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Revista Critiea de Ciéncias Sociais n° 15/16/17 Maio 1985 VASCO GONGALVES * MOVIMENTO DAS FORGAS ARMADAS, PROJECTOS POLITICOS DEPOIS DO 25 DE ABRIL E FORGAS ARMADAS A versio inicial do presente artigo foi elaborada tendo cm vista a minha partieipagio no coléquio «Portugal 1974-1984» promovido em Dezembro iltimo em Coimbra pela Revista Critica de Cigneias Sociais. Dessa versio foi extraida a intervengao feita no mesmo coléquio, na mesa redonda «As Forgas Armadas e os Projectos Politicos do 25 de Abril» Nao 6, evidentemente, possivel, dentro dos limites de um. artigo, fazer uma anélise laboriosa 'e exaustiva da Revolucao do 25 de Abril. & minha intencao referir, apenas, aqueles que, em minha opiniio, sto os principais tragos caracteristicos do proceso democratico-revolucionario que temos vivido e que vivemos, hoje. Contudo essa referéncia procuraré nfo ser superficial mas, ao contririo, captar a esséneia dos fenémenos. ‘A distancia, no tempo, contribui para a andlise objectiva, mas nio se pode nem se deve esquecer as condigées objectivas ¢ subjectivas, que estiveram presentes nos momientos passados, em que se desenrolaram as aegdes ¢ se verificaram os fenéme- nos que desejamos estudar, analisar e compreender, ¢ influen- ciaram a sua esséneia, ou seja, as causas do seu aparecimento desenvolvimento. Devemos procurar ter presente que, coexistindo as condi- goes prineipais com as secundarias, estas altimas, numa dada situagao, podem parecer & consciéneia social dos homens, por * General 54 Vasco Goncalves diversas razées, incluindo a sua prépria conseiéneia social ante- rior, podem parecer, diziamos, como principais em vez de secundarias e vice-versa. Esquecendo (deliberadamente ou no) ou néo tendo apre- endido as condigdes que existiam no momento passado, n&o se pode analisar objectivamente a situagio. Nao podemos confundir as linhas de fundo da histéria, a grande histéria com a pequena histéria, 0 que nao significa que nao devamos ter presente e dar atengao ao papel da persona- lidade na histéria. A revolugio de 25 de Abril de 1974 e o processo de trans- formagées estruturais que se desenvolveu na sua sequéncia sio um dos momentos mais altos de toda a nossa histéria patria. Ficardo para os portugueses como ficaram a Revolugao de 1383- -85 ¢ a Revolucio Liberal de 1820, E porque? Porque os grandes movimentos da histéria estio ligados as mudangas das relagoes sociais, 4s mudancas das relagoes de propriedade. Eles atingem os interesses mais profundos das diversas classes e camadas sociais, atingem as bases do préprio Estado. Nas vésperas do 25 de Abril as condigées objectivas da vida do nosso pais determinavam aos portugueses as tarefas que era necessario resolver para a sua libertacéo e para a ealizagio do progresso econémico-social, politico, cultural: —derrube da ditadura fascista-colonialista; —fim da guerra colonial por meio de uma correcta solu- edo politica; —instauragio’de um regime democratico; —liquidagdo do poder dos monopélios e latifindios; —transformagio democratica das estruturas sécio-econd- micas. Quando as condigdes objectivas esto eriadas, as condigoes subjectivas passam a ser decisivas, ou seja: —a compreensao pelos homens da sua situagao conereta € do que ha a fazer para a superagio das suas dificuldades ¢ ulterior desenvolvimento da sociedade; —o grau de consciéncia social; as acgdes conscientes; a organizagdo e a vontade dos homens, das classes, dos partidos que lutam pela realizagao de determinados objectivos ou contra essa mesma realizagio; —0s préprios resultados da actividade dos homens, seja consciente, seja, pelo contrério, inconsciente, espontinea, sao MPA ¢ Projectos Politicos 55 condigdes objectivas para o subsequente desenvolvimento da sociedade. AS CONDIGOES SUBJECTIVAS E OS MILITARES — 0 amadurecimento da consciéncia politica com a experiéncia da guerra colonial e da verificagao directa, sin loco», da exploragao colonial; — a impossibilidade real de vencer a guerra; — a incomodidade da guerra; — a compreensao da justeza do combate que os povos coloni- zados nos moviam; — a defesa da dignidade das Forgas Armadas; desejo de evitar a sua derrocada, cuja perspectiva cada vex mais se dese- nhava em consequéneia da politica do governo fascista, e de as Forcas Armadas nfo serem arrastadas na queda do regime, como «bode expiatérion; — a influéncia da contestacdo e da luta contra a guerra colonial nos meios universitarios e estudantis; — a influéneia de numerosos oficiais e sargentos milicianos na consciencializagao politica dos militares do Quadro Perma- nente; — o silenciamento da guerra colonial por parte do governo que procurava fazé-la aceitar, como rotina, a nossa juventude, 03 nossos militares, a0 nosso povo, foram factores positives de consciencializacao. Mas, simultaneamente, havia factores negativos: — a formagao séeio-cultural dos militares do Quadro Perma- nente; a sua psicologia, como que uma segunda natureza adquirida depois da entrada para as escolas militares, ou de assentar praca; — a educacao politica recebida nas escolas militares; — 0 binémio Patria-Ultramar e o temor da independéncia das, colénias ¢ da sua perda; —o afastamento dos militares das questées politicas; — as reservas quanto & acco reivindicativa e revoluciondria das massas populares; — 0 desejo de ¢ «clarifiear> o regime democratico. MFA e Projectos Politicos. TI E como a burguesia portuguesa, por si s6, ndo tem forga para impor ao pais a politica restauracionista, tem procurado e Obtido 0 apoio da grande burguesia internacional e do impe- rialismo (apoio que, aliés, j4 tinha antes do 25 de Abril) com a consequente, e cada dia 'imais grave, deliberada_subordinagéo politica, econémica, financeira, militar, diplomatica ¢ cultural do nosso pais a inleresses estrangeiros. ‘A Constituigao, o regime, as liberdades, as conquistas de Abril tém sido defendidos com tenacidade pelos trabalhadores suas organizacoes, pelos democratas, pelos patriotas. Contudo, passados dez anos sobre o 25 de Abril o regime democratico est seriamente ameacado. Nao tém sido os interesses da pequena e da média bur- guesia que tém sido restaurados, nem tao pouco esses estratos da burguesia desempenharam um papel hegeménico depois do 5 de Novembro de 1975. ‘As relacdes de propriedade que tém sido restauradas ou que esto em vias de o ser, em consequéncia da ofensiva contra-revolucionaria dos sucessivos governos constitucionais, sa as respeitantes aos interesses dos antigos monopolistas ¢ latifundiarios e do grande capital e A penetragéo e domfnio do capital estrangeiro, pois as relagdes de propriedade que inte- ressam directamente 4 pequena ¢ A média burguesia nao foram tocadas pela Revolugao de Abril. Os monopilios ¢ latifindios, 0 poder econémico e politico do grande capital ressurgem entre nés pelas maos dos seus aliados da pequena e da média burguesias, pela mao dos esocia- listas» e dos sociais-democratas, identificados com os interesses da direita e da reaceao, numa palavra, pela mao dos que teme- yam em 1975 0 ascenso das classes trabathadoras na sociedade portuguesa. E, hoje, os senhores do tempo do fascismo tém os seus representantes directos no governo, Assim, contrariamente ao que certos dirigentes e sectores, civis € militares, pretendiam, nao foram a pequena burguesia estratos da média burguesia, aliados a0 MFA (ou melhor, ao que dele restava), que hegemonizaram 0 proceso apés 0 25 de Novembro, porquento, dada a prépria légica do eapitalismo, os 12 Vaseo Goncalves apoios recebidos, quer no plano interno quer no plano externo, & as aliangas que haviam sido feitas, aquele proceso veio a ser controlado pelos interesses do grande capital nacional e inter- nacional, como esté a vista de todos nés. Do ponto de vista dos interesses do nosso povo, as aliangas que tém sustentado a politica de desastre nacional de finais de 1975 para cé foram aliangas erradas. Esta é uma grande ligio a tirar para o futuro. Osipreconceitos, as reservas, as suspeltas, as desconfiancas, ‘os medos de estratos da pequena burguesia e da média burguesia em relagdo a classe operdria, aos trabalhadores e as suas orga- nizagdes e os objectivos de hegemonia politica daquelas camadas da burguesia conduziram a aliangas erradas de que estamos sofrendo as consequéncias Na época actual, na sociedade portuguesa, a pequena e a média burguesia no’ esto em condigdes de hegemonizar pro- cessos de desenvolvimento, nem de hegemonizar situagées. Hoje o capitalismo nao é o da pequena ou da média burguesia. Também uma via de desenvolvimento nao capitalista ou de transigdo para 0 socialismo nfo pode, por elas, ser hegemo- nizada, até porque estas camadas sociais no serfo capazes de ‘Nao se pode desenvolver Portugal, nao se pode progredir subalternizando a classe operaria, os trabalhadores € as suas organizagées. A nossa experiéncia o mostra, ‘A nossa experiéneia o mostra. ‘Mas, entio, & pequena burguesia ¢ a estratos da média burguesia portuguesas j4 no restaré hoje um papel a desem- penhar para o progresio e a libertago do nosso povo? Resta, sim, ¢ um importante papel, uma importante mis so. Mas em alianga com a classe operdria, os trabalhadores © as suias organizagées sociais ¢ politicas. As tarefas que, hoje, as condigdes objectivas da nossa socie- dade colocam ao povo portugues (quer ele tenha ou nao cons- ciéneia delas), para a defesa do regime, para a resoluggo da grave crise politica, econémica, social e cultural para que fomos MFA ¢ Projectos Politicos 73 arrastados, para a defesa da integridade, soberania ¢ indepen- déncia nacionais exigem que seja construida essa alianga, para que possa ser encontrada uma alternativa de unidade nacional, para a realizagao do projecto patridtico que a Constituigao, na continuidade do Programa do MFA, encerra, Mas & alianga da classe operdria ¢ dos trabalhadores com a pequena burguesia e estratos da média burguesia e respectivas Organizagdes nao sio indiferentes a posigao e 0 papel politico das Forgas Armadas. Nao hA poder politico sem Foreas Armadas e, por assim © ser, as F. As sio um elemento constituinte relevante do sis- tema’ politico real. ‘Do mesmo passo, as F.A.s participam da correlagdo de forgas politicas e sociais, civis e militares que se estabelece, na sociedade, em cada momento. ‘As constituigGes burguesas de democracia parlamentar escondem esta realidade. Mas, nem por isso, 0 general De Gaulle em Maio de 1968, deixou de ir 4 Alemanha Federal, conversar com o general Massu, comandante das tropas francesas estacionadas naquele pais e'as de maior operacionalidade, ou os blindados franceses deixaram, nessa conjuntura, de fazer uma demonstracao de forga, movimentando-se nos arredores de Paris. Nas constituigées burguesas nao 6 explicitado, de modo transparente, 0 papel politico © as missdes das F. A's, a0 con- trério do que se verificava com a nossa Constituigo de 1976 antes da Lei da Revisdo Constitucional de 1982. De resto todos nés sabemos e temos a experiéneia de tal facto, isto & que a posigio politica das Forgas Armadas é por vezes, determinante, decisiva para a resultante da correlacdo global de forcas que define 0 poder politico. Aparecendo claramente no texto constitucional as Forgas Armadas como elemento constituinte do poder politico e sendo nesse texto estabelecidas as vias e meios legais da expressao dessa participagio, bem como definidas as suas missées, podem desse modo ser institucionalizados com transparéncia a natu reza e 0 cardcter dessa participacao. As Forgas Armadas estardo, entdo, institucionalmente su- bordinadas a um poder politico de que elas préprias sio parte constituinte, a um poder politico real que resulta do funcio- namento, da articulagao, da interrelagao simultineos de vérios 74 Vasco Gongalves organismos de poder como sejam o Presidente da Repiiblica, a Assembleia da Repiblica, o Governo, os Tribunais, a Adminis- ‘sragdo Central, a Administragdo Local (poder local), as préprias Forgas Armadas. ‘Nao estando claramente definidos na Constituiggo as re- gras e 05 limites da intervengao politica das Forgas Armadas, da sua participagdio no poder politico, hd gente que procura 0 apoio das Forcas Armadas para a esua politicas invocando que elas ndo se devem intrometer na_politica. Outros pretendem fazer confundir subordinagéo das For- gas Armadas ao poder politico com subordinacao & politica ¢ aos interesses de um governo que prossegue objectivos parti- aris e de classe e nao objectivos nacionais. Com outros, ainda, pode-se correr o risco de se subme- terem, nas suas decisées politica, a pressdes vindas de sectores das Forgas Armadas. E outros casos, derivados da ambiguidade institucional, se poderiam considerar. No texto inicial da Constituigao de 1976 era imposta As Foreas Armadas, como miss4o, entre outras, a garantia do regular funcionamento das instituigées democraticas e do cum- primento da Constituigao. Esta misao foi suprimida pela Lei da Revisdo Constitucional cujo texto, no que respeita as Forgas Armadas, é, deliberadamente, pouco claro, vago, para abrir as portas a3 tentativas da sua instrumentalizacao por parte dos governos (ver, por exemplo, a Lei de Defesa Nacional e das Forgas Armadas e 0 projecto de Lei de Seguranca Interna, actualmente na Assembleia da Repitblica, para discussio na especialidade) ‘As Forgas Armadas devem ser, rigorosamente, apartida- rias, 0 que nao significa que devam ser apoliticas (alids, nem o poderiam ser, pela sua prdpria esséncia), Elas devem ter, necessariamente, uma politica a qual de- verd ser, no dominio interno, a da garantia do cumprimento da Constituigao ¢ do funcionamento das instituig6es democraticas. ‘Mas a Constituigio nao é um texto neutro, Nao ha nenhu- ma constituigo no mundo que seja uma lei neutra. Todas tém um contetido ideolégico, de classe, mais ou menos apa- rente, certamente, mas pelo préprio facto de ser a Lei Fun- damental, a Constituigéo, que ¢ expressio das relagdes de forga numa dada sociedade, tem necessariamente um conteddo ideologico. Ora, a nossa, mesmo depois da revisio de 1982 continua a ter um contetido’ ideolégico que, objectivamente, numa socie- dade dividida em classes com diferentes interesses ¢ até inte- resses antagénicos entre algumas delas, é 0 mais amplo que se MFA ¢ Projectos Politicos 75 pode obter: 0 seu contetido politico, econémico, cultural, ideo- ldgico & anti-monopolista, anti-latifundista e imbuido do espi- rio de independéncia nacional e de paz ‘Mesmo depois da revisio de 1982 a Constituicao continua a ser um projecto nacional de desenvolvimento politico, sécio-eco- némico e cultural que interessa as mais vastas camadas da popu- lagdo portuguesa. E uma ampla plataforma de entendimento entre as classes ¢ camadas sociais que constituem a quase tota- lidade da populagao do pais. £ uma plataforma de entendimento para a alianga atras referida como indispensével para o futuro da nossa Patria. Por outro lado, a composicao social das nossas Forgas Armadas corresponde na sua quase totalidade a essas mesmas, classes ¢ camadas sociais de cujos interesses a Constituicéo & expressao objectiva (isto é quer estas classes ¢ camadas sociais tenham ou nao tenham consciéneia desse facto, HA, pois, compatibilidade social entre a Constituigao ¢ a composigao das Forgas Armadas, o que 6 uma condigao sine qua ‘non para a realizacdo da alianga patridtica a que nos temos refe~ rido, e cuja necessidade resulta, realmente, da nossa propria experiéncia apés 0 25 de Abril,’ se desejamos de facto que 0 pais marehe para 0 progresso econémico-social, para a liberta- edo do nosso povo, garantindo, do mesmo paso, a soberania e a independéncia_nacionais. elas razdes j8 apontadas atrés apesar de ndo estar, hoje, consagrado na Constituicio com transparéneia, continuaré a ser, inevitavelmente, muito importante o papel das Forcas Armadas no nosso sistema politico. ‘Nao se trata, contudo, como se procurou demonstrar, de pretender um estatuto de ‘autonomia politica para as Foreas Armadas, no seio da sociedade portuguesa, mas de reconhecer que as Forcas Armadas sao, indiscutivelmente, parte integrante do sistema politico. Reconhecido isto, é minha conviceio que as Foreas Arma- das devem assumir 0 dever patridtico de perfilhar uma posicao rigorosamente institucional, de garante do regime democritico constitucional e do funcionamento das suas instituicées, nao permitindo as Forgas Armadas a instrumentalizagio de si pré- prias quer pelos governos, quer pelos partidos. politicos ou quaisquer grupos de pressio, quer por elementos da sua prépria hierarquia,

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