vontade, concentram-se na natureza da humanida-
a saber, a vontade do Logos. Em outras de de Jesus, sem tratar explicitamente da
palavras, a obediência de Jesus era o relação entre sua divindade e humanida-
resultado da força impulsora do Logos. de. Minha discussão, portanto, terá este
Aqui, outra vez, como na controvérsia reduzido enfoque. Como nossa compre-
apolinarista, a Igreja primitiva aplicou o ensão da salvação nos ajuda a definir as
teste soteriológico para rejeitar a posição questões “ontológicas”? No restante des-
monotelista, argumentando que “a reden- ta apresentação desejo analisar as posi-
ção completa demanda uma completa en- ções “caída” e “não caída” com respeito
carnação, inclusive a concepção de uma à sua subjacente soteriologia e antropo-
vontade humana”.11 logia (explícitas ou implícitas). Ademais,
procurarei mostrar como os comentários
Conclusão de Ellen G. White podem prestar algum
esclarecimento sobre a análise.
É muito instrutivo notar que nessas
primeiras controvérsias o teste da ortodo- A natureza humana de Jesus: caída?
xia, de qualquer ponto de vista, ontologi-
camente, foi decidido em relação às suas O argumento fundamental para o pon-
implicações soteriológicas, ou seja, suas to de vista da “natureza caída” [ou pós-
A natureza de Cristo: a questão soteriológica / 23
Gage: “Ele tinha a faculdade da escolha Jesus não nasceu com carne pecami-
e a hereditariedade que a enfraquece e nosa por causa da natureza do pecado. A
desencaminha. Ele tinha uma natureza na posição da “natureza não caída” enfatiza
qual as tentações comuns a homens e mu- grandemente o conceito teológico do pe-
lheres podiam encontrar atração. Mas em cado original. Partindo de sua perspectiva,
Jesus o mal não encontrou nenhuma res- todos os seres humanos pós-queda parti-
posta.”21 A vitória de Jesus sobre o pecado cipam do pecado original, que é definido
tem implicações para nós. Gage interpreta primeiramente como a ruptura de um re-
Hebreus 4:15 no contexto do grande con- lacionamento entre o homem e Deus (Rm
flito, concluindo que “porque Jesus não 14:23), o que então leva à perpetração de
pecou, nenhum homem deve pecar”.22 Isto atos iníquos (1Jo 3:4).24
é, sendo que Jesus foi feito como seus ir-
Romanos 5:12-21 é apresentado como
mãos em todos os sentidos e foi tentado
uma passagem-chave na defesa do pecado
como somos, contudo sem pecado, nós
original. Rand conclui desta passagem que
também podemos viver sem pecar.
a morte, ou a condenação não é transmitida
para cada pessoa somente por causa do seu
A natureza humana de Jesus: próprio pecado. Isto também o faz. Mas em
não caída? um sentido profundo, a morte passa a todos
os homens por causa do pecado de Adão, ou
O ponto de vista da “natureza não ca- rompe o relacionamento com Deus (que o
ída” argumenta primariamente a partir da pecado de Adão afeta toda a raça é mencio-
natureza do pecado. Se o pecado fosse nado cinco vezes nos versos 15-19). Sim-
plesmente não é verdade que o pecado não
simplesmente uma questão de atos, en-
está presente até o primeiro ato pecaminoso
tão seria possível a compreensão de Je- da pessoa. Os homens são nascidos peca-
sus como nascido com carne pecaminosa, dores. “A morte reinou” (v. 14) a partir do
sem, contudo, ser um pecador. Mas partin- pecado de Adão. Os bebês morrem antes de
do da perspectiva da posição da “natureza pecarem conscientemente.25
não caída”, “simplesmente não é verdade
que o pecado não está presente até que a Rand desenvolve o argumento a favor
pessoa cometa o primeiro ato pecamino- do pecado original baseado em Salmos
so. Os homens são nascidos pecadores.”23 51:5, e conclui que todo ser humano, ex-
Portanto, Jesus não podia ter nascido com ceto Cristo, é nascido pecador.26 Contudo,
carne pecaminosa. ele distingue este conceito bíblico de pe-
Deve ser observado que, ao contrário cado original do conceito católico roma-
da opinião da “natureza caída”, que argu- no que imputa a culpa a cada ser huma-
menta partindo da ontologia para a sote- no nascido baseando-se na idéia de que
riologia, a posição da “natureza não caí- cada um estava seminalmente presente
da” segue o caminho oposto, operando a em Adão quando ele pecou. Tem-se a im-
partir da hamartiologia/soteriologia para a pressão de que a posição da “natureza não
ontologia. Mas é biblicamente exato afir- caída” também edifica sobre um princípio
mar que o pecado não é consumado ape- de solidariedade ou unidade, embora não
nas em atos? É biblicamente correto dizer ontologicamente, entre Adão e a raça hu-
que Jesus era diferente, ontologicamente, mana pós-queda.
do restante da humanidade no nascimen- A natureza de Jesus foi sem pecado
to? A resposta a estas duas interrogações porque Ele era singular. A posição da
básicas deve habilitar-nos a desenvolver a natureza “não caída” defende a singulari-
posição da “natureza não caída”. dade de Jesus, ontologicamente e de ou-
A natureza de Cristo: a questão soteriológica / 25
gue. Embora o texto basicamente fale de que Jesus “não conheceu pecado” (2Co
Jesus participando da natureza humana, 5:21), não dizer que Jesus veio “em carne
por si mesmo não caracteriza exaustiva- pecaminosa”, sendo que em sua opinião
mente a humanidade de Jesus. Se com- isto “poderia indicar que havia pecado
preendemos a natureza humana de Jesus nele”.34 Paulo pretende apagar tal infe-
como uma exata participação ontológica rência com a frase “em semelhança de
em todos os aspectos da vida humana, carne pecaminosa”.
como faz a posição da natureza caída, en-
tão Ele deve ter experimentado provações Deve ser notado que a posição caída
e enfrentado tentações da maneira como também crê que Jesus nunca pecou. Sen-
todos nós. Falando sobre a tentação es- do este o caso, parece que eles são capa-
creve Tiago: “Cada um é tentado pela sua zes de reter esta crença e dizer, ao mesmo
própria cobiça, quando esta o atrai e se- tempo, que Cristo veio com carne pecami-
duz” (Tg 1:14). Sobre este ponto, Grenz nosa tendo por base sua noção de pecado.
observa que sabemos pelos evangelhos O pecado parece consistir exclusivamente
que Jesus não era atraído para o pecado de ações, sendo que Jesus partilhou de to-
desta maneira. Então ele extrai a implica- das as nossas condições, incluindo o mau
ção ontológica: desejo inerente que atrai a tentação, não
tendo sido, todavia, um pecador.
Neste sentido podemos afirmar a... posição
de que Jesus estava livre da mancha do Ellen G. White sobre a condição do
pecado original, que é proveniente da pro- “ser” de Jesus
pensão para o pecado que todos os seres
humanos herdam de Adão... Jesus não era
atraído para o pecado por um mau desejo
O Espírito de Profecia presta algum
inerente dentro de sua natureza humana.32 esclarecimento sobre a condição ontoló-
gica da natureza humana de Cristo, parti-
A conclusão de Grenz é contrária a cularmente no que se refere à sua alega-
Hebreus 4:15, onde se afirma que Jesus da solidariedade ontológica com os seres
foi tentado em todos os pontos como nós humanos pós-queda? Apenas citarei, sem
somos? Não necessariamente. Hebreus muito comentário, algumas referências
4:15 simplesmente declara que Jesus foi sobre o assunto.
tentado tal como os seres humanos são 1. “A encarnação de Cristo sempre tem
tentados. Tinha Jesus que ter a má pro- sido, e sempre permanecerá um mistério.
pensão em sua natureza humana a fim de O que está revelado é para nós e para nos-
ser tentado como são os seres humanos? sos filhos, mas que cada ser humano seja
Não, Adão foi tentado humanamente, mas advertido o terreno de fazer a Cristo com-
ele não tinha as más propensões quando pletamente humano, tal como um de nós
mesmos, porque isto não pode ser.”35
foi tentado.
2. “Ele é um irmão em nossas fraquezas,
Em terceiro lugar, o que dizer de mas não em possuir idênticas paixões.
Romanos 8:3? Gage citou Nygren com Como o Impecável, sua natureza recuava
aprovação e disse que Jesus partilhou do mal.”36.
de todas as nossas condições. Ostensi- 3. “Por causa do pecado sua [de Adão] pos-
vamente, isto deve incluir nossa propen- teridade nasceu com propensões inerentes
são para o pecado, sendo que “da ‘carne’ de desobediência. Mas Jesus Cristo era o
surgia para Ele as mesmas tentações que unigênito Filho de Deus. Ele tomou sobre
para nós”.33 Aqui Bruce novamente pen- si a natureza humana, e foi tentado em to-
sa que isto estaria incorreto em vista do das as coisas como a natureza humana é
fato de Paulo, que claramente ensinou tentada. Ele poderia ter pecado; Ele pode-
A natureza de Cristo: a questão soteriológica / 27
ria ter caído, mas nem por um momento evidência em seus escritos no que concer-
houve nele uma má propensão.”37 ne à ausência de propensão para o mal na
4. “Ele era um poderoso suplicante, não natureza humana de Cristo? Erwin Gane
possuindo as paixões de nossa natureza argumenta que a menos que estejamos
humana caída, mas cercado de semelhan- dispostos a afirmar que Ellen G. White se
tes fraquezas, tentado em todas as coisas contradiz, somos obrigados a interpretar
como nós somos. Jesus suportou a agonia a passagem de alguma outra maneira. Da
que exigia auxílio e apoio de Seu Pai.”38 sua parte, Gane aplica os efeitos dos 4 mil
Muito claramente, Ellen G. White não anos sobre a humanidade de Jesus à sua
via a natureza humana de Cristo como dimensão física.40
sendo exatamente como a nossa. Ao me- Gane não é inexato nesta sugestão
nos tanto quanto diz respeito à propensão quando consideramos a seguinte declara-
para o pecado Ele não estava em completa ção da Sra. White: “Ele é um irmão em
solidariedade ontológica com nossa peca- nossas fraquezas, mas não em possuir
minosa e depravada natureza. idênticas paixões. Como o Impecável,
A despeito destas claras afirmações já sua natureza recuava do mal.”41 Nesta
citadas, outras passagens parecem dar a passagem, paixão se relaciona com “na-
impressão de que Cristo herdou uma na- tureza”, que em E. G. White, conforme
tureza humana caída e pecaminosa. Con- Gane mostra cuidadosamente, se trata de
sidere, por exemplo, a seguinte: sua natureza espiritual, distinta da natu-
reza física e intelectual do homem.42 Nis-
A história de Belém é inexaurível. Nela so, Cristo é diferente de nós. Por outro
se acham ocultas as “profundidades das lado, Cristo era semelhante a nós em nos-
riquezas, tanto da sabedoria como da sas fraquezas, que, neste caso, devem ser
ciência de Deus” (Rm 11:33). Maravi-
o que fica da natureza humana quando o
lhamo-nos do sacrifício do Salvador em
espiritual é retirado; a saber, as fraquezas
permutar o trono do Céu pela manjedou-
ra, e a companhia dos anjos que o ado- físicas.43
ravam pela dos animais da estrebaria. O
orgulho e presunção humanos ficam re- A conexão soteriológica no ponto de
preendidos em sua presença. Todavia, vista da “natureza caída”
esse passo não era senão o princípio de
sua maravilhosa condescendência. Teria
A avaliação soteriológica da posição
sido uma quase infinita humilhação para
natureza caída deve iniciar-se com sua
o Filho de Deus, revestir-se da natureza
humana mesmo quando Adão permane- opinião de pecado. O ponto de vista de
cia em seu estado de inocência, no Éden. que “possuir carne pecaminosa não torna
Mas Jesus aceitou a humanidade quando necessariamente a pessoa um pecador”
a raça havia sido enfraquecida por quatro já foi examinado e demonstrado como
mil anos de pecado. Como qualquer filho biblicamente incorreto. A noção, porém,
de Adão, aceitou os resultados da opera- incorpora um conceito específico de pe-
ção da grande lei da hereditariedade. O cado, podendo ser justificada somente se
que estes resultados foram, manifesta-se o pecado for definido em termos de ações.
na história de seus ancestrais terrestres. Em poucas palavras, parece que esta é
Veio com essa hereditariedade para par- a opinião de pecado que fundamenta a
tilhar de nossas dores e tentações, e dar-
posição da “natureza caída”, conforme
nos o exemplo de uma vida impecável.39
apresentada por Gage.
Como devemos lidar com tal declara- Uma ação que focalize a hamartiologia
ção em face do que parece ser esmagadora [estudo do pecado] tende a conduzir a uma
28 / Parousia - 1º semestre de 2008
Referências 3
Stanley J. Grenz, Theology for the Community
of God (Grand Rapids, MI: Eerdmans Publishing
1
Artigo traduzido do original em inglês por Company, 1994): 247.
Francisco Alves de Pontes.
4
Veja “A Carta de Ário a Eusébio” em Docu-
2
Raymond E. Brown, An Introduction to the mentos da Igreja Cristã.
New Testament Christology (Paulist Press, New
York, 1994): 3. 5
Grenz, 248.
30 / Parousia - 1º semestre de 2008
6
Ibid., 274. (Philadelphia: The Westminster Press, 1975), 80.
7
Gregório de Nazianzo, “An Examination of 32
Grenz, 276.
Apollinarius,” em Bettenson, 45. 33
Gage, 4 (ênfase minha).
8
Justo L. Gonzalez, A History of Christian Thou- 34
Bruce, 152.
ght, Vol. 1. (Nashville: Abingdon Press, 1970): 363.
9
Grenz, 296.
35
Ellen G. White, em Don F. Neufeld, ed.,
Seventh-day Adventist Bible Commentary (Jagers-
10
John H. Leith, ed., Creeds of the Churches town, MD: Review and Herald, 1979), 5:1129.
(Atlanta: John Knox, 1982), 36.
36
Idem, Testemunhos para a Igreja (Tatuí, SP:
11
Grenz, 298. Casa Publicadora Brasileira, 2002), 2:202.
12
Duas dissertações tratando das respectivas
Idem, em Don F. Neufeld, ed., Seventh-day
37
posições estão publicadas no Website do Instituto
Adventist Bible Commentary, 5:1129.
de Pesquisas Bíblicas [www.adventistbiblicalre-
search.org]: Kenneth Gage (pseudônimo), “What 38
Idem, Testemunhos para a Igreja, 2:202.
Human Nature Did Jesus Take? Fallen”; Benjamin 39
Idem, O Desejado de Todas as Nações (Ta-
Rand (pseudônimo), “What Human Nature Did
tuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), 25.
Jesus Take? Unfallen” [esta última publicada nes-
ta edição de Parousia com o título “Que natureza 40
Erwin R. Gane, “Christ and Human Per-
humana Jesus assumiu? Não caída”]. Estas decla- fection”, Ministry, outubro de 1970, Suplemento
rações de posturas oficiais cristalizam os pensa- Reimpresso de Ministry, agosto de 2003, 16. Veja
mentos sobre lados opostos e serão inseparáveis em Gane, 15-16 para o que ele considera ser outras in-
minha análise. satisfatórias, mas possíveis maneiras de interpretar
a passagem.
13
Gage, 3.
41
Ellen G. White, Testemunhos para a Igreja,
14
Ibidem. 2:202.
15
Ibidem. 42
Erwin R. Gane, “Christ and Human Perfec-
16
Ibidem. tion”, 6.
17
Ibidem.
43
Embora E. G. White use a palavra fraqueza tam-
bém no sentido de fraqueza espiritual, o uso prepon-
18
Ibid., 6. derante da palavra parece ser em um sentido físico e
19
Ibid., 4. material (Atos dos Apóstolos, 208; Testemunhos para
a Igreja, 2:434; Testemunhos para Igreja, 4:30; Ciên-
20
Ibidem. cia do Bom Viver, 226; Mensagens Escolhidas, 2:231;
21
Ibid., 6 (ênfase minha). Testemunhos para a Igreja, 1:306; Santificação, 25).
22
Ibidem.
44
Gage, 6.
23
Benjamin Rand, “Que natureza humana Jesus
45
Ibid., 5.
assumiu? Não caída”, nesta edição de Parousia, 34. 46
Ibid., 6 (ênfase minha).
24
Ibidem. Donald Guthrie, Tyndale New Testament
47
25
Ibidem. Commentaries, Hebrews (Grand Rapids, MI: Eerd-
mans Publishing Company, 1989): 88-89.
26
Ibidem. 48
Gage, 6.
27
Ibid., 35. 49
Grenz, 184.
28
Ibid., 33. 50
Dale Moody, “God’s Only Son”, Journal of
29
F. F. Bruce, Tyndale New Testament Commen- Biblical Literature, 72 (1953): 4.
taries, Romans (Grand Rapids, MI: Eerdmans Pu-
blishing Company, 1988), 118-123.
51
Rand, 39.
52
George E. Ladd, A Theology of the New Tes-
30
Ibid., 123.
tament (Grand Rapids, MI: Eerdmans Publishing
31
William Barclay, The Letter to the Romans, Company, 1991): 188.