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QUATRO AGENTES
DA USO
Autor
WILLIAM VOLTZ
Tradução
RICHARD PAUL NETO
Digitalização e Revisão
ARLINDO_SAN
Euhja — contato mudo entre terranos e o verme do
pavor, as lutas, a salvação... e a grande armadilha!
O monstro saiu devagar de trás das árvores, como se não soubesse para onde ir. Seu
corpo de verme tinha pouco mais de vinte metros de comprimento e quase três de
diâmetro.
Na ponta do corpo monstruoso via-se uma cabeça redonda de pelo menos cinco
metros de diâmetro, com dois olhos enormes.
Claude Collignot ficou apavorado ao ver o monstro abrir a enorme boca. As tenazes
uniformemente distribuídas em torno da cabeça estavam em movimento.
O verme do pavor passou a andar mais depressa. Sua cabeça precipitou-se em
direção a Collignot, que recuou instintivamente para o fundo da poltrona.
— Basta! — gritou Atlan.
O sargento Gilmore, que operava o projetor tridimensional, desligou o aparelho e
voltou a acender as luzes.
Collignot esfregou os olhos. Viu o Capitão Firgolt afastar-se lentamente da parede e
apontar para a tela escura.
— Não poderíamos ter obtido uma imagem mais fiel do inimigo — disse, dirigindo-
se ao Lorde-Almirante Atlan. — Todo mundo já tem uma idéia de como é a criatura que
teremos de enfrentar.
— Infelizmente não conseguimos filmar todas as características do verme do pavor
— observou Perry Rhodan, que estava sentado numa poltrona, em posição mais afastada.
— Não se esqueça de que o mesmo pode dar saltos de cento e cinqüenta metros. Isso
basta para fazer dele um inimigo muito perigoso, sem falar na capacidade de resistir às
armas mais potentes.
O grupo de homens que estava conversando encontrava-se no interior da nave
Carbula, um cruzador leve da USO. O calendário registrava o dia 17 de dezembro de
2.326.
Atlan escolhera quatro agentes da USO para uma missão muito importante. Há
algum tempo ocorrera a deserção do Tenente
Ebrolo, um anti que trabalhava como agente da USO. Por isso, o lorde-almirante
recorrera agora aos terranos. Nessa missão especial Atlan resolvera evitar de qualquer
maneira a participação de inteligências estranhas. A escolha recaíra no Capitão Brent
Firgolt e nos Tenentes Warren, Kopenziak e Collignot, que eram especialistas altamente
treinados.
— Os senhores já sabem qual é a tarefa que têm pela frente — disse Atlan,
dirigindo-se aos quatro homens. — Não se trata de capturar ou matar o verme do pavor.
Os senhores deverão testar o verme do pavor sem criar problemas para si mesmos.
— Tomara que o verme do pavor concorde com isso — observou o Tenente Aldo
Kopenziak em tom sarcástico.
Um sorriso quase imperceptível surgiu no rosto de Atlan. Conhecia as
peculiaridades de seus amigos terranos e sabia como lidar com eles.
— Pergunte a ele — sugeriu. Os homens riram.
O cruzador ligeiro Carbula estava estacionado nas imediações do planeta Euhja, o
terceiro dos cinco mundos que circulavam em torno da estrela Euthet. O sistema ficava a
8.314 anos-luz do planeta Terra, longe das rotas de tráfego galáctico.
Euhja era um mundo ara. Ou melhor, havia sido até o momento em que os cientistas
aras haviam trazido gafanhotos córneos em uma de suas naves. Assim que os monstrinhos
saíram da nave, despertaram do torpor, iniciaram seu processo de divisão ininterrupta e
devastaram o único continente existente em Euhja.
Dali em diante não havia mais nenhum núcleo dos aras por lá. Os médicos
galácticos ainda tiveram tempo para expedir um pedido de socorro, mas o auxílio chegou
tarde.
Euhja era um mundo aquático. Só possuía um único continente, que não passava de
uma ilha do tamanho da Groenlândia. A massa de molkex, formada pela divisão e
multiplicação dos gafanhotos córneos, só fora suficiente para a criação de um único
verme do pavor.
E esse exemplar único fora escolhido por Perry Rhodan e Atlan, depois de uma série
de conferências, para fazer novas descobertas sobre essa espécie de monstro.
Infelizmente Euhja não era o único mundo destruído pelos gafanhotos. A leviandade
e a irresponsabilidade haviam trazido a invasão dessa praga a quase duzentos planetas,
isso a um tempo em que já se tinham passado quinze dias desde o início desses
acontecimentos desastrosos.
E foi assim que nesses 200 mundos os vermes do pavor só surgiram 15 dias depois
de seu aparecimento nos planetas em que já havia ovos dos mesmos.
— Como sabem, conseguimos fazer observações em vermes do pavor no planeta
Zanmalon — disse Atlan. — Lá foram filmadas as cenas a que acabam de assistir. Neste
meio tempo, todos os dados disponíveis sobre os vermes do pavor foram introduzidos no
computador hiperimpotrônico da Lua terrana, para serem interpretados.
— E Natan, o computador, formulou algumas hipóteses espantosas — disse o
Capitão Firgolt.
— É verdade — confirmou o comandante supremo da USO. — Natan apurou, com
base nos dados existentes, que os vermes do pavor devem possuir certo grau de
inteligência. Diz que a mesma excede em cerca de dez vezes a de um cão pastor terrano.
A isso deve ser acrescentado um instinto muito preciso e uma série de atos previamente
treinados.
— Quem vai apurar se isso é verdade somos nós — disse Firgolt em tom calmo.
— Natan ainda apurou que, segundo parece, a massa de molkex é utilizada por
alguma raça desconhecida no revestimento protetor de suas naves. O computador não foi
capaz de informar como isso é feito.
Atlan fez um sinal para o sargento Gilmore. Este guardou o projetor tridimensional e
enrolou a tela.
— Neste meio tempo a situação da Galáxia se estabilizou — disse Rhodan sem
levantar-se da poltrona. — Os gafanhotos córneos, saídos dos ovos e formados por meio
da divisão contínua, transformaram-se em molkex, que por sua vez deu origem aos
vermes do pavor. Em Euhja temos uma última oportunidade para testar um desses
monstros. Não preciso ressaltar a importância da missão. Ainda não sabemos muito bem
o que está acontecendo, mas o perigo é evidente.
— Eu e meus homens faremos tudo que estiver ao nosso alcance — prometeu
Firgolt com a voz tranqüila.
— Assim que tiverem saldo da Carbula, Atlan e eu voltaremos para bordo da Eric
Manoli, onde aguardaremos os acontecimentos — disse Rhodan. — A Carbula
permanecerá no interior do sistema solar de Euthet. Dessa forma poderão pedir auxílio à
nave, assim que surja algum perigo.
Claude Collignot abriu o bolso do uniforme e tirou um charuto negro.
— E nosso equipamento especial, sir? — perguntou, dirigindo-se a Atlan.
O lorde-almirante esperou que Collignot acendesse o charuto.
— Será colocado num submarino. Não o largaremos diretamente na ilha, conforme
sugeriu o Tenente Warren — disse finalmente. — O submarino, bem camuflado, colocará
todo o equipamento necessário ao alcance de suas mãos, e ao mesmo tempo evitará que
alguém o localize.
— Compreendo, sir — disse Warren. — Iremos ao continente, vindos do mar.
— Os senhores disporão de todos os equipamentos de que poderão precisar durante
a permanência em Euhja — prosseguiu Atlan. — O mais importante é que não se
esqueçam do conversor de símbolos, que nos prestou serviços tão valiosos quando nos
comunicamos com os pos-bis. Talvez a inteligência do verme do pavor seja suficiente
para descobrir um método de estabelecer contato conosco.
— Claude ainda está preocupado, sir — disse o Capitão Firgolt, um oficial alto e de
ombros largos, de olhos castanhos e orelhas salientes.
Collignot, com o charuto pendendo molemente no canto da boca, lançou um olhar
desconfiado para seu superior.
— Pode falar, Tenente Collignot — disse Atlan, dirigindo-se ao homem de cabelos
negros.
— Não é nada, sir — apressou-se este a dizer.
Kopenziak, o mais idoso dos quatro agentes, brindou Collignot com um sorriso
irônico.
— Ele tem medo que alguma coisa possa acontecer aos seus charutos, sir — disse.
— Como Euhja é um mundo aquático, receia que a umidade possa amolecê-los.
Collignot ficou ruborizado e passou a mão no cabelo.
— Bem, sir, a gente tem de pagar um preço absurdo por estes charutos — disse em
tom valente.
Lembrou-se do verme do pavor que vira poucos minutos antes na tela.
Pelo que se concluía do aspecto do monstro, não teria muitas oportunidades para
fumar...
2
Viu que as quatro criaturas ficaram paradas. Ao que parecia comunicavam-se entre
si. Isso não era necessariamente um sinal de inteligência. Muitas raças possuíam uma
forma primitiva de comunicação por meio de sinais.
Os hábitos de sua raça impeliam-no a matar os quatro habitantes do mar, mas seu ser
revoltou-se contra as tendências inatas. Por algum tempo manteve-se completamente
imóvel, para observar os desconhecidos.
Refletiu sobre um meio de assustá-los. Seria interessante observar a reação dessas
criaturas miseráveis quando ele aparecesse.
A idéia chegou a diverti-lo. Será que a natureza não fizera uma brincadeira macabra
ao dotar justamente os monstruosos vermes do pavor com uma inteligência superior?
Como teria surgido sua raça? De onde vinha? O que teria aparecido em primeiro lugar: os
gafanhotos córneos, o verme do pavor ou o molkex?
Estas perguntas deixaram-no intrigado. Voltou a dedicar sua atenção exclusivamente
aos desconhecidos.
Começou a impacientar-se. Ergueu-se ligeiramente e desceu pela encosta.
Naquele momento aconteceu uma coisa estranha.
Os seres que via à sua frente espalharam-se apressadamente. Dois deles correram
em direções opostas, o terceiro veio em sua direção e o quarto continuou onde estava. Por
um instante o verme do pavor sentiu-se chocado. Mas chegou à conclusão de que isso não
queria dizer nada. Aquelas criaturas ainda não o haviam descoberto. A melhor prova disso
era o fato de que uma delas vinha exatamente em sua direção.
Nenhuma criatura, muito menos uma criatura que possuísse inteligência, seria
destemido a ponto de ficar parado ao vê-lo, quanto mais caminhar em sua direção.
A separação dos desconhecidos devia ter um motivo diferente. Talvez a devastação
da terra os deixasse apavorados, fazendo com que se afastassem em todas as direções
para verificar se em toda parte o quadro era o mesmo.
Indiretamente deviam a vida ao fato de que em torno deles tudo estava morto.
Não sentia pena por essas criaturas, mas compreendia perfeitamente a dor e a
tristeza que deviam sentir ao ver sua terra devastada. Qualquer criatura, por menor que
fosse seu grau de inteligência, possuía um instinto seguro do seu habitat. Muitas raças
chegavam a morrer quando retiradas do seu ambiente.
Seguiu atentamente os movimentos dos nativos. Ficou espantado ao notar a
segurança com que se moviam em terra, pois ao que tudo indicava eram habitantes do
mar.
Será que ao vê-lo fugiriam para voltar ao oceano? Resolveu que, se isso
acontecesse, ele os mataria antes que alcançassem o elemento salvador. Se conseguissem
fugir dele por certo não voltariam, pois o choque os manteria afastados por muito tempo
da terra. Os benévolos apareceriam neste mundo antes que se aventurassem novamente
para fora da água.
Viu o ser que, segundo acreditara, estava caminhando exatamente em sua direção, se
desviar um pouco. Apesar disso não acreditava que o tivesse visto. Não receava ser
descoberto, pois esses anões não lhe poderiam fazer nada.
O verme do pavor sentiu-se grato diante da idéia de que, além de um cérebro
inigualável, fora dotado de um corpo quase inexpugnável.
Mais uma vez a lembrança da ligação entre sua espécie e os benévolos lhe provocou
uma sensação desagradável. Havia algo de errado nisso, algo que devia ser mudado.
Procurou descobrir a série de conexões, mas seu saber coletivo não foi suficiente para
isso, pois resumia-se aos grupos de conhecimentos básicos. Só numa área dispunha de
conhecimentos mais detalhados. Sabia quais eram suas obrigações para com os
benévolos.
Perdeu de vista dois dos nativos, que desapareceram atrás das colinas que cobriam
duas penínsulas. Isso não preocupava o verme do pavor. Notou novamente, que o ser que
de início caminhara diretamente para ele, estava descrevendo uma curva ampla, mas
atribuiu o fato a algum acaso.
A quarta criatura continuava parada junto à água. O verme do pavor ficou espantado
ao notar que a mesma possuía um hálito tão quente que de vez em quando produzia
pequenas nuvens de fumaça. Isso contrastava fortemente com a suposição de que a forma
de vida que tinha à sua frente podia viver tanto na água como na terra.
Nenhum animal aquático seria capaz de produzir fumaça; quanto a isso não havia a
menor dúvida.
Resolveu mostrar-se abertamente aos nativos.
Ergueu-se ligeiramente sobre a parte traseira do corpo, fazendo com que os dois
braços-tenazes balançassem livremente no ar. Encurvou o corpo e encolheu a parte
posterior do mesmo. Sentiu a força que havia em seu interior. Seu ser parecia entesar-se
com a força de uma mola.
Deu um salto de cem metros em direção à água.
Tinha certeza de que pelo menos dois dos desconhecidos o haviam observado.
Esperava que fugissem, apavorados.
Mas não aconteceu nada.
A criatura que se encontrava perto da água nem sequer se moveu. Mantinha-se em
posição quase provocadora, produzindo nuvens de fumaça e colocando, a intervalos
regulares, uma das extremidades do corpo junto ao crânio.
O verme do pavor sentiu-se estupefato, ao constatar que o desconhecido que
caminhava obliquamente para a colina em que se encontrava também não esboçou a
menor reação. Viu-se diante de um mistério. O comportamento desses seres era
incompreensível.
Será que eram primitivos a ponto de nem terem a capacidade de avaliar um perigo
iminente? O verme do pavor sentiu-se cada vez mais perplexo. O aspecto dos nativos
levava à suposição de que seu grau de inteligência era bastante reduzido, mas seu
comportamento parecia ser um sinal de debilidade mental.
O verme do pavor deu outro salto, que o fez chegar a cem metros da praia. Não
havia a menor dúvida de que sua locomoção fora notada.
Naquele momento aconteceu uma coisa que o deixou totalmente confuso.
O ser que se encontrava junto ao mar deitou confortavelmente na areia e passou a
contemplar a água.
Eles o estavam ignorando!
Para essas criaturas, o verme do pavor nem existia. Os animais que tinha à sua frente
eram extremamente estúpidos. A decepção que sentiu quase chegou a ser dolorosa. Ao
mesmo tempo começou a aborrecer-se. Bem, ele lhes daria um sinal de sua presença
nesse continente ridículo. Mostraria que era forte, poderoso e invencível, e estes
perceberiam que o dono dessa ilha era ele.
Então o monstro abriu a boca gigantesca.
O nativo que se encontrava junto à água virou-se e encarou-o.
“Está me olhando”, pensou o monstro. “Está olhando para mim. Sei disso, embora
a esta distância não possa ver seus olhos.”
Lembrou-se de que talvez os olhos dessas criaturas fossem muito fracos. Talvez só
agora tivessem notado sua presença. Voltou a fechar a boca enorme. Esperou que os
nativos se levantassem e fugissem.
Mas não aconteceu nada disso. A criatura miserável ficou deitada e continuou a fitá-
lo.
“O medo deve tê-lo paralisado”, concluiu o verme.
Virou-se instintivamente para olhar a outra criatura, que estivera de pé bem perto
dele. Teve dificuldade de distinguir a figura minúscula naquele solo escuro. Mas logo viu
o outro habitante dos mares.
O mesmo estava calmamente parado atrás dele, a uma distância não muito grande, e
olhava em sua direção.
“O que é isso? — perguntou-se mentalmente o verme do pavor. “Até parece que
estas criaturas não sentem medo.”
“Estão me observando”, pensou. “Realmente parece que estão me observando.”
Mas logo chegou à conclusão de que isso seria impossível. Nenhum ser, por mais
primitivo que fosse, teria coragem para ficar parado perto dele. Será que a mentalidade
desses desconhecidos era diferente da de outras raças? Será que não conheciam o medo?
Isso significaria que não possuíam o instinto de autoconservação. Nesse caso aceitariam
qualquer coisa que acontecesse com eles como se fosse a coisa mais natural deste mundo.
Não se defenderiam de nenhum ataque. Tudo lhes seria indiferente.
O verme do pavor não acreditava na existência de seres desse tipo.
Voltou a abrir a boca, mas desta vez não perdeu tempo. Um raio energético saiu dos
pólos de irradiação, atravessou o ar com um chiado e atingiu o solo ao lado do nativo que
permanecia junto ao mar. O calor fez tremeluzir o ar. A areia transformou-se numa massa
vitrificada. Uma trilha negra marcava a trajetória de impacto do tiro energético.
O verme do pavor teve uma sensação de triunfo ao ver o nativo levantar-se de um
salto e sair correndo pela praia. Começava a divertir-se. Conseguira despertá-los da
letargia. Outro raio saiu de sua boca. A energia descarregou-se bem à frente do fugitivo.
Este deu um salto enorme para dentro da água, para não morrer queimado. O monstro
ronronava entusiasmado. Aqueles seres tinham medo, suas reações eram idênticas às de
quaisquer outros seres que entrassem em contato com os vermes do pavor. Ficou ansioso
para ver o que aconteceria em seguida.
Metade do corpo daquela criatura miserável estava coberta pela água. Depois de
algum tempo levantou a cabeça e olhou cautelosamente em torno. Parará de produzir
pequenas nuvens de fumaça.
Muito satisfeito, o verme do pavor contemplou sua vítima.
O próximo disparo provaria definitivamente a essa criatura que ninguém brinca com
o verme do pavor.
***
O Tenente Claude Collignot lançou um olhar triste para o pedaço de charuto
molhado que segurava na mão. O salto com que se colocara a salvo diante da fera
inutilizara a preciosa erva.
Um homem mundano como ele não deveria meter-se com criaturas desconhecidas,
muito menos com monstros estúpidos que faziam questão de exibir sua força bruta,
investindo contra tudo que se movesse perto deles.
Se esse gigante possuísse dez vezes a inteligência de um cão, ele não o mostrava.
Bem, até mesmo Natan poderia cometer um erro. Na opinião de Collignot esse monstro
não era mais inteligente que um rato de navio. Perguntou a si mesmo o que havia a
observar por ali. Poderiam dar-se por satisfeitos se escapassem com vida. Bastaria que
esse bebê gigante fizesse boa pontaria, e ele estaria perdido.
Collignot imaginou que estivesse deslizando aos sons de uma valsa antiqüíssima
sobre a pista de dança muito lisa do Hotel Jambuin de Terrânia. Passou gostosamente a
língua pelos lábios molhados. Se as coisas continuassem assim, executaria uma dança
bem alegre ali mesmo. O regente da orquestra seria aquele dragão, e ele, Collignot,
saltaria pela praia ao ritmo dos tiros energéticos.
“É bom que um homem possua senso de humor”, pensou Collignot. Mas na situação
em que se encontrava teria preferido um jogo de equipamento especial. Acontece que
haviam recebido ordens para aparecer na ilha completamente desguarnecidos.
Teve vontade de nadar para as profundezas do mar, mas por certo o Capitão Firgolt,
que estava de pé no alto da encosta, não gostaria disso. Tinham de descobrir os hábitos do
monstro.
“Que belos hábitos”, pensou Collignot, zangado.
A água fria lhe fazia bem e formava um contraste agradável com o ar superaquecido
dos locais em que se verificaram as descargas energéticas. “Todo cavalheiro deve tomar
um banho de vez em quando”, pensou o agente da USO.
O próximo disparo da fera arrancou-o abruptamente das reflexões.
Em torno dele a água começou a chiar e a borbulhar como se uma fonte tivesse
saído da terra. Vapores ergueram-se. Collignot espirrou. Os olhos lacrimejantes
procuraram enxergar para além da fumaça e distinguiram os contornos do verme do
pavor. Seus dedos agarraram-se ao fundo do mar. Apressou-se em pôr a cabeça embaixo
da água.
As ondas não bastaram para refrigerar a água com a rapidez que seria necessária. O
bombardeio do monstro fazia com que o calor aumentasse sensivelmente.
“Está me cozinhando como se eu fosse um peixe”, pensou Collignot apavorado.
O calor começou a tornar-se insuportável e o especialista levantou-se de um salto.
Em torno dele rugia o inferno. Collignot avançou pela cortina de fumaça e admirou-se de
ainda estar vivo. Cambaleando e correndo, conseguiu aumentar em alguns preciosos
metros a distância que o separava do ser que o martirizava.
Lançou um olhar para a encosta e viu o Capitão Firgolt, que saltava que nem um
louco entre as rochas e emitia gritos estridentes. Ao que parecia pretendia distrair o verme
do pavor.
Collignot sentiu-se grato ao constatar que deixara de servir de alvo para os
exercícios de tiro do monstro. Ficou parado. Fungava. O ar escaldante parecia ter
queimado sua garganta. Tirou um drope de água do cinto do traje subaquático e enfiou-o
na boca. Começou a chupá-lo gulosamente.
Aos poucos foi-se sentindo melhor.
“Agora o monstro vai atacar o capitão”, pensou Collignot.
Deixou-se cair na areia e pôs-se a refletir sobre como ajudar Firgolt caso a situação
se tornasse crítica para o mesmo.
***
Mais que o do tenente, o treinamento do Capitão Firgolt fora talhado para a
versatilidade. Isso não significava que apresentasse deficiência em alguma área que
devesse dominar; pelo contrário. Os conhecimentos do agente abrangiam muitas coisas
que aos olhos do homem comum pareciam não ter a menor importância.
Muitas vezes as missões dos agentes da USO colocavam os mesmos em situações
difíceis e extraordinárias. Naturalmente as tarefas eram distribuídas segundo os
conhecimentos de cada um. Um prestava-se muito melhor aos serviços de espionagem
que um gigantesco ertruso. As características físicas também eram consideradas na
escolha dos agentes.
Brent Firgolt fora colocado na pseudo-central de tiro de uma nave-modelo, para
receber um treinamento meticuloso no manejo de todas as armas existentes a bordo de
uma nave do Império.
Era versado em todos os tipos de tiro.
Quando o verme do pavor fez o primeiro disparo, cuja energia se descarregou bem
ao lado de Collignot, chegou a prender a respiração, pois chegou a recear pela vida do
companheiro. Mas quando viu que os outros tiros do gigantesco verme também não
acertaram o alvo, começou a acreditar que o fogo do monstro era bem orientado. Não
acreditava que fosse por simples acaso que o verme nunca atingia Collignot. Firgolt
constatou que a distância entre o agente e o ponto de impacto dos tiros, que
aparentemente erravam o alvo, sempre era a mesma. Concluiu que o monstro sabia
perfeitamente para onde estava atirando.
Ao que parecia, não tinha a intenção de matar Collignot — ao menos por enquanto...
Firgolt refletiu intensamente. Lembrou-se de que certos animais costumam brincar
com suas vítimas antes de matá-las. Há alguns anos, quando trabalhara como agente
numa velha nave cargueira, vira um gato maltratar um rato durante vários minutos, antes
de devorá-lo.
Era possível que o fato de os tiros do monstro não acertarem o alvo tivesse o mesmo
motivo. Nem sequer chegavam a ser um indício de inteligência. Provavelmente Collignot
não tinha tempo para pensar nisso. O tenente corria pela praia e provavelmente acreditava
que só lhe restavam alguns segundos de vida.
Firgolt viu Collignot atirar-se na água com um salto enorme. Por um instante
acreditou que quisesse nadar para o submarino, mas logo notou que o agente ficou
deitado no mesmo lugar.
Provavelmente o verme do pavor ainda não se havia adaptado à nova situação.
Estava agachado à distância de um salto de Collignot. Firgolt levantou os olhos para o
céu nublado. Em Euhja o sol brilhava raras vezes, pois o planeta era chuvoso. Aquele
mundo já fora uma base ideal dos aras, que podiam dedicar-se com toda calma às suas
pesquisas.
Mas no momento a terra era seca. O vento tangia rapidamente as nuvens.
De repente o verme do pavor abriu fogo contra a água em torno de Collignot. Assim
que surgiram os primeiros lampejos, a cabeça do tenente mergulhou. Firgolt sabia que se
tratava de descargas polares. Uma idéia surpreendente surgiu em seu cérebro. Lembrou-
se das lendas antigas, que continuavam a ser contadas na Terra. Nelas se falava muitas
vezes em dragões que cuspiam fogo, em monstros gigantescos que despejavam raios
mortíferos. Será que havia uma ligação entre essas histórias e o verme do pavor? Será que
há tempos imemoriais a Terra fora devastada pela praga dos gafanhotos córneos?
Era pouco provável, mas não impossível. De qualquer maneira Firgolt já estava
inclinado a acreditar que nem sempre as velhas lendas são absurdas e inacreditáveis,
conforme se costuma dizer.
Collignot desapareceu atrás de uma densa nuvem de fumaça. O capitão olhou para a
praia. Estava preocupado. Parecia que o verme do pavor começava a levar as coisas a
sério.
Precisava distrair a atenção da fera. Firgolt viu o tenente cambalear em meio aos
vapores. Ao que parecia não estava passando muito bem. Firgolt pôs-se a praguejar. Onde
estavam Warren e Kopenziak? Bem que poderiam ajudá-lo na manobra de desviar a
atenção do monstro.
Firgolt começou a gritar que nem um índio e pôs-se a agitar furiosamente os braços.
Esperava que o monstro o ouvisse. Collignot continuava a cambalear. Parecia exausto.
Firgolt gritou a plenos pulmões. O verme do pavor girou o corpo de lagarta e
levantou os olhos diabólicos para ele. Firgolt soltou um suspiro de alívio, mas logo teve
uma sensação de insegurança. Se sua atitude tivesse irritado o gigante, seria obrigado a
correr para salvar a vida.
Collignot deixou-se cair na areia. Do lado oposto da baía veio uma série de gritos
animalescos. Era Kopenziak, que corria pela rocha sobre as pernas tortas. Não demoraria,
e Warren também apareceria.
O verme do pavor escolheria um deles. Quando uma rocha rebentou bem a seu lado,
Firgolt compreendeu que o monstro estava atrás dele.
***
A criatura que se encontrava junto à água estava praticamente morta. Viu-a cair na
areia e ficar deitada. O ser que se encontrava atrás dele agia que nem um louco. Devia ser
a mãe do outro animal, que acabara de enlouquecer de susto porque o filhote fora
atacado, ou então estava empenhado numa manobra desviacionista.
“Para isso não se precisa de muita inteligência”, pensou o verme do pavor. Mas
havia um fato que o deixava pensativo. Os anões se haviam espalhado uniformemente em
torno dele. Estavam postados em quatro pontos opostos.
Não era possível que se iludissem a ponto de acreditarem que poderiam caçá-lo.
Caçar um monstro terrível, capaz de destruí-los de um golpe.
Não deixava de haver um plano em seu procedimento. Tudo parecia processar-se
segundo um sistema perfeitamente elaborado. Refletiu, febrilmente, à procura da solução.
Às vezes parecia que tinha pela frente animais extremamente primitivos, mas logo a
seguir era levado a acreditar que se tratava de nativos inteligentes.
Se os matasse naquele momento nunca descobriria a verdade. Era claro que pouco
importava para seu destino futuro que essas criaturas possuíssem inteligência ou não.
Mas a chama da revolução que ardia no interior do verme do pavor levava-o a agir de
forma estranha.
Não se dava conta disso, mas o fato era que todos os seus atos tinham um caráter
rebelde. Fez certas coisas que qualquer outro verme do pavor se teria recusado a fazer. A
reação normal teria consistido em matar imediatamente os desconhecidos, sem interessar-
se por sua origem.
Apesar de seu saber coletivo, o verme do pavor era um individualista típico, um
personagem singular, capaz de tomar decisões independentemente de sua raça. Era jovem
e inexperiente; seu saber limitava-se a certas insinuações. Mas sua inteligência
extraordinária permitia-lhe extrapolar seus conhecimentos. Era claro que muitas vezes
isso o levava a suposições menos corretas.
Nunca descobriria por que motivo fora justamente ele que, pela primeira vez, sentira
uma revolta interior contra os benévolos. Talvez isso tivesse sua origem no fato de ter
ficado só naquele continente.
Mergulhado em reflexões, deu um tiro na direção do ser que procurava distrair sua
atenção da criatura semimorta que estava deitada na praia. Sentiu uma necessidade
premente de ficar em sossego. Precisava refletir. Mais tarde poderia voltar ao mesmo
lugar e observar as criaturas para as quais seu desaparecimento devia representar um
triunfo.
Seu corpo contraiu-se como se fosse uma gigantesca mola de aço. Depois disso
afastou-se em saltos gigantescos e logo desapareceu atrás das colinas.
5
Interlúdio
Os benévolos chegaram nas primeiras horas da manhã. Sua nave rompeu a camada
de nuvens e a chuva e penetrou com um rugido nas camadas inferiores da atmosfera. O
silêncio medonho desse dia cinzento foi rompido de repente. O ar parecia tremer. Todo o
continente parecia vibrar.
O ruído aumentou, transformando-se num trovejar ensurdecedor. Antes fora apenas
um suave chiado, e ainda antes um farfalhar quase imperceptível, como o produzido pelas
asas de um pássaro.
O verme do pavor já havia registrado os primeiros indícios.
O primeiro som, muito fraco, bastou para que se sobressaltasse.
Os benévolos estavam chegando.
Estava na hora de tomar sua decisão. Até então tivera uma pequenina esperança de
que os benévolos não aparecessem. Essa esperança já se desvanecera.
Teria de mostrar do que era capaz.
Por alguns segundos, teve a impressão de ver a nave grotesca correndo entre as
nuvens, como se fosse uma sombra gigantesca. Dali a instantes seu ouvido sensível foi
atingido com toda a violência pelas ondas sonoras.
Estremeceu. Saltou imediatamente para cima da colina mais alta, para verificar se a
nave iria pousar nas proximidades. Deu apenas uns poucos saltos para chegar ao destino.
Uma grande planície estendia-se terra adentro.
Logo viu a nave. Estava pousada logo atrás das colinas. O revestimento de molkex
dava-lhe o aspecto de uma escultura na qual tivesse trabalhando um verdadeiro exército
de artistas, para produzir uma obra desse tamanho.
O verme do pavor ficou deitado por algum tempo, estarrecido. Cuidariam primeiro
do molkex, para depois dedicar sua atenção a ele. Deveria dirigir-se à nave.
Mas não o fez. O velho ódio voltou a despertar. Pensamentos confusos cruzaram seu
cérebro.
Lá embaixo, a nave pertencente à raça da qual dependia estava parada em meio à
chuva torrencial. Há tempos imemoriais os seres dessa raça faziam seu jogo infame com
os vermes do pavor.
Nunca se colocaria espontaneamente nas suas mãos.
Resolveu esconder-se deles. Não sabia até que ponto era importante e nem tinha
certeza de que o procurariam.
Sem dúvida havia por ali bons esconderijos, onde poderia permanecer oculto. Ainda
não sabia se aqueles seres possuíam aparelhos que facilitassem a procura. Lembrou-se da
caverna em cujo interior as quatro inteligências desconhecidas haviam passado a noite. A
entrada da mesma era bastante grande para permitir sua passagem. Se os desconhecidos
haviam abandonado a caverna para procurá-lo, poderia entrar lá.
Refletiu sobre seu plano.
Provavelmente aquelas minúsculas criaturas também haviam percebido a chegada
da nave. Qual seria sua reação? Fazia votos de que não cometessem o erro de dispensar
aos benévolos o mesmo tratamento que lhe haviam dispensado. Nesse caso o tempo de
vida que lhes restava seria bastante escasso.
Viu um movimento junto à nave.
O verme do pavor não perdeu tempo para descobrir o que era. Saiu em direção à
caverna, dando saltos gigantescos.
Quando chegou lá, notou que a caverna estava abandonada. Ninguém ficara para
tomar conta da mesma. Provavelmente os anões rastejavam entre as colinas, para
procurá-lo.
Espremeu-se pela entrada e conseguiu penetrar na caverna.
Os desconhecidos haviam deixado seu equipamento. Fascinado, o verme do pavor
examinou a aparelhagem. Não conhecia nenhum dos objetos. Mesmo que descobrisse sua
finalidade, seria incapaz de manejá-los, pois nada podia fazer com suas patas
desajeitadas.
Viu que os seres desconhecidos haviam preparado leitos no chão. Isso constituía
mais uma prova de sua fraqueza e vulnerabilidade.
O verme do pavor estava tão entretido na observação do interior da caverna, que só
notou que os desconhecidos haviam voltado quando os mesmos se encontravam à sua
frente, de armas em punho.
***
Warren, que tinha ótimo ouvido, foi o primeiro a ouvir o rugido distante dos
propulsores. Seu corpo esbelto estacou de repente. Inclinou-se ligeiramente.
— O que houve, tenente? — perguntou Firgolt.
— Não está ouvindo, sir? — perguntou Warren com a voz tensa.
Firgolt forçou o ouvido, mas a única coisa que percebeu foi o farfalhar da chuva.
— Parece... parece uma espaçonave que se aproxima — disse Warren em tom
hesitante. Ao que parecia, ainda não tinha muita certeza.
— É a Carbula — gritou Kopenziak. — Só pode ser.
— Silêncio! — ordenou Firgolt. Agora todos estavam ouvindo.
— É uma nave; quanto a isso não existe a menor dúvida — concordou Firgolt. —
Mas tenho certeza de que não é a Carbula. O cruzador ligeiro, se é que ainda existe, não
teria nenhum motivo para pousar aqui.
Ficaram parados. Estavam curiosos. Esqueceram-se do verme do pavor.
— Quem sabe se não são os estranhos seres? — gritou Collignot, superando o ruído,
que se tornava cada vez mais forte. — Nesse caso teremos distração de sobra.
O Capitão Firgolt não pôde deixar de rir. O som trovejante da nave estranha
continuou a retumbar em seus ouvidos.
— Está descendo por perto — profetizou Kopenziak.
Naquele momento viram uma mancha escura que se movia entre as nuvens e crescia
rapidamente. Warren abaixou-se instintivamente.
— Está descendo! — berrou Collignot. Um objeto totalmente assimétrico ficou
pendurado em cima das colinas. Firgolt lembrou-se do formato das naves dos pos-bis, que
representava um verdadeiro pesadelo. Mas o que viu à sua frente era uma massa de
formato arbitrário, que não dava a menor idéia sobre o aspecto geral da nave.
— Não sei como uma coisa dessas consegue voar — disse Kopenziak em tom de
incredulidade.
A nave estranha desceu atrás das colinas.
— Pousou — observou Collignot em tom seco.
O silêncio que se seguiu ao pouso da nave quase chegava a doer.
Firgolt lançou um olhar pensativo para a carabina de radiações que trazia ao ombro.
— Não poderemos enfrentá-los com isto — disse.
— O que vamos fazer, sir? — perguntou Warren.
— Acho que será preferível que nos retiremos para a caverna — sugeriu Firgolt.
— Aqui estamos numa posição insustentável. Talvez consigamos fazer observações
sem sermos notados, até que a nave volte a sair de Euhja.
— Isso é um eufemismo para o que realmente vamos fazer: fugir! — Collignot
cuspiu o toco de charuto apagado. — Ainda bem que voltaremos a um lugar enxuto.
Correram apressadamente para a caverna. Era espantoso que Firgolt se agüentasse
tão bem. Não se queixou uma única vez.
Quando se encontravam a cinqüenta metros de seu esconderijo, deram com a pista
do verme do pavor. O chão amolecido mostrava as marcas características de seu corpo
gigantesco.
Collignot freou a corrida. Fez o cano da carabina apontar para o chão.
— Olhe! — disse. Kopenziak soltou um palavrão.
— Está na caverna — disse Firgolt com a voz tranqüila.
Entreolharam-se. Os olhos de Kopenziak chamejaram numa resolução selvagem
para a luta.
— Já deve ter quebrado tudo — gritou, indignado. — Enquanto nós o
procurávamos, veio às escondidas e destruiu o equipamento.
— Logo saberemos se é assim — observou Firgolt, tranqüilo.
O Tenente Kopenziak fitou-o como se fosse uma coisa nunca vista. Seu rosto largo
contorceu-se numa expressão de espanto.
— Não me venha dizer que pretende entrar na caverna, sir.
— Não temos alternativa — disse Firgolt. — O verme do pavor é menos perigoso
que os seres estranhos. Talvez se encontre numa fase de tranqüilidade.
— Numa fase de tranqüilidade! — cochichou Collignot. — É muito engraçado.
Firgolt fez como se não tivesse ouvido. Não hesitou mais. Prosseguiu em direção à
caverna. Kopenziak imediatamente seguiu o capitão.
— Não podemos deixar que entrem sós no lugar em que está a fera — disse
Collignot, dirigindo-se a Warren. — Ainda acontece que meus charutos estão lá dentro.
Não quero que o monstro os esmague.
Os dois seguiram Firgolt e o especialista de estatura baixa. O verme do pavor
ocupava quase toda a caverna. Entraram silenciosamente e viram o monstro absorto na
contemplação do equipamento.
Não havia nada que tivesse sido destruído ou danificado. Cercaram o monstro com
as armas em punho.
O crânio gigantesco virou-se abruptamente. Collignot recuou instintivamente.
Kopenziak fechou os olhos para esperar a morte.
O verme do pavor brincou com as quatro tenazes. Abriu a boca enorme. Uma nuvem
de fedentina envolveu os homens.
— Está bancando o animal selvagem — cochichou Firgolt. — Parece que quer nos
fazer acreditar que veio a esta caverna para fugir da nave estranha.
— O conversor de símbolos, sir — disse Warren, também em voz baixa. —
Podemos tentar comunicar-nos com ele.
— Não — decidiu o capitão. — Acho que é preferível que continue a acreditar que,
em nossa opinião, possui pouca inteligência. Deve ter seus motivos para apresentar este
espetáculo. Por certo está interessado em ocultar sua inteligência.
Collignot fez menção de acender um charuto, mas Firgolt deu uma pancada em sua
mão e fê-lo cair.
— Não acenda nenhum fogo — cochichou. — Se irritarmos o bicho, não sairemos
daqui vivos.
O monstro recuou cautelosamente até a extremidade da caverna, sem tirar os olhos
dos terranos. Fazia de conta que estava tão perturbado que não sabia o que fazer.
Firgolt começou a falar em voz baixa, para gravar outro relato na fita. Só podiam
atingir parte do equipamento. A outra parte ficava atrás do corpo do verme do pavor.
Era uma situação estranha. Um verme do pavor e quatro homens defrontavam-se
num espaço estreito. Espreitavam-se mutuamente. Firgolt acreditava que qualquer erro
pudesse trazer a desgraça.
Caso a situação se tornasse mais séria, as armas que mantinham preparadas para
disparar não serviriam para muita coisa. No recinto apertado em que se encontravam
qualquer disparo representaria um perigo para eles mesmos.
Firgolt concluiu o relato e desligou o gravador.
Os olhos atentos do monstro acompanhavam todos os seus movimentos. Reinava
uma espécie de armistício, que poderia ser suspenso a qualquer momento, para degenerar
na luta armada.
Firgolt fazia votos de que os nervos do verme do pavor — se é que ele os possuía —
fossem tão firmes quanto os seus. Encostou cautelosamente à parede da caverna, evitando
fazer qualquer movimento rápido.
E agora? O verme do pavor parecia estar à espera de alguma coisa. Sua postura
exprimia perfeitamente a tensão interna sob a qual se encontrava.
Firgolt sentiu a frieza da rocha através das vestes. Lá fora as torrentes de chuva
precipitavam-se do céu. Um dos intermináveis períodos de chuva de Euhja acabara de ter
início.
De repente o silêncio foi rompido pelo rugido dos propulsores. O verme do pavor
abriu a boca, num gesto de pânico.
Firgolt inclinou-se para a frente.
A nave dos desconhecidos acabara de subir.
***
De início pensou em matar os quatro desconhecidos com uma série de rapidíssimos
disparos energéticos, mas logo se lembrou de que os aparelhos de rastreamento dos
benévolos registrariam imediatamente a liberação de energia. Não demorariam a
descobri-lo.
A única coisa que podia fazer no momento era dividir a caverna com os anões.
Provavelmente os mesmos haviam fugido da nave. Viu que estavam armados, mas não o
atacaram. Devia continuar a desempenhar o papel do animal estúpido.
Bancava o nervoso. Até parecia que tudo aquilo era novidade para ele. Ficou
satisfeito ao constatar que os desconhecidos não tentavam comunicar-se com ele. Isso
significava que ainda não tinham conhecimento de sua inteligência extraordinária.
Foi o que lhes salvou a vida. Provavelmente ele os teria esmagado com seu corpo
gigantesco, se tivessem mostrado que conheciam suas faculdades.
Recuou para os fundos da caverna.
Depois de algum tempo ouviu a nave dos benévolos decolar. Sentiu-se possuído de
uma alegria louca. Estavam abandonando este mundo. Era uma criatura livre! Mas levou
apenas alguns segundos para descobrir que sua esperança fora ilusória. A nave ainda não
estava abandonando o planeta.
Andavam à sua procura!
Começaram a sobrevoar sistematicamente todo o continente-ilha.
Lançou um olhar para os desconhecidos. Será que os mesmos sabiam o que estava
acontecendo?
Por um instante sentiu-se tentado a fazer um esforço para comunicar-se com eles,
para pedir que o ajudassem. Mas não fez nada disso. Por enquanto não havia um perigo
imediato à sua vida. Não podia sair da caverna. Os benévolos haviam esperado que
aparecesse logo após o pouso da nave. Acontece que ele se escondera. Se entrasse na
nave, formulariam perguntas embaraçosas e o examinariam. E não teriam nenhuma
dificuldade em constatar que ele possuía uma razão que não era apenas instintiva.
O ruído dos propulsores foi diminuindo. Nem por isso se poderia dizer que já não
corria nenhum perigo. Estavam procurando em outro lugar. Mas acabariam voltando para
cá.
À medida que se aproximava o momento em que os benévolos deveriam aparecer
nas proximidades, mais difícil lhe parecia a solução dos seus problemas. Bem que
precisaria do conselho dos anciãos, mas estava só.
Seu comportamento punha em risco todo e qualquer transporte. Face a isso, sua
própria vida, que estava arriscando, não assumia a menor importância. Sem que o
quisesse, causara um perigo grave para toda a espécie.
Não era um simples revolucionário, era um criminoso. Tinha uma mente deformada.
Eles o expulsariam, se chegassem a vê-lo. Gemeu. A angústia mental parecia oprimi-lo.
Dali a pouco voltou a ouvir a nave dos benévolos.
Interlúdio
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