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A n a L u iz a F a y e t S alla s
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Este é o tem a geral do trabalho de Johannes Fabian, Tim e and
th e Other. H ow A n th rop olog y M akes its O b je ct,* que p erten ce a uma
geração de an tropólogos que têm sido id en tifica d os com o “ os des
con ten tes” (S cholte, 1971) com os rum os que a an trop ologia tom ou
para con solidar-se com o ciên cia e que buscam , através de um a visão
crítica, estabelecer novas direções, lan çan do propostas con cretas com
um a perspectiva m od ifica d ora da p rática an tropológica.
F abian con cen tra as suas questões na p roblem ática do uso do
tem po no discurso an trop ológico, especialm ente de com o esse dis
curso se consolidou, co loca n d o, sistem aticam ente, o “ O u tro” num
tem po e num espaço d iferente do nosso. R elem bra o autor que esta
p rática é de natureza p olítica, já que tod o o con h ecim en to a n tro
pológico se deu por um a relação h istoricam en te estabelecida de poder
e d om in ação entre a sociedade do a n trop ólogo e a que ele estuda.
Dessa m aneira, a con solida çã o in icial d o discurso an trop ológico
ocorreu através de um paradigm a evolu cion ista da con cep çã o do
tem po, que n ão fo i som ente secularizado e naturalizado, m as tam bém
espacializado. A secu larização d o tem po em erge co m o um a con cep çã o
de tem po e espaço nos term os da história da salvação. Já o tem po
naturalizado e espacializado irá dar um sig n ifica d o esp ecífico da
distribuição da h um anidade n o espaço. Daí, a im p ortâ n cia do d ifu -
sionism o com o u m p ro je to de escrever história sem tem po dos povos
sem história, através do estudo da “ im utável” cultura prim itiva, onde
as relações tem porais puderam ser negligen ciadas em fa vor de rela
ções espaciais.
Os esforços que os a n tropólogos fizeram em estabelecer relações
com o “ O u tro” , por m eio de um dispositivo tem poral, im plicaram
n a afirm açã o con stan te de diferen ças com o distância. Isso acarretou
u m a distorção, já que o a n trop ólogo em seu trabalho de cam p o em
prega con cep ções de tem po diferentes daquelas de seus escritos.
A té h oje, argum enta F abian, con ceitos com o civilização, evolu
ção, desenvolvim ento, aculturação, m od ern ização estão presentes no
discurso an trop ológico, referentes a um a n o çã o de tem po evolu ci-
nário. O con teú d o id eológico desses con ceitos fu n d a m en ta -se num a
evidente superioridade da sociedade ocid en ta l e em con d ições de
p od er e dom inação. É assim que podem os com p reen d er que o “ p ri
m itivo” se con figu ra den tro dessa lin ha de pen sam en to com o um
con ceito tem poral, com o categoria, e n ão com o ob jeto do pensam ento
oeldental.
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C onsiderando o tem po um a dim ensão chave, através da qual nós
con ceitu alizam os relações com os “ O u tros” , F abian ch am a a aten ção
p ara a ausência de “ coeta n eid a d e” na p rática a n trop ológica. P or
“ coeta n eid a d e” F abian entende algo que deva ser criado, já que a
com u n ica ção h um ana refere-se à cria çã o de um tem po p a rtilh ado.
E nfatiza a persistência n o discurso a n trop ológico da n eg a çã o da
coeta n eid a d e, isto é, a n egação de um tem po p artilh ado, pelo a n tro
p ólogo e pela sociedade que ele estuda. T ra ta -se, p ortan to, da p ró
pria exp eriên cia vivida.
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da an tropologia, cristalizado nos estudos de “ caráter n a cio n a l” d e
senvolvidos pela an trop ologia am ericana. A possibilidade de d om in a -
ç&o p olitica, servindo a interesses estratégicos e de defesa n acion al.
A an tropologia, que durante m uito tem po serviu a esses p rop ó
sitos, en con tra-se, no m om ento, com p elid a a sair de um a posição
con tem plativa d ecorren te da postura relativista. F abian argum enta
que é necessário, nesse sentido, que o a n trop ólogo assuma, de fato,
um papel mais ativo em seus trabalhos de cam po, para não só
adquirir o sen tid o da vida dos povos que ele estuda, mas tam bém
para se coloca r d en tro d esse sen tid o.
P ond o em fo c o a questão do estruturalism o na discussão, surge,
nesse particular, a visão que Lévi-Strauss tem da p róp ria a n tro p o lo
gia e da in flu ên cia disso em toda ten dên cia de análise an tropológica.
Para Lévi-Strauss, a an trop ologia con sa g ra -se com o um a ciên cia da
cultura, esta sendo para ele o estudo das relações entre culturas
isoladas e as regras que governam essas relações. Com o base da
análise estruturalista, e n con tra -se um a d escrição ta xon óm ica que
organiza, de m aneira binária, o con h ecim en to. A utilização de sis
tem as sem iológicos, nesse tipo de análise, elim ina o tem po e, por
im p licação, qualquer n o çã o de processo, gênese, em ergência, p r o
dução e outros con ceitos que con stroem o corp o da “ h istória” .
Fabian critica o estruturalism o por este rem over o tem po da
realidade da prática cultural, co loca n d o em seu lugar form as lógicas
puras. Aqui, o tem po é naturalizado através do deslocam ento da
esfera da con sciên cia para a p rodu ção cultural. O p roblem a do
estruturalism o em relação ao tem po é recon h ecid o com o sendo, em
vários sentidos, ligad o à relu tân cia em ad m itir con sciên cia , Inten
ção, ou m esm o atividade subjetiva, com o fo n te de con h ecim en to
n ativo ou an trop ológ ico (c f. :6 0 ).
Para que se tom e a questão da tem poralização com o um o b je to
de investigação, F abian d efen d e a prop osição de que ela n ão pode
ser definida axiom áticam en te, já que con ota outras in stân cias de
en ten d im en to: lingüísticam ente, referin d o-se aos vários m eios de
a linguagem expressar relações tem porais; sem ioticam ente, desig
n an d o o estabelecim en to de relações de signos com referen tes tem
porais; e, ideologicam en te, ao se coloca r um o b je to do discurso
den tro de estruturas cosm ológicas, de tal m odo que as relações
tem porais torn a m -se centrais e tópicas. A tem poralização não se
con stitui num a propriedade in ciden tal do discurso h istórico; fo rm a -
se através de um sistem a sem iótico, proven do-se, tanto de sig n ifi
cante, quanto de sign ificado.
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Nesse sentido, a relação entre um determ in ado tipo de discurso
tem poral e seus referentes, assim com o a relação entre operações
tem porais esp ecíficas e seus sign ifican tes, estão, raram ente, n um
p lan o referen cial. Q uando n os referim os ao term o “ p rim itivo” , ou
“ selvageria” , eles ap arecem com o term os chaves n o discurso tem
poral, p ressu p on d o-os co m o representantes de um a seqüência e v o -
lucionária, um a rtifício para o estabelecim en to de distância tem poral.
Ao id en tifica r a prática freqü en te d o discurso an trop ológ ico
de n egação da coetaneidade, F abian sustenta sua argu m en tação
através da teoria literária, onde, ao n ível dos textos, en con tra rá
exem plos sem ânticos, sin táticos e estilísticos da questão d a tein -
p o ra lid a d e.
Cham a a aten çã o, especificam en te, p a ra o que os a n trop ólogos
con sideram seu “ presente e tn o g rá fico ” , analisando, assim, o p ró
p rio ato de escrever etnografías. O presen te e tn og rá fico, com o p rá
tica de se coloca r a n a rra çã o sobre ou tras cu ltu ras e sociedades
n o tem po presente, im p lica n a p rod u çã o de escritos que “ con g ela m ”
as práticas culturais, n ã o abrindo, den tro do discurso, a possibili
dade de m u d an ça e a din â m ica da p róp ria sociedade.
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dade cien tífica ) é m a rca d o pelo tem po presente; p ron om es e fo r
m as verbais na terceira pessoa m arcam um “ O u tro” fora do d iá
lo g o ” (:8 5 ).
Em suma, o con h ecim en to a n trop ológico realizou-se, tanto na
form a do presente e tn og rá fico, com o no passado do a u tobiográfico.
D e um a m aneira geral, o “ O u tro” , com o o b je to de con hecim en to,
teve que ser, sistem aticam ente, separado, distinto e, p referen cia l
m ente, distanciado d o an tropólogo. Nesse sentido, nós n ão e n con
tram os a selvageria no selvagem , ou a prim ltividade n o prim itivo,
n ós os colocam os lá. A an trop ologia tem usado de vários m eca n is
m os para m an ter distância, na m aior parte das vezes, m anipu lan do
a coexistência tem poral através da n egação da coetaneidade.
Em vista disso, o sen tido m aterialista e processual da teoria que
Fabiam propõe pode ser agora m elh or en ten dido, n o sentido m a r
xista do term o, fu n d a m en ta n do-se, em p rin cíp io, com o um a res
posta a o evolucionism o, on de o p resen te n ão é con ceb id o com o um
p on to no tem po nem co m o um a m odalidade da linguagem , mas
com o a co-p resen ça de atos básicos de p rod u çã o e reprodução.
Podem os agora pensar qual o sig n ifica d o disso em term os de um a
saída para a con tra d içã o prática entre pesquisa de ca m p o (co e
tán ea) e escritos an trop ológicos (n eg a çã o d a coeta n eid a d e).
C om o pudem os ver até agora, a base de sustentação de tod o
o argum ento de F abian ap oia-se, por um lado, n a questão da lin
guagem e, p or outro, na natureza da próp ria pesquisa de cam po.
A poiado na teoria m aterialista do con h ecim en to, ele acredita ser
possível um a solução, pelo m enos, ao n ível teórico. Em que con sis
tiria isso? P ara ele, a teoria m aterialista d o con h ecim en to tom a a
possibilidade de cria çã o da con sciên cia individual ou coletiv a com o
p on to de partida. Isso sign ificaria, a um p rim eiro nível, ver a p ro
dução d o con h ecim en to com o en volven do u m trabalh o de tra n sfor
m ação, através da relação entre “ co n h e ce d or” e “ co n h e cid o ” , com o
constitutiva da con sciên cia. Num segundo nível, é que esta relação
se constituiria co m o represen tacion al (sign ificativa, s im b ó lic a ), ou
n o sen tido de se torn a r u m Instrum ento d e In form ação.
F abian utiliza-se, tam bém , da herm en êutica para considerar as
distâncias tem porais num sentido mais con creto. P ara ele, a her
m en êu tica sig n ifica a a u to-com preen sã o da an trop ologia com o ciê n
cia interpretativa. T od a experiên cia pessoal é produzida sobre co n
dições históricas, em con textos históricos. A in stân cia h erm en êu
tica pressupõe um grau de distância, um a ob je tiv a çã o de nossa ex
periência. O fa to de que as nossas experiên cias co m o “ O u tro” sãc.
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necessariam ente, parte de nosso passado, pode se tran sform ar, n ão
em um im pedim en to, mas em con d içã o necessária para um approach
in terpretativo (cf. :8 9 ). Na a n tropologia, ressalta Fabian, a sub
jetivid ad e n ão pode ser coloca d a em reposição à objetivid ad e, jà
que o con h ecim en to etn og rá fico tem sem pre um referen cial au
tobiográfico.
O an trop ólogo e seu in terlocu tor con seguirão am pliar o “ c o
n h ecim en to” som ente a partir d o m om en to em que eles se e n co n
trarem um com o outro n o m esm o tem po. P rivilegian do a pesquisa
de cam po nessas con dições, F abian acredita ser possível a supe
ração do p roblem a da questão de tem poralidade na p rática a n tro
pológica.
Fundam entais para ele serão, n a realidade, dois con ceitos c h a
ves: con sciên cia e produção. A con sciên cia, p ara ele, em erge, ju s
tam ente, na pesquisa de cam po, n o co n fro n to de nosso arsenal
teórico m etod ológico com a realidade em pírica, dentro de um tem po
com p artilh ad o (ou que deva se r ). A prod u ção aparece mais num
sentido m arxista, pela criação de va lor que será apropriado pela
linguagem , n ão pela sim ples d efin içã o de um a relação que assuma
a coetan eidade, mas com o, fu n dam en talm ente, um a prática política
Creio que a validade das questões que F abian levanta em re
lação ao uso d o tem po n o discurso an trop ológ ico pode ser lida em
dois sentidos. P or u m lado, ao se assum ir a coetan eidade com o uma
prática política, o an trop ólogo terá a possibilidade de en ten der a
sua relação com o “ ou tro” na form a de um a relação política. Num
ou tro sentido, ao se negar a coetan eidade, n eg a -se esta relação
p olítica e, p or conseqüência, evid en cia-se a natureza de d om in a çã o
do con h ecim en to cien tífico ao tratar de outras soicedades ou grupos
sociais que, de m aneira geral, têm ocu p a d o um a posição h iera r
quicam ente “ in ferior” à nossa.
F abian tam bém assume a necessidade de um a abordagem h u -
m an lsta-h istórica, bu scan do resgatar a n oçã o de “ totalid ad e” com o
um m eio de se rom per um círcu lo vicioso que se con cretiza na
m edida em que existe um a descon tin u idade entre a experiên cia
existencial e a realidade objetiva. Nesse sentido, h á toda um a c r í
tica à abordagem cien tificista, que acabaria p or tran sform ar, tan to
observador, quanto observado em objetos, em “ coisas” , pela ca p a
cidade de alienar o pesquisador de sua própria hum anidade.
Um a crítica possível a F abian é que, apesar de id en tifica r
m uito claram en te o problem a do uso do tem po no discurso a n tro
pológico, ele n ão in d ica a solução de m aneira m uito explícita, d e
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corrên cia, talvez, do fa to d e assum ir um a p erspectiva m ais teórica
d o que prática. O seu m érito é ter trazido p a ra o cen tro das dis
cussões — através da questão d o uso d o tem po e da natureza p olí
tica da atividade do a n trop ólog o — o sig n ifica d o da pesquisa de
ca m p o e da próp ria fin alid ad e dos dados etn ográ ficos, n um a visão
bastante fecu n d a da relação entre teoria e política, co m o um cam po
a ser exp lorad o de form a m ais sistem ática pelos cientistas sociais.
Creio que a n o çã o de u m tem po com p a rtilh a d o, prop osta por
F abian, n ão elim inará, p or si só, as con tra d ições que se con fig u ra m
n o m om en to da pesquisa d e cam po. Na realidade, à m edida em
que tom arm os co n sciên cia dessas con tra d ições, é im prescindível
que saibam os trabalhar sobre elas. Isso será possível n o m om ento
em que a in serção d o an trop ólog o em d eterm in ada realidade social
o corra n u m a perspectiva em que ele tam bém se enquadre com o
a to r do en con tro etn ográ fico.
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BIBLIOGRAFIA
FABIAN Johannes. Time anã the Other. How Anthropology Makes its
Object. Nova Iorque: Columbia University Press, 1983.
SCHOLTE, B. Discontents in Anthropology. Social Research, vol. 38, n.° 4,
1971.
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