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Nasci e fui criado em Araraquara, uma cidade do Interior que fica bem no centro do
Estado de São Paulo. Araraquara possui uma característica muito interessante: uma parte da
população tem sotaque interiorano bastante carregado, enquanto que outra não tem sotaque
nenhum. Adivinhe em que lado da população eu fui criado? Evidentemente entre aqueles que
falam com sotaque bem acentuado. Quando me mudei para a capital, com 21 anos de idade,
de vez em quando observava algumas pessoas cochichando e sorrindo, provavelmente por
causa da minha maneira de falar. Pensava no assunto, mas não me incomodava, pois os
grupos me aceitavam bem e eu fazia amizades com facilidade. Entretanto, aos 24 anos,
quando resolvi me tornar professor de expressão verbal, percebi que o sucesso da nova
carreira poderia estar associado à minha maneira de falar.
Imagine eu ministrando cursos e palestras em todos os cantos do País e orientando os
alunos com aquele erre arrastado do interior paulista: "Laéérrrcio, você está toorrrto". Lógico
que perderia muito da minha força como professor dessa matéria. Por isso, fiz um
treinamento autodidata intenso, durante muitos anos, para eliminar qualquer vestígio do
sotaque interiorano. Mesmo assim, quando estou bem à vontade, despoliciado, tratando de
assuntos amenos, principalmente entre os familiares, vez ou outra acaba escapando um piirrr
ipipiirrr.
No meu caso, portanto, mudei minha maneira de falar por causa de uma necessidade
profissional, para poder sobreviver em uma atividade que exigia comunicação isenta daquela
marca tão característica da minha região natal.
Mas nem sempre é assim. Há alguns anos recebi um aluno que havia tomado posse
como ministro. Ele, assim como eu, tinha sido criado em uma cidade do interior do Estado de
São Paulo e por isso falava com sotaque forte, até bem mais acentuado do que aquele que
eu levara na bagagem quando saí de Araraquara. Bem, com essa minha "autoridade para
corrigir sotaque", depois do trabalho que havia feito comigo mesmo, em pouco tempo propus
um treinamento que eliminou cerca de 80% da sua pronúncia interiorana. A partir daí meu
conselho foi para que continuasse com os 20% remanescentes, por dois motivos. Primeiro,
porque a pasta que ele havia assumido estava naturalmente ligada aos assuntos do Interior e
seu leve sotaque poderia funcionar como ponto de identificação com os ouvintes. Segundo,
por causa da credibilidade que conservaria se continuasse falando daquela maneira. Essa
questão da credibilidade originada do sotaque interiorano merece uma análise mais
cuidadosa.
Embora a decisão final deva ser sua, alguns fatores precisam ser considerados para
que você saiba se deverá ou não eliminar o sotaque: a compreensão da pronúncia, o efeito
na avaliação e a possibilidade de resistência do ouvinte.
A compreensão da pronúncia
Já que estou citando a experiência de como meu amigo português preservou a forma
de falar de seu filho, vale a pena discutir um pouco sobre a maneira de tratar nosso sotaque
quando estamos em contato com pessoas de outros países. Certa vez, em uma entrevista
nas páginas amarelas da Veja, um cientista disse que não se importava em falar com
sotaque porque ele não era espião, pois só os espiões deveriam ter essa preocupação,
senão, seriam descobertos pelos inimigos.
Essa é uma boa sugestão de conduta. Não se preocupe com o fato de falar em uma
outra língua com sotaque, mesmo porque, por mais perfeita que seja sua pronúncia, as
pessoas saberão que você é de outro país. Quanto melhor for sua pronúncia e menos
sotaque tiver, mais eficiente será sua comunicação, mas não se pressione pelo fato de estar
se expressando em outra língua com algum tipo de sotaque.
Nessa circunstância, o que contará no contato com habitantes de outros países será
seu conhecimento, seu preparo e como você considera e respeita os hábitos culturais das
pessoas que irão ouvi-lo. Leve em conta também que para alguns povos a maneira
característica de falar dos habitantes de determinados países é muito agradável. Quem sabe
se as pessoas com as quais você deverá se relacionar não sejam de um país que o vê
assim, dessa maneira positiva.
Um conselho final
Mudar a maneira de falar não é uma decisão simples e fácil de ser levada a cabo. Por
isso, reflita bem antes de se decidir sobre a melhor forma de agir e leve sempre em conta o
seu desejo mais sincero. Não se sinta violentado pela decisão que tomar. Se resolver
eliminar o sotaque, analise se está certo de que o sacrifício será compensado pela melhor
qualidade de relacionamento e melhoria na eficiência da comunicação. Se, entretanto, julgar
que é conveniente continuar falando com sotaque que o identifique como oriundo da sua
região natal, meça bem as conseqüências dessa sua atitude e vá em frente. Em qualquer
situação faça o que for melhor para você e boa soorrrte!
Reinaldo Polito
Revista Vencer nº 48