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Dos Problemas Sociais aos Problema sociológicos

Definição de Problema Social


Rubington e Weinberg Spector e Kitsuse
Um Problema Social é “uma alegada situação incompatível com Um Problema Social é constituído pelo conjunto das
um significativo número de pessoas que concordam ser acções que indivíduos ou grupos levam a cabo ao
necessário agir para a alterar”. prosseguirem reivindicações relativamente a
determinadas condições putativas
As duas definições são muito diferentes nos seus pressupostos. Enquanto a primeira (Rubington e Weinberg) se centra na
situação que é considerada problema a segunda (Spector e Kitsuse) priveligia o processo pelo qual uma situação é
considera um problema.
É difícil chegar a uma definição consensual do que é um problema social, quer ao nível da realidade social, quer entre os
sociólogos que se dedicam ao seu estudo, porque a definição depende da perspectiva que se adota.
Os problemas sociais imbuídos de um significado social (porque se definem em função de um conjunto de valores sociais)
ao passarem pelo crivo do método científico adquirem um significado sociológico, isto é, reflectem valores sociológicos
relativos às perspectivas teóricas e metodológicas seguidas.
 Regularidade
Para que um problema social possa ser considerado um  Uniformidade
problema sociológico deve possuir as condições de :  Impessoalidade
 Repetição
Exemplo: Ao nível do significado social, a juventude é problematizada relativamente a aspectos tão variados como a
inserção profissional, a emancipação adulta, a toxicodependência a crise dos valores tradicionais entre muitos outros
aspectos.
Mas problematizar sociologicamente a juventude será questionar, por exemplo, se os jovens sentem estes problemas como
seus e de que forma os percepcionam. Será questionar a definição de jovem, quais as soluções que a sociedade preconiza
para os problemas da juventude e quais as suas consequências.

O Conhecimento sociológico pode ser situado num contínuo epistemológico que vai do Positivismo ao Relativismo

Positivismo Relativismo
A sociedade positivista defende a procura de leis sociais (à Segundo a posição relativista não existe nenhum critério
semelhança das leis do mundo natural) a partir de um método universal para o conhecimento e para a verdade. Todos
indutivo-quantitativo e advoga uma separação absoluta entre a os critérios utilizados serão sempre internos ao sistema
Ciência e a Moral isto é entre os fatos e os valores. cogniscente e como tal são relativos e não universais.
Para esta ciência é possível conhecer objectivamente a realidade Consequentemente a definição do que seja um
social, uma vez que existem critérios universais do problema social será sempre relativa, será antes de mais
conhecimento e da verdade. Ao abordar os problemas sociais a um rótulo colocado a determinadas situações e não
sociedade positivista estuda situações objectivas, que são uma característica inerente à situação em si mesma.
definidas como problemas em razão de características que lhe O que importa estudar é a definição subjectiva dos
são próprias. Daí a necessidade de se conhecerem as suas problemas sociais, conhecer os processos pelos quais
causas e de se chegar à elaboração das leis que regem o uma dada situação se torna problema social.
fenómeno.
A aplicabilidade da ciência e o desenvolvimento teórico
Um problema pressupõe uma solução. Os problemas sociais que têm um significado social requerem uma solução social

Desde o início que os sociólogos tentam equancionar o que Rubington e Weinberg denominam de mandato duplo
a) Por uma lado dar atenção aos problemas existentes na b) Por outro lado desenvolver teórica e
sociedade, numa perspectiva de correcção da realidade metodologicamente a sociologia enquanto ciência
social, através dos conhecimentos empíricos adquiridos
A ênfase que cada sociólogo coloca num prato ou noutro da balança condiciona o modo como problematiza a sociedade e o
seu trabalho como investigador.
Utilizando os conceitos de uma forma muito livre podemos dizer que as perspectivas que enfatizam o primeiro objectivo
estudam “problemas sociais” (sociologia correctiva) enquanto as que priveligiam o segundo objectivo estudam “problemas
sociológicos”
Hester e Eglin
Sociologia correctiva (pressupostos) Sociologia de intervenção
 Equivalência de problema social a problema sociológico
 As questões sociológicas derivam das preocupações sociais
 O grande objectivo do estudo sociológico é a melhoria dos A sociologia de intervenção não é uma especialidade ou
problemas sociais ramo sociológico, mas sim um modo de ver o trabalho
 Preocupação central com as causas ou etiologia dos do cientista social, que em vez de isolar o investigador
problemas relativamente ao seu objecto de estudo, o desafia ao
 Compromisso com os princípios positivistas da ciência invés, a ser contaminado por este levando-o a intervir
Para estes autores a sociologia correctiva falha nos seus ativamente na realidade que estuda e a não separar os
propósitos precisamente porque não separa a aplicabilidade da papéis de investigador e de cidadão. A investigação
ciência do seu corpus teórico-metodológico e não reconhece os social deve ser utilizada para melhorar a sociedade,
viezes que tal situação origina. segundo princípios humanistas de solidariedade e
Encara as pessoas como objectos e não como sujeitos que libertação
constroem a realidade social
As Perspetivas de estudo dos problemas sociais
Sociologia Positivista

1 – PATOLOGIA SOCIAL

O pensamento organicista cujo autor mais consistente foi o britânico Herbert Spencer, defende que a sociedade e os seus
elementos podem sofrer malformações, desajustamento e doenças à semelhança dos organismos vivos. Este argumento
pressupõe um estado de saúde ou de normalidade do organismo, sendo que as pessoas e as situações que interferiram com
este estado de normal funcionamento do organismo social são assim considerados problemas sociais.
Para a corrente da Patologia Social um problema social é uma violação das expetativas morais (Rubington, Weinberg).
A condição de saúde ou normalidade do organismo é definida por valorações do Bem ou do Mal.
A patologia pode ser encontrada no indivíduo ou no mau funcionamento institucional.
Perspetiva do Homem Delinquente (Escola positiva italiana Cesare Lombroso)
Uma vez que o problema está no indivíduo é essencial que se identifiquem as características que identificam o elemento
doente daqueles que são normais.
Para Cesare Lombroso era claro que a explicação do comportamento criminal dos indivíduos estava em características
fisiológicas particulares como o tamanho dos maxilares, assimetria facial, orelhas grandes ou a existência de um número
anormal de dedos.
Esta corrente voltou a ganhar alguma importância na década de 1960 mas os novos patologistas sociais afastaram-se da
procura de deficiências nos indivíduos e centraram-se nas deficiências na socialização. Segundo esta nova aproximação À
patologia social, os problemas sociais seriam o resultado da incorportação de valores “errados” pelos indivíduos fruto de
uma “sociedade doente”. Neste sentido a solução para os problemas sociais passaria necessariamente pela educação moral
da sociedade e pela incorporação de valores moralmente corretos

DEFINIÇÃO de PATOLOGIA
Define a patologia como sendo um comportamento destrutivo ou auto-destrutivo.
Vytautas Kavolis A definição de comportamento destrutivo seria possível em termos absolutos para
(Positivista) Vytautas Kavolis, isto é, igual em todas as sociedades humanas.
Defende que é impossível chegar a uma definição objectiva do que é patológico, até
Carl Rosenquist porque a “saúde” da sociedade passa muitas vezes pela “doença” de algumas das
(Relativista) suas partes. Para rosenquist a única forma de se estudarem os problemas sociais é
passando ao lado do que constitui a sua condição problemática e aceitar o
julgamento social como um dado
2 – DESORGANIZAÇÃO SOCIAL
A perspectiva da patologia social dominou o estudo dos problemas sociais até sensivelmente ao fim da Primeira Guerra
Mundial. Com a década de 1920 a perspectiva da desorganização social ganha claramente terreno na sociologia norte-
americana.
Autores da Patologia Social Autores da Desorganização Social
Trabalharam com concetualizações e termos emprestados de Em contraste os autores da perspetiva da desorganização
outras ciências e consideraram sobretudo a aplicabilidade social utilizam um conceito claramente “sociológico” e que
prática dos conhecimentos sociológicos na resolução dos apresenta um maior potencial de operacionalização do que
problemas sociais o conceito da patologia social
Segundo Rubington e Weinberg os quatro teóricos mais importantes da desorganização social foram :
Charles Cooley, Thomas, Znaniecki e Wiliam Ogburn
grupos primários onde os indivíduos vivem relacionamentos face a face, mais
Teorizou a
intensos e duradouros
Charles Cooley distinção
grupos secundários onde as relações são mais impessoais e menos frequentes
Definiu a desorganização social como sendo a desintegração das tradições.
Thomas e Znaniecki Concetualizaram a desorganização social como a quebra de influência das regras sociais sobre os
indivíduos
O contributo de Ogburn centrou-se no conceito de desfasamento cultural. Para a perspectiva da
desorganização social, a sociedade não é um organismo mas sim um sistema composto por várias
Ogburn
partes interdependentes. Segundo Ogburn as partes do sitema cultural podem modificar-se a ritmos
diferentes, produzindo um desfasamento no sistema que origina a desorganização social
Exemplo : Robert Park afirmou que a organização social se baseia nas tradições e nos costumes e que tudo o que perturba
os atos sociais, isto é, a mudança social, tem potenciais efeitos desorganizadores. Para os Autores da Escola de Chicago
(Robert Park) a desorganização social e por conseguinte os problemas sociais, têm uma distribuição desigual pelas
diferentes zonas da cidade, apresentando maior intensidade nas zonas de transição ou se concentram os imigrantes mais
recentes vindos de zonas rurais e onde é a maior a quebra do peso das tradições.
Críticas apontadas por Marshall Clinard ao conceito de Desorganização Social

a) O seu poder explicativo para a sociedade geral é reduzido, por ser um conceito demasiado vago e subjectivo. Será
mais adequado para a análise de grupos mais específicos e não para toda a sociedade.
b) Confundiu-se desorganização social com mudança social, o que desde já deixa por explicar porque é que nem
todas as mudanças originam desorganização, e implica que se prove que a situação anterior era de organização.
c) É um conceito fortemente sujeito aos julgamentos de valor do investigador, tal como o conceito de patologia. Por
um lado, tende-se a considerar desorganização numa perspectiva negativa como se todas as situações de
desorganização sejam por essência “más”.
d) Por outro lado, aplicou-se o conceito de desorganização social a situações que não são de desorganização, mas
que, pelo contrário, traduzem outros tipos de organização, de que é um exemplo típico o que se passa nos bairros
de lata.
e) O sistema social pode acolher em si focos de desorganização ou a existência de comportamentos desviados sem
que tal comprometa o seu funcionamento, desde que outros objectivos do sistema estejam a ser alcançado,
contrabalançando as influências desestabilizadoras que posam existir.
f) No seguimento da crítica anterior, ao constatarmos a existência de diferentes formas de organização social, não
podemos inferir que tal situação seja desastrosa para a sociedade, podendo pelo contrário ser indispensável para a
manutenção da coesão social

Outra crítica importante a pontar é que a perspectiva da desorganização social utiliza frequentemente explicações
circulares para os problemas de desorganização, isto é, o mesmo fato é considerado indicador e causa da
desorganização social ( exemplo: Desemprego)
3 – CONFLITO DE VALORES

Um outro modo de ver os problemas sociais é considerá-los como o reflexo de um conflito de valores na sociedade
relativamente a uma dada situação.
Esta perspectiva concebe a sociedade como um palco onde se confrontam grupos sociais com interesses diferentes
fazendo deste conflito permanente a dinâmica central da vida social. Os problemas sociais que daí resultam só podem ser
solucionados recorrendo à resolução de conflitos que estão na sua origem de formas como a negociação ou o consenso, ou
pela imposição ou coerção.
A perspetiva do conflito de valores, ao definir problemas sociais em relação a valores ou interesses dos grupos sociais
envolvidos, coloca em evidência a importância da definição subjectiva, sem a qual a condição objectiva de base não seria
só por si um problema social.

Teóricos mais importantes desta corrente da sociologia norte-americana


Richar Fuller e Richard Myers
Relativamente aos problemas físicos que não são causados pela acção
a) Problemas físicos humana (sismos, furacões) é consensual que a condição objectiva é
indesejável e nada se pode fazer para controlar as causa do problema
b) Problemas remediáveis Ex: delinquência juvenil. Apresentam consenso quanto à
Problemas que
(ameliorative) indesejabilidade da situação e quanto à necessidade de agir para a
afetam as
corrigir, mas criam-se conflitos no que diz respeito ao conteúdo da
sociedades
acção ou seja o que fazer
Os problemas morais são os mais complexos pois não existe consenso
c) Problemas morais quanto à própria indesejabilidade da situação
Ex: Consumo de marijuana, Eutanásia
Ainda segundo Fuller e Myers os problemas sociais evoluem segundo três fases

Inicialmente processa-se a tomada de consciência do problema quando os grupos sociais começam a


1ª Fase
encaram uma dada situação incompatível com os seus valores mais importantes, reconhecendo a
necessidade de agir

2ª Fase segue-se uma fase de determinação política, isto é, um processo de clarificação dos valores e das posições
em presença e definição de propostas de acção

3ª Fase por fim a fase das reformas, na qual são postas em prática determinadas soluções para o problema, que
podem ser levadas a cabno por agentes públicos ou por organizações privadas
Estas 3 fases não se excluem mas tendem pelo contrário a sobrepor-se: geralmente os grupos com maior poder colocam
em prática propostas de acção sem que isso signifique o encerramento da fase de determinação política. A fase da
consciencialização dos problemas pode ser considerada como estando sempre em aberto

4 - COMPORTAMENTO DESVIADO

Em meados do Séc. XX a sociologia tinha já realizado um longo caminho no seu desenvolvimento teórico e metodológico, o
número de sociólogos tinha aumentado consideravelmente bem como o financiamento para pesquisas. Havia cada vez
mais disposição para a integração entre teoria, pesquisa empírica e aplicação prática.
Esta intenção de integrar campos que tantas vezes estavam em oposição está na base da perspectiva do comportamento
desviado.
Observou-se uma clara tentativa de conciliar as duas grandes escolas que dominavam o pensamento académico da
sociologia norte-americana
Escola de Harvard Escola de Chicago
de ênfase teórica empírica e descritiva
Durkheim (sociólogo clássico europeu) É na Escola de Chicago que Edwin Sutherland, desenvolve a
Anomia significava uma ausência de normas, teoria da associação diferencial.
um quebrar de regras Se Merton enfatizou a questão da estrutura social,
Suicídio Anómico - Representa mais Sutherland centrou-se no processo pelo qual se dá o
propriamente uma mudança abrupta na taxa comportamento desviado
normal de suicídio, geralmente marcado por Processo de génese do comportamento criminoso
uma vertiginosa ascensão do número de (sutherland)
suicídios que ocorrem em períodos de crises 1 – o comportamento criminoso é aprendido, não é inato
sociais (o desemprego, por exemplo) ou 2 – é aprendido pela interacção com outros indivíduos num
Anomia processos processo de comunicação
Ausência Merton (Harvard) 3 – a aprendizagem mais importante é feita em grupos
de Leis ou Anomia é um desfasamento entre metas primários
organização culturais a atingir e os meios que a sociedade 4 – a aprendizagem envolve, por um lado, as técnicas
proporciona para o efeito. A estrutura culturalnecessárias ao crime e, por outro lado os motivos as
de uma dada sociedade coloca uma série de racionalizações e as atitudes a ele ligadas
metas a atingir pelos seus membros numa 5 - os motivos e os impulsos são aprendidos segundo a
certa hierarquia de importância. definição favorável ou desfavorável aos códigos legais.
Merton chegou a esta conclusão ao analisar a Podemos estar num meio no qual os códigos legais são
sociedade norte-americana que sobrevaloriza o definidos favoravelmente e são para ser observados, ou,
valor do sucesso mas deixa de lado largos pelo contrário podemos estar rodeados de indivíduos que
segmentos da população sem os meios para o são favoráveis À violação dos códigos legais
alcançar (camadas mais baixas da população) 6 – Um indivíduo torna-se delinquente pela razão de
encontrar um excesso de definições favoráveis à violação
Daqui resulta que o comportamento desviado é considerado da lei em detrimento das definições desfavoráveis à
um comportamento normal em situações consideradas violação da lei
anormais 7 – A associação diferencial veria em termos de frequência,
Tipos de adaptação individual segundo Merton duração, proximidade e intensidade
Desfasamento entre meios e metas 8 – o processo de aprendizagem dos comportamentos
1 - a inovação na qual as metas são mantidas mas são criminosos e não criminosos integra todos os aspectos
utilizados novos meios para as alcançar (roubar; subornar) normalmente envolvidos em qualquer tipo de
2 - o ritualismo pelo qual se renuncia às metas, mas se aprendizagem
sobrevalorizam os meios 9 – as necessidades e os valores gerais (segurança; riqueza
3 – a evasão na qual tanto os meios como as metas são material) que são reflectidos pelo comportamento
renunciados (alcoolismo) criminoso não explicam este mesmo comportamento uma
4 - a rebelião quando se pretende instaurar novas estruturas vez que outros comportamentos não criminosos também
de metas e meios os refletem
Podemos analisar diferentes tipos de problemas sociais com
este modelo de análise desde aqueles que envolvem
comportamentos delinquentes ou criminosos, à burocracia,
comportamentos adictos, movimentos ecologistas e
fundamentalismos vários
Tentativa de complementar e sintetizar a Teoria da Anomia e a Teoria da Associação Diferencial
Albert Cohen na sua teoria da subcultura delinquente sustentou que os jovens da classe trabalhadora enfrentavam uma
situação de anomia no sistema escolar, pensado segundo os valores da classe média. Na escola eram ensinados a prosseguir
estes valores mas eram-lhes vedados os meios legítimos para os poderem atingir. Em resultado estes jovens uniam-se e
formavam uma cultura própria que violava os códigos legais. As novas normas eram socializadas através do processo de
associação diferencial.
Richard Cloward e Lloyd Ohlin na sua teoria da oportunidade, sustentam que não basta considerarmos a estrutura de
oportunidades legítimas na génese do comportamento delinquente: é igualmente essencial ter em conta a estrutura de
oportunidades ilegítimas. Não se trata somente de uma ausência de oportunidades legais, mas também da presença de
oportunidades ilegais
CONCLUSÃO
A perspectiva do comportamento desviado entende que os problemas sociais reflectem, de forma mais ou menos direta,
violações das expectativas normativas da sociedade, sendo que todo o comportamento que viola essas expectativas é um
comportamento desviado. A solução para os problemas de comportamento desviado deverá passar pela ressocialização dos
indivíduos e pela mudança da estrutura social de oportunidades, de forma a que sejam aumentadas as oportunidades
legítimas e diminuídas as oportunidades ilegítimas

Sociologia Relativista
Neste ponto iremos abordar três perspectivas que seguem uma visão relativista da ciência, de base interacionista ( o
labeling e o construtivismo social) e estruturalista ( a perspectiva crítica). Nelas se defende em oposição ao positivismo, que
o conhecimento é socialmente construído. Se assim é, a questão central é saber como é que a realidade faz sentido para as
pessoas e através de que processos estas dão e partilham significados sociais

1 – Labeling

Antes de avançarmos com a descrição da teoria do labeling ou teoria da rotulagem consideramos importante referir
sumariamente as suas bases filisóficas
Foi professor de filosofia na Universidade de Chicago concebeu a formação do ego como o resultado
das interacções sociais com Outros Significativos. Desta forma os indivíduos aprendem a ver-se como
Mead objectos sociais e comportam-se de acordo com essa perceção. As pessoas interagem
fundamentalmente através de símbolos (sons, imagens, gestos) e os seus significados emergem da
interacção social. O comportamento irá depender do entendimento que fizerem destes símbolos, num
processo de reajustamento continuado
Herbert Blumer Desenvolveu a ideia de que os significados não são dados mas requerem uma interpretação ativa por
parte dos atores sociais envolvidos
Introduziu o conceito de identidade social para se referir às qualidades pessoais que permanecem
constantes em diferentes situações. Defendeu ainda que a identidade social pode ser consolidada
Erving Goffman pelas reacções dos outros ao comportamento dos indivíduos. Se as reacções forem negativas, as
pessoas podem ser forçadas a aceitar uma “spoled identity”, processo que Goffman define como de
estigmatização
PIONEIROS DO LABELING
Edwin Lemert Howard Becker
Defendeu no início dos anos 50 a teoria de que o desvio é Introduziu o conceito de Labeling que deu o nome a esta
definido pelas reacções sociais e introduziu os conceitos de corrente e o conceito de carreira desviante.
desvio primário e desvio secundário. Esta distinção de Defendeu que o comportamento desviado é aquele que a
conceitos baseia-se numa outra distinção que Lemert sociedade define como desviado.
estabeleceu entre comportamento desviado e papel social Os problemas sociais tal como os comportamentos
desviado. desviados, são definidos pelas reacções sociais a uma
Existe uma multiplicidade de causas, biológicas e sociais, alegada violação das normas ou expectativas sociais, e
para os comportamentos desviados, isto é para o desvio podem ser ampliados por essas mesmas reacções. Para
primário. Mas a causalidade dos papéis sociais desviados, ou alguém que seja rotulado de desviado é necessário percorrer
desvio secundário, reside na interacção social entre o uma série de fases sequenciais, num processo de interacção
indivíduo que é definido como desviado e o sociedade onde dinâmico a que Becker apelidou de carreira desviante.
se insere. A reação social ao desvio primário está assim na O que a perspectiva do labeling constatou é que nem todos
origem do desvio secundário. os que violam as normas são rotulados de desviados, o que
Evolução da interacção que leva ao desvio secundário nos leva a considerar que em última instância, todo este
1 – ocorrência do desvio primário processo traduz uma certa equação do poder na sociedade:
2 – sanções sociais quem define as regras, quem aplica os rótulos, quem é
3 - recorrência do desvio primário rotulado
4 – sanções sociais mais pesadas e maior rejeição social
5 – continuação do desvio, agora com possivel hostilidade e
ressentimento por parte do indivíduo desviado para com
aqueles que o sancionam
6 – o coeficiente de tolerância chega a um ponto crítico, que
se reflecte nas acções formais de estigmatização do
individuo levadas a cabo pela comunidade
7 - fortalecimento do comportamento desviado como
reacção à estigmatização e às sanções
8 - aceitação do estatuto de desviado por parte do indivíduo
estigmatizado e consequentes ajustamentos com base no
novo papel social
CRÍTICAS AO LABELING
Este aspeto está relacionado com algumas críticas feitas a esta corrente: por um lado afimar que o desvio é originado antes
de mais pela formulação das regras que são violadas e pelas reacções a esta violação das normas, soa como uma
desculpabilização e desresponsabilização dos comportamentos em vez de uma explicação dos mesmos.
Por outro lado para posições políticas mais à esquerda, a corrente do labeling ficou aquém do que podia ter ido na crítica
social ao concentrar-se unicamente no processo de criação e imposição dos rótulos sociais, sem ter ligado a este processo
com as desigualdades na estrutura social

2 – Perspetiva Crítica

A perspectiva crítica, também denominada de perspectiva radical, veio a centrar-se na questão da inflência do poder na
definição dos comportamentos desviados e dos problemas sociais e numa conceção alargada da contextualização social
do desvio.
A fundamentação desta corrente encontra-se no pensamento marxista. Assume portanto uma postura de conflito na
génese dos problemas sociais. Segundo a tradição marxista, os modos de produção da infraestrutura económica
determinam relações sociais distintas. No estádio capitalista de desenvolvimento, a divisão social mais importante é a que
separa os que possuem os meios de produção, a classe capitalista, dos que têm unicamente a sua força de trabalho para
vender, e que constituem a classe trabalhadora.
A classe capitalista tem como interesse vital o aumento do seu lucro e para tal deve explorar a classe trabalhadora,
controlando não só as condições de produção mas igualmente toso os aspectos da vida social. Os interesses da classe
capitalista e da classe trabalhadora são irremediavelmente opostos.
Para a perspectiva crítica, os problemas sociais advêm das relações sociais impostas pelo modo de produção e traduzem a
necessidade de controle da classe capitalista e a necessidade de resistência das classes exploradas.
A solução para os problemas sociais reside em última instância na mudança (de preferência revolucionária) do sistema de
classes para uma sociedade sem clases, isto é, sem exploração humana, sem injustiças e sem desigualdades.

Autores mais significativos desta abordagem


Ian Taylor Paul Walton e Jock Young

Segundos estes, o desvio deve ser analisado de forma materialista e histórica: materialista porque deve ser analisado o
contexto material no qual surge o desvio; histórica porque se deve relacionar o desvio com a evolução histórica dos modos
de produção. Este tipo de análise implica que se estudem as origens imediatas e alargadas do comportamento desviado, as
dinâmicas sociais envolvidas, as reacções ao desvio e as consequências que estas tenham sobre o comportamento desviado
Criticas ao Labeling

Esta perspectiva tem sido fortemente criticada por autores positivistas que argumentam ser este tipo de abordagem mais
uma ideologia do que uma teoria científica.
A teoria do labeling foi criticada por se limitar a explicar o processo da rotulagem social e não os comportamentos desviados
Ênfase dada por esta corrente Às questões de classe e ao poder económico
3 – Construtivismo Social

A afirmação de que a realidade social é socialmente construída pode ser subscrita num sentido amplo, por todos os
sociólogos, independentemente do seu posicionamento teórico. Ao falarmos aqui em construtivismo social estamos a
referir-nos a correntes teóricas cuja ideia central e geradora é a de que as pessoas criam activamente a sociedade
Berger e Luckman
Defendem que a sociedade é uma produção humana e o Homem é uma produção social. Para estes sociólogos a sociedade
é ao mesmo tempo uma realidade objectiva e subjectiva. É objectiva porque é exteriorizada relativamente aos actores
sociais que a produzem, e é objectivada sendo constituída por objectos autónomos dos sujeitos sociais. É uma realidade
subjectiva porque é interiorizada através da socialização
Kitsuse e Spector
Para estes a questão que deverá ser colocada é antes de mais saber porque é que algumas situações são consideradas
problemas sociais e outras não. O que pretendem explicar é o surgimento do próprio rótulo de problema social. Segundo
estes autores, somente através da problematização sociológica será possível chegarmos a uma teoria social dos problemas
sociais
A condição objectiva do problema social, é portanto, posta de lado pela perspectiva construtivista, pois esta não é
essencial para a existência de um problema social.
É a definição subjectiva do problema social que se revela essencial para a existência do mesmo e como tal só esta deve ser
investigada pelos sociólogos. Problemas como a violência conjugal, o trabalho infantil, a descriminação das mulheres ou a
poluição ambiental são exemplos de situações que só se converteram em problemas sociais quando se estabeleceu com
sucesso um movimento de reivindicação que definia estas situações como problemas.
Um problema social só se constitui em razão de todo um processo de reivindicação e reacção social. Daqui resulta que
para a perspectiva construtivista importa identificar quem considera que existe uma situação inaceitável e exige acção
reparadora, ou seja, quem define uma dada situação, real ou virtual, como problema social; quais as razões que
apresenta; quem reage a esta pretensão e que tipo de dinâmica se estabelece entre as duas partes
Somente após o estudo empírico do processo de definição de cada problema social é que podem ser elaboradas possíveis
soluções para o mesmo. Ao contrário das correntes eu abordamos anteriormente a perspectiva construtivista não
apresenta soluções à priori, para os problemas sociais
Os Construtivistas sociais argumentam em resposta que o conhecimento do processo de reivindicação de problemas sociais
pode ser produtivamente aplicado às mais variadas situações sociais: para que se dê a devida atenção às condições
objectivas causadoras de sofrimento é necessário antes de mais que exista quem reivindique eficazmente por elas. É
igualmente importante reconhecer que nem todos os autores construtivistas põem completamente de lado as condições
objectivas dos problemas sociais, nem esta corrente afirma que não se devem estudar estas situações objectivas: o que
afirmam é que este não deve ser o tipo de problemas sociológico a ser respondido pelos sociólogos que pretendem estudar
os problemas sociais enquanto definição de fenómenos sociais.
Exemplo : Podemos exemplificar esta ideia com o fenómeno da delinquência juvenil: segundo o construtivismo social, ou
estudamos a delinquência juvenil investigando aspectos como as causas do comportamento desviado dos jovens, a
evolução dos caso de delinquência, ou a sua distribuição pelos estratos sócio-económicos, ou então estudamos o problema
social da delinquência juvenil, ou seja como é que a sociedade veio a reconhecer este fenómeno como problema social, e
neste caso não é essencial que se saibam as causas do comportamento desviado em questão
SÍNTESE
Perspetiva Definição de Problema Social Elemento Central
Patologia Social Violação das expectativas morais Pessoas
Desorganização Social Falha no funcionamento das regras sociais Regras Sociais
Conflito de Valores Situação incompatível com os valores de um grupo social Valores e Interesses
Comportamento Desviado Violação de expectativas normativas Papéis sociais
Resultado da reacção social a alegada violação das normas
Labeling Reações sociais
ou expectativas
Relações de Classes
Perspetiva Radical Resultado da exploração da classe trabalhadora
sociais
Processo pelo qual os grupos sociais reivindicam que uma Processo de
Construtivismos Social
dada situação é um problema social reivindicação

Os Problemas sociais e a alteração do papel do Estado

O Estado Protetor O Estado Providência


Definição: progressiva centralização de poder nas mãos do Com a revolução industrial e a emergência de problemas
soberano na sequência da desagregação da sociedade do económicos e sociais que daí resultaram, o Estado foi
Ocidente medieval chamado a assumir funções de regulação e de orientação
Partindo da ideia que o poder não é uma simples progressivamente maiores, sobretudo nas áreas da política
capacidade de obrigar, mas que traduz a resultante da económica e social, tendo emergido a consciência
tensão entre tal capacidade e a vontade de obedecer crescente de que o Bem-Estar constituía um fim do Estado
poder-se-à afirmar que a centralização registada resultou a par dos referidos anteriormente.
de duas tendências: Para realizar tal finalidade, o seu aparelho administrativo
 Um processo de concentração da capacidade de teve de assumir uma dimensão progressivamente maior,
obrigar por parte do poder político, de que forma com uma organização cada vez mais complexa e uma
expressão, entre outras, a criação dos exércitos pilotagem progressivamente mais profissionalizada.
nacionaise a concentração progressiva do poder As tendências para a dimensão crescente da Administração
tributário Pública e para a assunção de um papel cada vez mais
 A emergência de um consenso crescente sobre a intervencionista na tentativa de resolução dos problemas
vontade de obedecer, do sector que mais tarde económicos e sociais, tiveram como resultado o aumento
viria a chamar-se de sociedade civil das despesas públicas e, naturalmente, da carga fiscal para
lhes fazer face
O modelo de Estado que daqui resultou privilegiou os fins Revolução industrial
de segurança e de justiça em detrimento do fim de bem
estar que por regra foi remetido para a esfera da
sociedade civil ainda que por vezes se tenham observado Problemas económicos Problemas sociais
incursões orientadoras dessa actividade, por parte do
poder estatal não tanto por via direta mas por intermédio
de acções das casas reais e da aristocracia
Desagregação da sociedade feudal Crescimento e radicalização
das funções do Estado

Concentração da Maior Consenso na vontade Estado de Providência


capacidade de obrigar de obedecer por parte da
pelo poder político sociedade civil Objectivos:
 Produzir segurança
 Reduzir a incerteza
 Promover a regulação e a orientação sócio-
Estado Protetor económica
Objetivos:
 Produzir segurança Fins dominantes do Estado:
 Reduzir a incerteza  Segurança
 Justiça
Fins Dominantes do Estado:  Bem Estar
 Segurança
 Justiça Características dominantes do aparelho do Estado:
Características dominantes do aparelho de Estado:  Dimensão progressivamente maior
 Pequena Dimensão
 Organização relativamente difusa  Organização progressivamente mais complexa
 Pilotagem centralizada  Pilotagem progressivamente mais profissionalizada

Ações do príncipe para garantir a eficiência do estado


Protector

Para garantir a eficiência do Estado Protetor o príncipe


recorreu a dois tipos de pessoas:
 Por um lado aos políticos profissionais e semi-
profissionais que atuavam ao seu serviço sendo
elementos da sua confiança. Pertenceram a este
grupo clérigos, literatos de formação humanística,
elementos da nobreza cortesã, a “gentries inglesa”
e os juristas universitários
 Por outro lado aos funcionários profissionais que
pouco a pouco foram aumentando na Europa, em
função da progressivamente maior complexidade
dos problemas que ao Estado competia resolver.
Assim se passou no campo da administração
financeira, da técnica guerreira e da actividade
jurídica, em que o profissionalismo especializado
tomou o lugar do amadorismo polivalente
Levou ao início do predomínio do absolutismo do
príncipe sobre os feudos e a lenta abdicação da sua
autocracia dando poder aos funcionários profissionais
para estes o ajudarem a vencer o poder feudal

As Perspetivas Liberais

Duma forma simplificada pode dizer-se que a perspectiva liberal foi resultado de uma lenta sedimentação de natureza
económica, doutrinária e política que ocorreu na europa a partir do Séc. XV.
Génese: Com a expansão europeia e a consequente diversificação dos mercados e acumulação de capital, a burguesia
consolidou-se como classe social.
Paralelamente a este processo, a ordem política foi também ela profundamente alterada, como atrás foi referido,
apresentando como traços dominantes a centralização do Poder real e o consequente enfraquecimento da velha
aristocracia, apoiada na ascensão da burguesia.
Acompanhando esta dupla tendência e escorando-a ideologicamente foram surgindo diversas doutrinas económicas e
sociais, como o mercantilismo, a fisiocracia e todo um corpo filosófico que procurou limitar o despotismo do príncipe,
que veio a criar condições para a revolução francesa.
Para os adeptos da perspectiva liberal, os problemas sociais e económicos resultam de uma acção desastrada do
Estado que, na mira de os resolver, intervém em demasia nos mecanismo de regulação do mercado
As Teses
É esta a tese defendida por grande parte dos principais autores do liberalismo positivista clássico, como Adam Smith,
Jeremias Bentham, Burke,Humbold do liberalismo utópico como Paine e Godwin e do neoliberalismo como Robert
Nozick ou John Rawls. Em todos estes autores encontramos uma forte crítica à excessiva dimensão do Estado, variando
no entanto, nos critérios definidores das suas funções e na definição do seu campo de atuação. É o caso, mais recente,
da corrente neoliberal, que deve ser entendida como uma crítica, da crítica à economia de mercado.
Teoria das internalidades
De acordo com esta teoria, a acção do Estado tem, com frequência, efeito imprevistos (internalidades), que pervertem
as intenções de justiça e de promoção do Bem-Estar das suas políticas.
Um exemplo deste tipo de efeitos perversos é o do ciclo vicioso das despesas públicas: (Rosanvallon)
 O crescimento das necessidades do cidadãos (económicas sociais de segurança) implica uma pressão sobre o
Estado no sentido de as colmatar (aumento da procura de Estado)
 O aumento da procura de Estado, obriga este a concentrar recursos e articulá-los para dar resposta às
necessidades (aumento da oferta de Estado)
 Para que a oferta de Estado cresça este é obrigado a fazer mais despesas públicas
 O aumento das despesas públicas determina um aumento de impostos para lhe fazer face
 O aumento da carga fiscal sobrecarrega os cidadãos o que, naturalmente, lhes aumenta as necessidades e a
procura de Estado e assim sucessivamente
Posição liberal face aos problemas sócio-económicos
 A maior parte dos problemas sociais e económicos resultam de uma excessiva intervenção do Estado
 A resolução dos problemas sociais e económicos deveria ser deixada aos mecanismos (naturais) de auto-
regulação do mercado
As limitações
Limitações apontadas pelos críticos à perspectiva liberal
 Os limites da acção do Estado, são em regra, insuficientemente operacionalizados
 Normalmente a crítica à acção do Estado é bem feita, nomeadamente no que respeita aos efeitos perversos da
burocracia baseada na teoria das internalidades. No entanto, os efeitos imprevistos do funcionamento do
mercado que condicionam fortemente emergência e o agravamento dos problemas sócio-económicos não são
convenientemente equacionados
Abordagem crítica de Suzanne de Brunhoff
De acordo com esta autora, a conjuntura é vista como um cenário de guerra económica o que implica, por parte dos
decisores políticos, uma atitude de nacionalismo económico. Neste contexto, as funções económicas e sociais do Estado
procuram atingir dois objectivos:
 Reforçar a frente de combate económica, apostando em políticas de obtenção de encomendas no estrangeiro e
em estratégias de financiamento e de proteccionismo dos sectores sociais mais fortes, como segmentos que
apostam no desenvolvimento tecnológico e nas exportações
 Ajudar a tratar dos feridos da guerra económica (pobres, novos pobres, imigrantes, idosos, desempregados)
As Perspetivas Marxistas
Génese: O pensamento marxista enquadra-se historicamente na europa do Séc XIX, em plena revolução industrial, na
tentativa de analisar a sociedade coeva e de propor soluções para as disfunções sociais que então se viviam.
A abundante obra de Marx (1818-1883) reflecte isto mesmo, não devendo ser entendida como um sistema fechado mas,
pelo contrário uma teoria em permanente evolução, por vezes mesmo contraditória, contrariamente à imagem que as
correntes ortodoxas posteriores fizeram passar.
Para isso muito contribuiu o próprio percurso existencial de Karl Marx: nascido e criado numa família de origem judia,
cujo pai se viu na contingência de se baptizar para não ser alvo de medidas discriminatórias anti-semitas, fez a sua
formação inicial na Alemanha, onde nasceu, tendo vivido sucessivamente exilado em França, na Bélgica e no Reino
Unido. Os seus comentadores apontam três tipos de correntes que lhe serviram de referência, a partir das quais (e
contra as quais) procurou extrair uma resultante dialética, que transparece ao longo da sua obra: a filosofia alemã, o
socialismo francês e a economia política inglesa.
Na Alemanha onde viveu até 1843, analisou e criticou a filosofia alemã do seu tempo, tendo sido profundamente
influenciado pelo pensamento de Hegel e pelo convívio com os jovens hegelianos, radicais seus amigos na Universidade.
Após os estudos de Direito e um doutoramento em Filosofia, trabalhou na Gazeta Renana como jornalista, experiencia
que marcou o seu olhar sobre os problemas sociais
Em França onde chegou exilado em Outubro de 1844 Marx continuou a trabalhar nos seus escritos filosóficos e
Económicos, tendo aprofundado o pensamento de socialistas franceses e começado a estudar a economia política
britânica, nomeadamente a obra de Adam Smith e David Ricardo através de traduções francesas
Em Bruxelas, para onde foi deportado em Janeiro de 1845 e permaneceu durante três anos, continuou os seus estudos
de economia e começou uma colaboração permanente com Engels que se manteve até ao fim da vida
Regressado a Paris em 1848 onde soube da publicação em Londres do Manifesto comunista, que havia escrito com
Engels no ano anterior para a Liga Comunista, lá residiu por uns meses a convite do governo provisório formado após a
abdicação do rei Luís Filipe, tendo voltado à Alemanha devido à conjuntura de maior liberdade política que então se
vivia, onde ficou preso por pouco tempo, como jornalista, tendo sido de novo expulso, sucessivamente para Paris e para
Londres em Agosto de 1848.
Em Londres onde viveu até à sua morte (1883) escreveu entre outros A lutas de classes em França, Crítica da Economia
Política, continuando as suas investigações económicas, que culminaram com a publicação da obra monumental em três
volumes, O capital.
A influência da gigantesca obra de Marx foi enorme na evolução do pensamento filosófico, económico, sociológico e
político do Séc. XX, bem como no desenrolar dos acontecimentos que marcaram a sua história pelas forças que
congregou e pelas reacções que suscitou
As Teses
O pensamento de Marx relativamente ao papel do Estado não é idêntico ao longo da sua obra, nela se encontrando
 Desde uma posição idealista defendida pela Gazeta Renana em 1843, em que descrevia a possibilidade de
existência de “uma associação de homens verdadeiramente livre num estado idealizado, concebido com base no
modelo hegeliano, como uma incarnação da razão,
 Passando pela afirmação de que o Estado era uma expressão da alienação humana semelhante à religião, ao
direito e à moralidade, um biombo que esconde as verdadeiras lutas inter-classes, assumindo-se como um
instrumento da classe dominante (ideologia alemã), uma mera comissão de gestão dos assuntos da burguesia
 Até à afirmação de que poderia desempenhar, apesar de todas as críticas, algum papel positivo em favor das
classes oprimidas (A guerra civil em França), ou mesmo que poderia ser, quando em situação de ditadura do
proletariado, instrumento de mudança para a sociedade comunista.

Apesar desta aparente ambivalência, parece ser constante o reconhecimento do importante papel que cabe ao Estado
como instrumento da classe dominante (seja ela burguesia ou proletariado) nas funções de regulação e orientação da
sociedade global.
Se a esta constatação acrescentarmos que, na perspectiva marxista, os problemas económicos e sociais são resultantes,
em última análise da situação de exploração de uma classe em benefício de outra num cenário de permanente luta de
classes, poderemos entender as duas estratégias defendidas por esta corrente, consoante detenha ou não o controle
do Estado:
quando o Estado não é controlado pela classe quando o Estado é controlado pela classe trabalhadora,
trabalhadora, às organizações desta classe cabe fazer deve centralizar a definição de rumos e a articulação de
pressão no sentido de que o poder político lhes faça meios para fazer face aos problemas sociais e económicos;
concessões, em nome de uma paz social ameaçada no neste sentido deve-lhe competir um papel dominante no
sentido de prevenir e atenuar os problemas sociais planeamento e organização da economia e da protecção
social
As Limitações
Correndo o risco de simplificar em demasia as críticas que têm sido feitas à perspectiva marxista de ver os problemas
sociais, podemos agrupar as críticas em dois conjuntos
 Do ponto de vista doutrinário as que sublinham  Do ponto de vista político, as que o acusam de
que ao privilegiar a luta de classes como falta de eficácia e de eficiência uma vez que, nos
instrumento de intervenção, o marxismo países em que foram aplicadas as conceções
provocou danos elevados na coesão social, marxistas de ataque aos problemas sociais e
lançando as classes sociais umas contra as outras, económicos, os resultados obtidos foram muito
gastando consideráveis energias sociais, inferiores aos previstos (ineficácia) e, os avanços
necessárias ao crescimento económico e ao conseguidos foram-no frequentemente a custos
desenvolvimento social, em nome da igualdade e económicos e sociais muito elevados (ineficiência),
em detrimento da liberdade uma vez que exigiram uma máquina estatal
excessivamente pesada
As perspectivas conciliatórias
Se nos reportarmos aos três valores centrais da Revolução Francesa, Liberdade, Igualdade e a Fraternidade, observa-se
que os dois primeiros foram claramente apadrinhados pela perspectiva liberal (liberdade) e marxista (igualdade), um em
detrimento do outro. Quanto ao valor da fraternidade, foi remetido, em regra, para a defesa da sociedade civil não
sendo considerado uma questão política tão relevante como a da Liberdade ou da Igualdade.
Procurando conciliar as doutrinas liberal e marxista, emergiu uma terceira tendência no século XIX que vaio dar
origem ao que se convencionou chamar Estado-Providência.
Os fundamentos:
Os fundamentos da intervenção do Estado relativamente aos problemas sociais e económicos podem encontrar-se na
constatação de efeitos imprevistos (positivos ou negativos) do funcionamento do mercado a que Pigou chamou de
Externalidades.
Os pilares do Estado intervencionista
A expressão Estado-Providência surge na França do segundo império criada por pensadores liberais hostis ao aumento
das atribuições do Estado, mas igualmente críticos em relação a uma filosofia individualista demasiado radical
Procurava-se com esta designação fazer referência a um modelo de Estado intervencionista, que na Alemanha da década
de 1880 era apelidado de Estado Social e no Reino Unido já nos anos 40 do século XX passou a ser crismado de Estado
de Bem-Estar. Em grandes linhas pode dizer-se que este modelo de Estado (Estado-Providência) integrou três tipos de
contribuições seguidamente sumariadas.

GLOBALIZAÇÃO

Escola de Pensamento da Globalização


Na sociologia globalização é o termo utilizado para designar o processo segundo o qual a informação, as imagens e os
bens/produtos originários de uma nação em particular ou de uma zona do planeta entram numa corrente global,
beneficiando para tal por exemplo do crescimento das empresas transnacionais, da televisão por satélite e mais
recentemente da internet.
 Enquanto alguns teóricos argumentam que o efeito fundamental da globalização consiste em diminuir os esbater
as diferenças culturais persistentes entre as nações na medida em que no seu seio os indivíduos acabam por ser
e estar submetidos a uma única cultura global
 Outros há que ao constatarem a tendência dominante de transferência de bens e informações do Ocidente, ou
das nações industrializadas ou ocidentalizadas para os países em desenvolvimento sugerem que a globalização
está era levada a cabo por um imperialismo cultural descomprometido, que mostra pouca preocupação e
consideração pelos tradicionais meios culturais de vida, que vão sendo abandonados à medida que os indivíduos
lutam pra conseguir os produtos ocidentais e para adotar as necessidades e sensibilidades das sociedades de
consumo como as suas.
 Outros teóricos há, no entanto, que são defensores de um ponto de vista mais otimista, sugerindo que a
globalização, em si mesma, contribui naturalmente para aumentar e melhorar a diversidade cultural das
diferentes nações, os conceitos e significados/implicações culturais associadas aos produtos ocidentais e que são
formulados com base no conhecimento e sensibilidades locais. E neste sentido os movimentos de anti-
globalização não fazem o menor sentido nem têm razão de exisitir. Constituem uma falsa questão.
3 Grandes correntes Escolas de Pensamento da Globalização
Hiperglobalistas ( Ohmae, Strange)

 Verifica-se uma perda acentuada da autoridade do Estado-Nação


 Crescente difusão da autoridade centrada num número elevado de organizações internacionais, transnacionais,
supranacionais e regionais (NATO, U.E., ONU, etc)
 O mundo assiste À emergência de uma civilização global (“democratização do mundo”) que promove os seus
próprios mecanismos de governação
 O Direito Internacional assume um papel importante na definição das normas supra-nacionais
 Predomínio claro de uma economia mundial assente numa matriz neoliberal
 Os mercados devem estar fora da alçada dos Estados
 A decisão política depende em grande parte do poder financeiro

Cépticos (Hirst, Thompsom)

 Acima de todos os intervenientes no processo de globalização predominam os governos nacionais


 O Estado-Nação é uma realidade para durar, uma vez que os governos nacionais continuam a ter uma
centralidade crescente na regulação e promoção da atividade política e económica fora das suas fronteiras
 Influência muito concreta do conceito de soberania formulado pelo renascentista Jean Bodin
 Vêem a governança global e a internacionalização económica como projetos ocidentais cujo o objetivo é o
domínio do Ocidente nos negócios mundiais
 A globalização nada mais é do que um mito criado por alguns blocos regionais de integração cuja a ideia é
permanecer muito poderosos
 Advogam a homogeneização cultural e a ideia de uma cultura global não passam de mitos adicionais
 A globalização constitui uma tentativa de implementação de estratégias económicas neoliberais
 Os factos disponíveis contrariam a ideia de que tem existido uma convergência das políticas macro-económicas e
de bem-estar por todo o mundo
 Denunciam a marginalização dos países do Terceiro Mundo por oposição à intensificação dos investimentos e do
comércio no seio dos países desenvolvidos
 A globalização não produz homogeneização pois cada vez mais se regista um aumento das desigualdades e da
consequente estratificação e hierarquização da economia
 Os cépticos entendem que todos devem participar no plano de governação (“moral politik”)

Transformacionistas (Giddens, Rosenau, Scholte e Castells)

 A globalização assume-se como uma força condutora de rápidas mudanças sociais, politicas e económicas que
estão a redefinir as sociedades contemporâneas
 A globalização constitui um processo histórico de longo prazo cheio de contradições e significativamente
moldado por factores conjunturais
 No entender de Hoogvelt a estrutura social global apresenta-se como um arranjo de três camadas: as elites, os
satisfeitos e integrados e os excluídos
 A globalização contemporânea está a reequacionar as funções e autoridade dos Governos e dos Estados, e não a
destrui-los
 A globalização está associada ao aparecimento de novas formas de organização política e económicas tais como
os grandes multinacionais, os movimentos sociais transnacionais, as agências reguladoras e de governação
internacional entre outras
 O espaço económico nacional já não coincide com as fronteiras territoriais. Verifica-se antes uma crescente
desterritorialização dos mercados económicos com a produção financeira a assumir uma dimensão cada vez
mais global
 Os Estados têm que se adaptar a um mundo em transformação, no qual não existe um clara distinção entre o
nacional e o internacional pois o local é, simultaneamente global

Para uma genealogia do discurso da globalização da experiência

A modernidade é de certo modo um projeto de libertação progressiva em relação aos diferentes tipos de coacções e de
constrangimentos que limitam a experiencia humana tradicional e, sendo a experiência determinada pelos quadros do
espaço e do tempo, é em relação a estes quadros que o homem moderno pretende, antes de mais libertar-se. Não
admira por isso que a modernidade prossiga a ultrapassagem, por um lado das fronteiras que definem o horizonte da
experiencia e a contêm dentro dos quadros físicos e culturais concretos da comunidade de pertença e, por outro lado de
que a temporalidade, de que a morte é o limiar definitivo fixado pela lei natural inexorável.
Apesar da sua origem eufórica este projeto iluminista acabaria por revelar uma face particularmente inquietante, tanto
por razões históricas devido a efeitos perversos da sua realização, como por razões fundamentais devido às antinomias
(contradições) lógicas do próprio projeto da modernidade.
1.1 – Das antinomias (contradições) lógicas da modernidade globalizadora
 Uma das antinomias do projeto da modernidade, pode ser formulado com o célebre slogan de Maio de 68: 2é
proibido proibir”, slogan que traduz a dificuldade com que se encontra qualquer projeto emancipador, em nome
do qual se podem legitimar todas as servidões
 Uma outra antinomia tem a ver com a própria definição de modernidade enquanto rutura emancipadora para
com a tradição. A modernidade torna-se assim o próprio fundamento legitimador da tradição uma vez que só se
poderá sustentar enquanto a tradição se mantiver na medida em que ela se mantiver.
É por isso que ao instituir-se como ideal legitimador do discurso e da ação, a modernidade não pode deixar de se tornar
por sua vez também tradicional. Foi esta antinomia que esteve na origem ao longo de toda a sua realização histórica,
tanto na aceleração dos processos vanguardistas como da sua crise letal.
Estas antinomias lógicas do projeto moderno tornam efetivamente a globalização uma experiência impossível. Só pode
ser globalizado aquilo que é fragmentado. A partir do momento em que, por hipótese absurda, desaparecessem os
particularismos e as diferenciações, também desapareceria qualquer hipótese de globalização não havendo de facto
mais nada para se globalizar.
1.2 Das realizações históricas perversas da modernidade globalizadora
Mas foi sobretudo nas primeiras décadas do século XX que as realizações históricas do projeto da modernidade tornaram
particularmente clara a consciência dos seus efeitos perversos. Seguiram-se duas experiências particularmente
traumáticas: o holocausto e a hecatombe nuclear. Pela primeira vez na história, tornava-se evidente que um dos efeitos
possíveis da performatividade técnica é a destruição planetária. A partir dos campos de extermínio e da hecatombe de
Hiroshima e Nagasaki, nunca mais seria possível dissociar a globalização do expectro da destruição total.
Um dos alvos da capacidade de extermínio alcançado pela tecnologia é a própria experiência. As fronteiras que
delimitam as diferentes modalidades de experiência do mundo e formam um mosaico de culturas são os primeiros alvos
da modernidade, considerados anacrónicos e freios dos projetos racionais de autonomia e libertação.
Deste modo a consumação do objetivo globalizante do desenvolvimento técnico abate as fronteiras suscetiveis de
impedir a progressão da dominação e da barbárie.
1.3 Da impossibilidade da globalização da experiência
É com esta ameaça que estamos ainda hoje imaginariamente confrontados e para a qual não é previsível qualquer
resposta tanto de natureza lógica como de natureza institucional. É certo que se fazem ouvir os apelos a um novo
contrato social que se imponha, não aos cidadãos que partilham uma mesma cultura, mas aos homens irmanados pela
partilha do mesmo planeta. Mesmo que fosse logicamente pensável, um contrato social de âmbito planetário, apesar de
urgente perante a globalização do potencial destruidor alcançado pela tecnologia, só poderia vir a ser concluído tarde de
mais, depois de a isso sermos coagidos, na sequência precisamente do desastre “global”. Não só porque a globalização é
uma experiência impossível, é uma ideia pura, uma realidade discursiva que ultrapassa qualquer capacidade humana de
experiência, mas também porque n é razoável esperar que a humanidade inteira respeite um imperativo categórico sem
primeiro saborear o fel dos revezes que a irresponsabilidade e a negligência da própria ação provoca

As etapas da globalização

É particularmente importante considerar a génese da globalização numa época marcada pela amnésia, pelo
esquecimento das origens provocada pelo deslumbramento perante as atuais capacidades performativas da técnica.
Questão genealógica:
Como emerge, que processos produzem a globalização, um tipo experiência que, como acabámos de ver é impossível de
experienciar?
É através da invenção de dispositivos artificiais que a modernidade procura abater as fronteiras espaciais e ultrapassar as
limitações temporais da experiência humana. Podemos por isso associar as diferentes etapas deste processo à invenção
dos instrumentos e dos utensílios, das máquinas e dos dispositivos telemáticos.
Cada uma das etapas técnicas prossegue maneiras diferentes de ultrapassagem de fronteiras que coagem a experiência
natural, prolonga, exterioriza e aperfeiçoa a experiência humana do mundo para além das fronteiras do seu
enraizamento natural.
2.1 A modernidade globalizadora originária do neolítico e a invenção de utensílios e instrumentos
O neolítico foi a primeira etapa verdadeiramente globalizante da experiência, o primeiro momento de modernidade.
Intimamente associado à domesticação do fogo, à invenção da metalurgia, das técnicas agrícolas, da charrua e da roda, o
neolítico libertou a experiência em relação aos ciclos sazonais. Com a invenção da escrita alfabética alcançava-se a
ultrapassagem das barreiras que confinavam a palavra e a memória dentro das fronteiras das comunidades de vida e das
fronteiras temporais da morte natural. Foi esta libertação da memória e da palavra que desempenhou o primeiro e
talvez mais decisivo processo de globalização, ao libertar a experiência dos limites imposto pelo ciclo das estações, da
vida mortal dos indivíduos e das gerações. Os inventos técnicos, destinados a alargar a intervenção do homem para
alémn do espaço da sua comunidade e a preservar a memória para além do tempo de vida viológica das gerações,
representou uma primeira tentativa de libertação dos constrangimentos que pesam sobre a experiência humana. Esta
etapa está assim intimamente associada à tecnicidade instrumental e utensilhar.
As primeiras civilizações prosseguiram de facto já um indiscutível processo de alargamento dos horizontes da
experiência, tanto individual como coletiva e podem por isso ser consideradas como autênticos processos de
globalização. A história da humanidade pode ser doravante encarada como uma longa caminhada de maturação e
aprofundamento deste processo
2.2 A concepção iluminista da modernidade globalizadora e a viragem maquínica
Para a emergência da etapa maquínica da globalização contribuiu de maneira decisiva a invenção do relógio mecânico. A
invenção de Giovanni di Dondi, no século XIV, autonomizou tecnicamente o tempo em relação à experiência humana da
temporalidade, processo de que o iluminismo do século XVIII viria a formular os princípios fundamentais. A constituição
de saberes disciplinares, fundamentados em procedimentos racionais metodicamente conduzidos, e de saberes técnicos,
independentes do seu enraizamento numa comunidade de vida, corresponde à emergência de uma nova modalidade de
desterritorialização da experiência, a do maquinismo industrial. Foi a etapa do alargamento das fronteiras do mundo até
aos confins do planeta, a dominação do Novo Mundo, com a consequente submissão e destruição de inúmeras culturas
autóctones.

A globalização da modernidade tardia

Se comecei por recordar rapidamente alguns aspetos fundamentais destes marcos históricos do devir globalizante do
passado foi para mostrar que a globalização não é propriamente uma experiência do nosso tempo, mas um processo que
se situa na continuidade de uma génese técnica que tem as suas raízes na longa história da modernidade, entendida
como rotura em relação às coações e aos constrangimentos do espaço e do tempo que delimitam a experiência
tradicional. O processo de globalização do nosso tempo situa-se, por conseguinte, na continuidade das etapas
precedentes da modernidade, apesar de apresentar, como veremos, aspetos indiscutíveis de rotura em relação à lógica
que presidiu à autonomização da experiências das etapas precedentes.
Pelo facto de consumar a autonomização da experiência técnica, a telemática inverte a relação da experiência humana
com o espaço e com o tempo. As técnicas precedentes tornavam possível a deslocação através de espaços cada vez mais
distantes, aumentando a capacidade de deslocamento, ao passo que a telemática dissuade a deslocação. Com a
telemática, as relações entre espaços distantes torna-se tanto mais fácil, rápida e confortável quando menos nos
deslocarmos e mais nos conectarmos às redes telemáticas.
As técnicas precedentes aceleravam os ritmos da experiência mas mantinham o diferimento e a duração dos processos,
ao passo que a telemática tende para instantaneidade, para a anulação da duração. É esta natureza instantânea do seu
funcionamento que subtrai o seu mundo à experiência humana e torna impercetivel a sua tecnicidade, o facto de se
tratar de um mundo simulado artificialmente
É precisamente a natureza impercetivel do seu funcionamento que torna a telemática um dispositivo naturalizado, um
análogo quase perfeito dos dispositivos naturais. Só podemos dar conta da modalidade de globalização do nosso tempo
se compreendermos este modo de funcionamento naturalizado. Já não se trata de permeabilidade dos territórios
concretos, de relações entre culturas particulares, como nos processos de globalização das etapas precedentes da
modernidade, mas a formação de territorialidades abstractas, constituídas por afinidades heterogéneas, efémeras e
invisíveis, que se fazem e se desfazem no próprio instante em que surgem ao acaso das conexões permitidas pela
permutabilidade das redes telemáticas.
Não é, por conseguinte, propriamente a globalização da experiência humana que está em jogo na sociedade da
informação telemática; é a globalização de uma modalidade reticular e abstrata de experiência, autónoma em relação à
experiência humana do mundo, experiência reticular que depende do nível de performatividade tendencialmente
naturalizada e impercetivel da técnica telemática.
Neste sentido, a telemática não é já um utensílio, um instrumento ou uma máquina. É um dispositivo lógico, disposto À
maneira de um sistema ou de uma rede que, pelo menos potencialmente se estende ao conjunto da realidade que ele
próprio produz à medida da sua natureza e do seu modo de funcionamento.
É por isso que o homem ao manipular os utensílios ou a utilizar os instrumentos, podia compreender a maneira como
estavam estruturados, intervir diretamente no seu fabrico e no seu aperfeiçoamento, ao passo que os dispositivos
telemáticos escapam à compreensão do seu utilizador.
Podíamos utilizar, por exemplo um elemento do motor de avião no motor de um automóvel ou numa turbina e o
operário podia intervir na reparação de eventuais perturbações no funcionamento das suas partes. As redes telemáticas,
por seu lado, são dispositivos lógicos, cibernéticos, e por isso a sua organização e o seu modo de funcionamento são
sintéticos. A sua estrutura e o seu funcionamento escapam à compreensão dos seus utilizadores.
Radicaliza-se assim a autonomia entre a compreensão da sua organização, que exige uma competência técnico-científica
especializada em relação à competência prática do seu manuseamento. Enquanto o funcionamento dos utensílios, dos
instrumentos das máquinas exploram os princípios mecânicos que determinam o funcionamento dos nossos órgãos dos
sentidos, a estrutura e o funcionamento das técnicas cibernéticas são de natureza lógica e, por isso, são análogos à
estrutura do nosso sistema nervoso central, do nosso cérebro. O seu funcionamento não é já análogo ao funcionamento
dos nossos órgãos dos sentidos; é algorítmico, obedecendo aos processos formais algébricos

Consequências da globalização reticular

As consequências da constituição desta modalidade reticular da globalização, na sequência da viragem cibernética da


experiência técnica, repercutem-se a todos os níveis da experiência humana do mundo.
Os valores económicos virtualizam-se e deixam de ter qualquer relação com a economia real, com as leis do mercado
que regulam a relação entre a produção e o consumo, passando a depender dos fluxos aleatórios d informação que
circula através das redes telemáticas.
O aleatório prevalece ao racionalmente projectado ou, melhor dizendo, à racionalidade da experiência humana do
mundo. Deixa, por conseguinte, de ter sentido, o confronto entre projetos capitalistas e projetos socialistas de
sociedade, dicotomia herdada da racionalidade maquínica e que a lógica reticular telemática neutraliza, enquanto
dicotomia lógica de um mesmo eixo semântico. É esta neutralização das dicotomias herdadas do maquinismo industrial
que está na origem dos fenómenos generalizados do indiferentismo político que se manifesta nomeadamente no
absenteísmo e na dificuldade de mobilização em torno de projetos que até há algumas décadas movimentavam as
massas.
Deste modo, é o princípio de realidade que se encontra alterado e, neste sentido, é a natureza do mundo que está em
jogo na actual conceção de globalização. Não é, por conseguinte, o mundo humano, o mundo da experiência
humanamente possível que é hoje globalizado, mas um mundo virtual produzido pelas redes telemáticas, mundo que
escapa a qualquer possibilidade de experiência. Não admira por isso que os empresários, os presidentes dos bancos
nacionais, os líderes dos organismos internacionais ou dos governos nacionais confessem sinceramente que não
compreendem as razões da inflação, da explosão da violência ou dos atentados terroristas.
A sua existência situa-se não no quadro da experiência humanamente possível, mas no quadro da experiência
tecnicizada e virtual das redes telemáticas, uma realidade diferente daquela que é humanamente compreensível e
regulável através de regras humanamente possíveis. Trata-se de uma outra lógica que decorre da constituição do mundo
virtual das redes cibernéticas da informação.
Como só é humanamente possível experienciar e perspetivar o mundo a partir da delimitação de horizontes espaciais e
temporais sensorialmente percecionados, não podemos propriamente experienciar este mundo virtual globalizado. Só
podemos aperceber-nos dos seus efeitos ou converter-nos em objetos dos seus efeitos.
Não admira por conseguinte que, a partir de 1994, ano em que Al Gore projetou as high ways da informação como o
grande desafio do nosso tempo, os governos do mundo inteiro tenham passado a assumir como é óbvia a
implementação da sociedade da informação.
A globalização reticular consiste na abertura, não das fronteiras das nações e das culturas, como no tempo do
maquinismo industrial regulado pelas leis dos Estados nação, mas das fronteiras dos mundos possíveis, abertura
virtualmente realizada graças à performatividade simuladora da cibernética.
Não é portanto através da deslocação mas pela conexão à rede que esse mundo virtual está À nossa disposição e que
nos dispõe de maneira quase natural.
Podemos por isso viajar através de mundo globalizado a um ritmo mais rápido do que o do nosso pensamento, ao ritmo
quase instantâneo da conexão às redes telemáticas.
Podemos dizer que o atual processo de globalização é invertido em relação ao das civilizações do passado, quando
curiosamente o alargamento das fronteiras do nosso mundo não tinha o nome de globalização mas de relações
interculturais.

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