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© ENSAIO EM GERAL 1. Se folhearmos uma bibliografia sobre o tema do ensaio, verificamos que existem com frequéncia ttulos que tomam esta forma: sensalo sobre o ensaion,E 0 gosto Itdico da dupli- cago, da reflexividade, de criar uma espécie de vertigem, de horizonte infinto, em que sujeto € objecto,linguagem ¢ me- talinguagem, se acabam por dissolver num diilogo intermin vel de espethos. Em lingua portugues, ¢ com algum prestgio € irmadiaglo no espaco ibérico, surgi, em 1944, um livzo de Sivio Lima que adoptou um pouco este esquema, mas intto- ‘duzivhe uma diferenga de efeitos consideriveis: « obra int tulavase Ensaio sobre a esséncia do ensaio, e o fundamental, E claro, est no facto de surgit no meio da expressto a palaven esséncia, Hla funciona como um elemento de fixagdo num processo que, de outro modo, se tomnaria excessivamente trans- bordante, Gostaria de desenvolver este trabalho sobre o papel insta- billzador do ensalo na arquitectura dos géner0s literrios, tomando este episidio como ponto de pari. Julgo que a va cilaglo entre estes dois tipas de ttulos -ensaio sobre o ensaior ‘ou eensaio sobre a essoncia do ensaio») € simtomtica de qual 18 ‘quer coisa que acompanha toda a historia do ensaio, quer a cconsideremos no imbito fillégico, como a histria da palavra ‘ensato, quer a analisemos como o inventirio € a narrativa da pritica ensaistica enquanto géneroliteritio. B, como & dbvio, ‘quando a noglo de esséncia aparece em cena, toda a prob lemitica se inflecte num sentido que provisoriamente podere- mmios clasiicar de bumanssta: € 0 ensalo como afirmagio da razio, do live exercicio da ra7io, ¢ da livre aiemacio da liber- dade do homem, [Esta acepcfo enraiza-se na conhecida cumplicidade eti- mol6gica entre a palavra ensafo ¢ termos como exagium, 00 sentido de balanca, e exaglare, no sentido de pesar. Mas, se recuarmos umm pouco, podemos ainda verificar que na origem de exagium haverla também exigo, que significa uma atitude de exigéncta que leva a expulsar aquilo que no passa pelo ‘erivo Gsto &, pela critica) de uma posiglo de rigor. Por conseguint, a idea de ensaio est associada 8 meta do peso — que, como sabemos, esti também presente no termo pensar: O ensaio é uma forma de pensamento em que se ‘pest o valor das ideias — num exercicio intelectual de ponde- ragdo (outro voesbulo que também entra nesta tela metafbrica). ‘Mas bf. uma terceira linha de sentido a ter em conta. E aquela em que 0 ensaio surge como um acto de por a prova, ‘numa acepgio que talvex nio sejaalhela 20 saborear prévio dos alimentos com que se pretendia eliminar 0 efeto de even ‘uals venenos eriminosos. Iso é, atrvés de uma experiéncta, procure afastar 0 que poderi ser perigoso para a conser: vvaglo do individuo, quer do ponto de vist sco (o veneno), ‘quer do ponto de vista mental a idela envenenada) 19 i Por iss0 Justo Lipsio, no sew trabalho de tradugio, asso. cava ensaio a gustus. Mas, por seu lado, Sainte-Beuve aprox mmava a palavra de Judus. Mais uma vez a dualidade intinseca (gustus/ludus) da nogio de ensaio se torna evidente. E ele ainda ressalta mais se virmos que, se a palavra exagium tem Juma relagio estrcta com a palavra examen, por outro lado ‘examen nilo designa apenas 4 nocio de exame, mas também 4 nogio de enxame (abétas, pissaros voando em conjunto, ‘mancha indecisa de multiplicidades), Podemos agora resumir esta primeira fase da nossa andlise. ‘Se pensarmos em tiulos na forma de vensalo sobre a esséncla do enssios, predomina certamente a nogio de exame com o seu rol de consequéncias a exigéncia, 0 gosto, a prova, 0 peso, a balanga, Mas, se optarmos por titulos 3 maneira de sensaio sobre 0 ensaio», deparamos com uma perspectiva diferente em, que avulta a importincia do enxame, da nuvem de péssars, da proliferagio iimitada, do jogo de espetbos. 2, Isto mesmo se pode logo verificar em leituras diver: ‘gentes de Montaigne e da sua relacio com a experiéncia do No capitulo It do Livro ‘Terceiso dos Essais, Montaigne parte da noglo de instabitidade, isto 6, de uma embriaguez natural, para definie 0 estatuto do mundo: sle monde n'est ‘qu'une branloire perenne» ¢ «la constance mesme n'est autee ‘chose qu'un branle plus languissant. Je ne puis asseurer mon ‘object; il va trouble et chancelant, d'une yvresse naturelle» ‘Tudo muda, portanto, a cada dia, mais, a cada minuto que ‘passa, Por iso, escreve Montaigne, «je ne peins pas Neste, je 2 peins le passage» Ba nocio de ensaio, no sentido de ensaar- “se @ st proprio, de se por a si proprio a prova face & ‘mudanga das cotsas, aparece claramente neste texto: Si mon ame pouvoit prendre pied, Je ne m'essaierois pas, je me resoudrois lle est toujours en apprentissage et en espreuve. Isto define o estatuto de um livro como os Essais: westce pas faire une mursille sans pierre, ou chose semblabe, que de bastir des livres sans science et sans art> Bncontramos a conhecida osclago: de um lado, a ideia de rmuralba do outro a auséncia de pedra. O que se entende em uncio das proprias perspectivas de Montaigne: se tudo mud, € por isso a verdade se insabiliza, hd, no entanto, uma instin- cia que mio muda € define a verdade subjacente a todas a5 instabilidades: € a do proprio ew enquanto foco central da cexperiéncia dos Essai, singularidade absoluta: «chaque homme porte la forme entire de humaine condition.» Dai resulta que 1 obra faz um 86 corpo com 0 seu autor, e, se verdade ina balivel existe, ela 6 2 verdade deste corpo: scy, nows allons conformément, et tout dun train, mon livre et moy. Aileurs, ‘on peut recommander et accuse ouvrage, & part de Fouvrier, {cy, non; qui touche I'un, touche autre.» Na letura feita pelo estudioso portugues Silvio Lima, no livro anteriormente citado, 0s Essa/s de Montaigne sio, em primeiro lugar, um processo de descoberta do proprio eu, ‘como ponto de partida absoluto, Mas, em segundo lugar, 0 ‘bomem em gerat (a «humana condigios) emerge imediata- mente no intetior do individuo. Isto é, 0 homem esti contido no individuo, o geral no particular A forga desta afirmagio poder garantir aqui o estilo de epopela Hbertadora (© pensi- a he mento € o livre exercicio de uma rao que afrma que o eu rio pode estar submetido a nenhuma autoridade que Ihe seja ‘exterior, seja ela de tipo religioso, politico ou intelectua). Podemos assim tragar o paralelo entre um Montaigne € tum Rousseau, cabendo ao primeiro o papel positivo de definir 4 partir de si pr6prio a norma da humanidade, e cabendo 20 segundo 0 papel incémodo de pretender definr a sua propria ‘norma a margem dessa humanidade. Rousseau seria um excén- ‘rico, enquanto Montaigne seria concéntrico. Nesta perspecti> va bumanista, Montaigne caracterizase pela recusa de toda € ‘qualquer forma de antortarismo € por um exercicio berador da razio que se promove como exame e espirto ertico. Se este processo € um processo infinito Gil n'y a point de fin en ‘nos inquisitions»), este ininto €o tnfinito do proprio bomem. Silvio Lima poder dizer que 0 ideirio dos Assaés€ 0 ede uma pedagogia dindmica, activist, funcional, construiva, do juizo da vontade» Hi Jean Starobinskt (Peuton définit L'sseafs, in Jean Starobinski, Cabiers pour un temps, Centce Georges Pompidou, Paris, 1985, pp. 185-196), numa reflexio teérica ‘que parte também de Montaigne, € mais matizado nas suas for- mulagdes. certo que a nogio de ensazo ests inequivocamente associada i ideia de liberdade:sJe erois que la condition de Pes: ‘si, et son enjeu tout aussi bien, c'est la Mberté de Vesprit, La liberté de esprit: la formule semble peutétre un peu em atique, mais histoire contemporaine se charg, hélas, de nous apprendre que c'est un bien et quil n'est pas communément ppartagé» Mas Starobinski acentua outros aspectos que inclinam © ensalo para o lado da sua dimensio mais Mica. Isto resulta, 2 sobretudo, do facto de os enstios serem escritos (embora [Emerson pretenda que os Bssais sejam 0 livre menos escrito ‘que existe), isto, estejam submetidos também 4 propria ond ago da linguagem. Diz Starobinski que essai culmine, done, chez Montaigne, dans les abandons et les ruses dt lan- gage, dans les entrelacs des trouvailles et des emprants, dans les ajouts qui affluent et enrichissent, dans la belle frappe des sentences, dans le décousu, 1a nonchalance maitrsée des digressions, qui forment des allongeails multipliables» Por ‘outro lado, 6 conhecida a ideia de Montaigne de que parece- ‘mos consdenados 8 tnterpretacao de interpretagdes, mesmo ‘que esta atitude Fosse nele objecto de uma itonia que no pode ser inteiramente desligada de uma autoironia, Por fim, por ‘muito que acentuemos 0 lugar do sujeito como matriz da erdade, ndo podemos esqueces que, no processo da comuni- ‘cagio, como sublinha Starobinsk, «la parole est moité & celu ‘qui parle, moitié & celul qui Ecouter. “Tudo isto faz do enstio um género que se enreda nas suas ‘Proprias contradigBes, Tomase dificil falar em esséncta do ‘ensaio, se por tal quisermos entender uma esséncia pura Porque no € pureza, mas hesitacio, indecidibilidade, mistura, Escreve Starobinski sobre o que poderia ser a estética do ‘ensaio: Son esthetique est celle du mélange» 3. Podemos dizer que a concepeio humanista do enstio, ‘exempliicada pela abordagem de um Silvio Lima, se inscreve ‘numa perspectiva do conhecimento umano em que 0 grande ‘confronto se realza entre 28 trevas € a hz da Razo — uma pperspectiva iluminista, por conseguinte. De um lado, as su 2B perstigdes, as crengas, os dogmas. Do outro, por um livre exer- cicio da razio de cada homem, a afirmagio da liberdade do ‘pensamento como exame ponderado de todas as ideias. De ‘certo modo, & medida que as tevas se reduziam ia-se implan- tando a visio cientifica do mundo — as coisas tal como elas ‘Sho, segundo o modelo positivist Richard Rorty, em Consequences of Pragmatism (Min nesota, 1982), procura tracar a genealogia da filosofia enquan- to género lteririo, ¢ isso leva 2 considerar que, no espaco da ‘radigio ilaminista, ariculado no confronto entre supersticio «¢razio, nfo hi ainda lugar para a flosofa. Toda a losofia que centio se faziatinha como tinico objectvo alargar 0 dominio do conhecimento cientifico enquanto concepeio da natureza él ‘ma da realidade, mas nio era possvel acetarse a existéncia de uma forma de conbecimento que exisisse a par do conheci mento cientifico $6 0 idealismo floséfico & que vai colocar a filosofia no lugar da ciéncia enquanto diseiplina auténoma que nos ‘garante 0 acesso & natureza \iima da realidad Isto tem, como sublinha Rorty, das consequenciasfundamentais: em primero lugar, afilosofia vem revelar que a razd0 € mais ampla do que 4 citncia; em segundo lugar, a religiio, a morale até a arte ‘podem agora ser incuidas no espaco da razio. A flosofia surge assim como uma superciéneia que permite pensar as relacdes centre a ciéncia ea arte, a moral e a reli. ‘Um segundo passo importante deste processo seri rex lizado por Hegel quando faz da fllosofia uma actividade no apenas reflexiva mas especulativa, que abandona as formas da ‘radiglo cientfia da argumentagio. Para Rorry, & com Hegel 24 ‘que a filosofia nos aparece na sua qualidade de género espect- _Fleamente iterdrio. Que significa isto? Que a flosofa ilo pre- tende estar no lugar da ciéncia, Porque a cigncia visa a agquisicio de wm vocabuliso inceiramente neutro para abordar a realdade, E porque o ideal da ciéncia seria 0 de evitar qual ‘quer relacdo com escrita, Kant, na medida em que pensa uma Filosofia como ciéneia, considera que a filosofia nto deveria ser cserita, © que 0 facto de a termos de escrever para a tomar comunicivel € apenas uma infeliz solugio de recurso. Com Hegel, a8 cosas passam-se doutro modo, na medida em que ele parte da ideia de que existem iaimeros vocabulirios dis: poniveis, de que cada wm deles tem uma fragiidade propria € de que nada pode imporse como garantia da escolha de um determinado vocabulilo, mesmo que cada vocabuliio sur, no fmpeto do seu processo de sintese, com a conviccio apatxonada ¢ preciria de que possui a verdade derradeira sobre as coisas, Ess paixo € 0 modo como a ruzio nos arrebata no pprocesso do conhecimento, mas toda a verdade se revela ra ppkdamente como iusto ultrapassada. Na andlise de Rory, © que nos fica como heranga de um Idealismo metafsico desaparecido € a marca romantica que permite afirmar que i um modo de conbecimento de raiz Iterdria que prescinde dos extérios discursivos da ciéncia. f {sso 0 que nos surge no pensamento romAntico a partir do tema do Witz, entendido, na sua fiacio etimolégica que o vin ccula idea de saber (wissen), como uma outra forma de saber que se caracteriza pelo abandono de uma discursvidade de tipo analitico © predicativo. Como acentuam LacoueLa- barthe ¢ Jean-Luc Nancy (Uabsolu litéraire, Seuil, Pati, 1978, 25 == p.75), 0 Witz nio € de modo algum um novo génoro de co- ‘nhecimento ou de literatura, mas algo que airavessa'todos os sgéneros, ¢ de certo modo 0 flimita: uma qualidade atnbuivel a qualquer tipo de géneros ou de obras, uma faculdade do cspirito, um tipo de espirtos, que se caracterza pela capaci. dade de sapreender num relance, € com a velocidade do relism- Pago, na confuso de um caos heterogéneo, as elagdes, novas, inéditas, eriativas» Para LacouelLabarthe © Nancy, o Witz é sum saberver imediato, absoluoe. Hegel, na Introducio a Fenomenologia do Espirito, ick \demarcarse deste conhecimento que, exaltado pelo entusias: ‘mo do imediato, no esti disposto a fatigarse no longo itneritio em que se vai revelando a fia © progressiva neces. sidade das coisas, Bo Goethe da maturidade afstarse do que cle considers, nos didlogos com Eckermann, «a doenca do Mas este romantismo prossegue o seu caminho ¢ € cle que vial modelae 0 essencial da modernidade estética, nx medida fem que esta, movida por vagis de sucessivas vanguardas que pretendem exprimit 0 inexprimivel, se defini como perma rnente revolta contra as formas. socials assumidas pela modernidade ihuminista. Octavio Pxz narrow alguns episéios ccentrais desta narrativa em Los bijos del limo (que na versio francesa se chamou Point de convergence, Gallimard, Pari, 1976), Para Schlegel, a flosofa esti exposta 3 permanente erosio {que emerge no interior dela e que vai tomar inteiramente inde- cisas as fronteras entre poesia eflosofia. A filosofia que aban donow a ideia do sistema entregase agora a uma vocagio ir 26 — rica que incessantemente a descentra de si propria. retomo do caos, na sua plenitude euférica, como impossibilidade do sistema, a vitéra do enxame sobre o exame, Frdriech Schlegel: «a ironia € a clara conseigncia da eterna aglidade, da plenitude {nfinita do casos Liabsolu litéraire, p. 213). 0 fragmento 121 do Atheneum diznos que sune idée est un concept accom. pili jusqu’ Tironie, une synthése absolue d'absoues syntheses, [Yéchange constante, et s'engendrant luiméme, de deux pens s€es en lutte» De certo modo, podemos dizer que 0 Witz € a poesia romintica so a mesma coisa: La poésie romantique ‘ese parmi les arts ce que le Witz est la philosophie, ce que a société, les relations, Hamitié et 'amour sont dans la ve autres genres litéraires sont achevés, et peuvent 2 présent tre entidrement disséqués. Le genre postique romantique est ‘encore en devenir; et Cest son essence propre de ne pouvoir ‘qu’étermellement devenir, et jamais s'accomplir. Aucune ‘théorie ne peut répuiser et seule une critique divinatoire pour rat se risquer A caracteriser son idéal. Hlle seule est infinie, ‘comme elle seule est libre, et elle reconnait comme premiére loi que Varbitraire du podte ne soufire aucune loi qui le ‘domine. Le genze poétique romantique est le seul qui soit plus qu'un genre, et soit en quelque sore Vart meme de la poésie: car en un certain sens toute poésie est ou doit étre roman tiques (fragmento 116 de Atheneum, L'absolu ltt6raire, pall, Segundo Novalis, © Witz & eriador, fabrca semethangas.» ‘Mas esta capacidade pottica de cra, de separar¢ aproximar num paixonado saber das distin, € acima de tudo um saber que se define como wn saber do amor, wa erética do conbecimento, a [No romance Lucinda, Schlegel poder dizer que «Caos ¢ Bros 0 41 melhor explicagio do romantco». E Novalis ii desenvolver eta flosofia amorosa em que 10 bi limites nem para os géneros Iiteritios nem para as formas de conhecimento. Para Richard Rory, esta flosofia amorosa define o espaco transbordante do que podemos chamar a cultura literdria ‘moderna. Ha tem wma caracteristia, que € a capacidade de se afirmar a si propria, numa critica implicita ou explicita 4 ie cia € 8 filosofa tradicional, como a forma de conhecimento que se ocupa daquilo que é verdadeiramente importante ara cada um de nés (ese tipo de verdades que nos fazem ‘iver e que tocam numa zona central da existéncia em que se decide a razio de ser das coisa, porque, como escrevia Musil ‘em 0 bomem sem quatidades, sno centro esti qualquer coisa 44 que chamei motivacio, ¢ na vida comum n6s agimos no segundo motivagdes, mas apenas segundo encadeamentos de ‘casas € de efeitos), Na perspectiva pragmatista de Rory, esta cultura litera sestende-se de Carlyle a Isiah Berlin, de Matthew Arnold € one! Trilling a Heine e a Saree, de Baudehire a Nabokov, de Dostolewski 2 Doris Lessing, de Emerson a Harold Bloom. A sua luxuriante complexidade nio pode ser reduzida uma con junglo de termos como *poesia”, “romance*,"ertica Meri Esta cultura é um fenémeno que o lluminismo no poderia ter antecipado. Kant aio a contempla na sua triple divisio das possiveis actividades humanas em conhecimento cientifico, acgao moral e livre jogo das faculdades cogaitivas no prazer cestético, Mas, 6 como se Hegel soubesse tudo desta cultura ‘mesmo antes de ela ter aparecidos (Rorty, op. cit, p. . 28 t | CContudo, © romantsmo é ainda movido por um desejo de rerdade. Rorty considera que a terceia etapa na afiemagio da autonomia da cultura Hterdria se realiza apenas com 0 prag: ‘matismo de Nietasche ¢ de Willam James, para 0s quais a esco- tha de qualquer novo vocabulirio milo € guiada por um pressen- timento de poder atingr a verdade, mas € apenas pela ideta de aque cada diferente vocabulisio tem condigSes para produzir ‘novos efeitos interesantes na nossa Felacao com © mundo. Esta (vejuse o ensaio inal do pequeno 32 oo volume Schiforuch mit Zuschauer. Paradigma einer Daseins- ‘metapber, Subamp Verlag, Frankfurt am Main, 1979; ed. ut 1 Mulino, Bologna, 1985). E isto € importante porque esta ‘mesma #nconceptualidade aparece como a matécia privilegia «a do pr6prio trabalho ensaistico: procursse através dela man ter uma relacdo com a forma enquanto indicio textual de um cenrsizamento irredutivel no mundo da vida. Como diz lumenberg, importam sobretudo «is ligagBes com os bast ores do mundo da vida enquanto apoio motivacional cons- ante de cada teorla — mesmo que nio seja necessirio estar constantemente presente. Se ji devemos reconhecer que da cincia nfo podemos esperar @ verdade, queremos 20 menos saber por que motivo desejamos saber uma coisa cujo saber val acompanhado pela desilsio, Neste sentido, as metiforas sio f6sseis que nos guiam para um estrato arcaico do processo da ‘curosidade teorética, Blumenberg acrescenta que «0 enigma ‘da metforas no resulta apenas da insuficiéncia dos conceitos face ao mundo da vida, mas também das xzdes que as upor- tam em contextos objectivas em que aparentemente fun- cionam como fonte de perturbacio concept (© que Simmel vai fazer com notivel desenvoltura € partic de uma espécie de fenomenologia da nossa experiéncia quo- tidiana da porta da ponte e desencadear uma série de efeitos tedricos com base nuimia tex muito frig e subul de Slamen: 1 afectivos ¢ estéticos, Novalis havia definido 0s termos em que Se processa 0 Jogo romintico da proximidade ¢ da distancia: Flutuar entre cextremos que & necessirio unir e dividi. Deste ponto lum novo da futuagio irompe toda a realidade — nele tudo esti 3 ccontido — objecto ¢ sujeito existem através dele, ¢ no ele através deles. A dimensio do eu, ou a poténcia imaginativa, 0 flutwar — determina, produz os extremos, entre os quais ‘corre a futuacdo» (Novalis, Werke. Tagebricher und Briefe, Hanser, Mnchen, 1987, vol. n, fragmento $55) Simmel avanga no mesmo sentido, mas evitando quer © paroxismo dos excessos quer a comodidade da sintese dialéc- tics. Tratase sobretudo de uma questio de perspectivas, de ‘modes de ver 0 mundo, Podemos olhar a natureza como se ‘ela tudo estivesse ligado, mas também a podemos considerae ‘como se nela tudo estivesse dividido. No € necessisio onto- logicizar a unidade, nem tragicizar a separasio. O que define ‘© homem em todos os planos (o coxporl, 0 espiritual, 0 sim bolico) é precisamente a sua capacidade para separar o que esti ligado € ligar © que esté separado, Nisto se diferencia do snimal, Porque o animal vai de um lugar a outro, pode volta, ode recomecar — mas no traga um caminbo. Construit tum caminho € um acto especificamente humano de ligar dois lugares entre si, Ba ponte € fundamentalmente a apoteose essa capacidade dos homens. Pode-se dizer que a ponte 10 apenas a ligagio entre as duas margens, mas, acima de tudo, 0 simbolo da vontade de ligar, Essa vontade existe precist- ‘mente na medida em que as margens surgem como que sepa rradas. \ vontade de ligar & um desejo de ir contra aquilo que surge mareado por uma an6nima vontade de separar, Por outro Jado, a ponte mo tem apenas a funedo pratica de permitic a passagem de uma para outra margem. Ha € um camino que se tomou visivel: isto €, uma forma estética. 6 uma forma ‘com sentido (0 sentido de ligae), mas que, como fendmeno sin: 34 ‘ular, no est vinculada a nenhuma dimensio abstracta,E, no ‘entanto, apesar do seu estatuto esttico, a ponte nilo pode Ser eduzida a uma obra de arte, porque ela passi a incorporarse ra natureza, 2 fazer parte da paisigem natural Em oposicio, no outro extremo deste arco conceptual, a porta. A construgio da porta € fundamentalmente 2 delim taglo de um terrtério, O espago € pura infinitude, mas ess Ccontinuidade sem ruptura € subitamente alterada pela intro- ‘duglo de um elemento, a porta, que estabelece wma fron- tira. Do lado de c4, tudo 0 que ficou surge marcado pela lunidade, esti unido entre si pelo facto de ser 0 que esté do lado de ea da porta. Mas a porta enquanto limite de um ter ritéro designa 0 lado de Ii, 0 exterior, como exterior desse ter- itor. § porta & a zona de articulagio entre 0 finito interior € © exterior infinto (neste sentido, este espago € a matriz de todo 0 espago romintico na sua insistente relagio entre © determinado ¢ 0 indeterminado, entre 0 condicionado € 0 {incondiclonado). Mas ha que distinguir ainda, observa Simmel, centre uma parede (que tem os mesmos efeitos demarcadores) uma port: porque a porta fecha como uma parede € simul taneamente abre como nenhuma parede pode fazer. E por isso, ‘quando fecha, fecha mals — € 0 simbolo da vontade de fechar. Enquanto 2 ponte liga apenas © finito de uma margem com 0 Sinito de uma outra margem, numa rede ilimitada de relagBes Sinitas, a porta € o lugae de encontro e ruprura entre 0 fnito & © nfinito, Porque a porta, 20 desenhar 0 espago isolado de um. serpantsi, coloca no seu exterior um espago gue € apenas 0 cespaco do puro exterior — € aqui se virkinserever (oda a

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