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Doutor, só uma perguntinha...

Dr. Tom Smith

Doutor, só uma
perguntinha...
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro)

Smith, Tom
  Doutor, só uma perguntinha... – / Tom Smith ;
[tradução Luis Reyes Gil]. – São Paulo : JSN
Editora, 2007.

  Título original: Doctor, have you got a


minute?

  1. Medicina - Miscelânea 2. Médico e paciente


3. Perguntas e respostas I. Título

  07-6243       CDD-610.76

Índices para catálogo sistemático:


1. Medicina : Perguntas e respostas   610.76

Copyright © Tom Smith, 2006


Direitos da tradução em língua portuguesa: JSN Editora Ltda.

Título do original: Doctor, have you got a minute?

Tradução: Luis Reyes Gil


Consultoria: Dr. Jacyr Pasternak
Preparação e revisão: Mauro Feliciano Alves
Capa: A2 com ilustração de Negreiros

Todos os direitos reservados.


É proibida a duplicação deste volume, no todo ou em parte,
sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico,
gravação, fotocópia ou outros), sem permissão expressa da Editora.

10  9  8  7  6  5  4  3  2  1

ISBN: 978-85-85985-18-9
À minha família
Introdução

V enho pensando em escrever este livro há mais ou menos


25 anos. Foi esse o tempo que passei respondendo per-
guntas nas minhas colunas sobre medicina em vários jornais.
Geralmente, as perguntas que recebo dos leitores são bem pre-
visíveis, até mesmo estúpidas, mas muitas delas, poderíamos
dizer, incomuns. Daquelas que não podem ser respondidas
procurando em publicações médicas, e tampouco seriam feitas
numa consulta clínica de rotina. Portanto, as deste livro não
são as perguntas e respostas que você irá encontrar normal-
mente numa coluna médica de jornal. São, suponho eu, uma
mistura do tipo de questões que me foram feitas socialmente,
muitas vezes em jantares, e quase sempre lá pelo fim da noite.
Elas passam pelo peculiar, o engraçado e às vezes o sério.
Responder perguntas sobre medicina fora do ambien-
te do consultório, seja numa festa ou num ponto de ônibus,
é coisa feita de improviso. Ao contrário da situação médica


“real” num consultório, não temos acesso imediato a livros e
publicações médicas, ou à Internet, ou seja, não dispomos de
nenhuma fonte precisa para dar apoio ao que estamos dizen-
do. Nem temos a oportunidade de ler um histórico comple-
to, ou examinar o paciente e pedir exames para comprovar o
diagnóstico – coisas básicas numa consulta médica. Assim,
quando falamos socialmente sobre um assunto, dependemos
de nossa experiência e daquilo que nossa memória guardou
do que tivermos lido.
Conseqüentemente, devo admitir que este livro é falho.
Eu respondi às perguntas do jeito que faria no cotidiano, ou
seja, à queima-roupa. A vantagem é que ao ler o livro você não
vai ter de se incomodar com notas de rodapé ou referências
a obscuros artigos em revistas das quais nunca ouviu falar, e
também que escrevi livremente e de um jeito muito pessoal a
respeito do mundo da medicina, da maneira como eu o vejo.
Feita a ressalva, tenho razoável certeza de que aquilo
que escrevi é adequado ao seu tempo: toda semana eu leio o
British Medical Journal, o Lancet e a New Scientist, geralmen-
te de cabo a rabo. E há ainda as coisas das quais tenho ouvido
falarem.
Nos últimos 25 anos venho participando de congres-
sos médicos pelo mundo todo. É como ser pago para ser um
estudante permanente de medicina. Assim, se me pergun-
tam, por exemplo, numa reunião social, sobre os benefícios
do vinho tinto para a saúde, posso dizer que estava lá, em
Paris (ou será que foi em Viena?), quando foram anunciados
pela primeira vez.


Conversas com um médico que você acaba de conhe-
cer raramente são muito racionais e empáticas, é claro, e
poucas vezes tão frutíferas como podem ter parecido à noi-
te. Com a ressaca da manhã seguinte (possivelmente para
os dois participantes) vem a compreensão de que aquilo que
se disse na noite anterior poderia muito bem ter ficado sem
ser dito. Nós médicos podemos sentir isso particularmente
quando o verdadeiro médico da pessoa telefona irado com
a interferência ocorrida na preciosa relação médico-pacien-
te, e ameaça relatar o diálogo evidentemente regado a ál-
cool à comissão disciplinar do conselho de medicina. Nun-
ca é demais dizer que, se você está seriamente preocupado
a respeito de alguma coisa, deve procurar seu próprio clíni-
co geral. Aqui apenas apresento algumas das questões mais
comuns, e mais singulares, que me foram feitas ao longo
dos anos. Talvez você se reconheça em alguns dos tipos...


A VICIADA EM BELEZA

Q uem é que está feliz com seu corpo e sua aparência?


Parece que cerca de 80 por cento dos homens não se
importam muito, e que mais ou menos a mesma proporção
de mulheres odeia sua aparência e gostaria de mudá-la. Pelo
menos é nisso que as revistas gostariam que acreditássemos.
Não sei se é verdade. As mulheres jovens que conheço geral-
mente dão a impressão de estarem contentes com elas, e isso
não parece mudar quando ficam mais velhas.
Mas existe a viciada em beleza. Ela percorre a Terra
procurando maneiras de melhorar sua aparência. Está des-
contente com sua pele, seu nariz, seus seios, suas pintas, sua
silhueta, sua postura, seu cabelo, suas marcas de expressão
(alguma vez você já ouviu uma viciada em beleza se referir
às suas rugas assim?) ou, na verdade, com a sua própria vida.
E assim ela tenta melhorar tudo isso com cremes, dietas da
moda e comprimidos – em geral, suplementos vitamínicos e
ervas – e às vezes com botox e plásticas.

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É difícil ela falar de outra coisa que não sejam as maneiras de
se manter parecendo jovem – cirurgias plásticas, colágeno,
botox e coisas do tipo – e se exercita muito por causa de um
material chamado celulite, desconhecido para a ciência médi-
ca, e que misteriosamente apareceu sob a pele das suas coxas.
Atualmente ela tenta erradicar esse material chacoalhando-o
com um cinto vibrador e batendo nele com galhos de bétula
numa sauna. Não está conseguindo lá muitos resultados.
Felizmente, de vez em quando ela sai de cena, para se
recuperar de sua última plástica no nariz ou nos seios, mas
logo depois volta com renovado entusiasmo e com um rosto
ainda mais desprovido de expressão.
Ela é provavelmente a mais frustrante de todas as pes­
soas que infernizam os médicos. Ela não dá bola para evi-
dências de processos médicos e de casos clínicos desastrosos:
prefere acreditar nos anúncios de empresas muito ricas (e
com freqüên­cia inescrupulosas) que promovem seus produ-
tos de beleza. Enquanto a viciada em beleza tagarela sobre
sua próxima aventura em busca da eterna beleza e da perfei-
ta saúde, fico imaginando se teve a chance de ler o livro Ela,
de Rider Haggard (a história da heroína eternamente jovem
que visitou a fonte do rejuvenescimento com excessiva fre-
qüência, com resultados terríveis). Mas, é claro, seria muito
indelicado perguntar.

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Vou envelhecer no mesmo ritmo da minha mãe?

Vai depender de você ter tido uma vida e um estilo de vida se-
melhantes aos dela. Provavelmente você não teve. Cresceu em
melhores condições, comeu melhor, teve menos problemas de
saúde em sua vida, e também um estilo de vida menos sacrifica-
do. Nesse caso, irá envelhecer mais lentamente do que sua mãe.
No entanto, a maior influência de envelhecimento em nossa so-
ciedade é o hábito de fumar. Ele acelera rapidamente o processo
de envelhecimento. Portanto, se sua mãe era não fumante e você
fuma, apesar de todas as suas outras vantagens, envelhecerá mais
depressa do que ela. Não se trata apenas das rugas, mas dos efeitos
que o cigarro, o monóxido de carbono e o alcatrão têm em todos
os órgãos internos. Os pulmões de fumantes parecem ser quaren-
ta anos mais velhos do que os seus donos.

É verdade que algumas pessoas têm metabolismo me-


lhor do que outras? Ou você pode ser gordo mesmo sem
comer muito?

Não, as pessoas não têm metabolismos diferentes. Nosso me-


tabolismo humano básico é universalmente muito similar: se
ele chega a diferir no seu ritmo é quase sempre devido a algu-
ma doença, como um distúrbio da glândula tiróide (hiperati-
vidade ou subatividade). E, sim, você pode ser gordo mesmo
sem comer muito.

13
Vamos voltar quarenta anos e examinar os estudos rea-
lizados sobre pessoas “agitadas e paradas”. Colocaram-se vo-
luntários em salas de “calorias controladas”, por alguns dias.
Tudo na sala era constantemente controlado – o calor que
as pessoas perdiam, sua atividade física, o material que elas
expeliam (para usar uma expressão mais delicada) e seu peso,
no primeiro dia e depois de vários dias de teste na sala. A
ingestão de alimentos era controlada, de modo que todos co-
miam a mesma coisa todos os dias. A temperatura de cada
sala era mantida constante, num nível confortável. No final,
metade das pessoas do teste havia conservado o mesmo peso,
e a outra metade engordado vários quilos.
A diferença entre elas? As pessoas que haviam mantido
o peso nunca tinham ficado paradas. Mesmo quando esta-
vam sentadas, mexiam os dedos, os membros, se ajeitavam
nos assentos, e levantavam e voltavam a sentar várias vezes.
Eram as “agitadas”. As que ganharam peso tendiam a ficar
largadas numa poltrona e só saíam dela para pegar a comida
que era empurrada por uma abertura na parede. Dificilmente
levantavam para dar uma andadinha. Quando estavam sen-
tadas, quase nunca mexiam um músculo. Elas se largavam na
poltrona e assim ficavam.
Agora vejamos os dinamarqueses em 2005. Os dina-
marqueses são de grande ajuda para responder questões como
esta. Eles têm uma população cativa – o país todo, cujos
registros médicos ficam na mesma base de dados. Acompa-
nharam todas as crianças nascidas na Dinamarca num deter-
minado ano, desde seu nono aniversário até completarem 18

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anos de idade. Registraram seu consumo de alimentos, ganho
de peso, a forma de seus corpos e a quantidade de exercício
que realizaram em seus anos de adolescência. Cerca de 15 por
cento deles ficaram obesos nesse período. O que os tornou
obesos? Não foi sua ingestão de alimentos. Em média, os di-
namarqueses magros haviam comido a mesma quantidade de
comida que os gordos. A grande diferença foi o exercício. Os
magros iam de bicicleta para a escola e se dedicavam bastante
a jogos e esportes. Os mais gordos iam de carro ou de ônibus
e preferiam ficar em casa jogando videogame do que ao ar
livre. Portanto, você pode ficar gordo mesmo sem comer de-
mais. A grande dificuldade para algumas pessoas é conseguir
gastar energia suficiente para queimar as gorduras.

Isso quer dizer que a única maneira de perder peso


é fazer exercício, e que os regimes não funcionam?

Não, não é isso. Nós nos tornamos gordos ao não praticar


exercícios, mas continuamos gordos e engordamos ainda mais
ao comer em excesso, e passar horas no sofá. Por isso devemos
tanto comer menos como fazer mais exercício.

Então, qual é a melhor maneira de comer menos? Já ten-


tei todas as dietas que existem e ainda não emagreci.

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A melhor resposta é comer mais devagar. A sensação de que
você está com fome leva um tempo para diminuir, mesmo
quando está forrando sua boca e estômago de comida. Se
come mais depressa, vai enfiar bem mais comida dentro de
você antes de se sentir satisfeito do que se comer mais deva-
gar. Os antigos estavam certos – eles ensinavam as crianças a
colocar menos comida na boca de cada vez, e a mastigá-la 32
vezes antes de engoli-la.
Talvez nessa época, quando todo mundo tinha os den-
tes cariados (você já viu quantos potes de geléia havia nas
cozinhas das casas de campo?), mastigar era uma coisa tra-
balhosa e ineficiente, e se levava mais tempo do que hoje para
conseguir mastigar alimento sólido até que ficasse em condi-
ções de ser engolido.
Seja como for, demore um tempo mastigando cada bo-
cado de comida antes de engolir: 32 vezes pode ser muito,
mas procure apreciar o gosto, saborear o último bocado que
engoliu antes da próxima garfada, e pegue metade da comida
que costuma colocar no garfo. Se você conseguir estender a
primeira parte de sua refeição até 25 minutos, mesmo que ti-
ver comido nesse tempo apenas parte do que costuma comer,
vai se sentir com bem menos fome. Não vai querer um monte
de comida no próximo prato, e provavelmente poderá dispen-
sar a sobremesa. Pelo menos é isso o que você deve ter como
meta. O método funciona e tem os benefícios de você poder
comer e apreciar todos os alimentos de que gosta, e até de cur-
tir o fato de estar comendo menos. Franceses e italianos têm
uma abordagem correta – eles fazem da refeição um aconte-

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cimento familiar, no qual o ato de comer é só uma parte da
diversão. Há também o beber, a conversa, as brincadeiras, a
música e a socialização, que tornam a refeição um verdadeiro
evento. Eles comem e bebem menos em quatro horas do que
os brasileiros em uma. Para provar meu argumento, vá um
dia até Paris e observe os parisienses. Então volte ao Brasil
e olhe para o povo nas ruas. Onde você vai encontrar mais
gordinhos? Pode apostar que é aqui.

Por que um seio é maior que o outro? Será que tem a ver
com o fato de a mulher ser destra ou canhota?

Não fomos projetados para ser exatamente simétricos. Olhe


para as duas metades do seu rosto. Se você dividir o rosto
pela sua linha média, espelhar cada uma das metades e depois
colar essas metades duas a duas, terá à sua frente imagens de
duas pessoas que se parecem vagamente com você, e ainda
menos uma com a outra. Com os seios acontece algo pare-
cido – não podemos esperar que o seio de um lado do peito
cresça e fique exatamente do tamanho do outro. Eles podem
ter uma diferença de volume de até um terço. Qual deles será
o maior é uma questão que parece ser decidida pelo acaso.
A hipótese de que o tamanho dos seios dependa do fato de
você ser destra ou canhota provavelmente se relaciona com
o volume dos músculos peitorais embaixo de cada um deles.
Como os que ficam do lado da mão que você mais utiliza são

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um pouco maiores (mas não de modo muito aparente), numa
mulher destra pode-se esperar que o seio direito seja mais sa-
liente. Mas não há evidência de que isso seja assim. A questão
da lateralidade pode não ter qualquer influência do tamanho
do tecido do seio.

Por que algumas mulheres têm barba?

Parte disso pode se dever a mudanças sutis nos níveis de


circulação de hormônios, quando há alteração na proporção
normal entre estrógeno e progesterona (os dois principais
hormônios sexuais femininos). Quanto mais progesterona
e menos estrógeno você tiver, maior a probabilidade de de-
senvolver pêlos. Existe também o efeito masculinizante da
produção constante de testosterona, que não é exclusiva do
homem, e que não decresce com a idade nas mulheres, o que
quer dizer que sua influência relativa se torna maior. A testos-
terona está na base da libido feminina – quanto mais alto o
nível de testosterona, mais forte o desejo sexual. Infelizmen-
te, isso vem acompanhado do surgimento de pêlos no queixo.

Por que algumas pessoas têm mais pintas que outras?

Nós humanos temos uma vasta variedade de colorações de

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pele, da pele bem clara dos escandinavos à pele bem escura
dos africanos equatoriais, incluindo todas as nuances entre
esses dois extremos. A cor da pele depende da quantidade
do pigmento melanina que ela contém – quanto mais escura
a pele, mas melanina ela tem depositada. Em alguns povos
de pele mais clara, as células de melanina, em vez de se
distribuírem de modo uniforme, concentram-se em “man-
chas”, que podem ter duzentas ou mais pintas, freqüente-
mente alinhadas, em geral nas costas. Quanto mais clara
a pele, maior a probabilidade de apresentar pintas. Pessoas
de pele escura têm bem menos pintas. A tendência de ter
muitas pintas (várias centenas) é hereditária. Se você tem,
deve checá-las regularmente (peça para alguém, se elas se
concentram nas suas costas), pois existe um risco crescente,
pequeno mas definido, de elas evoluírem para um câncer
com o avançar da idade, ainda mais se você tiver ficado ex-
posto regularmente ao sol.

É verdade que a comida ingerida em avião não engorda?

Não, não é verdade. Por acaso estar num avião suspende as


leis fundamentais da física? Ou da medicina? É claro que
não. A comida ingerida em avião tem exatamente o mesmo
efeito no seu peso que a comida ingerida em terra. O fato de
estar sendo ingerida a uma altitude de 8.000 pés (a pressão do
ar dentro do avião é ajustada para ficar compatível com esta

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altitude) não faz qualquer diferença. Mas talvez a qualidade
da comida tenha de ser levada em conta: não tenho certeza se
havia alguma caloria na coisa que me deram para comer em
minha última viagem de avião.

A gente precisa mesmo de pêlos pubianos? Eu passo a


vida raspando-os.

Será que carros precisam de pára-choques? Será que a pele da


pelve e o osso embaixo dos pêlos pubianos não precisam de
proteção contra outro osso pélvico batendo ou esfregando ne-
les? Experimente fazer um sexo mais enérgico com ambas as
áreas do púbis raspadas e isso talvez responda à sua pergunta.
Pessoalmente não recomendo, mas talvez eu seja um velho
rabugento e careta nascido antes que o sexo fosse inventado.

Quanto tempo duram os efeitos de uma cirurgia plástica,


como a de remoção de rugas? Ela tem de ser repetida de-
pois de algum tempo?

Se você está se referindo a aplicações de botox, então é pre-


ciso renová-lo depois de três a seis meses. Após esse tempo,
os músculos que ficaram paralisados por esse veneno pode-
rosíssimo voltam à ativa, e com eles as rugas. Se está falando

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de remoção cirúrgica de rugas, como as do pescoço, então
talvez a nova aparência dure um ano ou dois. Depende muito,
primeiro, de como você adquiriu essas rugas. Se é fumante,
por exemplo, então elas vão voltar bem mais rápido, pois os
elementos químicos do cigarro começarão a destruir a pele de
novo.

Por que o meu oftalmologista, especialista em cirurgias a


laser, continua usando óculos? Será que ele sabe de algu-
ma coisa que eu não sei?

Boa pergunta. Sim, ele sabe. Ele sabe que até 5 por cento das pes-
soas que fazem cirurgia a laser não conseguem enxergar tão bem
assim depois disso – elas ficam com a visão permanentemente
embaçada, e isso não pode ser corrigido de modo total com lentes.
Há dois requisitos básicos num bom cirurgião de olhos. Pri-
meiro, ele tem de ser bom no que faz. Segundo, tem de en-
xergar perfeitamente para poder continuar a fazer bem seu
trabalho. Você correria algum risco com sua visão se fosse
cirurgião oftálmico? A maioria das pessoas pode se virar bem
com uma visão parcialmente deficiente – na verdade, a maio-
ria de nós é assim. Por isso existem filas para fazer cirurgia de
olhos a laser. Mas os cirurgiões não. Não me incomodo de
usar óculos – uso-os desde que era estudante. Estaria perdido
sem eles, mas com seu auxílio posso enxergar perfeitamente
bem uma bolinha de golfe saindo do meu taco e voando 70

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metros para cair no buraco. Enquanto conseguir fazer isso
com meus óculos, não vou fazer cirurgia a laser.

A gente envelhece mais rápido trabalhando num ambien-


te com ar condicionado?

Não, não envelhece mais depressa. Você pode imaginar que


sim, pelo fato de sua pele ficar constantemente desidratada,
mas tomar bastante água é suficiente para deixar você livre de
rugas. Um bom ar condicionado deve ser capaz de lhe ofere-
cer um ar tão saudável como qualquer outra atmosfera não
poluída externa. No entanto, se esse ambiente com ar condi-
cionado é um escritório que mantém você amarrado em sua
mesa sem oportunidade de praticar exercício regularmente,
isso, sim, pode fazer com que envelheça mais depressa.

O colesterol é uma coisa que deve preocupar apenas os


homens?

Você pode imaginar que esta pergunta seja fácil de responder,


mas não é. Quase toda a pesquisa sobre o assunto foi feita
com homens: os estudos equivalentes em mulheres ainda es-
tão em andamento. Para homens, a resposta é inquestionável.
É melhor manter o nível total de colesterol abaixo de 5,2 uni-

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dades, e a relação entre o colesterol total e o colesterol de alta
densidade (HDL) deve ficar abaixo de 5,1.
Isso pode soar obscuro para você, mas o HDL é o
chamado “colesterol bom”, a substância que limpa as gor-
duras das paredes de seus vasos sanguíneos. As outras
duas substâncias que compõem o colesterol total são os
“maus” lipídios, que tendem a depositar gordura nos vasos
– são o chamado LDL ou colesterol de baixa densidade
(o L é de lipoproteína, um complexo de gorduras e proteí-
nas) –, e a VLDL (lipoproteína de densidade muito baixa
ou triglicérides). Somando os três, temos o colesterol total.
Deu para acompanhar até aqui? Para avaliar se você está com
um risco alto, a medição fundamental é a relação entre o co-
lesterol HDL e o colesterol total. Se o HDL corresponde a
mais de um quinto do total, então há pouco motivo para se
preocupar. Assim, um colesterol de, digamos, 7 está muito
bom se o HDL estiver em torno de 3, mas não se ele estiver
em torno de 1.
Quanto mais altos os valores de colesterol, maior o risco
de você sofrer um ataque cardíaco e infartar – desde que se
começou no Reino Unido a baixar os níveis de colesterol, re-
duziram-se nos homens pela metade as ocorrências de ataques
cardíacos e infartos. Essa é uma conquista fantástica.

1
Nota do consultor: no Brasil usamos outra unidade: 200 mg/dl.

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Quer dizer então que o colesterol parece não ser bom
para mulheres?

Antes que começássemos a medir e tratar os níveis de coles-


terol, os riscos de mulheres terem ataques cardíacos e infartos
aumentavam com a idade do mesmo modo que nos homens
– só que dez anos mais tarde do que eles. Ou seja, em média,
as chances de um homem de 60 anos ter um ataque cardíaco
eram as mesmas de uma mulher de 70 anos. Isso era uma boa
notícia para as mulheres. Existe alguma indicação de que sua
maior resistência a ataques cardíacos e infartos se deve à ação
protetora que os hormônios femininos exercem nos vasos san-
guíneos durante os anos em que elas menstruam.
Essas evidências deixaram os médicos inclinados a en-
carar os níveis de colesterol em mulheres como menos impor-
tantes do que os dos homens. Mas há vários problemas nesse
tipo de visão. Mulheres que fumam, que não controlam bem
sua pressão sanguínea alta e que fizeram terapia de reposição
hormonal por mais de seis meses têm alto risco de ataque
cardíaco e infarto em comparação com as demais mulheres.
Se elas quiserem melhorar sua saúde, sugere-se que parem
de fumar, monitorem e controlem regularmente sua pressão
sanguínea, interrompam sua terapia de reposição hormonal e
baixem seu colesterol, se estiver acima do limite definido para
homens. Nós, enquanto médicos, fazemos isso hoje rotineira-
mente, e é provável que esteja funcionando.
Portanto, como podemos conciliar essa prática com o
resultado de estudos franceses que mostram que o coleste-

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rol médio em mulheres com mais de 80 anos de idade está
acima de 8 milimoles por litro? Talvez as mulheres fran-
cesas sejam diferentes. Talvez seus níveis de colesterol te-
nham aumentado com a idade (embora isso pareça não
ter acontecido em outros lugares) ou então todas as mu-
lheres com baixos níveis de colesterol tenham morrido an-
tes de chegar aos 80! É possível que, para algumas mu-
lheres, o colesterol alto seja bom. Ainda não sabemos.
No geral, ainda me inclino a tentar baixar o coleste-
rol nas mulheres em que ele está muito alto, mas se tra-
ta de uma pequena prioridade, que passo a considerar
apenas depois de ter lidado com seus outros riscos “car-
díacos”. O fumo e a falta de controle da pressão sanguí-
nea matam bem mais mulheres do que o colesterol alto.

Tingir o cabelo repetidas vezes pode aumentar sua


perda?

Está comprovado que algumas tinturas podem matar folículos


de cabelo, pelo menos nos estudos feitos em animais. Parece
que é necessária uma combinação de peróxido de hidrogênio,
aminas e fenóis para que as tinturas atuem desse modo. Por-
tanto, se você quer manter uma vasta cabeleira, evite tinturas
que contenham esses elementos químicos. É curioso que as
pessoas que tingem regularmente o cabelo raras vezes se inte-
ressam em ver quais são os ingredientes da tintura. Qual foi a

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última vez que você fez isso? Você gostaria de saber o que está
engolindo caso se tratasse de comida ou remédio – e as tin-
turas de cabelo ficam em contato com o couro cabeludo, que
certamente absorve seus ingredientes. Se isso for uma preocu-
pação para você, que tal manter os cabelos grisalhos e chamá-
los de prateados? De repente, você pode estar lançando moda.

Praticar corrida pode causar lesões nos joelhos?

Correr não deve provocar lesões em joelhos normais, des-


de que você escolha um bom tênis, com amortecimento na
sola e no calcanhar. Mas pessoas que já têm as cartilagens do
jo­e­lho danificadas ou início de artrite podem fazer as coisas
piorarem. Se os joelhos começarem a doer durante ou de-
pois de correr, consulte um médico. Talvez você precise es-
colher outra forma de exercício. Caminhar num ritmo mais
forte pode ter os mesmos efeitos benéficos. Nadar também
é uma boa alternativa, mas talvez você ache o nado de pei-
to um pouco difícil. O nado crawl e o de costas provavel-
mente serão melhores para você, se tiver os joelhos sensíveis.

26
O MACHO DE MEIA-IDADE

O s alemães criaram um nome excelente para o que esse


cara tem – “complexo de tur-schluss”. Espero que meu
alemão esteja correto, desculpem-me se não estiver. Isso quer
dizer, obviamente, o complexo da porta se fechando. O ma-
cho de meia-idade começa a compreender que a porta está se
fechando para a sua juventude (ou mesmo para a sua meia-
idade) e quer agarrar o máximo possível do que a vida tem a
lhe oferecer antes que escorregue pelo outro lado da navalha
da vida em direção ao esquecimento. Devo mencionar alguns
eminentes políticos que se encontram nessa situação?
O primeiro sinal de que um homem se tornou um ma-
cho de meia-idade é que ele começa a se vestir de outro jei-
to: gravatas e camisas extravagantes passam a ocupar o lugar
das outras mais discretas que ele usou quando tinha 30 anos.
Saem os ternos de negócios e entram a moto, os agasalhos e
os sapatos vistosos. Ele começa a se preocupar com sua po-

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tência (quer mantê-la); seu cabelo (também quer mantê-lo);
e as gordurinhas da meia-idade (quer perdê-las, mas sem ter
de comer ou beber menos). Ele está apenas descobrindo que
todas essas ambições estão fora do seu alcance.
Ele voltou a fazer exercícios, depois de ter parado
quando saiu da faculdade, há uns vinte anos. Agora passou
a ir à academia (uma freqüentada por bastantes mulheres),
jogar futebol society e entrou para o clube de corredores.
Está se matando de tanto fazer exercício tentando se man-
ter jovem, e quer todas as dicas a respeito de como conse-
guir isso. Sua conversa gira em torno de níveis de coleste-
rol, pressão sanguínea, ataques cardíacos e sexo. Em poucos
anos, se ele sobreviver a essa terrível década, vai se estabili-
zar de novo numa vida normal, e tornar-se quase humano.

Por que os homens ficam carecas e as mulheres não?

Deixe-me trazê-lo de volta a cerca de 12 milhões de anos


atrás, quando nossos ancestrais eram ainda pequenas cria-
turas parecidas com macacos pulando e se coçando nas flo-
restas do leste da África – no atual Quênia. O clima mu-
dou de repente, e a planície arborizada transformou-se em
poucas centenas de anos numa planície gramada. Nossos
pequenos macacos agora tinham uma escolha a fazer. Ir
atrás da linha de árvores que retrocedia em direção às mon-
tanhas, onde acabaram virando chipanzés, ou fugir para

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o outro lado, para a costa. Ali poderiam sobreviver apenas
nas lagoas entre a praia e os recifes, onde estavam protegi-
dos dos grandes gatos e, pelos recifes, dos grandes tubarões.
Era idílico. Por 8 milhões de anos, os macacos viveram nas la-
goas. Ficaram mais altos, desenvolveram mãos e pés como se
fossem remos e nadadeiras, perderam quase todos os pêlos do
corpo para poderem nadar melhor, e adquiriram a necessária
camada de gordura sob a pele para manter a temperatura cor-
poral num nível ótimo. O nariz ganhou narinas que evitavam
que a água entrasse dentro dele. As pernas começaram a cres-
cer mais juntas, já que eles estavam a caminho de se tornar
totalmente aquáticos (eis por que nossa genitália transferiu-se
para a parte frontal, para acomodar o movimento das coxas,
batendo uma contra a outra ao nadar). O problema foram os
bebês. Nesse ambiente aquoso, com o que eles podiam contar
para se agarrar em caso de perigo, ou quando quisessem ma-
mar no peito?
A melhor coisa eram os cabelos compridos. Mães que
mantinham o cabelo em suas cabeças eram fáceis de reco-
nhecer e seus bebês tinham onde se agarrar. Assim, o gene
da calvície nas mulheres desapareceu. Mas não havia nenhu-
ma razão para manter o cabelo dos pais, já que eles não ti-
nham seios funcionais. Na sobrevivência dos mais aptos, a
calvície não representava nenhuma desvantagem, por isso o
gene da calvície não tinha por que desaparecer nos machos.
Então, após 8 milhões de anos nas lagoas, os macacos volta-
ram à terra. Eram muito mais capazes de se defender sozi-
nhos, pois agora tinham maior coesão social, agrupados em

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famílias. Tinham o dobro da altura em relação a 8 milhões de
anos atrás, um cérebro maior, e eram capazes de ver melhor
seus predadores, já que agora seus olhos estavam a mais de 1
metro do chão. Estavam agora bem distantes de seus primos
que haviam optado pelas florestas das montanhas havia 8 mi-
lhões de anos.
Soa improvável? Esse é um resumo da teoria de Elai-
ne Morgan, a importante antropóloga galesa. Como escocês,
gosto de dar crédito a alguém celta como eu – mas inicial-
mente ela não obteve nenhum crédito por seu trabalho. Ela
escreveu The Descent of Woman (“A Decadência da Mulher”),
em parte como reação a The Ascent of Man (“A Ascensão do
Homem”), escrito pelo guru da televisão da década de 70
Jacob Bronowski, e em parte para divulgar sua pesquisa junto
ao grande público. O establishment antropológico da época,
predominantemente masculino, deu pouca importância ao
seu trabalho, mas hoje ela é altamente respeitada, e sua teoria
sobre a época que nossos ancestrais passaram nos alagados do
leste da África é aceita por muitos de seus colegas.
Tal teoria pode resolver muitos quebra-cabeças a respei-
to da questão da calvície. Explicar, por exemplo, por que nós
humanos nos sentimos tão à vontade na água, gostamos de
nadar e passar férias na praia, e por que a grande maioria das
comunidades humanas vive às margens ou pelo menos próxi-
ma de mares e rios. Pode também explicar por que ainda te-
mos pêlos pubianos – bebês também podem se agarrar neles.
E o que dizer daquela relação mão-pênis (tema de uma das
perguntas a seguir)? Bem, as mãos estavam se desenvolvendo

30
e virando nadadeiras para permitir nossa locomoção na água.
Quanto maiores nossas nadadeiras, mais eficientes éramos,
e portanto mais machos. Será que isso se relaciona também
ao tamanho do pênis? Ou será que o tamanho não importa
tanto assim? Nossas mulheres modernas não estão tão preo-
cupadas com isso. A principal função do pênis é alcançar seu
prazer: e não precisa ser tão longo assim para isso.
Há um pós-escrito para a questão da calvície. É claro,
algumas mulheres acabam de fato ficando carecas, mas é raro
que isso aconteça antes da menopausa – e o gene que permi-
te a calvície pós-menopausa não teria evitado maternidades
bem-sucedidas em nossos ancestrais que viviam nas lagoas.
Mas elas são uma pequena minoria entre as mulheres. Quan-
do uma mulher jovem fica calva, o médico tenta identificar
causas físicas, como infecções do couro cabeludo ou alopecia.
Isso me faz lembrar com muito afeto de uma mulher en-
trando na faixa dos 40, com dois filhos, que me pediu orienta-
ção a respeito de sua calvície. Esta havia começado dois anos
antes, e era agora quase total, com cabelo apenas em volta da
parte alta das orelhas e atrás da cabeça. Para meu espanto,
o dermatologista diagnosticou calvície de padrão masculino,
e ordenou, sigilosamente (isso podia ser feito naquela épo-
ca), testes genéricos. Acabou-se descobrindo então que essa
mulher era na verdade um homem, com genitais externos fe-
mininos e testículos localizados dentro de sua pelve, que pro-
duziam uma mistura de testosterona e estrógeno. Não havia
útero, mas ela tinha em contrapartida uma vagina operante.
Era uma mulher perfeitamente feminina, criada como uma

31
menina, que, excetuando sua calvície (que ocultava com uma
excelente peruca), era bastante atraente. Seu marido e filhos
(que eram adotados – algo que fiquei sabendo apenas após o
diagnóstico) a adoravam. E, assim, o que podíamos fazer, eu e
o dermatologista? Decidimos não contar a ninguém – uma de-
cisão que provavelmente não poderia ser tomada hoje em dia.
O casal viveu feliz até se aposentar e os dois morre-
ram sem saber sua verdadeira condição. O tempo todo eu
fui médico da família – esse foi meu único caso de confu-
são de gêneros desse tipo. Não tenho certeza se isso con-
firma a teoria da doutora Morgan, mas me convenceu
de que a calvície do tipo masculino em mulheres é ex-
tremamente rara e deve ser tratada com muito cuidado.

Por que um testículo fica mais baixo que o outro?

Se os dois estivessem no mesmo nível, ficariam o tempo todo


batendo um no outro dentro da calça. Pense naquele jogui-
nho que se vê em mesas de executivos, com uma série de boli-
nhas de aço presas por um fio, em que se faz uma delas bater
nas outras quatro e a última da fila salta com uma certa força,
enquanto as outras ficam no lugar. Aplique isso aos testículos
do homem, lembrando o quanto são sensíveis, e ficará fácil
entender por que homens com testículos alinhados desapare-
ceram logo no processo de evolução da espécie.

32
O tamanho da mão de um homem é de fato uma indica-
ção do tamanho do seu pênis?

Quem você está tentando enganar? Quem fez esse estudo e


como? O pesquisador era homem ou mulher, e como ele con-
seguiu as medidas? Adoraria ver esse estudo, se é que exis-
te. Meu faro me diz que não há tal estudo (eu tenho mãos
pequenas). Existem homens para os quais as mãos grandes
estão inversamente relacionadas às dimensões de seus pênis.
Em outras palavras, quanto maior a mão, menor o pênis. Eu
lembro dos homens que se dedicam à modelagem física, que
usam esteróides para fazer crescer seus músculos. Como a
composição dos esteróides é semelhante à do hormônio tes-
tosterona produzido pelo homem, os testículos de quem toma
essa substância recebem a mensagem de que não precisam
mais trabalhar. Portanto, eles param de produzir testostero-
na, e o pênis reage da maneira esperada. Ele encolhe – às
vezes até sumir de vista. Quem se dedica à modelagem física
não parece se importar com isso. Mas acho que a maioria dos
homens – e quem dorme com eles – deve pensar de modo
diferente.

Quanto exercício físico devemos fazer de fato no dia-a-


dia para manter a forma?

Você provavelmente não quer saber esta resposta. Antes de

33
nos civilizar, éramos caçadores-coletores. O caçador médio
andava e corria 40 quilômetros por dia, o equivalente a uma
maratona. A fêmea coletora não ficava muito longe disso, por
volta dos 32 quilômetros. Depois de caçarem e coletarem sua
comida, eles a comiam o mais rápido possível, e então dor-
miam até ficarem com fome suficiente para sair atrás de mais
comida. Assim, sua vida alternava-se entre a fome intensa e
a saciedade – e é para isso que nossos corpos estão mais bem
equipados, mesmo hoje.
Sim, mas você deve saber que tivemos um período de
domesticação de animais e agricultura depois da fase de caça
e coleta. Nossos corpos não se modificaram para se adaptar a
esse estilo de vida? A resposta é que não fizemos isso por tem-
po suficiente para que o processo de evolução tenha nos mo-
dificado. E essa é a razão pela qual, agora que temos comida à
vontade e não precisamos fazer tanto exercício para agarrá-la
ou encontrá-la, ficamos gordos e inclinados à diabete. Pense
nos pobres indígenas pimas.
É claro que não se pode esperar que alguém corra uma
maratona quatro ou cinco vezes por semana (nossos ances-
trais provavelmente passavam três dias da semana dormin-
do). Mas ainda precisamos nos exercitar o suficiente para nos
mantermos razoavelmente magros – e isso, para a maioria das
pessoas, significa uma hora ou mais de exercício suficiente
para ficar sem fôlego, pelo menos quatro vezes por semana.
Coloque a sua mão no peito e jure que você faz isso.

34
Que história é essa dos índios pimas?

Eles são uma tribo de nativos norte-americanos na área dos


desertos do sudoeste dos Estados Unidos. Por volta de 1905,
um estudo mostrou que eles ainda eram caçadores-coletores.
Estavam todos magros e em boa forma física, viviam em re-
lativa pobreza, mas até idade avançada. Eles não desejavam
muito, e não tinham muito. Então alguém descobriu petróleo
em suas terras, e eles fizeram negócios muito espertos com
o governo dos Estados Unidos quanto a essas propriedades.
Praticamente da noite para o dia ficaram ricos. Compraram
carros e casas, passaram a comer muito bem e a desfrutar
uma vida de lazer e pouco trabalho físico.
Em uma geração tornaram-se obesos, quase todos – e
sobreveio o desastre. Eles desenvolveram a maior taxa de dia-
bete do mundo, e começaram a morrer de ataques cardíacos e
infartos por volta dos 30, 40 anos de idade. Chegaram perto
da extinção total. Somente com muito boa orientação a res-
peito de saúde, e com a compreensão por parte deles mesmos
de que estavam numa condição terrível, conseguiram dar a
volta por cima. Hoje, eles têm uma alimentação saudável e
dão atenção aos exercícios físicos, e estão conseguindo se sair
bem. É uma grande história de sucesso que poderia nos servir
de exemplo, agora que temos altas taxas de obesidade já entre
as crianças em idade escolar.

35
Transpirar ao fazer exercícios é sinal de estar em forma?
Não, é só um sinal de que você se exercitou o suficiente para
aquecer seu corpo, e que ele está tentando manter sua tem-
peratura na faixa ótima – por volta dos 37 graus centígrados.
Você perde calor conforme o suor evapora da superfície de sua
pele: o ponto do qual o líquido desaparece sofre resfriamento
e, se isso ocorre por todo o seu corpo, a temperatura mais
baixa é transferida para sua corrente sanguínea. Você enxer-
ga apenas uma pequena porção de seu suor: a maior parte
evapora antes que possa ver, na forma de uma gota sobre sua
pele. Suamos o mesmo tanto, quer estejamos em boa forma
física ou não.

Como posso saber se estou deprimido?

Essa é uma pergunta estranha. Você tem alguma dúvida a


respeito de momentos de baixo pique? A maioria das pessoas
percebe quando está deprimida – sente-se lá embaixo, não
quer encontrar pessoas, perde interesse nas coisas, e pode co-
meçar a desempenhar mal seu trabalho. Acorda antes da hora
e não consegue pegar no sono de novo. Pode tanto perder o
apetite como tentar se compensar comendo em excesso.
Se reconhecer duas ou mais dessas mudanças em você,
provavelmente está deprimido e precisa de ajuda, e deve pro-
curá-la de preferência com seu médico. Mas, se não esti-
ver com esses sintomas, existe um exercício muito simples

36
e confiável que você pode fazer. Imagine uma linha de 10
centímetros. No ponto 0 dessa linha fica a profunda infeli-
cidade, onde você vê tudo nublado. No ponto 10, você está
gloriosamente feliz, e não vê nenhuma nuvem escura na sua
vida. No ponto 5, você está mais ou menos; 7 ou 8 indicam
que você está relativamente feliz; 2 ou 3, que você anda bem
caidinho. Agora, sem pensar demais, veja em que ponto des-
sa linha você está.
Se pensou num número acima de 6, provavelmente está
bem; 5 quer dizer que está começando a ficar triste, encami-
nhando-se para a depressão; abaixo de 4, você precisa de aju-
da; 2 ou 1 indicam necessidade urgente de ajuda profissional.
O tratamento moderno inclui remédios e uma técnica cha-
mada terapia comportamental cognitiva – seu médico poderá
lhe falar melhor a respeito.

Por que, quando deixo crescer a barba, ela aparece ruiva?

Suponho que é mais provável você perceber barbas ruivas em


homens com cabelo de outra cor, pois isso as faz se destaca-
rem. Mas apenas uma minoria dos homens tem barba ruiva.
Pode ser porque essa parte de seu rosto não produz melanina,
e sim feomelanina (falaremos dela mais adiante). Como isso
acontece não é fácil de explicar.
Antigamente, quem tinha a barba ruiva com certeza
preferia raspá-la. O preconceito contra a barba ruiva tem uma

37
longa história, que remonta na verdade a Judas Iscariotes, su-
postamente o único discípulo de Cristo com cabelo dessa cor.
Naturalmente, isso criou desde então um preconceito contra
o cabelo ruivo – e esse preconceito ainda pode existir. Na caça
às bruxas dos séculos 16 e 17, muitas mulheres foram conde-
nadas à morte simplesmente por serem ruivas. Veja o relato
do “erudito” francês do século 17 Jean-Baptiste Thiers em seu
livro sobre a história das perucas:
“Os ruivos devem usar perucas para esconder a cor de seu
cabelo, diante do qual todos se horrorizam, pois Judas era
ruivo.”

Quanto ao fato de os homens deixarem crescer barbas, seja


de que cor forem, existe a explicação padrão de que a barba
demonstra a virilidade do homem e que, se você não provou
a sua chegando ao topo em seu trabalho, pode muito bem
fazê-lo de uma maneira mais simples, parando de se barbear.
Além disso, vale a pena mencionar que, no mundo da política,
todos os homens que se tornaram presidentes ou primeiros-
ministros nos últimos cem anos preferiram manter os queixos
bem limpos. Talvez eles não tenham sentido a necessidade de
proclamar sua virilidade – preferiram, em vez disso, a atração
pelo poder. A moda vai e vem, é claro, mas hoje o poder não
usa barba.

38
O cabelo pode ficar branco da noite para o dia, por causa
de algum choque?

Respondendo de improviso, é muito difícil imaginar como


isso seria possível. Quando o cabelo fica branco é porque sua
parte interior se tornou oca, e existe ar ao longo dela. O ar
entra pela raiz, quando o cabelo novo está sendo produzi-
do, e depois disso nada pode alterar sua composição. Como
o cabelo cresce só um pouco mais depressa que as unhas, a
maior parte dele na sua cabeça fica aí por algumas semanas.
Só o cabelo perto do couro cabeludo é novo. Por isso, para
que ele se tornasse branco de repente, seria preciso que cada
fio ficasse oco de repente e cheio de ar, da raiz até a ponta, do
dia para a noite. Quando me fizeram essa pergunta, eu não
sabia de nenhuma maneira pela qual isso pudesse acontecer.
As pessoas podem ficar de cabelos brancos bem depressa ao
chegarem aos 50 anos, quando os folículos deles, as estruturas
da pele que os produzem, começam a envelhecer. Por isso é
normal ficarmos de cabelos brancos no decorrer de algumas
semanas – o tempo para que os que contêm ar fiquem sufi-
cientemente compridos para constituir a maioria dos cabelos
da nossa cabeça. Mas do dia para a noite? Isso, para mim, já
era outra história. Até que li o British Medical Jornal de 6 de
maio de 2006.
Nele há duas fotos de um homem cujos cabelos ficaram
brancos num espaço de tempo de 36 horas – e outra foto
tirada seis meses mais tarde, com seus cabelos de volta à sua
aparência “pretos com alguns fios brancos”. Como isso pôde

39
acontecer? As doutoras Jessie Felton e Meg Price, dermatolo-
gistas em Brighton, Inglaterra, deram a explicação. Ele tinha
um problema raro, alopecia areata, no qual uma mudança no
seu sistema imunizador causou uma perda de cabelo repenti-
na, mas apenas dos fios que ainda continham seu pigmento.
Por isso, todos os seus fios de cabelo pigmentados caíram no
período de 36 horas, deixando apenas os brancos (ocos). Ao
ficar apenas com os fios brancos, seu cabelo de fato “bran-
queou” da noite para o dia (e no processo ficou também bem
mais ralo). A alopecia areata tem recuperação, e no seu caso
os cabelos pigmentados acabaram voltando a crescer, dando-
lhe a cor anterior, e também a densidade capilar de antes.
Se um choque pode provocar a alopecia areata ainda é
tema de discussão entre os médicos. Entretanto, há muitas pes-
soas com essa condição que atribuem sua perda de cabelo a um
choque – entre elas, o nadador olímpico Duncan Goodhew.

Como posso melhorar minha memória? Parece que não


consigo lembrar de nomes e números como antes.

Para melhorar sua memória, você pode tentar passar fome


por alguns dias. Essa é a mensagem que vem sendo transmi-
tida por pesquisadores da Yale Medical School dos Estados
Unidos. Quando fica vazio por algumas horas, seu estômago
começa a produzir uma substância chamada grelina, que en-
tra para a corrente sanguínea. Ao atingir o hipotálamo, uma

40
estrutura na base do cérebro, a grelina dispara as reações quí-
micas que nos fazem sentir com fome.
Isso é muito simples de entender. Se ficamos com o es-
tômago vazio por algum tempo, precisamos comer de novo
o quanto antes, e a sensação de fome irá nos fazer sair atrás
de comida.
Então, como é que isso afeta a memória? Os pesquisado-
res da Yale descobriram que a grelina também atua em outra
área do cérebro, o hipocampo, o centro da aprendizagem de
novos conteúdos e da memória. Ratos que receberam injeção
de grelina tiveram desempenho muito superior aos outros ra-
tos em todos os testes realizados de memória e aprendizagem
– em até 40 por cento. Os ratos com grelina injetada mostra-
ram ter uma estrutura cerebral mais complexa do que os ratos
normais, com no mínimo 30 por cento mais conexões entre
suas células cerebrais – uma forte indicação de que tinham
cérebro e memórias mais capazes.
Os pesquisadores foram além. Criaram um lote de ra-
tos que não eram capazes de produzir grelina: esses infelizes
animais tiveram baixo desempenho nos testes de memória e
inteligência, mas melhoraram muito quando receberam inje-
ções desse hormônio.
Os cérebros de humanos e de ratos não são muito dife-
rentes em sua química básica. A equipe de Yale já começou,
em vista disso, a dar a alguns voluntários humanos injeções
de grelina para ver se produzem os mesmos efeitos que nos
ratos. Se isso for confirmado, remédios desenvolvidos a partir
da grelina podem fazer grande diferença em doenças como a

41
de Alzheimer e perda de memória relacionada com a idade.
A equipe também está deixando alguns voluntários humanos
em jejum, para ver se a grelina produzida em seus estômagos
melhora sua agilidade mental e memória.
Um dos pesquisadores, Tamas Horvath, sugere que,
não sem uma ponta de ironia, se você está tendo um dia
difícil no trabalho e precisa de toda a sua competência para
enfrentar as situa­ções, deve tentar ficar sem o café da ma-
nhã. A reação da grelina, mesmo a umas poucas horas de
jejum, pode deixar você mais esperto e mais capaz de se
concentrar em suas tarefas mentais.
E, embora isso vá de encontro a tudo o que já nos
disseram ao longo dos anos sobre tomar um bom café da
manhã, os resultados fazem sentido. Todos nós ficamos so-
nolentos depois de uma boa refeição, em parte porque preci-
samos desviar recursos para nossos intestinos para que lidem
com o processo de digestão. Isso implica menor prioridade
para outras áreas, como os músculos e o cérebro. Nossos
ancestrais (de novo, os tais caçadores e coletores) estavam
programados, depois de uma boa refeição na floresta, a se
esconderem dos predadores e ir dormir. Eles simplesmente
fechavam sua memória e seu intelecto, tornando-se incons-
cientes. Quando ficavam um tempo sem comer, e tinham
de se nutrir de novo, precisavam contar com todo o poder
cerebral para perseguir sua próxima presa, da memória so-
bre onde a haviam encontrado da última vez, e da fome para
motivá-los. Fome, intelecto e memória eram três necessida-
des combinadas para continuar vivo.

42
Assim, comer apenas quando você sente fome, e nunca em
excesso de modo a ficar sonolento depois, pode ser uma maneira
de evitar a perda de memória e a deterioração da inteligência.

Andar de bicicleta pode tornar o homem impotente?

Com certeza pode. Eu odeio desestimular as ambições de


possíveis aspirantes à Volta da França, mas uma razoável
proporção de ciclistas profissionais de longa distância é de
impotentes, alguns de modo permanente, segundo relatórios
médicos. O problema é causado pela pressão que o selim da
bicicleta, duro e em forma angular, exerce sobre o perônio, o
tecido que fica entre a base do pênis e o ânus. Os nervos que
produzem a ereção passam por essa área, e o selim duro os
comprime contra o osso que fica embaixo, o que pode danifi-
cá-los de modo permanente. Portanto, se você quer correr de
bicicleta, use um selim que não tenha esse efeito. Existem no-
vos desenhos de selim que evitam a pressão sobre o períneo:
fico assombrado de ver que são pouco difundidos. Parece que
ganhar prêmios no mundo das corridas pode ser mais im-
portante para profissionais de elite do que suas vidas sexuais.
No entanto, se você está pensando em andar de bicicleta só
por lazer, e tem um selim confortável, não se preocupe. São
necessárias várias horas diárias sentado num selim realmente
duro, durante vários dias da semana, ao longo de vários me-
ses, para arruinar sua virilidade.

43
A MÃE NEURÓTICA

É fácil identificá-la. Ela sempre está um pouco atrasada


para a festa, e parece um pouco grosseira às vezes – quan-
do você consegue falar com ela (após finalmente desligar o
celular depois de checar sua prole pela quinta vez), entende
que só pensa e vive para criar os filhos. Reage a cada nova
notícia médica escabrosa como se a afetasse pessoalmente e,
quando a febre por riquétsia eclode em algum acampamento
escolar no Arizona, tem certeza de que seu filho está com a
doença. Entra em pânico com alergias, viroses, câncer, autis-
mo, e toda vez que seu filho sai para brincar na rua. Adere
a qualquer novo grupo de pressão relacionado com alguma
doença. Seu marido ou parceiro é alguém quieto e sofrido e,
se ela estiver com ele, veremos que ele tende a ficar num can-
to, todo constrangido, geralmente atrás de um grande copo
de gim.

45
Meus filhos quase não dormem à noite. É verdade que
isso pode atrapalhar seu crescimento?

Em tese poderia. Só produzimos hormônio do crescimento


quando estamos dormindo. Por isso, crescemos principal-
mente quando estamos dormindo, e nosso crescimento de-
sacelera quando estamos acordados. Assim, se seus filhos não
estão tendo sono suficiente, podem quando adultos ficar com
até 5 centímetros a menos da altura que poderiam ter. Só que
eles teriam de perder muito sono para que isso acontecesse.
Deixe o videogame e a televisão fora do quarto deles, e cultive
bons hábitos para a hora de deitar. Geralmente esses hábitos
se apóiam no bom senso.

O que é pior para a criança: uma febre muita alta por um


tempo relativamente pequeno ou uma febre mais baixa
que se estenda por mais tempo?

Pergunta interessante. Temos de voltar para a época an-


terior aos antibióticos e antitérmicos para encontrar a respos-
ta. Antes das sulfonamidas e da penicilina, as pessoas sabiam
que as crianças com infecções tinham febre alta. Elas con-
trolavam a temperatura até que atingisse o máximo, e então
ficavam esperando que caísse de repente. Esse ponto máximo
era chamado de crisis – Hipócrates falou dele em suas des-
crições de doenças há aproximadamente 3.000 anos. A cri-

46
sis se resolvia de duas maneiras – ou a criança se recuperava
ou morria. Isso explica por que a palavra passou a ser usada
como sinônimo de estresse extremo. A crisis, nos termos de
Hipócrates, era seguida pela lysis (recuperação) ou pela morte.
No que diz respeito à febre, é causada pelo esforço do corpo
para matar os germes invasores, baseado no princípio de que
podemos sobreviver a uma elevação maior de temperatura do
que eles. Talvez seja uma pequena margem de segurança – os
bichinhos morrem com 40 graus, e nós podemos sobreviver a
42. Assim, se produzimos uma febre de 41, ganhamos. Mas
podemos não ganhar se tivermos de chegar a uma febre de 43
ou mais alta – então, nós e os bichinhos (pois eles morrem se
nós morrermos) seremos os perdedores.
Quando se trata de uma temperatura de febre mais bai-
xa que parece se arrastar, a história é diferente. Costuma ser
um sinal de uma infecção branda continuada. Em crianças
(particularmente meninas), com freqüência é uma infecção
renal. Assim, se seu filho não está se sentindo bem ou está
quente ou suando, ou com dor de cabeça e tremores, com do-
res nos membros e nas costas, e sua temperatura é 38 graus ou
mais, você precisa pedir ajuda. Seu médico irá checar ouvi-
dos, nariz e garganta, peito, rins e urina para avaliar as causas
prováveis.
Nem todas as febres são causadas por infecções; existem
outras enfermidades, principalmente do sistema linfático e da
medula óssea, que fazem as pessoas terem febres altas com
intervalos de alguns dias. Seu médico provavelmente irá tam-
bém pedir exames de sangue para diagnosticá-las.

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E o que fazemos em caso de febres? Hoje não precisa-
mos mais esperar e observar, como Hipócrates. Temos anti-
bióticos para lidar com infecções específicas, e antitérmicos,
como os antiinflamatórios não-esteroidais (do tipo NSAID,
como naproxen e indometacina), que fazem as pessoas se sen-
tirem mais confortáveis e baixam a temperatura. A aspirina
talvez seja ainda a mais eficaz para adultos (não as usamos em
crianças atualmente). Para crianças com febre alta, mantê-las
arejadas com um leque pode ser eficaz. Algumas crianças têm
convulsões quando sua temperatura sobe demais, portanto
precisam de atenção especial para evitar o estágio de crisis.

É verdade que, se uma criança pequena sofre queimadura


de sol duas vezes no mesmo lugar, tem probabilidade de
desenvolver um câncer de pele?

Não, isso não é verdade. Mas toda vez que você se descuida e
sofre queimaduras de sol aumenta seu risco de câncer de pele.
Como a palma e o dorso da mão são as áreas mais expostas ao
sol, é nelas que há maior probabilidade de se desenvolver um
câncer. Quanto mais cedo você começar a se queimar ao sol
(na infância, por exemplo), maior a probabilidade de ter um
câncer de pele. Por isso, as crianças, particularmente, devem
estar bem protegidas por chapéus, camisas e filtros solares.

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De uma vez por todas: chupeta realmente faz mal ao
bebê?

Passei a maior parte de meus anos como médico condenando


a chupeta como uma coisa anti-higiênica, que pode defor-
mar e atrapalhar o desenvolvimento dos dentes nas crianças e
que funciona como um substituto da boa atenção maternal.
Portanto, minha tendência é contra-argumentar com ênfa-
se quando alguém afirma que ela pode ter algum benefício.
Com o tempo, entretanto, comecei a considerar que ela pode
ter alguma utilidade, particularmente em manter uma crian-
ça chorona quieta durante uma consulta. Mesmo assim, sem-
pre achei que as desvantagens superam as vantagens – até ler
um artigo no British Medical Journal de 7 de janeiro de 2006,
que sugeria haver menos mortes no berço entre crianças que
usavam chupeta à noite do que entre as que não o faziam.
A equipe californiana de Li De-Kun, Marian Willinger
e seus colegas comparou o uso de chupeta em 185 crianças
que haviam morrido repentinamente e em 312 crianças vi-
vas de um grupo de controle da mesma área. Houve menos
mortes entre as crianças que usavam chupeta do que entre as
demais. Os autores sugerem que o uso de chupeta mantém as
crianças de costas e talvez evite que elas engasguem enquanto
dormem.
Será que devo agora mudar a opinião que tive a vida in-
teira? Não tenho certeza. O artigo provocou algumas reações
mais exaltadas de médicos, que interpretaram os resultados
de modo diferente, incluindo a possibilidade (não levada em

49
conta) de que as crianças que não usavam chupeta poderiam
as ter usado em outras noites, mas, por estarem doentes na-
quela em que morreram, se comportaram de modo diferente
e não aceitaram sua chupeta usual. Continuo não recomen-
dando chupeta aos meus pacientes.

Qual é o real perigo de morar embaixo de linhas de trans-


missão de energia?

Há alguns anos, quando havia preocupação a respeito de


maiores índices de leucemia perto de usinas de energia nu­
clear e de locais secretos do Exército, um grupo de pesquisa-
dores examinou os índices de mortes por doenças da medula
óssea próximo de instalações militares. Eles mostravam de
modo conclusivo que havia diversas áreas perto de grandes
instalações militares com alto índice de leucemia. Infeliz-
mente para as pessoas que queriam processar o Ministério da
Defesa, muitas dessas instalações eram castelos construídos
pelos ingleses para subjugar os galeses no século 12!
É difícil provar de modo conclusivo que a incidência
de câncer e leucemia em qualquer área está relacionada com
emissões de radiação. Como ocorre com o magnetismo, é
muito difícil associar linhas de transmissão de energia elé-
trica com qualquer efeito sobre seres humanos, exceto que
elas causam preocupação e ansiedade. Ninguém conseguiu
provar conclusivamente que elas provoquem algum dano.

50
É verdade que, se medirmos a altura de uma criança em
seu terceiro aniversário, sua altura final será exatamente
o dobro disso?

Você errou quanto ao aniversário. Na verdade é o segundo,


não o terceiro. Crianças de 2 anos de idade são mais altas do
que imaginamos! Uma criança que tem 90 centímetros de
altura aos 2 anos terá cerca de 1,80 metro, pouco mais, pouco
menos, quando adulta. Isso vale para meninos e meninas. A
sua altura em qualquer outra idade é mais difícil de correla-
cionar com a sua altura na idade adulta. Por exemplo, uma
menina que aos 10 anos seja muito alta para a idade, mas que
começou a menstruar cedo, pode acabar sendo mais baixa do
que outras garotas que iniciaram a menstruação mais tarde.
Crescemos mais em altura no início da puberdade: é
o que se chama estirão do crescimento. Meninos e meninas,
quanto mais velhos forem ao iniciar seu estirão de crescimen-
to, mais centímetros irão ganhar nessa fase. Ou seja, um esti-
rão iniciado aos 14 anos de idade provavelmente irá acrescen-
tar bem mais centímetros à altura do que se começar aos 11.
Quando os hormônios sexuais se manifestam nas meninas, o
crescimento pára. O crescimento continua por mais alguns
anos nos meninos, o que é a principal razão que faz os ho-
mens serem geralmente mais altos que as mulheres.

51
Sempre pego resfriado e tosse depois de viajar de avião.
Será coincidência?

Não, provavelmente não é. O interior de uma aeronave pres-


surizada com trezentas pessoas a bordo é o ambiente perfeito
para a disseminação de vírus do sistema respiratório e mesmo
bactérias. O ar é filtrado ou renovado apenas parcialmente
antes de ser devolvido a você. Ou seja, uma pessoa espirran-
do no avião significa que todos terão o prazer de comparti-
lhar o seu vírus em poucos minutos. Num grupo qualquer
de trezentas pessoas, é provável que várias delas tenham em
sua garganta vírus de resfriado ou piores. Assim, se você não
teve um resfriado desse vírus particular em sua vida (veja a
pergunta sobre resfriados), irá pegá-lo nas próximas 48 horas.
Não há como escapar.
Alguns anos atrás, uma mulher com tuberculose em-
barcou num avião que ia para a Inglaterra. Duas mulheres
sentadas várias fileiras à frente dela desenvolveram o mesmo
tipo de tuberculose, com o mesmo padrão de resistência à me-
dicação, no prazo de um mês após o vôo. Portanto, corremos
um risco (embora muito pequeno no caso da tuberculose)
toda vez que voamos de avião. Mas esse risco é um daqueles
que corremos até de boa vontade.

Por que algumas pintas têm mais relevo e outras são mais
achatadas, um tipo é mais perigoso que outro?

52
Se examinarmos bem, a maioria de nós tem pintas, mais apro-
priadamente chamadas de nevos pigmentados, desde umas
poucas até centenas delas. Algumas ficam achatadas, como
sardas, outras são mais grossas do que a pele em volta e ficam
salientes. A maioria de nós tem também o estranho dermato-
fibroma na pele, na perna ou no braço. É um caroço pequeno
e firme, arredondado, que pode ou não ser pigmentado (geral-
mente é cor-de-rosa), com cerca de 2 milímetros de diâmetro.
A grande maioria das pintas, sejam achatadas ou salientes, é
e permanece inofensiva. É claro que a recente publicidade em
torno do sol e do câncer de pele levantou dúvidas a respeito
disso, e as pessoas ficam ligadas nas menores alterações em
sua pele, especialmente se já tiveram queimaduras de sol. As-
sim, quais são as mudanças que podem indicar que as coisas
não estão indo bem?
A seguir temos as mais recentes linhas gerais da Ame-
rican Cancer Society e da Cancer Research UK a respeito de
quando se preocupar com o fato de uma pinta poder estar
virando maligna e progredindo para um melanoma: existem
três sinais principais – mudanças de tamanho, forma e cor – e
três sinais secundários – inflamação, encrostamento ou san-
gramento; uma sensação de que está diferente, ou dolorida,
ou coçando; um diâmetro de 7 milímetros ou mais.
Todas essas mudanças podem começar a aconte-
cer num nevo achatado ou saliente, por isso fique atento.
Em geral, um melanoma maligno tem uma beirada mais
irregular do que uniforme, e a intensidade de sua cor pre-
ta, marrom ou azulada varia ao longo da superfície. Mas,

53
se você tem uma pinta com um ou mais dos sinais princi-
pais e um dos secundários, deve consultar um médico.
Acima de tudo, procure conhecer sua pele, de modo a ser
capaz de detectar mudanças em qualquer parte dela. Você
conhece bem o dorso da sua mão? Feche os olhos e tente ima-
giná-lo – o comprimento dos dedos, a forma das veias e dos
tendões, os pontos e pêlos de sua pele. Depois abra os olhos e
veja se sua imaginação chegou perto. Você ficará surpreso em
ver o quanto passou longe.
Portanto, dê uma olhada na sua pele de vez em quan-
do e veja se consegue memorizar o padrão das pintas. Exis-
tem astrônomos que observam o céu à noite e podem,
de uma só olhada, identificar uma nova estrela, uma su-
pernova que, vamos supor, não estava lá na noite anterior.
Não deve ser difícil fazer a mesma coisa com a sua pele.

Os pontos brancos nas unhas do meu filho podem ser


sinal de falta de cálcio?

Não. São pequenas bolsas de ar situadas entre a pele embaixo


da unha e a parte interna dela. Seu filho deve ter batido a
unha em alguma coisa, e nem percebeu. O pequeno trauma
pressionou a unha para cima e deixou o pontinho branco.
Mas existem outros problemas de unhas aos quais você deve
ficar atento. O aparecimento de uma depressão em forma
de colher na unha, capaz de abrigar uma gotinha de água,

54
é sinal de anemia por deficiência de ferro, também chama-
da de anemia ferropriva. Isso pode ter várias causas e, se as
suas unhas ficarem com essa depressão, faça um check-up. Vá
ao médico também se notar pequenas manchas vermelhas,
como linhas finas, sob as unhas, perto da ponta. Elas podem
ser pequenas embolias (tromboses em pequenos vasos san-
guíneos) decorrentes de algum problema cardíaco. Estrias
no sentido longitudinal da cutícula para a ponta não devem
preocupar. São apenas o modo que as unhas têm de crescer
em algumas pessoas. Mas, se as estrias estão em ângulo reto
com a direção de crescimento da unha, isso pode indicar
problemas de saúde (as unhas pararam de crescer por um
curto período) e você deve procurar um médico. Se você está
com os dedos grossos nas extremidades, com unhas que so-
bressaem de modo a parecer pequenos bastões africanos (os
chamados knobkerries), isso pode indicar doenças pulmona-
res e cardíacas crônicas. Se as suas unhas estiverem assim,
consulte um médico.

Tenho mais de 45 anos e fiquei sem menstruar um ano.


Ainda posso engravidar?

A maioria das mulheres entra na menopausa por volta dos 45,


50 anos de idade, mas isso não é uma data precisa. Você ainda
pode despejar um óvulo no útero a qualquer momento nos
dois anos seguintes à sua última menstruação. Todo médico

55
tem histórias de mulheres com mais de 50 anos que acredi-
tavam estar na pós-menopausa e descobriram que estavam
grávidas. Em mulheres que passaram dos 50 é raro ocorrer
uma gravidez naturalmente (ou seja, sem que a mulher esteja
sob os cuidados de um médico tratando para que ela ovule),
e o recorde na Inglaterra para uma gravidez natural foi aos 53
anos. Minha velha mãe estava completando 49 anos no dia
em que deu à luz um filho de 4 quilos. Ela ficou muito feliz,
e disse que esse filho a ajudou a se manter jovem.

Qual o melhor jeito de lidar com enjôo em viagens, par-


ticularmente de carro, em crianças?

A resposta é simples: faça com que elas finjam que estão di-
rigindo o carro. Quem guia o carro não fica enjoado, pois
precisa se concentrar na rua à frente dele. Se você conseguir
convencer as crianças a fazerem isso, elas tampouco ficarão
enjoadas. Temos dois mecanismos para saber onde estamos
em relação ao espaço à nossa volta – os olhos e os órgãos do
equilíbrio. No dia-a-dia usamos os dois simultaneamente e
seus caminhos até o cérebro trabalham juntos, de modo que
este receba a mesma mensagem de ambos. Isso muda quando
estamos viajando num veículo fechado. Nossos olhos podem
estar concentrados em alguma coisa dentro do carro, enquan-
to nossos órgãos do equilíbrio (como os canais semicirculares
cheios de fluido no nosso ouvido interno que atuam exata-

56
mente como níveis de bolha) detectam que estamos nos mo-
vendo pela rua (ou pelo mar, ou pelo ar, conforme o caso). O
cérebro fica confuso – estamos chacoalhando dentro do carro
ou fluindo pela rua? A confusão gera enjôo e tontura.
Portanto, a resposta é simples: coordenar olhos e ní-
veis de bolha com o mundo lá fora, e não com alguma coisa
dentro do carro em que estamos. Em um carro, isso significa
ficar olhando para a estrada ou a rua à nossa frente. Em um
navio, significa ir até o deque, se possível, e fixar os olhos no
horizonte. Não é fácil num avião, mas os vôos hoje costu-
mam ser tão estáveis, que o enjôo é mais raro. Se estiver num
assento junto à janela, fixe os olhos nas nuvens ou na vista lá
embaixo.
Voltando às crianças: nos carros atuais, geralmente é
difícil enxergar à frente para quem está no banco de trás. Por
isso procure providenciar para as crianças assentos de alta
segurança que lhes permitam enxergar lá fora. Brincadeiras
como identificar marcas de carro ou tipos de caminhão aju-
dam a fazer as crianças ficarem olhando para fora, e livros e
jogos eletrônicos devem ser evitados.

A asma é hereditária? Se for, é mais da parte do pai ou


da mãe?

Uma doença pode se manifestar dentro da família, mas não


ser herdada. Na época vitoriana achava-se que a tuberculo-

57
se era hereditária porque havia muitas pessoas da mesma fa-
mília que eram afetadas. Mas descobriu-se que a causa era
que a doença se transmitia pelo fato de as pessoas viverem
perto umas das outras. A propensão à asma (possuir o sis-
tema IgE) com certeza é hereditária. O interessante é que
mais provavelmente seja herdada do pai do que da mãe,
uma descoberta recente. Por isso, procure mais do lado do
pai do que da mãe para encontrar indícios de risco de asma.

O que é uma tiróide inativa e quais os sintomas?

A glândula tiróide situa-se em volta da parte frontal da la-


ringe, a caixa de voz, e é o equivalente no corpo humano ao
acelerador de um carro. Ela produz hormônio tiróide (mais
precisamente tiroxina, e mais precisamente ainda triiodoti-
roxina), por ordem da glândula pituitária, que fica suspensa
por uma haste na base do cérebro, dentro de uma cavidade
craniana. A glândula pituitária secreta TSH, hormônio esti-
mulador da tiróide na corrente sanguínea, onde seus níveis
crescentes são capturados pela glândula tiróide. Quando a
glândula tiróide é estimulada, envia o hormônio tiróide para
o sangue – e é aí que a diversão começa. Quanto mais ati-
va a tiróide for em sua reação ao TSH, mais rápida será sua
pulsação, mais rápido você irá pensar, mais ativo fisicamente
você vai ficar e também com mais fome. Uma tiróide hipe-
rativa deixa você com fome, fisicamente ativo e mentalmente

58
alerta, com um coração acelerado e magro como um palito.
Mesmo que você coma muito, irá queimar as calorias extras
e não vai ganhar peso. Na verdade, um dos sinais de tiróide
hiperativa é perder peso mesmo comendo como um cavalo.
Uma tiróide inativa dá o efeito oposto. Se o TSH não conven-
ce a tiróide a trazer suas benesses, e ela não consegue produzir
hormônio tiróide, então você desacelera, mental e fisicamen-
te. Sua pulsação cai, você pensa mais devagar, a ponto de essa
enfermidade ter sido confundida com demência, as feições
ficam mais grosseiras, o cabelo cai, a pele fica mais grossa, e
você engorda mesmo sem ter muito apetite. Há uma série de
outros sintomas, mas este livro não é um manual de medici-
na, e com esses sintomas já basta.
É suficiente dizer que, se a sua tiróide falha, é fácil re-
por o hormônio tiróide faltante com um simples comprimido
deste hormônio (usualmente, na forma de tiroxina, mas às
vezes também de triiodotiroxina) uma vez ao dia. A dose é
determinada pela reação da pessoa e ela terá de controlar os
níveis de hormônio e de TSH no seu sangue a intervalos de
alguns meses para ter certeza de que está tudo em ordem.
Por que a glândula tiróide fica inativa? A maioria dos casos
se deve a um distúrbio auto-imune, no qual o sistema imu-
nizador do organismo age como se a glândula contém “ma-
terial estranho” que precisa ser destruído. Esse erro sai caro,
podendo levar à efetiva destruição das células que produzem
tiroxina. Felizmente não é letal, e o tratamento moderno é
extremamente eficaz. A maioria das pessoas com diagnóstico
de subatividade da tiróide pode ter vida normal depois do

59
tratamento. Se você quiser mais informações sobre isso, veja
meu livro sobre problemas de tiróide (pela Wellhouse).

Como posso saber se estou entrando na menopausa?

Essa é outra daquelas perguntas que precisam de um livro


inteiro para acolher a resposta. A menopausa geralmente co-
bre um período de alguns anos a partir do seu início até o
fim, e as mulheres diferem a respeito de quando começa e de
quanto tempo dura. A definição médica de menopausa afir-
ma que se trata do período em que a menstruação pára, mas
isso não é simples de determinar. Em algumas mulheres, a
menstruação pára de repente. Em outras, ela vai rareando
até que pára, sem que a mulher saiba exatamente quando
foi que teve a última. Isso pode dificultar a contracepção:
conheci duas mulheres perto dos seus 50 anos que acharam,
depois de seis meses uma e nove a outra sem menstruar, que
não engravidariam mais. Engravidaram: felizmente, ambas
ficaram felizes com seus bebês, assim como os irmãos deles,
já com 20 e tantos anos. Surpresas como essas nessa idade
não são raras – acontecem com as melhores mulheres.
Há uma teoria segundo a qual as mulheres têm um
breve surto de estrogênio pouco antes de seus ovários encer-
rarem as atividades, e que é nesse período que engravidam.
Para a maioria das mulheres que tiveram menstruação re-
gular, a menopausa não traz muitos problemas, apesar dos

60
inúmeros artigos de revistas que dizem o contrário. É claro
que ocorrem calores, suores, mudanças no apetite sexual (é
freqüente ele aumentar – e com certeza tão freqüente como
diminuir) e mudanças de humor. Mas, se as mulheres tive-
rem uma compreensão do processo que estão atravessando
e contarem com o apoio de amigos e parceiros, não é um
período ruim da vida. Dá às mulheres a liberdade de não te-
rem de se preocupar mais em evitar filhos, e com freqüência
promove uma renovação da vida conjugal.
Os problemas surgem quando a menstruação se torna
mais intensa e mais freqüente, em vez de mais leve e rara. Isso
não é normal e, se estiver acontecendo com você, procure
um médico. A causa pode ser um mioma na parede do útero
ou mudanças nas células de revestimento. Ambos os casos
costumam ser tratados com uma nova técnica de remoção do
revestimento do útero por microondas: a histerectomia por
problemas de menopausa é praticamente coisa do passado,
graças a Deus.
Uma orientação geral sobre quando esperar pela me-
nopausa: se você começou a menstruar cedo, digamos aos 11
anos de idade, pode esperar que ela dure mais, vamos dizer,
até perto dos 50; se ela começou tarde, pode acabar alguns
anos mais cedo. Mas isso é só uma tendência muito genéri-
ca, e não dá para aplicá-la a cada mulher individualmente.
A idade com que sua mãe entrou na menopausa talvez seja
uma orientação melhor, mas só se você tem o mesmo estilo
de vida dela.

61
Devo ficar realmente paranóica em relação ao hidroxi-
benzoato?

Francamente, não. Os hidroxibenzoatos são elementos quí-


micos acrescentados a vários produtos para a pele, como po-
madas e cremes, para dar-lhes consistência e para que pos-
sam ser espalhados com mais facilidade. São classificados
como excipientes. Acabei de pesquisá-los no British National
Formulary (a “bíblia” dos médicos para prescrição de recei-
tas). Eles estão presentes num grande número de produtos
para a pele, e nenhum deles causou qualquer efeito colate-
ral, segundo a minha experiência. Para as autoridades mé-
dicas, não são carcinógenos (não induzem câncer nos testes
padrões). Segundo uma edição de 2006 dessa publicação,
“eles raramente causam problemas. Se um teste de contato
com a pele indicar alergia a um excipiente, então os produ-
tos que contêm a substância devem ser evitados”. Eu nunca
tive de interromper a prescrição de um creme ou pomada
contendo hidroxibenzoatos devido a alguma reação alérgica.
Então por que algumas pessoas estão tão preocupadas com o
hidroxibenzoato? Ouviu-se falar que desodorantes que con-
têm essa substância podem causar câncer de mama. A base
dessas alegações é que a maior parte das mulheres é destra e
aplica o desodorante no lado esquerdo com maior força do
que no direito. O câncer de mama, segundo se diz, ocorre ti-
picamente no segmento superior esquerdo. Eu não concordo
com isso. Primeiro, não é a força com a qual o produto é apli-
cado que faz penetrar os ingredientes de cremes, pomadas ou

62
desodorantes através da pele até os tecidos subjacentes, onde
eles precisam estar para poderem provocar câncer. A penetra-
ção na pele depende muito mais das propriedades químicas
do produto aplicado e da espessura da pele no ponto onde
é aplicado. Não há comprovação de que usar sua mão mais
forte colocará mais hidroxibenzoato no tecido subjacente da
mama do que o faria a mão mais fraca.
Do mesmo modo, desconheço qualquer pesquisa que
associe a lateralidade de uma mulher ao câncer da mama do
lado oposto (ou do mesmo lado). Se a alegação fosse corre-
ta, deveria haver uma forte associação, já que os hidroxiben­
zoatos vêm sendo usados em desodorantes faz vários anos.
Há um terceiro ponto: não foi provado que usuários re-
gulares de desodorante tenham mais câncer de mama do
que não usuários. Até que eu veja tais dúvidas respondidas
com números que provem o fato, vou encarar essa preven-
ção contra os hidroxibenzoatos como um receio infundado.
Estou disposto a mudar de opinião quando tiver mais evi-
dências. Se você ainda está preocupada, então é só escolher
cremes que não contenham essa substância. Mas eles terão
de conter algum aditivo para que possam ficar macios e fá-
ceis de aplicar. Será que esse novo aditivo tem características
melhores que o hidroxibenzoato? Ou vamos ter de repassar
essas mesmas questões, mais tarde, com esse novo aditivo?

63
É melhor imunizar as crianças contra tudo com vacinas
como a tríplice (sarampo/caxumba/rubéola) ou há fun-
damento em estimular o bom e velho sistema imuniza-
dor? Eu tive caxumba e sarampo quando criança.

Para sermos mais precisos, você “sobreviveu” a caxumba e sa-


rampo quando criança. Todo médico da minha geração viu
crianças morrerem de caxumba e sarampo, e muitas mais que
ficaram com seqüelas permanentes. Também vimos pessoas
morrerem ou ficarem paralisadas pela pólio, terem o peito per-
manentemente lesado devido a coqueluche, e morrerem jovens
pelos efeitos de doença cardíaca induzida pela difteria. Na In-
glaterra, na década de 1920, dezenas de milhares de crianças
morriam a cada ano de doenças infecciosas. Milhares de bebês
nasceram cegos, surdos e mentalmente comprometidos porque
suas mães haviam contraído rubéola durante a gravidez. Todas
essas crianças dependeram de seu bom e velho sistema imuni-
zador natural para se protegerem contra doenças. Não há ne-
nhum argumento que sustente isso. Nenhum mesmo.
Parece que em apenas uma geração esquecemos toda essa
história terrível. Pelo fato de não vermos mais essas doenças,
pensamos que não precisamos mais do desconforto de uma in-
jeção para ficarmos protegidos contra elas. Sabe-se que, desde o
século 18 até hoje, pessoas se opõem profissionalmente à vacina-
ção, com base em evidências distorcidas. Não prestamos aten-
ção às vozes racionais de pessoas que estudaram os números, fi-
zeram a pesquisa decisiva e ainda estão vendo gente no Terceiro
Mundo morrendo de doenças que podem ser evitadas.

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Eis um exemplo de como um lobby antivacina pode se
tornar tendencioso. Em 2005, líderes religiosos da África sub-
saariana ordenaram aos seus fiéis que parassem de vacinar as
crianças contra a pólio, que estava prestes a ser erradicada.
O resultado? Uma epidemia de poliomielite, levada por um
ou dois peregrinos, que se espalhou da África até o Extremo
Oriente, afetando dezenas de milhares de crianças e adultos.
A doença ainda está lá: numa parte do mundo em que fora
erradicada havia anos pela vacinação.
Você acha que isso não pode acontecer aqui? As alega-
ções (feitas em tom muito inflamado por um médico, que
não era especialista em imunização) de que a vacina tríplice
causava autismo e doença intestinal levaram milhares de mães
inglesas e irlandesas a se recusarem a vacinar seus filhos. Ape-
sar de muitos estudos refutarem as duas alegações e mostra-
rem que a pesquisa em que se baseavam era totalmente falha,
os pais mesmo assim se recusaram a aplicar a vacina tríplice.
Eles não deram ouvidos a médicos que tentavam explicar que
a justificativa de dar as três vacinas separadamente era absur-
da, sem qualquer razão imunológica. Não se “sobrecarrega o
sistema imunizador” ao dar três injeções ao mesmo tempo,
como algumas mulheres temem. O sistema imunizador não
funciona dessa maneira. Cada vacina estimula um conjunto
separado de reações imunizadoras, que não interferem umas
com as outras e não colocam uma tensão desnecessária no
sistema imunizador. Dar cada uma separadamente é simples-
mente cruel, multiplicando o número de injeções por três. A
criança passa a ficar com medo de médicos porque a sua vida

65
começa a ser dominada por injeções. Isso torna a relação mé-
dico-criança muito difícil mais tarde.
No México, como se precisa aplicar injeções nas crian­
ças contra muitas infecções tropicais, as autoridades de saúde
utilizam vacinas octovalentes – oito vacinas nu­ma injeção. Tais
autoridades não verificam quaisquer reações mais intensas às
oito do que vemos em nossas três, e não se opõem de modo
algum a essa proteção vital.
Os temores em relação à vacina tríplice resultaram em
surtos de sarampo na Irlanda, que mataram duas crianças, e
na Inglaterra na primavera de 2006, com a morte de outra
criança e seqüelas em muitas outras. Vi casos de sarampo
pela primeira vez em vinte anos em uma das clínicas em que
trabalho. Eram crianças muito doentes. Nenhuma delas havia
tomado a tríplice. Eu gostaria de ver os pais dessas crianças
afetadas pedirem satisfações ao médico que iniciou essa
campanha contra a vacina tríplice.
Não sei por que ainda temos entre nós esse malfada-
do lobby antivacinação. Somos os únicos da Europa que
esquecemos nossa história. Os demais países europeus
vêem o que está acontecendo aqui e balançam a cabeça.
Eu também tenho balançado muito a cabeça ultimamente.

Por duas vezes meu filho teve um ataque de asma depois


de comer hambúrguer e tomar refrigerante numa conhe-
cida cadeia de fast-food. Pode haver alguma ligação?

66
Pode, sim, segundo médicos neozelandeses que em 2006 re-
lataram uma série de casos. Ainda não ficou esclarecido se
foram ingredientes do sanduíche ou do refrigerante que defla-
graram o ataque, mas eles acharam os dados “significativos”
e recomendaram que as pessoas com asma tomassem cuidado
com fast-food.

Posso prever quando minha filha começará a menstruar


a partir de seu peso e altura?

A partir de sua altura não, mas com certeza a partir de seu


peso: 95 por cento das meninas começam a menstruar quan-
do chegam entre 46 e 48 quilos. Não importa sua altura. Ga-
rotas altas e magras começam a menstruar mais tarde do que
as mais gordinhas. E, como a altura que alcançarão depende
de chegarem à menarca (a idade em que a menstruação tem
início) o mais tarde possível, isso significa que as garotas mais
gordinhas não serão tão altas como poderiam ter sido. Essa é
outra boa razão para cuidar de que crianças na pré-escola não
fiquem acima do peso. Nem desenvolvam anorexia nervosa.

Por que estamos falando de anorexia?

Acredita-se que uma razão subjacente pela qual as meninas se

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tornam anoréxicas é que subconscientemente temem se tornar
adultas. Elas querem adiar a menstruação o máximo possível.
Portanto, mantêm seu peso suficientemente baixo – bem
aquém dos 47 quilos – e ficam infantis, sem menstruação.
Não sei se isso é totalmente aceito como uma das razões da
anorexia, mas é verdade que meninas e mulheres anoréxicas
param de menstruar. Parece que esse era o caso também das
pequenas atletas e ginastas que treinavam tanto que perma-
neciam pequenas. Algumas delas viram sua capacidade de ge-
rar filhos mais tarde permanentemente comprometida.

Por que eu tendo a perder cabelo no inverno e não no


verão?

Provavelmente porque é esse seu ciclo anual natural de cres-


cimento de cabelo – nosso cabelo tem fases de crescimento e
descanso e o seu deve estar coincidindo com essas estações.
É quase certo que não se trata de nada preocupante. Uma
pequena ressalva: talvez sua glândula tiróide esteja variando
de atividade, e fique menos ativa no inverno. Isso explicaria
a queda. Você sempre pode verificar isso fazendo um exa-
me de sangue. Veja a resposta à pergunta sobre tiróide. Os
tricologistas costumam sugerir às mulheres que têm queda
de cabelo a ingestão de comprimidos de ferro, considerando
que elas muitas vezes estão um pouco anêmicas (por causa
de menstruações muito fortes), e que isso causa o problema.

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Não estou certo se existe uma boa base médica para isso, mas
conheço mulheres que ficaram satisfeitas com os resultados.

Qual é o dano causado pelos raios X? Não vou permitir


que o dentista tire raio X dos meus filhos. Estou certo?

Não. O raio X dentário moderno emite uma pequena dose de


radiação a uma área muito focalizada do seu maxilar. Prova-
velmente você fica mais exposto a radiação na sua vida diária,
talvez das rochas de granito em volta de você (em algumas
áreas elas têm uma concentração relativamente alta de rádio)
ou de outras fontes de radiação. O risco do eventual raio X
dentário sobre você ou seus filhos é muito pequeno. Você vai
notar que os dentistas atuais nem colocam aquele colete de
chumbo protetor, pois as máquinas que usam não os deixam
expostos a qualquer excesso que possa ser prejudicial – e eles
estão muito mais expostos a raios X do que você. É claro que
isso não quer dizer que as pessoas devam ser complacentes
com os raios X. Eles são essencialmente perigosos e, se pedi-
rem para você tirar um raio X, ou uma série deles, digamos,
no hospital, é bom perguntar a respeito dos riscos.

É verdade que o celular pode causar tumor cerebral?

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Finalmente temos a resposta definitiva para essa preocupação
alarmante – e a resposta é não. Entrevistas com 966 pacien-
tes britânicos com glioma, a mais comum forma de tumor
cerebral, e a que se sugeriu estar relacionada com o uso do
celular, mostraram que eles não usavam o celular com maior
freqüência, nem por mais tempo, do que outras 1.715 pes­soas
em condições similares, escolhidas aleatoriamente de listas
de médicos de família, e que não tinham problemas no cé-
rebro. Ou seja, usuários regulares de celular têm o mesmo
risco de um tumor cerebral que pessoas que nunca usaram
um ou o fizeram ocasionalmente. Por isso, podemos tirar
essa preocupação da mente, pelo menos por um ou dois anos.
Ainda não usamos os celulares por tempo suficiente para ex-
cluir a possibilidade de aparecerem tumores após vários anos
de uso – mas esse risco parece cada vez mais improvável.

Tudo bem, não causam tumores, mas podem acentuar


dores de cabeça em pessoas mais sensíveis a eles?

Isso também foi estudado. Andou-se falando que algumas


pessoas são mais “sensíveis” a sinais de telefone celular, que
lhes podem provocar dores de cabeça ou piorar as que já têm
regularmente. Assim, os médicos do King’s College Institute
of Psychiatry conceberam um engenhoso teste, expondo ses-
senta pessoas “sensíveis” e sessenta pessoas (grupo controle)
que não tinham esses sintomas a três condições: o sinal de

70
celular normal; um sinal que não era transmitido por pulso
(acreditava-se que a qualidade do pulso do sinal era a fonte
das dores de cabeça); e uma condição “falseada”, na qual,
na verdade, não havia nenhum sinal eletrônico. As dores de
cabeça subseqüentes foram então classificadas por intensida-
de. As pessoas “sensíveis” tiveram dores de cabeça nas três
condições, e as não sensíveis relataram pouca ou nenhuma
dor de cabeça. O sinal fictício produziu intensos sintomas
em algumas das pessoas sensíveis, sugerindo que tais dores
tinham causas psicológicas subjacentes, mais do que físicas.
Todas as três condições se mostraram equivalentes para pro-
vocar dor de cabeça no grupo sensível, e não tiveram efeito
sobre as outras pessoas. Assim, seja o que for que estivesse
causando dores de cabeça nos indivíduos sensíveis, não eram
seus celulares.

Quais são as probabilidades de eu morrer de um coágulo


de sangue quando vôo para a Nova Zelândia?

Bem pequenas, na verdade, especialmente se viajar pela Air


New Zealand. Seus aviões têm bastante espaço para as pernas
na classe econômica (falo por experiência pessoal). Mas pri-
meiro deixe-me explicar do que se trata. A trombose é um coá­
gulo de sangue que se forma nas veias quando o fluxo através
delas fica estagnado. Sentar por muitas horas com as pernas
dobradas e a parte frontal do assento espremida na parte de

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trás dos joelhos pode bloquear o fluxo ascendente do san-
gue, da panturrilha para a coxa. A dobra dos quadris também
pode tornar mais lento o fluxo do sangue nas veias das coxas.
Assim, as condições são favoráveis para a formação de coágu-
los nas panturrilhas ou coxas, não só em aviões, mas em via-
gens de ônibus de longa distância também. Se o coágulo ficar
na veia em que se formou, não provocará muito dano – pode
causar um pouco de dor e inchaço na panturrilha ou coxa,
mas acaba sumindo quando o fluxo de sangue se restabelece.
O problema é quando uma parte do coágulo original da perna
se desprende e é arrastado para cima, passando pelo coração,
indo para os pulmões, onde ele pára e bloqueia a circulação.
Isso é chamado de embolia, o que deixa a pessoa com falta de
ar e, conforme o caso, pode matá-la.
Você deve estar imaginando que todo ano milhares de
passageiros de avião devem sofrer tromboses e embolias. Não,
isso não acontece. A embolia ocorre naturalmente em cerca
de uma entre cada mil pessoas (dados da Inglaterra), não im-
porta se elas viajam de avião ou não. É um risco médico rela-
tivamente pequeno. Entre as pessoas que fazem regularmente
vôos de mais de dez horas, o risco permanece muito pequeno,
e é difícil de avaliar individualmente.
O recurso que se utiliza para identificar a trombose é
uma máquina Doppler de ultra-som – é simples e não invasi-
va. Uma equipe de pesquisa usando Doppler não conseguiu
encontrar uma única trombose entre 899 passageiros que voa-
vam por mais de doze horas. Em outro estudo, em 878 passa-
geiros que fizeram viagens aéreas de 39 horas (para onde será

72
que viajaram?), nove tiveram sinais de trombose, dos quais
quatro haviam tido uma embolia. Isso é apenas 1 por cento
e, dos nove, revelou-se que oito já haviam sofrido risco de
trombose (por problemas médicos) antes de realizar esse vôo.
Parece portanto que, se você não apresenta nenhum desses
“fatores médicos de risco” e está com a saúde normal, a proba-
bilidade de ter uma embolia com risco de vida numa viagem
longa de avião é extremamente baixa. Além disso, é melhor
saber se você está entre os passageiros “de risco”. Portanto, ve-
rifique a lista a seguir. Você corre risco adicional de trombose
e embolia se:
• fuma (não importa quantos cigarros por dia)
• passou recentemente por uma grande cirurgia
• tem câncer
• está grávida
• está tomando pílula anticoncepcional ou fazendo
  tera­pia de reposição hormonal
• tem varizes­
• já teve trombose e/ou embolia

Como você pode reduzir seu risco? Use meias compres-


sivas (elas devem exercer no tornozelo uma pressão de 15 a 30
mmHg) antes do vôo. Você pode comprá-las no aeroporto ou
numa farmácia. Tome muita água (evite álcool, que desidrata
você ainda mais e favorece a trombose) e movimente-se durante
o vôo. Mesmo quando estiver sentado, estique as pernas e mo-
vimente-as várias vezes a cada hora. Deite o mais na horizontal
possível, com as pernas estendidas, quando tentar dormir.

73
Se você já sabe que está com risco bem alto, então seu médi-
co pode aconselhá-lo a tomar uma injeção de heparina de baixo
peso molecular pouco antes do vôo. Isso previne o coágulo – mas
seus efeitos colaterais restringem seu uso a pessoas para quem
um vôo de longa distância torna a trombose quase inevitável.
Portanto, não se preocupe, mas consulte o médico se tiver
alguma dúvida sobre sua condição de saúde para voar.

Faz mal à saúde tomar pílula anticoncepcional por muito


tempo?

Que pergunta! Eu escrevi um livro de 35.000 palavras sobre


o assunto, e você me pede para resumi-lo em um ou dois
parágrafos! A resposta, como em muitas outras questões mé-
dicas, é “depende”. Depende de que pílula você toma (há vá-
rios tipos com intensidades e tipos de hormônio diferentes),
depende do seu estilo de vida (se você fuma ou não, se tem
obesidade, pressão alta, corre risco de trombose), do seu his-
tórico familiar (algum parente próximo teve câncer de mama)
e do seu próprio histórico médico (que doenças você já teve).
Mas vamos supor que você não corre nenhum risco em par-
ticular, está relativamente saudável, não fuma, tem menos de
35 anos, e está tomando uma pílula combinada de baixa do-
sagem (estrogênio e progesterona). No primeiro ano de pílula,
você tem um pequeno risco adicional de formação de coágulo
(trombose) numa veia, que pode se fragmentar e terminar

74
nos pulmões (embolia). Os números são baixos – cinco casos
para cada 100.000 mulheres por ano. Comparado com um
risco de sessenta casos de gravidez por ano entre 100.000 mu-
lheres, isso pode ser encarado como uma economia se você
estava antes confiando, digamos, em camisinha ou tabelinha
para sua contracepção (esses métodos não são nem de perto
tão eficazes).
Os riscos são um pouco maiores com as chamadas pí-
lulas de segunda e terceira gerações (seu médico pode lhe in-
formar quais as pílulas são dessas categorias), mas continuam
mais baixos do que os riscos de gravidez. Depois de um ano
tomando a pílula, o risco de trombose diminui.
No entanto, ele cresce bastante se você está acima do
peso, fuma e tem mais de 35 anos. Se tem mais de 35 anos e
fuma, o risco é tão grande que você tem de parar com a pílula
ou com o cigarro. O médico não prescreverá a pílula se você
continuar a fumar, pois isso seria irresponsabilidade da parte
dele. Você mesma terá de fazer a escolha.
Falou-se muito sobre o maior risco de câncer de mama
para quem toma pílula. Na verdade, o risco é bem pequeno,
chegando a alguns poucos casos adicionais em 10.000 mu-
lheres que tomam pílula. E esses casos adicionais parecem
ocorrer apenas em mulheres nos primeiros dez anos de con-
sumo da pílula – de modo que mulheres que tomam pílula há
mais de dez anos têm o mesmo risco que aquelas que nunca
tomaram.
Existem duas coisas a respeito dos casos adicionais.
Trata-se quase sempre de casos “iniciais” – ou seja, estão

75
confinados ao seio e são altamente curáveis, não represen-
tando uma alta taxa de mortalidade. Isso sugere que as mu-
lheres teriam contraído o câncer de qualquer modo, mas
que são diagnosticadas mais cedo quando estão tomando
pílula – possivelmente porque já estão mais cientes dos ris-
cos de problemas nos seios e se examinam mais atentamente
do que as outras mulheres.
O segundo ponto é que o número crescente de câncer
de mama associado ao uso da pílula é compensado pelo re-
duzido número de casos de câncer ovariano (que é, caso a
caso, mais letal do que o câncer de mama) e de câncer uteri-
no. A pílula participa ativamente na prevenção do câncer de
útero e de ovário. E, em estudos de grandes proporções, um
resultado inesperado, mas bastante consistente, é que mulhe-
res que tomaram a pílula durante anos têm uma incidência
bem menor de artrite reumatóide. Os hormônios nas pílulas
podem de algum modo ajudar a proteger as articulações da
ocorrência dessa doença.
Existe também a questão da pressão alta. Em algumas
mulheres (de novo, apenas algumas), a pressão do sangue co-
meça a aumentar quando passam a tomar pílula. Se esse au-
mento continuasse, elas correriam maior risco de um ataque
cardíaco ou infarto. No entanto, ele vai crescendo lentamen-
te, de modo que um pequeno aumento pode ser identificado a
tempo e revertido. Assim como com a trombose, se a pressão
for subir, isso acontecerá normalmente nos primeiros meses
de ingestão da pílula, mas ela pode começar a aumentar mais
tarde, ou seja, você vai precisar controlar sua pressão sanguí-

76
nea duas vezes ao ano durante todo o tempo em que estiver
tomando pílula.
Então, é ruim para a saúde tomar pílula? Não, desde
que você saiba quais são os riscos e tome medidas quando for
necessário. Grandes estudos junto às pessoas que tomaram e
que não tomaram pílulas sugerem que quem as usa costuma
viver mais tempo. Portanto, pode não ser para você tão ruim
assim.

Se minha mãe achou fácil ter filho, será que comigo vai
ser assim?

Posso entender sua ansiedade, mas não tranqüilizá-la com-


pletamente. Se você herdou a mesma constituição pélvica da
sua mãe, tem a mesma forma física dela, e vai ter o primeiro
filho mais ou menos na mesma época que ela, então é mais
provável que seu parto seja similar. Mas, se você é cinco ou
seis anos mais velha do que sua mãe quando ela teve seu pri-
meiro filho, então é provável que o parto seja mais demorado
e um pouco mais cansativo. Quanto mais tarde você tiver o
primeiro filho, especialmente depois que estiver perto dos 30,
mais demorado e difícil ele tenderá a ser. Quanto aos aspectos
positivos, somos hoje mais capazes de aliviar as dores e difi-
culdades do parto do que na época da sua mãe. Além disso,
mulheres como você tendem a ter melhor forma física e con-
tar com uma atenção pré-natal maior do que sua mãe, o que

77
pode compensar a diferença de idade. Francamente, é melhor,
no aspecto físico, começar uma família com 20 e poucos anos,
mas há muitas mulheres que se saem bem mesmo quando dão
à luz o primeiro filho já por volta dos 40 anos.

Se meu filho terminar se inclinando para uma ou outra,


qual é melhor, bebida ou drogas?

Que pergunta. Você quer deixar seu filho na frigideira ou


mandá-lo direto para a fogueira? Supondo que a frigideira
mate mais lentamente do que o fogo, então álcool é a pri-
meira e as drogas a segunda. Embora isso dependa também
do que o seu filho faz quando bebe. Em minha vida como
clínico geral vi muito mais vidas sacrificadas pelo álcool do
que pelas drogas, mas isso acontece porque na nossa parte
da Escócia o álcool é muito mais fácil de adquirir. Mor-
tes precoces por embriaguez geralmente estão relacionadas
com acidentes de trânsito, com ocasionais overdoses letais de
crianças pequenas que tomam todo o conteúdo da prate-
leira doméstica de bebidas de seus pais enquanto eles estão
fora (e a babá provavelmente dormindo). Só nos anos mais
recentes temos visto o resultado de sessões de bebedeiras
de adolescentes (um fenômeno relativamente novo em nossa
sociedade) virarem falência do fígado, com adultos jovens
necessitando desesperadamente de um transplante (e em ge-
ral morrendo antes que este se torne possível). Por isso eu

78
jamais escolheria beber em excesso como um passatempo
para qualquer adolescente.
Mas eu ficaria mais preocupado ainda com drogas. Le-
mos histórias trágicas sobre mortes repentinas por ecstasy, e
não damos muita atenção porque achamos que jamais acon-
tecerão com nossos filhos tão bem criados. Não acreditamos
que a canabis (maconha, baseado, back, jererê ou qualquer
um de seus equivalentes mais em voga) faça realmente algum
mal – e, afinal, ela não está para ser usada como remédio para
pacientes de esclerose múltipla? Isso, com certeza, quer dizer
que tudo bem com a maconha, não é mesmo? E as celebri-
dades todas usam cocaína, não é? E não parece que faz mal a
elas, não é verdade?
Vou dizer o que penso. Não é lá muito moderno, mas
é resultado de minha experiência como médico na primeira
década do século 21. Nossa área na Escócia rural foi total-
mente transformada pela epidemia de drogas ilegais desde os
anos 1980. Agora temos centenas de dependentes de heroína
– todos eles começaram com as chamadas drogas leves, sen-
do a inicial quase sempre o cigarro. Temos adolescentes com
danos provocados por ecstasy e que estão permanentemente
sob a supervisão de serviços psiquiátricos locais só porque ex-
perimentaram maconha. Muitos desses usuários de drogas já
estiveram na prisão porque roubaram ou fizeram algo pior só
para poder manter seu hábito. Todos eles são ruínas físicas
ou mentais com praticamente nenhuma perspectiva de uma
qualidade de vida razoável. Muitos irão morrer jovens, pobres
e sozinhos. Quando eles vêm até nós procurando ajuda, ten-

79
tamos fazer o melhor possível, mas com poucas esperanças,
porque sabemos da atração que as drogas exercem neles, e da
pressão que sofrem por parte das pessoas de seu grupo e dos
traficantes. Eles perderam o ânimo para qualquer coisa a não
ser como e quando vão poder tomar de novo sua droga.
O que eu escolheria entre drogas e álcool? Se tivesse de
fazer isso, então considerando os prós e contras, preferiria que
o adolescente tomasse álcool, porque é mais fácil de tentar con-
trolar, e mais disponível legalmente (não imagine por isso que
sou favorável à legalização das drogas – não sou). Pessoas com
problema de alcoolismo têm maior probabilidade de admitir
isso, e de procurar ajuda. Usuários de drogas, na minha ex-
periência, geralmente tendem a não ver os problemas que esse
hábito está causando, e dificilmente procuram ajuda ou a acei-
tam quando lhes é oferecida. Para ser franco, fico desesperado
quando preciso me envolver com esses casos – e conheço muitos
outros médicos que também ficam assim. Eu não me sinto tão
desesperado e sem esperança quando lido com um alcoólico.

É verdade que, se você vem tentando iniciar uma família


há mais de um ano, é mais provável que tenha um meni-
no do que uma menina?

Se você é holandês, parece que sim. Não sei se isso se aplica


a qualquer casal. Médicos holandeses acompanharam 5.283
mulheres que tiveram filhos entre 2001 e 2003. Os casais que

80
demoraram mais de um ano para engravidar (apesar de faze-
rem tudo para isso, vamos dizer assim) tiveram mais meninos
do que seria de esperar. Nascem lá em qualquer comunidade
mais meninos do que meninas. Geralmente a proporção é de
51 por cento de meninos e 49 por cento de meninas. Esse foi
o caso dos casais que conseguiram engravidar no prazo de
um ano de tentativas de conceber. Mas, para as mulheres que
ficaram mais de um ano esperando engravidar, a proporção
menino-menina foi de 57 para 43. Isso é suficiente para ser
perceptível, mas obviamente não tão acentuado que permita
prever com algum grau de certeza que qualquer mulher que
tenha precisado esperar mais de um ano terá um menino.
E por que essa diferença? Em algumas mulheres rela-
tivamente inférteis, a principal barreira à concepção é mais
forte do que o usual muco no colo do útero e no útero. Os
médicos holandeses sugerem que o esperma masculino (que
carrega o cromossomo Y), sendo mais leve e nadando mais
rápido que o esperma feminino (que carrega o cromossomo X
mais pesado), é capaz de nadar mais depressa pelo muco mais
grosso – e portanto ter melhor chance de alcançar o óvulo que
está à espera. Se a explicação parece um pouco “forçada”, não
pergunte a mim, e sim à equipe de obstetras de Maastricht.

É bom para o desenvolvimento cerebral dos meus filhos


expô-los a mais de uma língua desde cedo?

81
Isso foi uma grande discussão na Escócia no início do século
20, quando o gaélico, a língua nativa das Highlands, quase
foi extinto porque os pais achavam que usá-lo em casa iria
tornar mais difícil aos seus filhos a aprendizagem do inglês.
Os professores puniam as crianças que falavam gaélico na sala
de aula. Agora sabemos mais a respeito. Quanto mais cedo
apresentamos uma segunda língua à criança, mais habilida-
des de linguagem ela vai conseguir (e mais facilidade ela terá
em aprender se entrar em contato com uma terceira e quarta
línguas mais tarde). Descobriu-se que as crianças que fala-
vam tanto gaélico como inglês tinham mais facilidade em
aprender uma terceira língua, como o francês, do que seus
colegas. O gaélico está agora experimentando um ressurgi-
mento na Escócia. Também há evidências de que uma se-
gunda língua melhora o raciocínio, e talvez o intelecto. Mas
não é somente expor crianças a línguas o mais cedo possível
que ajuda. Os alunos que estudam música desenvolvem ta-
lento especial para identificar sons – não só as notas musi-
cais, mas palavras também. Assim, uma criança que apren-
deu a apreciar e tocar música tem maior probabilidade do
que as demais de ir bem na aprendizagem de novas línguas.

Quanto tempo devemos esperar entre uma gravidez e ou-


tra? O que é melhor para a mãe e para os bebês?

Se você quer se informar sobre como tornar o parto mais

82
fácil, tem uma boa margem de segurança. Os períodos em
que o parto pode ficar mais difícil é entre dezoito meses e
cinco anos depois do último parto. Antes de dezoito meses,
há um pouco mais de sangramento: depois de cinco anos, o
parto tende a ser mais demorado e cansativo. Mas isso são
tendências e não regras rígidas. Se sua preocupação é se os
seus filhos vão se dar bem entre eles, então uma gravidez a
cada dois anos é o mais acertado. Eles terão poucas coisas
em comum durante sua infância se esse intervalo for maior,
digamos, a cada quatro anos, e eles podem ficar muito próxi-
mos e virarem rivais se vierem a cada ano. Mas, de novo, isso
são tendências – depende muito de como os pais lidam com
a questão. É claro que, se você está pensando em montar um
time de futebol, então as crianças mais velhas se inclinarão a
cuidar das mais novas. Isso não é tão distante assim: no início
do século 20 era comum ter entre nove e doze filhos, e eles
não se davam tão mal assim no conjunto. Numa das famílias
mais felizes (e mais pobres economicamente) que tive a felici-
dade de cuidar, a mãe deu à luz dezenove filhos. Eles viviam
em três grandes sobrados interligados. Todo mundo cuidava
de todo mundo, e a mãe era magrinha e uma graça de pessoa,
com seus 40 e poucos anos.

83
ADEPTOS DA BALADA

O s adeptos da balada curtem a vida ao máximo. Isso in-


clui muita bebida (embora eles saibam que estão além
da quota semanal recomendada), muitos mais cigarros do que
o sensato (embora eles já tenham decidido parar no ano que
vem) e uma droga recreativa eventual (o termo eventual usa-
do aqui com muita elasticidade).
A contra-indicação para o estilo de vida dos adep-
tos da balada, que de outro modo poderia ser chamado de
hedonista, é a “paranóia do dia clareando” – aquele mo-
mento lá pelas 4 da manhã, quando o cara se sente desi-
dratado e com a cabeça martelando. Ao acordar de res-
saca, ele é assaltado por uma ansiedade a respeito de sua
saúde e estilo de vida, e decide mudar imediatamente.
Ao sair de casa, corre atrás de algum chá desintoxicante
ou de sementes de abóbora... e de repente já são 7 da noi-

85
te outra vez, e um copo com gelo e alguma bebida dentro
bem deliciosa já está na frente dele e tudo o que decidiu
se evapora no éter (ou numa névoa de fumaça de cigarro).
Em geral, consigo detectar um adepto da balada a qui-
lômetros – e eles são uma causa perdida. Com receio de
contar ao seu médico a verdade, pois este pode insistir
numa mudança de estilo de vida imediata, eles me pro-
curam em festas, numa desesperada tentativa de se con-
vencerem de que as advertências médicas oficiais, por al-
guma razão, não se aplicam a eles mesmos. Nunca gasto
muita energia em minhas respostas, pois sei que, de ma-
nhã, eles não vão lembrar de ter conversado comigo.

Fumar maconha pode me deixar meio abobado?

Pode, apesar do que afirmam aqueles que fumam. Se você


quer preservar sua memória e seu intelecto, não fume maco-
nha sob nenhuma forma. Médicos na Grécia compararam a
habilidade mental de vinte pessoas que fumaram maconha
quatro vezes por semana durante quinze anos com vinte pes-
soas que a tinham usado por menos de sete anos, e 24 outras
que nunca haviam fumado. Todas elas receberam quinze pa-
lavras para memorizar, e depois pediu-se que as repetissem. A
nota média para os que fumaram maconha por mais tempo
foi 7, para os que fumaram menos tempo foi 9 e para os que
nunca fumaram, 12. É uma diferença grande, que demonstra

86
muita perda cerebral devida diretamente à droga. Esse é ape-
nas um dos mais recentes estudos que mostram que o abuso
repetido de drogas “leves” danifica o cérebro. Não surpreende
que seja assim, pois o principal ingrediente ativo da maco-
nha, o tetraidrocanabinol, ou THC, é altamente solúvel em
gordura. Como o cérebro é o órgão do nosso corpo com a
mais alta concentração de gordura, o THC constrói uma li-
nha reta para se instalar, e fica ali durante semanas. Se você é
um usuário regular de maconha, seu cérebro nunca fica livre
dela – e isso pode contribuir para um desastre a longo prazo,
incluindo psicoses (como esquizofrenia e paranóia), depres-
são e demência. É sério.
Assim, se você usa maconha só para se divertir, por fa-
vor, lembre-se (antes que esqueça) que seu cérebro é seu bem
mais precioso. Não vale a pena danificá-lo permanentemente
com maconha.

Por que fico com uma fome cavalar quando estou de


ressaca?

Essa pergunta é interessante. A maior parte das pessoas não


pode nem ver comida quando está de ressaca – elas ficam
enjoadas. Não sei bem a resposta a essa pergunta, mas pos-
so sugerir uma possível. Estar com fome ou não depende do
nível de uma substância chamada leptina no nosso sangue.
A leptina é liberada para a circulação por células de gordu-

87
ra depois que começamos a comer uma refeição substancial.
Quando ela atinge o cérebro, liga-se a células nervosas no
“centro da fome”, nas profundezas do cérebro. Isso desliga
nossa sensação de fome, e paramos de comer.
Brilhante, você deve estar pensando. Então por que não
usar leptina para emagrecer? É só tomar uma dose dela, des-
ligar seu mecanismo da fome e perder vários quilos. Infeliz-
mente, isso não funciona dessa forma com pessoas obesas.
Elas produzem muita leptina naturalmente, mas também
uma proteína chamada CRP em grandes quantidades – e isso
“varre” a leptina em circulação antes que ela tenha a oportu-
nidade de se ligar às células da fome. Portanto, essas pessoas
não conseguem desligar sua fome. Quanto mais leptina se dá
a uma pessoa obesa, mais CRP esta produz, por isso ministrar
leptina não será uma solução para ela. Pois bem, talvez o que
esteja acontecendo é que você, ao tomar bebida alcoólica (ao
contrário de outras pessoas que não sentem fome quando es-
tão de ressaca), ela faça você produzir mais CRP, o que o deixa
com fome. Nesse caso, eu evitaria ficar de ressaca, porque au-
mentar o CRP pode levar a um dano precoce ou inflamação
do fígado, e isso ser o prelúdio de algum problema mais grave.

Por que fico com fome ao fumar maconha?

Vale a resposta anterior, só que em vez de álcool leia-se maco-


nha. A mesma mensagem, também. Se a maconha faz você se

88
sentir esfomeado, então talvez seu fígado não esteja gostando.
Talvez seja hora de repensar seu estilo de vida e de ver se você
quer mesmo ter uma existência razoavelmente longa. Aliás,
existe uma boa razão para a maconha ser chamada de droga.

Qual o melhor jeito de curar ressaca?

Se você acha provável que ficará de ressaca, tome muita água


antes de começar a beber e procure controlar a bebida à noite.
A ressaca é uma combinação de desidratação e queda do nível
de álcool no cérebro. O primeiro efeito é bem óbvio e conhe-
cido, mas o segundo mais sutil, às vezes até alarmante. Se
você conseguir se hidratar, e limitar o nível de álcool no cére-
bro não bebendo mais nada por um tempo, vai ficar bem.
A dor de cabeça de uma ressaca resulta da desidratação
– o cérebro encolhe um pouco com a desidratação, e isso dis-
tende as membranas em volta dele. As terminações nervosas
da dor ficam nessas membranas, e isso provoca a dor de cabe-
ça. Manter o cérebro mais regado a água e menos encharcado
de bebida pode evitar o problema. O enjôo é causado pela
intoxicação de álcool no estômago e no intestino. O único jei-
to de evitar isso é não beber tanto, a ponto de alcançar níveis
tão altos de intoxicação. Estes variam conforme o indivíduo,
mas, como regra geral, quatro ou cinco drinques comuns ao
longo de algumas poucas horas são suficientes para produzir
razoável desconforto na maioria das mulheres, e um pouco

89
mais que isso tem o mesmo efeito nos homens. Se você bebeu
o suficiente para ficar bêbado, vai levar um bom tempo para
o seu cérebro se refazer.
Também é bom relembrar que da noite até o dia seguin-
te você perde apenas 10 por cento do álcool a cada hora, por
isso, ao acordar de manhã, é bem possível que ainda esteja
bem acima do limite permitido para poder dirigir. Nesse pon-
to, seu cérebro está fortemente sedado e ainda desidratado, e
vai demorar para voltar ao normal. Seus reflexos só estarão
bem talvez no início da tarde.
Tentar curar a ressaca tomando mais uma dose
pode funcionar a curto prazo, já que uma pequena quan-
tidade de álcool eleva um pouco o seu nível no cére-
bro, mas é provavelmente o caminho certo para o al-
coolismo. A partir do momento em que você bebe de
manhã para tratar do desconforto de estar sem álcool, dá
o primeiro passo para não poder passar mais sem bebida.
Se decidir usar remédios extravagantes, como gema de ovo
com molho inglês e sal e pimenta, ou um Bloody Mary bem
apimentado, lembre-se de que a parede do seu estômago já
foi baleada. Álcool tem efeito direto no estômago e pode
levar um dia ou dois para as células da parede do estômago
se recuperarem dos maus tratos. Qualquer coisa que precise
ser digerida – como ovo cru e laticínios – só irá prolongar
esses danos.

90
Por que às vezes tenho uma ressaca infernal e outras ve-
zes não, mesmo quando parece que tomei o mesmo tanto
de bebida?

Muito disso depende de você no dia anterior ter cuidado de


se hidratar enquanto bebia. A dor de cabeça depois de beber
tem muito a ver com um distúrbio no equilíbrio normal de
água e eletrólitos (sódio, potássio, cloro, bicarbonato e outras
moléculas com carga elétrica na sua corrente sanguínea, cé-
rebro e outros tecidos), e também com o nível de álcool. As
ressacas às vezes dependem também do nível de substâncias
mais “fortes” naquilo que você bebeu. Em algumas bebidas,
principalmente os destilados, não é apenas o álcool etílico que
afeta o coitado do seu cérebro – há muitas outras moléculas
complexas na bebida, e elas podem acentuar a intoxicação do
seu cérebro. Isso não está muito distante de tomar gasolina
– que é apenas um álcool mais “forte”.
Por exemplo, por alguma razão inexplicável, o absinto se
tornou popular como bebida entre os jovens de hoje. Foi proi-
bido durante anos porque se conhecia seu poder de intoxica-
ção, e mesmo seu poder letal em doses não muito maiores do
que um drinque normal. Já vimos reações terríveis ao absinto
na prática, com ressacas que duraram dias, e até uma morte.
Portanto não se trata só do quanto você bebe, mas do
que bebe também. E de se alguém “incrementou” sua bebida.
Na manhã seguinte, você sabe de fato o que bebeu na noite
anterior? Se bebeu o suficiente para ter uma ressaca infernal,
eu aposto que não sabe.

91
Tudo depende também da rapidez com que tomou a
bebida alcoólica: beber muito num intervalo de tempo relati-
vamente curto joga o nível de álcool de seu cérebro mais para
cima do que beber devagar, ao longo de várias horas. Sua dor
de cabeça aparece quando você começa a ficar consciente de
novo e seu cérebro torna-se sensível às toxinas que colocou
nele. Devo confessar que não sou muito simpático a quem
formulou essa pergunta. A resposta óbvia é estar sempre no
controle da quantidade que você bebe, de modo que não che-
gue a ficar de ressaca. Mas imagino que devo ser um velho
careta e empedernido que nunca foi jovem na vida.

O que é mais propício a espalhar infecções, um beijo ou


um cumprimento de mão?

Até uns dois ou três anos atrás eu teria respondido que é o beijo,
mas não agora. Apertar a mão de alguém pode trazer más notí-
cias. Considere por exemplo o vírus de inverno do vômito. Ele
se espalha rapidamente em comunidades e hospitais, causando
diarréia e vômito por dois dias; daí o número de casos decresce,
e ele parece ter desaparecido completamente. Só recentemente
os pesquisadores descobriram o que causa esse vírus, e como ele
se espalha – e tiveram algumas surpresas no processo.
Costumávamos supor que a maioria das infecções que
provocavam vômito e diarréia era provocada por comida. Se
o estômago e o intestino estão afetados, é natural que procu-

92
remos a causa naquilo que andou por dentro deles. Mesmo
assim, anos e anos examinando cozinhas e comida oferecida
em hospitais, por exemplo, não permitiram identificar a causa.
Então, algumas linhas de cruzeiros marítimos relataram sur-
tos de doenças similares. Suas cozinhas estavam impecáveis, e
os pesquisadores concordaram, como nos surtos em hospitais,
que a causa não deveria ter sido a má higiene dos funcio-
nários. A estação do ano tampouco fazia diferença. Embo-
ra a doença fosse chamada de doença de vômito do inver-
no, ela acontecia em qualquer época do ano. Os navios de
cruzeiro fogem dos climas de inverno, e houve dezenas de
surtos neles. Alguns cruzeiros foram até abandonados devi-
do ao grande número de passageiros e tripulantes afetados.
A solução veio quando um vírus, chamado primeiramente
de norwalk, depois norovírus, foi descoberto em material de
amostra das vítimas. Não foi encontrado nas cozinhas ou na
comida, mas nas mãos de pessoas com a doença, assim como
na sua diarréia. Com freqüência não foi encontrado na saliva.
Ficou claro que o vírus se transmitia de mão em mão. Al-
guém com o vírus incubado podia deixá-lo numa maçaneta
de porta ou no corrimão da escada, ou nos talheres, o que
seria suficiente para infectar outra pessoa.
Isso foi uma revelação, porque a opinião geral dos espe-
cialistas é que os vírus, ao contrário das bactérias, que são outro
tipo de germe, podiam durar apenas um curto período fora do
organismo, e certamente morreriam muito rápido deixados na
pele das mãos – que têm seus próprios mecanismos de proteção
contra germes. Não se achava possível que um aperto de mão

93
ou uma maçaneta pudessem transmitir uma infecção viral.
Então, as empresas de cruzeiros marítimos mandaram car-
tas a cada um de seus potenciais passageiros dizendo que
não deveriam embarcar se estivessem com diarréia ou en-
jôo. Eles instalaram sistemas à base de álcool para lavar as
mãos nas entradas de seus refeitórios. Ofereciam atendimen-
to médico gratuito para qualquer passageiro que desenvol-
vesse enjôo e diarréia enquanto estivesse a bordo, desde que
ele informasse imediatamente o médico do navio. Os sur-
tos de norovírus em cruzeiros marítimos diminuíram desde
que essas precauções foram implantadas, embora no verão
de 2006 tenha havido três em navios partindo da Inglaterra.
Os hospitais vêm fazendo o mesmo. Mas, enquanto os cruzei-
ros possuem uma população cativa que pode ser controlada,
os hospitais não têm esse luxo. Eles recebem montes de visi-
tantes, e deve-se informar que a infecção inicial por norovírus
que decorre de surtos em hospitais é quase sempre trazida pe-
las visitas dos pacientes. A precaução a ser tomada é não visi-
tar um amigo no hospital se você esteve recentemente doente
ou andou há pouco tempo na companhia de alguém doente.
E lave muito bem as mãos antes de entrar no hospital.
Esse conhecimento é inteiramente novo. Conta-se que
a rainha Vitória demitiu o médico real porque ele lavou suas
mãos somente depois de examiná-la e não antes. Ela estava
absolutamente certa em fazer isso! Vá lá saber onde um mé-
dico vitoriano pode ter enfiado a mão antes de ir visitar a
rainha. Especialmente se, como alguns ainda suspeitam, ele
era Jack, o Estripador.

94
E o que dizer da febre glandular, famosa por ser a “in-
fecção por beijo” entre adolescentes? Com certeza, o vírus
causador (ele tem o exótico nome de Epstein-Barr) é trans-
mitido de lábio a lábio. Outra infecção universal provavel-
mente transmitida por beijo é o vírus do herpes labial. O
aspecto mais estranho das infecções labiais, no entanto, é
nossa completa falta de conhecimento sobre o que causa as
ulcerações da boca (as aftas). Quase todo mundo já teve es-
ses pequenos pontos brancos doloridos dentro da boca, na
língua, na parte interna dos lábios ou da bochecha, embora
não se saiba o que poderia ser responsável pela sua transmis-
são, ou mesmo se é uma infecção. Ninguém jamais achou
que um vírus ou outro germe fosse responsável por elas. O
tratamento mais eficiente é colocar sobre elas um pequeno
comprimido de cortisona. Isso remove a dor quase instan-
taneamente, sugerindo que a área está inflamada (cortiso-
na é a mais recente droga antiinflamatória), embora não se
saiba o que estimula a inflamação em primeira instância.

Só tomo vinho, nem chego perto de destilados. Isso com


certeza vai preservar meu fígado?

Não necessariamente. Depende inteiramente da quantidade


de álcool que você ingere. Não importa que tipo de bebedei-
ra você escolhe. Trata-se na verdade de quanto álcool você
toma por dia, não da forma como ele vem acondicionado.

95
O cardo-mariano é realmente bom para o fígado?

O que você espera que o cardo-mariano faça pelo seu fígado?


Um fígado saudável não precisa de nenhuma forma de medi-
cação, seja por ervas ou ortodoxa. Ele simplesmente dá conta
de suas milhares de funções como sempre. Não existe um in-
grediente mágico em nenhuma medicina que possa melhorar
seu desempenho desde que você esteja se alimentando com
uma dieta variada e não abuse dele, digamos, com álcool ou
mesmo com algum remédio de ervas, como vimos acontecer
ao longo dos anos. Lembro do surto de doenças do fígado en-
tre crianças afro-caribenhas em Birmingham nos anos 1960
e 1970, porque suas mães davam-lhes bush teas (chazinhos e
mezinhas misteriosos com vegetais de reputação folclórica),
numa crença tragicamente equivocada que seria bom para a
saúde dos filhos. Depois, há poucos anos, vários adultos na
Bélgica sofreram sérios problemas no fígado e nos rins por
causa de ervas importadas da China.
Preciso dizer que a comunidade chinesa na Inglaterra
está tentando corrigir isso. O que parece ter acontecido na
Bélgica, segundo meu informante favorito, é que a popula-
ridade global das ervas chinesas aumentou muito sua coleta,
tornando-as escassas. Alguns inescrupulosos entraram no ne-
gócio de compra e venda de ervas, usando ervas substitutas
que se revelaram tóxicas. Como conseqüência dos casos bel-

96
gas, Kew Gardens montou um centro de pesquisa especial,
financiado pela comunidade chinesa do Reino Unido, para
analisar os produtos importados.
Não, eu não recomendaria cardo-mariano para o fíga-
do ou para qualquer outro órgão. Saúde não funciona assim.
Você está se alimentando e vivendo de modo saudável, e nesse
caso não precisa de nenhum suplemento de ervas ou de qual-
quer outro tipo para melhorar sua saúde, ou então você está
doente. Neste último caso, não seria mais sábio confiar na
classe médica, que conhece bem os órgãos e seus problemas?
Pense num engenheiro aeroespacial alternativo – você gosta-
ria de voar num avião que fosse projetado por ele?

Quando é que temos de ir ao médico por causa de uma


tosse?

Se você é não fumante, qualquer tosse que se estenda por


mais de duas ou três semanas tem de ser investigada. O mé-
dico vai querer examinar a garganta e o nariz, e auscultar o
peito para, a partir disso, tomar algumas medidas adicionais.
Se você fuma, vai ter uma tosse de qualquer jeito. Parar de
fumar vai acabar com a tosse no prazo de um mês. Se isso não
ocorrer, consulte o médico. Você terá de ser examinado para
saber a extensão do dano ao seu pulmão. Se você tem uma
tosse permanente e continua a fumar, é melhor falar a respei-
to de sua decisão com seu advogado do que com seu médico.

97
Beber vinho pode ser saudável?

Tudo depende do quanto você toma de vinho. As evidências


a favor foram expostas por Jean-Marc Orgozozo, professor da
Universidade de Bordeaux, que primeiro revelou ao mundo
que o vinho fazia bem à saúde. Ele conseguiu provar de uma
vez por todas se o vinho tinto produziu dano na população
servida pelos seus hospitais. Tinha ao seu redor os elementos
perfeitos: um grande número de pessoas que haviam tomado
vinho todos os dias desde a infância, e uma boa proporção de
pessoas que nunca o haviam bebido. Então ele montou um
grande estudo englobando quase todas as pessoas da região,
anotando seus hábitos relacionados à bebida, e acompanhou-
as pelos 25 anos seguintes. Cada certificado de óbito foi ana-
lisado pelo seu departamento.
O resultado o deixou assombrado – e a todos os de-
mais médicos que o ouviram ler seu trabalho. As pessoas que
haviam tomado uma quantidade moderada de vinho vive-
ram mais tempo que os abstêmios. Não só um pouco mais,
mas bem mais tempo – alguns anos. O suficiente para que
a diferença fosse muito significativa. A possibilidade de que
esses resultados fossem obra do acaso eram de mais 20 para
1, contra. Os que tomavam vinho tinto tinham bem menos
ataques cardíacos e infartos, e se eles não passassem da conta,
ficando nas duas ou três taças de vinho por dia, nem sequer

98
apresentavam um índice mais elevado de doenças do fígado.
O problema dessa feliz descoberta é que a quantidade média
de vinho que uma pessoa bebe numa só noite de festa costu-
ma ser maior do que aquela que um “bebedor moderado” do
estudo de Jean-Marc toma em uma semana.
O outro lado das conclusões de Jean-Marc é assustador,
em vez de nos tranqüilizar. Em última instância, tomar vinho
pode ser saudável dependendo do lado em que você está da
curva J. A curva J relaciona a quantidade que você bebe com
o risco de morrer antes do que poderia esperar. Ela se pare-
ce com a própria letra J. Tem uma pequena curva ascendente
para a esquerda, onde se situam os abstêmios, e outra curva
ascendente bem maior e mais íngreme para a direita, em que
ficam as pessoas que tomam mais de duas ou três taças por dia
de vinho, ou equivalentes. O fundo da curva – as pessoas que
vivem mais anos – é um ponto bem preciso. Ela inclui as pes-
soas que tomam uma ou duas taças por dia. Quanto mais você
beber acima disso, mas à direita e para cima ficará nessa curva
J. Quanto mais para cima estiver, mais curta a sua vida.
A propósito, três taças por dia é uma quantidade
maior do que quando Jean-Marc escreveu a respeito nos
anos 80. As taças de vinho aumentaram de tamanho. Elas
costumavam conter 125 mililitros de vinho. Hoje, a maio-
ria pode conter até 250 mililitros. Isso equivale a um ter-
ço de uma garrafa de vinho, ou dois copos comuns. Três
taças desse tamanho equivalem a seis a oito unidades, de-
pendendo da força do vinho, ou seja, álcool suficiente para
três dias inteiros. Se você toma três copos de vinho vá-

99
rias vezes por semana, já subiu até a metade da haste do J.

Tenho lido a respeito das “boas coisas” do vinho tinto,


como os licopenos, que também encontramos no chá,
tomates, maçãs e cebolas vermelhas. Eles são de fato
­benéficos?

É verdade. Todos esses alimentos contêm substâncias que são


úteis para prevenir um ataque cardíaco ou infarto, mas você
não conseguirá se beneficiar disso se, como mulher, beber
mais do que duas taças de vinho por dia. Seu fígado não con-
segue lidar bem com mais do que essa quantidade de álcool.
E não faz sentido se proteger contra um ataque cardíaco para
morrer antes disso de cirrose hepática. De qualquer modo, a
verdadeira proteção que beber vinho oferece vem do próprio
álcool que ele contém, não de outros elementos químicos.

É verdade que tomar vodca junto com fondue de queijo


pode matar a pessoa?

E por que você iria querer tomar vodca junto com fondue de
queijo? Na verdade, antes de mais nada, por que você iria que-
rer comer fondue de queijo? É uma refeição que faz a maior
bagunça, e não satisfaz. Eu não sei de nenhuma razão cien-

100
tífica que recomende evitar tomar vodca com fondue. A não
ser que você tome tanta vodca que não consiga mais engolir
com facilidade e o queijo derretido grude na sua garganta, fa-
zendo-o ficar asfixiado e morrer. Tentar tirar um queijo gru-
dento de dentro da garganta de uma pessoa engasgada, e em
pânico, não é fácil. A manobra de Heimlich não funcionará
muito bem se o queijo estiver grudado em volta das amígdalas
e na epiglote, colado mais embaixo na abertura da laringe, e
você só tiver alguns segundos para interromper a asfixia. Mas
nunca tive a oportunidade de fazer algo assim, portanto acho
que não deve ser muito comum, e não encontrei nenhuma
referência direta ao assunto na literatura médica.
Existe outra maneira pela qual o fondue de queijo pode
matá-lo. Se você está tomando um tipo particular de antide-
pressivo – um inibidor da monoamina oxidase (IMAO) –, en-
tão comer queijo é perigoso. Uma reação entre os ingredientes
do queijo e os do IMAO pode elevar sua pressão sanguínea a
níveis perigosos, provocando alto risco de um infarto. Tomar
álcool junto aumenta esse risco. Por isso, aprecie seu fondue
de queijo, mas sem se embebedar. E evite o fondue se estiver
tomando esse tipo de antidepressivo.

Nossos genes determinam se seremos alcoólicos ou não?

Em parte, sim. Estudos sobre alcoólicos sugerem que uma


proporção significativa dessas pessoas possui uma variação

101
particular do gene da alcooldeidrogenase que as faz tolerar
muito mais álcool que as demais. Isso pode levá-las a beber
mais do que é saudável sem sofrer os efeitos danosos que os
outros sentem, o que talvez seja o primeiro passo para o pe-
dregoso caminho do alcoolismo. No entanto, qualquer pes-
soa, com qualquer combinação de genes, pode se tornar alcoó­
lico, o que sugere que são as circunstâncias sociais, mais do
que a bioquímica básica do corpo, que se revelam cruciais na
maioria das vezes.
Existe uma exceção do outro lado da moeda. Algumas
pessoas têm uma forma de outro gene, aldeidodeidrogenase,
que as torna particularmente sensíveis aos efeitos do álcool.
Elas se sentem enjoadas e passam mal depois de tomar uma
pequena quantidade. Naturalmente, aprendem logo a evitar
tomar mais do que o mínimo, e não viram alcoólicos. Talvez
sejam elas as mais afortunadas.

Por que as mulheres não podem beber o mesmo tanto que


os homens antes de sofrerem danos no fígado?

Infelizmente, as mulheres têm em média o fígado menor que


os homens, e precisam exigir bem mais desse órgão devido aos
seus hormônios sexuais. Isso reduz sua capacidade de lidar com
o álcool. É duro, mas está provado. O da mulher tem cerca de
dois terços da capacidade do fígado do homem para quebrar o
álcool. Por isso, seu limite fica determinado em cerca de dois

102
terços em relação ao do homem. Algumas mulheres podem
beber mais, mas isso depende de seus níveis de alcooldeidro-
genase. Esta é a enzima que quebra o álcool no organismo. Al-
gumas pessoas produzem muita, outras pouca. Quanto mais
você produz, maior a quantidade de álcool que pode ingerir
antes de ficar bêbado. A maior parte das mulheres usa sua dei-
drogenase para quebrar seus hormônios sexuais – estrogênio
e progesterona –, o que deixa menos para o álcool. Por isso, o
nível de álcool no seu sangue eleva-se mais depressa e perma-
nece alto por mais tempo do que nos homens. As mulheres
são um pouco como os homens japoneses, já que pelo menos
metade de todos eles, e outros homens do Extremo Orien-
te, produzem pouca alcooldeidrogenase. Como resultado, fi-
cam bêbados muito depressa com pequenas quantidades de
ál­cool. Você pode perceber quando estão embriagados porque
ficam avermelhados. E eles têm cada ressaca no dia seguinte...

Por que algumas pessoas contraem câncer e outras não, em-


bora fumem o mesmo tanto ou vivam no mesmo ambiente?

Uma coisa crucial para saber se você pode ter ou não câncer
em determinado órgão é descobrir se herdou ou não o con-
junto de genes que o propicia. Alguns genes, quando “acio-
nados” por influência externa, podem iniciar o processo que
leva ao câncer. Eles são denominados oncogenes. Há outros
genes que protegem contra o câncer. Talvez o mais conheci-

103
do deles seja o P53. Sua tarefa é detectar qualquer mudança
anormal numa célula que possa ser o início de um processo
cancerígeno. Depois de fazer isso, o P53 instrui a célula a
“cometer suicídio”, de modo que desapareça, e sua química é
quebrada em seus elementos básicos para que possam circular
e ser reutilizados de forma diferente. O nome médico desse
processo é apoptose.
Cada uma das células do nosso organismo contém a
versão do gene P53. Se ele é danificado de alguma forma,
então a apoptose não ocorre, qualquer mudança cancerosa
pode continuar, e o processo que leva a um câncer totalmen-
te consolidado não pode mais ser interrompido. Sabemos
que, no câncer de pulmão, uma das ações dos elementos
químicos do cigarro é danificar o gene P53. Também sa-
bemos que, em famílias com vários casos de câncer de in-
testino, muitos dos afetados herdaram um gene P53 defei-
tuoso ou uma mutação dele, num gene chamado 18qLOH.
Portanto, a resposta à pergunta é que isso depende de sua
constituição genética. Algumas pessoas ficam protegidas con-
tra o câncer porque não possuem oncogenes. Outras porque
têm um sistema P53 robusto. E ainda há outras que correm
risco porque possuem oncogenes (eles foram detectados em
pessoas com câncer de seio, pulmão, ovários e útero) ou por-
que seus hábitos (como o cigarro) destruíram suas principais
defesas anticâncer.

104
O que você diz da rainha-mãe da Grã-Bretanha? Ela fu-
mava como uma chaminé e viveu até os 101 anos. Como
explicar isso?

Fico feliz de você ter feito essa pergunta. Na década de 1980,


ela permitiu que se colocasse uma garantia oficial da família
real britânica nos maços de cigarros Rothmans. Nessa época,
escrevi uma coluna para um jornal dominical escocês, furioso
com o fato de a família real endossar um hábito que estava
matando tantos dos meus pacientes. Então fiz uma relação
das mortes dos últimos monarcas do Reino Unido. Eduardo
VII morreu de falência crônica dos pulmões em 1910, e os
últimos dois anos de sua vida foram terríveis. Jorge V fale-
ceu do mesmo modo em 1935, com suas últimas respirações
ofegantes, e com o aval explícito de um compassivo médico
real. Eduardo VIII morreu de câncer na garganta. Jorge VI
morreu de câncer do pulmão e doença cardíaca.
Todas essas mortes estavam diretamente relaciona-
das à dependência do cigarro. Todos esses reis deram aval
às suas marcas favoritas. Então, é claro, veio a princesa
Margaret...
Portanto, não pude acreditar quando vi a rainha-mãe
aprovando o mesmo material que havia matado seu ma-
rido e que acabaria matando sua filha. Meu artigo foi exi-
bido à entrada da Casa dos Comuns por um movimento
antitabagista, e tive meus quinze minutos de fama. Não
acho que vá constar da Lista dos Honoráveis da família real.
Então como é que a rainha-mãe durou tanto tempo? Ela teve

105
a sorte de herdar os genes certos – e a maioria dos demais
membros da Casa de Windsor obviamente não. A gente ga-
nha umas e perde outras.

106
O ANTROPÓLOGO AMADOR

O s AAs são eternos estudiosos da vida. Interessados na


“visão geral”, antropólogos amadores querem saber dos
fundamentos, não de detalhezinhos sem importância, como
sua própria condição de saúde. Portanto, são o oposto da mãe
neurótica e do adepto da balada. Querem saber das questões
gerais no grande esquema das coisas, e pensam, de modo bem
equivocado, que um clínico geral tem algo a oferecer nas res-
postas que dá. Desejam acrescentar algo ao grande repositório
de conhecimento de seus já enciclopédicos cérebros, e o que
pode haver de melhor para isso do que pescar conhecimen-
to, seja qual for, do primeiro “especialista” que encontram
no complexo jogo da vida? Das respostas que dou a seguir,
você não demorará a compreender que quando o antropólogo
amador vem falar comigo ele está despencando das alturas do
seu mundo da Lua. Mas isso não importa porque, depois que
ele agarra você, não há mais como se soltar.

107
Por que as pessoas de certos países são mais altas, como
os holandeses, os zulus, por exemplo?

Essa é uma das muitas questões cuja resposta pode ser encon-
trada no fato de termos sido caçadores-coletores. Volte atrás
algumas centenas de milhares de anos – na verdade, para 4
milhões de anos atrás. Os humanos viviam nas planícies da
África ou nas florestas. Era uma vantagem ser alto se a pessoa
morava nos pastos, porque podia enxergar acima da vegeta-
ção de metro e meio de altura e verificar se animais como
os grandes gatos com dente de sabre estavam vindo na sua
direção. Também era uma vantagem ser um corredor veloz
sobre duas pernas. Por isso, pernas compridas, a posição ereta
e mãos capazes de arremessar lanças eram pontos a favor. Daí
resulta a alta estatura dos zulus, etíopes, quenianos e outros
mais, que, por necessidades semelhantes, perderam os genes
para baixa estatura.
Por outro lado, se a pessoa morasse nas florestas, a altura
constituía uma desvantagem para se deslocar pelo emaranha-
do da selva – era melhor ser baixo. Daí os pigmeus e hotento-
tes, que perderam o gene para alta estatura. Essa pode ter sido
uma vantagem nos países mais ao norte, pelo fato de a estru-
tura corporal magra e alta oferecer maior área superficial por
peso corporal, e isso permitiu à pele tirar o máximo partido
da luz do sol. Ter a pele clara também ajudou, por permitir-lhe

108
produzir o máximo possível de vitamina D ao longo do verão.
Quanto aos holandeses, o fato de serem altos tem uma jus-
tificativa mais recente. Eles vêm sendo grandes e alimentan-
do-se de laticínios por muitos séculos, e isso permitiu que
crescessem até seu potencial máximo. Com os finlandeses é
semelhante. Desde o momento em que nós ingleses come-
çamos a comer de modo mais saudável (sim, isso está acon-
tecendo), a partir da segunda metade do século 20, a altura
média dos adultos cresceu em mais de 5 centímetros, em
ambos os sexos. Estamos chegando mais perto dos holande-
ses e dos escandinavos.

Quanto tempo podemos viver? Isso está definido no nas-


cimento, ou poderemos viver mais tempo do que já con-
seguimos antes?

Se você está querendo viver 150 anos, tenho más notícias.


Parece que a duração de nossa vida está definida desde o nas-
cimento e não há nada que possamos fazer a respeito – exceto
mudar nossa constituição genética, e isso ainda vai demorar
muito para acontecer, se é que vai ser possível um dia.
O ponto crucial é a freqüência com que suas células
podem se renovar. Estou falando das células de todos os nos-
sos órgãos, da pele aos intestinos, cérebro, fígado e coração, e
todo o resto. Em cada um de nossos órgãos, as células estão
constantemente se renovando – algumas com maior rapidez

109
do que outras. As células das paredes do intestino e as células
da medula óssea (que produzem as células sanguíneas) “re-
ciclam-se” mais rápido do que as células dos ossos e nervos.
Mas elas estão todas programadas para se multiplicar um de-
terminado número de vezes, e não mais.
Um fator crítico para essa programação é o telômero.
Trata-se de uma estrutura no final de cada cromossomo. Te-
mos 23 pares de cromossomo e, toda vez que uma célula é
renovada, os cromossomos se alinham e se dividem, para pro-
duzir mais duas células, iguais ao seu pai. O problema é que,
para se dividir, os cromossomos perdem um pequeno pedaço
do telômero. Conforme nos tornamos mais velhos, nossos te-
lômeros ficam cada vez mais curtos, até que nada mais sobra
deles. Sem o telômero, a célula não pode mais se reproduzir,
e morre – e nós também.
Assim, podemos descobrir com precisão quanto tempo
provavelmente viveremos medindo o comprimento de nossos
telômeros no nascimento. Quanto mais longos forem, mais
tempo viveremos. Algumas pessoas estão programadas para
morrer por volta dos 70 anos, outras aos 90. Quer saber como
vai ser para você? Não, eu sabia que não. Até onde sei, nin-
guém está medindo regularmente o comprimento dos telô-
meros atualmente – mas ficarei surpreso se isso não acontecer
no futuro.
De qualquer modo, há um pequeno porém em confiar
no comprimento do telômero para prever a longevidade. Ao
se renovarem, as células algumas vezes cometem erros, e os
novos cromossomos não ficam perfeitos. Essa é uma das ma-

110
neiras pelas quais o câncer começa, portanto você pode ter
um telômero longo, e mesmo assim morrer antes do que de-
veria por causa de um “erro de transcrição” (o nome técnico
desse tipo de erro). É duro ver que estamos programados para
morrer seja de velhice, porque nosso cromossomo ficou sem o
comprimento necessário, seja de câncer, porque a replicação
de nosso cromossomo foi defeituosa. Mas a vida é assim – e
há muita pesquisa sendo desenvolvida nessas duas áreas. O
interessante é que, tenho a impressão, os que pesquisam esses
problemas são uma geração de pessoas mais velhas do que o
usual. Eu imagino por que.

O comprimento de nossos telômeros é transmitido fami-


liarmente? Será que herdamos de nossos pais a tendência
a viver mais?

Tudo depende de seu pai, não da sua mãe. O comprimento


do telômero parece ser transmitido de pai para filho (ou fi-
lha), e a mãe é em geral irrelevante nesse sentido. Esse foi o
resultado de uma pesquisa realizada na Suécia, mas acredito
que os suecos não são diferentes dos demais.
Eles também descobriram que os cromossomos de es-
perma “mais velho” (ou seja, de esperma de um homem mais
velho) possuem telômeros mais longos do que os de esperma
“mais novo”. Assim, parece provável que, quanto mais velho
for o pai de uma pessoa quando esta é concebida, mais longos

111
serão os telômeros dela, e portanto mais tempo provavelmen-
te ela viverá. Até aqui, é tudo teoria, mas se trata de boa ciên-
cia. Portanto, se você quer prever o quanto vai viver, dê uma
olhada no lado paterno da sua árvore familiar e esqueça da
mãe. Mas lembre-se de que houve várias influências na vida
e na morte das gerações passadas (e das atuais) que não têm
nada a ver com a hereditariedade. Seu pai pode então ter sido
programado para uma vida bem mais longa do que a que ele
realmente teve.

Um homem pode tomar injeções para fazer seu peito dar


leite?

Como pai, eu teria adorado ser capaz de compartilhar esse


dever de alimentar um bebê no peito, mas acho difícil.
Sim, seria possível aplicar injeções num homem para que
ele tivesse seios operantes como os da mulher. Primeiro,
ele precisaria tomar estrogênio e progesterona para de-
senvolver os seios, e depois prolactina para acionar a pro-
dução de leite. É quase certeza que iria funcionar, mas
acho que isso ainda não foi tentado em seres humanos.
A razão é que existe um pequeno inconveniente. As inje-
ções de hormônio teriam um poderoso efeito prejudicial
aos hormônios masculinos. O potencial amamentador per­
deria sua virilidade e seu interesse sexual, assim como seu
desejo. Seria com certeza um anticoncepcional muito efi-

112
caz – o bebê não poderia esperar por um irmãozinho. E
poderia haver um pouco de desacordo conjugal. Mas, tam-
bém, o que importa isso, desde que o papai cumpra com
sua parte na amamentação?

Por que as mulheres vivem mais?

O que as mulheres achariam se eu dissesse que é porque nós


homens cuidamos de atender todos os seus caprichos, prote-
gê-las do estresse e das preocupações durante toda a sua vida,
e que morremos mais cedo devido ao fardo adicional que isso
representa para nós? Vocês acreditariam nisso? Provavelmen-
te não, mas não custa tentar. Infelizmente, nós, pobres ma-
chos, costumamos morrer mais cedo do que vocês robustas
mulheres porque nascemos com uma grande desvantagem.
Aquele tal cromossomo Y que nos diferencia de vocês mulhe-
res carrega pouco mais do que cromatina sexual (a proteína
que determina que temos nossos penduricalhos). É uma des-
culpa pequena para um cromossomo decente. Por outro lado,
as mulheres têm dois cromossomos X, resplandescentes, com
uma série de benesses além das proteínas sexuais. Isso lhes
dá uma vantagem numa série de questões – vocês têm mais
recursos em seu sistema imunizador e ficam imunes a uma
série de doenças. E é esse cromossomo X de vantagem que
provavelmente explica por que geralmente vivem mais do que
nós – quando, é claro, conseguem sobreviver na velhice – cer-

113
ca de cinco anos. Um pouco desses anos adicionais depende,
também, mais do estilo de vida do que da hereditariedade.
O casamento parece ajudar ambos os sexos a viver mais
tempo: homens casados vivem em média sete anos mais do
que os solteiros, e mulheres casadas dois anos a mais do que
as não casadas. Isso sugere que talvez os homens ganhem um
pouco mais da vida marital do que as mulheres. Mas se você,
como mulher, realmente quer viver mais tempo, entre para
um convento, e quanto mais cedo melhor. Particularmente
em Minnesota. Um estudo de 2006 destacou as freiras de
Minnesota como a comunidade mais longeva. Talvez seja
porque elas riem um bocado. Outro aspecto da vida longa, ao
que parece, é um bom senso de humor, e dar muitas risadas.
Você acha isso estranho por se tratar de freiras? Não é o que
diz a minha experiência – tive o privilégio de cuidar de duas
comunidades de freiras, e elas são o máximo.

Por que eu continuo juntando felpas azuis no meu


­umbigo?

O umbigo é um órgão muito negligenciado. Sua única utili-


dade termina com o nascimento. Por isso, as pessoas tendem
a ignorá-lo, a ponto de permitirem que acumule detritos, às
vezes durante anos. É claro que as pessoas tomam banho, mas
ao ensaboarem a barriga esquecem de limpar esse recesso (ou
é uma fenda?). Com o passar dos anos, o vão vai sendo preen-

114
chido por restos sólidos de pele, suor, material que se despren-
de de roupa íntima, até fragmentos de sabão – e eles podem
se solidificar e ficar duros como pedra. Uma das tarefas cen-
trais de cirurgiões novatos ao “prepararem” a pele do abdome
para uma cirurgia é desencavar esses restos petrificados, para
evitar que a infecção se espalhe a partir deles para o corte,
durante a operação. Existe até um nome para isso – litotomia
umbilical –, que ficou conhecido por ser usado como uma
“pegadinha” nas perguntas de provas finais de medicina. Às
vezes ocorrem infecções no umbigo por um germe que pro-
duz uma colônia de coloração azul, o chamado Pseudomonas
pyocyaneus. É uma cor azul linda, mas o germe não é lá mui-
to agradável. Um sabonete antisséptico resolve o problema.

Por que os aspargos deixam meu xixi com cheiro forte?

Não são só os aspargos. Comer certos legumes deixa o xixi com


cheiro mais forte. Com certeza você notou isso tam­­bém ao co-
mer frutos do mar – como mariscos ou peixes gordurosos. A
cerveja deixa o cheiro mais forte, quando você se livra de seus
resíduos químicos. É isso que compõe esses cheiros – resíduos
químicos das substâncias que tornam sua comida tão saboro-
sa antes de mais nada. Seu aroma não é necessariamente tão
atraente depois que a comida é atacada pelos seus intestinos,
fígado e rins. É tudo uma questão de como você processa aqui-
lo que come depois de tê-lo digerido. Seu fígado transforma o

115
alimento nas substâncias que você precisa – proteínas e gor-
duras, e combinações delas, além de glicose – para continuar
a ter uma existência saudável. O processo produz necessaria-
mente alguns resíduos, e os mais voláteis, que são solúveis em
água, são concentrados, e depois excretados pelos seus rins.
Volte sua mente para os seus anos escolares, e para todos aque-
les cheiros, bons e ruins, que seu professor de química costu-
mava criar nas aulas de química orgânica no laboratório. Eles
vinham dos aldeídos e cetonas – substâncias que pairavam no
ar como perfumes – ou gases. Depois que nosso fígado lidou
com aspargos, alho, camarões e coisas do tipo, o que sobra para
o rim processar e transformar em urina são aldeídos e cetonas.
Dissolvidos na urina dentro do corpo, elas não alcançam nossas
narinas. Quando liberadas no ar no banheiro, a história muda.
Não é ruim que a urina tenha cheiro forte. Às vezes,
um cheiro diferente da urina pode ser um sinal inicial de
alguma doença – e por isso os médicos de antigamente se
preocupavam tanto em avaliar o cheiro. O exemplo clás-
sico é o cheiro doce de acetona (parecido com o de pêra),
que pode ser o primeiro sinal de diabetes. Por isso, se sua
urina começar a apresentar um cheiro diferente, e você não
comeu nada fora do usual, talvez seja uma boa idéia levar
uma amostra para exame. Felizmente não temos mais de
cheirar (ou provar!) a urina – contamos hoje com sofisti-
cados testes bioquímicos que fazem esse trabalho por nós.

116
Por que algumas pessoas têm um terceiro mamilo?

Nas primeiras semanas de nosso desenvolvimento humano


após a concepção, todos nós passamos por uma série de mu-
danças. Uma delas é o desenvolvimento de uma “linha do
mamilo”, que corre de cima para baixo de cada um dos lados
do peito e do abdome, aproximadamente do meio da claví-
cula, descendo até a metade da virilha. Espaçada de manei-
ra bastante uniforme ao longo dessa linha fica uma série de
mamilos, de quatro a seis de cada lado. Conforme crescemos
e vamos assumindo uma forma mais humana, as células dos
mamilos adicionais obedecem a uma mensagem embutida de
“cometer suicídio”, mais ou menos como fazem as células da
cauda de um girino quando se desenvolvem para dar origem
a um sapo (é o mesmo processo, denominado apoptose). Na
maioria das pessoas sobrevivem apenas os mamilos que ficam
na posição em que deverão estar quando adultas. Mas nada
na natureza está escrito na pedra e, assim, para uma pequena
parte das pessoas, uns poucos mamilos adicionais resistem à
apoptose. Daí a ocasional preservação de um, dois ou mesmo
mais mamilos adicionais. Mas não sei de ninguém cujos ma-
milos adicionais tenham produzido leite ou estejam associa-
dos a seios que se pareçam com os de uma mulher.

117
O tamanho do seu chapéu tem a ver com o do seu
­c érebro?

Não, não tem. Posso garantir isso pessoalmente. Tenho uma


cabeça relativamente grande, e o tamanho de chapéu que eu
uso é o 7 polegadas e três quartos. Como sou um pouco arro-
gante, obviamente julguei que isso indicava que eu tinha um
cérebro grande. Até que me envolvi num acidente de carro
e precisei de radiografia do crânio. Esta mostrou que os os-
sos do meu crânio eram mais grossos do que o usual, e essa
parte adicional explicava o fato de ele ser maior. O tamanho
do meu cérebro era médio, para minha decepção. E repito:
o tamanho do cérebro não é importante – veja a resposta à
pergunta seguinte.

O cérebro dos homens é maior que o das mulheres?

Na média, sim, mas essa não é a medida que importa. Exis­­


tem diferenças consideráveis entre o cére­bro do homem e o
da mu­lher. Os homens não vão gos­tar dessa resposta, mas,
em todo caso, lá vai.
O detetive Hercule Poirot que me desculpe, mas nós
homens devemos aceitar que as mulheres têm mais “peque-
nas células cinzentas” na parte frontal do cérebro (o “córtex
frontal”) e também conexões mais complexas e numerosas
entre as células cinzentas do que os homens. O cérebro das

118
mulheres tem também um fluxo sanguíneo maior pelo córtex
frontal do que o dos homens. Todas essas diferenças falam a
favor do fato de que, nessa parte do cérebro, as mulheres estão
em vantagem. O córtex frontal é a parte do cérebro que usa-
mos para formular julgamentos e tomar decisões. Portanto, o
cérebro da mulher é mais eficiente, e melhor no conjunto.
Desculpe, senhores, quanto a isso não há o que discutir.

Qual a origem da crença antiga de que as ruivas têm chei-


ro diferente?

A idéia de que as ruivas têm um cheiro diferente das outras


mulheres (ninguém está nem aí com o cheiro dos ruivos...)
vem do francês Augustin Galopin, que escreveu Le Parfum
de La Femme, em 1886. Ele tinha a exótica teoria de que as
ruivas possuíam o aroma mais forte entre todas as mulheres, e
que cheiravam a âmbar (morenas, segundo ele, tinham cheiro
de ébano, e as loiras um perfume mais delicado de âmbar e
violeta).
Isso me confunde. O âmbar é um fóssil, pelo amor de
Deus! Como é que pode ter cheiro, e como é que as ruivas
podem ter esse cheiro? Mesmo assim, aqui estamos nós, 120
anos mais tarde, ainda discutindo o assunto.
Para esclarecer melhor a questão, pessoas ruivas dife-
rem bioquimicamente das demais apenas numa coisa: não
conseguem produzir melanina na sua pele. Elas têm uma va-

119
riação no gene que fabrica melanina, de modo que produzem
um pigmento vermelho em vez dela, chamado feomelani-
na. Isso as torna mais suscetíveis que o normal a câncer de
pele, o que não tem nada a ver com o seu cheiro corporal. A
composição do seu suor – das axilas, virilhas ou do resto do
corpo – não apresenta nenhuma diferença em relação ao das
pessoas não ruivas. Será que as ruivas que você conhece não
usam uma linha diferente de perfumes e loções para o corpo?

Quanto à questão do cheiro do corpo, por que às vezes


tenho um cheiro terrível e outras um cheiro gostoso?

O cheiro do nosso corpo é composto por uma combinação de


coisas. O que você comeu na noite anterior interfere – subs-
tâncias voláteis do alho e da cebola passam para o seu suor.
Você andou emocionalmente agitada nos últimos tempos, se-
xualmente excitada, com raiva, ansiosa? Nesse caso, as glân-
dulas nas axilas, virilhas e as menores nas suas costas podem
ter estado hiperativas, e produzindo aromas mais fortes do
que o do suor normal. Você tem tomado banho regularmen-
te? Se não, é provável que bactérias e fungos produzam mau
cheiro. Num dia normal, com uma refeição comum na noite
anterior, sem nenhuma excitação óbvia e um banho antes de
sair de casa, o suor não deverá ter cheiro nenhum. Afinal, ele
é apenas uma solução de água e sal.

120
Pode existir um estado de suspensão da vida? Uma pes-
soa ser mantida viva indefinidamente sem que o coração
pulse e sem respirar, e depois trazida de volta à vida nor-
mal, sem danos?

A resposta imediata a essa pergunta, dada sem pensar, seria


não, é claro. Mas espere um pouco. Em janeiro de 2000, a
revista Lancet relatou o caso de Anna Bagenholm. Ela havia
caído de cabeça numa fenda de um rio congelado, durante
um esqui cross-country, e só foi encontrada e tirada da água
oitenta minutos mais tarde. A temperatura do seu corpo es-
tava mais de 20 graus abaixo da normal. Não havia pulsação
cardíaca audível e nenhum movimento respiratório percep-
tível. Ela foi levada de helicóptero até um hospital, onde seu
sangue foi removido, aquecido e reintroduzido em suas veias.
Depois de sessenta dias sob cuidados intensivos, ela se recupe-
rou completamente sem seqüelas de longo prazo.
Esse foi um caso excepcional de sobrevivência? Ou trata-
se de um mecanismo que existe em todos nós? Hasan Alam,
traumatologista do Hospital Geral de Massachu­setts, acha que
esse mecanismo poderia ser usado para salvar muitas vidas.
Ele levou a temperatura corporal de porcos anestesiados até 10
graus Celsius (o normal é 37), retirou todo o seu sangue, ope-
rou-os de múltiplos ferimentos graves enquanto eles estavam
nesse estado de morte aparente, e depois fez outra transfu-

121
são para reintroduzir o próprio sangue dos animais, aquecido.
Quando a temperatura de seus corpos atingiu 25 graus, os
corações voltaram a bater, e os animais que pareciam estar
mortos retornaram à sua vida normal.
O doutor Alam vê isso como um passo para ajudar pa-
cientes vitimados por traumas muito sérios em suas primeiras
horas. É possível realizar reparações muito mais longas e intrin-
cadas se o cirurgião não está pressionado pela necessidade de
manter o paciente bem oxigenado e com suprimento de sangue
– num trauma severo, em geral é comum que o paciente precise
de transfusões que chegam a três vezes o volume de sangue de
seu corpo. Ele acredita que a melhor temperatura para man-
ter uma animação totalmente suspensa é de 10 graus. Abaixo
de 5 graus, as células do corpo começam a morrer. Ele espera
fazer testes em humanos dessa sua técnica utilizada para por-
cos, mas se depara com uma dificuldade pouco comum. Os
melhores pacientes para os testes seriam pessoas que perderam
muito sangue, estão gravemente feridas, e que irão morrer em
muito pouco tempo sob circunstâncias normais. Por definição,
elas não serão capazes de dar seu total consentimento para se
sujeitarem a um teste. E esse consentimento é essencial para
qualquer nova pesquisa médica. Para a equipe de pesquisa do
doutor Alam, isso é um impasse, que só pode ser solucionado se
a comunidade concordar previamente em participar, mais ou
menos como ocorre hoje com a doação de órgãos.

122
Usar o cérebro pode de fato deixar a pessoa mais inteligente?

Por que você acha que os taxistas de Londres são tão espertos?
Eles nunca perdem a chance de uma conversa inteligente, e um
deles foi o campeão do jogo Senha no Reino Unido. Provavel-
mente isso se deve a ter de adquirir “o conhecimento”. São ne-
cessários muitos anos e um bocado de treino de memória para
passar no teste e se tornar motorista profissional em Londres.
A doutora Eleanor Maguire e sua equipe na Universi-
dade College, que fizeram um estudo especial sobre os ta-
xistas de Londres, mostraram que na média seu cérebro tem
um hipocampo maior que o normal. O ainda mais convin-
cente é que, quanto mais tempo eles guiam, maior seu hi-
pocampo. Como essa região do cérebro está muito envol-
vida na memória e no raciocínio, ela é um bom indicador
de que treinar o cérebro em tarefas complexas de memória
deixa você mais inteligente. Devo admitir que em minhas
visitas a Londres sempre apreciei o bate-papo no táxi. Com-
pare isso, por exemplo, com os motoristas de outras gran-
des capitais, que não precisam passar por um treinamento
tão rigoroso. Seria muita ousadia mencionar Nova York?

Ser canhoto é uma vantagem ou uma desvantagem em


relação a ser destro?

Há duas gerações era uma nítida desvantagem. Os professo-

123
res forçavam as crianças canhotas a usarem a mão direita, a
ponto de serem cruéis com elas – embora houvesse desvanta-
gens práticas óbvias: escrever à tinta com a mão esquerda ge-
ralmente fazia borrar a página; isso ocorria conforme a mão ia
seguindo a tinta ao longo da página, em vez de se adiantar a
ela. Felizmente, esse preconceito acabou e os canhotos podem
desenvolver naturalmente todas as suas habilidades manuais.
Se o sentido da pergunta é saber se os canhotos têm um tipo
diferente de cérebro em relação aos destros, então a resposta
provavelmente é “não”. Os estudos mais recentes dividem as
pessoas não mais entre destros e canhotos, mas em pes­soas
que têm lateralização forte ou mista. Você pode descobrir
qual o seu tipo anotando que mão utiliza para as tarefas do
dia-a-dia, como escrever, atirar coisas, usar tesouras, escova
de dente, faca (sem o garfo) e colher. Agora pergunte-se se
essa é também a mesma mão que você coloca em cima ao
segurar uma vassoura ou uma pá, ou com a qual pega um fós-
foro ao riscá-lo ou a tampa de uma caixa ao abri-la. Assinale
para cada uma dessas atividades que mão você “sempre” ou
“geralmente” usa. Pessoas com lateralização forte marcarão
a mesma mão (seja ela a esquerda ou a direita) para todas as
tarefas, e na maior parte das vezes dirão que a utilizam “sem-
pre”. Pessoas de lateralização mista alternarão as mãos nas
diferentes tarefas. O interessante nesse sistema de pontuação
é que apenas 2 por cento da população é de canhotos com
lateralização forte.
Estudos de lateralidade desfizeram, por exemplo, o mito
de que as pessoas canhotas são mais criativas e os destros mais

124
lógicos: aparentemente elas não diferem muito. No entanto,
existem diferenças entre os de lateralização forte (sejam des-
tros ou canhotos) e os de lateralização mista. Estes últimos
parecem ter uma memória mais acurada do que os de late-
ralização forte. Se forem dedicados à música, os de latera-
lização mista gravitarão mais em torno de instrumentos de
cordas e os de lateralização forte para a bateria e o teclado.
Alguns pesquisadores do cérebro sugerem tentativamente que
isso ocorre porque os de lateralização mista têm uma conexão
maior entre as duas metades do cérebro (por uma estrutura
chamada corpo caloso). Eles podem, portanto, lidar melhor
com tarefas que exigem a coordenação do cérebro todo. Ou-
tros pesquisadores estão menos convencidos disso: eles dizem
que as influências sociais e culturais das pessoas são bem mais
atuantes do que a dimensão das conexões entre as duas me-
tades do cérebro para determinar seu caráter e seus talentos.
Imagino se alguém chegou a comparar, digamos, violinistas
e percussionistas, quanto à perda de memória em idade avan-
çada. Isso abriria uma discussão. Nunca ouvi falar de alguém
que tenha de fato feito um estudo desses, mas daria uma boa
tese de mestrado.

O DAT, distúrbio afetivo transitório, existe mesmo? E é


verdade que a melhor maneira de curá-lo é tomar sol?

Nos países do hemisfério norte, os médicos dizem que a car-

125
ga de depressão aumenta em janeiro (depois dos feriados de
Natal e ano-novo) e assim fica até fim de março (início da
primavera nesse hemisfério). Se o tempo na primavera e no
começo do verão continua ruim, nublado e com chuva, então
o DAT piora.
Lembro de um mês de maio em que chovia todo dia.
Em meus anos de prática médica tive o maior índice de con-
sultas por depressão naquele mês – superando todos os janei-
ros e fevereiros de longe. Mas não me pergunte a respeito de
falta de sol e depressão. Pergunte à boa gente de Rattenberg,
no Tirol. Essa vila fica no fundo de um vale, com pouco sol o
ano inteiro. Atualmente, numa tentativa de erguer seu ânimo
coletivo, eles estão colocando espelhos gigantes nas monta-
nhas do lado oposto do vale para que o sol refletido chegue
até lá. Os espelhos acompanharão o sol, de modo que as pes-
soas do vilarejo (que supostamente estão de baixo astral neste
momento) receberão seus raios do amanhecer até o anoitecer.
Será que de repente eles ficarão uns austríacos mais anima-
dos? Será que os médicos deles também terão uma fase mais
feliz? Como colega, espero que sim.

Como é que os pacientes sobreviviam a operações na épo-


ca em que a anestesia ainda não havia sido inventada?

O segredo era o seguinte: os cirurgiões eram tão rápidos, que


a operação terminava quase antes de que o paciente tivesse

126
tempo de reagir a ela. Conta-se que durante uma operação
realizada por um certo professor Langenbeck, um cirurgião
alemão no início do século 19, um de seus colegas se afastou
por um momento da mesa de operação para dar uma fungada
de rapé (imagine isso numa sala de cirurgia atual) e perdeu
completamente uma amputação de braço. Tem também uma
história extravagante do professor Ashley Cooper, realizando
uma operação na Inglaterra quase na mesma época do pro-
fessor Langenbeck na Alemanha. Ao amputar a perna de um
homem à altura do meio da coxa, com movimento circular de
sua faca curva de amputação, ele “cortou fora a parte de trás
do avental de um assistente e dois dedos de um outro”.

127
JORGINHO, O CURIOSO

F elizmente, o relacionamento entre médicos e os filhos de


seus pacientes é bastante formal. No consultório, geral-
mente as crianças que estão lá para serem examinadas são
tranqüilas, um pouco assustadas e tímidas. Elas não incomo-
dam e, pelo final da consulta, médico e criança geralmente
são bons amigos. A ameaça são as crianças que vêm junto
– um irmãozinho ou uma irmãzinha menor –, que sabem que
não estão lá para responder perguntas, para serem examina-
das ou testadas. Elas têm de estar presentes porque a mamãe
não arrumou ninguém para tomar conta delas (geralmente é
surpreendente que as mães não consigam ninguém) e então
podem aprontar a maior bagunça na sala.
“Pra que serve isso?”, a criança pergunta, segurando na
mão um espelho vaginal (e você não sabe dizer como é que
foi parar na mão dela porque estava examinando o ouvido
do seu irmãozinho). Depois que aparelhos de medir pressão,

129
estetoscópios, martelos de joelho e pilhas de anotações des-
pencaram pelo chão, o pequeno anjo vira-se para você e per-
gunta: “Como é que meu irmãozinho foi parar na barriga
da mamãe?” E em seguida dispara: “E por onde é que ele
vai sair?” Você sabe que ele conhece perfeitamente bem as
respostas para ambas as questões, e que está perguntando só
para ver você se contorcer de raiva. Mas sorri com doçura, não
responde, e procura abreviar ao máximo o resto da consulta.
É nessa hora que você gostaria de demonstrar exatamente o
que poderia fazer com o tal espelho. Mas se contém porque,
na verdade, gosta muito da sua profissão. O lado positivo de
Jorginho, o curioso, é que às vezes ele tem perguntas que re-
almente fazem você pensar.

Do que é feita a meleca do nariz?

Suponho que deva responder essa pergunta, embora ela ofen-


da minha sensibilidade literária. A mucosidade nasal, para dar
à meleca do nariz o seu devido nome, é o resultado de uma
batalha titânica entre os bandidos (bactérias e vírus) e os mo-
cinhos (nosso maravilhoso sistema imunizador) que é travada
quase todos os dias de nossas vidas. Respiramos as gotículas
das tosses e espirros de outras pessoas, por meio das quais os
bandidos desferem seus ataques, e elas se instalam na super-
fície interna de nosso nariz. O nariz tem uma impressionante
eficiência em “varrer” o ar dentro dele para as “escovas” que

130
sobressaem em suas passagens – de modo que são poucas as
gotículas e as partículas de poeira que conseguem passam e ir
direto para os pulmões. Quando elas pousam sobre as super-
fícies nasais internas, nossa primeira linha de células de defesa
produz mucosidade – uma espécie de grude – dentro da qual
existem substâncias químicas que reconhecem e recobrem os
germes. Elas também enviam uma mensagem química que
ativa a segunda linha de células de defesa para que venham
até o local e combatam os invasores. As células reconhecem
o inimigo dentro de sua camada de substâncias químicas, e
começam a engoli-lo. Na batalha, há baixas de ambos os la-
dos, o que deixa uma bagunça de células mortas e germes que
devem ser limpados pela mucosidade.
As melecas do nariz são os detritos de uma batalha
que você provavelmente não sabia que estava sendo travada
todos os dias dentro de seu nariz. Só quando ele se torna
uma terrível zona de guerra – como num resfriado – é que
você sente as conseqüências, em seu nariz coçando e irritado.

O que faz a gente sentir de repente um calafrio, como


quando “alguém anda por cima da nossa cova”?

Você já viu o pêlo de um gato arrepiar, por exemplo, quando


ele vê um cachorro por perto? Os pêlos todos ficam em pé,
em ângulo reto exato com a superfície da pele. Ou já notou
como o corpo de um pássaro parece mais gordo nos dias mais

131
frios do inverno, porque todas as suas penas estão estufadas?
Nosso repentino “calafrio” é um resquício dessas reações: elas
remontam à nossa ancestralidade, a épocas em que estávamos
lutando como pequenos mamíferos peludos como um rati-
nho, tentando escapar dos dinossauros. E mesmo a épocas
anteriores a essa.
É claro, não temos mais pelagem, mas ainda pêlos fi-
nos por todo o corpo, que conseguimos distinguir com di-
ficuldade. Quando estamos relaxados, os pêlos ficam deita-
dos em cima da pele. Na base de cada pêlo há um músculo
cujo trabalho é pegá-lo e mantê-lo ereto, para que fique em
pé, como acontece com o pêlo do gato e as penas do pás-
saro. No passado distante, quando o corpo das pessoas era
coberto por densa pelagem, isso era um importante meca-
nismo de defesa. O pêlo arrepiado fazia-as parecer maio-
res, desestimulando seus inimigos. E, provavelmente mais
importante, a cobertura mais grossa retinha mais ar quen-
te junto ao corpo, protegendo-as do frio. Quando sentimos
frio hoje, ainda ficamos com a pele arrepiada – cada pon-
tinho é um dos músculos levantando os restos de um pêlo.
Então por que ainda sentimos esses calafrios pela espinha,
agora que nossos pêlos são pequenos demais para servirem
para alguma coisa? É porque ainda temos o sistema nervoso,
que entra em ação quando o corpo percebe alguma ameaça – o
sistema nervoso simpático. E ramificações do sistema simpá-
tico servem cada um dos músculos dos pêlos. Por isso, quan-
do temos uma leve surpresa, ou somos atingidos repentina-
mente por uma corrente de ar frio, ou percebemos consciente

132
ou inconscientemente que estamos diante de alguma espécie
de ameaça primária, nosso sistema simpático ainda entra em
ação. Uma dessas ações é fazer levantar nossos pêlos, todos,
quase ao mesmo tempo, e portanto sentimos uma corrente de
pêlos se erguendo descendo pelas nossas costas. Somos como
o gato quando vê o cachorro. Dura alguns segundos e, quando
o estímulo termina, os nervos voltam à sua atividade básica.

Por que batemos os dentes quando estamos com frio?

Esse é um cenário diferente do anterior, quando “alguém an-


dava por cima da nossa cova”. Quando a temperatura do nos-
so corpo cai, precisamos gerar calor para mantê-lo dentro da
estreita faixa de 1 grau em torno dos 37 centígrados. Fazer os
músculos se contraírem e relaxarem rapidamente gera calor de
modo muito eficiente – daí o tremor – e os grandes músculos
da mandíbula que fazem os dentes bater são perfeitos para isso.

Por que choramos?

Provavelmente você nunca sentiu o desconforto de estar com


o olho seco, caso contrário não faria essa pergunta. Para que
seu olho funcione, a superfície deve estar úmida o tempo in-
teiro. Por isso, as glândulas lacrimais acima e abaixo do canto

133
externo das pálpebras devem produzir constantemente lágri-
mas para manter a superfície coberta por um fluido aquoso.
As pálpebras piscam para que as lágrimas se distribuam por
todo o olho. Depois, as lágrimas são drenadas nariz adentro
por outro duto, cuja entrada fica na parte interna da pálpebra
inferior, perto do nariz. Se as suas lágrimas secam, o olho fica
vermelho e muito irritado, e propenso a se infeccionar. Ale-
xander Fleming estava pesquisando as propriedades antibióti-
cas das lágrimas (uma substância chamada lisosima) antes de
chegar à descoberta da penicilina.
Todos sabemos o que nos faz chorar – dor, pesar, triste-
za, ansiedade, as emoções desagradáveis. Essa é a parte da per-
gunta mais fácil de responder. Mas, em certas circunstâncias,
saber qual o propósito ou o benefício de chorar é mais difícil
de compreender. Quanto ao aspecto fisiológico da resposta,
podemos dizer que a produção de lágrimas é o resultado da
estimulação do sistema nervoso simpático, que está em ação a
todo vapor em tais circunstâncias. Assim, as lágrimas são ape-
nas um acompanhamento acidental para as demais reações
que estão acontecendo em outras partes do corpo. O psicólo-
go iria mais longe e sugeriria que chorar é uma demonstração
exterior muito pessoal da emoção que você sente nas circuns-
tâncias em que se encontra. Se isso é visto por seus amigos e
familiares, fica entendido que constitui algo que requer pieda-
de, simpatia e atenção. É a reação fisiológica perfeita para obter
conforto numa hora em que ele é muito necessário. A maneira
como isso teve início deve remontar a milhares de anos, quan-
do o rosto humano começou a ser capaz de expressar emoções.

134
Se eu tiver orelhas maiores, vou conseguir ouvir
melhor?

Por que temos orelhas fixas dos lados da nossa cabeça? Elas
não são iguais às orelhas de alguns animais, como os morce-
gos, que as utilizam com fins direcionais. Algumas poucas
pessoas conseguem mexer as orelhas, mas sem nenhum pro-
pósito útil. E elas têm um papel bem pequeno em captar as
ondas sonoras – pessoas que nascem com orelhas bem peque-
nas ou com quase nenhuma orelha externa conseguem geral-
mente ouvir bem mesmo assim. Uma vez que o som alcança
o orifício do ouvido, ele é canalizado ao longo de um tubo em
direção ao tímpano, onde o processo de audição realmente
começa. A forma externa dos ouvidos não faz muita diferença
nesse processo.
Um bom exemplo de por que ele não faz diferença
pode ser encontrado em animais marinhos. As focas não têm
ouvidos externos – os leões-marinhos têm orelhas bem sa-
lientes. Não há comprovação de que a falta de orelhas torne
as focas menos capazes de ouvir do que os leões-marinhos.
Entendemos muito bem o que acontece depois que o som
alcança o tímpano – ele é amplificado pelos três ossículos no
interior da orelha média, e depois recolhido e selecionado na
orelha interna, que transforma o som em atividade elétrica
ao longo do nervo auditivo até alcançar o cérebro, que en-

135
tão interpreta o som adequadamente. O pavilhão auditivo
desempenha um papel bem pequeno nesse processo. Portan-
to, devo concluir que a função mais importante das minhas
orelhas externas é meramente manter meus óculos no lugar.

Por que sinto um pouco de enjôo quando coloco meu


dedo no umbigo?

Essa é novidade para mim, mas há algumas razões possíveis.


John L. Sullivan e Harry Houdini, se estivessem aqui, pode-
riam ajudar a responder. Mas eles já estão agora bem além de
seu prazo de validade.
Minha sensação pessoal a respeito dessa relação entre
a manipulação do umbigo (por falta de melhores palavras)
e sentir enjôo é que você pode estar estimulando seu plexo
solar. Este é um feixe de nervos que fica no verso do abdo-
me, logo atrás do umbigo. Ele controla os principais movi-
mentos do seu intestino e o processo de digestão. Se você o
estimular de modo errado, os músculos do intestino ficarão
bloqueados. Isso com certeza pode fazer você sentir náuseas.

Que história era essa de Sullivan e Houdini?

John L. Sullivan era um campeão mundial de boxe no fi-

136
nal do século 19. Até ele entrar em cena, os boxeadores con-
centravam-se em bater no peito e no queixo do adversário.
Ele desenvolveu o golpe no plexo solar. Um golpe forte no
umbigo paralisava o intestino, e os vasos sanguíneos dentro
do abdome dilatavam-se repentinamente – de modo que o
infeliz oponente de Sullivan não tinha mais fluxo de sangue
do abdome para o coração. O resultado era uma total inca-
pacidade de lutar, e uma vitória por nocaute para o campeão.
Desde a época de Sullivan, todos os boxeadores são treinados
para defender-se contra o golpe no plexo solar, mantendo seus
músculos abdominais tensos durante a luta toda.

E Houdini?

Houdini sabia tudo a respeito do plexo solar e de como se


defender contra um soco no abdome – tanto assim, que desa-
fiou qualquer um a tentar nocauteá-lo, ou mesmo machucá-
lo, por meio de um soco na sua barriga, e ofereceu uma alta
recompensa a quem conseguisse. Muitos tentaram, usando
até martelos e marretas, mas ele sempre se mostrou pronto a
assimilar os golpes.
Até um dia, quando terminava de comer num restaurante
e, ao sair da mesa, um jovem acertou-lhe um soco no umbigo, pe-
gando-o desprevenido, enquanto seus músculos estavam relaxa-
dos e o estômago cheio de comida. O soco derrubou-o e rompeu
seu intestino. Ele morreu três dias depois de peritonite.

137
O VICIADO EM MEDICINA
ALTERNATIVA

R eceio que essa peste que freqüenta as festas seja quase


sempre do sexo feminino. Ela não vem incomodá-lo para
receber algum conselho – longe disso. Está lá para dar-lhe um
bom conselho, e também oferecer-lhe um pouco de sua men-
te. Para ela, os médicos foram seduzidos e afastados do ver-
dadeiro caminho pela indústria farmacêutica e pela ortodoxia
da medicina oficial, e esqueceram dos caminhos de cura da
mãe natureza. Qualquer coisa “natural” deve ser melhor, por
definição, do que qualquer coisa “química”. Então, ela adere
a ervas, dietas vegetarianas e todas as modas alternativas do
momento. Ouvimos sempre uma diatribe a respeito de homeo­
patia, acupuntura, iridologia, reflexologia, reiki, taoís­mo, irri-
gação do cólon, o aspecto holístico das coisas e os benefícios
de orar à mãe terra, ao Sol ou a qualquer divindade mística
(de preferência, oriental). Ela fala longamente sobre os bene-
fícios da equinácea, erva-de-são-joão, gingko biloba, feverfew,

139
óleo de prímula noturna, extrato de ostra da Nova Zelândia,
e vitaminas A, B, C, D, E e K. Se soubesse de mais coisas,
ela com certeza falaria delas também. Sabe tanto a respeito
da maneira que elas funcionam no organismo quanto sobre
a engenharia de um jato jumbo e de como pilotá-lo, mas isso
não interrompe seu discurso.
Ela fala de “campos de energia”, “vibrações” e “au-
ras”, e usa cristais, ímãs e pêndulos para descobrir e até
para curar doenças. Não importa que tudo o que afir-
ma contradiz abertamente as leis da física – ela pode curar
quaisquer doenças desde que você pense positivamente.
E, afinal, se os métodos que ela lhe propõe não dão cer-
to, é culpa sua por não acreditar neles, nunca culpa dela.
Não adianta explicar que os avanços da medicina moderna
ao longo dos últimos trinta anos salvaram milhões de pes-
soas da morte precoce por pressão alta, ataques cardíacos e
infartos, úlceras do estômago, infecções, câncer, leucemia,
linfomas, diabetes, diversas formas de artrite, e têm ajuda-
do as pessoas a tolerarem e sobreviverem a diversas doen-
ças, hereditárias ou de outro tipo. E que os métodos alter-
nativos dela estão aí há milhares de anos sem que façam a
menor diferença para a expectativa e a qualidade de vida.
Ela não vai ouvir. Por isso sugiro que, da próxima vez que sair
de férias, ela tente uma empresa aérea alternativa que produ-
za aviões nos mesmos termos que os defensores da medicina
alternativa fazem suas panacéias. Ela não vai achar a menor
graça, e irá embora, comentando asperamente que não estou
querendo levar a sério o que diz. Na verdade levo pessoas

140
como ela muito a sério. Volta e meia, ao longo dos anos, ve-
nho achando-as perigosas por interferirem na recuperação de
pessoas muito doentes, às vezes prejudicando-as muito. Por
isso, nem ligo se ela vai embora pisando duro.

Comida orgânica é sempre melhor do que a não orgânica?

Não. Não na minha opinião – vou explicar melhor. Primeiro,


as plantas não são totalmente orgânicas. Elas na verdade se
alimentam de material inorgânico. Ou seja, suas raízes cap-
tam minerais inorgânicos – e não orgânicos – do solo em
volta delas. Absorvem potássio, sódio, magnésio, selênio, ni-
tratos, amônia, fosfatos, carbonatos, silicatos e uma série de
outros minerais diretamente de seu entorno. Elas não se im-
portam se esses nutrientes foram colocados à sua disposição
em esterco ou em sacos de fertilizante: na verdade, não têm
um mecanismo pelo qual possam estabelecer distinção entre
eles. Se o magnésio está no solo em volta das raízes, então elas
irão absorvê-lo, não importa se ele chegou até ali por meio de
um sistema chamado “orgânico” ou não. O resultado final é o
mesmo. A cenoura vai continuar sendo cenoura, com a mes-
ma estrutura química, e oferecer o mesmo valor nutricional
tanto se foi cultivada organicamente como não.
Entendo que as pessoas fiquem preocupadas com o ­fa­to
­de que os legumes, frutas e verduras cultivados não organica-
mente possam conter resíduos de pesticidas e praguicidas, e

141
afetar nossa saúde. Por outro lado, os produtos orgânicos po-
dem conter mais parasitas. Ninguém até agora fez um estudo a
longo prazo para avaliar as vantagens e as desvantagens – o que
exigiria analisar amostras de tecidos de pessoas que tivessem
se alimentado organicamente durante anos e compará-las com
os de outras alimentadas com produtos de supermercado. Eu
apostaria que o setor orgânico não correria o risco de fazer isso
– com receio de que os resultados não pendessem para o seu lado.
Nesse meio tempo, desde que, como população, estamos nos
alimentando de comida preparada por métodos modernos,
não houve nenhuma elevação nos problemas de saúde devida
diretamente à escolha desses produtos em lugar dos orgânicos.
A diferença é que comemos demais, e nos tornamos obesos,
mas isso fica fora da discussão entre orgânicos e não orgânicos.
Pelo que entendo de economia de cultivo e de alimentação,
acredito que temos de alimentar o mundo, e precisamos desen-
volver cultivos suficientes para tanto. Será que conse­guiríamos
fazer isso usando apenas métodos de cultivo ­orgânicos?

Vale a pena usar clister de café?

Por que raios alguém quereria enfiar café no seu intestino? O


final do intestino grosso não serve para digerir coisas. É um
órgão de excreção, aliás, muito eficiente, se você deixá-lo em
paz para que realize sua função. Sua parede interna não está
apta a entrar em contato com café. As coisas saem dele – não

142
foi feito para que as coisas entrem. O simples pensamento
de colocar café no reto, depois limpar e enxaguar o tubo, já
deve deixar qualquer um perturbado, tanto de pensar em re-
ceber como em aplicar. Está pretendendo aplicar você mesmo
o clister? Vai acrescentar leite ou açúcar? Não temos papilas
do gosto no nosso reto, e por uma razão muito boa, conside-
rando o material que corre dentro dele. A que temperatura
deve estar o café ao ser inserido? É um absurdo. Se você quer
os benefícios do café, por que não simplesmente tomá-lo?

Tomar leite de soja pode fazer mal?

O leite de soja não é diferente de outros alimentos manufa-


turados, no sentido de que a maioria das pessoas pode tomá-
lo na certeza de que fornecerá os nutrientes padrões (proteí-
nas, gorduras e carboidratos), os mesmos que obteremos de
uma série de outros produtos, como os derivados de leite, por
exemplo. O que ocorre é que as estruturas detalhadas desses
alimentos diferem daquelas dos outros vegetais. Na maioria
das vezes, isso não importa, porque nosso sistema digestivo
quebra essas estruturas e transfere seus “componentes” bási-
cos para o fígado, que então as recompõe nos nossos próprios
tipos de proteínas, gorduras e carboidratos. Os problemas só
aparecem quando o sistema imunizador de algumas pes­soas
(felizmente, bem poucas) encara o material da soja como
“estranho” o suficiente para requerer tratamento especial, e

143
reage de modo violento contra ele. Isso pode causar transtor-
nos digestivos e outros distúrbios de saúde não muito bem
definidos. Assim, para algumas pessoas a soja é um problema,
semelhante ao que o leite é para outras pessoas.
Aquelas que reagem mal ao leite têm dor e inflama-
ção no intestino, porque não possuem as enzimas intesti-
nais capazes de quebrar a lactose, um açúcar do produto.
Então elas recorrem à soja, que não tem lactose. Essa é uma
medida razoável. No entanto, não consigo aceitar bem o
que ocorre no Mediterrâneo. Nessa região há uma propor-
ção bem maior de pessoas com intolerância à lactose do que
no norte da Europa. Mesmo assim, não tenho ouvido fa-
lar que os italianos, gregos e espanhóis estejam se voltando
para o leite de soja. Eles comem uma comida deliciosa, com
muito pouco leite. Será que a cozinha mediterrânea é per-
feitamente adequada a nós, sem se precisar recorrer à soja?

Por que as pessoas nas lojas de produtos naturais sempre


parecem não estar muito bem de saúde?

Em primeiro lugar, por que você acha que elas foram lá?
Pessoas saudáveis não precisam ir a lojas especializadas em
produtos bons para a saúde. Se você já está saudável, não
há nada que precise tomar para ficar mais saudável ainda.

144
Será que o leite realmente provoca câncer?

Quem pensaria que alguém nem mesmo imaginaria uma


pergunta como essa até agora? Esse é o temor lançado por
Heather Mills McCartney e seus amigos na Associação dos
Vegetarianos e dos Vegans (pessoas que procuram viver sem
contribuir para o sofrimento dos animais). Eles proclama-
ram em maio de 2006 que os laticínios são responsáveis por
quase todas as doenças que atingem os seres humanos mo-
dernos, entre elas (cito a partir de seu release à imprensa)
“certos tipos de câncer, doenças cardíacas, diabetes, osteo-
porose e obesidade”. Vou dar os nomes das pessoas que os
apóiam, para que você julgue por si só: são o professor T.
Colin Campbell, da Universidade Cornell, a professora Jane
Plant, descritos como “cientistas de ponta”, e Juliet Gellatley,
fundadora do Viva, a maior organização de vegetarianos e
vegans da Europa. Veja na Internet o tipo de trabalho que
eles realizam, mas leve em conta que têm um desejo comum
– livrar-se de todos os animais de criação e convencer as pes-
soas a se tornarem ao menos vegetarianos, e de preferência
vegans. Prefiro basear meus julgamentos na segurança e nos
benefícios do leite a partir do trabalho de pessoas que estão
menos motivadas por essas crenças pessoais. No momento,
não vejo absolutamente nenhuma razão para abandonar o
leite como elemento nutricional.

145
Será que o estrogênio presente nos modernos suprimen-
tos de água pode nos tornar impotentes?

Até onde consigo compreender, o problema com o estrogênio


não é que esteja em nossa água potável, mas nos efluentes de
esgotos (eles são a conseqüência da excreção pelas mulheres
dos hormônios ingeridos nas pílulas anticoncepcionais). Os
sistemas de tratamento de esgotos não conseguem filtrar os
estrogênios do efluente líquido final, por isso eles alcançam
nossos rios, onde peixes e outras criaturas os absorvem. Isso
é ruim para os peixes machos, porque se transformam em
infelizes semifêmeas e não podem mais procriar.
Mas com o estrogênio na água potável o problema é ou-
tro. Ele não deveria estar presente nela, já que os sistemas de tra-
tamento de água precisam garantir que a potável fique livre de
contaminação. Consultei autoridades responsáveis pela água,
e elas não têm notícia de qualquer problema com esse nosso lí-
quido. E tampouco notei nenhuma falta de interesse por sexo
entre nossa população jovem – aliás, muito pelo contrário.
No entanto, não há dúvida de que, se entrar estrogênio em
nosso suprimento de água, mesmo em pequenas quantidades,
ocorrerão problemas sexuais: homens jovens podem desenvol-
ver seios e ver suas armas encolherem e ficarem frouxas. Nem
eles nem seus parceiros vão achar isso satisfatório. Como pos-
so afirmar isso? Lá nos anos 1960, quando os homens come-

146
çaram a trabalhar pela primeira vez nas linhas de produção
de pílulas anticoncepcionais, inalavam pequenas quantidades
de pó do produto, e apresentaram as modificações que aca-
bei de relatar. As mulheres que trabalhavam nas linhas de
produção também foram terrivelmente afetadas. Muitas delas
se tornaram inférteis – elas inalavam todo mês uma quan-
tidade de pó suficiente para atuar como anticoncepcional.
As empresas farmacêuticas tiveram de desenvolver sistemas a
vácuo nas linhas de produção, além de roupas vedadas para os
operadores, para protegê-los mesmo da mais ínfima partícula
de contaminação – e as coisas voltaram ao normal para ho-
mens e mulheres. Por isso, o menor vestígio de estrogênio na
água potável pode ter sérias conseqüências para a população
em geral.

Será que tomar bebidas à base de iogurte probiótico todo


dia pode melhorar a saúde?

É impressionante, mas pode, sim! A idéia dos iogurtes pro­


bióticos é que as bactérias que eles contêm são similares às
presentes no intestino do bebê de colo, e que estão associa-
das à proteção contra a doença inflamatória do intestino. Elas
também são responsáveis pela soltura dos intestinos que todo
pai que já trocou fraldas alguma vez conhece muito bem.
Uma dúvida levantada pelos especialistas é a respeito de como
a “bactéria boa” dos iogurtes passa pelo ácido do estômago

147
sem ser destruído. Sendo proteínas, em tese elas deveriam ser
digeridas antes de alcançar o intestino grosso, que é onde “fa-
zem seu trabalho”. No entanto, boa parte delas parece de fato
sobreviver e mudar os movimentos do intestino na direção
certa, segundo seus usuários. Mas depois disso é difícil julgar
que diferença elas fazem para a saúde geral da pessoa.
Pesquisadores suecos dizem ter a resposta. Mostra-
ram que pessoas que tomam probióticos faltam menos ao
trabalho do que as que não o fazem, principalmente por-
que têm menos queixas de problemas digestivos e de es-
tômago. Eles dizem que isso não se deve ao fato de essas
pessoas que tomam probióticos serem de alguma maneira
menos propensas a faltar, mas tal coisa é difícil provar. Os
jurados ainda estão reunidos para chegar a uma conclusão.

Os franceses se orgulham de seu serviço de saúde “na-


tural”, mas, quando vou à França e fico doente, parece
que me receitam mais comprimidos e remédios do que na
Inglaterra.

Os franceses sempre tiveram um amor muito maior que nós


pelos remédios. O equivalente francês do nosso sistema de
saúde sempre registrou a prescrição de duas ou três vezes mais
remédios do que aqui. O que os franceses gastam com remé-
dios é pelo menos o dobro do nosso gasto, per capita. Eles
não vêem uma contradição entre a medicina “prescritiva” e

148
a medicina “natural”, considerando que uma complementa a
outra. Tradicionalmente, sempre fomos mais cautelosos em
relação ao que chamamos de “polimedicação” (prescrever
vários remédios ao mesmo tempo), mas parece que estamos
encostando nos nossos vizinhos. Não são só os franceses que
gastam uma fortuna em remédios; basta consultar os gastos
dos alemães (mais altos ainda) e nos Estados Unidos (astro-
nômicos). Os americanos vêm tentando mudar isso, e cada
um dos seus Estados está montando uma forma de medicina
chamada managed care, na qual os médicos ficam limitados
a prescrever a partir de uma lista fechada de remédios conce-
bida por “especialistas”. Isso está causando muita discussão,
mas os custos em elevação provavelmente tornarão a medida
comum, num futuro próximo, em toda parte, inclusive na
França.

Por que não se pode tomar erva-de-são-joão quando se


está usando a pílula?

As pessoas tendem a achar que, sendo um remédio uma sim-


ples erva, é mais seguro e tem efeitos colaterais menos sé-
rios do que um remédio receitado. Isso está totalmente er-
rado. Se um remédio é eficaz, digamos, contra a depressão,
como se diz da erva-de-são-joão, então deve estar provocan-
do uma alteração química no organismo (na verdade, no
cérebro), da mesma maneira que o faria um antidepressivo

149
receitado. Mas a erva-de-são-joão não atua somente no cé-
rebro. No fígado “dispara” as enzimas produzidas por esse
órgão para quebrar os hormônios da pílula anticoncepcio-
nal. Isso significa que os hormônios da pílula são destruídos
mais depressa que o usual, provavelmente bem antes que o
dia termine, deixando a mulher desprotegida em relação à
ovulação, e portanto à concepção. Assim, se você combina
a erva-de-são-joão com a pílula, corre o risco de engravidar.
Mas essa interação com a pílula anticoncepcional é apenas a
ponta do iceberg da erva-de-são-joão. A seguir temos a lista do
British National Formulary (um receituário que é a “bíblia”
dos médicos ingleses), onde aparecem as drogas cuja ação é
alterada, bloqueada ou realçada pela erva-de-são-joão – e tra-
ta-se de uma lista impressionante para uma “erva”:

• antibacterianas – eritromicina (não durante e por duas


semanas após a erva-de-são-joão)
• anticoagulantes – reduz os efeitos da warfarina
• antidepressivos – efeitos muito aumentados e efeitos
colaterais
• antiepilépticos – reduz seu efeito
• antimalária – reduz sua proteção contra a malária
• drogas antipsicóticas (receitadas para esquizofrenia e
mania) – reduz o efeito
• antivirais – o BNF lista dez antivirais (usados princi-
palmente para HIV e herpes) cujos níveis sanguíneos
são reduzidos pela erva-de-são-joão
• barbitúricos – reduz seu efeito

150
• remédios para o coração – reduz o efeito do digoxin,
importante para o controle do ritmo cardíaco
• remédios anticâncer e para evitar a rejeição após trans-
plante – reduz sua eficiência
• remédios contra a asma – reduz seu efeito

Há ainda outros, com complexas interações para deter-


minadas doenças, que deixei de lado.
Se existe um preparado que mostra a importância de
saber tudo a respeito de ervas medicinais, e de tratá-las exa-
tamente como drogas prescritas, esse é a erva-de-são-joão.

O que foi que a atriz Gwyneth Paltrow fez com aqueles


copos nas suas costas depois do nascimento de Apple?
Estou grávida de oito meses. Será que preciso daquilo?

Não, a não ser que queira ir para o parto com uma série de caro-
ços quentes e vermelhos e até bolhas nas costas. O que você está
descrevendo são as ventosas, uma prática medieval que consiste
em colocar um copo de vidro aquecido virado para baixo em
cima da pele. Precisa estar quente o suficiente para machucá-la.
O princípio é tão extravagante quanto o resultado. Há mil
anos mais ou menos, quando os médicos não sabiam na­da
a respeito da circulação ou mesmo dos princípios básicos de­
saúde e doença, inventavam dezenas de recursos insensatos
para tratar (ou enganar?) seus pacientes. Eles usavam san-

151
grias, cataplasmas, purgas (causando terríveis diarréias) e
quase sempre faziam seus pacientes passar maus bocados.
Leia os relatos sobre a morte de Carlos II para saber o quanto
os médicos da época eram medonhos, e tão terríveis os tra-
tamentos que esse rei teve de agüentar antes que os médicos
finalmente com ele acabassem. Ele deve ter sentido inveja da
morte rápida e limpa de seu pai, Carlos I, que foi decapitado.
Um desses tratamentos eram as ventosas. Os médicos acha-
vam que ao levantar a pele, fazendo-a formar um caroço, eles
de algum modo melhoravam a circulação do paciente e fa-
ziam-no se sentir menos mal. Com certeza, os pacientes se
sentiam bem melhor quando a ventosa era removida, porque
era um tratamento dolorido na hora e que continuava a doer
depois por bastante tempo. Para poder agüentar, tinham de
se convencer de que um tratamento precisa “doer para resol-
ver”. Eram poucos os que voltavam para continuar o trata-
mento. Portanto, não, você não precisa seguir o exemplo da
Gwineth Paltrow. Os grandes e os bons nem sempre ficam
com o melhor.
O que me espanta é que em pleno século 21 ainda
tenha gente disposta a se submeter a tratamentos desse tipo
quando não há absolutamente nenhuma razão científica,
médica, lógica ou de qualquer outro tipo que os justifiquem.
Será que as novas gerações não conseguem aprender nunca
com os erros do passado?

152
Teste

J á pensou alguma vez no que seu médico acha de você


como paciente? Ao entrar no consultório, você sente que
ele “afunda na cadeira” ou que o rosto dele se ilumina? Aí vai
um teste que deve fazer você parar para pensar. Ele estabelece
bem a distinção entre o paciente dos seus sonhos e aquele
que é o pior dos pesadelos para o médico. Vá somando seus
pontos à medida que responde às perguntas – e então verá a si
mesmo da maneira que seu médico o vê.

1. Alguma vez você já pôs saia de babado, meia arrastão e


salto agulha para ir ao médico?

Conte 0 ponto se sua resposta for não, e 3 pontos, se for sim.


Se a resposta é sim e você tem mais de 60 anos, conte o dobro
de pontos. Se você é homem, não importa a idade, multipli-
que por 10.

153
2. Quantas destas coisas você toma todo dia? Óleo de
prímula noturna, betacaroteno, vitaminas A, B, C, D ou
K, cápsulas de óleo de peixe, zinco, gingko biloba, ostras
da Nova Zelândia, erva-de-são-joão.

Conte 1 ponto para cada uma (e também 1 para cada vita-


mina). Se der mais de 3, multiplique por 3, se der mais de 5,
multiplique por 10.

3. Qual a grossura do seu prontuário médico?

Conte 0 ponto se tiver menos de 2 centímetros, 1 se tiver


2,5 a 5 centímetros, 4 se tiver mais de 5 centímetros, e 10 se
ocupar meia estante.

4. Quantas vezes você trouxe um artigo de revista ou um


download da Internet sobre a sua doença para mostrar ao
seu médico?

Conte 0 ponto para nunca, depois 1 ponto para cada


vez. Multiplique por 10 se forem mais de três vezes.

5. Quantos remédios receitados, com prazo de validade


vencido (e que você nunca tomou), você guarda na sua
caixa de remédios?

Conte 1 ponto para cada, e multiplique por 10 se forem mais


de cinco.

154
6. Quantas vezes relatou que um remédio receitado dei-
xou você doente, produziu efeitos colaterais ou lhe pro-
vocou alergia?

Conte 0 ponto para nunca ou apenas uma vez. Conte 2 pon-


tos para cada vez, depois disso. Multiplique por 20 se forem
mais de cinco vezes.

7. Quantas vezes você veio para uma consulta de rotina


com seu médico e perguntou a respeito de mais de dois
problemas de saúde?

Conte 1 ponto para cada vez e 10 para mais do que três vezes.

8. Alguma vez você escreveu uma lista de problemas de


saúde a respeito dos quais gostaria de falar durante a
consulta?

Se nunca, ou se você pediu um horário maior para isso,


conte 0 ponto. Se não pediu um horário maior, conte 1. Se
mais de uma vez, conte 1 ponto para cada vez, e então acres-
cente 2 pontos para cada item da lista. Se você somou 10
ou mais pontos neste cômputo inicial, multiplique por 5.

9. Quando a sua consulta parece encerrada, e você já che-


gou até a porta, alguma vez virou-se e disse (como o te-
nente Columbo): “Ah, tem outra coisa, doutor...”?

155
Conte 10 pontos se tiver feito isso uma vez, e 20 pontos para
cada vez subseqüente.

10. Você possui seu próprio prontuário médico e envelo-


pes de raios X em casa, e insiste em falar a respeito deles
toda vez que vai ao médico?

0 ponto para não, 10 pontos para sim.

11. Seu médico receitou um remédio para você, mas sua


irmã/prima/parente/esposo lhe diz que não é o remédio
certo/a dose está errada/deu alergia nele ou efeitos cola-
terais sérios/não vai resolver nada. O que você faz?

Você não liga a mínima, 0 ponto. Você volta ao médico e lhe


expõe os receios deles, 1 ponto. Você pára de tomar o remédio
imediatamente porque confia mais nessas pessoas leigas do
que no seu médico, 10 pontos.

12. Alguma vez seu médico pediu para você parar de fu-
mar e você não parou?

Conte 2 pontos para a primeira vez, 5 para a segunda e 50


pontos para a terceira vez, ou mais. Conte menos 10 pontos
se você nunca fumou, e menos 5 pontos se você de fato parou
da primeira vez que ele pediu.

156
13. Quando o medo da gripe aviária surgiu, insistiu
para que você e sua família conseguissem uma receita de
­Tamiflu?

0 ponto se não, 5 pontos se você insistiu.

14. Quantas vezes você pediu uma segunda opinião de


outro médico que não fosse o seu?

Se nunca ou uma vez, conte 0 ponto. Se duas vezes ou mais,


conte 2 pontos para cada vez. Multiplique por 20 se isso ocor-
reu cinco vezes ou mais.

15. Você acha que os “remédios naturais” são mais se-


guros e mais eficazes do que os remédios modernos
­receitados?

0 ponto se você acha que não, 2 pontos se você está em dúvi-


da, 10 pontos se você acha que são.

16. Além de consultar seu médico, quantas das pessoas


a seguir você também visita regularmente (sem contar
nada a ele)? Seu homeopata, osteopata, quiroprático,
acupunturista, reflexologista, iridólogo, astrólogo, irri-
gacionista do cólon, reiki, herbalista, terapeuta de cris-
tais, especialista em cura pela fé, terapeuta de pedras
quentes?

157
Conte 0 ponto para nenhum, e 2 pontos para cada um. Mul-
tiplique por 10 se forem mais de três.

17. Quantas vezes você interrompeu um tratamento com


antibióticos/antidepressivos/antipsicóticos/remédios para
o coração/ ou alguma outra receita de remédios vitais an-
tes do prazo estipulado e sem contar nada ao médico?

Para nenhuma vez, conte menos 5 pontos. Para uma ou duas


vezes, compute 0 ponto; se três vezes ou mais, acrescente 2
pontos para cada ocasião.

18. Você tem problemas com álcool e não consegue se


controlar, apesar de todos os esforços de seu médico para
ajudá-lo?

Se não, conte 0 ponto. Se você tem sido maltratado pela bebida


e parou realmente de beber, pode se agraciar com menos 20
pontos (adoramos pacientes como esses). Se você ainda está
bebendo muito, acrescente 10 pontos. Se você entra bêbado no
consultório, acrescente 200 pontos. Se você mostra agressivi-
dade em relação ao seu médico, enfermeira ou recepcionista,
acrescente 500 pontos e não se dê ao trabalho de voltar.

19. Você é um pai/mãe novo?

Sim? Então dê-se menos 10 pontos. Não há aspecto negativo


nesta pergunta – todos os médicos conhecem o problema de

158
criar filhos, e são (espero) todos muito compreensivos, seja
qual for o seu problema.

20. Você recebe um aviso para comparecer em tal data e


horário para o seu check-up anual. Você comparece?

Para sim, 0 ponto. Você liga e diz que o horário é incon-


veniente, mas marca outro horário? Se sim, 0 ponto. Você
não dá bola e joga o aviso da consulta no lixo. Acrescente 10
pontos.

21. Com que freqüência você tem mudado de médico ao


longo dos anos, mesmo morando no mesmo endereço?

Para nunca, marque 0 ponto. Para duas ou três vezes, marque


10 pontos. Para quatro ou mais vezes, marque 100 pontos.

22. Finalmente, o número de telefone do seu médico está


na lista de discagem rápida?

Se não, 0 ponto. Se sim, marque 10 pontos, a não ser ­que­ você


seja ­uma jovem mãe, a quem se pode perdoar qualquer coisa,
ou alguém com uma doença séria que precise de atenção ur-
gente com freqüência.

159
Qual é a sua pontuação?

O paciente dos sonhos, é claro, marcou 0 ponto ou até menos.


Ele não existe, mas um dia vou encontrá-lo. E então pedi-
rei que se case comigo, não importa se é homem ou mulher.
(Será, sem dúvida, um casamento platônico, pois eu terei sido
seu médico.) Você ainda será um sonho de paciente se tiver
marcado 20 pontos ou menos. Entre 20 e 40 pontos, você é o
paciente médio. Não se preocupe, ainda amamos você. Com
mais de 40 pontos, você começa a entrar no grupo dos que
nos fazem afundar na cadeira. Mais de 60 significa que você
é o tipo de paciente que leva o médico a parar de fazer clínica
geral – o verdadeiro pesadelo de paciente. Se você conseguiu
300 pontos ou mais, por que é que se dá ao trabalho de ir ao
médico? É óbvio que não confia nele, nem acredita que possa
ter alguma influência positiva na sua saúde.
Eu mesmo bolei esta escala de pontos, portanto ela não
é “oficial”. Mas gostaria de ficar com os direitos dela, pois
acho que pode ser uma ferramenta valiosa para qualquer clí-
nico geral. Se você tivesse de preencher um teste como este ao
marcar uma consulta, tenho certeza de que suas respostas se-
riam muito esclarecedoras para a prática, e iriam determinar
exatamente como a relação paciente-médico evoluiria. Fico
feliz em oferecê-lo aos meus colegas médicos e desejo a eles
muito boa sorte.

160
PRINCIPAIS DICAS
DO DOUTOR TOM

C ostuma ser difícil saber quando você realmente precisa


ir ver seu médico, ou quando pode, ao contrário, cuidar
de si mesmo com segurança. Por isso, aí vão dez dicas impor-
tantes a respeito de como lidar com indisposições comuns em
casa, além dos sinais cruciais que devem fazer você procurar
a ajuda de seu médico.

Dor de estômago
Na maioria das vezes, não é de fato o seu estômago, mas o seu
intestino que dói – ele está cheio de ar e os músculos da pare-
de do intestino estão prestes a ficar com cãibra. Grosso modo,
se a dor é acima do umbigo, provavelmente é estômago; se for
abaixo, provavelmente é intestino grosso. Se for exatamente
no umbigo, observe se nas próximas horas a dor não se deslo-

161
ca para baixo e para a direita – isso poderia indicar apendicite.
Em caso de dores na parte alta do estômago, tome um antiá-
cido: na farmácia você encontrará dezenas deles.
Para dores na parte baixa do estômago, tome bastante
líquido e tente aliviar o intestino. Um preparado antiirritante
para o intestino – hortelã é uma boa escolha – pode ajudar a
aliviar o espasmo. A hortelã é muito boa para as duas extre-
midades do intestino.
Se a dor persiste ou piora, procure ajuda, especialmente
se começar a vomitar e, mais ainda, se houver bile no vômito.

Diarréia
Ela é um sinal de infecção na parte final do intestino. Não
tome nenhum remédio contra a diarréia. Ele só vai prolongar
a infecção: a diarréia é a maneira que o organismo tem de
se livrar da infecção. Em vez disso, tome bastante água para
repor o líquido perdido e acrescente sal, açúcar e minerais à
água. Uma excelente maneira de fazer isso é tomar refrigeran-
te à base de cola – o normal, não o diet. Se houver farmácia
por perto, compre uns envelopes de reidratante. Eles contêm
a combinação exata de substâncias para recuperar o intestino
sem lhe causar mais estresse ainda. Nomes comerciais são o
Rehydrat e o Dioralyte, mas há outros. Tome seis a oito por
dia com muita água. Evite comida muito rica e laticínios du-
rante 24 horas para dar um descanso às células das paredes do
intestino. Se houver sangue na diarréia, procure seu médico.

162
Constipação
Qual a melhor maneira de fazer o intestino funcionar bem?
Se a constipação ou prisão de ventre é um hábito que você teve
sempre, então precisa mudar seus hábitos. Introduza maior
variedade na sua comida, com muitos legumes, verduras e
frutas, e tome muita água todo dia, para começar. Acredite
ou não, o exercício físico é muito útil. Ele vai ajudar a fortale-
cer os músculos da parte frontal da barriga – os da sua parede
abdominal. Você precisa deles bem fortes para aumentar sua
capacidade de expulsar os materiais do intestino.
Não tome laxante diariamente. Eles levam a um “intes-
tino laxante” – um problema no qual os intestinos perdem de
fato o poder ou a tendência de empurrar a matéria fecal adiante
em direção à sua expulsão.
Se você tiver de tomar um laxante, deixe isso para um
dia especial, no máximo uma ou duas vezes por semana. Se a
constipação é recente, você precisa descobrir a causa. Uma mu-
dança repentina e inexplicável no hábito intestinal, que leve a
prendê-lo ou soltá-lo, em adultos, precisa ser investigada. Pode
ser um primeiro sinal de câncer do intestino ou da próstata.

Cãibra
É aconselhável descobrir a causa, se possível. Os músculos
ficam com cãibra quando o seu equilíbrio “eletrolítico” ou
mineral está fora do padrão. Excessiva perda de sal (diga-
mos, depois de um dia de exposição ao sol) ou um distúr-
bio no metabolismo do cálcio podem ser umas das razões

163
da cãibra, embora geralmente seja difícil ter certeza disso.
Água tônica (sem o gim!), que contém quinino, é um re-
médio clássico para a cãibra, e um copo dela à noite pode
prevenir a ocorrência daquelas cãibras que acordam você logo
cedo. Beber muito líquido também ajuda.
Para curar as cãibras, alongue o músculo afetado. Por
exemplo, levante o pé quando tiver cãibra na panturrilha,
estique os dedos do pé quando tiver cãibra no centro dele.
Muitas vezes, as dores nas costas são causadas por cãibras dos
grandes músculos que correm ao longo da coluna: alongue-os
arqueando suas costas. A melhor maneira é deitar de barriga
no chão, com as mãos atrás das costas, e levantar os ombros e
as pernas. Faça isso regularmente todo dia e irá acabar com a
velha dor nas costas.

Falta de sono
Se não consegue dormir, deixe todas as suas preocupações do
dia fora da porta do quarto. Coloque um rádio-relógio ao lado
da cama e sintonize numa emissora de música ou entrevistas
– evite televisão no quarto. Não faça refeições pesadas depois
das 8 da noite, e tome apenas uma bebida leve e quente antes
de ir para a cama. Um banho quente e uma cama confortável
são ideais para induzir o sono.
Se você não consegue dormir depois de todas essas pro-
vidências, converse com seu médico. Tomar comprimidos
para dormir toda noite é algo totalmente inadequado, pois
você pode criar dependência deles. E aí eles, além de não pro-

164
duzirem efeito, vão fazer você ter noites horríveis quando pa-
rar de tomá-los. Recomendamos àqueles que têm problemas
de sono que não tomem mais de dez comprimidos por mês, e
nunca por mais de duas noites consecutivas.

Resfriado comum
Isso é fácil: duas ou três aspirinas ou paracetamol três vezes
ao dia; tomar muito líquido; procurar descansar o máximo
possível, o dia todo; e falte ao trabalho nos três primeiros
dias. Se você for trabalhar, passará o resfriado aos demais co-
legas, e isso não é justo com eles.
Ainda não existe um antiviral para o resfriado comum,
por isso ele ficará em você ainda pelos próximos seis dias, não
importa o que faça – embora você só seja contagioso nos três ou
quatro primeiros dias. Você provavelmente terá uma centena
de resfriados em sua vida – a cada vez, de um vírus diferente.
Pequenas coisas desagradáveis, esses vírus dos resfriados.

Picada de inseto infeccionada


Pomadas e outros preparados na verdade não funcionam, e a
maioria só serve para segurar o calor da inflamação na pele.
O melhor é deixar a pele o mais fria possível.
Coloque gelo em cima da picada pelo tempo que puder
tolerar o frio – digamos, por volta de dez minutos. Isso vai
remover o calor da picada e diminuir a coceira. Volte a aplicar
gelo após uma hora se o desconforto continuar.

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Um comprimido de anti-histamínico uma vez ao dia
(você pode comprar na farmácia) ajudará.
Se as picadas infeccionarem muito, você terá de recorrer
a um antibiótico, e nesse caso precisará de receita.

Queimadura de sol
A resposta definitiva é manter-se frio o mais rápido possível.
Por isso, proteja-se à sombra e fique nela o resto do dia.
Tome banho frio de banheira (um chuveiro pode ser
dolorido) e deite num quarto com pouca luz e um ventilador
forte dirigido à sua pele.
Se sentir enjôo, dor de cabeça e calor, pode estar com
insolação, e terá então de ingerir muita água, com uma ge-
nerosa medida de sal, pelo menos um copo a cada hora.

Dor de ouvido em crianças


A maioria das crianças tem dor de ouvido alguma vez na vida,
e dificilmente é algo grave – mas a reputação que a dor de ou-
vido tem de ser o prenúncio de uma doença mais séria como
a meningite naturalmente deixa os pais preocupados. Uma
dose infantil de paracetamol costuma ser suficiente. Também
pode ajudar uma compressa fria sobre a orelha ou atrás dela.
Mas existem alguns sinais de que alguma coisa mais grave
pode estar acontecendo. Por exemplo, quando a criança sente
enjôo, queixa-se de dor de cabeça, ou é muito sensível à pres-

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são no osso que fica logo atrás da orelha. Se houver algum
desses sintomas, leve a criança ao médico.

Dor de cabeça em criança


Seu filho se queixa de dor de cabeça e você acha que ele está
inventando só para poder faltar à escola?
Você está equivocado. Crianças pequenas não mentem
a respeito de dor de cabeça. Se elas se queixam, então é que
estão de fato com dor de cabeça. Crianças têm dores de cabe-
ça de tensão e enxaquecas do mesmo jeito que os adultos, e é
preciso investigar para saber as causas.
Somente uma criança entre mil, aproximadamente, ao
se queixar de dor de cabeça pode estar com um tumor cere-
bral, mas não convém se dar ao luxo de descartar esse caso
raro. Assim, crianças que se queixam repetidamente de dor de
cabeça devem ser levadas ao médico.

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Agradecimentos

Eu não poderia terminar este livro sem a ajuda e o apoio de


um pequeno grupo de mulheres. Em primeiro lugar, a minha
agente, Mandy Little, que após breve conversa levou-me, na
qualidade de escritor, num encontro na associação de jorna-
listas da área médica. Sua confiança em mim fez-me conhecer
Aurea, Vanessa e Emily na Short Books. Elas têm sido colegas
fantásticas, e por meio de suas experiências em coquetéis, fes-
tas e na vida em geral arrecadaram um substancial número de
questões (e, no geral, as mais diferentes). Agradeço também a
Deanna Wilson, uma colega jornalista e boa amiga por mui-
tos anos, pela imensa ajuda na leitura e conferência do texto e
por muitas de suas risadas durante esse trabalho.
Há também a Lesley Anderson, minha nora e artista,
que fez a ilustração da capa da edição original. Ela pegou
exatamente o espírito do livro.
Finalmente, agradeço a meus colegas médicos de famí-
lia. Este livro é para vocês e seus pacientes. Estou certo que
poderia ser escrito por qualquer um de vocês. O livro saiu
porque finalmente tive tempo de fazê-lo.

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