O controle difuso é aquele que pode ser feito por todos os
juízes, mas sempre quando estiverem analisando um caso
concreto. O questionamento sobre a constitucionalidade da norma é feito via defesa ou exceção e acarreta uma questão incidental. Isso porque o juiz, antes de analisar o mérito da ação, deverá inicialmente decidir se considera a norma constitucional ou inconstitucional. Na primeira hipótese, aplicará a norma normalmente ao fato e julgará o mérito conforme o previsto na norma. No segundo, deixará de aplicar a norma, por reputá-la inconstitucional, ou seja, esta será afastada no momento da decisão. No entanto a norma, ainda que não aplicada pelo magistrado naquele caso concreto, continua no ordenamento jurídico, ou seja, quem não ingressou com ação judicial, para obter o afastamento da norma de seu caso concreto, deverá cumprir normalmente a norma. Isso porque a decisão aplica-se apenas às partes do processo.
No controle concentrado da Constituição Federal a
competência para julgar é exclusiva do Supremo Tribunal Federal. A provocação deve ser feita, via ação, por um dos legitimados previstos no artigo 103, CF (Presidente da República; Mesa do Senado Federal; Mesa da Câmara dos Deputados; Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; Governador de Estado ou do Distrito Federal; Procurador-Geral da República; Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido político com representação no Congresso Nacional; confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional). A norma será analisada abstratamente, em tese, sendo o controle de sua constitucionalidade o próprio mérito da ação. A decisão, nesse caso, será aplicável para todos e vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração direta e indireta das esferas federal, estadual e municipal (não vincula a função legislativa). Dessa forma, é como se a norma fosse retirada do ordenamento jurídico, pois a partir dessa decisão não será mais aplicável para ninguém.
Mas uma dúvida é frequente, especialmente quando se fala da
cláusula de reserva de plenário. Quanto à cláusula de reserva de plenário, estabelece o art igo 97 da Constituição Federal que “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.”
Isso significa que quando a turma ou câmara (órgão
fracionário do Tribunal) analisa uma ação ou um recurso, em que é questionada a constitucionalidade da norma aplicável ao caso, se considerá-la constitucional, julgará aplicando-a. Contudo, se concordar que a norma é inconstitucional, não terá competência para declarar a inconstitucionalidade, nem poderá julgar, deixando de aplicar a norma. Deverá, então, submeter essa questão incidental ao Plenário ou Órgão Especial (art. 93, XI, CF) do Tribunal. Essa regra está disciplinada nos artigos 480 a 482 do CPC. O art igo 480 dispõe que:
“Arguida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo
do poder público, o relator, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara, a que tocar o conhecimento do processo.”
E o artigo 481 que:
“Se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento (obs.
Ou seja, aplicará a norma); se for acolhida, será lavrado o acórdão, a fim de ser submetida a questão ao tribunal pleno."(obs. Pois o órgão fracionário não pode declarar a inconstitucionalidade).
No entanto, essa regra tem uma exceção, justificável em razão
do princípio da economia processual. Estabelece o parágrafo único do artigo 481 que: “Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”.
Verifica-se, com isso, que a decisão do Plenário/Órgão do
Tribunal ou do Plenário do STF passam a ser vinculantes (de cumprimento obrigatório) pelos órgãos fracionários (turmas e câmaras) dos Tribunais. Contudo, os juízes de primeira instância continuam livres para decidir de acordo com sua convicção. Além disso, a norma continua no ordenamento e esse entendimento só será aplicado para as pessoas que ingressaram com ação judicial.
Para exemplificar, imaginemos cinco pessoas, Íris, Osíades,
Set, Nephthys e Hórus, que estão sujeitas ao cumprimento de uma obrigação por força do previsto na Lei nº XXX/2013, questionável quanto à sua constitucionalidade.
Íris, Osíades e Set ingressam com ação judicial, alegando que
não querem praticar o ato previsto nessa lei, por reputá-la inconstitucional.
O juiz de primeira instância que aprecia o caso de Ísis é o
primeiro a julgar e concorda que a lei seja inconstitucional, afastando-a de seu caso e liberando-a da obrigação. A parte contrária recorre e quando o órgão fracionário do Tribunal A analisa o caso, concorda com a tese da inconstitucionalidade e remete a questão ao Plenário ou Órgão Especial do Tribunal A, o qual, por maioria absoluta declara a norma inconstitucional. A partir disso, o órgão fracionário julga o caso de Íris, que fica liberada de cumprir a obrigação prevista na Lei nº XXX/2013. Inconformada com essa decisão a parte contrária oferta Recurso Extraordinário no Supremo Tribunal Federal.
Enquanto isso, o juiz de primeira instância que está analisando
o caso de Osíades julga, concordando que a lei seja inconstitucional, afastando-a de do caso e liberando-o da obrigação. A parte contrária recorre para o mesmo Tribunal A. O órgão fracionário, nesse caso, não precisará remeter o incidente ao Plenário ou Órgão Especial, apenas irá aplicar a decisão já proferida no caso de Ísis, ou seja, afastará a norma, porque declarada inconstitucional.
Logo depois disso, o órgão fracionário do Supremo Tribunal
Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário do caso de Ísis, também entende que a norma seja inconstitucional, então encaminha a questão ao Plenário do STF que, por maioria absoluta, declara a norma inconstitucional, decisão essa que valerá apenas para o caso de Ísis.
O juiz de primeira instância, do caso de Set, demora muito
tempo para julgar, mas finalmente decide, considerando a norma constitucional, aplicando-a e impondo o cumprimento da obrigação a Set. Assim, mesmo havendo já uma decisão do STF, declarando a norma inconstitucional, os juízes de primeira instância continuam livres para decidir de acordo com sua convicção. Isso porque, a decisão foi proferida num caso concreto e apenas foi aplicável às partes daquele caso concreto (no exemplo, Ísis e a outra parte). Ocorre que Set não se conforma com essa decisão e recorre ao Tribunal B, que ainda não havia apreciado o caso. Contudo, já há uma decisão do Plenário do STF, então o órgão fracionário do Tribunal B deverá aplicar essa decisão, nos termos do artigo 481, pr. Ún do CPC. Logo, o órgão fracionário desse outro Tribunal deverá afastar a norma do caso de Set, já que o Plenário do STF já declarou a norma inconstitucional. Dessa forma, Íris, Osíades e Set ficaram livres da obrigação imposta pela norma, já que obtiveram uma declaração judicial da inconstitucionalidade desta. No entanto, a norma permanece no ordenamento, já que esse controle é o difuso, realizado em casos concretos, que só atingiu as partes. Então, Nephthys e Hórus, que não ingressaram com ações judiciais, estão sujeitos a cumprir a obrigação fixada na Lei nº XXX/2013, pois esta continua no ordenamento, produzindo efeitos, com uma presunção (relativa) de constitucionalidade.
Agora, se um legitimado propusesse uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade em face dessa Lei nº XXX/2013 e o STF a declarasse inconstitucional, então essa decisão valeria para todos (art. 102, § 2º, CF). Desse modo, Íris, Osíades, Set, Nephthys, Hórus e todas as demais pessoas não precisariam mais cumprir a obrigação fixada na lei que foi declarada pelo STF inconstitucional no controle concentrado e abstrato.