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COLEÇÃO ESTRUTURA E FUNÇ~Q. !


-~ ~ . . . . . . ,_, _ ~,t
ÁNTROPOLOGIA
..1
d
NA SOCIEDADE
2
1 PRIMITIVA
Orientação de:
ROBERTO AUGUSTO DA MATIA
A. R. RADCLJFFE-BROWN
e
Professor Emérito
da Universidade de Oxford .
LUIZ DE CASTRO FARIA
Prefácio dos Professores:
E. E. Evans-Pritchard
Professor de A11tropotogia Social
na U11iversidade de Oxford

Fred Eggan
) Professor de Antropologia
na Vnlversidade de Chicago

Traduçcio de
)
Natha11ael C. Caixeiro
)

BIBLIOTECAS
PESPSP

FICIIA CATALOGRAFICA
. ) (Preparad4 pelo Centro de Catalogação-na-fonte do
Sindicato Nacional dos EdUores de Livros, GB)

RadcllUe-Brown, Al!red Reginald, 1881·


R12e Estrutura e função na sociedade primitiva; tra.d.
de Na.tllanael O. Caixeiro. Potrópolls, Vo:re.s, 1973,
272p. (Antropologia, 2).
j lllbliogra!ta.
1. Antropologia social. · J. Tftulo. II. Série.
o PETRÓPOLIS
73,0055 CDD-301 .2 EDITORA VOZES LTDA,
1973

........ ---
têm uma reformulação na qual certos termos são em-
pregados diferentemente do modo como o foram nos
antigos ensaios agor~ rei~prr:ssos. Por . exemplo, no~
primeiros ensaios escritos ha vinte ou_ m!i.s anos, a. ~a ·
lavra «cultura> é empregada com o ~1gnt:1cado admitido
daquela época como termo geral designativo de um. mo- Capitulo l
do de vida inclusive o modo de pensar, de determinado
grupo soci;l localmente definido.
O Irmão da Mãe
na África do Sul '

ATRIBUI-SE GRANDE IMPORTÂNCIA À RELAÇÃO DE IRMÃO


·da mãe e filho da irmã entre povos primitivos em mui-
tas partes do mundo. Em alguns casos, o filho da irmã
tem certos direitos especiais sobre a propriedade do
irmão de sua mãe. Houve época em que era costume
·considerar essas práticas como relacionadas com insti-
tuições matriarcais, e sustentava-se que sua presença
num povo patrilinear podia ser oonsiderada como prova
de que aquele povo teria sido matrilinear em alguma
·época passada. Este modo de ver é ainda mantido por
uns poucos antropólogos e foi adotado por Junod em
·seu livro sobre o povo baThonga da Africa Oriental
Portuguesa. Referindo-se aos costumes relacionados com
o comportamento recíproco do irmão da mãe e filho da
irmã, diz ele: «Ora, tendo pesquisado com especial cui-
dado este curiosíssimo aspecto do sistema thonga, che-
go à conclusão de que a única explicação possível é
,que, antigamente, em tempos muito remotos, nossa tri-
'bo passou por um estágio matriarcal» (Junod, The Life
of a South African Tribe, 1913, V,o1. l, p. 253).
E' desta teoria que desejo tratar neste ensaio; mas
não é minha intenção repetir ou acrescentar as obje-
,ções que já se levantaram contra ela por diversos crí-
ticos nos últimos anos. A crítica meramente negativa
1 Ensaio lido perante a Soutl! Afrlcan Assoclat1011 for tlte Advancement
·OI Sclence, em O de julho de 1024, e Impresso no South Afrlcan Journal
-of Sclence, Vot. XXI, pp. 542-55,
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não fa:z a ciência progredir. O único meio, safü;fatório filho da irmã pode proceder com grande liberdade para
de- desfazer-se de certa hipótese inadequada é descobrir com o innão de sua mãe, e pode tomar a melhor de
urna hipótese melhor. Disponho-me, pois, a submeter- suas reses ou ficar com qualquer dos melhores objetos
vos uma hipótese alternativa, e, se bem sucedido, não que ele possua. Pelo contrário, o irmão da mãe pode
em provar minha hipótese, mas ao mostrar -que ela dá tomar da manada do sobrinho qualquer rês que seja
uma possível explicação dos fatos, terei pelo menos re- deformada ou veiha, e ficar com qualquer objeto velho
futado o parecer do Sr. Junod de que a explicação que e usado que ele possua.
ele admit-e seja a cúnica possível». O que é ~obr~tudo interessante para mim é que na
parte da Polmés1a que melhor conheço, isto é, nas ilhas
Quase não temos dados sobre costumes deste tipo, Friendly (Tonga) e em Fiji, encontramos costumes que
referentes a muitas tribos africanas. Não que esses cos- mostram mu_ita sem~lha_:1ça com os de baThonga. Lá,
tumes não existam, ou que não sejam importantes para
os próprios nativos, mas devido a que o estudo sis-
temático e científico dos nativos dessa região estão ape-
il também, o filho da 1rma tem •o direito de tomar muitas
liberdades com o irmão de sua mãe, e pode retirar qual-
quer das posses do tio. E lá também encontramos o
nas no início. Terei de me referir principalmente, por- seguinte costume: quando o tio faz um sacrifício o
tanto, aos costumes dos baThonga registrados pe~o ~r. filho da irmã pode retirar a melhor parte oferecida 'aos
Junod. Estes dados podem ser encontrados no primeiro deuses e comê-la. Assim, no transcurso desse ensaio fa-
volume da obra há pouco citada (pp. 225 et seq., e pp. rei também eventuais referências aos costumes de Tonga.
253 et seq.). Algumas das mais importantes observa- Es!es !rê~ povos, os_ baThonga, os Nama e os Tonga,
ções pode!-11 ser resumidas como seguem: t!m mstltu1ções patrihneares ou patriarcais; isto é, os
1. o sobrinho por parte de mãe em toda a sua vida é objeto
filhos pertenc~m ao grupo social do pai, e não ao da
de cuidado especial por seu tio;
mãe; a propriedade é herdada na linha masculina, pas-
2. quando o sobrinho fica doente, o irmão da mãe oferece
sando normalmente de pai ao filho. O ponto de vista
um sacrifício em favor dele; que estou contrariando é que os costumes referentes ao
3, muita coisa é licita ao sobrinho em relação ao irmão da irmão da mãe só podem ser explicados supondo-se que,
mãe; por exemplo: ele pode ir à casa do tio e comer a refeição em alguma época passada, esses povos tivessem insti-
que foi preparada para este; tuições matrilineares, encontradas hoje entre outros po-
4. o sobrinho reivindica parte da propriedade do irmão de vos primitivos, onde os filhos pertencem ao grupo so-
sua mãe por morte deste, e às vezes reinvindica uma das cial da mãe, e a propriedade é herdada na linha femi-
viúvas; nina, passando de um homem a seu irmão e aos filhos
5. quando o irmão da mãe oferece um sacrifício a seus an- de sua irmã.
tepassados, o filho da irmã furta e consome a parte de· carne
E' engano supor que podemos compreender as insti-
ou bebida oferecidos aos <leuses.
tuições da sociedade, estudando-as isoladas, sem consi-
Não se deve supor que esses costumes sejam pecu- derar as demais instituições com as quais elas coexistem
liares aos baThonga. Há provas de que costumes se- e com as quais podem estar relacionadas, e desejo
melhantes podem ser encontrados entre outras tribos c?amar a atenção para uma correlação que parece exis-
africanas, e sabemos da existência de costumes seme- tir entre costumes referentes ao irmã-o da mãe e os cos-
lhantes em outros povos em várias partes do mundo. tumes referentes à irmã do pai. Tanto quanto ·nos per-
Na própria Africa do Sul costumes deste tipo foram des- mitem os dados disponíveis no momento onde desco-
cobertos pela Sra. Hoernle entre os hotentotes nama. O brimos a importância do irmão da mãe, ta~bém achamos

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que a irmã dD pai é igualmente importante, embora todas as sociedades, ou em todas as que apresentam
de maneira diferente. O costume de deixar o_ filho da certo tipo. São essas tendências gerais que incumbe de
irmã tomar liberdades com o irmão de. sua_ mae parece modo especial à antropologia social descobrir e explicar.
ser em geral acompanhado de uma obngaç~o Je deter: Uma vez que começamos a reconstituir relacionamen-
tos em qualquer distância oonsiderável, é muito grande
minado respeito e obediência .Pªr! com ~ irm~ do Pª1•
Junod pouco fala acerca da 1rma do pa1 entre os ba- o. número das diferentes espécies de parentes que é lo-
Thonga. Ao falar da conduta do homem para com esta gicamente possivel distinguir. Esta dificuldade é evita-
parenta (sua rarana) diz apenas: «_M~tra para com ela da na sociedade primitiva por um sistema de classifi-
grande respeito. No entanto, ela nao e de modo algum cação, através do qual os parentes do que poderia coe-
uma mãe (mamana)> (op. cit., p. 223). So~re os ~o- rentemente considerar-se como grupos diferentes são
tentotcs nama, temos dados melhores: a .irma do pai. é classificados num número limitado de grupos. O prin-
objeto do maior respeito por parte do filho de seu ir- cípio de classificação mais comumente adotado na so-
mão. Em Tonga este costume estã muito . clar_a.mente ciedade primitiva pode ser enunciado como o da equi-
definido. A irmã do pai de um homem esta acm:a de valência de irmãos. Em outras palavras se me coloco
todos os demais parentes a quem ele deve respeitar e em determinada relação com um home~, considero-mé
obedecer. Se ela escolhe uma esposa para ele, cabe-lhe ~om_o na mesma espécie geral de relação para com seu
casar-se com ela sem mesmo atrever-se a fazer reservas 1rmao; e, de modo análogo com uma mulher e sua irmã.
ou levantar objeção alguma;. e ~ mesm~ em tudo o que
Deste modo o irmão do pai vem a ser considerado co-
diga r,espeito à sua vida. A 1rma do pat é sagrada para mo uma espécie de pai, e seus filhos são, portanto
ele; sua palavra é lei; e uma das maiores falt~s de que parentes da mesma espécie como irmãos. Do mesm~
possa ser inculpado seria mostrar-se desrespeitoso para modo, a irmã da mãe é considerada como outra mãe e
com ela. Ora, esta correlação ( que não se . ad~tnnge, seus filhos são, portanto, irmãos e irmãs. Tal siste~1a
evidentemente, aos três exemplos que menc1one1, mas encontra-se entre as tribos bantu da .Africa do Sul, en-
parece como disse, ser geral) deve ser tomada em con- tre os hotentotes nama e também nas ilhas Friendly.
sideração em qualquer explicação de costumes ~eferen- .\ Graças a esse princípio, as sociedades primitivas são
tes ao irmão da mãe, porque os co~tu1;1e~ _rela~1onados
i capazes de chegar a tipos definidos de conduta para
são, caso eu esteja com razão, não inshtmçoes m~epen~ com tios e tias e primos de certos grupos. A conduta
dentes mas parte de um sistema; e nenhuma exphcação de um homem para com o irmão de seu pai deve ser do
de un:a parte do sistema será satisfatória, a menos que mesmo grupo geral que sua conduta para com seu pró-
se encaixe numa anãlise do sistema como um todo, prio pai e ele deve proceder para com a irmã de sua
Na maioria das sociedades primitivas as relações so- mãe de acordo com o mesmo tipo em relação à sua
ciais dos indivíduos são amplamente reguladas_ com base mãe. Os filhos do irmão de seu pai ou da irmã
no parentesco. Isto é ocasionado pela forma~ª? de pa- da mãe devem ser tratados quase exatamente como ir-
drões de conduta fixos e mais ou menos def1~1dos para. mãos e irmãs.
cada um dos tipos reconhecidos de relacionamento. Este princípio, porém, não nos dá imediatamente qual-
Existe, por exemplo, um padrão especial de co~du~a quer p~drão nem para o irmão da mãe nem para a irmã
para O filho em relação ao pai, e outro para. _um 1rmao do pa1. Seria possível, sem dúvida, tratar o primeiro
mais novo em relação ao mais velho. Determinados pa- co1;10 a um pai e a última como semelhante a uma mãe,
drões variam de uma sociedade a outra; mas há certos e 1~to, de fato, parece ter sido adotado numas poucas
princípios fundamentais ou tendências que aparecem em sociedades. Certa tendência neste sentido encontra-se

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._§ vez, mais seguro, se acompanharmos a definição desses
em algumas regiões da Airica e c~rtas partes da _Po- esquemas conforme a obra de Junod, visto que suas
linésia. Mas é característico de sociedades nas quais o observações não terão sido influenciadas pela hipótese
sistema classificatório de parentesco ou não está plena- que estamos tentando demonstrar.
mente . desenvolvido ou foi em parte desfeito. A relação para com o pai, diz ele, «implica respeito
Apa'ftce outra tendência onde o sistema classi~icat6- e mesmo temor. O pai, embora não se incomode ·muito
rio de . parentesco atinge alto grau de desenvolvimento com os filhos, é, porém, seu instrutor, aquele que repre-
ou elaboração: a tendência a revelar. esquemas quant:° ende e castiga. O mesmo fazem os irmãos do pai~
ao irmão da mãe e irmã do pai, considerando-se o pri- (op. cit., p. 222). Da própria mãe, diz ele: «ela é sua
meiro como uma espécie de mãe masculina e a se?unda verdadeira mamana, e esta relação é muito profunda e
como uma espécie de pai ieminino. E_sta tendên~1a re- terna, combinando respeito com amor. O amor, porém,
vela-se, por vezes, na linguagem. Asstm, !1ª AirtC':_ do em geral, excede o respeito» (op. cit., p. 224). Quanto
Sul o termo comum para designar o irmao da mae é à relação da mãe para com seus filhos, verificamos que
malume ou umalume, que é um composto formado a «Ela é geralmente fraca para 00111 eles e frequentemente
partir da raiz ma para «mãe» e um _suf!_Xo que _significa acusada pelo pai de os estragar».
«masculino». Entre os baThonga a irma do pa1 é cha- Há certo risco em fórmulas condensadas, mas penso
mada rarana, termo que o Sr. Junod explica como ~ig- que não estaríamos muito errados ao dizer que numa
nificando «pai feminino». Em certas li~guas su!-afr1ca- sociedade fortemente patriarcal, tal como encontramos
nas não existe termo especial para designar a irmã do na Afríca do Sul, o pai é aquele que deve ser respeitado
pai; assim, em Xosa, ela é designada por um te~mo e obedecido, e à mãe cabe ternura e indulgência. Pode-
descritivo: udade bo bawo, que literalmente quer dizer ria eu, se necessário, demonstrar-lhes que o mesmo
«irmã do pai>. No zulu ela pode ser denominada por acontece com a vida familiar dos habitantes das ilhas
termo igualmente descritivo .ou pode ser chamada ape- Friendly.
nas de ubaba, «pai», exatamente como os irmãos do . Se, agora, aplicamos o princípio que, como sugeri,
pai. Nas ilhas Priendly, o irmão da mãe pode ser ch!- vigora nesses povos, a conseqilência é que a irmã do
mado por um termo especial, tuasirra, ou pela expr~ssao pai é aquela a quem se deve obedecer e tratar com
fde tangata, que significa, literalmente, «mãe 1:1asc_uhna__», respeito, enquanto do irmão da mãe deve-se esperar in-
Esta semelhança entre Africa do Sul e Pohnésta nao dulgência e carinho. Mas a questão é complicada por
pode segundo penso, ser considerada acidental; contu- um outro fator. Se consideramos a relação de um so-
do ~ão há conexão possível entre as línguas poliné- brinho para oom seu tio e tia, surge a questão do sexo.
sl;s e as bantu, e acho muito diflcil conceber que as Nas sociedades primitivas existe assinalada diferença na
duas regiões tenham adotado o costume de chamar o conduta de um homem para com outros homens · e na
irmão da mãe por um termo que signifique «mãe mas- conduta para com as mulheres. Correndo mais uma vez
culina>, por influência de uma na outra ou de uma ori- o risco de uma fórmula, podemos dizer que certo grau
gem .comum. consid~rãvel de familiaridade é, em geral, apenas per-
Vejamos agora se podemos deduzi~ o_ que dev:m ser mitido numa sociedade como a baThonga entre pessoas
os padrões de conduta para com o 1rmao da mae e a do mesmo sexo. O homem deve tratar seus parentes fe-
irmã do pai numa sociedade patrilinear com base no mmmos com maior respeito do que seus parentes mas-
principio ou tendência que acabamos de sugerir. Para culinos. Em conseqüência, o sobrinho deve tratar a irmã
isto, devemos primeiro conhecer os esquem:15 quanto ao de seu pai com muito maior respeito do que a seu pró-
pai e à mãe, respectivamente, e acho que isto será, tal- r:strutura e ••. E23l6 - 2 33
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prio pai. (Do mesmo modo, devido a-o principio do res- lizmente, não hã quase dado algum sobre esse assunto
peito por idade ou hierarquia, um homem deve tratar referente à África, e muito pouco com referência a ou-
o irmão mais velho de seu pai com mais respeito que tras partes do mundo. Ademais, existem certas idéias
a seu próprio pai). Reciprocamen1e, um homem pode falsas relacionadas com esta distinção de sociedades em
tratar o irmão de sua mãe, que é de sexo igual ao seu, matriarcais e patriarcais, que é necessário desfazer an-
com uraa de familiaridade que não seria possível com tes de tentarmos ir mais longe.
qua!g~er mulher, mesmo sua própria mãe. A influência Em todas as sociedades, primitivas ou adiantadas, o
do sexo na conduta de parentesco é mais bem perce- parentesco é necessariamente bilateral. O indivíduo é re-
bida nas relações de irmão e irmã. Nas ilhas Friendly lacionado a certas pessoas através de seu pai ou para
e entre os nama um homem pode devotar grande res- com outros através de sua mãe, e o sistema de paren-
peito a sua irmã, sobretudo se irmã mais velha, e ja- tesco da sociedade revela o que seria o caráter de seu
mais pode permitir-se quaisquer familiaridades com ela. trato com os parentes paternos e maternos respectiva-
O mesmo é certo, penso, quanto ao bantu sul-africano. mente. Mas a sociedade tende a dividir-se em segmen-
Em muitas sociedades primitivas a irmã do pai e as ir- tos (grupos locais, linhagens, clãs, etc.) e quando o
mãs mais velhas são objetos do mesmo tipo geral de princípio da hereditariedade é admitido, como · o é no
conduta, e cm algumas dessas os dois tipos de parentes mais das vezes, como o meio de determinar a comuni-
são classificados juntos e designados pelo mesmo nome. dade de um segmento, então é preciso escolher entre
Do princípio hipotético deduzimos certo esquema de descendência materna ou paterna. Quando uma socieda-
conduta para com a irmã do pai e para com o irmão da de é dividida em grupos com uma norma de que ·os
mãe. Ora, esses padrões são exatamente os que encon- filhos pertencem ao grupo do pai temos a descendência
tramos entre os baThonga, entre os hotentotes e nas patrilinear, ao passo que, se os filhos sempre pertencem
ilhas Friendly. A irmã do pai deve, acima de todos os ao grupo da mãe, a descendência é matrilinear.
parentes, ser respeitada e ·obedecida. O irmão da mãe Há, infelizmente, grande liberdade no emprego dos
é aquele parente de quem sobretudo se deve esperar termos matriarca! e patriarcal, e, por este motivo, mui-
indulgência, com quem podemos ser familiares e tomar tos antropólogos recusam-se a empregá-los. Se não po-
liberdades. Eis aqui, pois, uma alternativa de «possível demos absolutamente passar sem eles, devemos em pri-
explicação» dos costumes referentes ao irmão da mãe, meiro lugar dar definições exatas. Uma sociedade pode
e ela tem a vantagem sobre a teoria de Junod de tam- ser chamada patriarcal, quando a descendência é pa-
bém explicar os costumes correlatos referentes à irmã trilinear (isto é, os filhos pertencem ao grupo do pai);
do pai. Isto, porém, não conclui, mas apenas inicia nos- o casamento é patri!ocal (isto é, a mulher muda-se para
sa investigação. E' muito fácil inventar hipóteses. O o grupo local do marido) ; a herança ( ou propriedade)
trabalho importante e difícil começa, quando começamos e a sucessão (hierárquica) são em linha masculina, e
a verificá-las. Seria impossível para mim, no curto tem- a família é patripotestal (isto é, a autoridade sobre os
po disponível, fazer qualquer tentativa de verificar a membros da família está nas mãos do pai ou seus pa-
hipótese que acabei de expor. Tudo o que poss.o fa:er rentes). Por outro lado, uma sociedade pode ser cha-
é assinalar certas linhas do estudo que proporcionarao, mada matriarca!, quando a descendência, herança e su-
segundo penso, aquela verificação. cessão estão na linha feminina, quando o casamento é
A primeira coisa e a mais óbvia é estudar em por- matrHocal ( o marido muda-se para a casa de sua mu-
menor a conduta do filho da irmã e do irmão da mãe lher), e quando a autoridade sobre os filhos é exercida
um para com o outro nas sociedades matriarcais. Infe- pelos parentes da mãe.
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• •iili!ljifllliiliiill!li!líll!iiijíii!i!!P-~-liliiiilliílllíllji!illillj!!"i!!ii---.......
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Se aceita esta definição de termos contrários, é ime- tintamente matriarcal o pai e seus afins são !3empre de
diatamente óbvto que grande número de sociedades pri- importância na vida do indivíduo.
mitivas não são matriarcaís nem patriarcais, embora al- No sudeste da África temos um grupo de tribos que
gumas possam inclinar-se mais para um lado e outras se inclina vigorosamente para o patriarcado, a tal ponto,
para o inverso. Assim, se examinamos as tribos da Aus- de fato, que poderíamos talvez, com razão, falar deles
trália oriental, que às vezes são chamadas matriarcais, como patriarcais. A descendência do grupo social, he-
descobrimos que o casamento é patrilocal, de modo que rança da propriedade, sucessão da chefia, tudo isto está
a comunidade do grnpo local é herdada na linha mas- na linha masculina; o casamento é patrilocal, e a auto-
culina, a autoridade sobre os filhos está princípalmcnt~ ridade na familla é acentuadamente patrlpotestal. No
nas mãos do p-ai e seus irmã·os, que a propriedade (o norte da Africa, no Kenya e regiões circunvizinhas, há
que há de propriedade) é sobretudo herdada na linha outro grupo de povos marcadamente patriarcais, alguns
1i deles de fala bantu, ao passo que outros são de fala
masculina, enquanto que, na medida que a hierarquia é .•_.,,-_

reconhecida, não há questão de sucessão. A única íns-


"
nilótica ou hamltica. Entre essas duas regiões patriar-
tituíção matrilinear é a descendência do grupo tot~mico, íl cais há um aglomerado de povos que se estende aparen-
que é através da mãe, de modo que essas tribos, longe } temente cruzando a África de leste a oeste, ao nível de
de serem matriarcais, inclinam-se antes para ,o lado pa- Nyasalândia e Rodésia d-o Norte, nos quais a tendência
triarcal. O parentesco entre eles é totalmente bilateral, é no sentido matriarca! quanto a suas instituições. Des-
mas para a maioria dos fins o parentesco através do cendência do grupo social, herança da propriedade e
pai é de mais importância que o parentesco através da sucessão da monarquia ou chefia são em linha femini-
mãe. Há alguma evidência, por exemplo, de que a obri- na. Em algumas das tribos o casamento parece ser ma-
gação de vingar a morte recaia sobre os parentes da trilocal pe~o menos temporária se não permanentemente,
linha masculina ao invés de incumbir aos da linha isto é, um homem que se casa tem de ir viver com o
feminina. povo de sua mulher.
Achamos um interessante exemplo deste bilateralismo, E' sobre esses povos e seus costumes que precisamos
se assim pode ser chamado, na África do Sul, na tribo urgentemente de dados, se quisermos compreender ques-
OvaHerero. Os fatos não são muito seguros, mas tudo tões tais como a que tratamos neste trabalho. De uma
indica que esta tribo é subdividida em duas séries de tribo desta região temos uma excelência e ampla des~
segmentos que se cruzam. Numa série ( os omaanda) a crição na obra de Smith e Dale (The lla-speaking Peop/e
descendência é matrilinear, enquanto o outro (otuzo) é of Northern Rhodesia, 1920). Infelizmente, nestas ques-
patrilinear. Uma criança pertence ao eanda de sua mãe tões de que agora tratamos os dados são escassos e
e herda o gado dos irmãos de sua mãe, mas pertence evidentemente muito incompletos. Há, porém, duas ques-
.ao oruzo do pai e herda seus esplritos antepassados. A tões que eu gostaria de abordar. A primeira refere-se
à conduta do irmão da mãe para com o filho de sua
autoridade sobre os filhos parece estar nas mãos do pai
irmã. Ficamos sabendo que «o irmão da mãe é um per-
e seus irmãos e irmãs. sonagem de grande importância, detentor do poder atê
Está claro, assim espero, que a distinção entre socie- de vida e morte sobre seus sobrinhos e sobrinhas, que
dades matriarcais e patriarcais não é absoluta, mas re- nem outros parentes e nem mesmo os pais possuem;
lativa. Mesmo na sociedade mais acentuadamente pa- ele deve ser honrado até pelo próprio pai. Trat;i-se do
triarcal dá-se alguma importância social ao parentesco a~unculi potestas, que entre os baila é maior que o pa-
através da mãe; e, analogamente, na sociedade mais dis- tna potestas. Falando-se do irmão da mãe,. é costume
35· 37
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1
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materno que se verificam na Polinésia, e, aparentemente,


usar-se um titulo honorífico dado a pessoas que são al- '!
em algum grau, na Africa do Sul. Isto a teoria do Sr.
tamenie respeitadas» (op. cit., Vai. I, p. 23_0). Este _tip~ Junod evidentemente não faz, nem pode fazer.
de relaçã-o entre o irmão da mãe e o i1lho da_ 1rma Mas, admitindo a hipótese que acabo de expor, a
é obviamente o que poderiamos esperar nu~a sociedade questão fica muito mais simples. Na sociedade primitiva
acentuadamente matriarcat Mas como, entao, poderia- há tendência bastante acentuada a submergir o indiví~
mos explicar, com base na ieoria de Junod> a mudança duo no grupo a que ele ou ela pertence. A conseqüência
que deve ter ocorrido deste tipo de relação para aquela disto em relação com o parentesco é uma tendência a
agora existente entre os baThonga? . . estender a todos os membros do grnpo certo tipo de
Jsto suscita outra questão que não me sena posstVel conduta que tem sua origem num relacionamento com
analisar em pormenor, mas que tem seu peso na argu- determinado membro do grupo. Assim, a tendência na
mentação. Vimos até agora considerando a relação d_o tribo baThonga pareceria ser a de estender a todos
filho da irmã para com o irmão da mãe; mas se qui- os membros do grupo da mãe (família ou linhagem)
sermos chegar a uma explicação final, devemos tambér_n certo padrão de conduta que decorre do padrão especial
estudar a conduta de um homem para com seus demais que aparece na conduta de um filho para com a sua
parentes do lado materno> e para com .º grupo de s~a mãe. Uma vez que é de sua mãe que ele espera cuida-
mãe como um todo. Ora, nas ilhas Fnendly a relaçao dos e indulgência, ele procura a mesma espécie de tra-
peculiar entre um filho da irmã e um irmão da mãe tamento das pessoas do grupo de sua mãe, isto é, de
existe também entre o iilho da filha e o pai de sua todos os parentes maternos. Por outro lado, é a seus
mãe. O filho da filha deve ser honrado por seu ~vô. parentes paternos que ele deve obediência e respeit-o.
Para este o neto é «um chefe~. Ele deve assumir a Os esquemas que assim surgem em relação com o pai
propriedade do avô, e po~e ti~ar a oferenda que seu e mãe são generalizados e estendidos à parentela de
avô faz aos deuses na cenmôma kQlla. O avô materno um lado e de outro. Se dispuséssemos de tempo, pode-
e O irmão da mãe entram num esquema de conduta ríamos mostrar-lhes de modo conclusivo que este é, real-
muito semelhantes, cujo aspecto marcante é a indulgên- mente, o princípio que governa as relações entre um
cia por uma parte e a licitude quanto a outro. Ora, hã indivíduo e seus parentes maternos nas tribos patriarcais
evidência da mesma coisa entre os baThonga, mas tam- da Africa do Sul. Devo deixar a demonstração, porém,
bém no caso faltam-nos dados completos de que pre- para outra ocasião. No momento, limito-me a ilustrar
cisamos. Escreve o Sr. Junod que um avô «é mais ameno minha exposição.
para com o neto filho de sua -filha do que com ~ neto O costume, não raro impropriamente chamado de
filho de seu filho» (op. cit., p. 227). Neste sentido, o «compra da , noiva» e de modo geral conhecido na Afri-
costume de chamar o irmão da mãe de kokwana (avô) ca do Sul como lobola, é, como o Sr. Junod muito bem
demonstrou, um pagamento em compensação à familia
é significativo. . .
Há no caso algo que nos parece impossível exphcar- da moça, por sua perda quando ela é levada pelo ca-
se de acordo com a teoria de Junod. Numa sociedade samento. Ora, desde que nas tribos patriarcais da Afri-
assinaladamente matriarcal o pai da mãe não pertence ao ca do Sul uma mulher pertence ao povo do pai a com-
grupo como seu neto, e não é uma pess~a de quem pensação deve ser paga a eles. Mas pode-se 'verificar
se possa herdar ou que possa ex1:rcer autoridade. ~u~l- que em muitas tribos certa porção do «pagamento> é
quer explicação das liberdades lícitas para com o irmao transferido para o irmão da mãe da moça por quem
da mãe não podem ser satisfatórias a menos que tam- está sendo feito. Assim, entre os baPedi, d<> gado te-
bém explique as semelhantes licitudes para com o avô 39
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nyalo umâ cabeça (chamada hloho) é passada para o
irmão da mãe da moça. Nos baSotho, uma parte do mente visados em qualquer ritual por seus descendentes
na linha masculina. ··
ga<:lo recebi~o por uma moça ao ensejo _de~ seu ca~a-
mento pode, às vezes, ser toma~o pelo 1!mao de sua Os nativos do Transkei são muito claros em suas. de-
mãe sendo esta transação conhecida por d1tsoa. Ora, os clarações a mim feitas de que os deuses maternos de
naH~os declaram que o ditsoa recebido pelo irmã~ da uma pessoa, o ancestral patrilinear de sua mãe, nunca
mãe é realmente mantido por ele em favor dos f~lho~ infligirão castigo sobenatural a essa pessoa fazendo-a
de sua irmã. Se um dos iilhos ou filhas de sua 1rma ficar doente. {Não estou absolutamente certo quanto às
fica doente, pode ser que ele tenha de of:,recer um sa- tribos Sotho, mas suponho que eles provavelmente têm
crifício a seus espíritos antepassados, e entao _ele se vale opiniões semelhantes). Por outro lado, uma mulher ca-
de um animal de sua herança ditsoa. Além disso, qua~- sada pode receber proteção de espíritos ancestrais de
do O filho da irmã deseja obter uma esposa, pode tr sua linhagem patrilinear, e do mesmo modo seus filhos
ao irmão de sua mãe pedir-lhe ajuda para encontrar o pequenos, desde que estejam com ela. P.orque as crian-
gado necessário e neste cas_o o tio pod~~dar-lhe_ alguma ças apenas estão plenamente incorporadas à linhagem do
parte do gado ditsoa recebido por ocasiao do cas~men- pai, quando atingem a adolescência. Desse modo, no
to da irmã, ou mesmo dar-lhe gado de sua ~rópna he- Transkei, uma mulher quando casa deve receber uma
rança, contando ser ressarcido com o gado dttsoa ~ ser vaca, a vaca ubulu11ga, de seu pai, da herança da linha-
recebido · no futuro, devido ao casa~ento d~ .sobrinha. gem dela, a qual ela pode levar para seu novo lar. Visto
·Acho que a Corte de Ape1ação Nativa ?ec1diu q~e o que ela não pode beber o leite da vaca herdada pelo
pagamento da ditsoa ao irmão da mãe e voluntáno e marido durante o primeiro período de sua vida marital,
não pode ser considerado obrigação legal, e estou de pode abastecer-se de leite da vaca que traz de heran-
acordo com esse julgamento. Cito este costum~ P_?rque ça de sua linhagem. Esta vaca constitui um vinculo en-
ele ilustra a espécie de interesse que cabe ao mna? da tre ela e sua linhagem, seu gado e seus deuses, porque
mãe quanto ao filho de sua irmã) ajudando-o e cutdan- gado é o vínculo material entre os membros vivos da
do do seu bem-estar. Isto nos põe de novo dia~t~ da linhagem e os espíritos antepassados, Assim, se ela fica
.questão: por que o irmão da mãe P?de s~r sohc1taclo doente, pode fazer para si um colar com as crinas do
a oferecer sacrifícios quando seu sobrinho fica doente. rabo dessa vaca e deste modo colocar-se sob a proteção
· No sudeste da África a adoração dos antepassados. é dos deuses de sua linhagem. Além do mais, se um de
patrilinear, isto é, adora-se e participa-s~ dos sacrifíc_:1os seus filhos pequenos fica doente, pode fazer um oolar
a espíritos dos parentes falecidos na bnha mas,:ulm_a. parecido, com o que supostamente dá proteção à crian-
As declarações de Junod acerca dos baThonga nao sao ça. Quando seu filho cresce ela deve receber um touro
inteiramente claras. Em certo lugar declara ele que cad~ ubulunga da herança de seu pai, e, em conseqüência, é
família tem duas séries de deuses, os do lado do pai do rabo deste animal que ela fará o amuleto protetor;
e os do lado· da mãe; são iguais em dignidade e todos semelhantemente, a filha, quando se casa, é separada
podem ser invocados ( op. cit., II, p. 349, e l, p. 256, de sua mãe, e pode receber uma vaca ubulunga. do pai.
nota). Mas em outra parte declara 9ue se u~a oferenda Embora, de acordo com declarações a mim feitas, os
·deve ser feita aos deuses da familia da mae de~e ser antepassados maternos não castiguem seus descendentes
àtravés dos parentes maternos, ~s 1TU1lume (op. cit., II, com doença, podem ser chamados em socorro, Quando,
p. 3p7); Outras passagens confirmam isto e mos!ram- portanto, uma criança fica doente, os pais podem- apelar
·nos que os ·. espíritos antepassados só podem ser direta- ·para o. ir;mão .da mãe da criança, ou ao -pai: da :mãe, .s~
ainda estiver vivo, e pedir que seja ofereciqo, ,Úm. sacri-
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morto cm qt_1c os batukulus (filhos da irmã) desempe-
iício e um pedido de ajuda em favor dos antepassados nham parte importante. Eles matam e distribuém as ví-
maternos da criança. Isto, de qualquer modo, é decla- timas do sacrifício e quando o sacerdote oficiante faz
rado como prática nas tribos Sotho, e um dos propósi- a prece ao espírito do morto são os filhos homens da
tos do gado ditsoa que vai do pagamento nupcial ao irmã que, após certo tempo, interrompem ou «cortam»
irmão da mãe da noiva é considerado como provisão a prece e a terminam. Eles então, nos clãs baThonga,
para tais sacrifícios em caso de necessidade. apoderam-se das porções do sacrifício que foram de-
Isto nos traz ao desenvolvimento final do princípio que dicadas ao espírito do morto e correm levando-as «rou-
sugeri como base dos costumes reierentes ao irmão da bando-as» (op. cit., I, p. 162). '
mãe. O padrão de conduta para com a mãe, que é ~ou de parecer que o significado disto é que tal pro-
revelado na família em razão da natureza do grupo fa- cedimento dá expressão ritual à relaçã·o .especial exis-
miliar e sua vida social, é estendido com modificações tente entre o filho da irmã e o irmão da mãe. Quando
apropriadas à irmã da mãe e ao irmão da mãe, portan- o tio está vivo, os sobrinhos têm o direito de ir à al-
to ao grupo de par~ntes maternos em geral, e fina1mente deia e tomar o seu alimento. Agora que ele está morto
aos deuses maternos, ancestrais do grupo da mãe. Do e~es vêm e fazem isto novamente, como parte do rituaÍ
mesmo modo o esquema de conduta para com o pai é funebre, e como se fosse pela última vez, isto é, vêm
estendido aos irmãos do pai e suas irmãs, e a todo o e roubam porções da carne e bebida que são postas
grupo paterno ( ou antes a todos os membros mais ve- fora como porções do homem morto.
lhos dele, sendo que, no caso, o princípio quanto à idade
impõe modificações), e finalmente aos deuses paternos. A mesma espécie de explicação prevalecerá, segundo
O pai e seus parentes devem ser obedecidos e res- penso, quanto ao papel desempenhado no sacrifício e ou-
peitados (e até adorados, no sentido original da pala- tros rituais pelo filho da irmã entre bantos da África
vra), e assim também os antepassados paternos. O pai do Sul e também em Tonga e Fiji. Na medida em que
<:astiga seus filhos do mesmo modo que o podem fazer o homem teme seu pai, do mesmo modo teme e reve-
os antepassados do lado paterno. Reciprocamente, a rencía seus antepassados paternos, mas não teme o ir-
mãe é carinhosa e indulgente para com seus filhos, e mão de sua mãe, e pode assim agir de modo irreverente
-0 mesmo deve acontecer com seus parentes, bem como
para com seus antepassados maternos; na verdade exi-
ge-se que ele aja assim pelo costume, em certas' oca-
os espíritos ancestrais maternos.
Princípio muito importante, que tentei demonstrar em siõ<:s,. dando,. ?este modo, expressão ritual às relações
-0utra parte (The Andaman /slanders, Capítulo V), é soc1a1s especiais entre um homem e seus parentes ma-
que os valores sociais vigentes numa sociedade primitiva ternos de acordo com a função geral do ritual, tal co-
mo o entendo.
~ão mantidos mediante sua expressão nos costumes ri-
tuais ou cerimoniais. Os valores que aqui deparamos Será oportuno, talvez, um breve resumo da hipótese
nas relações do indivíduo para com seus parentes de que estou enunciando, com as pressuposições implicadas
ambos os lados devem, portanto, ter apropriada expres- e algumas das suas importantes conseqüências:
são ritual. O assunto é demasiado vasto para que dele
tratemos aqui, mas desej,o analisar uma questão. Entre .t •. ~ característica da maioria <las sociedades que chamamos
os baThonga, e também na Polinésia Ocidental (Fiji e pnmit!vas é que a conduta de indivíduos uns para com outros
é mmto amplamente regulada com base no parentesco fruto
Tonga), o filho da írmã (ou em Tonga também o filho este da forma~ão de padrões iixos de conduta para cada pa-
da filha) intervém no ritual de sacrifício. O Sr. Junod rente ou relaça o de parentesco;
descreve uma cerimônia de derrubada da cabana de um
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MM!~~~~;t"'"'""'.~'""~ª-""··"'". ,;:__.,.,,,,.. '"'""~"'"'fã~!"!:~"'·......,m..,,J~[.,..,1.f.tl!'!,@""·""'3"""'~-"'~~'"-·'..... _.....·-'-~""',·""·,_,,,..1<ilk""-""º-'""'"""''"""-t~~--·- - - ~ • • • • - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - " " " ' - - - - - - - - - - -

2. isto por vezes está associado com uma organização seg- rnento do gado ditsoa ao irmão da mãe de uma noiva
mentária da sociedade, isto f, com uma condiçíi.o na quat _foda não era legal, mas apenas obrigação moral. Tanto quan-
a sociedade é <lividida em certo número de segmenios (linha- to me sinta capaz de formar uma opinião, diria eu que
gens, clãs);
o julgamento estava certo.
3. enquanto o parentesco é sempre e ~ec:es~arlamente ~ilate-
ral, ou cognado, a organização _segmenlár1a e:uge a :icto~a? do Toda a questão do pagamento por ocasião do casa-
prilicípio unilinear, e deve ser te1ta uma opção entre inshtmções mento (lobola) é de considerável Importância prática no
patrlti.neares e matrlllneares; momcnro para missionários e magistrados, e para os pró-
4. em sociedades patri!ineares de certo_ tipo, ~ e~quema es- prios nativos. Ora, o estudo da exata situação em que
pecial de conduta entre um filho da irm~ e o 1tmao da mã: uma pessoa se encontra para com seus parentes mater-
decorre do padrão de conduta entre .º Mho e -~ mãe, qu~ e
~m si produto da vlda social no seio <la familia no sentido nos é de molde a que sem ele seria impossível chegar
restrito; a uma compreensão totalmente acurada dos costumes de
5. esta mesma espécie de conduta tende a estender-se a to- lobo/a. Uma das principais funções do lobo/a é fixar a
dos os parentes maternos, isto é, a toda familia ou grupo a posição social do filho do casamento. Se o pagamento
que o irmão da mãe pertença '; adequado for feito por uma família, no caso os filhos
6. nas sociedades com adoração de antepassados patrilinear da mulher que venha a ela em troca de gado pertencem
(como a baThonga e os insulares do arquipélago Friendly) o àquela família, e os deuses dela são seus deuses. Os
mesmo tipo de conduta pode também ser estendido aos deuses
da familia da mãe: nativos consideram que o mais forte dos laços sociais é
7. o tipo especial de conduta para com os parentes maternos
o do filho e sua mãe, e portanto, pela extensão que
(vivos e mortos) ou para com o grup? ~atern~ ~ seus deuses inevitavelmente ocorre há um laço muito forte entre o
e relíquias exprime-se em costumes ntua1s deltmdos, sendo a filho e a família de sua mãe. A função do pagamento
iunção ritual, no caso, como em out~a p_arte, fixar. e perpetuar lobo/a não é destruir, mas modificar esse vínculo, e si-
certos tipos <te conduta, com as obrigaçoes e sentimentos nele tuar os filhos definitivamente na familia ou grupo do pai
lmplicados.
para todas as questões relacionadas não apenas com a
Concluindo, permitam-me observar que escolhi o tema vida social, mas religiosa da tribo. Se não for pago
de. minha contribuição neste encontro, porque é não ape- lobokl algum a criança inevitavelmente pertence à fa-
nas te6rfoo como de interesse prático. Por exemplo, há mília da mãe, embora sua situação seja então irregular.
a questão quanto a se a Corte de Apelação Nativa es- Mas a mulher por quem o lobo/a é pago não se converte
-táva realmente certa em seu julgamento de que o paga- em membro da família do marido; os deuses da família
não são os deuses dela; e aquele é o teste final.
Disse o bastante, espero, para demonstrar que a com-
• Esta extensão a partir do lrmão da mãe a outros parentes maternos
·ê demonstrada na tribo baThonga através da terminologia do parentesco. preensão adequada dos costumes referentes ao irmão da
-O termo matume, primeiramente aplicado ao Irmão da mãe, é estendido
.llos filhos daqueles homens, que são também malume. Se os lrmlios de mãe. seja uma premissa necessária para qualquer teoria
minha mlle estão mortos cabe a seus filhos oferecer o sacrlflclo a meu
Javor aos ,nli!us antepassados maternos. Na parte norte da tribo, o termo
final do /abola.
matume caiu em desuso, e o pai da mãe, o Irmão da mãe, e os filhos
11omens do Irmão da mãe são todos chamados kok111a11a (avó). Embora
pareça absurdo para nós chamar um filho do Irmão da mãe, que pode
ser na verdade mais jovem do que o falante, por uma palavra que sig-
nifique "avó",. o argumento deste ensaio nos permitirá perceber algo
.do seu significado. A pessoa que deve fa2er o saerlflclo em meu favo,r
aos meus antepassados maternos é primeiramente o pai de minha mãe, e
4epols, se · ele ettlver morto, o Irmão de minha mãe, e depois da morte
deste último, seu filho, que pode ser mais Jovem do que eu. Há seme-
lhança de· futt'Çll.ó nesses três relacionamentos; um 11ntco esquema geral de
.conduta lnlnha para com todos eles e Isto · é de. novo semelhante em geral
quanto ao& avós. A nomenclatura é, pois, adequada.

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