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REPRESENTAÇÕES DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO ANARQUISMO BRASILEIRO

CONTEMPORÂNEO E SUA RELAÇÃO COM A AÇÃO DIRETA


LUIZ FELIPPE DE CASTRO HENNING1
GILSON LEANDRO QUELUZ2

Resumo:
Nos anos 1990, podemos ver ressurgir no globo o fenômeno anarquista. Tal fenômeno é
impulsionado pelo processo de levante zapatista de 1994, que subsequentemente propõe uma
aliança mundial contra o neoliberalismo, que resulta em uma coordenação de organizações
anticapitalistas a AGP (Ação Global dos Povos). A AGP acaba por reinserir nos meios
militantes as noções de autogestão e ação direta, contribuindo assim para reabilitar o
anarquismo. No Brasil se faz sentir este movimento, sendo herdeiros deste processo
organizativo, organizações como o MPL (Movimento Passe Livre), parte de organizações da
CAB (Coordenação Anarquista Brasileira), além do aparecimento e difusão da tática Black
Bloc neste período. Estas organizações e manifestações aparecem atravessadas, por discussões
relacionadas a ciência e tecnologia (C&T), em muito animadas por aquilo que se percebe como
“crise ambiental”. Tais reflexões oscilam entre o rechaço à técnica e propostas radicais de
reorganização tecnológica num viés libertário. Sendo este um debate fundamental na
contemporaneidade, as representações da tecnologia acabam por se relacionar diretamente com
as práticas propostas por estes grupos, gerando diferentes representações e padrões de ações.
Este trabalho apresentará algumas destas representações sobre C & T, enfatizando as propostas
e práticas contra hegemônicas deles advindas.
Palavras-chave: Anarquismo; Representações; Tecnologia; Ciência; Práticas.

INTRODUÇÃO

1 Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Tecnologia- PPGTE da UTFPR.


luizfelippe.decastrohenning@gmail.com

2 Professor do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia-PPGTE da UTFPR ,


queluz@utfpr.edu.br

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Vivenciamos uma significativa mudança no panorama politico brasileiro, a partir das
manifestações de massa que eclodiram no país em junho de 2013. Desde a década de 1990, não
eram vistas manifestações desta proporção no Brasil, com tamanha participação, impacto e
relevância social. Tais manifestações, aparecem como contestação ao modelo de gestão do país,
pois se é fato que nos últimos anos, se conseguiu combater a desigualdade social, e a pobreza
extrema, como podemos observar nos dados apresentados por Hugo Albuquerque(2014), que
arrola alguns destes aspectos em seu artigo “Becoming-Brazil: The Savage Rise of the Class
without Name”. O autor observa que em meados de 2013, os governos sob gestão do Partido
dos Trabalhadores haviam conseguido entre os anos de 2002 e 2012, os seguintes resultados:
aumentar a expectativa de vida dos brasileiros, que passou de 70,72 (Banco Mundial 2013) anos
para 74,6 anos; a mortalidade infantil diminuiu de 25,3 em cada mil nascidos vivos para 12,9;
2 o coeficiente de Gini, que mede a desigualdade social, diminuiu de 0,59 para 0,52; 3 A taxa
de desemprego caiu de 12,9% para 4,9% (cfr. Haider 2012). Porém este mesmo autor, observa
que 2013 foi um ano de intensos protestos contra o atual “sistema político” e pelas “condições
gerais de vida do Brasil” (ALBUQUERQUE, 2014), afinal a despeito do enfrentamento a
pobreza persiste certa precariedade do acesso a direitos sociais como transporte, educação e
saúde. Não à toa, estes fatores aparecem citados como motivação da revolta entre os
manifestantes de 2013, segundo pesquisa do IBOPE
Outro elemento que retorna com certo vigor ao debate público é a “ação direta”, isto
pelo padrão de manifestações verificado no junho de 2013. Tal polêmica é suscitada
principalmente pelas ações promovidas pelos Black Blocs. A “ação direta”, bem como o
anarquismo ganham nova relevância social, no bojo destas manifestações, pela aparição dos
chamados Black Blocs (Blocos Negros), assim denominados em decorrência de sua
caracterização, marcada pelas vestimentas pretas. Apesar de ganharem maior relevância na
atual conjuntura, justamente por aparecerem aliados a manifestações de massas que eclodiram
em diversas localidades do País, os Black Blocs não são um novo sujeito. É possível
documentar aparecimentos esporádicos, com menos impacto social, da prática Black Bloc no
Brasil em outros momentos recentes de nossa História (CORRÊA, 2014). Porém, é importante
destacar que o Black Bloc não é a única manifestação de “ação direta” que ganha as ruas,
todavia como destaca Dupuis-Déri (2014) e Graeber (2009), estes ganham mais destaque via
imprensa por serem mais facilmente enquadrados no estereótipo de anarquista antissocial e
violento. O MPL, também não passa desapercebido da grande mídia, suscitando polêmicas

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causadas pelo seu modelo de ação direta, que se caracteriza pelo trancamento de vias e liberação
de catracas do transporte público, que acaba por gerar conflitos, podendo ser facilmente
apresentado pelos mesmos estereótipos que cabem ao Black Bloc. Como observam Graeber
(2009) e Depuis-Déri (2014), estes aspectos da ação direta promovidos pelos movimentos
libertários e anarquistas suscitam interpretações enviesadas.

Como observado, destacam-se neste processo que culminou nas “jornadas de junho”,
grupos que sustentam a prática da “ação direta”, em especial as organizadas e coordenadas pelo
MPL (Movimento Passe Livre), movimento que contesta não somente o transporte privado,
bem como a apropriação da cidade, assim como a própria forma de política da tradicional
esquerda dos anos 1980 e 1990. O MPL parece influenciado pelo do federalismo em seu sentido
libertário, pois é uma federação nacional de coletivos, que atuam de forma autônoma, baseada
em princípios comuns. (ORTELLADO, 2013) (POMAR, 2013), (LIBERATO, 2006). Há uma
clara relação do MPL com os princípios e práticas anarquistas, todavia no sentido trazido por
Mintz (2006), ao termo “libertário”, compreendendo este como expressões do anarquismo em
meio a espaços que não tem propriamente a identidade anarquista, pois participam destes
movimentos pessoas desvinculadas da ideologia em seu sentido doutrinário.

Deve-se destacar ainda um terceiro grupo de anarquistas, ligados a noção política da


ação direta, que se colocam dentro da tradição por assim dizer “clássica” do anarquismo, por
buscar suas referências nas obras de Bakunin, Malatesta e do Grupo Dielo Trouda, dentre
outros, ou seja, nas obras que de alguma maneira acabam por sintetizar a proposta de
organização política anarquista revolucionária. Sustentam a ideia de organizações anarquistas,
ou seja, que possuam recorte ideológico e métodos de formação e seleção de militantes, assim
como programa e estratégia definidos. Tais organizações compreendem que devem estar
inseridas em movimentos sociais (de massa), para que, por meio de sua influência sobre as
classes exploradas, possam dar início a um processo de revolução social, ou seja, uma ruptura
com o atual modelo organizativo da sociedade. Tal representação do anarquismo se encontra
atualmente em grande medida, mas não somente, encarnada no Brasil, naquilo que se autodefine
como CAB (Coordenação Anarquista Brasileira), esta agrupa algumas coletividades de
anarquistas espalhadas pelo Brasil, que sustentam tais propostas em uma coordenação.
Consideramos tanto o MPL, Black Blocs e CAB como parte de um mesmo “campo” ideológico,
o anarquismo.

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A despeito do Black Bloc ter sua origem na Alemanha da década de 1980, aparecendo
em meio a contracultura e movimento ecologista, sua popularização se deu já nos anos 1990,
por meio da difusão midiática, tendo como episódio emblemático as manifestações em Seatle
no ano de 1999, onde os Black Blocs “ganham o mundo”, por meio dos meios de comunicação
de massa. Anteriormente seus ideias eram difundidos por meio de publicações anarquistas e
contra culturais, bem como sobre ecologia. (DEPUIS-DÉRI,2014). As manifestações da década
de 1990, eram em larga medida coordenadas pela Ação Global dos Povos (AGP), a qual passou
a existir nos idos de 1997. A AGP tem seu impulso por meio da convocação de um encontro
mundial contra o neoliberalismo, encabeçado pelo EZLN (Exército Zapatista de Liberação
Nacional), que simbolicamente se apresenta para o mundo no ano de 1994, por meio de um
levante armado que libera parte do território mexicano, no mesmo dia que em que se ratificava
o acordo que inaugurava o NAFTA, que por sua vez permitia a comercialização de terras sobre
a posse de comunidades indígenas denominadas “ejidales”. Tal evento deu início a um novo
ciclo de lutas contra a “globalização” e o “neoliberalismo”, cujo movimentos do mundo inteiro
(pelo Brasil, por exemplo, participa o MST), se articulando na AGP para conter o processo de
“neoliberalização”. A AGP organizou manifestações junto as cúpulas econômicas (ex.: A20,
G7, entre tantas outras), para se opor aos tratados que nestes espaços se realizavam. O Black
Bloc, como observado em uma dessas manifestações que será largamente televisionada, atinge
grande repercussão, em muito pelo seu tipo de “ação direta” que oscila entre a destruição de
“símbolos” do capital e a “autodefesa” da manifestação.

O MPL, por sua vez, aparece como um desdobramento regional , da organização da


AGP, que no Brasil se articulou muito em torno da luta contra a ALCA, na medida em que
alguns militantes passam a refletir acerca da necessidade de organizar lutas em torno de temas
locais, enquanto a AGP se organizava em torno de cúpulas econômicas que ocorriam em
diversos pontos do globo. (LIBERATO, 2006) (ORTELADO,2013) (POMAR, 2013)
(GENNARI,2005) (LUDD, 2002) (DUPPUIS-DÉRI, 2014).

A CAB (antigo FAO- Fórum do Anarquismo Organizado) também tem forte vínculo
histórico com a AGP, contando para a sua formação com militantes que são advindos tanto da
luta pelo transporte (MPL), como de históricos militantes que se formaram em meio a
organização da AGP. Estes militantes acabaram entendendo a necessidade de uma organização
política anarquista que formasse e coordenasse militantes para atuar em meio aos movimentos

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sociais. Deste modo pode-se definir que tanto Black Blocs, CAB, como o MPL, são parte do
amplo “campo” do movimento anarquista, sendo participes de um mesmo processo histórico
de reaparecimento, expansão e articulação de práticas de “ação direta”, características do
anarquismo.

O anarquismo, como “campo” político, pode ser dividido ao menos em duas grandes
tradições, uma relacionada a ações de tipo “insurrecional” e outra que tem como grande mote
a organização política das “massas” exploradas. Tais tipos de manifestação política do
anarquismo, geram diferentes padrões de “ação direta”. Pode-se localizar, por sua forma de
ação os Black Blocs, na tradição “insurrecional”, que compreende que a intensificação da ação
direta, em especial aquela que visa opor a força às instituições capitalistas, acabaria por acirrar
o conflito entre as classes e possibilitar um processo de ruptura. (CORRÊA, 2013)

O Black Bloc, devido tanto a seus modos organizativos, baseado em grupos de


afinidade, assim como na formação espontânea, tem suas práticas facilmente identificadas com
o insurrecionalismo. Também se aproxima da tendência insurrecional, por ter espaço destacado
para o enfrentamento físico, a oposição de força (real ou simbólica) ao sistema capitalista e suas
instituições como central em sua estratégia de ruptura, nesse sentido movendo pouco esforço
na construção de organizações de massa.

O MPL, aparece dentro de uma tradição de “massa” do anarquismo, com a reserva que
são mais parte daquilo que denominamos movimento “libertário”, visando acumular forças
sociais, via lutas de curto prazo, para que em algum momento possa mobilizar essas forças
sociais de forma definitiva, por meio do processo que se compreende como revolução
social.(CORRÊA,2014). A CAB deste modo, também pode ser vinculada a tradição de
“massas”, com a diferença que se caracteriza como uma organização política de recorte
anarquista, que busca por meio de sua influência em movimentos sociais, coordenar um
processo de transformação da sociedade no sentido do socialismo libertário.

Neste “campo”, que é o anarquismo, se opõem duas grandes “representações” da


tecnologia, onde como observado o Black Bloc aparece como uma das expressões, vinculada a
contracultura e insurrecionalismo, daquilo que seria um “pessimismo” tecnológico, ou mesmo
“determinismo”, ao passo que o MPL, assim como as organizações anarquistas da CAB,
aparecem atravessadas pela visão da “ecologia social” (direta ou indiretamente). A ecologia

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social, compreende a necessidade de reorganização/reapropriação da tecnologia para outros
fins, em muito sintetizados pelo pensamento de Murray Bookchin, uma das principais
influências desde a formação da AGP e de seu antecessor o Reclaim The Streets (LIBERATO,
2006,). Boockchin defende que a questão ambiental, assim como outros malefícios
provenientes da técnica, estão mais conectados com o modelo societário capitalista, do que a
uma característica intrínseca da própria técnica, aliando a discussão ambiental com problemas
de caráter social. A visão de Bookchin aparece como oposta à de autores libertários “anti-
tecnológicos”, como Moore (2016), expoente daquilo que ficou conhecido como
“primitivismo”, que chega a afirmar a necessidade de abandono de toda “civilização” por esta
ser considerada como responsável por toda o processo de alienação humana, e mesmo a
Bonnano (2007), um anarquista insurrecionalista, que aponta a “tecnologia industrial” como
primeiro elemento a ser destruído, por ser responsável pela exploração dos trabalhadores.

Problematiza-se deste modo, as “representações” acerca da tecnologia, notando que


estas tem certa influência no padrão de “ação direta” adotada pelos diferentes vieses do
anarquismo. Deste modo, partimos da hipótese que as diferentes “representações” da tecnologia
que circulam no campo do “anarquismo”, destacadamente nesta onda que se dá nos anos 1990
(CORRÊA,2013), tem relação com o padrão de ação direta. Percebe-se neste debate,
indiretamente, a presença de categorias que são caras ao campo da CTS (Ciência Tecnologia e
Sociedade), como “essencialismo/pessimismo” (CABRAL, 2006) (BAZZO) que aparecem em
tensão com as noções de “sociotécnica” (LIMA FILHO & QUELUZ, 2005). É, assim, possível
fazer uma aproximação destas categorias de destaque da área CTS, as primeiras se aproximando
do campo “insurrecional” e a segunda do campo de “massa”.

REFERENCIAL TEÓRICO

Partimos das definições do anarquismo presentes na obra de Corrêa (2014), onde o


anarquismo é definido como uma ideologia política voltada para prática, surge das contradições
e lutas dos trabalhadores, sendo formalizadas por intelectualidades imersas no movimento. Está
baseada na crítica a dominação estatal e exploração capitalista, propondo a supressão de ambos
via ação revolucionária; isto é, a derrocada violenta do Estado e tomada dos meios de produção,
implementando práticas Socialistas Libertárias, através do federalismo político e autogestão

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econômica. Corrêa(2014) ainda compreende, que o anarquismo surge em meio a um contexto
histórico definido, de formação do capitalismo, ou seja, de ampliação da força de trabalho
assalariada, das relações de exploração do trabalho mediadas pela propriedade privada,
urbanização da sociedade, emergência do racionalismo, bem como formação dos Estados
Nacionais. Segundo o mesmo autor, tais elementos da então modernidade que se formava,
foram fundamentais para o desenvolvimento do movimento anarquista, que surge justamente
em meados do fim do século XIX e início do século XX, por meio das práticas organizacionais
de um setor da I Associação Internacional dos Trabalhadores. (CORRÊA, 2014).
Corrêa (2014), ainda destaca certo reducionismo nas tentativas de construir
historiografias do anarquismo, que quando não focam em grandes personalidades, acabam por
focar em episódios históricos muito específicos, acabando por reduzir em muito a história do
anarquismo, e mesmo fazendo este parecer um fenômeno pontual, abrindo margem a várias
interpretações equivocas que circulam sobre o anarquismo e sua história. Neste sentido, o autor
sugere a adesão ao estudo do anarquismo por meio de “ondas”, que busca compreender o
anarquismo por meio de recortes históricos em suas diferentes manifestações ao longo da
história, inspirando-se nas obras dos estudiosos sul-africanos do anarquismo Lucien Van der
Walt e Michael Schimidt. Para ele, seriam ao menos 5 ondas do anarquismo. (CORRÊA, 2014)
O período que estudaremos nos remete a quinta onda, localizada justamente entre a década de
1990 e início dos anos 2000.

Localizamos nosso objeto de estudo justamente entre meados dos anos de 1994 e 2013,
buscando compreender que relação tem as diferentes representações acerca da tecnologia e as
práticas da ação direta em meio ao anarquismo, no contexto do Brasil. Como apresentado na
introdução, tomaremos como representativos de expressões ligadas ao pensamento anarquista,
três sujeitos que se fazem presentes nesta retomada do anarquismo, onde dois acabam por se
apresentar mais propriamente no campo do anarquismo, que são o Black Bloc e as organizações
políticas anarquistas (no caso as organizações da CAB). O MPL acaba por se incorporar naquilo
que Mintz (2006) afirma ser o movimento “libertário”, pois este reflete práticas anarquistas sem
ter necessariamente este viés de forma clara, justamente por somar às suas práticas os sujeitos
não anarquistas. Estas três manifestações do anarquismo, surgem em meio ao seu processo de
ressurgimento internacional, disparado em larga medida pela formação da AGP. O Black Bloc
aparece em meio as próprias ações da AGP, sendo MPL e CAB, em alguma medida, parte dos

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desdobramentos da retomada da ação direta, e resgate do pensamento anarquista. (LIBERATO,
2006) (POMAR, 2013) (ORTELADO, 2013 ).

O Black Bloc, como já apontado, difunde-se em grande medida por meio de veículos de
comunicação em massa, bem como por meio de materiais ligados ao pensamento anarquista,
ecologista e contra cultural (DEPUIS-DÉRI, 2014). O MPL, aparece ainda em 2005, em certa
medida como desenvolvimento da AGP (ORTELDO, 2013), também em resposta a necessidade
de organizar um movimento que desse conta da pauta do transporte, que fazia eclodir revoltas
de massa em cidades como Salvador e Florianópolis e na ausência de uma organização que
catalisa-se tal força social, especialmente a “velha” esquerda alvo de críticas dos adeptos da
AGP, neste caso aparecendo como adversário a UNE (União Nacional dos Estudantes
(Movimento Passe Livre) (POMAR, 2013).

A CAB, fruto do FAO (Fórum do Anarquismo Organizado), fundado ainda em 2002,


que se transformou na CAB em 2012, é fruto do entendimento da necessidade de retomada da
organização política anarquista. A CAB absorveu parte da militância que forma a quinta onda
do anarquismo, sendo uma das expressões desta no Brasil. Sua origem remonta ao contato de
anarquistas gaúchos com a Federação Anarquista Uruguaia, ainda na década de 1990. Em
grande medida este agrupamento, visa a reconstituição do anarquismo organizado como
partido, para reinserção em movimentos sociais de massa. (OASL & FARJ, 2012).
Essas expressões, acabam por representar as duas grandes tendências do anarquismo, se
configurando como as manifestações destas no Brasil. Por um lado, o Black Bloc vinculado a
uma perspectiva insurrecional, e por outro o MPL e a CAB apresentando uma perspectiva de
massas. Como destacado, estas correntes acabam por representar, frente a tecnologia, posições
distintas. O Black Bloc quando pensado em relação ao insurrecionalismo, e mesmo frente a
suas inspirações nos grupos de afinidade, e formação em meio a grupos ligados ao pensamento
ecologista e contraculturais, se vê vinculado a perspectivas que rechaçam a
tecnologia.Bonnano, um dos principais nomes da literatura e mesmo prática insurrecionalista
defende o ataque a tecnologia industrial (2007). Quando relacionado ao primitivismo, corrente
anarquista, em grande medida ligada a contracultura e ao pensamento ecologista, encontra-se
o rechaço completo a qualquer modo de tecnologia, como no texto de Moore (2016) “Uma
Introdução Ao Primitivismo”, onde se propõem o abandono completo de qualquer técnica
moderna, e mesmo, da tecnologia de maneira geral. Por sua vez, vemos a CAB, diretamente

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inspirada pelas reflexões acerca da tecnologia presentes em autores como Boockchin, que
pregam o redimensionamento da tecnologia, refutando o “irracionalismo” primitivista. O MPL
aparece influenciado por tal autor, pois como aponta Liberato (2006), Boockchin seria um dos
grandes inspiradores da AGP por suas reflexões sobre a ecologia.

Como vemos, aqui, se encontram em oposição as definições de tecnologia dentro do


“campo” anarquista. Tais representações acerca da técnica, como destacado anteriormente, se
refletem na prática política da “ação direta”. A “ação direta”, como observa Guimarães (2009),
representa a forma política que tem a proposta anarquista, se referindo tanto a ação política,
compreendida como ação não mediada, como a proposta educativa e de propaganda. Note-se
que para o insurrecionalismo e primitivismo, correntes que estão em contato com o Black Bloc,
o rechaço a tecnologia tem papel central, neste sentido o padrão de ação direta deve ser de certo
modo influenciado por tal esquema de pensamento. Ao mesmo tempo que nas correntes de
massa, se pensa a necessidade de reorganizar tecnologia, visando superar problemas
relacionados a alienação, meio ambiente e mesmo exclusão.

Tal tensão que se encontra disposta no anarquismo, é convergente com aquela que
anima os debates CTS desde a década de 1970 (BAZZO, 2003), na oposição que se faz entre
certo “pessimismo” e mesmo “essencialismo” (CABRAL, 2006) da tecnologia, que consiste no
pensamento que interpreta a mesma como essencialmente negativa, ou seja, insalubre ao meio
ambiente e alienante ao ser humano, ao “triunfalismo” (BAZZO, 2003), ponto de vista que
encarava de forma positiva todo progresso tecnológico, assumindo mesmo uma visão
evolucionista e linear da técnica. À estas visões “essencialistas”, se encontra oposta a uma visão
denominada por Lima Filho & Queluz (2005) como “sociotécnica”, ou seja, a noção que a
tecnologia é constituída historicamente, conectada a um contexto social, e logo não deve ser
dissociada do mesmo, visão em certa medida similar àquela sustentada em grande medida pelos
autores do anarquismo localizados no campo de “massas”.

METODOLOGIA

Este trabalho, cabe sublinhar, faz parte de uma pesquisa mais ampla cuja ideia geral, é
por meio de entrevistas buscar a compreensão do universo anarquista, e suas representações a
respeito da tecnologia. Tal texto, é fruto de parte do trabalho para a elaboração de projeto de

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pesquisa e mestrado “Do Determinismo Tecnológico a Ecologia: Quando o Anarquismo se
Encontra com a área da Ciência Tecnologia e Sociedade (CTS)” .
Por meio do levantamento bibliográfico se buscou mapear as principais representações
de tecnologia que marcam o anarquismo e seus dois grandes campos, o “insurrecional” e o de
“massas”, e que papel tais correntes atribuem a tecnologia em seus marcos teóricos e em seus
processos de transformação política. Por outro lado, se elaborou uma pesquisa prévia para maior
conhecimento dos sujeitos que escolhemos como representativos das correntes do anarquismo
na realidade brasileira, bem como, a consulta a documentos elaborados pelos mesmos.
Cabe destacar neste, que se optou, pelo arcabouço conceitual sugerido por Bourdieu.
Esta escolha deu-se pela opção em tratar o anarquismo como um “campo”, onde se encontram
diferentes representações de tecnologia em disputa. “Campo”, na compreensão de Bourdieu, é
entendido como um espaço de determinadas “lutas simbólicas”. Buscamos compreender quais
as “lutas simbólicas” que se estabeleceram no campo anarquista em relação as “representações”
de tecnologia, e de que forma estas se relacionam com a formação de um “habitus”, sistema de
práticas dos agentes, no caso a militância anarquista em suas diferentes expressões, cujas
práticas se referem a seu modelo de ação direta. Partimos também das observações de Chartier
(2002) que percebe que as ideias, logo, as “representações” acabam por expressar muito além
de consciências individuais, mas uma “mentalidade” de um período histórico, logo se referem
a elementos sociais e históricos.

CONCLUSÕES/CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio de nosso trabalho preliminar, de pesquisa e levantamento bibliográfico, foi


possível concluir que a ação direta, modelo de ação política anarquista, está relacionada as
diversas representações de tecnologia dos diferentes grupos libertários. Percebemos que uma
das principais correntes do anarquismo, a corrente insurrecional, assume a tecnologia como um
dos principais elementos a serem eliminados para a promoção do fim da alienação humana,
sendo a representação da mesma fundamental para compreender seu modelo de ação. No
mesmo sentido a tecnologia, ocupa lugar importante, dentro daquilo que é a perspectiva de
massas, pois a despeito de esta criticar as relações sociais que regem a tecnologia no
capitalismo, há a convicção na necessidade de socialização de conhecimentos e da própria
tecnologia em uma sociedade libertária.

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REFERÊNCIAS

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CABRAL, Carla Giovana. Pelas telas, pela janela: o conhecimento dialogicamente situado.
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