Вы находитесь на странице: 1из 12

131

Da hipermodernidade
ao consumo retrô:
as dualidades do consumo jovem no século XXI

Rita Aparecida da Conceição Ribeiro


Doutora em Geografia pela UFMG
Professora do Programa de Pós-graduação em
Design da Universidade do Estado de Minas Gerais
E-mail: rita_ribeiro@uol.com.br

Adélia Barroso Fernandes


Doutora em Linguística pela UFMG
Resumo: Vivemos o momento em que uma nova geração, já Professora do Centro Universitário de Belo Horizonte
totalmente formada a partir da inserção tecnológica, começa a E-mail: adeliabfernandes@gmail.com
ter seu espaço. Chamada geração Z, constitui-se por crianças e
adolescentes de até 17 anos. Essa nova geração incorpora, des-
de cedo, as novas tecnologias, mas também as discussões que
permeiam a sociedade. São afinados com as mais recentes tec-
nologias, consomem produtos com aspecto vintage, como os
inspirados na pin-up Betty Boop e se espelham no ideal român-
tico dos livros e filmes como os da saga Crepúsculo. Por que seu
comportamento indica gostos e hábitos tão paradoxais?
Palavras-chave: consumo, tecnologia, comportamento, juventude.

De la hipermodernidad al consumo retro: Las dualidades del O mercado de consumo dos jovens vem
consuno joven en el siglo XXI
Resumen: Vivimos un momento en que una nueva generaci- abrigando, atualmente, as tendências mais
ón, ya totalmente formada a partir de la inserción tecnológica, variadas. Assim como se configuram diversas
comienza a tener espacio. Llamada generación Z, constituida
por niños y adolescentes de hasta 17 años, es una generaci- tribos unidas pelo interesse em estilos musi-
ón que incorpora, desde temprano, las nuevas tecnologías, y cais, tendências de moda, esporte ou games,
también las discusiones que permean la sociedad, consumen
productos con aspecto vintage, como aquellos inspirados en
essas mesmas tribos são responsáveis por in-
la pin-up Betty Boop y se identifican con el ideal romántico fluenciar o gosto e os hábitos de consumo.
de los libros y las películas como los de la saga Crepúsculo. Vivemos o momento em que uma gera-
¿Por qué su comportamiento indica gustos y hábitos tan pa-
radójicos? ção de consumidores, já totalmente forma-
Palabras clave: consumo, tecnología, comportamiento, juventud.  da a partir da inserção tecnológica, começa
From hypermodernity to retro consumption: the dualites youth a participar do mercado. A chamada Gera-
consumption of XXI Century ção Z. Enquanto a geração Y é configurada
Abstract: The moment we live, shows us a generation that
grew up inside an environment of technological integration:
por jovens de 20 a 30 anos, a Z constitui-se
the Z generation. They are children and teenagers that adopt por crianças e adolescentes de até 17 anos. A
new technologies in a easy way and stay in contact with the semelhança entre as duas gerações reside no
most recent ones. They buy vintage products, as that ones that
are inspired by Betty Boop pin-up and have the romantic ideal fato de que a Geração Z também é inquieta,
of Twilight books and movies, but also think about social pro- menos fiel às marcas e acostumada a fazer
blems. Why does their behavior indicate so paradoxical choices
and habits? tarefas múltiplas. A diferença, no entanto, é
Keywords: consumption, technology, behavior, youth. que a nova geração tem todas as característi-

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
132

cas de forma mais acentuada, pois se desen- ideal romântico dos livros e filmes que movi-
volveu junto com os avanços tecnológicos mentam bilhões ao redor do mundo na saga
mais recentes. De acordo com Paulo Carra- Crepúsculo, por exemplo.
menha, diretor presidente da GFK CR Brasil Nossa proposta de trabalho é entender
“A geração Z já nasceu com o joystick, o con- quem são os jovens que compõem a geração
trole remoto e o celular no berço, enquanto Z, que espelha comportamentos, gostos e há-
a Y viu isso acontecer. Se a Y quer as coisas bitos paradoxais. Assim, nos propomos a dis-
rápidas, a Z muito mais, ela não sabe o que é cutir a influência da mídia no comportamen-
o mundo sem tecnologia” (www.mundodo- to social, tendo como foco as transformações
marketing.com.br, 14/09/2010). no consumo, a constituição do universo da
adolescência e como essa nova geração de
consumidores recebe sua influência e é, ao
Além disso, mesmo tempo, criadora de novos hábitos
como fruto do de consumo. Entender essas questões é es-
tar preparado para as demandas de um novo
capitalismo, a mídia
público, cada vez mais seletivo, exigente e, de
se transforma no certa forma, desencantado com a atmosfera
canal ideal para do hiperconsumo em nossa sociedade.
a divulgação de
novos produtos Um olhar sobre a sociedade do consumo
partindo da ótica da comunicação

A sociedade não é mais entendida como


Diferentemente das gerações que se de- estrutura compartimentada e fixa. Assim,
senvolveram paralelamente aos avanços digi- correlacionam-se a tecnologia, a linguagem,
tais, essas novas gerações incorporam, desde o mercado de trabalho, a política e as uni-
cedo, as novas tecnologias, mas também as versidades. Essa concepção filosófica com-
discussões que permeiam a sociedade, como preende o sujeito como participante ativo
a preocupação ambiental, a diversidade se- do processo de conhecimento. A produção,
xual, e não se furtam a discutir tais questões o consumo, ideias e tecnologias formam um
e levantar bandeiras, desde que acreditem ambiente plural.
nelas. Transparência é uma das exigências Dentre as grandes mudanças que se pro-
dessas novas gerações que acessam dados cessaram no transcorrer do século XIX para o
com a maior facilidade e se recusam a pagar século XX, destacam-se o desenvolvimento dos
por produtos e conteúdo. Fazer downloads meios de comunicação e as modificações que
gratuitos de músicas, filmes e livros é um há- atingiram a natureza da transmissão e do in-
bito comum a esses consumidores. tercâmbio das formas simbólicas. Thompson
Quem são esses jovens? Que tipo de influ- aponta que os meios de comunicação promo-
ência eles têm na sociedade? Enquanto são veram uma reelaboração do caráter simbólico
afinados com o que há de mais moderno em da vida social, reorganizando os meios pelos
termos de tecnologia, consomem produtos quais a informação e o conteúdo simbólico são
com aspecto vintage: um bom exemplo é o produzidos, intercambiados e reestruturaram
sucesso que a pin-up criada nos anos 30 do os meios pelos quais os indivíduos se relacio-
século passado faz entre esse público: a linha nam entre si (Thompson, 2001).
Betty Boop vende desde roupas, até material Ao contrário de outras sociedades, que
escolar. A moda já espelha com clareza essa mantinham seus contatos e tomavam co-
tendência retrô, que se reflete também no nhecimento do mundo a sua volta a partir

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
133

das relações essencialmente interpessoais, vi- e modificam suas características culturais. As


venciamos na atualidade a era da informação investigações estão voltadas para uma com-
mediada, em que não contam mais apenas os preensão global de cultura e dos processos
encontros face a face. Segundo Thompson comunicativos, tentando-se traçar um qua-
(2009:31): dro analítico da sociedade contemporânea,
que tem interesses cada vez mais diversos e
Com o desenvolvimento da comunicação
que é heterogênea e complexa, impossibili-
de massa, a circulação das formas simbó-
licas é sempre mais separada da necessida- tando sua circunscrição apenas ao universo
de de um lugar físico comum e por isso a das tecnologias. Do mesmo modo, não há
mobilização do sentido tem cada vez mais como se investigar temas, atitudes e proces-
capacidade de transcender o contexto so- sos culturais sem atentar-se para a presença
cial dentro do qual as formas simbólicas dos meios de comunicação de massa, que
são produzidas. É apenas com o desenvol-
não só participam da configuração dessa so-
vimento da comunicação de massa que os
fenômenos ideológicos podem tornar-se ciedade, como têm um importante papel na
fenômenos de massa, isto é, fenômenos ca- construção da sociedade contemporânea.
pazes de afetar grande número de pessoas A área da comunicação exige, também,
em locais diversos e distantes. Se a comuni- um desenvolvimento permanente de teorias e
cação de massa se tornou o meio mais im- reflexões críticas que deem conta desse com-
portante para a operação da ideologia nas plexo terreno do fazer e do pensar a comu-
sociedades modernas, isso se deve ao fato
de ela se ter transformado num meio im- nicação e a sociedade. A terceira área é a de
portante para a produção e a transmissão negócios, pois as mídias se constituem como
de formas simbólicas, e porque as formas o setor que mais cresce, com investimentos
simbólicas assim produzidas são capazes vultosos, tanto no seu desenvolvimento ope-
de circular numa escala sem precedentes, racional (novas linguagens, convergências,
alcançando milhões de pessoas que com- satélites, equipamentos), como na produção
partilham pouco em comum além da ca-
pacidade de receber mensagens mediadas
de conteúdos para internet, vídeo, impresso,
pelos meios. cinema, rádio, mídias alternativas etc.
Nesse sentido, a produção de objetos
Além disso, como fruto do desenvolvi- de consumo, obrigatoriamente em algum
mento capitalista, a mídia se transforma no momento do seu processo de produção e
canal ideal para a divulgação e instauração colocação no mercado, deve dialogar com
de novos produtos, formas de comporta- os instrumentos da comunicação. Ela se
mento e necessidades que surgem motivadas faz porta-voz das tecnologias, nos apresen-
pela publicidade. De certa forma, podemos ta novos produtos, instiga o consumidor a
compreender o seu crescimento como sendo conhecê-los. Aqueles que fazem e pensam a
também um reflexo desta mobilidade das es- comunicação como um campo do saber, um
truturas midiáticas. campo no qual se operam as transformações
Entender a comunicação pressupõe no sociais, porque, no mínimo, democratizam
mínimo atenção em três áreas que se inter- o acesso e a circulação dos bens simbólicos,
ceptam. A primeira área é a tecnológica, pois entendem o seu papel social e seu poder de
os avanços são velozes e alteram não apenas intervenção na criação de novos hábitos, ou
o modo de uso, mas os modos de relação e na readaptação dos costumes.
produção dos sentidos entre os homens. É Portanto, uma reflexão sobre o proces-
inegável que as tecnologias de comunica- so comunicacional inclui um olhar sobre a
ção, desde o final do século XIX, têm des- experiência vivida pelos sujeitos e o modo
pertado o interesse dos pesquisadores pelo com que esta interfere em sua relação com
modo como os homens trocam, constroem o mundo. A comunicação está ligada à expe-

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
134

riência cotidiana dos sujeitos, não podendo apreensão teórica de determinado objeto de
separar-se dela. A experiência nos remete ao investigação implica, necessariamente, mais
outro, nos impulsiona ao encontro. Se a ex- do que simplesmente a adoção de uma pers-
periência é a marca do mundo em mim, essa pectiva teórico-metodológica. Ao partirmos
marca é, ainda que subjetiva e individual, de determinado conjunto de ideias estamos,
presença dos outros em mim. A comunica- simultaneamente, nos comprometendo com
ção tece uma rede entre nossa experiência e uma forma de “visão de mundo”, que vai tor-
nossa relação com os outros. nar nossas ações cotidianas sobre o objeto e
As transformações culturais e tecnológi- nossa análise dele impregnadas do ponto de
cas ocorridas na sociedade são rapidamente vista adotado. Nossa premissa é entender o
percebidas pelo mercado e refletidas na ótica processo comunicacional como uma intera-
comunicacional. A comunicação apresenta ção entre produtores da informação e con-
as características da pluralidade, do dina- sumidores. Assim, caminhamos no sentido
mismo e das mudanças sociais. “O sujeito do que é possível uma comunicação eficaz entre
pensamento quase não se distingue mais de quem produz a informação e aqueles que a
um coletivo cosmopolita, composto por do- recebem, desde que os instrumentos que via-
bras e voltas do qual cada parte é, por sua vez, bilizem tal processo sejam claros e voltados
misturada, marmoreada ou matizada” (Lévy, para o público que se pretende atingir.
2000:65). É o coletivo cosmopolita (homens, Nossa visão, portanto, privilegia este du-
técnicas e ambiente) que nos integra, numa plo enfoque: não perder a dimensão de mú-
configuração fractal. tua revitalização entre teoria e prática, que
Este coletivo de que nos fala Lévy impõe não devem ser analisadas como realidades
desafios. Por este motivo, partimos de uma antagônicas, e preservar a multiplicidade das
concepção de que o processo comunicacio- abordagens que tratam das variadas proble-
nal não separa a prática da teoria e entende máticas comunicacionais.
os dois processos como partes da construção Além disso, a concepção de comunicação
do saber, que tanto pode servir à reflexão, que orienta nossa discussão apóia-se na ideia
mas também à construção de mecanismos de que ela se constitui como espaço simbóli-
de comunicação mais eficazes com o público co de trocas e disputas de sentidos do social,
consumidor. A comunicação torna essa rela- elaborado de modo permanente e inédito
ção mais imbricada ainda, já que seu objeto pelos sujeitos em interação. A comunicação,
refere-se tanto à análise das práticas culturais de um modo geral, e o jornalismo, a publici-
como à análise e ao domínio das tecnologias dade, as relações públicas e o cinema e vídeo,
que intermediam as inúmeras formas de tro- cada vez mais amparados pelo design, de
cas simbólicas, além das técnicas produtivas modo mais específico, instituem as relações
acionadas no momento em que notícias, sociais e são por elas instituídos, participan-
anúncios publicitários, planejamentos ins- do de forma reflexiva da construção social.
titucionais, produções editoriais, vídeos, fil- O papel da comunicação e do design não se
mes e outros produtos se materializam. restringe às possibilidades do encontro para
A indissociabilidade entre teoria e práti- produção de sentidos, mas significa também
ca – no sentido de que ambas participam do um espaço para que esses sentidos sejam
mesmo movimento em que o homem cons- conferidos, discutidos, reformulados e vol-
trói as suas mais variadas formas de apreen- tem para a sociedade de forma transforma-
são e construção do mundo – é, assim, o que dora, já que tecnologias mudam a sociedade.
nos orienta na formulação deste artigo. Ou- Os meios de comunicação são em gran-
tro elemento que nos diz sobre essa indisso- de parte responsáveis pela maneira como o
ciabilidade é o fato de que qualquer forma de consumo extrapolou apenas as necessidades

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
135

de mercadorias e alcançou o que hoje Nestor da sociedade civil, personalidades e anônimos


Canclini (2010) define como desejo de per- e é também referência para os processos cole-
tencimento social, de cidadania em constru- tivos de produção de sentidos. A comunicação
ção pelo ritual do consumo. As pessoas não midiática tem uma natureza paradoxal (Castro,
consomem apenas o necessário, mas por de- 1997), instituindo formas de interação social e
sejarem sentir-se integradas a uma rede de sendo por elas instituída. A mídia, ao fazer cir-
sociabilidade social. A mídia, especialmente a cular os inúmeros discursos, provoca constan-
televisão, apresenta essas promessas de “estar te reorganização reflexiva da sociedade.
juntos” e de “felicidade” como parte principal
dos produtos à venda. Consumir faz o sujeito
compreender que vive no mesmo tempo dos A comunicação
outros sujeitos, em sintonia cultural e econô- institui as relações
mica. Ser cidadão atualmente não é ter direi-
sociais e é por
tos e deveres, mas também ter condições eco-
nômicas para obter os objetos de desejo. elas instituída,
participando de
[...] quando selecionamos os bens e nos forma reflexiva da
apropriamos deles, definimos o que consi-
deramos publicamente valioso, bem como construção social
os modos com que nos integramos e nos
distinguimos na sociedade, com que com-
binamos o pragmático e o aprazível (Can-
clini, 2010:45).
A publicidade, o design e a influência da
Os discursos que aparecem na mídia fa- mídia no comportamento social
zem parte de um processo de reflexividade
social, e não podemos estabelecer um limite O desenvolvimento tecnológico ocorrido
rígido para determinar o início das produ- no século passado foi determinante para as
ções de sentidos. Tanto os comunicadores transformações em quase todos os campos.
utilizam-se dos conhecimentos comuns que A produção de bens passa do conceito de
circulam na sociedade para abordarem um utilitarismo e incorpora valores intangíveis.
tema, como também os receptores absorvem Hoje, o indivíduo tende a se mostrar a par-
e reelaboram conhecimentos, incorporando- tir dos objetos que possui. A concretização
-os nas suas práticas cotidianas e, por vezes, de identidades atrelada a produtos de con-
modificando-a. Desse modo, lembramos que sumo foi uma marca do final do século XX
aqueles que produzem comunicação de mas- e continua presente, com toda força nesse
sa são também receptores ao lerem jornais, novo milênio. A contribuição da mídia nesse
ao assistirem televisão, ao ouvirem rádio, processo é fundamental, pois ela incentiva
ao lerem livros, ao navegarem na internet e, comportamentos, dissemina modas e reflete
também, ao consumir determinados produ- a configuração da sociedade do consumo.
tos. E os receptores dos produtos midiáticos Como fruto do desenvolvimento capi-
têm acesso a várias fontes de conhecimento e talista, a mídia se transforma no canal ide-
participam de diversas relações em ambien- al para a divulgação e instauração de novos
tes distintos, onde elaboram múltiplos senti- produtos e também de novas formas de
dos sobre a vida social. comportamento e necessidades que surgem
A mídia referencia-se, pois, nas construções motivadas pela publicidade. De certa forma,
de sentido realizadas pelos grupos, atores so- podemos compreender o seu crescimento
ciais, representantes do aparato estatal-admi- como sendo também um reflexo desta mo-
nistrativo, representantes do setor econômico, bilidade das estruturas midiáticas.

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
136

A comunicação não é vista apenas em seu ce entre o design, a publicidade e o momento


potencial instrumentalizador, como algo que sócio-histórico no qual são criados os objetos
possa ser dominado por alguém e que garan- e produzidos os anúncios é buscar compreen-
ta sucesso a todos que souberem operaciona- dê-lo na sua globalidade, pensando como as
lizá-la. O homem é um ser social e a comu- formas simbólicas presentes nos objetos e nos
nicação enraíza-se no seu potencial social. seus anúncios são permeadas pelo cotidiano e
É nesse contexto de agrupamento, de agre- como, mesmo sendo assimiladas pelo consu-
gação, que a comunicação se constitui. Para midor como ficções, ou “propaganda”, dizem
Maffesoli (2001), o homem busca pertencer respeito à sua vida e aos valores disseminados
nessa mesma sociedade.
Maffesoli (2002) ressalta a importância das
construções simbólicas da ficção na vida coti-
A publicidade diana. Para o autor, o fictício permeia o real,
enquanto forma tornando-o mais atraente. O elemento ficcio-
simbólica propicia a nal tem como sentido organizar um espaço
idealização vital, mediando a experiência cotidiana. Os
meios de comunicação de massa, bem como
de personagens e a publicidade, nessa perspectiva, são agentes
situações traduzidas nesse processo, contribuindo para uma cons-
nos anúncios trução simbólica mais complexa, capaz de in-
terferir na forma como os sujeitos localizam-
-se no mundo e constroem sua identidade,
através das mais diversas referências.
a esse corpo coletivo, incorporando-se nele Everardo Rocha (2001) aponta a publi-
e sendo incorporado por ele: “O sentimento cidade como um espaço de bricolagem, no
comum, o desejo de vibrar conjuntamente, sentido de que esta se apropria dos mais di-
não são mais reservados aos domínios sepa- versos domínios. O autor afirma que o pen-
rados da arte, mas invadem todos os aspectos samento mítico também é composto como
da vida social” (Maffesoli, 2001:244). num processo de bricolagem, pois este se
Ao compreender o processo comunicativo encontra limitado aos diversos repertórios
dessa maneira, vamos buscar inter-relacionar construídos pela sociedade. Assim sendo,
as formas simbólicas presentes na publicida- propõe uma aproximação entre o pensa-
de e como elas são assimiladas e influenciadas mento mítico e a publicidade. Para Rocha:
pelos sujeitos, ao mesmo tempo produtores e Ambos encontram na bricolagem uma for-
receptores destas. Vera França (1998) caracteri- ma comum de operação intelectual. Um
za o ato comunicativo como uma interlocução: anúncio se caracteriza como uma estória,
uma narrativa, uma experiência. Sua ex-
O ato comunicativo é mais do que a simples pressão é de uma ideologia construída em
relação de reciprocidade, o “estar juntos”, cima de pequenos fatos do cotidiano que
porque ele supõe a palavra, a construção relacionam um produto a uma forma de
partilhada de uma materialidade simbóli- “bem viver”, de prestígio e status. (...) Um
ca. A comunicação ultrapassa igualmente a anúncio pode ser lido como um mito, uma
esfera circunscrita da palavra pronunciada, narrativa que circula em sociedade. Ou
porque essa palavra se funda na relação como ritual; experimentação e discurso
dos interlocutores, sua “co-presença” e “co- sensível dessa sociedade (Rocha, 2001:59).
-participação” do ato (França, 1998:53).
O aspecto ficcional da publicidade pode
Assim, entender como um processo co- ser responsável, inclusive, pela constituição
municativo singular, a relação que se estabele- das próprias formas como os indivíduos se

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
137

organizam em seus laços sociais cotidiana- pela publicidade proporcionam uma sagra-
mente construídos que nascem em diversos ção dos rituais do dia-a-dia e das representa-
momentos de um estímulo criado a partir ções que constituem o imaginário desenvol-
dos produtos que a mídia veicula, sejam eles vido no cotidiano do homem.
produtos tangíveis ou intangíveis. Seja nas As imagens e estereótipos presentes na
manifestações da moda, ditadas pela mídia publicidade definem modelos capazes de
e que conformam e distinguem as mais di- criar comportamentos, atitudes e até mesmo
versas tribos urbanas, seja pelo status que o expressões idiomáticas que se incorporam ao
produto apresentado confere a seu possui- cotidiano das pessoas, possibilitando novas
dor, que o diferencia e o coloca em outra interações e conformando sua experiência
categoria de consumo. Se cabe ao designer do mundo. A publicidade aliada aos produ-
criar os produtos, caberá à publicidade criar tos midiáticos como a TV, o cinema, as revis-
a atmosfera mítica que confere a eles valores tas e a internet propiciam uma recriação do
simbólicos que os tornam objetos de desejo. ideal de homem e mulher vendendo mode-
A publicidade enquanto forma simbólica los de comportamento e produtos das mais
propicia a idealização de personagens e situ- variadas espécies.
ações traduzidas nos anúncios, assim como
nos contos ou nas lendas populares, e produz
uma eufemização, no sentido dado por Ma- Afinal, quem você pensa que é?

ffesoli (2002) como idealização, que passam De acordo com Iwancow (2005):
despercebidos na vida cotidiana. Essa eufe-
mização pode ser traduzida, dentre outras O Estatuto da Criança e do Adolescen-
maneiras, pelos diversos estereótipos por ela te, aprovado pela ONU (Organização
veiculados. das Nações Unidas), em 1989, considera
criança, para os efeitos da Lei, o menor
Essa relação “totêmica”, que pode assumir de 12 anos, e adolescente aquele com ida-
múltiplas formas, encontra-se na fascina- de compreendida entre 12-18 anos, não
ção que exercem o chefe, a vedete, o herói, fazendo qualquer referência à chamada
o criminoso etc., onde a força dessa relação juventude. Para as Nações Unidas, são jo-
reside no fato de encontrarmos nesse totem, vens os indivíduos com idade entre 15 e
nesse ícone, um pedaço de nós mesmos, de 24 anos, mas salvaguarda que, de acordo
nossa vida. Existe uma familiaridade ime- com a realidade, cada país pode estabele-
diata que alimenta sonhos e fantasmas e cer sua “faixa jovem”.
que, através da dupla relação com o objeto
da fascinação, assegura um valor adicional à
vida banal. Essa duplicidade é assim como Para a CNPD – Comissão Nacional de Po-
dissemos, uma maneira de se viver a imor- pulação e Desenvolvimento –, a estratifica-
talidade (Maffesoli, 2002:71-2). ção do grupo jovem (15-24 anos) é dividi-
da em faixas de idades que correspondem
Para Maffesoli, as imagens (de toda or- a público-alvo, subdividindo os seguintes
dem, e em seus vários suportes) são forma- recortes etários: 15 a 17 anos - jovens ado-
lescentes; 18 a 20 anos - jovens; e 21 a 24
doras de todo o corpo social, consumidas anos, jovens adultos.
coletivamente, aqui e agora, servindo como
um fator de agregação que permite perceber
o mundo e não apenas representá-lo. Elas Assim, o adolescente no Brasil é todo indi-
víduo com idade entre 12 anos completos e
forneceriam, então, vínculos que relacionam
18 anos incompletos. E os jovens, segundo
todos os elementos do dado mundano entre os institutos de pesquisa (Ibope e Ipsos/
si, proporcionando um reconhecimento de Marplan) são identificados na larga faixa
si através do outro, seja este outro pessoa, etária dos 15 aos 24 anos (IWANCOW,
ideias ou produtos. As imagens produzidas 2005:6).

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
138

O período da adolescência é considera- tórico. Nossa abordagem, nesse momento,


do como uma fase liminar, momento em privilegiará a cultura adolescente.
que o indivíduo, aos poucos, deixa o status
de criança, mas ainda não é incorporado ao A constituição da cultura do
universo adulto. Por ser considerado um pe- consumo adolescente
ríodo de transição, naturalmente os compor-
tamentos paradoxais são previsíveis, pois os O final da Segunda Guerra Mundial trou-
questionamentos do tipo “afinal você é adul- xe uma série de mudanças em todos os se-
to ou criança?”, fazem parte da rotina dos tores. A industrialização crescente, a política
adolescentes. Porém, muito mais que uma do American Way of Life, com a valorização
questão de mudanças biológicas, aqui enten- mais intensa do consumo voltado para a in-
demos o conceito de adolescência, como na dústria de bens aliados à revolução tecnoló-
perspectiva adotada por Rocha (2009), como gica, trouxe consigo os primeiros passos para
um conceito cultural: uma nova ordem cultural.
A noção de adolescência é, de fato, asso- Depois do advento da televisão de costa a
ciada a um período da vida biológica. Esse costa, após 1945, as rádios locais recebe-
ciclo de vida, porém, demonstra algo mui- ram um novo estímulo. Mas enquanto caía
to preciso: sua própria arbitrariedade. Ele a grande audiência noturna de 17 milhões
revela, sobretudo, que é a ordem cultural de casas para três milhões, pouco foi fei-
que determina a classificação de seus con- to para melhorar a programação além do
teúdos, a hora em que se passa de um lugar aumento do número de canais. O surgi-
para outro, e o modo pelo qual se passa. mento do rádio transistor, primeiramente
Isto não é uma experiência biológica, não oferecido como item de luxo nos Estados
é uma experiência teológica, não é uma Unidos, na década de 1950, além do rápido
experiência metafísica, isto é uma experi- desenvolvimento de rádios para automó-
ência cultural. São valores que fazem essas veis, garantiu um lugar de destaque para a
fronteiras (Rocha e Pereira, 2009:28). música popular, a qual, pontuada por bre-
ves boletins de notícias, permaneceu como
Se entendermos a adolescência pelo pris- um item de consumo geral (Briggs; Burke,
ma cultural, podemos então estabelecer os 2004:233).
territórios que lhe são pertinentes, apoiados
na perspectiva de Morin (1999): O surgimento de uma geração de jovens,
fruto do baby-boom pós-guerra, e o cresci-
O exame sócio-histórico nos levará a dar mento das ocupações que exigiam educação
importância especial aos caracteres ao secundária e superior são fatores preponde-
mesmo tempo de indeterminação e de-
rantes para a formação de uma juventude
terminação da adolescência-juventude: a
indeterminação é este estado incerto que que se torna dominante nas culturas de mer-
vem da coexistência, da imbricação e tam- cado desenvolvidas. O aumento da cultura
bém da distância entre o universo infantil e juvenil indica também uma profunda mu-
o universo adulto. A determinação é o que dança nas relações entre as gerações.
vem preencher esta zona incerta, isto é: 1) a
cultura adolescente; 2) a escolaridade pro- O que importava para os jovens america-
longada e a condição de estudante (Morin, nos era a diversão. Pela primeira vez, mui-
1999:138). tos adolescentes não tinham que trabalhar
para ajudar suas famílias. Além da escola,
O autor apresenta a hipótese de que a cul- estes jovens tinham poucas responsabilida-
tura adolescente, assim como a condição de des incômodas, e, com o advento da aju-
da de custo, eles adquiriram um poder de
estudante, constituem dois pólos de desen- compra maior. Reconhecendo a existência
volvimento de uma classe de idade juvenil de um novo grupo de consumo, empresá-
que tem um importante papel no devir his- rios americanos correram para preencher

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
139

esse filão, provendo-o de itens “essenciais” seu início os sentimentos paradoxais convi-
como roupas, cosméticos, fast food, carros vem e conflitam-se na cultura juvenil. Esses
– e música. Os adolescentes demonstraram
conflitos muitas vezes são incorporados pelo
ser um grupo de consumo extremamente
maleável, gastando seu dinheiro de forma sistema capitalista e retornam na forma dos
previsível. A indústria fonográfica, entre- mais variados produtos, sejam eles bandas de
tanto, produziu uma “Parada de Sucessos” rock, livros ou filmes. “Assim, pode-se dizer
que era banal e leve, carente de qualquer esquematicamente que esta cultura é criada
referência identificável com o dia-a-dia
pela adolescência, mas que ela é produzida
deste novo grupo consumidor (Friedlan-
der, 2006:38). pelo sistema. A criação modifica a produção
e a produção modifica a criação.” (Morin,
A incorporação dos estilos musicais vin- 1999:140).
dos dos guetos, a crescente indústria de con-
sumo de massa cada vez mais voltada para
o público jovem e o desenvolvimento acele- A industrialização,
rado dos veículos de comunicação tendo em o American Way of
primeiro lugar o rádio e posteriormente a Life e a valorização
televisão, possibilitam a difusão dos gêneros intensa do consumo
musicais e sua assimilação por camadas cada
vez maiores de jovens, ávidos pela identifi-
de tecnologia
cação com os novos ídolos que começam a trouxeram uma
surgir. nova ordem cultural
A novidade da década de 1950 foi que os
jovens das classes alta e média, pelo menos
no mundo anglo-saxônico, que cada vez
mais dava a tônica global, começaram a Nesse sentido, podemos entender os dis-
aceitar a música, as roupas e até a lingua- tintos modismos criados pelos adolescentes
gem das classes baixas urbanas, ou o que que rapidamente são incorporados pela in-
tomavam por tais como modelo. O rock foi
dústria virando os mais diversos produtos ao
o exemplo mais espantoso. Em meados da
década de 1950, subitamente irrompeu do longo dos últimos anos do século XX. Um
gueto de catálogos de “Raça” ou “Rhythm caso recente, que ainda vem gerando uma
and blues” das gravadoras americanas, di- série de frutos é o fenômeno desencadeado
rigidos aos negros pobres dos EUA, para pelo livro Eclipse, de Stephenie Meyer. Foca-
tornar-se o idioma universal dos jovens, e
do num romance entre a adolescente Bella e
notadamente dos jovens brancos (Hobsba-
wm, 1999:324). um vampiro e lançado em 2005, o livro rapi-
damente percorreu o mundo, virou filme e
O rock passa a ditar comportamentos que conseguiu uma legião de fãs ardorosos. Ime-
rapidamente são incorporados pela indústria diatamente surgiram no mercado editorial
do entretenimento, que aliada à indústria da dezenas de títulos com histórias similares e
cosmética e da moda, desenvolvem produtos séries de televisão abordando o tema. O livro
voltados especificamente para esse segmento ainda vem gerando outros produtos agrega-
até então inexistente na sociedade de con- dos como cadernos, camisetas, bonecos e ar-
sumo. A cultura adolescente que se forma tefatos voltados para o seu público-alvo.
já está atrelada a valores paradoxais. “Esta Eclipse é um fenômeno interessante de
cultura juvenil é ambivalente. Ela participa ser analisado, pois reúne as principais con-
da cultura de massas que é a do conjunto da venções que vêm povoando o universo dos
sociedade, e ao mesmo tempo procura dife- adolescentes do século XXI. Assim, os vam-
rençar-se” (Morin, 1999:139). Assim, desde piros que na mitologia alimentam-se de san-

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
140

gue humano, no livro são “vegan”, se ali- preço por grande parte dos internautas e
mentam apenas de sangue de animais, mas não para nenhum tipo de avaliação dos
respeitando a natureza. O amor em Bella e produtos.
o vampiro é casto, o ato sexual apenas se Enquanto no discurso percebe-se a pre-
configura após o casamento, já no quarto ocupação com questões sociais, os jovens
livro da série. O vampiro se revela como o entrevistados também não demonstram
novo príncipe encantado do milênio, mas iniciativa – contra ou a favor – em relação
trazendo em sua simbologia os elementos às marcas. A maioria (96%) nunca partici-
do consumo: ele é rico, poderoso e sempre pou de um boicote a um produto ou uma
jovem. Valores esses que constituem os de- empresa. Oitenta e um por cento disseram
sejos da maior parte dos adolescentes. nunca ter comprado um produto com a in-
No século XXI, a cultura juvenil cons- tenção de premiar uma empresa que julga
titui-se, de maneira irrevogável, a partir virtuosa do ponto de vista ambiental ou
de suas interações e influência dos produ- em relação à qualidade, por exemplo.
tos midiáticos e da internet. Em recente Consumidores ávidos de tecnologia, os
pesquisa publicada pelo Centro de Altos adolescentes elegem o celular como seu
Estudos da ESPM, durante o 5º Encon- principal objeto de desejo e consumo. Em
tro Nacional de Estudos do Consumo, no recente levantamento pela pesquisa “Teens
Rio de Janeiro, publicado no site Mundo and Technology” (Jovens e Tecnologia) da
do Marketing em 23/09/2010, os jovens Consumer Electronics Association (CEA)
se apresentam como consumidores cada nos Estados Unidos e publicada na revista
vez mais paradoxais. Enquanto, de acor- Época Negócios (2009), 92% dos pesquisa-
do com a pesquisa, sessenta por cento dos dos sentem-se à vontade com tecnologia, e
jovens acreditam que o consumidor pode 77% afirmam que ela é a forma preferen-
influenciar a sociedade mudando produ- cial para socializar-se com os amigos.
tos e empresas que não estão preocupados Uma conclusão apresentada no mesmo
com questões ambientais, éticas e sociais, artigo, em que entidades como a CEA e as
apenas 6% deles se interessam por política agências de publicidade Y&R e JWT, em
e outros 5% por questões ligadas ao meio- Londres apontam é o caráter paradoxal do
-ambiente. consumo desse segmento. A busca dos jo-
Apesar de se considerarem bem infor- vens por objetos do passado é um dado que
mados, os assuntos sobre os quais reve- pode ser comprovado pelo recente interes-
lam maior domínio são o esporte (42%), se em discos de vinil e câmeras fotográficas
seguido por música (31%), moda (18%) e manuais. Na matéria “Os novos velhos”,
cinema (12%). As maiores fontes de infor- publicada no jornal Folha de S.Paulo em
mação ainda são constituídas em primeiro 04/04/2011, jovens que optaram por câme-
lugar pela TV aberta, seguida pela internet ras manuais e discos de vinil revelam seu
e por influência de amigos. O baixo nível fascínio por esses “objetos retrô”. Apesar
de interesse desses consumidores pela po- de afirmarem não se desvincular das novas
lítica também se manifesta no consumo, tecnologias, fazem questão de ressaltar o
mostrando-se pouco engajados quando diferencial dos artefatos mais antigos.
o assunto é aprofundar-se em relação aos Outro exemplo que serve para ilustrar a
produtos. A maioria dos jovens, represen- questão, diz respeito ao caráter retrô com-
tados por 76% dos entrevistados, ainda de binado à alta tecnologia. Mesmo nos obje-
acordo com o site, interage frequentemen- tos de ponta como os IPhone, o apelo retrô
te com o que a internet oferece. A web, no está presente, basta olhar os modelos das
entanto, ainda é usada para pesquisa de capas que começam a ser comercializadas:

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
141

Ilustração 1: capa para iPhone rádio te, agora têm se tornado verdadeiros eventos
transistor.1 sociais entre as meninas. Na moda, a tendên-
cia retrô se afirma, principalmente nas tribos
ligadas à cultura do rock e da pop music. A
figura da pin-up Betty Boop, ícone dos anos
30, estampa desde cadernos a camisetas.

Paradoxais, porém não imprevisíveis



Ilustração 2: capa para iPhone câmera Ao examinarmos os comportamentos
fotográfica.2 e tendências de consumo dos adolescentes
do século XXI, podemos perceber como os
diversos consumos – música, moda, filmes,
objetos constituem, cada vez mais cedo, os
elementos distintivos da sua identidade.
São os objetos indicadores que apresentam
a condição social do indivíduo. Ela pode se
caracterizar desde bens de alto custo, como
o último modelo de carro esportivo ou um
Também, ao se digitar num iPad, o baru- novo modelo celular. O que importa é que o
lho que se ouve é uma reprodução do som das seu uso confere ao portador uma distinção
antigas máquinas de datilografia. Na maioria entre os demais.
das máquinas fotográficas digitais, ao dispará- Os adolescentes, ainda em busca de seu
-las, o dispositivo imita o som das máquinas lugar no mundo, constituem uma cultura
mecânicas. Avançamos, mas sem querer nos que valoriza determinados bens que são re-
desapegar dos valores e tradições antigas. presentativos dos seus distintos códigos de
conduta. Assim, ao percebermos a oscilação
Ilustração 3: porta durex em formato de
entre os objetos da hipermodernidade: celu-
fita cassete.3
lares, IPads, jogos de última geração, associa-
dos ao consumo de objetos retrô, observa-
mos que a necessidade de contestação ainda
está presente.
A nova cultura adolescente-juvenil tem,
assim, dois polos e a partir desta bipolari-
dade se efetua uma espécie de eletrólise em
que se cria algo de misto, que se difunde no
Assim como no exemplo da saga Crepús- conjunto do mercado juvenil. Nesta zona
culo e nos objetos de apelo retrô, as tradições mista, a dissidência e a revolta são integra-
têm retornado ao universo adolescente. Fes- dos no sistema, depois de terem sido mais
tas de 15 anos, que durante muito tempo fi- ou menos filtradas, sem que, entretanto,
sejam eliminados todos os elementos cor-
caram esquecidas no imaginário adolescen-
rosivos (Morin, 1999:139-140).
1
Disponível em http://blogdaretro.uol.com.br/?p=5446. No entanto, percebemos com mais inten-
­Acesso em: 17/03/2011.
2
Disponível em http://blogdaretro.uol.com.br/?p=5446. sidade que o caráter contestatório se traduz
­Acesso em: 17/03/2011. muito mais no consumo, do que em atitudes
3
Disponível em http://www.rosamundo.com.br/Conteudo/
ProdutoDetalhe.aspx?idProduto=00001753&modelo=POR
de contestação ou mobilização social. Ainda
TA_DUREX_FITA_CASSETE. Acesso em: 22/03/2011. que estas estejam presentes em seu ideário,

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...
142

o consumo, mais que tudo é a marca dessa rede, percebemos que os maiores focos de
geração. influência ainda continuam na grande mí-
A grande transição que observamos na dia, mas o estabelecimento das comunidades
constituição da geração adolescente, a partir constituídas pelo Orkut e Facebook, entre
dos babyboomers dos anos 50 até esta segun- outras, promove novas formas de relaciona-
da década do século XXI é justamente a afir- mento e interação social.
mação das identidades não mais pelo atrela- As tecnologias, nesse sentido, serviram
mento a determinados movimentos, como o para modificar os processos de interação,
movimento hippie, os movimentos estudan- que são cada vez mais mediados, seja pelos
tis, mas a partir dos diversos consumos. celulares ou pelas redes sociais. Se mudam os
Num primeiro momento, tais consumos processos de interação social, certamente ou-
se revelam pela influência direta dos meios tras mudanças serão sentidas a partir do mo-
de comunicação de massa, tendo o cinema mento em que esses adolescentes migrarem
em primeiro lugar, seguido pelo rádio e, a para a idade adulta. Como serão suas novas
partir dos anos 60, pela imensa influência da relações? Aí somente o tempo dirá.
televisão. Com o advento da sociedade em (artigo recebido dez.2011/ aprovado out.2012)

Referências

BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de LUCKMANN, Thomas; BERGER, Peter L. A construção social
Gutenberg à internet. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. da realidade. Petrópolis: Vozes, 2006.
CANCLINI, Néstor. Consumidores e cidadãos. Rio de Janeiro: MAFFESOLI, Michel. Elogio da razão sensível. Petrópolis:
Editora UFRJ, 2010. Vozes, 2001.
CASTRO, Maria Ceres S. Na tessitura da cena, a vida, comuni- MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: necrose. Rio
cação sociabilidade e política. Belo Horizonte: UFMG, 1997. de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
FRANÇA, Vera Regina Veiga. Jornalismo e vida social. Belo PORTO, Edson. “O mapa do consumo adolescente”. Época Ne-
Horizonte: UFMG, 1998. gócios. São Paulo, n. 31, setembro 2009.
FRIEDLANDER, Paul. Rock and roll: uma história social. Rio ROCHA, Everardo; PEREIRA, Cláudia. Juventude e consumo:
de Janeiro: Record, 2006. um estudo sobre a comunicação na cultura contemporânea.
HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX – Rio de Janeiro: Mauad, 2009.
1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. ROCHA, Everardo. Magia e capitalismo. São Paulo: Brasilien-
IWANCOW, A. E. “A cultura do consumo e o adultescente”. se, 2001.
Texto apresentado no XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade. Petrópolis:
da Comunicação (Intercom). Rio de Janeiro, 2005. Vozes, 2001.
KOSIK, Karel. Dialética do concreto. São Paulo: Paz e Terra, THOMPSON, John B. Ideologia e cultura moderna. Petrópo-
1995. lis: Vozes, 2009.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. São Paulo: Edi- TOTI, Thaís. “Os novos velhos”. Folha de S.Paulo, Folhateen,
tora 34, 2000. 04 de abril de 2011.

Líbero – São Paulo – v. 16, n. 31, p. 131-142, jan./jun. de 2013


Rita Aparecida da Conceição Ribeiro / Adélia Barroso Fernandes – Da hipermodernidade ao consumo retrô...

Вам также может понравиться