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Na trilha
do Paraíba
do Sul
Quem conhece bem o rio sabe que ainda
é possível salvá-lo, apesar de todas as
agressões que o transformaram em um
grande depósito de esgoto e ameaçam a
sobrevivência de 15 milhões de pessoas
nes t e n ú m e r o
REVISTA DA ALERJ
Ano I - Número 01 - Dezembro de 2007
Na trilha 6 INCLUSÃO
do Paraíba Prática de esportes evita
do Sul que jovens sigam o caminho
Quem conhece bem o rio sabe que ainda
é possível salvá-lo, apesar de todas as
agressões que o transformaram em um da criminalidade
grande depósito de esgoto e ameaçam a
sobrevivência de 15 milhões de pessoas
10 ENTREVISTA
O milionário português Joe
Berardo investe em arte e
jardins no Rio de Janeiro
Na trilha do
Paraíba do Sul
REVISTA DA ALERJ
“ Espero ver nas páginas da RA a nossa
Baixada Fluminense, região estigmatizada
pela violência e pela pobreza
” Lindberg Farias
Assembléia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro C ARTAS
Presidente
Jorge Picciani
1ª Vice-presidente Nova Iguaçu Comando Militar
Coronel Jairo
2º Vice-presidente
A Alerj está de parabéns em Parabenizo a louvável iniciati-
Gilberto Palmares lançar mais um instrumento de va da Alerj que, respaldada pela
3º Vice-presidente
Pedro Fernandes Neto comunicação direta com a socie- competência do seu Departamento
4º Vice-presidente dade. Já há alguns anos acompa- de Comunicação Social, fez acon-
Gerson Bergher
1ª Secretária nho o jornal quinzenal produzido tecer o lançamento da REVISTA
Graça Matos
pela Casa e sempre elogio a qua- DA ALERJ. Cabe ressaltar que
2º Secretário
Zito lidade das matérias e da edição, os temas abordados nesta nova
3º Secretário
Dica
que enfocam o trabalho da Alerj publicação revelam a preocupa-
4 a Secretário e de suas comissões. A proposta ção da Assembléia em informar
Fabio Silva
1a Suplente
da revista – de tratar com pro- a população sobre os assuntos
Renata do Posto fundidade assuntos diversos que relevantes ocorridos no campo
2º Suplente
Armando José interessem ao cidadão fluminense militar, social, psicossocial, polí-
3º Suplente – será com certeza também uma tico e econômico. É uma verdade,
Pedro Augusto
4º Suplente rica fonte de inspiração para os que não pode ser desprezada, o
Edino Fonseca
próprios parlamentares. Espero fato de que a cultura é o elemento
muito ver nas páginas da RA determinante da ci-
a nossa Baixada Fluminense, dadania, é o que
REVISTA da Alerj
região estigmatizada pela vio- vai determinar
Ano I - Nº 1
Dezembro de 2007
lência e pela pobreza, mas onde a sobrevivência
Publicação trimestral do
Departamento de Comunicação
existem jóias que a imprensa de um povo. Pe-
Social da Assembléia Legislativa
do Estado do Rio de Janeiro
em geral não enfoca. Parabéns, lo menos, é esta
deputado Jorge Picciani, a conclusão que se
Jornalista responsável
Fernanda Pedrosa por incentivar iniciativas pode chegar quando se
(MT-13511)
Coordenação: Geiza Rocha
assim. Quem ganha é o tem uma sociedade bem
Reportagem: Everton Silvalima, povo do Estado do Rio informada. Saúdo a Alerj pela
Luciana Ferreira e Fernanda Porto
Fotografia: Rafael Wallace
de Janeiro. revista recém-nascida.
Diagramação: SMPG/Daniel Tiriba
Telefones: (21) 2588-1383/1627
Fax: (21) 2588-1404 Lindberg Farias TC Nunes
Rua Primeiro de Março s/nº Prefeito de Assessor parlamentar do Comando Militar
sala 406 CEP-20010-090 –
Rio de Janeiro/RJ Nova Iguaçu do Leste, Rio de Janeiro (RJ)
Email: dcs@alerj.rj.gov.br
www.alerj.rj.gov.br
Impressão: WalPrint
Tiragem: 3 mil exemplares
REVISTA DA ALERJ
Este tem sido o principal foco de nossa divulgação,
tanto no site (www.alerj.rj.gov.br), por meio de dados
e notícias, como através da publicidade, que sempre
é voltada para a prestação de serviços.
Ao apresentar nosso mais novo meio de comunica-
E ditorial Jorge Picciani
ção – a REVISTA DA ALERJ – estamos assumindo o
compromisso de aprofundar assuntos que influenciam
direta ou indiretamente o trabalho legislativo, e de dar
voz a especialistas e à população no debate de temas
N
to ao meio ambiente, ao
abordar a vida das
comunidades que
os últimos cinco anos, vivem às margens
a Assembléia do Rio Paraíba do
Legisla- Sul, busque respei-
tiva do tar estes princípios
E s t ado e divulgar sua im-
do Rio de Janeiro não tem portância para nossas
medido esforços para aprimo- futuras gerações. Por is-
rar os seus meios de intera- so mesmo, optamos pelo
ção com a sociedade. Seja uso do papel certificado,
através do relacionamento Fabiano Veneza garantia de que a atividade
com a imprensa e com o madeireira que deu origem a
cidadão, que pode con- ele ocorre de maneira legal e não acarreta
tar com nossas centrais a destruição de florestas primárias, como
telefônicas 0800, seja in- a Amazônia.
vestindo em publicações Não nos furtamos também a refletir so-
próprias, nosso objeti- bre questões ligadas à atividade da mídia,
vo é um só: a busca como na matéria em que colocamos em
da transparência. debate o uso indiscriminado dos grampos
Procuramos mos- e a privacidade do cidadão. Outro tema
trar o que a Alerj de destaque é a importância do esporte
faz e os canais na abertura de novas perspectivas para
de comunicação os nossos jovens.
que existem pa- Vida longa ao nosso mais novo veículo
ra que o cidadão que, espero, contribua para o debate
possa interagir aprofundado dos diversos aspectos que
com os depu- envolvem a vida do cidadão fluminense.
tados e com
as comissões. Ótima leitura!
REVISTA DA ALERJ
Salvos pelo
Rafael Wallace
i nc lus ão
esporte
Celso de Castro Barbosa
D e que o esporte
é capaz de mu-
dar o destino
das pessoas,
ninguém mais duvida no Brasil.
Afinal, a origem humilde da maio-
ria dos nossos heróis, especialmen-
te no futebol, é prova definitiva
de que é possível ir longe, mesmo
pertencendo a uma classe que
historicamente pouco avança no
País. Mas, se o esporte muda a
vida, ninguém mais tem dúvidas
também de que é urgente mudar o
esporte. Mudar a gestão. Reformar
profundamente suas estruturas.
Permitir que um número cada vez
maior de crianças e jovens en-
contre um caminho de realização
pessoal e profissional, ampliando
a visibilidade do talento brasileiro.
Este é o desafio.
Aos 25 anos, o campeão de
taekwondo Diogo Silva, primeiro
dos 54 ouros do Brasil no festejado
Pan Rio 2007, critica a falta de
transparência na administração
de recursos destinados ao esporte
que abraçou ainda menino. Dedicação da mãe, preocupada com a agressividade do filho,
– Os atletas evoluíram muito fez de Diogo Silva campeão de taekwondo
REVISTA DA ALERJ
Marcelo Regua / Agência O Dia
compromisso, mas recusei. Pensei
que aquele era um compromisso
REVISTA DA ALERJ
Paulo Alvadia / Agência O Dia
REVISTA DA ALERJ
Berg Silva/ Agência O Globo
realmente apoiar o esporte, es- – Estamos agindo como Cuba, Telefone: (21) 2588-1308
REVISTA DA ALERJ
“Precisamos
ajudar o povo
culturalmente”
D
e ntre v ista
F ernanda P edrosa
J oe B erardo
e família pobre, ele saiu da Ilha da Madeira em
1962, aos 18 anos de idade, para fazer fortuna
na África do Sul. Enriqueceu aproveitando
Como surgiu sua ligação com os resíduos das minas de ouro abandonadas.
o Brasil? Diversificou os negócios, investiu em diamantes, exploração de
Tenho três irmãos que vieram para petróleo e gás. Hoje, tem participações na Portugal Telecom e
São Paulo há mais de 30 anos. Sou no grupo de investimentos BCP Millenium, além de ser dono
o mais novo da família e sempre da vinícola que produz o famoso vinho Quinta da Bacalhôa.
vim ao Brasil para visitá-los, por- Condecorado pelo Governo português com a Ordem do Infante
tanto, vinha somente a passeio. D. Henrique no grau de comendador, José Manuel Rodrigues
Berardo – ou simplesmente Joe Berardo –, 63 anos, diverte-se
Por que resolveu investir em fazendo negócios e aplicando parte da sua fortuna, estimada em
arte e na preservação da na- 500 milhões de euros, em coleções de arte e na preservação da
tureza no Brasil? natureza. Possui uma das maiores coleções do mundo de obras do
A primeira ligação cultural que eu século XX, transformada este ano no Museu Coleção Berardo de
tive com o Brasil foi em Ouro Pre- Arte Moderna e Contemporânea, em Lisboa. Assim como fez em
to (MG). Sou amante de jardins, Portugal, onde criou jardins exóticos abertos ao público na Ilha
tenho diversos jardins abertos ao da Madeira e na capital, ele quer investir também no Sítio Burle
público, e fui a Minas visitar os Marx, em Guaratiba (RJ), e criar museus de arte popular e
jardins de Bernardo Paz, perto de art-déco no Estado do Rio de Janeiro. Joe Berado deu entrevista à
Belo Horizonte, um dos melhores RA na piscina do Copacabana Palace, horas antes de receber
do mundo. De lá fomos a Ouro a Medalha Tiradentes, principal comenda do estado.
Preto, onde visitei a Igreja de São
Francisco de Assis, do Aleijadi-
nho, e o prefeito (Ângelo Oswal-
do) me disse que os sinos há mui- sil. E eu faço isso por quê? Porque fessor Paulo José Pardal. Por
to tempo não tocavam. Um havia o Brasil, incontestavelmente, foi a que esse interesse?
caído e o outro estava quebrado. terra que melhor recebeu os por- Em uma de minhas viagens ao
Minha mãe, Ana Berardo, era tugueses, desde o tempo do des- Brasil, conheci Romaric Büel
muito católica, ia à missa todos os cobrimento até agora. Acho que é (curador e colecionador de arte)
dias, então mandei consertar os um dever meu, como português, e ele falou-me de uma coleção de
sinos em homenagem a ela. Por- agradecer a esta nação tão fan- carrancas do Rio São Francisco,
tanto, minha mãe está nos sinos tástica, que nos recebeu nas boas uma raridade que ia ser vendida
da igreja do Aleijadinho, uma coi- horas e nas horas de amargura. e dispersada. Essa coleção des-
sa fantástica que eu nunca mais pertou-me atenção porque, na
vou esquecer. Esta foi minha pri- O sr. vai criar o Museu da Car- Europa, as embarcações tinham
meira experiência cultural no Bra- ranca, com a coleção do pro- na frente esculturas de mulheres
10 REVISTA DA ALERJ
“
Se não fizer negócios,
não posso ser mecenas;
uma coisa não é
Fotos Rafael Wallace
REVISTA DA ALERJ 11
“ Hoje, como um
dos maiores
colecionadores de
arte contemporânea
do mundo, ainda estou
sujeito a cometer
enganos. A única
maneira de a pessoa
não se enganar
é não fazer nada
”
arte? Qual foi a primeira obra
de arte que o sr. olhou e quis
ter na sua casa?
Aos 10 anos de idade, comecei a
colecionar selos, caixas de fósfo-
ros e cartões de navios. Por que
colecionar? Para preservar a his-
tória. Às vezes, uma peça sozinha
não tem valor, mas colocada jun-
to a outras faz uma história e fica
mais fácil compreender a evolu-
ção. Fui para a África do Sul com
18 anos, trabalhei muito e, aos
29, casei-me. Antes do casamen-
to, fomos comprar mobília para a
casa e gostei de um quadro que
estava na parede da loja. Chegan-
do à casa, percebi que o quadro buiu muito também para o ainda não foi exposta. Como eles
era uma reprodução. Fiquei dana- seu desenvolvimento espiri- conseguiram levar aquelas escul-
do! Minha mulher, então, alertou- tual. Como foi isso? turas gigantescas para lá, sem
me: “Se quiseres o quadro original Sou fascinado pela arte africana. transportes, sem estradas?
terás que ir ao Louvre”, disse ela. Gostaria de saber como, em re-
O quadro era a Mona Lisa (risos). giões onde não há televisão nem O sr. criou um jardim com
Ainda tenho esse quadro, porque eletricidade, onde não existem plantas e esculturas de várias
foi o princípio. Hoje, como um dos livros nem comunicação com o regiões do mundo, na Ilha da
maiores colecionadores de arte resto do mundo, eles fazem traba- Madeira, e agora está cons-
contemporânea do mundo, ainda lhos fantásticos de cultura? Deve truindo um jardim com budas
estou sujeito a cometer enganos. haver alguma ligação com Deus. gigantes?
A única maneira de a pessoa não Mas, que deus? Ninguém sabe Sim, fica em Óbidos, perto de Lis-
se enganar é não fazer nada. bem a história, mas há no Zim- boa. Quando os talibãs destruí-
bábue ruínas que são considera- ram aqueles budas milenares no
O sr. começou a fazer fortuna das incas. Tenho também uma Afeganistão, tive a idéia de fazer
na África e costuma dizer que grande coleção de esculturas do o Jardim da Paz, afinal, no meio
a civilização africana contri- Mali, com mais de 1.500 anos, que de tanta intolerância, os budas
12 REVISTA DA ALERJ
“ Por que colecionar?
Para preservar a
história. Às vezes,
uma peça sozinha não
tem valor, mas colocada
junto a outras faz
uma história e fica
mais fácil compreender
a evolução
”
entrado em um museu. De junho cios, não posso ser mecenas; uma
a setembro, mais de um milhão coisa não é possível sem a outra.
de pessoas visitaram o museu. É Acho que isso pode servir de
uma marca inédita em Portugal. exemplo para outros homens de
Precisamos ajudar culturalmente o negócios, que deveriam dedicar
povo. Se o mundo quer ajudar as mais dos seus fundos para contri-
populações em dificuldades não buir também para a arte. Se nós
pode deixar de apoiar e expor a quisermos ter um ponto de refe-
cultura. Uma maneira de impedir rência da humanidade, este será
o desenvolvimento da população é sempre relacionado com a arte e
acabar com a cultura, como tentou a cultura. É por isso que a minha
fazer a China. A China está agora coleção é relacionada com o sécu-
a desenvolver e a comprar em todo lo XX. Temos 113 movimentos re-
o mundo o passado da sua cultura presentados. Muitos museus têm
– e numa velocidade fenomenal. vários Picassos, vários Mondrians,
Felizmente aqui no Brasil vemos mas não têm uma coleção como a
um esforço dos políticos de dar minha, que foi programada desde
representam a paz. Temos budas prioridade também à cultura. o primeiro dia com a intenção de
gigantes, de até 21 metros de al- deixar uma representação do que
tura, outros de cinco metros, to- O sr. gosta de política? Pode- aconteceu no século XX.
dos trazidos da China. ria vir a se candidatar a al-
gum cargo eletivo? O sr. costuma dizer que não
Quando inaugurou o Museu Não. Na verdade, nunca tinha pensa em se aposentar, só
Berardo, em Lisboa, o sr. disse votado na minha vida, só recen- quando morrer, “se morrer”.
que daria ingressos gratuitos temente, para eleger o presidente É verdade. A única maneira de con-
para funcionários públicos e da Madeira. Em Portugal o voto tinuar a trabalhar pela cultura é con-
sócios de clubes da primeira não é obrigatório. tinuar a trabalhar também nos ne-
divisão. Por que escolheu es- gócios. Num jantar na casa da dona
ses dois segmentos? O sr. prefere ser conhecido Lily Marinho, notei que ela mantém
Comecei inicialmente com essa como empresário bem-suce- tudo exatamente como se Roberto
idéia, mas depois decidi abrir dido, um sef-made man, ou fosse chegar a qualquer momen-
gratuitamente. Foi fantástico ver como mecenas das artes? to. Então, o que é morrer? Não sei
a visitação de estudantes, de fa- Acho que não posso fugir de ne- bem... Morrer é para aqueles que
mílias inteiras que nunca tinham nhum dos dois. Se não fizer negó- não fazem nada pela cultura.
REVISTA DA ALERJ 13
paraíba do sul T exto Romildo Guerrante
Fotos R afael Wallace
Um rio
muitas histórias
14 REVISTA DA ALERJ
– principalmente a piabanha e o dourado, espécies em biólogos, engenheiros sanitaristas, pescadores. Desde
extinção – e sobrevivem apenas algumas espécies de que haja vontade dos governos de controlar principal-
quase nenhum valor comercial, como o mandi. mente o esgoto doméstico, responsável por 90% da
Sem peixes, estão sumindo também os pesca- carga poluente despejada sem tratamento em milhares
dores. Grandes espécimes, só quando o rio se apro- de pontos ao longo do seu curso. Cerca de um bilhão
xima da foz, depois de uma seqüência saudável de de litros de esgoto são lançados diariamente na bacia
encachoeiramentos, responsáveis por intensa oxige- do Paraíba do Sul, mas o tratamento é feito em apenas
nação de suas águas. A degradação consentida está 10% dos 180 municípios. A cobrança pelo uso de suas
bebendo lentamente as águas do Paraíba, que ainda águas, promessa de recursos para redimi-lo, começou
assim permite a vida de 15 milhões de pessoas em há quatro anos, depois de discutida durante 40. O to-
três estados, e abastece o País com energia elétrica tal arrecadado até 2006, acrescido de contrapartidas
extraída de represamentos que roubam sua saúde, dos projetos e injeção de recursos federais, alcança
criam barreiras instransponíveis para os peixes de aproximadamente R$ 68 milhões, segundo dados da
piracema, facilitam o acúmulo de sedimentos e a Agência Nacional de Águas (ANA). Estima-se que
proliferação de algas danosas. seja necessário investir R$ 3 bilhões para vencer os
Mas o rio tem salvação, concordam ambientalistas, problemas somados em quatro séculos.
REVISTA DA ALERJ 15
Esgoto, apenas 8% de seus esgotos, mas
está construindo, com recursos da
vilão
tratado para 58%.
Enquanto no Estado de São
Paulo a média de esgoto tratado
antes do lançamento está em
Pindamonhangaba, na região 40%, no Estado do Rio de Janeiro
central do Vale do Paraíba paulis- tratamento é quase igual a zero.
ta, tem 140 mil habitantes, trata O que salva as águas do Paraíba,
100% de seu esgoto. Quarenta O engenheiro sanitarista alerta o ambientalista Guilher-
quilômetros abaixo, Aparecida do Nathan Neves estuda o me de Souza, da ONG Projeto
Norte (SP), meca de peregrinos, 36 Paraíba há mais de 30 anos Piabanha, de Itaocara (Noroeste
mil habitantes (aos quais se so- fluminense), é a longa seqüência
mam 170 mil nos fins de semana), de corredeiras e encachoeira-
não trata um só litro de esgoto. E engenheiro sanitarista Nathan Ba- mentos, responsáveis por intensa
o que é pior, o lançamento se faz rile Neves, diretor do Laboratório oxigenação da água, além da bai-
numa imensa boca fétida 20 me- Ambiental de Resende, que estuda xa densidade populacional, que
tros acima do ponto de captação o Paraíba há mais de 30 anos. – No limita o volume de esgoto. O que
da água que se bebe na cidade. geral – diz ele – as cidades servidas não salva o trecho do Paraíba que
– Mas a água é boa – garante, pela Sabesp (a companhia estadu- cruza Cambuci, 20 quilômetros
reservadamente, um engenheiro al paulista de saneamento, caso abaixo, onde o esgoto do hospital
do serviço municipal de água e de Pindamonhangaba) chegam da cidade é despejado um pouco
esgoto, que admite custos eleva- a tratar até 80% do esgoto. Mas antes do ponto de captação da
dos no tratamento químico para os serviços municipais, que têm água que bebe a população de
permitir transformar em potável menos recursos, tratam em torno 15 mil habitantes.
a água cheia de dejetos que sobe de 5%. Há bons exemplos de mu- – É o esgoto que está ma-
para a estação de tratamento. dança, como o de Resende, região tando o rio – diz Joaci Ferreira
O rio ali está tão assoreado do Médio Paraíba, que hoje trata Gonçalves, 50 anos, presidente da
que, por ocasião das festas da
cidade, em outubro, os organiza-
dores têm de pedir à Cesp que
abra as comportas da represa de
Paraibuna para elevar o nível das
águas e permitir a passagem da
procissão dos pescadores.
Existem projetos para a cons-
trução de quatro estações de
tratamento de esgoto, a um custo Em Aparecida, onde não existe
de R$ 8 milhões. Por enquanto, a tratamento de esgoto, João
agência que administra a Bacia do Fernandes levou duas horas no meio
Paraíba (Agevap) adiantou cerca da capituva para conseguir três
de R$ 200 mil. lambaris de duas polegadas
– Dá no máximo para comprar
o terreno e fazer o projeto – diz o
16 REVISTA DA ALERJ
Por desinformação
ou má-fé, muitos
pescadores com
suas gaiolas foram
vistos ao longo do rio
pescando lagostas.
Não há fiscalização
REVISTA DA ALERJ 17
Na divisa dos
municípios
de Silveiras e
Areias (SP), no
alto da Serra
da Bocaina, o
fio d`água que
dá origem ao
Paraíba
Exploração de eucalipto
em Silveiras (SP), a 40
quilômetros da nascente,
dentro de área protegida
pelo Ibama
MG
Resende
Barra Mansa
Areias
Silveiras
Aparecida
Potim ga
i t in
P ara
R io
Pindamonhagaba
SP
tratado antes de
ser lançado nas
águas do Paraíba
18 REVISTA DA ALERJ
Pelas águas do Paraíba não circulam
apenas embarcações, mas também móveis
descartados que seguem rumo ao mar
Boca de lançamento de
vinhoto in natura nas
imediações de Campos
ES
Cambuci
São Fidélis Atafona
São João
da Barra
Itaocara
Campos dos
Goytacazes
Além Paraíba
Moura Brasil Sapucaia
Três Rios
Paraíba do Sul
Vassouras
RJ
REVISTA DA ALERJ 19
Toninho, o pecuarista Alziro Ramos:
que virou guia pescadores são
da nascente fiscais do Paraíba
A pele é vermelha, torrada pelo sol a que se ex- Dos mais de 300 piraquaras que viviam na co-
põe permanentemente no campo, sua paixão. Aos munidade de Beira-Rio, em São José dos Campos,
53 anos, Antonio Paulo de Paiva, o Toninho, leva hoje restam pouco mais de 20. O fim da piabanha,
uma vida que é o sonho de muita gente cansada do dourado, da traíra e do lambari, de 20 anos
da agitação das grandes cidades. Há 10 anos, esse para cá, está condenando o grupamento à morte.
pecuarista, fluminense de Quatis, mudou-se para Hoje só restam uns poucos mandis, sem nenhum
Silveiras (SP), acompanhando a mulher, a médica interesse comercial.
pediatra Vilma. – A poluição matou tudo. Botaram alguma quí-
Com os filhos já crescidos e morando na cidade mica – suspeita Alziro Ramos, 75 anos, 14 filhos e 62
grande, arrendou uma fazenda e retomou o trabalho netos, pescador desde criança. – Não tem fiscalização
na pecuária de leite. A coisa não deu muito certo e, aqui, quem corre o Paraíba é nós, e nós não vemos
pouco tempo depois, resolveu criar cavalos mestiços. ninguém do governo por aqui – diz o velho pesca-
Fascinado com a beleza da região onde nasce o Rio dor à sombra de um exótico pessegueiro japonês,
Paraíba, Toninho começou a guiar turistas interes- nos fundos da casinha paupérrima em que vive às
sados em conhecer a nascente do Paraíba e as trilhas custas de pensão do INSS. Uma horta comunitária
dos tropeiros que por ali passaram no século XVII, ajuda os remanescentes a sobreviver. A escola de
em busca do ouro, em direção a Minas Gerais. ensino fundamental funciona ao lado, montada sob
– O número de turistas foi aumentando, principal- um galpão de lona. Um pouco acima da colônia,
mente durante uma festa tradicional de comemoração uma sucessão de obras de condomínios de luxo
tropeira, realizada na cidade em agosto, quando o devasta a vegetação ciliar e desmonta com dragas
Casarão Tropeiro, antiga pousada dos viajantes do as margens do rio.
século XVIII, recebe centenas de visitantes atraí- A colônia tinha 1.200 pescadores em 1951; hoje
dos pela culinária rústica criada pelos homens que eles não passam de 300. Os pescadores culpam as
acompanhavam as mulas com suas cangalhas e jacás empresas de extração de areia, “todas legalizadas”,
através da Serra do Mar – conta ele. pelos maiores danos ao rio. Os sobreviventes da pesca
A festa atrai cada vez mais gente e tem intensa pro- estão se mantendo com os quatro salários que recebem
gramação, inclusive uma corrida de mulas, homenagem do Governo federal durante o período da desova, de
aos animais que permitiram ao homem ocupar a região. novembro a fevereiro. E a pesca, uma tradição que
É a corrida ForMula, que Toninho nunca perde. passava de pai para filho, deixou de ser atraente.
20 REVISTA DA ALERJ
Nino dá adeus ao Biólogo: hidrelétricas
arquipélago que dividem o rio em
vai submergir compartimentos
Nino tem 36 anos, pesca desde criança, nasceu e O biólogo Guilherme de Souza é presidente da
vive num paraíso, a Ilha Capixete, em frente à cidade mais importante das ONGs que atuam em defesa do
de Itaocara. Ninguém o conhece pelo nome, Winer Rio Paraíba do Sul, o Projeto Piabanha. Desde 1991, ele
Vieira Alves, mas é um faz-tudo que vem há anos está à frente do maior programa de repeixamento do
montando uma estrutura modesta de turismo na ilha, rio, em parceria com a Pesagro, a empresa estadual de
aonde chega através de um canal de 50 metros de pesquisas agrícolas. É um dos muitos conhecedores
largura pilotando o barco que construiu. que atribuem às hidrelétricas (cinco em operação,
A felicidade de Nino está perto do fim, porque duas em projeto, uma em obra) a responsabilidade
bem ali todo o arquipélago vai ser engolfado pelas pela redução das espécies de peixes.
águas represadas da usina Barra do Pombo. A con- – O represamento está transformando o Paraíba em
cessão da licença ambiental espalhou o desânimo uma seqüência de grandes tanques, em vários comparti-
entre os pescadores da área mais rica em vegetação mentos que isolam a comunicação da fauna e impedem
e fauna aquática de todo o rio. a troca de material genético – garante Guilherme.
– Uma coisa está ligada à outra. Aqui tem peixe Ele diz que a eutrofização, processo de multiplicação
porque tem corredeira nas cabeceiras e tem muita de microorganismos nos lagos das barragens, alimenta
vegetação. O peixe se alimenta dos sedimentos que as algas nocivas, especialmente a capituva, que está
essa vegetação deposita no rio – explica Nino, que tomando o trecho médio superior do rio. Guilherme teme
retira semanalmente do rio entre 80 e 100 quilos de também o que considera uma ameaça ainda maior, que
dourados, carpas, bagres e cascudos. estaria nos dois projetos de hidrelétricas logo abaixo
Enquanto conversa, Nino aguarda a chegada de Itaocara, na barra do Rio Pomba e em Cambuci,
de outros colegas que saíram de madrugada para 20 quilômetros abaixo. O primeiro irá inundar o maior
recolher as redes. Daí a pouco chegam Sidnei Paulo conjunto de ilhas da bacia, de exuberante vegetação,
de Souza e Ronaldo Ribeiro Monteiro, ambos de o chamado Ninhal das Garças, berçário de aves e local
29 anos, com o barco carregado de cascudos e um de grande piscosidade. E nem mesmo a garantia de
solitário exemplar de dourado de cinco quilos, hoje que serão feitas escadas para os peixes de piracema
o peixe mais nobre do Paraíba. Nino não consegue tranqüiliza o presidente do Projeto Piabanha.
entender por que a prefeitura apóia a construção – Aqui perto mesmo, em Além Paraíba, só
da hidrelétrica, já que a pesca e o turismo podem as espécies exóticas conseguem subir a escada
render muito mais, garante. – afirma Guilherme.
REVISTA DA ALERJ 21
Na beira do
rio, a educação
ambiental
Em São Fidélis, bem na beira do Paraíba e em frente Alunos de escolas públicas aprendem
à monumental Serra do Sapateiro, funciona há pouco ecologia ao vivo com pássaros e peixes
mais de três anos o Centro Conservacionista da Flora e
da Fauna. É um imenso viveiro de aves e peixes que foi possíveis dessas gargantas silvestres. Por entre os
transformado, gradativamente, em centro educacional pássaros circulam os estudantes, guiados pelos mo-
ambientalista. Ali se reúnem toda semana alunos de nitores, que explicam como vivem aqueles pássaros
escolas públicas de Campos e Quissamã, que recebem apreendidos pelo Ibama, e que serão devolvidos à
aulas de ambientalistas de formação variada – biólogos, liberdade depois de recuperados.
engenheiros e até mesmo velhos pescadores – inclusive – Vocês estão vendo esses pássaros presos, mas
sobre preservação do Rio Paraíba. eles estão presos provisoriamente, porque foram
Em grandes tanques, vivem espécies nativas apreendidos pelo Ibama e estavam em más condi-
e exóticas de peixes do Paraíba e da Amazônia. ções – explica o monitor.
Numa área de 120 mil metros quadrados, uma parte Depois de passarem toda a manhã estudando
é reservada para uma imensa gaiola de tela, onde as coisas da natureza, almoçam afobadamente e
mais de dois mil pássaros de 40 espécies diferentes correm para o que consideram o melhor momento
promovem uma verdadeira algaravia de todos os sons do dia: o banho de piscina.
para recuperar
te acima de um determinado padrão, pagam sete
vezes mais. A idéia é estimular o usuário a instalar
a bacia
sistemas próprios de tratamento de água, o que já
vem sendo constatado pela Associação Pró-Gestão
das Águas da Bacia do Paraíba do Sul – Agevap,
um organismo multiparticipativo, com sede em
A cobrança pelo uso da água na Bacia do Para- Resende, responsável pelo repasse dos recursos e
íba do Sul, instituída por lei em 1997 e feita desde acompanhamento da execução dos projetos.
2003 pela Agência Nacional de Águas (ANA), é Foi constituída em 2002 com o objetivo de de-
considerada pelo Governo federal o grande instru- sempenhar as funções de agência de água da bacia
mento para deter o avanço da degradação, e até do Paraíba. Por falta de uma experiência brasileira
mesmo reverter o estado atual dentro de alguns no assunto, só dois anos depois foi possível torná-la
anos. A recuperação da Bacia do Paraíba é esti- operacional, assumindo as funções de gerenciadora
mada em R$ 3 bilhões. dos recursos decorrentes da cobrança da água pela
Cobra-se dos grandes usuários de água pelo Agência Nacional de Águas, os quais são aplicados
volume de captação (R$ 0,01 por metro cúbico) e de acordo com os projetos aprovados pelo Comitê
22 REVISTA DA ALERJ
A maquete
que ensina
a preservar
À medida que as placas vão sendo retiradas,
vai aparecendo o impacto no meio ambiente da
presença do homem nesse rico ecossistema, desde
a busca do ouro, no século XVII, à introdução do
café, no século seguinte, seguida da pecuária e
chegando à industrialização nos séculos XIX e
XX. Mais de 40 unidades da "Maquete ambiental
do Vale do Paraíba e Litoral Norte: 500 anos de Ana Celina Tibúrcio, monitora ambiental da
transformações" já foram distribuídas nas escolas ONG Vale Verde, de São José dos Campos
pela ONG Vale Verde, de São José dos Campos (SP),
que atua há 19 anos, ao lado de quase 40 entidades, outras entidades. A monitora ambiental Ana Ce-
na área ambientalista do Vale do Paraíba. lina Tibúrcio é uma das encarregadas de formar
O projeto nasceu de uma idéia do então pre- multiplicadores no uso da maquete.
sidente da ONG, o biomédico André Miragaia, – Não temos hoje mais que 3% da cobertura
hoje secretário de Meio Ambiente de São José vegetal que tínhamos no início do século XVII
dos Campos, e teve apoio da Petrobras, além de – lamenta Ana Celina.
REVISTA DA ALERJ 23
Ensaio T exto e Fotos Rony M altz
Cenário entre o
mágico e o sombrio
Na foz do rio Paraíba do Sul, Atafona sofre os efeitos da
erosão, é engolida pelo mar e hoje exibe ruínas onde
há 30 anos havia mansões e uma bela cidade de veraneio
24 REVISTA DA ALERJ
No fim da década de 40 um periódico campista documentou o
avanço do mar sobre a Ilha da Convivência, a maior do delta, hoje
praticamente deserta. Era o primeiro registro moderno de um
processo de erosão que remonta ao período Holoceno, oito mil anos
atrás. Com o aquecimento global na ordem do dia e o Homem no
banco dos réus, Atafona vive um melancólico anticlímax global:
sofre de mal natural. E crônico: períodos de erosão similares ao que
o litoral passa hoje já ocorreram pelo menos oito vezes no passado
geológico da região. O vento Nordeste é o grande vilão dessa
história, desbastando a linha de costa e incitando as marés contra o
continente. Inexaurível, cada vez mais intenso, moldou o litoral feito
água mole em pedra dura e batizou em tupi-guarani uma cidade aos
poucos varrida pelo seu sopro: Atafona, “moinho de ventos”.
REVISTA DA ALERJ 25
Há seis meses Seu Antônio levou mulher, filha e três
netos para ocupar uma carcaça abandonada cujas
poucas paredes – outrora adornadas com quadros caros
e cabeças de peixe-espada – se encarregava de caiar
de branco. Nasceu na Paraíba, há 58 anos, e morou no
Ceará, São Paulo Brasília e Rio de Janeiro. Escolheu
Atafona pela tranquilidade: “Aqui nós vive mais”.
Ao contrário
da erosão, que
abasta a faixa de
terra, o fenômeno
de progradação
provoca um
acúmulo de
sedimentos na
praia, alargando
a área de
continente. Foi
esse fenômeno
que, na década
de 70, durante
uma trégua
do Oceano
Atlântico,
motivou o boom
imobiliário à
beira-mar.
As construções
não durariam
20 anos.
26 REVISTA DA ALERJ
Hermano Taruma
o pini ão
A dauto Novaes
Mutações
novas configurações
do mundo
D
urante quase dois meses, pensadores humano – ou melhor, do trans ou pós-humano.
nacionais e estrangeiros de diversas Pois é isso que noticiam os cientistas quando
áreas – cientistas, filósofos, soció- falam, por exemplo, de nanotecnologia e manipulação
logos, crítico de arte, psicanalistas genética, forças que nem o capital controla; quando
– percorreram cinco estados do País anunciam canyons de bilionésimos de milímetro
para discutir um tema pouco estudado: as mutações. feitos com partículas de cobre, ou desenham de-
Todos partiram de uma hipótese geral: o Ocidente terminado logotipo de determinada multinacional
vive hoje não propriamente uma crise das instituições com 57 partículas de zenônio sobre fundo niquelado,
políticas, culturais, das normas morais e éticas, da apontando, em associação com a informática, para
sensibilidade e das mentalidades, mas uma grande mecanismos invisíveis que servirão tanto para extir-
mutação, fruto de dois fenômenos incontornáveis, a par um câncer como para gerar um – ou para vigiar
globalização e a revolução tecnocientífica. e punir. Na mesma linha, o, até há pouco, sagrado
Entendamos a mutação como uma revolução, não corpo humano não será somente mais uma vítima da
do tipo das revoluções históricas que a precederam, evolução; será também objeto de design (claro que
mas uma verdadeira revolução antropológica. O ciclo para poucos) – e isso, não só no momento do defeito,
de conferências Mutações – novas configurações do como desde antes de sua concepção. Altura? Olhos
mundo retomou outra questão: estaríamos vivendo o azuis? Grau de inteligência? Há quem preveja luta
fim de uma idéia de civilização, diante de um novo de espécies no lugar da luta de classes.
mundo de reprodução automática? Antes de tudo, que Enfim, tudo faz pensar na história do criador que
fenômeno é esse que exige de uma palavra um novo foi destruído pela criatura; no caso, a tecnologia.
sentido? Mutação é também a morte dos mitos, das Acontece que não se trata de acreditar em um mal
fábulas, das abstrações, das crenças, dos monstros, inerente à tecnologia. Não só porque somos eternos
das metafísicas, dos devaneios, provocada pelo poder beneficiários dela, como também porque a história,
da técnica. É, portanto, o declínio dos valores huma- como escreveu Eça de Queiroz, “é uma velhota que
nos e, conseqüentemente, do fazer político de fato, não se cansa de repetir”: é impossível deter certo tipo
correspondendo ao empobrecimento lingüístico, que de avanço. O mal está na defasagem entre os diversos
é nada mais nada menos do que a possibilidade de aspectos do pensamento. Em outras palavras, a des-
pensar novos horizontes, primeiro passo para mate- coberta do fogo trouxe consigo, de imediato, o dilema:
rializá-los, para tornar a história um pouco mais nossa queimar o outro ou aquecer noites frias?
– liberdade. É tudo isso, à medida que as ciências Adauto Novaes é jornalista, filósofo e curador do ciclo de
avançam a ponto de anunciar o nascimento de outro conferências Mutações – novas configurações do mundo .
REVISTA DA ALERJ 27
tendên cia G eiza Rocha
Respeito ao
meio ambiente
REVISTA DA ALERJ é impressa
em papel certificado pelo Forest
Stewardship Council (FSC)
O
que têm em co- servar as florestas nativas ainda teve que provar aos auditores do
mum esta revis- existentes no planeta. Este grupo conselho que pratica o manejo flo-
ta que você está estabeleceu princípios e critérios restal sustentável e foi obrigada
lendo agora, o para orientar o manejo florestal de também a certificar toda a cadeia
livro Intermitên- forma econômica e sustentável, de produção, incluindo os meca-
cias da morte, do prêmio Nobel com práticas ambientalmente nismos de controle das fábricas
de Literatura José Saramago, e o corretas, socialmente justas e eco- sobre a matéria-prima utilizada.
último livro da série Harry Potter? nomicamente viáveis. Ao escolher No caso dos livros, eles têm o selo
A resposta é simples: a preocupa- o papel certificado, a REVISTA impresso, que pode ser conferido
ção com o meio ambiente, refletida DA ALERJ buscou aliar-se a este logo nas primeiras páginas. Mas,
pela escolha do papel, certificado projeto mundial e divulgar a idéia para que a revista editada pela
pelo Forest Stewardship Council de que é simples contribuir para Assembléia Legislativa do Estado
(FSC). “Este selo, que pode ser a preservação do meio ambiente do Rio de Janeiro pudesse receber
dado tanto à floresta quanto à a partir de atitudes socialmente este selo, a gráfica que a imprime
cadeia de produção de um deter- responsáveis. Por possuir o selo, o também teria que ser certificada,
minado produto, atesta que todas papel oferece ao leitor a garantia o que encareceria o processo,
as empresas envolvidas no proces- de que a atividade madeireira já que apenas duas gráficas no
so respeitam o meio ambiente”, que deu origem a ele ocorre de Brasil possuem o selo e nenhu-
explica a secretária executiva do maneira legal, não acarreta a ma delas funciona no estado do
FSC Brasil, Ana Yang. destruição de florestas primárias, Rio. “A preocupação com o meio
Conhecido como Conselho como a Amazônia, e respeita as ambiente tem que vir aliada à
de Manejo Florestal, o FSC foi populações que tradicionalmente responsabilidade com os gastos
fundado em 1993, no Canadá, por vivem nas florestas. públicos. De nada adiantaria
ambientalistas, pesquisadores e Para obter o selo do FSC, a fazer uma revista respeitando
empresários preocupados em con- indústria Suzano Papel e Celulose todos os critérios ambientais, se
28 REVISTA DA ALERJ
Rafael Wallace
Vantagens
socioambientais
da certificação*
l Reduz o impacto ecológico
do aproveitamento florestal
l Conserva a capacidade
de regeneração das florestas
nativas
l Preserva o habitat de
vida silvestre e protege os
recursos hídricos
l Apóia o desenvolvimento
econômico das populações
locais
REVISTA DA ALERJ 29
cultura
Clássicos do
pensamento Política
Johannes A lthusius
sobre a liberdade
Importante teórico do
consentimento, do contrato,
do federalismo e do
corporativismo, o alemão
Althusius (1557-1638)
conciliou idéias bíblicas,
Coleção de livros de filosofia e política, aristotélicas e neocalvinistas
até então inéditos em língua portuguesa, em um original sistema
convida à reflexão e ao debate das político, baseado
em princípios das leis
liberdades individuais e coletivas natural e contratual.
“A política é a arte de
unir os homens en-
tre si para estabele-
Hume, o italiano Benedetto Croce,
o inglês Trevor-Roper ou o suíço
Benjamin Constant — que, além
presente em todos os seus textos.
O alemão Humboldt era apontado
por seus contemporâneos como “o
cer a vida social comum, cultivá-la da clareza com que refletem os maior filósofo da liberdade”, e 200
e conservá-la.” Esta proposição problemas fundamentais de sua anos depois dele o húngaro Polanyi
geral norteia o conteúdo de Polí- época, têm em comum um especial escreveu uma obra cujo ponto de
tica, obra que, publicada em 1603, empenho na defesa da liberdade. partida é a relação entre a ciência
constitui um divisor de águas Jacob Burkhardt, por exemplo, con- e a liberdade.
entre o pensamento medieval siderava a beleza e a liberdade os A edição brasileira da Coleção
e as idéias políticas modernas valores fundamentais da existência Liberty Classics é uma iniciativa do
do Ocidente. Seu autor, Johan- humana, e a tentativa de estabele- Liberty Fund, entidade educativa
nes Althusius, está entre os 20 cer um vínculo entre os dois está de Indianápolis (EUA) que, com o
grandes clássicos do pensamento objetivo de estimular o ideal de uma
ocidental, que jamais haviam sido Instituição educacional sociedade composta de indivíduos
editados em língua portuguesa, livres e responsáveis, coordena e
privada, o Liberty
mas que começaram a chegar ao patrocina diversos projetos mundo
Fund tem por filosofia
mercado brasileiro há quatro anos, afora. Em parceria com a carioca
através da Coleção Liberty Clas- estimular o ideal Topbooks, já editou 13 títulos; ou-
sics, editada pela Topbooks. de uma sociedade tros sete se encontram em produção
São livros de pensadores reno- composta de indivíduos para lançamento em 2008. Veja a
mados — como o escocês David livres e responsáveis seguir o que está nas estantes.
30 REVISTA DA ALERJ
A crise do século XVII – Religião, A perfectibilidade do homem
a Reforma e mudança social John Passmore
Hugh T revor-Roper
Neste livro de 1970, o filósofo e cientista
Professor de história na Universidade de político australiano John Passmore (1914-
Oxford por 23 anos, o inglês Trevor-Roper 2004) realiza um ambicioso balanço das
(1914-2003) analisa, em nove textos produzidos diversas formas de se interpretarem os
entre 1956 e 1967, a Guerra Civil, a Restauração conceitos de perfeição e perfectibilidade,
e a Revolução Gloriosa na Inglaterra. dos antigos gregos aos dias atuais.
REVISTA DA ALERJ 31
Mídia Luciana F erreira
Um freio à invasão
da privacidade
A polêmica dos grampos e
do vazamento de informações
leva o Governo a elaborar
regras mais rígidas para a
interceptação telefônica
E
m setembro deste ano, o diretor da
Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa,
afirmou ser contra o uso de grampos
pela Agência Brasileira de Inteligência
(Abin), mesmo em casos de suspeita
de terrorismo e sabotagem. O uso havia sido defendido
pelo delegado Paulo Lacerda, antecessor de Corrêa
na PF e indicado para dirigir a Abin.
Menos de um mês antes, a revista Veja
havia publicado uma denúncia, que
mais tarde foi provada falsa, sobre um
suposto grampo ilegal nos telefones de
ministros do Supremo Tribunal Fede-
ral. As escutas telefônicas, segundo a
denúncia, teriam sido instaladas pela
Polícia Federal, por conta de disputas
políticas entre os poderes.
Estes foram apenas mais alguns ca-
pítulos na novela dos grampos, que de
tempos em tempos volta aos noticiários
por conta de suspeitas de abuso no uso
de escutas telefônicas e do vazamento
de conversas legalmente captadas, muitas
32 REVISTA DA ALERJ
vezes com os processos ainda em curso e sem que os Se o Governo é acusado de explorar politicamente
acusados tenham sido condenados. A polêmica deu informações obtidas através de escutas da Polícia Fe-
origem a uma Comissão Parlamentar de Inquérito deral, a imprensa é apontada como uma das principais
(CPI), instalada na Câmara Federal para investigar favorecidas pela indústria do grampo quando divulga,
denúncias de instalação de grampos ilegais por órgãos muitas vezes de forma sensacionalista, diálogos sus-
policiais. E o Governo resolveu criar uma comissão peitos e denúncias não comprovadas. A divulgação de
conteúdo de interceptação telefônica é justificada por
seu caráter de interesse público. É direito da socieda-
de ter acesso a informações relativas a, por exemplo,
desvios de dinheiro e corrupção administrativa. Mas
a fronteira entre interesse público e violação de in-
formações particulares pode ser nebulosa, e suscita
debates sobre os limites éticos do jornalismo.
Denúncias de corrupção ou de desvios de verba,
divulgadas pela imprensa, podem atender também a
interesses particulares. O off sempre ajudou jornalistas
a fazer matérias que denunciam esquemas de corrup-
especial, com representantes de vários ção, mas é comum políticos e empresários municiarem
órgãos, para redigir um projeto de lei com regras a imprensa com dossiês, fitas, gravações ou documen-
mais rigorosas para a interceptação telefônica. tos – às vezes obtidos de forma ilegal – contra seus
Um dos objetivos é reduzir brechas que fazem com oponentes. O jornalista justifica a publicação como
que advogados de defesa tentem anular as provas sendo de interesse público, mas sua fonte também se
produzidas. A lei atual, criada em 1996, trata somente beneficia com a divulgação das informações.
de interceptações telefônicas, e não prevê novidades O falecido senador Antônio Carlos Magalhães
tecnológicas como escutas ambientais, telefonia era conhecido por mandar grampear seus adversá-
por IP, mensagens instantâneas de computador ou rios. Em matéria publicada pela revista IstoÉ, em
torpedos de telefone celular. Outro ponto que está fevereiro de 2003, ele admitiu ter gravado quase 200
sendo rediscutido diz respeito ao vazamento de in- horas de conversa de seu inimigo político Geddel
formações. Segundo o coordenador-geral de Estudos Veira Lima. Segundo ACM, jornalistas da Folha de
e Pesquisas da Secretaria de Assuntos Legislativos S. Paulo e da revista Veja também teriam recebido
do Ministério de Justiça, Leandro Galuzzi, o grupo o material de suas mãos. Ele esclarece que o do-
discute uma forma de coibir a divulgação de docu- cumento, de 170 páginas, é um resumo da escuta
mentos sob segredo de Justiça, optando pela não ilegal. Para o jornalista Renato Delmanto, professor
penalização do jornalista. da faculdade paulista Cásper Líbero, caberia aos
– Evitar o vazamento é um dos pontos nevrálgicos jornalistas refletir um pouco mais sobre suas rela-
do anteprojeto. Ainda não temos nada definido, mas ções com essas fontes.
mantemos nosso foco na fonte da divulgação. Estamos – Enquanto especialistas debatem soluções
realizando estudos técnicos para saber o que pode tecnológicas e jurídicas para se identificar e coibir o
ser feito para controlar as cópias do material entregue vazamento de informações, seja por parte da Polícia
pelo Poder Judiciário. Podemos, por exemplo, atribuir Federal, seja por parte do Ministério Público, seja fru-
códigos específicos para cada cópia e, assim, em caso to da espionagem empresarial, jornalistas deveriam
de vazamento, saber quem é o responsável pela divul- refletir se estão realmente a serviço da sociedade, ou
gação do documento – explica Galuzzi, ressaltando se estão, mesmo que involuntariamente, a serviço
que a escolha do grupo vai depender fundamental- de agentes que usam de meios pouco éticos para
mente da viabilidade técnica da solução. enfrentar a concorrência – afirma ele.
REVISTA DA ALERJ 33
Fabano Veneza
panorama Trocando em miúdos
No local de origem
A Assembléia Legislativa do Estado
do Rio de Janeiro e a Federação
Os sete lustres de alabastro que iluminam o Saguão Getúlio
do Comércio do Estado do Rio de
Vargas, do Palácio Tiradentes, sede da Alerj, finalmente Janeiro (Fecomércio) lançaram a
voltaram aos seus lugares, depois de quatro meses de cartilha Como um projeto se torna
restauração. “Estavam muito avariados. Tivemos que lei na Alerj, com o bê-á-bá da
reforçá-los com uma manta de fibra de vidro para que tramitação legislativa. O objetivo
suportassem melhor o próprio peso”, explica a restauradora é promover a aproximação da
Ana Frazão, da Casatelier Restauração e Arte, responsável sociedade com o Poder Legislativo
pelo reparo, autorizado pelo Iphan. Uma equipe de cinco e incentivar um exercício maior da
pessoas foi encarregada cidadania participativa. O texto,
de aplicar a manta de Daniel Tiriba que está disponível no site da Alerj
fibra de vidro, fazer (www.alerj.rj.gov.br), mostra toda a
trajetória de um projeto, desde sua
a higienização, troca
criação até a promulgação, como
da fiação, limpeza dos
lei. A Fecomércio-RJ é a primeira
metais e proteção
entidade que traz para o âmbito
com resina acrílica. estadual a parceria já feita pela
Os sete lustres estão Confederação Nacional do Comércio,
no Palácio desde a que elaborou uma cartilha sobre
sua inauguração, o trâmite das leis no Senado e na
há 80 anos. Câmara dos Deputados.
De portas abertas
Rafael Wallace
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