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Lamy Filho Alfredo e José Luiz Bulhões Pedreira; A Lei Pedro!

, Antonio; La Anónima Actual y la Sindicación de


das S/A, Renovar, Rio, 1992, (885 págs.). Acciones, Ed. Rev. de Dir. Priv., Madrid, 1969. A norma jurídica como modelo
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Tradução de Fernando Herren Aguillar


Publicação nesta Revista autorizada pelo tradutor

1. A norma jurídica é uma "regra de ções societais do direito no coração de um


conduta nas relações sociais, geral, abstrata modo de produção gerador de desigualda-
e obrigatória, cuja sanção é assegurada pelo des e de dominação, os enfoques críticos
poder público" 1• Qyer se adote tal definição, não se inquietam muito em relação à sua
quer se prefira uma variante que valorize pertinência. É verdade que, se ninguém
sua vinculação a um tipo de "ordens", "co- mais denunciar no direito a vontade masca-
mandos", "imperativos" ou ainda de "direti- rada da classe dominante ou uma pura va-
vas", não se contesta muito que toda regra riedade de violência, esta visão da norma
jurídica tem por objeto uma conduta,' que jurídica como preceito de conduta pode fa-
ela mesma impõe, proíbe ou permite. No cilitar a demonstração de sua vocação para
seu campo de validade, toda ordem jurídica garantir e legitimar uma ordem social esta-
repartiria as ações humanas entre lícitas belecida, sempre a serviço de algumas mu-
(prescritas, positivamente permitidas ou in- danças desejadas pelos detentores do poder.
diferentes) e ilícitas (ações proibidas ou abs- Gostaríamos, contudo, de convencer da
tenções de fazer o que é prescrito). Pouco necessidade de rejeitar essa definição. Ela
importa que essa repartição de acordo com peca pelo simplismo e irrealismo ao mesmo
um código binário possa ser importunada tempo. Nossa convicção é a de que se uma
pelo sentimento de um "vazio jurídico", que ordem jurídica como o direito estatal fran-
torna incerto o estatuto de um comporta- cês de nosso tempo se apresenta de início
mento que se desejaria fosse explicitamente como um conjunto de normas, estas não
comandado, proibido ou autorizado. Essa constituem todas, bem ao contrário, regras
concepção das normas jurídicas e de uma de condutas. Trata-se no máximo de regras
relação com as ações releva desse "senso para ações. É nisso que elas pertencem ao
comum teórico dos juristas" 2, que fornece a gênero de normas éticas, e não em razão
matéria comum da maior parte das obras e daquilo que seria necessariamente seu obje-
ensinamentos de introdução ao direito. Ela to3.
é recebida ou confirmada por inúmeras pro- 2. A ambição deste questionamento pa-
duções de teoria ou filosofia do direito, a rece de início limitada. Não se pretende
começar pelo normativismo jurídico kelse- fornecer resposta exaustiva à questão "o que
niano. Os sociólogos que se interessam pela é uma norma jurídica?", mas apenas mos-
presença do direito nas relações sociais pa- trar a inadequação à experiência mais banal
recem se acomodar a essa situação, ou até de uma definição recebida por juristas, teó-
mesmo fazem dela o pressuposto de uma ricos e filósofos do direito de diversas obe-
noção demasiado sumária da efetividade (os diências. Este questionamento se quer mo-
comportamentos conformes) ou da inefeti- desta contribuição a essa forma de
vidade (os comportamentos violadores) das polifonia que é naturalmente a prática da
normas. Preocupados em desvendar as fun- teoria do direito, à medida em que esta
78 .R. Fac. Direito UFRGS, Porto Alegre, 10: 79-99, jul. 1994 79
última pretende menos descobrir a verdade di desse direito no quotidiano. O "rigor da rídico da situação que ela regulou: tal pes- tipo "x deve fazer a", ligando um nome de
do direito que propor conceitos úteis a um lei" se encontra relativizado nesse aspecto e soa deve ou não indenização a tal outra? T ai sujeito (x) a um nome de ação (a) por um
progresso contínuo na sua compreensão. se pressente mais claramente a variedade de ato privado ou público permanece válido "functor proposicional normativo". Desse
Assim, não cremos que a elucidação da vias dessa "constrição" que a própria idéia ou foi anulado? Qtal é o titular de tal functor depende a natureza da regra - nor-
vocação específica das disposições conven- de lei evoca. Também nisso a tese muito função? ma prescritiva ("deve fazer") proibitiva
cionalmente dotadas de "valor normativo" parcial que vai ser exposta inspira a descon- O uso da decisão é então análogo ao de ("não deve fazer") ou permissiva ("pode fa-
se vincule necessariamente aos debates con- fiança em relação a toda teorização radical uma regra . zer") - que pode no entanto ser significada
temporâneos sobre a ontologia do direito. da sistematicidade do direito e incita a pre- 4. A norma é de fato uma espécie de por expressões do gênero "é obrigatório ou
Qtalquer que seja a posição preferida a esse ferir, sem dúvida graças a alguns remendos, modelo: é de sua vocação a servir de refe- proibido ou permitido fazer a".
respeito 4, a questão "o que é uma norma o recurso ao paradigma do jogo8 • Ela deve, rência para o fim de determinar como as as Ora, os enunciados que compõem o Có-
jurídica?" deveria continuar pertinente para no mínimo, suscitar resguardos quanto a coisas devem ser que um enunciado retira digo Civil, o Código Penal, a Constituição,
quem admita que a Constituição, os códi- uma compreensão de tipo organicista ou sua significação normativa, e não de um as leis, não revestem sempre, bem ao con-
gos, leis, decretos, etc., têm algo a ver com teleológica da regulação social para a qual pretenso conteúdo prescritivo, proibitivo trário, essa forma pretendidamente canóni-
o direito, mesmo se eles não o constituam concorre o direito e de sua maneira especí- ou permissivo de uma conduta. Cuidare- ca das proposições normativas. Ninguém
em si mesmos e mesmo se o direito a eles fica de dela partici par9 • mos de oferecer as devidas explicações a esse duvida no entanto que elas signifiquem
não se limite. "Duvidar que o direito (qual- 3. Falaremos indiferentemente de regra respeito (1), "em seguida examinaremos em normas jurídicas. A onipresença do "indica-
quer que seja sua concepção) compreende ou norma jurídica. A extrema dispersão das que medida ou em que sentido as normas tivo" na linguagem do direito suscitou con-
regras e que estas sejam um dos aspectos distinções propostas entre os conceitos que jurídicas, identificadas como modelos para trovérsias e tentativas de interpretação. Para
salientes do direito, pareceria por demais esses dois vocábulos respectivamente desig- os objetos os mais diversos, apresentam os Michel Villey, as inúmeras "disposições sob
violentamente contrário à experiência co- nariam recomenda que se atenha ao uso caracteres que tradicionalmente se lhe atri- forma enunciativa" correspondiam à autên-
Inum"5. terminológico mais difundido. Para alguns, buem (generalidade, obrigatoriedade, ·.pre- tica linguagem do direito: é verdade que se
Nossa rejeição da concepção "deôntica" normas e regras constituem duas categorias sença de uma sanção) (II). o direito reside, como pretendia esse autor,
geralmente aceita se relaciona à experiência diferentes, mas o acordo cessa quando se no "justo objetivo, real", trata-se de uma
de uma sociedade estatal como a nossa. trata de precisar o gênero e a espécie. Ou- simples constatação. Para a maior parte dos
Nada autoriza com efeito a pretender que a tros vêem na norma antes uma componente I- Uma compreensão instrumental da protagonistas desta discussão, ao contrário,
normatividade seja da essência do jurídico, de toda regra. É questão de convenção 10 • Se normatividade jurídica conviria distinguir a linguagem na qual se
portanto que a existência de regras objetiva- parece oportuno tomar como sinônimas as exprime de fato "o legislador" e a linguagem
das e pré-postas é preponderante a ponto de expressões "regra de direito" e "norma jurí- Razões não faltam para se abandonar a normativa: se aquele não se vale sempre
tornar inconcebível um modelo jurídico ca- dica", não convém desconhecer, por outro representação corrente das normas jurídicas desta última, é lícito deduzir preceitos le-
rismático6. Assim, ela não implica posição lado, a distinção essencial entre regras e gais de verdadeiras proposições normativas,
como regras de conduta (A), e de compreen-
particular sobre o delicado problema das decisões. Não acompanharemos os autores dê-las - portanto, também, de identificá-las ou, melhor, de reconstruir a partir deles os
fronteiras da juridicidade, supondo-se a in- que reagrupam estas duas espécies num gê- - como modelos ideais para os objetos mais encadeamentos de normas 14 • A elaboração
tenção de formulá-lo, de maneira útil, sobre nero das "normas" 11 • Tal opção terminoló- variados (B).
de sistemas informatizados de auxílio à de-
a base de uma hipótese razoável de um gica poderia contudo se prevaler de uma cisão jurídica ou judicial conduz hoje al-
pluralismo jurídico que não condene ao analogia parcial de uso da regra (ou norma)' guns especialistas a convir uma análise au-
A- As tibiezas de uma concepção deôntica
perecimento, seja no panjurismo, seja num e da decisão. Esta última, da qual se encon- tomática dos textos legislativos que passa
completo relativismo 7 • Ela não ordena mais tram numerosas variedades na vida do direito S. Definir a norma jurídica como uma igualmente por uma reconstituição das fon-
determinada posição nas discussões sobre as (dispositivo de um julgamento, nomeação, regra (obrigatória) de conduta, é necessaria- tes do direito, postulando uma intensa pre-
funções do direito - para que e para quem mas também disposição ab-rogatória situa- mente postular que ela sempre tem por ob- sença de enunciados que ligam a um ante-
serve o direito numa dada sociedade?- cuja da numa lei ou disposição sobre a aplicação jeto um comportamento, uma ação. Os es- cedente combinando diversamente as
elucidação permanece o objetivo primor- de uma lei no tempo, edição uma transfe- pecialistas da lógica jurídica confirmam condições jurídicas, as conseqüências, seja
dial das posturas críticas face ao que se rência de propriedade ou de capital inscrita essa visão, pelos menos aqueles que vincu- sob forma de estatuto jurídico, seja sob for-
pode chamar "ideologia jurídica dominan- numa lei de nacionalização, anistia editada lam esta disciplina à lógica das normas (ou ma de permissão, de proibição ou obrigação
te". No entanto, a distância que a rejeição numa lei, etc), é certamente um ato tenden- à lógica deôntica), porque a seus olhos a de ações humanas possíveis" 15 •
da visão deôntica conduz a adotar com re- te a modificar pontualmente a situação ou lógica formal, dedutiva, governa no essen- Se ela se torna sistemática, tal tradução
lação à representação corrente de um direi- o objeto que ela afeta e ela se esgota nessa cial a argumentação jurídica 13 , ao contrário pode ser admitida sem traição ou empobre-
to enquadradando estritamente as ações e intervenção 12 • Seus efeitos, não obstante, se do que sustentam os antiformalistas, mais cimetfto do sentido dessas disposições que
tomando de qualquer modo cada um de revelam duráveis, pois enquanto ela não for sensíveis ao lugar da lógica da persuasão, da são a linguagem fenomênica do direito con-
seus sujeitos pela mão, encaminha a uma neutralizada, é possível a ela se referir para retórica. Com efeito, as demonstrações dos temporâneo? Por exemplo, é claro que exis-
compreensão mais realista do modus operan- determinar a configuração ou o "valor" ju- primeiros a pó iam-se sobre proposições do te no reconhecimento ou atribuição de um

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direito subjetivo bem mais que a autoriza- de móveis, a posse vale o título"), que se critivas" (de conduta), numerosas "regras pos1çoes de incriminação não-codificadas
ção de uma condu ta determinada: é uma está diante de uma norma porque esse texto constitutivas" visando à determinação de contêm bem poucas proibições ou prescri-
habilitação garantida para desempenhar ou implica proibição a quem quer que seja de fatos, processos ou situações assim providos ções de comportamentos baseados na amea-
não atos jurídicos ou materiais cuja enume- desconhecer o direito assim conferido ao de efeitos pelo sistema jurídico que os con- ca de uma pena. Qtanto aos arigos 1382 e
ração exaustiva seria freqüentemente incon- possuidor ou injunção a todos de respei- tém18. ss. do Código Civil, não proíbem de modo
cebível. É o caso da propriedade ou do tar. .. tal norma? Proibição ou injunção so- Mais significativos ainda nos parecem os algum condutas danosas sob a ameaça de
direito de cada um a sua vida privada (libe- mente existem porque há regra. Ora, a que reparos que certos realistas escandinavos fi- indenização: eles se limitam a fixar as con-
rar ou deixar captar ou difundir informa- se apega essa significação normativa, única zeram aportar à teoria impereativista de dições nas quais nascem dívidas de repara-
ções sobre sua vida privada releva do exer- apta a fundar a passagem de seu "se indica- John Austin e, sobretudo, sua rigorosa crí- ção.
cício desse direito, e não significa de modo tivo" a uma prescrição ou proibição de con- tica por H. L. A. Hart. No século passado, 8. Assim os direitos estatais contemporâ-
algum renúncia à sua titularidade)! Qlem dutas? A crença de que só há uma norma aquele primeiro autor havia sustentado que neos não se assemelham ao Decálago e bem
não percebe quão redutora seria a tradução na prescrição de uma ação ou de uma abs- o direito surgia do comando que ele cons- pouco aos regimentos disciplinares do exér-
sistemática de todas as disposições legisla- tenção - numa permissão de agir também, tituía de um sistema de ordens constritivas cito. A observação vale mesmo para o códi-
das de que resulta hoje a atribuição de uma para a doutrina mais audaciosa - obrigada porque apoiadas em ameaças. Mais recente- go de trânsito onde abundam no entanto as
prerrogativa jurídica (direito, poder) em a manter por objeto da regra a conduta mente, alguns teóricos escandinavos preci- ocorrências do verbo "dever" - mas na voz
proposições construídas por meio de um daqueles (sujeitos de direito, ou ainda ór- saram que se tratava, na realidade, de "co- passiva - ou para as disposições do código
functor "pode fazer" ou da expressão "é per- gãos da aplicação do direito) cujas relações mandos autônomos", impessoais e abstratos do trabalho_ relativas à higiene e à seguran-
mitido fazer" e do nome de uma ação de- ou atividade são tributários de sua existência (e não de verdadeiros comandos de sujeito ça. Trata-se aí, não obstante, de setores de
terminada? Observa-se às vezes que o direito e, precisamente, de seu valor de norma. Mas determinado a sujeito determinado), antes regulamentação (no sentido material, e um
é "imperativo-atributivo" e, não importa o esta ação consiste apenas, no final das contas, de distinguir, no seio dessa categoria singu- tanto quanto pejorativo do termo), onde se
que pensemos a respeito no plano filosófico em respeitar a regra porque ela é regra! lar, os "comandos de comportamento" ~os manifesta um claro propósito de normali-
ou político, o direito subjetivo resistiu aos Outro teste: reconhecer-se-à a normativi- "comandos performativos" operando pelo zação. Ainda que isso se deva à complexida-
ataques de seus detratores. Os tempos são dade da proposição "A criança concebida mero efeito de sua edição, a atribuição de de de nossas sociedades, à variedade das
mesmo os da profusão dos direitos, ainda durate o casamento tem por pai o marido" uma qualidade ou de uma competência ju- missões a cargo do poder público ou à so-
que eles não tenham uma igual consistência (art. 312 do Código Civil) explicando que rídica (ex: "Os descendentes mais próximos fisticação dos instrumentos da regulação as-
ou uma idêntica eficiência no jogo jurídico. ela tem por sinônimo o enunciado: "Todo sucedem ao falecido", "O rei é o comandan- sumida pelo direito, não se pode dispensar
O que chamamos hoje o direito objetivo faz mundo deve tratar a criança concebida du- te-em-chefe das forças armadas") 19 . Mais ra- a busca de um conceito adequado da norma
uso aqui de um procedimento de gerencia- rante o casamento como filho do marido dical, mas ainda insuficiente, é a crítica jurídica. Vale dizer, um conceito apto a dar
mento, enqudramento e reprodução das re- da mãe?" Na verdade esse texto se limita a endereçada por Hart ao modelo austiniano conta da normatividade de inúmeras dispo-
lações entre seus "sujeitos", cômodo e rico atribuir ao interessado a qualidade de filho do direito como conjunto de ordens apoia- sições legisladas ou proposições inovadoras
de alcance simbólico, que não se encontra legítimo. A obrigação, para cada um, de das em ameaças. O professor de Oxford imputadas à jurisprudência, mesmo ao cos-
freqüentemente em outras regulações so- tratá-lo como tal é exatamente a de levar em estabelece que todo sistema jurídico se apre- tume, nas quais se lê espontaneamente re-
ciais de tipo normativo, como as morais conta a disposição legal, de se "conformar" senta sob a forma de uma união de duas gras. Pouco importa se elas não revistam a
(que se reportam às faculdades simples: "ter a ela, dir-se-ia. Isso não é postular que tal categorias de normas: regras primárias im- forma pretendidamente canônica das pro-
o direito de fazer alguma coisa" é a mesma disposição possui significação de norma, pondo obrigações e regras secundárias, que posições normativas ou somente pudessem
coisa que ser titular de uma prerrogativa tal apesar de sua estrutura, sintática, e abstra- conferem poderes públicos ou privados de emprestá-la mediante o preço da perda de
como um direito subjetivo?), as disciplinas ção feita de toda possibilidade de traduzi-la criação e modificação dessas obrigações ou sentido ou de utilidade. A noção de modelo
puras ou os usos mundanais. em prescrição de conduta? Convém então determinam como as normas primárias são apresenta, a esse respeito, uma notável vir-
6. Deduzir soluções implícitas de textos vincular essa significação à função reserva- reconhecidas 20. No curso de sua crítica do tude heurística.
legislados é prática bastante corrente e fre- da a esse enunciado, independentemente de imperativismo, que desemboca também em
qüentemente correta no plano lógico, para seu objeto e de sua forma. uma versão particular da dualidade regras
que se denegue a priori toda legitimidade às 7. Encontram-se, aliás, no campo da teo- prescritivas-regras constitutivas, ele admite B - A normatividade ligada à função dos
operações de tradução em nome da distin- ria do direito, algumas emitentes reticências no entanto uma analogia entre "a lei penal enunciados jurídicos
ção da linguagem dos juristas 16 . Ainda é a respeito da representação deôntica das re- munida de suas sanções" ou as regras da
necessário explicar-se o que fundamenta a gras jurídicas, de cada norma jurídica. Ins- responsabilidade civil, de um lado, e um 9. Não são raros os autores que qualifi-
dedução de uma "proposição normativa" de pirando-se na filosofia anglo-saxônica da corpo de ordens gerais apoiados em amea- cam a regra de direito como "modelo" 21 .
uma disposição enunciativa e verificar que linguagem comum e da teoria dos atos de ças, de outro. Ora, se nos restringirmos aos Mas eles a concebem em geral como um
a mudança do significante não altera o sig- linguagem, alguns colocam em evidência o textos formulados na linguagem do legisla- modelo de conduta. A ruptura com a con-
17
nificado. Dir-se-à, contemplando-se o céle- lugar do "performativo" da linguagem . dor, força é constatar que enunciados do cepção deôntica não é consumada. Uma
bre art. 2279 do Código Civil ("Em matéria Outros distinguem, ao lado das "regras pres- código penal (francês) ou as inúmeras dis- rica análise de M. P. Amselek 22 pareceu ao

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contrário torná-la possível. É esta v1a que 10. Reconhecer valor normativo a um é possível fazer ou esperar segundo o direito são aplicáveis".). Assim, a aplicação de uma
convém seguir, apesar de que os escritos enunciado é compreender que ele é chama- positivo. regra de direito deve de início se entender
ulteriores desse autor autorizem a pensar do, à maneira de um modelo material (es- Mas a perspectiva de referência às regras do ato de referência ao modelo que ela consti-
que ele tenha estacado a meio caminho23 . quadro, molde de roupas, etc.), para servir pode ser também de contestar o que foi tui, para os fins de avaliação jurídica numa
Situar a norma no gênero dos modelos de referência. Sua vocação será a de permitir feito, tendo em vista alcançar eventualmen- perspectiva qualquer. Mas se desenha desde
é colocar em evidência sua natureza instru- a avaliação de situações, relações, atos, ações, te um resultado prático (caso daquele que, logo uma segunda acepção legítima do ter-
mental de medida, de padrão. A partir daí condutas, ou outros objetos ainda, vale di- desejando obter a anulação de utn ato ou a mo. A aplicação de uma norma se entende
a normatividade de uma proposição não se zer, de determinar como eles devem ser, reparação de um dano, ·confronta ora já da própria operação de avaliação, teoricamen-
vincularia simplesmente, inclusive na or- deverão ser ou deveriam ter sido do ponto realizado .às normas que regulam sua vali- te decomponível em dois momentos: a jus-
dem das relações e atividades humanas, à de vista do sistema ao qual pertence essa dez ora uma seqüência de fatos às regras da taposição do modelo e do objeto concreto a
função de instrumento de medida atribuída a norma, para que sejam conformes às suas responsabilidade civil). Ela pode ser ainda avaliar, e em seguida a verificação dessa re-
esse enunciado, independentemente de seu disposições e para obter, em cada caso, os de apreciar a conformidade de um certo lação. Se ela representa a operação central
objeto (uma conduta ou outra coisa) e de resultados ligados a essa conformidade. estado de coisas às regras em vigor, em vista de um julgamento jurisdicional, a aplicação
sua formulação? A resposta afirmativa faz Essa função de referência se realiza através de uma inspeção para os mais variados fins deste segundo sentido se encontra em prin-
aceder uma concepção unitária, simples a de operações de julgamentos, nos sentidos lógi- (atitude elementar do inspetor de trabalho cípio inteiramente alojada em sua motiva-
despeito das aparências, e bastante ésclare- co e psicológico, em contextos e finalidades visitando um estabelecimento, ou atividade ção, pois o dispositivo é pura decisão fun-
cedora em muitos aspectos, das normas éti- bastante diversos. Essa operação de julga- de auditoria). Essa ação de avaliação se ins- dada sobre a conclusão dessa confrontação
cas em geral e das regras jurídicas em parti- mento se inscreve às vezes numa atividade creve, conforme o caso, na perspectiva de (ainda que a prática francesa seja por vezes
cular. institucional - atividade administrativa ou elaboração de uma decisão administrativa de retomar es.sa conclusão no dispositivo
Ao menos quanto a estas últimas, a inte- atividade jurisdicional (o "julgamento" no ou de uma decisão chamada a pôr termo a do julgamento ou do acórdão).
ligência dessa concepção requer desde logo processo de decisão ou julgamento no sen- um pleito formalizado (atividade jurisdicio-
2 2 Uma regra jurídica pode ter os mais
duas precisões: tido institucional) - mas tal não é seu con- nal, pelo menos numa ordem em que "o
texto mais cotidiano. diversos objetos.
- a vocação de um enunciado para servir juiz resolve o litígio de maneira conforme
de modelo de avaliação resulta de sua inser- A perspectiva de colocar em operação às regras de direito que lhe são aplicáveis", 12. O reconhecimento da significação
ção num conjunto socialmente considerado esse modelo ideal, dessa variedade de padrão, sabendo-se que ele é também instado a se normativa de um enunciado em linguagem
como normativo, vale dizer, voltado a essa pode ser a de uma ação futura, vale dizer, referir às normas de procedimento a fim de do direito e, por esse fato, sua contribuição
função específica de permitir determinar da realização de uma operação da qual se assegurar a regularidade do desenrolar do ao governo das ações, não depende da na-
como as coisas devem ser, o que elas valem espera um certo resultado ou uma regulação processo). tureza de seu objeto - do que ela "fala" -uma
do ponto de vista próprio desse conjunto, de uma situação jurídica. Assim, enquanto 11. Normalmente utilizadas em séries, vez que ela se a pega à sua vocação de mo-
é maneira de sublinhar que não se concebe uma pessoa busca concluir um contrato ou em razão das conexões ou indivisibilidades delo. Do mesmo modo, os enunciados que
regra jurídica isolada, não integrada a um constituir uma sociedade, ou quando ela de seus objetos respectivos, estas normas só compõem a ordem jurídica estatal francesa
"sistema" normativo; deseja conformar sua ação pessoal, uma si- podem ser empregadas na medida de sua atual (considerando apenas seu segmento
- essa inserção depende, por sua vez, seja tuação ou uma coisa (um edifício, estabele- pertinência ao caso em questão, vale dizer, legislado) têm, na sua imensa maioria, sig-
da competência que outras disposições des- cimentos industriais, um veículo, etc.) às de sua "competência" normativa. Esta é, nificação de normas, sem que haja necessi-
regras em vigor, seja por civismo ou pred- para cada regra, função do seu objeto e dade de se perguntar se eles podem ser tra-
se conjunto reconhecem ao autor do enun-
cupação de evitar incômodos; ou ainda tributária de normas próprias a essa compe- duzidos em proposições normativas no
ciado (condição primeira de uma validade
quando ela quer jogar habilmente com as tência (disposições gerais ou especiais rela- sentido dos lógicos das normas.
das regras legisladas, que é, no direito esta-
regras em vigor, ou mesmo se lhe apraz tivas à sua aplicação no tempo ou ratione Nesse conjunto, encontram-se certamen-
tal moderno, uma validade do tipo formal),
saber o que ela arrisca antes de empreender materiae). Ela se verifica por uma confron- te modelos de conduta (art. 212 do Código
seja do reconhecimento de sua participação
uma ação ou a materialização de uma situa- tação tão rápida que mal chega a ser cons- Civil francês), mas também modelos de re-
nessa ordem pelos "membros do grupo" (va-
ção irregular. Se há sempre, nessas diversas ciente desse teor abstrato da norma aos da- lações entre pessoas (art. 312 ou art. 1382
lidade factual ou empírica) pelas normas
circunstâncias, relação de norma à conduta, dos concretos. Trata-se de uma variedade de do Código Civil), de qualificação de um
constitucionais (alternativa à hipótese kelse-
é nesse sentido e sempre que a primeira vai operação de qualificação. De resto, essa sujeito de direito (art. 488 do Código Civil),
niana da Grundnorm) ou pelas regras não-
servir para dirigir a segunda, mas não por- competência se vê às vezes discutível e, em de atribuição de uma prerrogativa a um
-legisladas24.
que ela o tem por objeto. Abstração feita da diversas circunstâncias, objetivamente dis- sujeito (art. 9º do Código Civil ou o artigo
Explicações complementares se impõem,
diferença de intenção, a regra manifesta cutida25. Uma vez adquirida, ela torna a constitucional que enuncia "o Presidente da
bem entendido. Elas serão ordenadas em
igualmente sua natureza de modelo quando norma aplicável no sentido, por exemplo, República tem o direito de conceder indul-
torno de três proposições.
é contemplada pelo jurista dogmático que do art. 12, 1~ alínea, do novo código de to"), do efeito de um ato (art. 1165 do
P~ Enquanto norma, toda regra de direi- prepara, por exemplo, um comentário legis- processo civil francês ("O juiz decide o lití- Código Civil) ou de uma situação de fato
to se entende de um modelo ideal. lativo ou algum guia prático expondo o que gio conforme as regras de direito que lhe (art. 2279 do Código Civil). Encontra-se
84 85
igualmente modelos de coisas materiais (o uma manifestação esportiva, o nome, a mar- lar, a confrontação com o art. 544 do Có- fato, em nome da indispensável segurança
estado ou o equipamento dos veículos ou ca, ou o emblema publicitário de um pro- digo Civil permite responder que é legal jurídica ou lamentar a degenerescência da
as condições dos locais de trabalho) ou de duto de tabaco ou o nome de um produtor, realizá-lo, uma vez que "a propriedade é o prática 29 • Para os nossos propósitos, o fenô-
instrumentos especificamente jurídicos (o fabricante ou comerciante de tabaco ou pro- direito de gozar e de dispor das coisas da meno prova que a significação de norma,
regime dos escritos contratuais ou o dos dutos de tabaco", o art. 10 da lei de 9 de maneira mais absoluta (....)'127 • Modelos de tanto quanto a interpretação dos termos
títulos de crédito). julho de 1976 afeta a atividade de emissoras qualificações, os "enunciados de tipo predi- que a formulam, constituem apostas das
Múltiplas são igualmente as normas que de televisão tanto quanto os organizadores cativo" ( dos quais encontramos notáveis confrontações de interesses, cujo campo de
significam modelos de aplicação de outras de manifestações esportivas, na medida em exemplos nos arts. 516 e ss. do Código prática retórica específica instituído pelo
regras, de operações procedimentais,'t;ttc. que as primeiras difundem imagens destes Civil: "To dos os bens são móveis ou imó- direito é o teatro 30 •
Não se trata de negar a presença de nor- 26
últimos • De resto, os sujeitos cuja ativida- veis". "Os objetos que o proprietário de um 14. Assim sendo, se todas as regras jurí-
mas jurídicas tendo uma conduta por obje- da ou cujos atos são objeto de tais normas fundo ali colocou para o serviço e a explo- dicas, qualquer que seja seu objeto, têm
to, mas elas não são com certeza a maioria. jurídicas são mais freqüentemente pessoas ração desse fundo são imóveis por destina- igualmente vocação para afetar ações, é urh
Entre as que parecem de início constituir jurídicas (interessados na qualidade de em- ção") constituem normas mais certamente princípio e sempre a partir das operações
modelos de comportamento, um exame pregador ou a outro título) que indivíduos. ainda. de julgamento pelas quais elas são aplica-
ate11to mostra que muitas tratam menos de Ora, é possível falar do comportamento de 13. A concepção da norma como modelo das. Passagem obrigatória de seu uso, a re-
uma conduta humana que de um ato mate- "atores" que não sejam pessoas físicas? de conduta ou de qualquer outro objeto sim- ferência a esses modelos adquire um sentido
rial ou jurídico. O objeto do modelo é en- Uma enumeração exaustiva dos tipos de plifica o reconhecimento da significação prático particular enquanto deve presidir
tão o resultado possível de ações a cuja objetos dos quais as regras de direito podem normativa da imensa maioria dos enuncia- uma decisão, institucional ou privada, "de
consistência as motivações, e freqüen temen- constituir os modelos seria vã. O essencial dos formulados em linguagem jurídica. Pa- realizar um ato jurídico ou material. Com
te os próprios autores, permanecem indife- é ressaltar a variedade desses objetos. Acres- rece-nos, sobretudo, que ela dá conta da efeito, se a perspectiva do operador é a da
rentes. Pensamos em particular nas inúme- tentaríamos apenas que as definições das experiência da relação cotidiana com .~sses regularidade jurídica (caso do juiz em par-
ras disposições formuladas na "voz passiva". categorias jurídicas anunciadas em lingua- enunciados. Mesmo porque ela não conduz ticular), tal ato consistirá em conformar a
Qtando os textos enunciam que os locais gem do direito têm, também elas, valor de a dotar de valor normativo todas as prepo- situação a esses modelos. Grande é a varie-
de trabalho "devem ser mantidos num esta- normas, ainda que a concepção deôntica da sições dos textos constitucionais, legislati- dade dessas ações de conformação das coi-
do constante de limpeza e apresentar as normatividade ética obrigue, para lhes reco- vos e regulamentares. Na França, em parti- sas e eventos às regras a plicáveis. Mas se
condições de higiene e de salubridade neces- nhecer "valor jurídico'', a inserí-las em en- cular, os textos contemporâneos contêm cuida menos de ações-objeto dessas normas
sárias à saúde do pessoal" e "devem ser or- cadeamentos proposicionais complicados não apenas decisões, mas também disposi- que de ações de homens-artesãos, cuja posi-
ganizados de maneira a garantir a segurança concluídos por "proposições normativas ções que significam, à primeira vista, ape- ção em relação a esses instrumentos é aná-
dos trabalhadores" (art. L. 232-1 e L. 233-1 stricto sensu". Qye as noções, portanto as nas avaliações éticas, programas de política loga à do alfaiate diante do "molde": este
do Código do Trabalho francês), eles signi- categorias jurídicas, pertençam, em todo pública, formulações de objetivos. Esta prá- último governa a ação do primeiro, enquan-
ficam não modelos de condutas dos empre- caso, à família dos modelos ideais não é o tica da "legislação proclamatória" ou "decla- to constitui um modelo de vestimenta, e não
gados, mas referências a uma situação dos bastante para assegurar a normatividade de matória" suscita ironia ou perplexidade de de conduta humana. Uma condenação de
locais que "deve ser", abstração feita das toda definição em linguagem do direito. numerosos juristas, que não encontram nos indenizar, a anulação de um ato, o pronun-
atividades humanas possíveis ou indispen- Ocorre sobretudo que esta última institui textos em causa essas "regras de conduta", ciamento de uma obrigação de fazer, mas
sáveis a esse fim. Do mesmo modo, ao es- uma equivalência entre a denominação d~ menos ainda esses "comandos dotados de também a execução de uma decisão judicial,
tatuir que "nenhum assalariado pode ser uma categoria e a reunião de elementos, uma ameaça de sanção" que eles tomam por o pagamento de uma dívida, a preparação
sancionado ou despedido em razão de sua propriamente jurídicos ou factuais ou me- únicas autênticas regras de direito 28 • No en- e a realização de uma operação regular pró-
origem, de seu sexo, de seu estado civil (...)", nos numerosos, de sorte que ela tem o sen- tanto, alguns desses enunciados acabam por pria a atingir os resultados que as regras
esse texto do Código do Trabalho visa à tido de modelo de atribuição de uma qua- desempenha r algum papel na resolução de pertinentes conferem a essa regularidade
não-superveniência de um ato jurídico ca- lificação ao objeto subsumível no conceito questões jurídicas e na solução de litígios, (constituição' de uma sociedade, redação de
racterizado por certos motivos objetiváveis, nomeado pelo termo definido. Nesse senti- quando orientam a interpretação das pró- um testamento, celebração de um casamen-
antes que a proibição de uma conduta de- do, o enunciado significa já um modelo prias regras ou quando os tribunais as in- to, realização de um licenciamento regular),
terminada ao empregador. Esta atitude pa- para operações de qualificação. Mas, de um vestem de um valor normativo ou delas a outorga de uma autorização cujas condi-
rece muito banal em nossos sistemas jurídi- modo reversível, funciona também como deduzem regras implícitas. Prova disso são ções se encontram satisfeitas, a realização
cos. Normas desse gênero, certamente, uma referência para a imputação de certos as mutações semânticas e pragmáticas de de arranjos materiais relevam igualmente de
afetam, no final das contas, ações, mas estas efeitos jurídicos a uma qualificação adqui- diversas proposições do Preâmbulo consti- uma tal atividade "artesanal" de conforma-
menos determinadas e potencialmente mais rida. Para a questão de saber se o direito de tucional de 1946, a serviço das escolhas de ção às regras. Elas ilustram o teceiro sentido
numerosas que parecem. Por exemplo, ao propriedade de uma pessoa a autoriza a política jurisprudencial do Conselho de Es- que convém reconhecer à expressão "aplica-
dispor que "é proibido fazer anunciar, sob realizar, relativamente ao seu bem, tal ato tado e, mais ainda, do Conselho Constitu- ção de uma norma jurídica", aquela pela
qualquer forma, na ocasião ou t1o curso de do qual não trata nenhuma norma particu- cional. Alguns podem se indignar desse qual alguns agentes do sistema estatal são
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encarregados de velar . Mas não se trata do teor do modelo. A ponto de alguns des- ta ao autor do fato é descartadada por não A "pressuposição" tal qual é habitualmente
exatamente ou não se trata sempre de uma ses princípios serem antes nomeados que se ter apurado qualquer culpa de sua parte, concebida, fixa antes as condições às quais
imitação do modelo, análoga ao corte de formulados, porque parecem muito difíceis não é precisamente em virtude do art. 1382 está subordinado um dado efeito: se este
um pedaço de tecido conforme os contor- de enunciar. Pensemos no princípio da do Código Civil? não deve se produzir porque as condições
nos do "molde": a metáfora tem limites, igualdade, cujas indeterminação e relações Encontramos aqui a diversidade, já assi- não estão satisfeitas, é em virtude da pró-
inerentes à diferença de um modelo ideal e incertas com múltiplas regras expressas (tra- nalada, dos sentidos do termo "aplicação", pria norma, pois, em conseqüência de sua
de um modelo material. tando de objetos mais limitados) são tão que a análise teórica deve opor aos vícios aplicação.
notórias quanto sua positividade. terminológicos dos redatores de leis e dos 17. Acrescente-se que a freqüente comple-
3º As normas jurídicas são modelos sim-
16. Fora desse caso, o grau variável de juristas. Sobretudo se se trata de dar conta xidade do modelo trazido por toda norma
ples ou complexos
complexidade das regras jurídicas parece do processo efetivo de manipulação das jurídica é acompanhada de uma incerteza
15. Elas articulam freqüentemente dois acreditar uma análise clássica de sua estru- normas jurídicas. Concebê-las como mode- estimada ou virtual de sua exata configura-
ou mais elementos, segundo uma relação tura. Para numerosos autores 3 \ uma norma los permite distingir duas operações no cur- ção. A afirmação do "sentido claro" de um
que é no mais das vezes de imputação: im- jurídica compor-se-ia sempre (mediante re- so de sua aplicação: o ato de a elas se repor- texto normativo vem do mito ou, na me-
putação de uma sanção penal a uma ação, construção dos enunciados) de uma hipóte- tar em razão de seu objeto, sendo este lhor das hipóteses, do argumento em favor
de nulidade de um ato em face de certos se ou pressuposição (ou ainda antecedente, "causa" de sua competência, depois a con- de uma leitura determinada que se quer
vícios ou de certas irregularidades, de uma pressuposto, fato jurídico) e de uma conse- frontação dos dados empíricos aos modelos prevalecer. Convém ao menos reconhecer "a
dívida de reparação ao ato danoso de uma qüência ou efeito jurídico (ou ainda: conse- que elas significam. Uma e outra merecem, textura abetta do direito" 33 • Mesmo a idéia
pessoa ou de uma coisa, do poder de fazer qüente, dispositivo). Fundamentalmente hi- já o dissemos, o nome de aplicação. Apesar de que existe, apesar de tudo, um "núcleo
um ato dadas tais circunstâncias, etc. Existe potética, ela poderia portanto se exprimir de que a estrutura dualista destacada por de certeza" inspira dúvidas legítimas . A
espaço, no entanto, para normas-modelos sob a forma "Se ... , então ... " Para além das uma doutrina clássica se encontre em inú- experiência atesta, mediante texto constan-
na estrutura mais simples, tais como os mo- divergências sobre a consistência exata de meras regras, ela corre o risco, se se a quer te, que o teor atribuído ao modelo com a
delos de atribuição de prerrogativas reco- cada um desses dois elementos, todos os sistemática, de caracterizar o que Kelsen autoridade de uma solução "de outro posi-
nhecidas a todos ("Cada um tem o direito partidários dessa análise vêem na hipótese chamava Rechtssiitze (proposições descritivas tivo" pode variar. O sentido de uma dispo-
ao respeito de sua vida privada") ou, ao ou pressuposição a determinação das "con- do direito) antes que Rechtsnormen (as nor- sição, que não suscita controvérsia em certa
contrário, a um só ("O Presidente da Repú- dições de aplicação" da regra. Assim, o art. mas jurídicas elas mesmas). Sobretudo, época revelar-se-à ambíguo ou incerto numa
blica exerce o direito de indulto"), ou ainda 1382 do Código CiviJ3 2 poderia enunciar-se: compreender a hipótese ou pressuposição circunstância em que sua interpretação será
os modelos de comportamento que não são "Se uma pessoa causa por sua culpa um como o enunciado das condições de aplica- o jogo de uma oposição de interesses. Os
subordinados a nenhuma outra condição dano a outrem, então ela é obrigada a repa- ção da regra é desconhecer a realidade e a exemplos abundam. "O Presidente da Repú-
além da existência da situação jurídica ou rá-lo", a primeira proposição fixando as importância decisiva das duas operações in- blica assina as leis (... )", percebe-se o equívo-
factual visada ("Os cônjuges se devem mu- condições de aplicação de uma norma, que telectuais primordiais necessariamente pré- co desse art. 13 da Constituição de 1958
tuamente fidelidade, segurança e assistên- seria assim "inaplicável" na ausência de fato vias a toda conclusão de aplicabilidade ou antes que as peripécias políticas de coabita-
cia", disposições do código de trânsito sobre culposo do pretendido responsável. A reda- inaplicabilidade da norma no sentido tradi- ção 1986-1988 engendrassem a controvérsia
a circulação dos veículos). A simplicidade es- ção mesma de um texto como o célebre art. cional desses termos. (o Chefe de Estado só tem uma competên-
trutural do instrumento-norma não significa L. 122-12, ai. 2 do Código do Trabalho- "Se Na realidade, as condições de aplicação de cia vinculada ou pode ele recusar a assina-
necessariamente que ele seja dotado de um sobreviver uma modificação na situação ju- uma regra (de sua competência normativa) tura)? A disputa, que não diz respeito ape-
sentido claro, preciso, unívoco. rídica do empregador, notadamente por são reunidas quando se põe, nos contextos nas ao sentido das normas mas por vezes
Tal é o caso de numerosos princípios-re- (...), todos os contratos em curso no dia da os mais variados, o problema da avaliação ao também à sua positividade- tal regra é bem
gras. Pois se o termo "princípio" conhece modificação subsistem entre o novo empre- qual ela deve oferecer resposta: quem é respon- assentada por uma "jurisprudência constan-
uma variedade de ocorrências geradoras de gador e o pessoal da empresa" - incita tribu- sável por tal dano? O contrato de trabalho te", tal proposição em linguagem do legisla-
uma polissemia no mais das vezes negligen- nais e doutrina a dizê-lo "não-aplicável" concluído com tal empregador se encontra dor tem significação normativa? - afeta tan-
ciada - alguns, que são a maioria, opõem quando o evento que afeta a empresa não transmitido a tal outro? Dito de outra for- to a certeza comodamente emprestada ao
"princípios" a "regras" - ele designa e quali- constitui uma modificação na situação jurí- ma, essa competência, ou aplicabilidade, de- direito que a solução oficial (jurisdicional)
fica freqüentemente autênticas normas jurí- dica do empregador. Como não ver, contu- pende do objeto de norma-modelo, e não da parece, afinal, orientada por simples "dire-
dicas positivas. O uso do vocábulo tende do, que se a transmissão de plano dos con- maneira pela qual este informa aquele ou- tivas de interpretação". Sem falar no efeito
então a sinalizar a estabilidade e o valor tratos de trabalho for então descartada, é tro, ou seja, se se preferir, depende daquilo das noções-quadro e standards (fala-se ainda
particulares reconhecidos à regra, que vão em consideração desse art. L. 122-12, ai. 2 e de que trata a disposição com significação em "noções fluidas" ou de "conceitos plásti-
às vezes em paralelo na hierarquia das nor- no final de sua confrontação aos dados da normativa, e não do modo como ela o trata. cos"), das quais a notória instrumentalização
mas. Ela denota em todo caso uma notável espécie, portanto por efeito de sua aplica- A hipótese de sua aplicação se encontra do direito contemporâneo em nada reduziu
generalidade de pertinência (de competên- ção? Igualmente, se na presença de um assim realizada cada vez que uma situação a importância 34 , nem das perturbações indu-
cia), ligada a uma freqüente indeterminação dano, a responsabilidade civil que se impu- concreta faz surgir o problema em questão. zidas por uma impressionante massa de
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instrumentos internacionais ou comunitá- ção tratando da eleição ou dos poderes do tas ocupando postçoes determinadas, mas diferem nisso dos simples desejos ou conse-
rios, aos quais o ordenamento jurídico deve Presidente da República apresentam, nesse suscetíveis de serem mobilizadas no quadro lhos, mas não das normas constitutivas de um
uma parte de sua "fluidez". Isto também se sentido, o mesmo característico de generali- de uma outra relação. O art. L. 122- 12, ai. sistema moral ou disciplinar qualquer que
observa se abordarmos as normas jurídicas dade que, por exemplo, o art. 1382 do Có- 2 do Código do Trabalho ilustrará, ainda não teriam sentido sem essa mesma preten-
sob o ângulo dos caracteres que lhe são digo Civil! aí, a proposta: modelo de relação entre as- são à obrigatoriedade no quadro do dito
ordinariamente reconhecidos. É num outro sentido que se reivindica, salariados e um novo empregador, ele é fre- sistema. Se as regras de uma ordem jurídica
em nome da igualdade dos cidadãos ou dos qüentemente invocado entre empregadores, estatal, tal como o direito francês, parecem
sujeitos (igualdade na lei), a generalidade onde um pretende que o outro deve ou teria dotadas de uma característica obrigatória,
II - Caracteres atribuídos às normas das regras de direi to: estas últimas não de- devido "retomar" seu pessoal totalmente ou intensa a ponto de se verificar na sua própria
jurídicas veriam distinguir-se segundo a origem, en- em parte, ou então sustenta, ao contrário, definição, é porque esta ordem pretende sub-
quadramento sócio-profissional ou a locali- que ele suportou indevidamente os custos meter o conjunto da sociedade que enquadra
Uma vez que a significação normativa de zação dos indivíduos e seria necessário da demissão de assalariados tratados como o Estado- constituir o único corpus normativo
um enunciado em linguagem do direito é banir os regimes particulares, salvo necessi- de referência, sob reserva do espaço que ele
seus quando não havia "modificação na si-
ligada à sua vocação instrumental de mode- dade de levar em conta algumas diferencia- concede a outras referências, jurídicas ou não
tuação jurídica do empregador" no sentido
lo para os objetos os mais diversos, tais ções "naturais" (idade, nacionalidade, sexo - e não se coloca de maneira alguma na de-
do texto. É preciso ver aí uma razão suple-
caracteres merecem ser reexaminados sob ou situação matrimonial, segundo as con- pendência de adesões voluntárias.
mentar para rejeitar toda assimilação das
um novo enfoque ou com um sentido novo. cepções há longo tempo dominantes). Sabe- 21. Mes-mo assim compreendida, a obri-
normas jurídicas às ordens ou comandos,
A reavaliação é menor, no entanto, no que -se que o manifesto recuo daquela generali- gatoriedade das regras jurídicas não permite
que "informam" essencialmente as relações
respeita à generalidade e à abstração empres- dade alimenta, desde G. Ripert, pelo menos elidir os problemas originados da aparição
daqueles que as formulam com aqueles às
tadas à regra jurídica (A) que em relação a a denunciação de um declínio do direito 35 • de instrumentos recomendatórios. Limitados
quais elas se dirigem. E se compreende de
seu caráter obrigatório (B) e, sobretudo, des- Isso não impede que as regras particulares, na ordem interna, eles têm um peso mais
que teóricos tenham forjado o duvidoso
ta "sanção" que o acompanharia necessaria- como as regras especiais (opostas às normas notável na produção das organizações inter-
conceito de "comandos autônomos" para
mente (C). que valem por uma categoria genérica de nacionais (dos princípios diretores da
tentar dar conta dessa singularidade.
relações), apresentem mesmo título que as OCDE à intenção das empresas multinacio-
A - Generalidade e abstração normas de campo de aplicação mais vasto, nais no código internacional de conduta
o caráter de generalidade inerente a todo
B - Obrigatoriedade
para a transferência de tecnologia da CNU-
18. Toda norma jurídica obtém estas modelo prometido a um número indetermi- 20. Dizer que "toda regra de direito é CED, passando pela Declaração de princí-
duas qualidades de sua natureza genérica de nado de aplicações. Mesmo a norma que obrigatória" é truísmo ou proposta inútil se pios tripartite da OIT sobre as empresas
modelo. Como tal, todo modelo é abstrato. visa à situação de um indivíduo determina- se refere à substância da norma compreen- multinacionais e a política social, sem es-
Um modelo ideal ainda mais. Assim perma- do é, desse ponto de vista, geral. Sob con- dida como uma regra de conduta. A pres- quecer, bem entendido, as recomendações
nece a despeito de quão "concreto" possa dição de que se trate de uma regra, pois se crição ou a proibição de um comportamen- da CEE). Numa terminologia da visão cor-
parecer seu objeto ou seu teor. Porque ela o conceito de norma individual pode ser to pode ser algo diverso de obrigatório e rente da norma jurídica como modelo de
pertence a esse gênero, toda norma apresen- admitido 36 , uma diversidade de enunciados que pode, em compensação, significar carac- comportamento, fala-se a seu objeto de
ta um caráter essencial de generalidade por que pareceriam ter lugar na sua extensão terística semelhante à atribuída a uma per- "normas de função diretiva elástica" em
sua aptidão a receber um número a priori relevam na verdade do gênero das decisões missão? No quadro da concepção aqui de- oposição às "normas de função diretiva au-
indeterminado, senão ilimitado (existem re- antes que do das normas. Pensamos nos senvolvida, essa mesma afirmação invertida toritária" que seriam os "comandos", por-
gras temporariamente em vigor), de aplica- dispositivos das decisões judiciais ou admi- faz sentido, sublinhando o que se poderia tanto as normas jurídicas clássicas 38 •
ções. O procedimento da edição de regras nistrativas, que a teorização kelseniana compreender como um aspecto da validade Conviria rio entanto verificar no detalhe
traduz, a esse respeito, uma racionalização, toma, erradamente segundo entendemos, das regras. Parece de fato que esta "obriga- que a "facultatividade" dos modelos em
uma economia de meios e contribui à igual- como atos criadores de normas indivi- toriedade" se relaciona ao uso das normas questão afeta- como em outro lugar a obri-
dade, quando se o compara ao do impera- duais37. jurídicas, e não ao seu conteúdo: elas são gatoriedade - sua utilização antes que seu
tivo (ordem) e da decisão que precisam ser 19. As normas jurídicas manifestam, de uso obrigatório, portanto, exclusivo, em conteúdo. Essa tarefa excederia o objeto do
indefinidamente retiradas. A partir daí, su- tudo bem considerado, uma outra forma de relação a toda situação que penetre o campo presente estudo. Em segundo lugar, e aí
blinhar a generalidade e abstração da nor- generalidade. Poderíamos falar de uma "ge- da validade do conjunto normativo ao qual reside o verdadeiro desafio teórico, seria
ma jurídica, crendo revelar assim um de neralidade de sua oponibilidade", no senti- elas pertencem. Elas e apenas elas são perti- necessário formular adequadamente a ques-
seus traços específicos, parece pura tautolo- do de que elas podem ser invocadas nas nentes e devem ser aplicadas para determi- tão de sua pertinência ao domínio do jurí-
gia. Esta generalidade permanece mesmo se relações as mais variadas entre sujeitos de nar o que valem atos e situações, o que eles dico. O debate tem lugar na doutrina de
a situação a que visa a regra, cada vez que direito. Esta característica adquire todo seu devem ser ou como as coisas devem se en- direito internacional e de direito econômico,
haja ocasião de aplicá-la, é sempre a de uma relevo, tratando-se de regras constituindo contrar ou ser organizadas a fim de assegu- a propósito desse "direito verde", soft law,
pessoa apenas: as disposições da Constitui- um modelo de relação entre pessoas abstra- rar sua conformidade à ordem jurídica. Elas opondo os que rejeitam aos que admitem a
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idéia de uma normatividade ou, mais exata- desde aplicação do direito), a que se prende para que um demandante possa formular lham dessa vocação de servir de referência
mente, de uma juridicidade relativa 39 • Ele a juridicidade destes últimos se a qualidade uma pretensão com base nela; que exista para apreciar operações ou atos que relevam
remete, no fundo, à exigência e às dificul- de regra de direito depende da previsão de virtualmente um juiz para julgar essa pre- de sua competência normativa. Não são
dades já assinaladas de uma definição esti- uma sanção em caso de descumprimento do tensão, mesmo de uma maneira que se diz poucos os processos judiciários que susci-
pulativa do direito. Admitimos apenas uma preceito? As regras de incriminação penal e, erradamente simbólica". Mas o que resta da tam a aplicação contenciosa dos artigos
inclinação a considerar que, mesmo de uso mais ainda, as disposições fixando as con- idéia de tarifa, vale dizer, de um preço 2044 e seguintes do Código Civil a propó-
facultativo, os modelos trazidos por tais dições da responsabilidade civil delitual anunciado, senão de um preço a pagar? De sito de uma transação cujas qualificação,
instrumentos relevam de um jurídico do têm sempre sentido de organizar uma san- fato, nosso colega desvia-se disso no curso validade, e alcance são discutidas 42 • Essas
qual não se vê em nome de que se poderia ção da violação de normas de com porta- de sua demonstração para escolher, no final regras manifestam em tal circunstância sua
negar a evolutividade, inclusive do ponto menta particulares? Seria necessário consi- das contas, um critério de e'lJentus judicii, "juridicidade", sua pertinência ao sistema
de vista da natureza dos aparelhos da regu- derar que cada uma delas implica a portanto do eventual ingresso em juízo no de direito, quando a sentença estima que o
lação que ele assume. Este problema de existência de uma norma prescrevendo ou lugar de uma tarifação que aplicaria even- ato impugnado vale como transação e pro-
construção de numa definição operativa, ou proibindo a ação cuja abstenção ou cometi- tualmente esse juízo. Este desvio lhe permi- duz todos os efeitos desta, ou quando ela
seja, apta a fundar investigações teóricas e mento seria assim sancionado. Mas, induzir te atingir seu objetivo. Mas convém, ao nos- adota a solução contrária, rejeitando a exce-
empíricas sobre as formas e transformações da positividade do art. 1382 do Código Ci- so ver, conferir uma importância central a ção de coisa julgada levantada pelo defensor
da regulação jurídica, poderia ressurgir a vil a de uma interdição implícita de causar essa vocação que tem em comum as normas que invocou o art. 2052, al. I\ do Código
partir da elucidação da sanção que, segundo por sua culpa um dano a outrem, não é qualificadas de jurídicas e que se quer assi- Civil ou, ainda, quando anula esse ato ata-
a opinião comum, informaria toda regra de precisamente desconhecer as modalidades nalar nomeando-as como tais. cado por via de ação. Se nos propusermos
direito. de uma regulação que se dispensa de um tal 23. A recorrência à idéia de "sanção", a conservar o termo, elas são igualmente
desvio? Sobretudo se as diversas modalida- como questão pertinente ao que nossas so- "sancionadas" em um e outro casos. Elas o
C- Sanção des reagrupadas sob o vocábulo "sanções ciedades nomeiam "direito", traduz, à evi- são da mesma maneira que todas as outras
jurídicas" mantêm alguma relação com as dência, a inerência a esse modo de regul~ção regras do sistema jurídico, inclusive as da
22. Consistiria num mal, ou ao menos idéias de constrição ou de coerção, a inten- social da possibilidade de recorrer a um terceiro Constituição 43 : servindo de padrão para jul-
numa desaprovação, infligido pela autorida- sidade dessa relação é bastante variável e a chamado a julgar as demandas. Ainda é preci- gar como as coisas deveriam, devem ou de-
de social instituída - portanto o aparelho esta categoria genérica parece faltar unida- so compreender exatamente essa eventuali- verão ser do ponto de vista desta ordem
do Estado no caso de um direito estatal - e de. O que há de verdadeiramente comum dade: a nosso ver, ela é a do processo antes jurídica, no quadro e para os fins da reso-
compreendido como uma reação à violação entre a nulidade de um ato jurídico, que que da sanção no sentido trivial do "mal" lução de um conflito - portanto no quadro
da regra. Pena, reparação, expulsão, destrui- evoca o insucesso de uma operação, e uma que infligiria, conforme o caso, a decisão de um julgamento institucional = inde-
ção de um edifício, ou ainda anulação de pena, mesmo de simples multa, ou a conde- que encerra esse processo. Enunciar que pendentemente do teor do dispositivo da
um ato jurídico, ela concretizaria, tanto no nação a pagar uma indenização 40 ? uma norma é uma regra de direito, vale decisão a intervir (indeferimento do pedi-
seu pronunciamento quanto pela execução Ph. Jestaz recentemente tentou renovar a dizer, de um elemento de uma ordem jurí- do, absolvição ou condenação, anulação, or-
forçada, a presença de uma coerção con- análise ou, ao menos, escapar à circularida- dica determinada, significa que ela servirá denamento de uma medida em virtude de
substancial à noção de direito. A ameaça de de das relações entre direito e sanção 41 • eventualmente, em função de sua aplicabi- um poder reconhecido em decisão liminar,
sua superveniência seria o fator mais seguro Conviria, segundo nosso colega, conceber a lidade, de instrumento de medida a um juiz etc.). Dito de outra forma, a "sanção" das
de conformidade espontânea às normas ju- sanção como a "tarifa" inerente a toda nor- instituído por essa ordem, no quadro de normas de direito se manifesta preponde-
rídicas. No final das contas, ela forneceria ma jurídica e, ao contrário, significativa- uma atividade de resolução de conflitos or- rantemente na motivação da decisão do que
o critério mesmo da juridicidade dessas re- mente ausente do domínio da moral ou dos ganizada por essa mesma ordem. É signifi- em seu dispositivo.
gras. costumes, estando entendido que as regras car, ao mesmo tempo, que essa norma é 24. Tem os, aqui o que parece sem equiva-
Esta representação corrente suscita reser- "se tarifam umas pelas outras" e que cada suscetível de ver seu sentido e seu alcance em lente no domínio das diversas morais, dos
vas, umas clássicas, outras menos dominan- uma não fixa necessariamente sua própria situações concretas discutidos no quadro assim preceitos de conveniência ou das regras da
tes, mas mais pertinentes. Mesmo que não tarifa. Descobre-se todavia que esta reside, instituído. Essa caracterização vale tanto arte. Se ocorre que essas normas encontram
se tomem por "verdadeiro direito" os ele- em definitivo, na eventualidade do recurso para as regras de procedimento que regulam alguma pertinência por ocasião do julga-
mentos do sofi law evocados acima, pode-se a um juiz suscetível de deduzir disso, pela esse quadro - as disputas a seu respeito são mento das demandas no terreno do direito,
verificar que cada uma das normas que via da decisão, um efeito preciso. No total, moeda corrente e as vias de recurso permi- é na medida apenas em que as regras jurídi-
compõem uma ordem como o atual direito conclui o autor- que permanece atado, por tem a propositura de ação de maneira que cas então aplicáveis a isso remetem explici-
francês se encontra provido de uma sanção outro lado, a "uma definição do direito pela os tribunais possam interpretá-las ou apli- tamente ou através de uma categoria como
assim concebida? A supor que haja possibi- sanção" - "a regra jurídica seria provida de cá-las - quanto para as normas substantivas. a de "culpa". Elas não são igualmente "juri-
lidade de distinguir normas de conduta uma sanção - e por isso digna de portar seu Mesmo as disposições legais que ordenam dicizadas". No entanto, a especificação que
(sancionadas) e normas sancionadoras (go- nome - sob dupla condição: que ela se re- as formas extrajudiciais e não jurisdicio- acabamos de ensaiar é a de um caráter atri-
vernando a ação dos juízes e das autorida- vista de um caráter de precisão suficiente nais de resolução de conflitos comparti- buível a uma norma tida por jurídica - uma

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vez que ela é tida como tal por força dos dem como o direito estatal francês podem abrangem, e, mais ainda, a "descrição" das abstenção de ações tão diversas, e não mais
critérios de validade admitidos pela ordem encontrar um sentido, admitida sua nature- condições técnicas de aplicação ou mobili- que diferenças de intensidade dessa pressão.
considerada - e não do que poderia ser o za de modelo "que age" a partir de operaçõ- zação das normas, serão raramente supér- Cremos que a concepção realista da regra
critério mesmo de sua juridicidade. Nossa es de avaliação. A esse respeito, afirmar que fluas. Aqui como alhur~s o progresso do de direito desenvolvida neste estudo favore-
perspectiva não é portanto a das habituais toda norma jurídica se encontra sancionada conhecimento supõe o abandono das pro- ce a consideração dessa diversidade, que ca-
considerações sobre a relação entre norma é inexato se a sanção se entende como uma postas gerais sobre "a força do direito", racteriza o teor das normas tanto quanto os
jurídica e sanção. Segundo pensamos, dizer pressão constritora do comportamento con- qualquer que possa ser sua virtude desmis- contextos e as finalidades de sua utilização
que uma regra de direito é suscetível de ser forme a essa norma ou do castigo mediante tificadora ou sua aptidão a sugerir hipóteses como modelos, como referências. Ela auto-
debatida em juízo (justiciable), não é enun- sua violação. É preferível constatar que toda que permanecem, portanto, a verificar. riza a compreensão da variabilidade de sua
ciar o que permitiria identificar, em uma regra que se reputa pertencer a uma tal Q!em discordará? relação teleológica (prevista ou suposta)
coorte qualquer de normas, aquelas que são ordem tem, por isso mesmo, vocação a ser- Um mínimo de atenção para essa tecno- com as ações que elas têm vocação de guiar.
jurídicas e aquelas que não o são, mas de- vir de referência na solução institucionali- logia da regulação jurídica põe em dúvida Por exemplo, será indiferente observar que
duzir uma conseqüência dessa qualificação. zada dos litígios no campo dessa ordem, e, que o direito assegure "o enquadramento a dissuasão de numerosos atos julgados so-
Extrair um critério genérico do jurídico assim, a ver discutida sua significação e seu normativo das condutas humanas, impon- cialmente nocivos é pesquisada para a for-
é um outro problema, que releva de uma alcance. do o respeito a modelos de comportamen- mulação de normas de incriminações que
iniciativa, já evocada, de construção de uma 25. Qle resta da idéia de constrição em to"48. Qter-se dizer que ele impõe defato ou dispensem sua proibição formal? Ou que a
definição estipulativa do direito, operacio- tudo isso? Sua presença no seio das ordens apenas que ele prescreve? Mesmo escolhen- promoção de certas práticas desejadas, no-
nal para certas investigações nos confins da jurídicas não deixa muita dúvida, não mais do a segunda interpretação, a inserção pare- tadamente a título de políticas públicas
teoria do direito e da sociologia jurídica que as relações polimorfas dessas ordens (pensamos nas formas atípicas de mise au
ce largamente inexata ou equívoca. Inexata
teórica, de pura sociologia do direito (veri- com os fenômenos de poder ou de domina- travai! inventadas pelas sucessivas políticas
se se tem olhos voltados à extrema diversi-
ficação da h i pó tese e pesquisa das modali- ção. Tudo sugere que estes últimos passem de emprego ou de tratamento social do de-
dade dos objetos de enunciados que têm
dades empíricas de um pluralismo jurídico tanto pelo discurso que os enunciados da semprego), passa pela edição de regras "téc-
vocação de referência para agir, para a
num espaço social dado) e mesmo de antro- linguagem do direito constituem (ou que se nicas" que as dotam de um regime jurídico
orientação das ações, sem ser todos, ao con-
pologia jurídica. Sem sair à cata de uma tal desdobra para legitimá-los) e pela "força particular, conferindo vantagens para os
trário, modelos de conduta. Inexata porque
definição, lembramos que a hipótese do simbólica" do encadeamento das normas, atores que incitam (sem dizê-lo), retirando-
se (dada a variedade de seus objetos e sendo
processo, a vocação a um questionamento quanto pelo teor mesmo das regras, a obje- -os de qualquer controle público?
dotados de uma obrigatoriedade de uso e de Importa ainda mais ter atenção às con-
perante um terceiro, o recurso mesmo a esse tividade que eles tendem a conferir à ordem uma aptidão a serem deduzidas em juízo),
terceiro interveniente, exercem desse ponto estabelecida, as obrigações e restrições que dições nas quais as regras, substantivas ou
esses modelos são destinados a "pesar" sobre procedimentais, são mobilizadas pelos "sujei-
de vista uma forte atração. Penso nos escri- decorrem de sua combinação ou de seu uso, os comportamentos efetivos nas relações so-
tos de alguns eminentes autores engajados os atos de coerção que habilitam alguns tos". Essas condições resultam em parte de
ciais, eles o fazem habilitando e encorajando dispositivos jurídicos procedimentais, mas
numa elucidação das razões de ser do direi- dentre eles ou pelo efeito de reprodução certos atos mais freqüentemente que dissua-
to, de sua singularidade ou, simplesmente, inerente a todo modelo. Mas se há muito a elas se vinculam também às possibilidades
dindo certos comportamentos. Equívoca, a ou limitações de ação que produzem as nor-
na pesquisa de um critério universal do reter do que pôde ser escrito sobre essa
afirmação o é na sua concisão, pois negli-
jurídico, de Pasukanis à -M. Carbonnier, questão 46 , é sob a condição de jamais negli- mas substanciais, consideradas na sua arti-
gencia o fato de que as "condutas" enqua- culação. Pois, se não se pode desconhecer a
passando por A. Kojeve e certos sociólogos genciar a ambivalência do direito sublinha-
dradas são às vezes atos materiais ou jurídi-
americanos ou antropólogos 44 . Se teóricos e do, notadamente, pelos enfoques críticos 47 . força simbólica da ordem normativa - não
cos que se pretende garantir, encorajar ou mais que o evidente e natural fenômeno da
sociólogos a negligenciam hoje em suas pro- Mais ainda: a elucidação da parte e das vias
erradicar, mas às vezes também operações ignorância ou do conhecimento aproxima-
posições de definição estipulativa, parece- da constrição exercida pelos dispositivos ju-
-nos que estes teriam muito a. ganhar, levan- rídicos (ou através deles) determina que se
especificamente jurídicas (cumprimento de tivo, mítico, de seu conteúdo 50 - a primeira
do em consideração, mais ainda que a nor- desconfie particularmente das interpretações formalidades ou de um procedimento, pre- exigência é de s'e lembrar que as normas não
matividade45, a possibilidade de recurso ins- globais, as que visam "ao direito", ou "ao visão de cláusulas) orientadas para a realiza- se colocam por si próprias em movimento. Sua
titucional ou a aplicabilidade por um juiz direito moderno", ou mesmo "ao direito ção de atos da mesma ordem ou de decisões mobilitação supõe iniciativas, normalmen-
(contestabilité ou justiciabilité) que caracteriza positivo francês". Ela requer, de início, tan- cuja validade depende dessas operações: te tributárias das necessidades, interesses,
as regras à luz da experiência de fenômenos to no estágio de análise teórica como no da bom número de normas jurídicas tem esta- conhecimento dos atores, sejam eles mem-
de regulação, que são os mais indiscutivel- investigação empírica, a consideração séria tuto de "normas técnicas", de normas de bros do Ministério Público ou agentes en-
mente tidos por do "direito". Mas se trata do material concreto dos corpus normativos, técnica jurídica 49 . Equívoca ela é, enfim, carregados de velar pelo "respeito" a essas
aí de uma simples anotação à margem de portanto da diversidade de sua tecnologia. porque ela não pode dar conta da variedade regras. Este lembrete não é jamais inútil.
uma proposta que é de pesquisar em que Nessa persp.ectiva, as distinções de acordo das modalidades segundo as quais as regras Para a teoria do direito, pode ser o útil
condições as asserções ordinárias sobre os com os tipos de regras, as análises por se- de direito em vigor tendem a exercer uma ensinamento de uma sociologia jurídica ela
caracteres necessários das regras de uma or- qüências de disposições e setores que elas pressão efetiva em vista da realização ou da mesma atenta aos dados normativos em re-

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lação aos quais diversas ações adquirem sen- une t/Jéorie critique du droit. Bruxelles, Duculot, 1975, pp. (Pour une t/Jéorie de la connaissance juridique, Genéve, 20 Le concept de droit. trad. M. Van de Kerchove, Bru-
99 e ss. Droz, 1979, pp. 45 e ss). xelles, Facultés uníversitaires Saint-Louis, 1976. pp. 33 e ss.
tido, mesmo se elas aí não encontram sem-
7 Corpos de regras identificáveis no seio das empresas 12 Não se trata de decisão sem ato. Melhor: a decisão 21 K. Olivecrona, H.L. Hart. M. Virally. Mac Cormick
pre sua causa. A questão entre conjunto de
ou outros grupos infra-estatais, ou ainda a /ex mercato- é um ato (inclusive a decisão implícita de que tenha notadamente.
regras jurídicas e ações nos parece com efei- sido tomada a partir das regras) produzindo, por sua
ria, são direito? Um dado processo de regulação encon- 22 Mét/Jode p/Jénoménologique et t/Jéorie du droit. LGDJ,
to situada sobre um terreno onde essas duas trado no seio de comunidades camponesas ou de so- própria realização, o efeito que ela busca sobre sua 1964 (esp. pp. 217 e ss.), cuja influência será facilmente
disciplinas são necessariamente com ple- ciedades "primitivas" releva do jurídico? Se não há situação concreta. É quanto a seu objeto que a idéia de identificada em nossos desenvolvimentos.
mentares se se deseja que seus ensinamentos nenhuma razão para afirmar que apenas o direito for- "performativo" desenvolvida pela teoria dos speec/J act.f
2 3 Naquilo em que ele parece não conceber que as
tenham qualquer validade 51 • O trabalho de mulado e "sancionado" pelo Estado merece essa quali- tem a pertinência mais indiscutível. Ao contrário, a
normas jurídicas possam ser outras coisas além de
ficação, convém construir um critério genérico para os norma não nasce necessariamente de um ató (ex: regras
teoria não pode ignorar a variedade dos modelos de conduta (v. em particular. La p/Jenomenolo-
fins de identificação e de análise comparada dos fenô- jurisprudenciais, ao menos nos sistemas que ignoram
usos sociais das regras de direito 52 - a utili- menos do direito. Mas a definição assim requerida por o stare decisis). Se ela não procede de um ato de legisla-
gie et. /e droit, Arcb. de pbil. du Droit. t. XVII, 1972, p.
zação argumentativa na negociação ou para 185; Pbilosopbie du droit et tbéorie des actes de langage, cit.
certas investigações históricas, sociológicas e antropo- ção (no sentido material), o único resultado certo deste
Le droit téclmique de direction publique des conduites lmmai-
a justificação de atos tanto quanto a busca lógicas é apenas estipulativa, no sentido que lhe indica é precisamente de colocá-la, de fazer dela um elemento
nes, Droil.f, 10/1989, p. 7). M.). L. Sourioux acolhe a
do resultado jurídico prometido por sua M. Troper (Pour une définition stipulath1e du droit. Droits, da ordem normativa em vigor. Ela vai em seguida viver
idéia de "modelos de referência", mas a propósito de
aplicação (no terceiro dos sentidos acima 10/1989. p. 101). e agir como simples produto desse ato de edição, ad-
"proposições normativas de comportamento" (lntroduc-
8 Para diferentes pontos de vista: Le Systéme .furidique. quirir uma "espessura" e uma eficiência próprias, por
distinguidos) - e a amplitude dos fenôme- sua vocação para afetar um número a priori indetermi-
tion au droit, PUF, 1987, n 2 24). A interpretação que
nos de negociação cotidiana sobre as nor- Arc/Jives de P!Jílosop/Jie du Droit, t.31, Sirey, 1986. Para sustentamos parece bastante próxima, por outro lado,
nado de situações concretas. (v. infra, n2 18).
uma postura crítica da teoria autopoética da escola de da de J. F. Perrin (Régie, in Arc/Jives de Pbilodop/Jie du
mas, inclusive as estatais 53 • A sociologia ju- N. Luhmann, v. M. Van de Kerchov e F. Ost, Le systéme 13 Cf. os numerosos trabalhos de G. Kalinowski, a Droit, t. 35, Siiey, 1990, p. 245).
rídica, por sua parte, seria vã se não levasse jurídique entre ordre et désordre, PUF, 1988 (especialmen- começar por sua lntroduction à la logique .furidíque.
24 A incerteza sobre o que vem a ser esse "meio" (meio
em conta a complexidade e as sutilezas da te pp. 149 e ss.) LGDJ. 1965. Recorda-se de suas controvérsias com o
social global, meio judiciário, meio dos profissionais
técnica das ordens jurídicas de referência, a 9 V.Dictionnaire Ençyclopédique de T/Jéorie et de Sociologie "antiformalista" Chaim Perelman.
especialistas na matéria?) carrega todas as conseqüên-
"mecânica" de sua aplicação, ou ainda as de Droit, E Story-Scientia, 1988, verb. Régulatíon sociale, 14 A questão havia sido abordada por J. Ray (Essai sur cias que conhecemos a respeito da positividade das
intenções que podem mais ou menos clara- por J. Commaille. De início tomado de empréstimo da la structure logique riu code ciz,il /rançais. Alcan. 1926). regras imputadas a essa prática denominada "jurispru-
mente presidir sua produção 54 • Diversidade, mecânica pela biologia, depois adotada em ciências Para referências aos escritos sobre esse tema de M. dência", que se assemelha simultaneamente ao fenôme·
sociais, onde conhece grande sucesso, o termo "regula- Villey, de um lado, de Motulsky, de MM. Kalinowski no da imprensa, da autoridade (repertórios e doutri-
esta é decididamente a palavra chave! E isso e J. L. Gard ies, de diversos teóricos estrangeiros, de
ção" designa às vezes um fenômeno que respeita à vida nadores tanto quanto juízes), da crença compartilhada
tanto quando se trata de descrever a organi- das regras (um dado sistema é autoeco, ou heterorre· outro, V. nossa tese: Des oppositions de normes en droit (E. Serverin, De la .furisprudence en droit privé. Tbéorie
zação interna dos sistemas jurídicos con- guiado?) ou o processo no qual elas são criadas, trans- prh1é interne, Lyon III, 1975, n 2 s 4 e ss. Para outras d'une pratique, P. U. Lyon, 1985; Ph. Jestaz, La jurispru-
temporâneos quanto no momento de cons- formadas, suprimidas (ex: J. D. Reynaud. Les régles du modalidades de reconstrução: R. Guastini, Lezioni sul dence, ombre portée du contentieux, O. 1989. Chron.
truir os métodos de investigação dos quais jeu. L 'action collecti'l'e et la régulation soeiale. A. Colin. linguaggio giuridico, Turin, Giappichelli, 1985, e Dalle 149).
1989, p. 31). Empregamo-lo aqui para qualificar a ação fonti alie norme, Turin, Giappichelli, 1990, pp. 13 e ss.
se espera um progresso na inteligência da 25 Nas configurações empírico-jurídicas de onde nas-
dessas normas, tendo em vista as relações a que elas 15 A. A. Martino, Analyse automatique de textes .furidiques cem esses conflitos de competência normativa que são
regulação jurídica de nossas sociedades. visam, porque ele nos parece evocar, a um tempo, a et aide à la décision, Annales de Piretij, n 2 Montpellier, os conflitos de leis no tempo ou no espaço e os con-
reprodução de uma ordem, a possibilidade de sua alte· 1989, p. 59. flitos de regras que resultam de um concurso de qua-
ração (o direito é, por suas reformas ou por certos 16 Implicitamente operada, desde 1923, por Kelsen lificações.
Notas procedimentos que ele institui, instrumento de uma 26 Cf. o caso da difusão de imagens do "rallye" Paris-
(distinção das Recbtmormen e das Recbtssatze), a distin-
certa mudança), mas também a de um "jogo", inclusive
ção desses dois níveis de Iinguagem jurídica teria sido ·Dakar 1986, permitindo a visualização de veículos
um jogo com as normas jurídicas. É sem dúvida corp
1 Lexique de tmne.1 juridiqueJ, 82 ed., Dalloz, 1990 explicitamente enunciada pela primeira vez em 1948, portadores de publicidades proibidas por essa lei anti-
uma outra acepção ainda que publicistas e especialistás
por B. Wroblewski. Sobre o conjunto do tema, v. Le tabagismo (Paris, 1O de janeiro de 1986. D. 1986, Flash
2 de ciência administrativa o usam quando trabalham
L. A. Warat. Mitos e Teorias na Interpretação da Lei, language riu droit, t. XIX, Sirey, 1974. Para uma diferen- n 2 4; Gaz. Pai. 1986.1.76).
sobre a evolução da intervenção estatal (v. J. L. Autin,
Ed. Síntese, Porto Alegre, 1979. ciação mais complexa, .J. Wroblewski. Le languages juri- 27 G. Cornn. Les définitions dans la loi, in Mélanges
Du Juge administratif aux autorités admínistratives indé-
3 A análise aqui proposta foi desenvolvida para os diques: une f'ypologie, Droit et société, n 2 8, 1988, p. 13. dédiés à Jean Vince]u, Dalloz, 1981, p. 77 (que toma a
pendentes: un autre mode de régulation, Rev. dr. Publ.
propósitos de uma tese de doutorado defendida em 17 C. Grzegorezysk. Le rôle du performat{f dans /e langage
1988. 1213 e as referências). definição por "uma norma jurídica, um enunciado de
1975. Foi precisada, aprovada perante o CERCRID, à riu droit. Arc/J. pbilo. droit, t. XIX, Sirey, 1974, p. 229, e direito positivo", mas opera uma convincente distinção
10 Encontram-se distinções, não concordantes, por
luz das investigações sobre a parte do direito na reso- L 'impact de tbéorie des actes de langage dans /e monde entre definição real e definição terminológica, que de-
lução dos conflitos e no âmbito de um ensino douto· exemplo, em L. Duguit, H. Motulsky ou F. Luchaire ·-
.furidique: essai de bilan, in Tbéorie des actes de langage, mandaria aqui um desenvolvimento mais detalhado).
r ai. Comp. Dictionnaire... , cit., verb. Régles. par J. Wroblews-
étbique et droit . PUF, 1986, p. 165. 28 J.B. Auby. Prescription juridique et production ju-
ki, e verb. Norme, par M. Troper e O. Loschak.
4 V. Contro'l!erses autour de l'ontologie riu droit, PUF, 1989
18 Para uma crítica radical da distinção das regras ridique, Rw. dr. publ. 1988.673. É surpreendente que,
11 P. Mayer. La distinction entre régles et décísions et /e
(sinal dos tempos, esta compilação não reserva ne- normativas e das regras constitutivas, v. P. Amselek. partindo de uma concepção muito austiniana da nor-
nhum espaço ao enfoque materialista do direito), e droit · international prh,é, Dalloz, 1973; G. de Geouffre
P/Jilosop!Jie du droit et tbéoríe des actes de langage, in ma jurídica, o autor não descubra mais "normas não-
Définir /e droit/1, Droits, 10/1989. de la Pradelle, Essai d'introduction au droit français-I.
T/Jéorie des actes de langage, étbique et droit. cit. p. 109 ·prescritivas".
Ed. Erasme, 1990, n 2 37 (que distingue "princípios",
5Mac Cormick, La texture ouz1erte des textes .furidiques, ín (especialmente, pp. 143 e ss) ·Contra: C. Grzegorezyk, 29 C. Atias. Normatif et non normatif dans la législa-
"regras" e "decisões" no seio de um gênero "normas").
Contrm.JerJes ... , cit., p. 115. L'impact de la t/Jéorie deJ actes de langage ... , pp. 192-193.
Acolhendo uma conceituação ilustrada por Kelsen, J. tion récente de droit privé. Droit prospectif 1982-2. p.
6 J. Carbonnier, Sur /e caractére primítífde la régie de droit, F. Perrin distingue as normas gerais, ou regras, e as 19 S. Stromholm e H. H. Vogel, Le realisme scandinaz,e 219; A. Viandier, La crise de la téchinique législative,
in Flexible droit, 5.! ed., LGD.J 1983.87, L.Rancent. Pour normas individuais, tais como as ordens ou injunções dam la pbilosopbie riu droit, LGDJ, 1975, n 2 s 97 e ss. Droits, n 2 4, 1986, p. 75; J. B. Auby, cit.

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de obrigações. Ocorre que ela corresponde a uma dife- Código Civil segundo o qual "os cônjuges se devem
30 A. Jeammud. Consécration de droit nouveaux posi- nistrativos ou privados (mas não regras de valor legis-
rença plausível entre dispositivos em que os autores mutuamente fidelidade, segurança e assistência"). Valeria
tif. Sens et objet d'une interrogation, in Consécration et lativo), interpretar outras regras, etc.
entendem absolutamente respeitados pela prática (ex: a pena pesquisar sistematicamente em que medida essa
usage de droits nou11eaux, CERCRID, Université de
44 V. E. B. Pasukanis. La t/Jéorie générale du droit et !e as regras do código de trânsito ou as relativas à segu- distinção se manifesta no seio de corpos de regras repu-
Saint-étienne, 1987, pp. 9 e ss. • Sobre normas progra-
marxisme, Ed i, 1970, pp. 83; A. Kojeve, Esquisse d'une rança no trabalho)· eles perseguem uma normalização tadas de ordem pública (ex: na legislação do trabalho,
máticas: Les formulations d'objectifs dans les textes
phénoménologie du droit. Gallimard, 1981, pp. e ss.: J. das ações • e aqueles que introduzem faculdades, ou inclusive nos seus setores de passo mais "regulamentaris-
législatifs, Droit prospectif 1989-4; Eros Roberto Grau,
Carbonnier. Sociologie juridiqlie, Thémis, PUF, 1978, pp. mesmo "imperativos", têm sobretudo por sentido prático ta"). Mas a significação de modelos de referência é, bem
Direito, Conceitos e Normas Jurídicas. São Paulo, Ed.
193 e ss. (e a referência à H. Kantorowicz): N. Rouland. apreciar ex post as situações ou as ações (ex: o art. 212 do entendido, comum a todos os enunciados em causa.
RT. 1988, pp. 131/153.
Antbropologie juridique. PUF, 1988, nos 40 e ss. - V.
31 Motulsky, du Pasquier, J. Dabin, P. Pescatore, R. igualmente, F. Ost e M. van de Kerchove. "Jurisdictio
Lukic, na teoria de língua francesa. Mas também MM. et définition du droit." Droits, 10/1989, p. 53.
A. Decocq, M. Puech, P. Mayer, e por último]. Héron 45 O que permitiria apreender no campo as formas do
(Étude structurale de I'application de la loi dans !e "direito carismático".
temps, RTD civ. 1985.277).
46 Notadamente, D. Loschak, Le droit discours de
32 Art. 1382 do CC francês: Tout fait quelconque de pouvoir, in Itinéraires, Études en l'bonneur de Léo Hamon.
l'homme qui cause à autrui un dommage, oblige ce/ui par Economica, 1982, p. 429; CU RAPP. Le droit en procés,
la faute duque/ ii est arri11é, à !e réparer. PUF, 1983 (esp. os estudos de J. Chevalier e D. Los-
33 H. L. A. Hart. citado, pp. 155 e ss. Mac Cormick, chak); G. Rocher, Droit, pouvoir et domination. Socio-
cit. (que distingue utilmente "texto de regra" e "conteú- logie et sociétés (Montreal), vol. XVIII, nº 1/1986, p. 33.
do de regra"). 47 A. Jeammaud. "Critique du droit" en Francia: de la
34 V. CERCRID. Pour une réflexion sur les mutations búsqueda de una teoria materialista dei derecho ai estu-
des formes du droit, Procés 9/1982, p. 5; Les standards dio critico de la regulación jurídica. Analu de la Catedra
dans les divers systemes juridiques, Droit Prospectif Francisco Suarez (Grenade), nº 25/1985, p. 105. • Sobre a
1988-4. importância dessa "ambivalência" do direito moderno na
reflexão de um considerável filósofo contemporâneo. V.
· 35 B. Oppetit. L'hypothése du déclin du droit, Droits,
P. Guibentif, Et Habermas? Le droit dans l'oeuvre de
nº 4, 1986, p. 9. Jurgen Habermas, Droit et societé nºs 11/12, 1989, p. 159.
36 Os contratos modernos, sobretudo quando são mo- 48 J. Chevallier. Droit, ordre, institution, Droits,
delados por contratos tipos ou remetem a condições 10/1989, p. 19.
gerais, dão sem dúvida origem a normas individuais
que se acrescentam às obrigações contratadas pelas par- 49 Assim as regras de nossos sistemas jurídicos não
tes ou as "equipam", fixando as modalidades de sua provêm exclusivamente do mundo ético.
execução ou as conseqüências de sua inexecução. 50 Não vemos que esse fenômeno estabeleceria a "fal-
37 Tbéorie pure du droit, trad. Ch. Eisenmann, Dalloz, sidade sociológica" da regra correntemente designada
1962. esp. pp. 318 e ss. pelo adágio Nemo censetur legun ignorare. Com efeito, o
teor dessa norma é na realidade que a ignorância das
38 P. Amselek, Norme et foi, Arch. ph. droit, t. 25, Sirey, regras jurídicas não poderia eximir das conseqüências
1980, p. 89, e L'évolution générale de techinique juri- da sua aplicação.
dique dans les sociétés occidentales, Rev. dr. publ.
51 Cf., toda uma frente de pesquisas francesas destes
1982.275 (espec., pp. 285 e ss.).
últimos anos, cuios principais animadores são P. Las-
39 V. em particular G. Farjat, Réflexions sur les codes coumes e E. Serverin.
de conduite privés, e P. Sanders, Codes of conduct and
Reportar-se-á ultimamente a um recente artigo desses
sources cif la1u, in Le droit des relations économiques inter-
pesquisadores: Le droit comme activité sociale. Pour
nacionales. Études offirtes à B. Goldman, Litec, 1982, pp.
une approche webérienne des activites. Droit et société,
47 e 281: M. Bettati, Réflexions sur la portée du code
nº 9. 1988, p. 165.
international de conduite pour !e transfert de techno-
logie: éloge de l'ambiguité, in Étude offertes à ... Col- 52 CURAPP. Les usages sociaux du droit. PUF, 1989.
liard, Pedone, 1984, p. 83 e as referências. 53 J. D. Reynaud, cit.
40 H. L. A. Hart. Le concept de droit, citado, pp. 51 e ss. 54 Certas distinções que se vinculam ao fato de que a
41 La sanction ou l'inconnue du droit, D. 1986. conformação efetiva das coisas às normas parece mais
Chron. 197. ou menos intensamente pesquisada ou esperada, po-
dem então fornecer um excelente quadro de interpre-
42 E. Serverin, P. Lascoumes e Th. Lambert. Transac-
tação. Assim, A. Supiot opôs "regras de direito" e "re-
tions et pratiques tramactionnelles, 1987, pp. 6 e ss.
gras de normalização" (Delégalisation, normalisation
43Se a contrariedade de uma lei à Constituição não et droit du travai!. Dr. soe. 1984.296, esp. pp. 301 e ss)
pode hoje ser "sancionada" senão em escassa medida para apoiar uma leitura (um pouco sombria) da evolu-
(dado o regime de acesso à jurisdição constitucional), ção legislativa do direito do trabalho. Uma tal oposi-
as normas da Constituição e de seu Preâmbulo têm ção nos parece discutível, em particular pela escolha de
vocação a serem manipuladas pelas outras jurisdições, negar pertinência ao "verdadeiro direito" de preceitos
administrativas ou judiciárias, para avaliar atos admi- inscritos nas leis e que engendram uma malha cerrada

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