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Para contextualizar seus conceitos, Anderson parte dos novos estados americanos do
final do século XVIII e início do XIX, e utiliza alguns exemplos essenciais para defender
sua tese. Estes estados eram, como ele nos apresenta, crioulos, e neste momento
histórico lutavam por sua libertação. Um dos motivos para este anseio era o fato de que
os primeiros imigrantes americanos, que habitavam a América não eram aceitos como
governantes desses estados. Para governá-los, eram emitidos espanhóis moradores da
Espanha, o que gerou grande descontentamento em meio à elite crioula. Ou seja, os
crioulos não compreendiam e não aceitavam que não pudessem ter autonomia dentro de
seus estados e que eram necessários habitantes da Espanha para governá-los sendo que
eles tinham descendência hispânica.
Para contribuir com a insatisfação,
Com o surgimento dessa linguagem política usada para construir uma legitimidade e o
surgimento das identidades, os discursos tomam como base símbolos e metáforas, ou
seja, criam imagens na mente dos receptores desse discurso. Em 1878, por exemplo,
percebe-se o uso desses discursos incutidos no processo de Independência da América
Espanhola. E a eficácia política desse uso é incontestável. Enfim, são discursos políticos,
baseados em metáforas e instrumentos retóricos que ambicionavam difundir no
imaginário popular imagens que contribuíssem efetivamente com a ascensão dos chefes
políticos, nesse caso, da elite crioula.
Outro ponto de vista que permeia a década de 1980 é a do historiador marxista Eric J.
Hobsbawm. Confrontando efusivamente as teses supracitadas, defendidas por Benedict
Anderson, ele inicia o capítulo “O protonacionalismo popular”, em sua obra, Nações e
nacionalismo desde 1780: Programa, mito e realidade, contrapondo, já nos primeiros
parágrafos, as idéias de que a língua, a religião, a imprensa e a legitimidade emocional
são os elementos chave na formação de uma identidade nacional. Para ele, “nenhum dos
(...) tipos pode ser legitimamente identificado com o nacionalismo moderno” [4].
(...) não há razão para supor que a língua tenha sido apenas mais um entre os
muitos critérios pelos quais as pessoas pertenciam simbolicamente a uma
coletividade humana. E é absolutamente certo que a língua não tinha ainda um
potencial político. [e] (...) as línguas multiplicaram com o Estado, e não o contrário.
[5]
Sob este aspecto, a contraversão existente entre a teoria de Benedict Anderson e Eric
Hobsbawm é incontestável. Pode-se dizer, ainda, que a segunda foi resposta à primeira.
Isso fica claro quando se nota o questionamento feito por Hobsbawm sobre a linguagem e
a imprensa, sendo o primeiro desses elementos evidenciado com o texto do autor,
transposto acima. Além disso, este autor enfatiza sua crítica a Anderson, elencando
elementos da teoria marxista. Ele faz isso, por exemplo, ao destacar que as nações são
baseadas em dois pontos divergentes, os de baixo e os de cima. A saber, a classe
dominante e a classe dominada, o que deixa claro o teor marxista de suas constatações.
Todos estes fatores só contribuem para uma conclusão: Benedict Anderson atenta-se
mais às questões culturais, enquanto Hobsbawm, preocupado com as classes e divisões
sociais, leva esta questão à discussão relacionada às teses marxistas.
Outro autor, que se insere nesta discussão, só que num contexto posterior, é Antônimo
Mitre [6]. Podemos notar a essência das reflexões de Mitre em uma passagem em que ele
analisa O Facundo de Sarmiento. Quando ele afirma,
(...) é fato reconhecido que o destaque que Sarmiento confere à biografia visa a
desentranhar, por essa via, os traços essenciais da cultura e as chaves do processo
histórico que encarnariam, de maneira exemplar, nas personalidades
representativas de uma época.
Com esta breve menção, ele se mostra mais adepto da teoria de Benedict Anderson,
na qual a imprensa assume papel fundamental na difusão do espírito nacionalista em
meio às comunidades.
Para clarear um pouco a hermética discussão proposta por Mitre acerca da metáfora
do espelho, é essencial recorrer à literatura. Sobre a metáfora do espelho, por exemplo,
Marcelo Rubens Paiva disserta: “O espelho nos dá esta sensação mágica de,
subitamente, tomar consciência de si mesmo. É o momento que você se encontra com o
que você representa para o mundo” [7]. Neste sentido, Mitre defende a tese de que as
pessoas se reconhecem, dentro de uma “comunidade imaginada”, para lembrar Anderson,
como se vissem a si diante do espelho, e essa imagem é retorcida. Enfim, nos olhamos
com o olhar de quem nos observa externamente. Um exemplo, no caso do Brasil: se os
franceses acreditam que o rodeio é um elemento representador do Brasil, passamos a
acreditar nessa idéia e nos vermos como “o país do rodeio”. Nesse caso, estaríamos
“naturalizando” um dos elementos, como sendo o verdadeiro representante, quando na
verdade, existem muitos outros fatores possíveis de serem elencados como representante
da cultura brasileira, ela é vasta o suficiente para isso. Estaríamos, portanto, nos vendo
no espelho como os outros nos vêem. Esta “naturalização” aproxima-se com a teoria de
Anderson, quando propõe que, geralmente, na formação de uma identidade nacional, faz-
se do novo, antigo, além, é claro, dos esquecimentos ou negligencias que se faz do
passado de uma nação, em detrimento de lembranças que, na verdade, são interesses da
linguagem política.
Com efeito, as três discussões são fundamentais para a compreensão desse momento
histórico em que entra em cena as questões do nacionalismo e a atenção dos
historiadores para elas. Marxista, Eric Hobsbawm defende a existência dos “de baixo” e
dos “de cima”, como forjadores da nacionalidade, e não da imprensa e da língua como
difusores e principais meios pelos quais se criaram estas “comunidades imaginadas”.
Sendo estas últimas defendidas por Benedict Anderson, historiador experiente que tem
sua obra consagrada na historiografia. Enfim, coube a discussão de Antonio Mitre com
texto mais fechado e que trás à luz os estudos pós modernos, bem como se utiliza da
metáfora do espelho para inserir seu debate naquele concernente à formação das
identidades nacionais latino-americanas, contribuir para esta discussão sobre o conceito
de nacionalidade.
O texto “Pioneiros Crioulos”, de Benedict Anderson, tem como objetivo analisar quais elementos
favoreceram os movimentos de independência nas Américas entre os séculos XVIII e XIX. Há
diversos elementos a se considerar nesse processo, mas o autor chama especial atenção para o papel
dos pioneiros crioulos. Sinteticamente, tratava-se daquelas pessoas nascidas na América, mas de
pais europeus. Aqui, tornaram-se proprietários de terras em sua grande maioria, mas também
comerciantes e profissionais liberais.
Em termos de status, espanhóis natos tinham mais credibilidade, tanto que eram eles quem
ocupavam os cargos mais significativos na Colônia. Com o passar do tempo, os crioulos se
tornaram numerosos e passaram a exercer bastante influência e até pressão pelo seu lugar na
administração da colônia. Segundo Anderson, foram precisamente as comunidades crioulas que
desenvolveram as primeiras concepções na América do ser nacional. Na visão do autor, após três
séculos de colonização, os crioulos redefeniram as populações das suas províncias coloniais como
pertencentes a uma mesma nação; fizeram da Espanha a sua inimiga e transformaram o império
hispano-americano em dezoito Estados independentes. Segundo o autor (2005, p. 80), acredita-se
que os crioulos estimularam os movimentos de independência nas províncias coloniais (sobretudo
na Venezuela, México e Peru), por recearem a “mobilização política das ‘classes inferiores’: a saber,
sublevações dos índios ou dos escravos negros”. Apesar de esse argumento ser bastante plausível,
ele aponta que antes disso há outros dois fatores recorrentes para explicar a organização desses
crioulos em torno dos processos de independência. Que fatores são esses? A maior firmeza do
domínio de Madrid sobre a colônia, bem como a propagação de ideias liberalizantes a partir do
século XVIII.
A maior firmeza de domínio de Madrid se deu em forma de centralização administrativa na mão de
peninsulares natos, aumento e criação de novos impostos e maior monopolização do comércio. Já o
alastramento de ideias liberalizantes trouxe consigo a ideia de republicanismo. Enfim, o autor
apresenta então esses três motivos plausíveis: o medo dos crioulos de que as classes dominadas se
sublevassem, o maior rigor do domínio de Madrid e o alastramento das ideias liberalizantes vindas
da Europa. Sim, esses argumentos são plausíveis, mas, segundo Anderson, ainda não explicam
adequadamente o impulso independentista que se deu na América, hispânica sobretudo. O autor
passa então a desenvolver o seu argumento de que as independências foram possíveis devido ao
papel dos crioulos em fazer com que as suas províncias administrativas passassem a se imaginar
como membros pertencentes a uma mesma comunidade. Ou seja, esses crioulos não entrariam em
conflito com o poder espanhol apenas por interesses políticos e econômicos, mas também porque
agora se imaginavam como membros de uma mesma comunidade e a que se propunham defender.
Com se deu a formação dessa comunidade imaginada? O autor desenvolve o seu argumento, como
segue explicado nos próximos parágrafos.
Segundo Anderson (2005, p. 83), citando Masur, “cada uma das novas repúblicas sul-americanas
fora uma unidade administrativa do século XVI ao século XVIII”. Muitas dessas unidades
administrativas surgiram de forma arbitrária, imprevista, “mas com o decorrer do tempo, acabaram
por adquirir uma realidade mais consistente sob a influência de fatores geográficos, políticos e
econômicos”. Além disso, o Império era imenso, o que favorecia com que essas unidades se
convertessem em zonas econômicas separadas e de difícil comunicação com as demais, obrigando-
as a desenvolverem sua autonomia. Com o passar do tempo, essas porções administrativas
ganharam sentido em termos de unidade e afetividade, ou seja, a consciência de que partilhamos
dos mesmos problemas, estamos e queremos estar aqui juntos.
Um dos principais problemas compartilhado por maior parte dos crioulos era não ter os mesmos
privilégios dos peninsulares na administração da colônia, sendo barrados na ocupação de cargos
estratégicos. Além de não poderem ocupar os cargos mais representativos, essa situação gerou entre
os crioulos o sentimento de exclusão. No início da colonização não era um problema, mas com
passar das décadas e duas viradas de séculos, a Coroa viu-se diante de um problema incontrolável.
Suas colônias já não estavam nas mãos dos peninsulares, mas de uma numerosa geração de crioulos
insatisfeitos com a Metrópole e unidos pelo mesmo sentimento de exclusão. Na visão do autor, esse
conflito com os peninsulares contribuiu entre os crioulos na formação de consciências nacionais.
Outro fator de peso foi a maior incidência dos jornais locais, sobretudo a partir do século XVIII,
estimulando os leitores à prática de se imaginarem como parte de uma formação própria, com
existência e problemáticas específicas de outras porções administrativas e mergulhadas dentro de
um universo maior que era o Império Espanhol.
Em síntese, o autor busca mostrar que a resistência crioula foi concebida já em termos de
consciência nacional, tendo sido crucial para a formação dos movimentos independentistas que
tomaram a América nos séculos XVIII e XIX.
Referências: