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1. Introdução
Em sistemas elétricos de potência (SEP), os curtos-circuitos são chamados
geralmente de faltas, portanto neste documento os termos curto-circuito e falta têm o
mesmo significado.
Em princípio, é importante destacar que o conhecimento dos níveis de curtos-
circuitos em um sistema elétrico tem como principal objetivo definir a capacidade de
interrupção de disjuntores e o estudo da graduação de relés de proteção contra
sobrecorrentes, visando uma operação seletiva e suficientemente rápida para proteger os
diversos dispositivos e equipamentos de um SEP contra os efeitos provenientes de
sobrecorrentes anormais, como acontece comumente nos casos de correntes de curtos-
circuitos.
A análise da natureza de uma corrente de curto-circuito num circuito c.a, desde o
regime transitório até o regime permanente, é muito importante sob o aspecto de
proteção (graduação de relés) e de dimensionamento de disjuntores e chaves-fusíveis no
que tange à capacidade de interrupção.
Neste texto faz-se essa análise, bem como se apresenta a formulação clássica de
cálculo de curto-circuito em um sistema trifásico aterrado, usando componentes
simétricas.
2. Ângulo de fase
São correntes indutivas, geralmente com baixo fator de potência, tendo em vista
que se apresentam atrasadas em relação à tensão pré-falta, tomada como referência. Em
sistemas trifásicos aterrados de distribuição (níveis de tensão da classe15 kV, por
exemplo, 13,8 kV), as correntes de faltas, que não envolvem a terra, apresentam ângulos
típicos, na faixa -70º < θ < -45º. No caso de linhas de transmissão (V ≥ 69 kV),
geralmente esses ângulos estão dentro da faixa -86º < θ < -70º.
Naturalmente, o ângulo das correntes de falta depende do ângulo da impedância
do circuito percorrido pela corrente de falta, que é dado por (1).
X
θ = tan −1 ( ) , (1)
R
3. Regime transitório
Logo após a ocorrência de um curto-circuito, as correntes apresentam um
comportamento assimétrico em relação ao eixo dos tempos (período transitório, cuja
duração máxima é em torno de 6 ciclos de 60 Hz ou 0,1 s), ou seja, a corrente é
assimétrica. Pode ser decomposta em uma componente senoidal somada a uma
1
componente exponencial decrescente (componente contínua ou c.c), cuja duração irá
depender da constante de tempo do circuito, σ = L/R (L=X/2πf), em que f é a frequência
do sistema. Transcorrido o período transitório, a corrente de falta entra em regime
permanente. Neste período, é denominada componente simétrica.
Comumente, as correntes de curtos-circuitos são calculadas no regime
permanente, empregando-se a teoria de componentes simétricas e o teorema de
Thévenin, obtendo-se, assim, os valores eficazes dessas correntes. Por sua vez, os
valores assimétricos são calculados por meio da resolução de equações diferenciais ou
por simulações, empregando-se ferramentas computacionais tais como ATP (Alternative
Transient Program), SIMULINK (módulo de simulação do MatLab), RTDS (Simulador
Digital em Tempo Real), dentre outros.
O comportamento de uma corrente de curto-circuito fica mais claro quando um
circuito RL, alimentado por uma fonte de tensão alternada, e(t), é simulado por meio do
fechamento de uma chave como esquematizado na Figura 1.
t=0 R L
i(t)
e(t) ~
−t
i(t) = I m sen(w t + α − θ) + e τ sen(α− θ)
, (3)
−t
τ
i(t) = I m sen(w t + α − θ) + I m e sen(α − θ)
sendo:
2
L
τ= : constante de tempo do circuito (s);
R
X
θ = tan −1 : ângulo da impedância Z do circuito.
R
A corrente i(t) pode ainda ser escrita na forma reduzida como em (4).
α − θ = 0 ou π ⇒ i cc = 0 ⇒ Não há assimetria
π
α − θ = ± ⇒ i cc,max = m I max = m 2 × I ef,ca ⇒ Há assimetria (5)
2
I ef = I 2max + I ef,
2
ca (6)
Substituindo (5) em (6), obtém-se o valor eficaz máximo de i(t), isto é, o valor
eficaz máximo da componente assimétrica, ou seja:
I ef = 3 × I ef,ca , (7)
3
Assimétrica
Simétrica
4
Assimétrica
Simétrica
5
4. Fator de assimetria
Na prática, é comum o emprego de fatores de assimetria, fassim, para calcular os
valores eficazes das componentes assimétricas de curtos-circuitos. Para isso, multiplica-
se o valor eficaz da corrente, calculado em regime permanente, pelo fator de assimetria
correspondente, determinado no ponto da falta. Os valores típicos de fatores de
assimetria são extraídos de curvas (Figura 6) ou de tabela, Tabela 1, e dependem,
obviamente, do tempo transcorrido após a falta, da relação X/R (no ponto da falta), e do
ângulo de incidência, α, conforme descrito em (9). Para α=0, geralmente os fatores de
assimetria assumem valores entre 1 e 1,8, ou seja, 1≤ fassim < 1,8.
Figura 6 – Curvas de fatores de assimetria para t = 4,17 ms (1/4 de ciclo de 60 Hz); α=0 →AZUL;
α=pi/8 →VERMELHA; α=pi/4 →PRETA; α=pi/2 →MAGENTA
6
1,25 1,029 4,10 1,212 15,00 1,550
1,30 1,030 4,20 1,220 16,00 1,560
1,35 1,033 4,30 1,225 17,00 1,570
1,40 1,035 4,40 1,230 18,00 1,580
1,45 1,037 4,50 1,235 19,00 1,590
1,50 1,040 4,60 1,249 20,00 1,600
1,55 1,043 4,70 1,255 22,50 1,610
1,60 1,045 4,80 1,260 25,00 1,615
1,65 1,047 4,90 1,264 27,75 1,625
1,70 1,050 5,00 1,270 30,00 1,630
1,75 1,055 5,20 1,275 35,00 1,636
1,80 1,060 5,40 1,290 40,00 1,648
1,85 1,063 5,60 1,303 45,00 1,653
1,90 1,065 5,80 1,310 50,00 1,659
1,95 1,068 6,00 1,315 55,00 1,660
2,00 1,070 6,20 1,324 60,00 1,680
2,10 1,075 6,40 1,335
2,20 1,080 6,60 1,350
2275 Icc3F
1970 Icc2F
1649 IccFT
Subestação 186 IccFTm, Rt = 40 Ω
69 kV 13,8 kV P
Impedâncias de Thèvenin no ponto P
∆-YT Z2 = Z1 = 0,0842 + j 0,7159 p.u
Z0 = 0,1314 + j 1,1978 p.u
Vb = 13,8 kV, Sb = 100 MVA
7
X1Th
Falta trifásica: Rel 3 F = (8)
R 1Th
X 0 Th + X1Th + X 2 Th
Falta fase-terra franca: Rel1F = (9)
R 0 Th + R 1Th + R 2 Th
0,7159
Rel 3 F = = 8,5 ⇒ f assim = 1,420 ⇒ I cc,3F,assim,ef = 1,420 × 2275 = 3230,5 A
0,0842
2 × 0,7159 + 1,1978
Rel1F = = 8,8 ⇒ f assim = 1,425 ⇒ I cc,1F,assim,ef = 1,425 × 1649 = 2349,8 A
2 × 0,0842 + 0,1314
• Trifásico
• Bifásico ou dupla-fase
• Bifásicos à terra ou dupla-fase-terra
• Monofásicos à terra ou fase-terra
d
R arco = 28710 × ( Ω) , (10)
I1,4
F
em que:
d: distância de arco inicial em (m) (separação máxima entre fases para faltas polifásicas,
e entre uma fase e um ponto aterrado para as faltas à terra);
IF: corrente de falta em (A);
Rarco: resistência de arco em (Ω).
8
No Quadro 1 são dados valores típicos de resistência de arco durante uma falta
para diferentes níveis de tensão nominal.
Inicialmente, a resistência arco possui valor baixo, com o passar do tempo ela
pode evoluir, aumentando para valores da ordem de 50 ohms ou superiores.
Vf T 13800 / 3
= = 2,65 A , (11)
RF 3000
Va 1 1 1 Va 0
Vb = 1 a 2
a × Va 1 (12)
Vc 1 a a 2 Va 2
9
Em (12), a matriz formada pelos fasores 1, a = 1∠120 o e a 2 = 1∠ − 120 o é
conhecida como matriz de transformação, T.
Va0 1 1 1 Va
1
Va1 = × 1 a a 2 × Vb (13)
3
Va2 1 a2 a Vc
Ia 1 1 1 I a0
Ib = 1 a 2
a × I a1 (14)
Ic 1 a a 2 I a2
I a0 1 1 1 Ia
1
I a1 = × 1 a a × Ib
2
(15)
3
I a2 1 a2 a Ic
10
6.1. Circuitos de sequências
Considere-se os terminais de um gerador síncrono, trifásico aterrado como
mostrado na Figura 8.
a
b
Ea Eb
~ ~
•N
Va
~ Ec
Vb
VNT ZT
c
Vc
Za1 Ia1
Ea1 ~ Va1
E a1 = Va1 − Z a1I a1 ,
(16)
em que:
Ea1: tensão interna de sequência positiva na fase a do gerador;
Va1: tensão de sequência positiva na fase a dos seus terminais do gerador;
Ia1: corrente de sequência positiva na fase a do gerador;
Za1: impedância de sequência positiva do enrolamento da fase a do gerador.
11
b) Circuito de sequência negativa (Figura 10).
Za2 Ia2
Va2
Va2 = − Z a2 I a2 , (17)
em que:
Va2: tensão de sequência negativa da fase a;
Ia2: corrente de sequência negativa da fase a;
Za2: impedância de sequência negativa do enrolamento da fase a.
Za0 Ia0
3ZT Va0
Va 0 = − Z a0 I a0 − 3Z T I a0 = −(Z a0 + 3Z T )I a0 (18)
12
6.1. Falta trifásica com impedância de falta
Para analisar esse tipo de falta, considera-se o sistema mostrado na Figura 12,
cujas tensões fase-terra da fonte trifásica aterrada são Ea, Eb e Ec.
a
b
c
ZF ZF ZF
Za1 Ia1
Ea1 ~ ZF Va1F
Figura 13 – Circuito de sequência positiva para falta trifásica através de uma impedância
De acordo com o circuito, a corrente Ia1 é dada por (19). Já Ia0 =0 e Ia2 =0, pois a
falta é equilibrada. Então, de acordo com circuito da Figura 13, escreve-se:
E a1
I a1 = (19)
Z a1 + Z F
Ea
I a = I a1 =
Z a1 + Z F
Ea
I b = a 2 I a1 = a 2 ×
Z a1 + Z F
Ea
I c = aI a1 = a ×
Z a1 + Z F
13
Va1F = Z F I a1 (20)
Substituindo esse valor em (12), obtêm-se as tensões nas fases no ponto da falta,
conforme (21).
VaF = Va1F = Z F I a1
VbF = a 2 Va1F = a 2 × Z F I a1 (21)
VcF = aVa1F = a × Z F I a1
a
b
c
ZF ZF ZF
Ia Ib Ic
ZT
Va (ZF + Z T ) ZT ZT Ia
Vb = ZT (Z F + Z T ) ZT × Ib (23)
Vc ZT ZT (Z F + Z T ) I c
14
Va0 1 1 1 (Z F + Z T ) ZT ZT 1 1 1 I a0
1
Va1 = × 1 a a ×
2
ZT (Z F + Z T ) ZT × 1 a2 a × I a1 (24)
3
Va2 1 a2 a ZT ZT (Z F + Z T ) 1 a a 2 I a2
Va0 (Z F + 3Z T ) 0 0 I a0
Va1 = 0 ZF 0 × I a1 , (25)
Va2 0 0 Z F I a2
Va2 = ZF Ia2
Za1 Ia1
Ea1 ~ ZF Va1=Va1F
Za2 Ia2
ZF Va2 =Va2F
15
Za0 Ia0
ZF
Va0 =Va0F
3ZT
1
I a0 = I a1 = I a2 = I a (27)
3
E a = Va + VT , (28)
Ea
I a1 = (30)
Z a0 + Z a1 + Z a2 + 3Z T
3 Ea
Ia = (31)
Z a0 + Z a1 + Z a2 + 3Z T
16
Considerando Za1=Za2, tem-se:
3 Ea
Ia = (32)
2 Z a1 + Z a0 + 3Z T
Para que (27) seja satisfeita, os circuitos de sequências devem ser ligados em
série, como mostrado na Figura 17.
Figura 17 – Ligação dos circuitos de sequências positiva, negativa e zero para cálculo de falta fase-terra
Va 0 = − (Z a0 + 3Z T )I a0
Va1 = Ea1 − Z a1I a1 (33)
Va 2 = − Z a 2I a 2
VaT 1 1 1 Va 0
VbT = 1 a 2
a × Va1 (34)
VcT 1 a a 2 Va 2
A substituição de (33) em (34), resulta nas tensões de falta nas fases, no ponto da
falta.
17
6.4. Curto-circuito bifásico através de uma impedância
Geralmente, o curto-circuito bifásico se desenvolve através de uma impedância
de falta, ZF, que se apresenta entre as duas fases defeituosas (Figura 18).
a
b
c
IF
ZF
Vb − Vc
IF = ⇒ Vc = Vb − Z F I F
ZF
Va0 1 1 1 Va
1
Va1 = × 1 a a2 × Vb
3
Va2 1 a2 a Vb − Z F I F
1
Va1 = [Va + aVb + a 2 (Vb − Z F I F )] (35)
3
Sendo Va0 = 0, tem-se:
Va = Va1 + Va2
Vb = a2Va1 + aVa2
1
Va1 = [(Va1 + Va2 ) + a(a 2 Va1 + aVa2 ) + a 2 (aVa1 + a 2 Va2 − Z F I F )] (36)
3
18
Substituindo IF em (36), obtém-se:
1
Va1 = {(Va1 + Va2 ) + a(a 2 Va1 + aVa2 ) + a 2 [aVa1 + a 2 Va2 − Z F I a1 (a 2 − a)]} (37)
3
j 3 Ea
I c = −I b = (39)
Z a1 + Z a2 + Z F
E a1
Va = 2 (Z a2 + Z F ) (40)
Z a1 + Z a2 + Z F
Va0 1 1 1 Va
1
Va1 = × 1 a a × 0
2
(41)
3
Va2 1 a2 a 0
Va
Va0 = Va1 = Va2 = (42)
3
19
Sendo Ia = 0, então:
I a0 + I a1 + I a2 = 0 (43)
Figura 16 – Ligação dos circuitos de sequências positiva, negativa e zero para cálculo de bifásica à terra
Ea
I a1 = (44)
Z (Z + 3Z T )
Za1 + a2 a0
Za2 + Za0 + 3Z T
Ainda, de acordo com esse circuito, tem-se: Va0 = Va1 =Va2 = Ea1 – Za1 Ia1.
Então:
E a − Z a1I a1
I a2 = − (45)
Z a2
E a − Z a1I a1
I a0 = − (46)
Z a 0 + 3Z T
I b = I a 0 + a 2 I a1 + aI a 2 (47)
I c = I a 0 + aI a1 + a 2 I a 2 (48)
20
Finalmente, a corrente na falta é:
I F = I b + I c = 3 I a0 (49)
As componentes simétricas das tensões são: Va0 = Va1=Va2 = Ea1 – Za1 Ia1.
VaT 1 1 1 Va 0
VbT = 1 a 2 a × Va 1
VcT 1 a a 2 Va 2
3 Ea
VaT = , (50)
Z a1 Z a1
1+ +
Z 0 Z a2
em que:
Z0 = Za0 + 3ZT
j 3 Ea
−
I CC,2F Z a1 + Z a2 j 3 Z a1
= 2
=− 2 (51)
I CC,3F a Ea a (Z a1 + Z a2 )
Z a1
Se Za1= Za2, resulta:
I CC,2F j 3 3∠ − 90
=− 2
= o
= 0,866∠ − 330 o (52)
I CC,3F 2a 2∠240
Em módulo, tem-se:
I CC,2F = 0,866 × I CC,3F (53)
21
6.7. Potências de curtos-circuitos
Comumente, definem-se os níveis de curtos-circuitos de um sistema elétrico
trifásico om base nas potências de curtos-circuitos trifásicos. Também é comum o
cálculo da potência de curto-circuito monofásico franco (Zterra= 0).
Scc,3φ = Vpprefal
. u × I cc,3 φ, p . u (p . u)
prefal
Se Vp.u = 1 p.u ,
então:
Scc,3φ,p . u = I cc,3φ,pu
22
Transmissão (LT) Z1 → 0,001 pu/km (230 kV, 100 MVA)
Transformador de distribuição: 3% a 5%
23
a) Curto-circuto monofásico: fase b-T
Fase a (vermelha) e fase c (azul): zero; fase b (verde): corrente de falta à terra
3000
[A]
2000
1000
-1000
-2000
0,19 0,21 0,23 0,25 0,27 [s] 0,29
(f ile Simula_f altas_Aula_MPEE.pl4; x-v ar t) c:X0006A-X0001A c:X0006B-X0001B c:X0006C-X0001C
c:X0006C-X0001C
As correntes das fases a e c são não aparecem no gráfico porque são iguais a
zero.
b) Curto-circuto trifásico: 3F
2000
1000
-1000
-2000
0,190 0,201 0,212 0,223 0,234 [s] 0,245
(f ile Simula_f altas_Aula_MPEE.pl4; x-v ar t) c:X0006A-X0001A c:X0006B-X0001B c:X0006C-X0001C
c:XX0019-XX0012
24
c) Curto-circuto bifásico (bc): 2F
1000
500
-500
-1000
-1500
-2000
0,195 0,205 0,215 0,225 0,235 0,245 [s] 0,255
(f ile Simula_f altas_Aula_MPEE.pl4; x-v ar t) c:X0006A-X0001A c:X0006B-X0001B c:X0006C-X0001C
2000
500
-1000
-2500
-4000
0,195 0,205 0,215 0,225 0,235 [s] 0,245
(f ile Simula_f altas_Aula_MPEE.pl4; x-v ar t) c:X0006A-X0001A c:X0006B-X0001B c:X0006C-X0001C
c:XX0019-XX0012
25