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2 - MARTINS, Wilson.

Um Brasil diferente; ensaio sobre fenômenos de aculturação no


Paraná. São Paulo, Anhembi, 1955. 506p.
A Cultura do Algodão no Rio Grande do Norte"
3 - FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro, Graal, 1982.
Denise Monteiro Takeya •.•.
4 - Vigiar e punir; nascimento da prisão. Petrópolis, Vozes, 1983.

5 - PARANÁ. Governo do Estado. Mensagem apresentado à Assembléia Legislativa do


Estado por ocasião do abertura do 3" Sessão Ordinária de 2" Legislatura pelo Senhor
Bento Munhoz do Rocha Netto, Governador do Paranâ. Curitiba, 1953.

6- . Mensagem apresentado à Assembléia Legislativa do Estado por


ocasião do abertura da 4" Sessão Ordinária do 2" Legislatura pelo Senhor Bento Munhoz Tendências da pesquisa em História Econômica do Brasil no
do Rocha Netto, Governador do Paranâ. Curitiba, 1954.
período 1889-1930.
7 - . Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa do Estado por
ocasião do abertura do I" Sessão Ordinária da 3" Legislatura pelo Senhor Antonio A economia brasileira na República Velha, como objeto na produção
Annibelli, Governador do Paranâ. Curitiba, 1955. historiográíica, apresenta-se inserida tanto em análises mais abrangentes, que
8- . Mensagem apresentado à Assembléia Legislativa do Estado por cxtrapolam 1889-1930, como nas que se referem ao seu próprio período'.
ocasião do abertura do Sessão Legislativa Ordinária de 1957 pelo Senhor Moysés Lupion, Tais análises centralizam-se em duas tcrnáticas básicas:
Governador do Paranâ. Curitiba, 1957. A primeira trata das relações da economia brasileira com a economia
9- . Mensagem apresentado à Assembléia Legislativa do Estado por
mundial, onde o comércio exterior, as finanças e os investimentos
ocasião da abertura da Sessão Leglslativa Ordinária de 1958 pelo Senhor Moysés Lupion, estrangeiros são os principais pontos enfocados. Teoricamente, a razão de ser
Governador do Paranâ. Curitiba, 1958. dessa tcmática está no fato de que a economia brasileira é uma economia de
exportação, fundada pela expansão do capital mercantil europeu, e sua
evolução é vista dentro do contexto do capitalismo em escala mundial.
A segunda diz respeito ao binômio cafeicultura-industrialização, mais
atenta, portanto, às transformações estruturais internas que ocorrem na
região Sudeste, especialmente em São Paulo, embora não perca de vista a
permanência da condição periférica da economia brasileira, como um todo .

•. Texto elaborado a partir da Dissertação de Mcstrado Um outro nordeste, defendida na


PUC/SPem 1983 .
•.•. Mestra em I1istória pela PUC/SP, professora do Dcpto. de História da UFRN e
Doutoranda em História Econômica pela FFLCH/USP. Publicou Um outro nordeste e, em co-
autoria com I1ermano Machado Lima, ltistôria político.administrativa da agricultura do RN
(189211930).
I Vejam-se os trabalhos de PRADO JR., Caio. l/istória econômica do Brasil. (s. 1.),
\3rasiliense, 1963; MELLO, J. M. Cardoso de. O Capitalismo Tardio. Campinas, 1975
(mimcografado); VILLELA, A. e SUZIGAN, W. Política de governo e crescimento da
economia brasileira (1889·1945). Rio de Janeiro, IPEA/INI'ES. 1973; CARONE, E. A
República Velha. lnstituiçôes e Classes Sociais (/889·1930). Rio de Janeiro, Direi, 1978;
FAUSTO, Boris. Dir. l l istária Geral da Civilização Brasileira, tomo lI!, O Brasil
Republicano. 10 vol., Estrutura de poder e economia (1889- 1930). CA?\O, Wilson. Raizes da
concentração industrial em São Paulo. Rio de Janeiro, Direi. 1977; DEAN, Warrcn. A
industrialização de São Paulo. (s. I.), Difel/Edusp, 1971; SILVA. Sérgio. Expansão Cafeeira
e origens da indústria no Brasil. São Paulo. Alfa·6mega, 1976; STEL~, Stanlcy, Origens e
evolução da indústria têxtil no Brasil, 1850·1950. Rio de Janeiro, Campus, 1979.

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Pensado o problema em termos espaciais, ou melhor, ainda em termos Considerando-se que a Zona da Mata, que constitui 18,2% de toda a
regionais, o que se verifica é que a predominância dessas duas tcrnãticas, área nordestina, representava o reduto da cana-de-açúcar e o agreste e sertão se
especialmente da segunda, toma o Sudeste uma região privilegiada pela configuravam como área por excelência do algodão, lemos um quadro em
produção historiográfica sobre a economia brasileira, na República Velha. que não só os limites físico-espaciais de uma e outra cultura são bastante
Pouco ou quase nada se escreve sobre a situação econômica das outras definidos, mas também esses mesmos limites indicam a importância do
regiões no mesmo período. Existe aí uma grande lacuna nos estudos de algodão no quadro da economia regional.
história econômica. Essa importância ganha relevo na economia do Rio Grande do Norte -
O caso do Nordeste é, particularmente interessante, porque quando se um dos Estados algodoeiros nordestinos - no período da Repúbliea Velha,
faz presente como tema, revela a persistência de um enfoque: o que analisa a que é aquele que especialmente nos interessa.
unidade produtiva dos engenhos e usinas. É o Nordeste açucarciro-,
Dessa forma, a produção historiográfica sobre a economia brasileira, na
República Velha, não só favorece o Sudeste, como "locus" de análise, mas Açúcar e algodão na economia norte-rio grandense
ainda, em se tratando do Nordeste, restringe-se àquela produção agrícola e
estrutura agrária que representou sua época áurea de sobrcposição econômica No Rio Grande do Norte, no período que se estendeu entre os anos de
às demais regiões. 1860, quando ocorreu o segundo surto das exportações de algodão para o
Essa tendência da pesquisa histórica encobre a importância que uma mercado mundial, e os anos de 1880, o cultivo da cana-de-açúcar e o do
outra cultura teve na cstruturução da economia regional - a cultura do algodão coexistiram com grau de importância diferenciado.
algodão. A queda dos preços do algodão a partir de 1872 e a grande seca de 1877,
O Nordeste é uma região que, historicamente, se caracterizou como área que fez recuar a pecuária como atividade produtiva de vulto, além de atingir
algodoeira, além de canavicira. O marco inicial dessa caracterização teve também o algodão, favoreceram o cultivo da cana de forma que este passa a
lugar quando ocorreu o primeiro surto exportador do algodão no Brasil, deter a preponderância no quadro econômico do Estado.
estimulado pela revolução industrial inglesa, na segunda metade do século Atravessando fase próspera, a exportação de açúcar atingiu seu ápice
XVIII. O Nordeste tornou-se então a segunda área produtora/exportadora do nos anos oitenta. A partir daí, ela declinou seguindo uma tendência comum
país, logo em seguida ao Maranhão, a todo o açúcar brasileiro no final do século XIX, que enfrentando a
O segundo surto exportador do algodão para o mercado mundial, na concorrência do açúcar de beterraba nos maiores mercados consumidores -
década de 1860, impulsionado pela interrupção das exportações americanas Grã-Betanha e Estados Unidos - só ganhou novo alento por ocasião da
com a Guerra de Secessão, reafirmou uma tendência anterior. Durante longo primeira grande guerra.
tempo, até os anos de 1940, o Nordeste permaneceu como área de No Rio Grande do Norte, o número de engenhos em atividade decresceu
concentração da cotonicultura frente às demais regiões brasilciras''. continuamente e, ao findar a primeira década do século XX, as engenhocas
Dentro do espaço nordestino, o algodão se consolidou como cultura para a fabricação de aguardente e rapadura eram em número muito superior
típica daquelas áreas mais secas que são exatamente a maior parte desse aos engenhos para a fabricação de açúcar propriamente dito, Dos dez
mesmo espaço. municípios que compõem a Zona da Mala, três exportavam apenas os
subprodutos da cana e aqueles que conseguiam exportar açúcar, exportavam
do tipo bruto, de baixa qualidade. No sertão, encontrava-se o cultivo da cana
nas cercanias dos açudes, processado em engenhocas; seus subprodutos
2 A esse propósito são bastante elucidativos especialmente os trabalhos de QUEIROZ, S. R. destinavam-se principalmente ao consumo local e, eventualmente, à
Reis de. l listoriografia do Nordeste. São Paulo, Secretaria da Cultura/Divisão de Arquivo do exportação para os municípios vizinhos.
Estado, 1979 e LUZ, Nícia Villela. "A história econômica do Brasil no período 1830 a 1930: O algodão, no Rio Grande do Norte, não seguiu a mesma trajetória que
abordagens e problemas, um ensaio bibliográfico", IN: PELA(,Z, Carlos M. A moderna
história econômica. Rio de laneiro, APEC, 1976,1'1'. 203·212.
o açúcar, pois o fim da fase áurea da exportação para o mercado externo da
31'ara uma história da cultura do algodão na região nordeste veja-se o trabalho clássico de
década de 1860 não significou sua estagnação ou retrocesso. Pelo contrário,
ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o homem no Nordeste. São Paulo, Ciências a partir de 1887 se expandiu o cultivo pelo sertão norte-rio grandcnsc de uma
Humanas, 1963. variedade de algodão característico do Estado - o algodão mocó, Além disso,

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favorecida pela crise açucareira, a cotonicultura avançou progressivamente do país, concentrado sobretudo no Rio de Janeiro, no então Distrito Federal,
sobre a Zona da Mata. nas Minas Gerais e em São Paulo.
Dessa forma, a partir da década de 1880, enquanto o açúcar decaiu em O terceiro ponto de convergência das análises é o que diz respeito à
importância, o algodão se firmou. CulLura dominante no agreste e no sertão importância do setor têxtil na origem do processo de industrialização no
e em processo de avanço sobre a Zona da Mata, ele foi progressivamente se Brasil. A indústria de fiação e tecelagem é apontada como um dos primeiros
impondo, em detrimento do açúcar, como o principal produto agrícola de setores a consolidar-se. Esse setor de vanguarda era aquele que utilizava
exportação do Estad04. justamente o algodão como sua principal matéria-prima industrial.
A renda estadual provinha então principalmente dos impostos de O algodão nacional, produzido principalmente no Nordeste, fora
exportação. Os dados quantitativos referentes à receita arrecadada pelo desalojado gradualmente de sua posição no mercado mundial, pela
Tesouro entre os anos de 1890 e 1930 indicam que num movimento paralelo concorrência de outros produtores, no último quartel do século XIX. A
à progressão da quantidade e valor do algodão exportado, progrediam também década de 1860 marcara o grande e último surto exportador do algodão
os valores da receita, atestando a importância fundamental que o algodão brasileiro para o mercado mundial, no largo período que se estendeu até a
adquiriu enquanto produção agrícola para a economia norte-rio grandense. década de 1930. Durante esses setenta anos, essa exportação nunca cessou de
Desta forma, a partir da década de 1880 estabeleceu-se a tendência que todo, mas era insignificante no valor total das exportações do país.
se confirmaria nos anos posteriores e que definiria os contornos do quadro A possibilidade de abastecer a indústria têxtil em expansão no sudeste
econômico do Rio Grande do Norte na República Velha - cotonicultura do país, significou uma alternativa de mercado para toda a produção
como mola-mestra da economia norte-rio grandense, polarizadora das algodoeira nordestina e possibilitou a permanência da cotonicultura como
atividades produtivas do Estado. setor agrícola de peso na economia dessa região.
É no desenvolvimento da indústria têxtil algodoeira nacional que A passagem da exportação do algodão nordestino do mercado externo
residem os elementos explicativos para o quadro econômico norte-rio para o mercado interno, tem sido referida por diferentes autores como Caio
grandense na República Vc1ha. Prado Jr., Stanley Stein, Edgar Carone, Wilson Cano e Paul Singcr". Com
exceção deste último, que dedica parte do seu trabalho à análise do
desenvolvimento econômico e evolução urbana de uma cidade nordestina-
Algodão e mercado interno Recife -, nos demais autores, a problemática das relações entre a
cotonicultura do Nordeste e a indústria têxtil nacional é colocada, na maioria
Alguns dos mais conhecidos e consagrados estudos que envolvem o das vezes, a partir de uma visão unilateral, ou seja, do ponto de vista dessa
tema da industrialização brasileira, embora apresentem análises e industrialização. Novamente aqui observa-se o favorecimento do Sudeste, em
interpretações divergentes, coincidem em alguns pontos''. relação aos trabalhos de pesquisa.
O primeiro deles é o da delimitação do período que marca o início do No estudo por nós desenvolvido, analisamos a evolução interna da
processo de crescimento industrial no Brasil. É assim que os anos de 1880 economia norte-rio grandense a partir dessa problemática. Neste artigo,
são apontados como aqueles a partir dos quais se instala um processo de entretanto, nos restringimos a levantar alguns pontos sobre o significado da
industrialização. expansão da cotoniculLura no Rio Grande do Norte.
Um segundo ponto em comum, entre os diferentes estudos, refere-se ao A partir de 1880 os vínculos que se estabeleciam entre a produção
problema da localização espacial dessa industrialização em curso. Imbricado algodoeira nordestina e a indústria nacional foram se consolidando cada vez
com o setor cafeeiro, o setor industrial desponta e se firma na região sudeste mais.
O consumo interno do produto no Brasil chegou mesmo a se fazer em
detrimento das exportações para o Exterior. Ao findar a primeira década do
4 Além do algodão c açúcar, os produtos mais importantes dentre os tradicionais na pauta de século XX, a produção pernambucana, por exemplo, já se dirigia
exportação do estado eram: o sal, o couro, a borracha e a cera de camaúba. preferencialmente para as fábricas têxteis e de fiação nacionais. Para ser
5Vejam-se os trabalhos de: SINGER, Paul. Desenvolvimento econômico e evolução urbana.
2- ed., São Paulo, Nacional, (s.d.); SILVA, Sérgio, obra citada; CANO, Wilson, obra citada e
MELLO, 1. M. Cardoso de, obra citada. 6Vejam-se as obras já mencionadas desses autores.

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exportado para o mercado mundial, restava apenas o que não tivesse Dessa forma, coexistiam um mercado externo carente de matéria-prima
condições de ser consumido internamente. de boa qualidade e um mercado interno igualmente carente em crescimento, e
Os principais países compradores do algodão nacional eram então a apto a consumir um algodão cujas técnicas de cultivo e bcncficiarncnto
Grã-Brctanha, Portugal e França. Juntos respondiam pelo consumo de 91 % faziam-no de baixa qualidade.
da exportação brasileira, cabendo a esses países, respectivamente, 75%, 14% Cabem aqui algumas referências à indústria têxtil algodoeira da própria
e2%. região Nordeste.
Quanto aos Estados brasileiros produtores/exportadores sua participação O setor têxtil no Brasil, tendo sido um dos primeiros a desenvolver e
pcrccntual no total das exportações do Brasil em: Pernambuco 40%, Paraíba consolidar-se, se expandiu quase simultaneamente pelas diferentes regiões.
26%, Ceará 10%, Piauí 8%, Rio Grande do Norte 8%, Alagoas 7%, cabendo Isto significava que por um lado a indústria têxtil de diferentes Estados
o restante aos demais Estados. igualavam-se em importância e, por outro lado, a produção e o consumo
No Rio Grande do Norte, as exportações para o exterior dos principais estavam restritos, ambos a uma mesma área.
produtos do Estado - algodão, caroço de algodão e açúcar - destinavam-se à O processo que se iniciou com a concentração industrial no Sudeste
Grã-Brctanha e aos Estados Unidos. alterou esse quadro.
As vantagens para a economia nacional de processar o algodão A supremacia dessa região já era indiscutível em 1907, como
internamente, liberando o país de importar tecidos cuja matéria-prima era demonstram os dados do recenseamento industrial desse ano. A área do Rio
produzida aqui mesmo, eram reconhecidas. Mas esteve sempre presente a de Janeiro, incluindo-se o Distrito Federal, reunia então o maior número de
possibilidade de reconquistar para o Brasil uma posição de destaque entre os fábricas e o mais alto valor da produção. Essa preponderância do Rio de
países produtores de algodão para o mercado mundial através da melhoria da Junciro/Distrito Federal, no que se refere à indústria de fiação e tecelagem,
qualidade da produção nacional. Esse ponto de vista foi defendido por ocasião passou a alterar-se paulatinamente entre os anos de 1905 e 1920, quando
da Primeira Conferência Algodoeira ocorrida no Rio de Janeiro, em 1915, então São Paulo sobrepôs-se a todos os demais Estados. Esse crescimento da
por iniciativa da Sociedade Nacional de Agricultura. indústria têxtil paulista inseria-se num processo mais amplo que era o
A possibilidade de aumentar a produção brasileira, com vistas aos crescimento de todo o parque industrial de São Paulo, no período referido.
consumidores europeus, encontrava respaldo. Com efeito, o aumento da Paralelamente a esse processo de concentração industrial no Sudeste,
procura de algodão em progressivo no mercado mundial. ocorreu uma diversificação e aperfeiçoamento da produção têxtil que colocou
A Grã-Brctanha, por exemplo, embora fosse o principal importador do essa região em condição de se lançar na conquista do mercado nacional,
algodão brasileiro, recebia dos Estados Unidos da América 80% do algodão concorrendo com a similar inglesa, cujos produtos dominavam aquelas
consumido por suas fábricas, no começo do século XX. O restante provinha faixas de maior poder aquisitivo do mercado consumidor de tecidos do país.
das Índias Inglesas e do Egito, suas colônias. O progresso técnico e a conquista do mercado nacional, levados a efeito
Essa dependência foi tanto mais nefasta quanto o desenvolvimento da pela indústria têxtil algodoeira do Sudeste, eram manifestações de sua
indústria têxtil americana que implicou num consumo cada vez maior do preponderância frente à das demais regiões brasileiras.
algodão produzido no próprio país. Isto gerou uma escassez crescente de Dentro desse processo da evolução da indústria têxtil algodoeira
matéria-prima na Europa. nacional, o Nordeste entrou em descompasso frente ao Sudeste, embora estas
A qualidade da fibra brasileira, entretanto, impedia que o país regiões tivessem partido de condições senão idênticas, pelo menos
respondesse positivamente ao aumento da procura internacional do algodão e semelhantes. Assim em 1907, havia no Nordeste - aí incluindo-se Bahia,
desta forma mantinha-se a exportação brasileira para o Exterior em índices Pernambuco, Ceará, Alagoas, Sergipe, Parafba e Rio Grande do Norte - um
insignificantes. totat de 38 fábricas, número que quase se igualava ao de Minas Gerais
Por seu turno, havia uma industria têxtil nacional que no seu processo tomada isoladamente, que contava com 36 unidades fabris. O valor total da
de evolução técnica começara produzindo, basicamente, tecidos de qualidade produção nordestina, nesse ano, foi inferior ao do Estado de São Paulo,
inferior. A esse tipo de tecidos adequava-se um algodão também de baixa também tomado isoladamente, ou seja, 31.015 contra 44.990 mil réis.
qualidade. No Nordeste, excetuando-se a Bahia, o mais importante centro têxtil
era o de Pcrnambuco. Embora não tivesse um número de fábricas muito

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maior do que outros Estados da mesma região, como Ceará e Alagoas, Apesar disso, e ainda que os dados disponíveis sejam escassos,
detinha um valor da produção bastante superior ao dos demais Estados lacunosos e encontrados de forma dispersa nas fontes existentes, é possível
nordestinos, e próximo ao da Bahia, segundo os dados da mesma fonte uma visão aproximada da relação entre a exportação de algodão para os
citada. Nos anos de 1890, a indústria têxtil pernambucana tomou grande portos estrangeiros e para os portos nacionais. Por ela podemos concluir que
impulso e Pernambuco deu os primeiros passos no sentido de conquistar O entre os anos 1900 e 1920, o algodão saído do Estado com destino a portos
mercado regional, exportando tecidos. brasileiros foi sempre superior, tanto em quantidade quanto em valor àquele
Entretanto, essa expansão teve que enfrentar a concorrência dos tecidos que se dirigia para o exterior.
produzidos no Sudeste que, exatamente nesse período, passam a penetrar no O Rio Grande do Norte encontrava-se entre os Estados exportadores de
mercado nordestino. algodão para o porto de Santos e para o do Rio de Janeiro, mas a exportação
No Rio Grande do Norte, a possibilidade de desenvolvimento da do Estado para este último porto era bem superior àquela para Santos. O
indústria têxtil estava sujeita a uma dupla concorrência. Por um lado, havia algodão pcrnarnbucano e o norte-rio grandense eram os principais
aquela exercida pelos tecidos importados das fábricas do Sudeste, e, por abastcccdorcs da indústria têxtil algodoeira localizada no Rio de janeiro e
outro, a concorrência dos tecidos pernambucanos. Neste quadro residem Distrito Federal. Em 1907, a importação de algodão do Rio Grande do Norte
alguns elementos explicativos para o tardio desenvolvimento das fábricas de pelo porto do Rio de Janeiro chegou a superar em muito a dos demais
tecidos no Estado. A primeira indústria têxtil propriamente dita, não só Estados, alcançando 8.964 toneladas, vindo logo a seguir a de Pernanbuco
reunindo um grande número de operários numa mesma fábrica, mas ainda com 2.068 toneladas.
sob a forma de maquinofatura, utilizando a energia a vapor, foi inaugurada Entretanto, é preciso considerar que parte desse algodão, que dava
em 1888 e fechada em 1925. Durante esse período, ela foi a única fábrica entrada no porto do Rio de Janeiro, era daí recmbarcado pela Estrada de Ferro
têxtil existente no Estado. A história da industrialização no Rio Grande do Central do Brasil, com destino às fábricas paulistas,
Norte, entretanto, ainda está por ser escrita. A alternativa que se abriu para a cotonicultura nordestina pela expansão
Ao estímulo constituído pelo desenvolvimento da industria têxtil do do mercado interno, constituído pela indústria têxtil algodoeira nacional,
Sudeste respondeu a cotonicultura nordestina. Ao findar a primeira década do gerou vínculos de interdependência entre os dois setores.
século XX, a preponderância do mercado interno sobre o externo era um fato Singer considera que para o Nordeste havia por um lado a vantagem de
inconteste. O consumo interno do produto era crescente e garantia então contar com um mercado garantido "já que as barreiras alfandegárias excluíam
mercado para quase toda a produção. Entre os anos de 1900 e 1915, o parque competidores externos", por outro lado, segundo o autor, havia a
têxtil paulista, por exemplo, praticamente triplicou sua importação de desvantagem "de estar restrito a um mercado muito menos dinâmico que o
algodão, passando de 27.781 toneladas para 63.514 toneladas. internacional?".
A exportação de algodão pelo Nordeste para os Estados do Sudeste fazia O grau de dependência das fábricas nacionais, em relação à matéria-
parte do chamado comércio de cabotagcm, isto é, o comércio marítimo prima fornecida pelos Estados nordestinos, pode ser aquilatada pelas
interestadual. A inexistência no Brasil de dados estatísticos regulares e conseqüências da praga e da seca ocorridas em 1914-1915. Nesse período,
precisos, referentes ao período de 1889 a 1921, sobre esse intercâmbio, foram destruídos 2/3 da produção do Nordeste, gerando o fechamento de
dilicultava enormemente qualquer pesquisa que envolvesse esse tema. fábricas por falta de matéria-prima.
O problema é ainda maior, quando se trata de Estados nos quais não se Foi nessa oportunidade que os Estados Unidos da América, como
faziam registros sistemáticos e criteriosos sobre o movimento de importação grandes produtores mundiais de algodão, tentaram conquistar o mercado
e exportação de mercadoria, como é o caso do Rio Grande do Norte. brasileiro. Na Primeira Conferência Algodoeira foi denunciada a ameaça da
Dessa forma, toma-se extremamente difícil diseernir com exatidão, entrada livre do algodão americano e os conseqüentes prejuízos que daí
dentre o total da exportação anual de algodão desse Estado, qual a parcela que poderiam advir sobre a economia nordestina. A tentativa foi frustrada, mas
se destinava para o mercado externo e a que se destinava para o mercado permaneceu a questão de garantia de abastecimento para a indústria têxtil
interno. Nas exportações norte-rio grandenses havia um agravante: parte do algodoeira do Sudeste.
algodão saido com destino a Pernambuco era daí reexportado para o mercado
externo.
7S1NGER, Paul, obra citada, p. 313 c 314.

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Foi após essa crise de escassez dos anos de 1914 a 1916, que o Estado ainda quando se trata de estudar a economia nordestina no período da
de São Paulo deu início a um processo de expansão de sua lavoura algodo- República Velha.
eira. O primeiro grande salto da cotonicultura paulista ocorreu após a geada Qualquer interpretação sobre a história econômica regional do Nordeste,
de 1918 que, destruindo cafezais, incentivou a cultura do algodão. A partir de referente ao período 1860 a 1940, que não leve em conta o significado da
então, e mediante avanços e recuos, a produção paulista cresceu, até que nos cotonicultura para a região, necessariamente deve ser considerada como uma
anos trinta, São Paulo foi alçado à posição de principal produtor do país. interpretação limitada.
Foi desta forma que, uma vez cortados os laços de dependência da É preciso retomar a análise da história econômica regional tentando
indústria têxtil algodoeira do Sudeste em relação ao Nordeste "(... ) este que recuperar o significado do algodão nessa economia, de forma a que seja
era um produtor/exportador marginal no mercado internacional, passava superada a escassez bibliográfica, que atualmente existe, sobre o nordeste
agora a sê-lo, também, no mercado nacional"8:· Mas este já é outro capítulo algodoeiro.
na história das relações irucr-rcgíonats no Brasil. Evidentemente, no trabalho por nós desenvolvido, a análise se refere a
um dos Estados nordestinos, e não à região como um todo. O
desenvolvimento de pesquisas sobre a economia de outros Estados do
Consideraç[)es finais Nordeste, buscando avaliar o significado da cultura do açúcar e do algodão,
contribuiria para uma compreensão cada vez mais ampla e profunda sobre a
Durante o espaço de tempo em que a cotonicultura teve na indústria evolução da economia regional nordestina.
têxtil algodoeira do Sudeste um mercado garantido para a sua produção, no Uma outra questão importante é aquela que está relacionada à razão de
Rio Grande do Norte ela foi capaz de provocar mudanças ao nível da ser dessa importância da cotonicultura no Rio Grande do Norte, no período
produção, da comercialização e do financiamento do conjunto do setor em estudo.
agrícola do Estado. A expansão da cultura do algodão só foi possível na medida em que o
Essas mudanças foram especialmente significativas no âmbito de dois crescimento do setor industrial têxtil algodoeiro do Sudeste, gerando a
problemas-chave com que se defrontava a cotonicultura norte-rio grandense: necessidade de matéria-prima, tomou viável a constituição de um mercado
o do êxodo da mão-de-obra e o do escoamento da produção agrícola. As "so- interno, potencialmente apto a consumir o algodão nordestino e, com ele, o
luções" encontradas inseriram-se, também de forma significativa, no quadro norte-rio grandense. Assim, a possibilidade de abastecer as fábricas têxteis
da "política federal de obras contra as secas" que exatamente nesse período, nacionais constituiu um sucedâneo para a perda da posição do algodão
da primeira década do século XX, passa a ser sistematizada. Essas, entretan- brasileiro, no mercado mundial.
to, são questões que não cabem nos limites deste artigo. Por ora, gosta- Essa rcoricntação de mercado era parte de um processo mais amplo que
ríamos de tecer algumas considemçõcs em tomo do que até aqui foi exposto. estava se cstruturando entre o final do século XIX e o começo do século XX
Em primeiro lugar, há que considerar o significado da cotonicultura no - o da constituição de uma Divisão Intracional do Trabalho no Brasil9.
quadro das atividades produtivas do Rio Grande do Norte no decorrer dos anos O contexto em que ocorria essa constituição era aquele caracterizado
de 1880 a 1915, quando ela, em expansão contínua, tomou-se a mais impor- pela emergência e afirmação de um pólo dinâmico no país, que teve sua
tanto atividade agrícola, respondendo pela vitalidade da economia do Estado. origem na expansão da cafeicultura no oeste paulista, originando a formação
Essa constatação indica a necessidade de se repensar a economia nordes- de um núcleo capitalista interno.
tina, mais especificamente a história econômica dessa região, ultrapassando Esse quadro encontrou sua correspondência, ao nível político, pela
uma abordagem tradicional na historiografia brasileira, onde o estudo da implantação da chamada "política dos governadores", através da qual a
história econômica do Nordeste se confundia com o estudo da economia açu- burguesia cafccira paulista consolidou sua hegemonia sobre o conjunto do
careira. Essa abordagem é, certamente, marcada pela importância que a la- país.
voura canavicira teve para o Nordeste, num longo período de tempo _ o A "especialização" da agricultura do Rio Grande do Norte na produção
período colonial brasileiro. O que se observa é que esse enfoque se manifesta do algodão, ocorrendo imbricada ao crescimento e concentração da indústria

90 conceito de Divisão lntranacional do Trabalho foi formulado por SINGER, Paul, obra
8CANO, Wilson, obra citada, p. 95. citada.

170 171
têxtil no Sudeste, correspondeu ao processo de intcgração da economia norte-
rio grandense na Divisão lntranacional do Trabalho .
.,
Esse quadro remete à questão da necessidade de se aprofundar o estudo
da história econômica do Brasil, sob a ótica das relações intcr-rcgionais, tão
pouco utilizada nos trabalhos de pesquisa.
Essas relações se intensificam, precisamente, no processo de instalação
da Divisão Intranacional do Trabalho no país. Dessa forma, esse período
histórico constituiu um "momento" precioso para os estudos de história
econômica, porque nele estão elementos essenciais para a compreensão da
problemática da desigualdade regional no Brasil.

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