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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE
- Professor das disciplinas "Processo Legislativo Constitucional" e "Direito Consti-
tucional" em cursos de Graduação e Pós-Graduação em Brasília-DF.
- Analista Processual do Ministério Público da União (Procuradoria Geral da Repú-
blica, Brasília-DF).
- Assessor Jurídico de Subprocurador-Geral da República.
- Especialista em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito
Público (IDP).
- Professor de Direito Constitucional de vários cursos preparatórios para concur-
sos em Brasília-DF, Palmas-TO e João Pessoa-PB.
- Professor da Escola Superior de Advocacia do Distrito Federal (ESA-DF).
- Instrutor Interno do Ministério Público Federal.
- Autor de "Roteiro de Direito Constitucional" (4ª Edição); "Legislação Aplicada
ao MPU" (2ª Edição); "Lei nº 8.112/90 Comentada Artigo por Artigo"; "Processo
Administrativo" (3ª Edição) e "Servidor Público" (3ª Edição).
- Membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC), do Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) e ex-professQr da Escola Superior do
Ministério Público da União (ESMPU).

PROCESSO
LEGISLATIVO
CONSTITUCIONAL
o

I I
WWW.EDITORAjUSPODIVM.COM.BR
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

5.4.3. Matéria OBS: resoluções que possuem efeitos externos: delegação legis-
Essa diferença já apontada traz, por conseguinte, uma outra dis- lativa (art. 68, §2 Q ); matéria tributária (art. 155, §l Q , IV; §2 Q , IV e V,
tinção: a matéria (=conteúdo) a ser tratada por cada um desses dois b); suspensão da eficácia de lei declarada inconstitucional pelo STF
instrumentos normativos. em controle difuso (art. 52, X), entre outras.
Assim, enquanto os decretos legislativos tratam das matérias pre-
vistas no art. 49 da CF (e também no caso do art. 62, § 3 Q ), as resolu- 6. MEDIDAS PROVISÓRIAS
ções servem para regulamentar os temas previstos nos artigos 51 e
6.1. Antecedentes históricos e direito comparado
52 da Carta Magna.
As medidas provisórias foram inseridas no ordenamento jurí-
5.4.4. Efeitos dico brasileiro com a Constituição de 1988. Representam, portan-
Mais uma vez, estamos diante de uma regra geral - que admite to, uma inovação da Carta Cidadã. Porém, o modelo de legislação
exceções, é verdade, mas que pode ser útil no estudo da matéria. pelo Poder Executivo não era inédito no Mundo, muito menos no
sistema constitucional brasileiro.
Os decretos legislativos produzem efeitos externos (atingindo
outros poderes, além do Legislativo, e também os particulares), en-
quanto as resoluções produzem,geralmente, efeitos meramente in- 6.1.1. A Legislação pelo Poder Executivo: aspectos históricos
ternos, interna corporis (atingem apenas a própria Casa Legislativa Montesquieu já defendia que o Executivo não poderia legislar
que as edita). (faculdade de estatuir), mas deveria participar da legislação impe-
Excepcionalmente, as resoluções podem ter efeitos externos. É o dindo determinadas decisões parlamentares (faculdade de impe-
caso, por exemplo, da delegação legislativa, que se faz por resolução dir, ou veto propriamente dito 226).
do Congresso Nacional (art. 68, § 2Q); da resolução do Senado que Porém, vários autores - principalmente no Século XX - revisi-
suspende a eficácia de lei declarada inconstitucional em controle di- taram a teoria clássica da "separação de poderes". Podemos citar,
fuso pelo STF (art. 52, X); da resolução senatorial que fixa alíquotas por exemplo, Marcel de La Bigne de Villeneuve, que, em 1934, já
máximas de determinados tributos, como o ICMS (art. 155, § l Q , IV). enxergava o esgotamento e a decadência do princípio da separa-
Quadro: diferenças entre Decretos Legislativos e Resoluções: ção de poderes. Numa monografia intitulada La Fin du Principe de
Séparatíon des Pouvoírs 227 ("O Fim do Princípio da Separação de
Decretos Legislativos Resoluções Poderes"), cuja segunda parte era sintomaticamente denominada
Câmara ou Senado (exceto nos Elimination de la Théorie de la Séparation des Pouvoirs, o francês
casos de delegação legislativa, defendia que, no contexto histórico do século XX, era impossível
Competência Congresso Nacional
em que a Resolução é do Con-
gresso)
fazer reviver o dogma em questão, ainda que de forma adaptada
ou relativizada 228.
Art. 49 Art. 51 e 52; art. 68; art. 155,
Matéria
~ art. 62, §3º §1º, IV, e §2º, V, b

Internos (interna corporis), 226. Cf. CARVALHO NETTO, Menelick de. A Sanção no Procedimento Legislativo.
Belo Horizonte: Del Rey; 1992.
exceto alguns casos, como dele-
gação legislativa, matéria tribu- 227. VILLENEUVE, MareeI de La Bigne de. La Fin du Principe de La Séparation des
Efeitos Externos Pouvoirs. Paris: Sirey; 1934.
tária, suspensão da eficácia da
lei declara inconstitucional pelo 228. "(...) la théorie de la Séparation des Pouvoirs, strietement prise dans les terms
STF em controle difuso, etc. employés par Montesquieu, est rationallement et pratiquement inacceptable (..).
Tels sont cette tentative d'adaptation et de rejeunissement de la doctrine de Mon-

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Pregava, arrimado no declínio do Estado Liberal- que já vinha nio do Estado Liberal. E já defendia que o Executivo forte, exigido
dando mostras de saturação, uma atuação forte e centralizadora pelo Estado Social, deveria ter uma parcela do poder de legislar.
do Executivo 229 , enfeixando em si as prerrogativas de ação e di-
reção 230 , numa nova doutrina de todo adaptada aos movimentos
6.1.2. Antecedentes no Direito Brasileiro: os Decretos-Lei
intervencionistas da década de 30, como o New Deal que Roose-
velt implantaria nos Estados Unidos da América para fazer frente Surgidos em 1937, com o Golpe do Estado Novo e a outorga da
à crise econômica desencadeada com o crack da Bolsa de Nova Constituição de 1937 (vulgarmente conhecida como a Polaca) por
Iorque, em 1929. Getúlio Vargas, os Decretos-Lei configuravam uma forma de legis-
lação editada pelo Poder Executivo, com a homologação pelo Legis-
Para tanto (dizia), era necessário abolir a teoria da separação
lativo. Todavia, como o Parlamento permaneceu fechado durante
dos poderes, com vistas a se permitir uma concentração de pode-
todo o período ditatorial (1937-1945), na verdade o Brasil foi regi-
res na esfera do Executivo, para que esse pudesse desempenhar
do, inteira e exclusivamente, por decretos editados pelo Presidente
satisfatoriamente o fim estatal do bem comum. Como toda teoria
da República, com força da leiZ31.
revolucionária, é certo que a doutrina engendrada por Villeneuve
não foi isenta de exageros e de uma boa dose de radicalismo. Mas A figura do decreto-lei foi abolida com a Constituição democrática
também é certo que, se por um lado defendia uma desmesurada de 1946, mas ressurgiu com o Ato Institucional nº 2, de 1964, que
concentração de poderes na esfera do Executivo, por outro alertou atribuía ao Presidente da República o poder de editar decretos-lei,
para o esgotamento da "separação de poderes" como dogma e para ad referendum do Congresso Nacional, nas matérias relativas à segu-
o redesenho das relações entre os órgãos da soberania com o declí- rança nacional. Com a Constituição de 1967, o campo de edição dos
decretos com força de lei foi ampliado, para permitir sua edição tam-
bém em matérias financeiras e administrativas. Interessante notar,
também, que, nessa segunda fase dos decretos-lei, a não apreciação
stesquieu (. ..) ils naus semblent inneficaces et rains (...), et insoutenables aussi do ato pelo Congresso Nacional no prazo constitucionalmente des-
bien au point de vue de la raison qu'à celui de l'expérience". VILLENEUVE. Op. crito implicava a aprovação do decreto, que se transformava em lei
Cit., pp. 65-75. Numa tradução livre: "a teoria da Separação dos Poderes, estrita- por decurso de prazo (instituto que não mais existe no Brasil). E, pior,
mente presa aos termos empregados por Montesquieu, é, racional e praticamen- mesmo se o decreto-lei fosse rejeitado pelo Congresso, os efeitos já
te, inaceitável (...) Talo são [também] as tentativas de adaptação e renascimento produzidos continuavam necessariamente válidos, pois a rejeição se
da doutrina de Montesquieu (. ..) elas nos parecem ineficazes e falhas (.. .), e inacei-
táveis tanto do ponto de vista da razão quanto da experiência".
dava com efeitos ex nunc, e não ex tunc (retroativos)232.
229. "Cette autorité, ce pouvoir [o Executivo], dont le rôle est de fondre dans une im- :1.1

mense et souple synthêse tous les besoins divers et les intérets légitimes de la com-
Eis o texto da Constituição de 1967 (já com a Emenda nº 1, de
munauté étatique, doit nécessairement être unique, puisque, dans sa sphêre, il est 1969):
souverain.". Idem, ibidem, p. 79. Tradução livre: "Esta autoridade, este poder [o
Executivo], cujo papel é fundir em uma imensa e flexível síntese as necessidades Art. 55. O Presidente da República, em casos de urgência ou
diversas e os interesses legítimos da comunidade estatal, deve necessariamente de interêsse público relevante, e desde que não haja aumento
ser único, dado que, na sua esfera, é soberano.".
230. "Le gouvernment ne se borne pas, en eftet, à exécuter l'ordre ou le mandat
d'autrui; il a une activité primaire; il decide; il ordonne pour son propre compte 231. Cf. Constituição de 1937, arts. 11 a 14.
et dans as propre sphêre. Même quand il se borne à apliquer la loi, il garde (. ..) une 232. Cf. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Sa-
large faculte d'appréciation". Idem, ibidem, p. 89. "O governo não se limita, em raiva, 2010, p. 1288. Contra, considerando que a rejeição poderia ter efeitos
efeito, a executar a ordem ou o mandato de outro; é uma atividade primária; ele retroativos (ex tunc), confira-se: MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Co-
decide; ele ordena por sua própria conta e em sua própria esfera. Mesmo quando mentários à Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, de 1969, tomo IH.
a
se limita a aplicar lei, ele guarda (. ..) uma larga faculdade de apreciação.". São Paulo: RT, 1973, p. 161.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

de despesa, poderá expedir decretos-leis sôbre as seguintes Art. 77 da Constituição Italiana de Art. 62 da Constituição Brásil~ira
matérias: 1947 (tradução livre) de 1988 (redação original)
I - segurança nacional; O Governo não pode, sem delegação das
Câmaras (art. 76) editar decretos com Sem correspondência no art. 62.
Il - finanças públicas, inclusive normas tributárias; e força de lei ordinária.
III - criação de cargos públicos e fixação de vencimentos. Quando, em casos extraordinários de
Em caso de relevância e urgência,
necessidade e urgência, o Governo adota,
§ 1 º - publicado o texto, que terá vigência imediata, o de- o Presidente da República poderá
sob sua responsabilidade, provimentos
creto-lei será submetido pelo Presidente da República ao adotar medidas provisórias, com
provisórios com força de lei, deve no
Congresso Nacional, que o aprovará ou rejeitará, dentro de força de lei, devendo submetê-las
mesmo dia apresentá-los para conversão
sessenta dias a contar do seu recebimento, não podendo de imediato ao Congresso Nacional,
às Câmaras, que, ainda se estiverem dis-
que, estando em recesso, será con-
emendá-lo, se, nesse prazo, não houver deliberação, aplicar- solvidas (em recesso), deverão ser espe-
vocado extraordinariamente para se
-se-á o disposto no § 3º do art. 51 233 • (Redação dada pela cialmente convocadas para se reunir em
reunir no prazo de cinco dias.
cinco dias (arts. 61 e 62).
Emenda Constitucional nº 22, de 1982)
Os decretos perderão a eficácia desde o Parágrafo único. As medidas pro-
§ 2º A rejeição do decreto-lei não implicará a nulidade dos
início, se não convertidos em lei no prazo visórias perderão eficácia, desde a
atos praticados durante a sua vigência. de sessenta dias de sua publicação. As edição, se não forem convertidas em
Câmaras podem, todavia, regulamentar lei no prazo de trinta dias, a partir
por meio de lei os efeitos jurídicos produ- de sua publicação, devendo o Con-
6.1.3. Antecedentes no Direito Comparado: os provvedimenti zidos com base no decreto não convertido gresso Nacional disciplinar as rela-
provvisori italianos e outros casos (rejeitado)*. ções jurídicas delas decorrentes.

A Constituição Italiana de 1947 prevê, no art. 77, a possibili- *. Texto original em italiano: "li Governo non puà, senza delegazione delIe Camere
dade de o Governo (Poder Executivo) adotar, "em casos extraordi- [76], emanare decreti che abbiano vaIare di legge ordinaria.
nários de necessidade e urgência", provimentos provisórios ou de- Quando, in casi straordinari di necessità e di urgenza, íl Governo adotta, sotto la
sua responsabilità, provvedimenti provvisori conforza di legge, deve ílgiorno stesso
cretos-Iegge ("provvedimenti provisori") com força de lei. Foi nessa presentarli per la conversione alIe Camere che, anche se sciolte, sono appositamente
fonte que o Constituinte Brasileiro de 1988 bebeu para "importar" convocate e si riuniscono entro cinque giorni [612, 622].
a figura das medidas provisórias. I decreti perdono efficacia sin dalI'inizio, se non sono convertíti in legge entro ses-
santa glOrnz dalIa Iara pubblicazione. Le Camere possono tuttavia regalare con
Senão, comparemos os textos do art. 77 da Constituição Italia- legge i rapporti giuridici sorti sulIa base dei decreti non converti ti':
na com a redação original (antes da EC 32/01) do art. 62, de nossa
Constituição: Como se percebe, a redação original do art. 62 da nossa Constitui-
ção era uma cópia fiel, com pouquíssimas alterações, do texto do art.
77 da Constituição Italiana.
Lá, os decreto-Iegge (como são conhecidos os atos decorrentes
dos provimentos provisórios adotados pelo Governo) são formal-
233. Este dispositivo, por sua vez, previa: "Na falta de deliberação dentro dos prazos
estabelecidos neste artigo e no parágrafo anterior, cada projeto será incluído au- mente editados pelo Chefe de Estado (o Presidente da República)
tomaticamente na ordem do dia, em regime de urgência, nas dez sessões subse- a pedido do Governo (chefiado pelo Primeiro-Ministro). Ressalte-
qüentes em dias sucessivos, se, ao final dessas, não for apreciado, considerar-se-á -se que a Itália é uma República parlamentarista. Nesse contexto,
definitivamente aprovado". Era a aprovação do projeto por decurso de prazo:
podia uma decreto-lei transformar-se em lei sem ter havido deliberação do Con-
o Presidente tem a obrigação de editar o decreto-legge solicitado
gresso!
pelo Governo, sendo de praxe, porém, reconhecer que o Chefe de

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
fim, apenas para
Portuguesa de 1ficar
97 nos
6exemplos
' m aIs
. conheCIdos,
. a Constituição
Estado pode devolver o provimento provisório ao Governo para "me- permIte, no art 201 a ed' - d e d ecretos-Iei
que em algum h' , ., Iça0
lhor análise"234. lam~nto238. as Ipoteses, sequer precisam ser ratificados pelo Par-
É preciso notar, porém, que o decreto-Iegg e é adotado sob a res-
ponsabilidade do Governo (Conselho de Ministros). Num sistema de
governo parlamentarista, isso significa que o Governo (inclusive o 6.1.4. Medida provisória no Brasil, a " . . -
original do art. 62) . pnmelrageraçao" (redação
Primeiro-Ministro) pode cair se o decreto for rejeitado pelo Legis-
lativ0 235 . Na redação original de 1988 (e é .
noção histórica, para que se po ImlhPortante que se tenha essa
o prazo de validade dos decreti-Iegge é de sessenta dias, mas se _ ssa me or compreender a d'f'
caçoes trazidas pela EC 32/01) as medo . , . s mo 11-
admite a reiteração (reedição) do ato, sempre que demonstrada pelo editadas pelo Presidente da Re ' 'bl" Idas provlso~las podiam ser
Governo a persistência da situação excepcional de necessidade e ur- (pois, em tese, não havia limit ~u ~ca acerca de quaIsquer matérias
gência. Essa a nova orientação tomada pela Corte Constitucional Ita- Constituição Italiana). Inclusi~~oesS e tema, co~o também não há na
permitia a edição de MPs acerc '~ ~~re.mo Tnbunal Federal, se não
236
liana, na Sentença nº 360/1996 .
É de se notar que não só a Itália abriga em seu ordenamento a fossem benéficas ao réu 239 alg a e hlr~lto_penal.' a; admitia quando
, ' o que oJe nao maIs e possÍveP40.
fugira dos decretti-Iegge. Na verdade, essa forma de legislação pelo Tambem no regime anterior
Executivo é bastante comum na Europa. Como afirma Brasilino Pe- mática das medid . , . à alter
. açao - constItucIOnal
.. na siste-
as proVlsonas taIs proviment .
reira dos Santos, em estudo específico sobre as medidas provisórias nham prazo de validade de 30 d: os excepCIOnais ti-
no Brasil e no Direito Comparado: "Os decretos-leis têm uma certa podiam ser reeditadas pelo pre~~~~::sd:e~~;~~l~;o;~ Sl~!~;mda,
tradição no Direito Constitucional europeu"237. vezes, d entro do prazo legal d ' e e
É o que dispõe a Súmula n~ p:~r~~a;Tr~e o pr~zo cons~it~~ion~l.
Na Alemanha, A Grundgesetz (Lei Fundamental de Bonn, 1949)
prevê, no art. 81, a possibilidade de o Chanceler (Chefe de Gover- aPdreciada pelo Congresso Nacional podia, a ~t: ~~d~~alf;~~lsona nda~
ta a dentro do seu pra d fi ' . . I" ser ree I-
no) declarar o estado de necessidade legislativa. Na França, existem de lei desde a primeir:~di~;:';~cza de tnnta dias, mantidos os efeitos
as ordonnances (ordenanças), com força de lei, que podem ser edi- que uma medida "provi ' . " '. sso gerava a situação esdrúxula em
tadas inclusive em casos de necessidade e urgência ou em matéria apreciada pelo Congres:~r~:c~~~~~~va por longos anos, sem ter sido
de finanças públicas. Na Espanha, o art. 86 da Constituição de 1978
(nitidamente inspirado na experiência italiana) permite ao Executivo Sobre o tema, Ednilton Andrade Pires noticia que:
editar decretos com força de lei, mas ressalva algumas matérias. Por

clalmente europeu, na citada obra' SANTOS B ?o Dlrelt~ Comparado, espe-


238. C.f. toda a exposição detalhada dos decretos-lei ..
234. Cf. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida Provisória e sua Conversão Provisórias no Direito Com
e ss.
d ' rasIlmo PereIra dos. As Medidas
para o e no Brasil. São Paulo: LTr, 1993, pp. 101
em Lei. São Paulo: RT, 1994, p. 71.
235. Como noticia José Levi Mello: "Diferentemente do que se sugere na doutrina bra-
sileira, a rejeição 90 decreto-legge não gera a automática queda do Conselho de 239. Em julgado anterior à EC 32/01 o STF'
ria: sua inadmissibilidade em 't"
.
assIm se manIfestara: "Medida provisó-
Ministros italiano (no mesmo sentido é a prática no parlamentarismo espanhol), . ma erIa penal extraída I d .
em que pese minar a força e a credibilidade do Governo, podendo, até mes-
mo, em alguns casoS, prenunciar a sua queda". Idem, ibidem, p. 84.
nOls benéficas, assim, as que abolem crt
da .mterpretação sistemática da Constit i _' _ pe a outrma consensual
çao, nao compr~ende a de normas pe-
gam ou abrandem penas ou am liam osmes ou Ih~s res!rmgem o alcance, extin-
236. Cf. texto integral (em italiano): http://www.cortecostituzionale.it/giurispru-
denza/pronunce/schedaJndice.asP?Sez=indiCe&Comando=LET&NoDec=360 julgado em 08.11.20ÓO).'
t
de punibilidade" (STF Pleno R/254 818 C;: de Isen~ao de pena ou de extinção
c O
. , e ator Mmlstro Sepúlveda Pertence,
&AnnoDec=1996&TrmD=&TrmM=.
237. SANTOS, Brasilino Pereira dos. As Medidas Provisórias no Direito Compara- 240. CF, art. 62, §l Q , I, b.
do e no Brasil. São Paulo: LTr, 1993, p.151.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

mais. ser convocado extraordinariamente. Por outro lado, ficou


''A permissão da reedição de medida provisória, comumen- conslgn~do que, ~~ a~gumas matérias, o Presidente não pode edi-
te atribuída ao Supremo Tribunal Federal foi, na verdade, tar m~dldas provlsonas. Ademais, a apreciação das MPs passou a
primeiramente uma decisão do Congresso Nacional. (... ) Em ser feita. por cada ca~a ~o_ Congresso, de forma isolada. Passou a
março de 1989 (...) publicou-se o parecer da comissão, no ser p~evI.sta na CAonstltmçao a apreciação prévia dos requisitos de
qual o Congresso Nacional admitia formalmente a reedição
relevanCla e urgencia ~a MP por uma comissão mista de Deputa-
de medidas provisórias"241.
dos e S~n~dores. Por fim, restou explicitado na Constituição que
Outra característica que marcava as medidas provisórias no pe- a MP reJeltad~ perde os efeitos ex tunc, mas, se o Congresso não
ríodo pré-EC 32 era que a rejeição da MP pelo Congresso Nacional regular, em ate 60 dias, os efeitos da medida rejO eitada .. -
produzia, automaticamente, efeitos retroativos (ex tunc), devendo o valerá ex nunc. ' a reJelçao
Legislativo regular a eficácia da medida (por meio de decreto legisla-
tivo). Ademais, a apreciação da medida (para aprová-la ou rejeitá-la) Uma tabela sintetiza as principais alterações 243 :
era feita conjuntamente por ambas as Casas do Congresso Nacional
_ o qual, se não estivesse reunido, deveria ser convocado extraordi- Antes da EC 32/01 Depois da EC 32/01

nariamente. Prazo de vigência 30d + 30d + 30d+ 30d... 60d + 60d


Vejamos agora, brevemente, as principais alterações trazidas pela Apreciação pelo Sessão da cada Casa isoIada-
Sessão conjunta
EC 32/01. Congrésso , mente
Congresso em Convocado para sessão
Prazo da MP fica suspenso
6.1.5. Medida provisória no Brasil: a "segunda geração" (art. 62, recesso legislativa extraordinária
na redação da EC 32/01) Restrição explícita
Não Sim
A EC 32, de 2001, trouxe substanciais modificações na normatiza- deIl1àtérili$ •
ção das medidas provisórias. O art. 62 tornou-se mais analítico, limi-
tando o poder do Executivo de editar MPs. Passou-se do "regime da
.'
Reedição Sim
Não (apenas prorroga-se a
validade por mais 60 dias)
reedição" para o "regime do sobrestamento"242. Expliquemos. "~c

Sim, a partir do 45º dia de


Sobrestalllento da
Até a EC 32/01, as medidas provisórias valiam por 30 dias, mas Não vigência da MP sem aprecia-
pauta
podiam, se não apreciadas pelo Congresso, ser reeditadas inúmeras "
ção do Congresso
,cc i
vezes. Após a reforma constitucional, passaram as MPs a ter prazo Ex tunc, devendo ser Ex nunc, se o Congresso não
de vigência de 60 dias, prorrogáveis (automaticamente) por mais 60 Efeitos da rejeição regulados pelo Con- regulamentar os efeitos da
dias. Mas, passados 45 dias da edição, a Casa do Congresso em que gresso rejeição em até 60 dias
esteja tramitando a MP passa a ter a pauta sobrestada ("trancada"):
não pode deliberar sobre nenhum outro projeto, antes de votar a
6.2. Conceito
MP.
Outra modificaç~o da EC 32/01 foi que o prazo da MP não mais . P~d.e-se conceituar medida provisória como um ato normativo
pnmano, excepcional no quadro da separação de poderes, editado
corre durante os recessOS do Congresso, que também não precisa

241. PIRES, Ednilton Andrade. A Medida Provisória e sua Evolução Constitucio-


nal. In: Ensaios sobre impactos da Constituição Federal de 1988 na socie-
dade brasileira, vol. 2. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008, p. 583. 243. A tabela se baseia, também, na obra citada de Ednilton Andrade Pires.
242. Idem, ibidem, p. 584.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

pelo Presidente da República em matérias relevantes e situações de Por fim, deve ficar claro que a medida provisória, uma espécie
urgência, e sujeita a condição resolutiva 244 . Analisemos esse conceito. de legislação pelo Executivo, não é a regra no esquema da sepa-
ração de poderes. Realmente, a função de legislar é prerrogativa
Primeiramente, fica claro que a medida provisória é um ato nor-
principal do Legislativo. Qualquer ato editado pelo Presidente da
mativo primário. Isto é: retira seu fundamento de validade direta-
República no exercício da função legislativa, ou com força de lei
mente da Constituição; pode criar direitos e obrigações; tem, no di-
(lei delegada, medida provisória, decreto autônomo) configura
zer da Constituição, "força de lei" (art. 62, caput). Não é lei, pois nela
uma exceção, e como exceção deve ser interpretado (ou seja, deve
só se transformará se for aprovada pelo Congresso Nacional; mas,
enquanto isso, vale como se lei fosse. Dito de outra forma: é um proje- ser encarado de forma restritiva).
to de lei que já vale como se lei fosse.
6.3. Pressupostos de validade
Ademais, está sujeita a condição resolutiva. Expliquemos.
A medida provisória, com a natureza excepcional que tem, só
Condição é a cláusula que subordina os efeitos de um ato jurídi-
deve (ou deveria) ser utilizada pelo Presidente da República em
co (nesse caso, a medida provisória) a um evento futuro e incerto.
situações absolutamente (permita-se a repetição) excepcionais.
Existem, segundo a doutrina e a legislação, dois tipos de condições:
Nesse ponto, é bastante significativo o nome que se dá na Alema-
as suspensivas e as resolutivas. No primeiro caso, o ato jurídico não
nha à Legislação pelo Executivo: estado de emergência legislativa.
vale até que se implemente a condição. Já na segunda hipótese (con-
dição resolutiva), o ato jurídico vale, mas deixará de produzir efeitos Por isso mesmo, as medidas provisórias, no Brasil, só podem
se ocorrer a condição. ser utilizadas para tratar de matérias relevantes, importantes,
fundamentais. É inconstitucional, por violação ao art. 62 da Cons-
Esse último quadro é o que reflete a figura da medida provisó-
tituição, medida provisória que trate, por exemplo, de matérias
ria. Editada pelo Presidente da República, deve ser imediatamente
secundárias, como instituição de loteria para auxiliar os clubes de
publicada e remetida ao Congresso para apreciação. A partir daí, co-
futebol (como infelizmente já tivemos).
meçará a correr o "prazo de validade" (ou melhor, de vigência) da MP
(sessenta dias, prorrogáveis por mais sessenta). Se, nesse período, o Mas existe outro pressuposto constitucional para a edição de
Congresso rejeitar a medida ou não apreciá-la, o ato perderá, deixará MPs, e que deve ser preenchido cumulativamente com aquele já
de produzir efeitos (condição resolutiva). Caso, porém, a medida seja citado (relevância): é a urgência. Com efeito, o normal é que o Pre-
votada e aprovada pelo Congresso, pode-se dizer, grosso modo, que sidente da República, como detentor da iniciativa de projetos de
deixará de ser uma medida provisória para se transformar em lei, de- lei (art. 61, caput e § 1 º), remeta as matérias que julgar pertinen-
finitivamente (quer dizer, até que seja revogada por outra lei).Como tes sejam regulamentadas ao Congresso, por meio de projeto de lei.
afirma José Afonso da Silva, as medidas provisórias são "sujeitas a Nos casos em que considere essa aprovação absolutamente urgente,
uma condição resolutiva, ou seja, sujeitas a perder sua qualificação poderá remeter o projeto junto com a mensagem de urgência, o que
legal no prazo de 120 dias"245. fará com que o Legislativo delibere sobre o projeto no prazo máximo
de 100 dias (descontados os períodos de recesso) - ver art. 64, §§
244. O conceito é de Paulb Gustavo Gonet Branco, para quem "as medidas provisórias 2º a 4º. Apenas nos casos em que nem mesmo esse prazo de 100 dias
são atos normativos primários, sob condição resolutiva, de caráter excepcional
no quadro da separação de poderes". BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Curso
de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 838. No mesmo senti-
do: FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Op. Cit., p. 246.
245. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 838. Em verda-
Maleiros, 2006, p. 534. No mesmo sentido: BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. de, aponta o citado autor, a expressão original é de Pontes de Miranda.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

É o que ocorre com a medida provisória, que, nos ca-


't do é que o Presidente estaria autorizado a editar sos de urgência e relevância, seria justificada no sistema
pudesse ser respel a ,A'" 246
medidas provisórias, com vlgencw lmedzata , , parlamentar"247.
Da singela análise desse quadro, já se vê que a ediç~o de medIdas Na verdade, ao contrário do que afirma Nelson Jobim, tratou-se,
, " deveria configurar um verdadeiro aconteClmento, e~ ,ca- sim, de uma improvisação do ordenamento brasileiro, que, na ânsia
provlsonlas 'd d u'blica Não é porém o que se verifica na pratica,
sos de ca aml a e p , , ' de substituir os antigos decretos-lei, importou, sem quaisquer cui-
Todos os Presidentes da República, desde a CF /88, esme~a:a~­ dados, o instituto italiano, Trata-se de uma cópia deslavada (des-
olume de medidas provlsonas culpem-nos a expressão), como comprovamos ao fazer a compara-
~s;i;~::~!:~~:: ~~;~:~:s:~~~: ;:d: se~ credit~do
ao déficit de es- ção do art, 77 da Constituição Italiana com o texto original do art.
, 'to republicano da política brasileira, e, tambem, refl~xo do nosso 62. É o que já advertiam, em certa medida, Adílson Mota e Michel
p~n " 1 (que "importou" do parlamentansmo um me- Temer, em debates na Assembleia Constituinte de 1987 248 .
sIstema constituclOna 'd 'r ta) e
, da tá-lo devidamente ao sistema presl enCla lS
~:~:c~~~~;en~o da Constituição pelos três poderes da República. Permitimo-nos, novamente, discordar de Nelson Jobim, para
quem a introdução das medidas provisórias no texto do projeto de
A rimeira causa do excesso na edição de medid~s provisórias é, Constituição já constava da emenda que propunha o presidencia-
p li' 't "importação" da figura dos prove- lismo. Realmente, poderia até constar, mas é preciso lembrar que o
ndo entendemos, a ma leI a
~~!~enti provvisori italianos (um in~ti~uto do sistema parlamenta- projeto original da Constituição era parlamentarista, Com a adoção
rista) para o nosso sistema presidenClahsta de governo, do presidencialismo (diga-se, quase em cima da hora), o instituto
da medida provisória ficou "isolado". Se, num modelo parlamenta-
Veja-se o que diz, a respeito, Ives Gandra da Silva Martins~ .
rista, serve de fórmula para garantir ao Executivo alguma margem
liA medida provisória é instrumento de produção legl~la:lVa de ação independentemente do Parlamento, ao ser inserida no sis-
copiado do modelo italiano e idealizado pelo constltumte tema presidencialista a medida provisória serviu para criar uma
para um sistema parlamentar de governo. espécie de "hiper-presidencialismo".
O esforço bem-sucedido do Presidente Sarney em d~rr~bar
o modelo parlamentarista, que orientou os ~on_stlt~mtes Veja-se a precisa análise de André Ramos Tavares:
durante os trabalhos nas Subcomissões e Coml~soes,. mcl~­ "( ... ) a medida provisória contextualiza-se mais exatamente
sive naquela de Sistematização, criou, em mUitos. dl.SpOSl- em sistemas parlamentaristas, uma vez que, em tais circuns-
. um descompasso entre a intenção do constltumte, o tâncias, todo e qualquer provimento provisório será edita-
t lVOS, I PI " ( )
modelo idealizado e o modelo plasmado pe o enano .... do sob responsabilidade (política) do Primeiro Ministro.
(... ) ocorrendo a rejeição, esta configura, automaticamente,
em tais sistemas, um voto de desconfiança em relação a seu
Chefe de Governo"249.

. VARES André Ramos. Curso de Direito Cons-


246. No sentido q~e defeh~emos. TA ' 1292. Da mesma forma, o Decreto n Q 247, MARTINS, Ives Gandra da Silva; BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Consti-
2010
titucional. Sao Paulo. sa;a~va, de ;e~'editada medida provisória sobre maté- tuição do Brasil, voI. 4, tomo I. São Paulo: Saraiva, 1995, pp. 427-428.
4,176/02, segundo o qua dna~ P~ro dos prazos estabelecidos pelo procedimento 248. Cf. PIRES, Ednilton Andrade. A Medida Provisória e sua Evolução Constitu-
ria "que possa ser aprova a en C t't' a-o" (art 40 V) Em sentido contrá- cional. In: Ensaios sobre impactos da Constituição Federal de 1988 na so-
A' 'sto na ons I wç .,. ciedade brasileira, voI. 2. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008, p. 581.
legislativo de urgenclQ prevI h' 't es o proJ'eto pode demorar muito
. c d d que mesmo nessas IpO es . 249. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva,
no, de~en en, o MARAL JÚNIOR José Levi Mello do. Medida ProviSÓrIa e sua
no LegIslativo. A ' 2010, p. 1288.
conversão em lei. São Paulo: RT, 2004, p. 151.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

Mas pode ser apontada uma segunda causa para o abuso na edi- rios, poderia a medida provisória ser declarada inconstitucional
ção de medidas provisórias: a omissão ou abuso dos poderes cons- quando evidentemente não preenchesse os pressupostos consti~
tituídos. O Executivo abusou das prerrogativas excepcionais que lhe tucionais. Vejam-se, a propósito, os precedentes seguintes, a título
foram atribuídas; e o Legislativo e o Judiciário se omitiram de frear meramente exemplificativo:
os arroubos do Executivo. "A edição de medidas provisórias, pelo Presidente da Re-
Com efeito, o Legislativo, a quem cabe rejeitar MPs que não pre- pública, para legitimar-se juridicamente, depende, dentre
outros requisitos, da estrita observância dos pressupostos
encham os requisitos de relevância e urgência, raríssimas vezes exer-
constitucionais da urgência e da relevância (CF, art. 62, "ca-
ceu esse poder. Por outro lado, o STF muitas vezes deixou de declarar put"). - Os pressupostos da urgência e da relevância, embora
inconstitucionais medidas provisórias irrelevantes ou não urgentes conceitos jurídicos relativamente indeterminados e fluidos,
por entender que a análise desses pressupostos é um ato discricioná- mesmo expondo-se, inicialmente, à avaliação discricioná-
rio do Presidente da República. ria do Presidente da República, estão sujeitos, ainda que
excepcionalmente, ao controle do Poder Judiciário, porque
Num primeiro momento, o Supremo Tribunal Federal entendeu
compõem a própria estrutura constitucional que disciplina
que, por se tratar de ato político, a medida provisória não se subme- as medidas provisórias, qualificando-se como requisitos
teria à análise do Judiciário, quanto aos pressupostos de relevância legitimadores e juridicamente condicionantes do exercício,
e urgência: pelo Chefe do Poder Executivo, da competência normativa
"não cabe ao Poder Judiciário aquilatar a presença, ou não, primária que lhe foi outorgada, extraordinariamente, pela
dos critérios de relevância e urgência exigidos pela Cons- Constituição da República. Doutrina. Precedentes. - A pos-
tituição para a edição de medida provisória (cf. ADIs 162, sibilidade de controle jurisdicional, mesmo sendo excepcio-
526,1.397 e 1.417)"250. nal, apóia-se na necessidade de impedir que o Presidente da
República, ao editar medidas provisórias, incida em excesso
Em sentido semelhante, confira-se: de poder ou em situação de manifesto abuso institucional
pois o sistema de limitação de poderes não permite que prá~
"No que concerne à alegada falta dos requisitos da relevân-
ticas governamentais abusivas venham a prevalecer sobre
cia e da urgência da Medida Provisória (que deu origem à Lei
os postulados constitucionais que informam a concepção
em questão), exigidos no art. 62 da Constituição, o Supremo
democrática de Poder e de Estado, especialmente naquelas
Tribunal Federal somente a tem por caracterizada quando
hipóteses em que se registrar o exercício anômalo e arbitrá-
neste objetivamente evidenciada. E não quando dependa
rio das funções estatais.
de uma avaliação subjetiva, estritamente política, mediante
critérios de oportunidade e conveniência, esta confiada aos UTILIZAÇÃO ABUSIVA DE MEDIDAS PROVISÓRIAS - INAD-
Poderes Executivo e Legislativo, que têm melhores condi- MISSIBILIDADE - PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODE-
ções que o Judiciário para uma conclusão a respeito"251. RES - COMPETÊNCIA EXTRAORDINÁRIA DO PRESIDENTE
DA REPÚBLICA.
Numa evolução jurisprudencial, a Corte passou a entender que,
embora os conceitos de relevância e urgência sejam discricioná- - A crescente apropriação institucional do poder de legislar,
por parte dos sucessivos Presidentes da República, tem des-
pertado graves preocupações de ordem jurídica, em razão
250. STF, Pleno, ADln 1667-MCjDF, Relator Ministro \lmar Galvão, DJ 21.11.1997. do fato de a utilização excessiva das medidas provisórias
No mesmo sentido: ADln 1376-MCjDF, Relator Ministro \lmar Galvão, DJ de
causar profundas distorções que se projetam no plano das
31.08.2001. relações políticas entre os Poderes Executivo e Legislati-
251. STF, Pleno, ADln 1717-MCjDF, Relator Ministro Sydney Sanches, DJ de
vo. - Nada pode justificar a utilização abusiva de medidas
25.02.2000.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

provisórias, sob pena de o Executivo - quando ausentes ra- Mesmo depois dessa evolução jurisprudencial, percebe-se que o
zões constitucionais de urgência, necessidade e relevância Presidente dispõe de um campo extraordinariamente amplo de dis-
material -, investir-se, ilegitimamente, na mais relevante cricionariedade para avaliar a relevância e urgência para a edição da
função institucional que pertence ao Congresso Nacional, medida provisória, pois nem o Legislativo cumpre seu dever de rejei-
vindo a converter-se, no âmbito da comunidade estatal, tar as MPs inconstitucionais, nem o STF as declara inconstitucionais,
em instância hegemônica de poder, afetando, desse modo, a não ser em casos extremos.
com grave prejuízo para o regime das liberdades públicas
e sérios reflexos sobre o sistema de "checks and balances", Valem ser conhecidas as ponderações de Celso Antônio Bandeira
a relação de equilíbrio que necessariamente deve existir de Mello, que defende (a nosso ver, como correção) a possibilidade
entre os Poderes da República. - Cabe, ao Poder Judiciário, de ampla apreciação pelo Judiciário dos pressupostos de edição das
no desempenho das funções que lhe são inerentes, impedir medidas provisórias:
que o exercício compulsivo da competência extraordinária
de editar medida provisória culmine por introduzir, no pro- "O Judiciário não sai de seu campo próprio nem invade
cesso institucional brasileiro, em matéria legislativa, verda- discrição administrativa quando verifica se pressupostos
deiro cesarismo governamental, provocando, assim, graves normativamente estabelecidos para delimitar uma dada
distorções no modelo político e gerando sérias disfunções competência, (sic) existem ou não existem. Uma vez que a
comprometedoras da integridade do princípio constitucio- Constituição só admite medidas provisórias em face de si-
nal da separação de poderes. - Configuração, na espécie, tuação relevante e urgente, segue-se que ambos são, cumu-
dos pressupostos constitucionais legitimadores das medi- lativamente, requisitos indispensáveis para a irrupção da
das provisórias ora impugnadas. Conseqüente reconheci- aludida competência. É dizer: sem eles inexistirá poder para
mento da constitucionalidade formal dos atos presidenciais editá-las. Se a Carta Magna tolerasse edição de medidas de
emergência fora destas hipóteses não haveria condicionado
em questão:'252.
sua expedição à pré-ocorrência destes pressupostos nor-
"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 11 E mativos. Segue-se que têm de ser judicialmente controla-
18 DA MEDIDA PROVISÓRIA N.º 1.925-5, SUCESSIVAMEN- dos, sob pena de ignorar-se o balizamento constitucional da
I,
I TE REEDITADA ATÉ O ADVENTO DA EMENDA CONSTITU- competência para editar medidas provisórias. Com efeito,
CIONAL N.º 32/2001. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 5.º, se 'relevância e urgência' fossem noções só aferíveis concre-
II CAPUT; 37, CAPUT, E 62, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDE-
II tamente pelo Presidente da República, em juízo discricioná-
RAL. rio seu, o delineamento e a extensão da competência para
Os dispositivos em referência, ao atribuírem aos órgãos de produzir tais medidas não decorreria da Constituição, pois
trânsito o registro de ônus reais sobre veículos automotivos teria o âmbito que o Chefe do Executivo lhes quisesse dar.
de qualquer espécie, não ofendem as normas constitucio- Assim, ao invés de estar limitado por um círculo de poderes
nais indicadas. Os requisitos de relevância e urgência estabelecido pelo Direito, ele é quem decidiria sua própria
para edição de medida provisória são de apreciação esfera competencial na matéria, ideia antinômica a tudo que
discricionária do Chefe do Poder Executivo, não caben- resulta do estado de Direito"254.
do, salvo os casos de excesso de poder, seu exame pelo
Poder Júdiciário. Entendimento assentado na jurispru-
dência do STF. Ação julgada improcedente"253.
254. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Perfil Constitucional das Medidas Provi-
sórias. In: CLÉVE, Clemerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto (orgs.). Doutri-
252. STF, Pleno, ADIn 2213-MCjDF, Relator Ministro Celso de Mello, Dj de nas Essenciais: Direito Constitucional, volume IV. São Paulo: RT, 2011, pP.
23.04.2004. 119-120. No mesmo sentido: GRAU, Eros Roberto. Medidas Provisórias na
253. STF, Pleno, A:DIn 2150jDF, Relator Ministro llmar Galvão, Dj de 29.11.2002. Constituição de 1988. In: CLEVE, Clemerson Merlin; BARROSO, Luís Rober-

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
IOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

medida provisória estadual, desde que, primeiro, esse ins-


6.4. Competência
trumento esteja expressamente previsto na Constituição
A edição de medidas provisórias é atribuição exclusiva do Presi- do Estado e, segundo, sejam observados os princípios e as
dente da República, na qualidade de chefe de governo (chefe do Exe- limitações impostas pelo modelo adotado pela Constituição
cutivo). Realmente, na esfera federal, apenas quem esteja exercendo Federal, tendo em vista a necessidade da observância simé-
a Presidência da República tem o poder de editar medidas provisó- trica do processo legislativo federal. Outros precedentes:
rias, com força de lei (CF, art. 62, caput). ADI 691, reI. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 19.06.92 e ADI
812-MC, reI. Min. Moreira Alves, DJ 14.05.93 .
Questão interessante, já resolvida pelo STF, dizia respeito à pos-
sibilidade de edição de medidas provisórias por governadores e pre- 3. Entendimento reforçado pela significativa indicação na
Constituição Federal, quanto a essa possibilidade, no capí-
feitos. tulo referente à organização e à regência dos Estados, da
Por um lado, a própria Corte reconhece (como já vimos) o princí- competência desses entes da Federação para 'explorar di-
pio da simetria, de forma que as regras gerais do processo legislati- retamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás
vo federal aplicam-se de forma automática aos Estados, ao DF e aos canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida pro-
Municípios. Também em favor da possibilidade de adoção de MPs na visória para a sua regulamentação' (art. 25, § 2º)"255.
esfera estadual, há a nova redação dada pela EC 5/95 ao § 2º do art.
25 da CF: "Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante con- 6.5. Limitações materiais
cessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a
edição de medida provisória para a sua regulamentação". Ora, se Ao contrário do ordenamento jurídico italiano, em que pode ser
não pode ser editada MP para regulamentar essa matéria, pode ser editado decretto-Iegge sobre quaisquer matérias, a EC 32/01 incluiu
várias limitações temáticas, vários assuntos que não podem ser vei-
editada em outros casos.
culados por meio de medidas provisórias. Nesse ponto, o ordena-
Mas, de outra parte, é certo que a medida provisória, como forma mento brasileiro aproximou-se mais do sistema constitucional espa-
de legislação pelo Executivo, é uma exceção, e as exceções não se pre- nhol, afastando-se da fonte italiana originalmente adotada.
sumem, devem vir expressas.
Porém, mesmo antes da citada EC 32/01, já existiam temas que
!li
I II
A solução que o Tribunal engendrou conseguiu atender a esses não poderiam ser tratados por medida provisória. Vejamos.
dois princípios: considerou que é válida a edição de medidas provi-
sórias por governadores e prefeitos (por simetria), mas desde que
6.5.1. Fundo Social de Emergência
haja previsão expressa na respectiva Constituição Estadual ou Lei
Orgânica Municipal ou do DF (por ser exceção, deve vir prevista ex- A Emenda Constitucional de Revisão nº 1, de 1994 (ECR 1/94)
pressamente). Ademais, devem ser respeitados os mesmos princí- criou um "Fundo Social de Emergência, com o objetivo de saneamento
pios e limitações previstos na Constituição Federal. financeiro da Fazenda Pública Federal e de estabilização econômica"
(ADCT, art. 71, na redação original da referida ECR 1/94). A mesma
Confira-se: Emenda incluiu no ADCT um art. 73, dispondo que, para a regula-
"(...) No julgamento da ADI 425, reI. Min. Maurício Corrêa, mentação do referido Fundo, "não poderá ser utilizado o instrumen-
DJ 19.12.03, o Plenário desta Corte já havia reconhecido, to previsto no inciso V do art. 59 da Constituição".
por ampla maioria, a constitucionalidade da instituição de

to. Doutrinas Essenciais: Direito Constitucional, volume IV. São Paulo: RT,
255. STF, Pleno, ADIn 2391/SC, Relatora Ministra EIlen Grade, Dl de 16.03.2007.
2011, p. 459.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Essa foi a primeira restrição explícita quanto ao conteúdo que Posteriormente, com o novo regime jurídico das medidas pro-
poderia ser veiculado por MP. visórias trazido pela EC 32/01, essa emenda pôs um termo final a
essa limitação, conferindo nova redação ao citado art. 246:

6.5.2. Exploração de gás natural canalizado pelos Estados-mem- "É vedada a adoção de medida provisória na regulamentação
de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada
bros por meio de emenda promulgada entre 1 Q de janeiro de 1995
A EC 5/95 criou aquela que foi a segunda restrição expressa até a promulgação desta emenda, inclusive".
à edição de medidas provisórias, quando dispôs, na nova redação A despeito da horrível técnica redacional do artigo, que se refere
dada ao § 2º do art. 25 da CF, que: a "esta emenda", embora tenha-se integrado no texto da Constitui-
"Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante con- ção, pode-se entender o que determina o dispositivo: não pode ser
cessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, editada medida provisória para regulamentar artigo da Constitui-
vedada a edição de medida provisória para a sua regu- ção cuja redação tenha sido alterada por emenda constitucional
lamentação". promulgada entre 1 º de janeiro de 1995 e a data da promulgação
da EC 32/01 (11 de setembro de 2001).
6.5.3. Regulamentação de matérias objeto de emenda constitu- André Ramos Tavares, com razão, critica veementemente essa
cional promulgada entre 1 Q de janeiro de 1995 e 11 de setembro vedação:
de 2001 "Trata-se da vedação mais aberrante que se poderia ter, já
que é totalmente aleatório o lapso temporal escolhido, bem
Com a eleição de Fernando Henrique Cardoso para Presidente
como as matérias vedadas (que só foram vedadas por força
da República (1994), pôs-se em prática, de forma mais efetiva, o
do período e não da matéria em si)"257.
programa nacional de desestatização. Uma das primeiras emendas
constitucionais aprovadas, com base nessas diretrizes, foi a que
quebrou o monopólio do petróleo. 6.5.4. Vedações expressas no art. 62, § 1 Q
1I,
lill Receoso de que o Executivo editasse seguidas MPs acerca dos O § 1 º do art. 62 da Constituição, incluído pela EC 32/01, pas-
monopólios que seriam quebrados por meio de medida provisória, sou a prever expressamente matérias que não podem ser objeto de
aprovou-se, na EC 6/95, a inclusão de um art. 246 na Disposições medida provisória.
Constitucionais Gerais, com o seguinte teor:
6.5.4.1. Nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos
uÉ vedada a adoção de medida provisória na regulamentação
políticos e direito eleitoral
de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada
por meio de emenda promulgada a partir de 1995"256. Trata-se de matérias em que é necessário um grau mínimo de
estabilidade jurídica, algo obviamente incompatível com a figura
da medida provisória, que é um ato normativo precário (=pode ser
256. Como noticia José Afonso da Silva: "O objetivo imediato [do art. 246] consistiu
derrubado a qualquer momento). Como ficaria, por exemplo, a situ-
em estabelecer limites de atuação do Poder Executivo quanto às leis mencionadas
nas Ecs-5, 6, 7 e 8 relativamente à regulamentação das matérias ali previstas ação de um estrangeiro que se tivesse naturalizado brasileiro com
que eram monopólios. E aí seu alcance é importante. Abriram-se os monopólios,
mas se estabelece regra de controle dessa abertura pelo Congresso Nacional". Cf.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: 257. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva,
Malheiros, 2006, p. 533. 2010, p. 1296.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

base em uma medida provisória, depois rejeitada pelo Congresso? Repita-se: hoje em dia é inconstitucional qualquer MP que seja edita-
Ademais, é difícil imaginar uma situação em que tais matérias de- da em matéria penal, mesmo que seja benéfica ao réu 261 •
mandassem uma regulamentação legislativa urgente, que justifi-
Por outro lado, é preciso ter cuidado: ainda pode ser editada MP
casse a edição de uma MP 258 .
em matéria de Direito Civil (direito material). O que não se pode é ter
Por outro lado, como lembra André Ramos Tavares, "há um elo MP sobre Direito Processual Civil. A explicação para essa distinção
que une todas essas referências. Nelas se pode constatar que qualquer é que o Direito Civil, por ser disciplina extremamente ampla, pode
mudança traria implicação direta ao processo eleitoral"259. demandar uma legislação de urgência, a ser veiculada por meio de
Por tais razões, o constituinte derivado resolveu retirar tais maté- medida provisória.
rias do âmbito material das medidas provisórias. Anote-se, a título de comparação, que o artigo 99, 3, da Constitui-
ção Argentina, proíbe a edição de "decretos de urgencia" (inspirados
6.5.4.2. Direito penal, processual penal e processual civil em nossas medidas provisórias) em matéria penal, tributária, eleito-
Antes da promulgação da EC 32/01, o Supremo Tribunal Federal ralou relativa a partidos políticos.
(com protestos de boa parte da doutrina) entendia ser possível a edi-
ção de medidas provisórias sobre as matérias aqui citadas - desde 6.5.4.3. Organização do Poder Judiciário e do Ministério Público,
que, obviamente, houvesse relevância e urgência. Podemos citar, por a carreira e a garantia de seus membros
exemplo, a medida provisória que instituiu a prisão temporária (MP Essa matéria também não pode ser objeto de delegação legislati-
nº 111/89, depois substituída pela Lei nº 7.960/89) e várias MPs que va (art. 68, § 1 º, I), o que justifica, ao menos num primeiro momento,
alteraram o Código de Processo Civil. Em matéria penal, a Corte ad- que também não possam ser veiculadas por meio de medida provi-
mitia a edição de MPs apenas in bonam partem, isto é, apenas para sória - até mesmo em respeito à separação de poderes.
beneficiar o réu 260 • Realmente, se a organização do Poder Judiciário e a previsão das
Com a promulgação da EC 32/01, porém, ficou vedada a edição de garantias dos seus membros é matéria de iniciativa privativa desse
medidas provisórias sobre quaisquer aspectos do Direito Processual mesmo Poder (CF, art. 93, caput, e art. 96, lI, b), nada mais lógico que
Civil, Processual Penal e Penal (ainda que seja para beneficiar o réu). a matéria não possa ser regulamentada unilateralmente pelo Chefe
do Executivo, por meio de medida provisória.
"Ademais", anota José Levi Mello, "as matérias ora enfocadas
são reservadas à lei complementar, o que, por si só, impede
a sua veiculação em medida provisória"262 (confiram-se os
258. Na Itália, em que não há limitações materiais expressas à edição de decretti-
-legge, foi julgado que não cumpria os requisitos de extraordinária necessidade
arts. 93, caput, e 128, § 5º, da CF).
e urgência (art. 77 da Constituição de 1947) decreto-lei sobre financiamento de
partidos políticos. Cf. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida Provisória
e sua conversão em lei. São Paulo: RT, 2004, pp. 72 e 137.
259. TAVARES, André Ramos, Op. Cit., p. 1296.
260. Nessa orientação antiga da Corte, confira-se o precedente seguinte: "Medi-
da provisória: sua inadmissibilidade em matéria penal, extraída pela doutrina
consensual da interpretação sistemática da Constituição, não compreende a de 261. Cf. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Op. Cit., p. 842. No mesmo sentido:
normas penais benéficas, assim, as que abolem crimes ou lhes restringem o alcan- AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida Provisória e sua conversão em
ce, extingam ou abrandem penas ou ampliam os casos de isenção de pena ou de lei. São Paulo: RT, 2004, p. 217.
extinção de punibilidade." (STF, Pleno, RE 254.818, Relator Ministro Sepúlveda 262. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., pp. 135-136. No mesmo sentido:
Pertence, DJ de 08.11.2000). BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, etal. Op. Cit., p. 841.

202 203
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

6.5.4.4. Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamen- Mas porque, dentre as várias espécies de crédito especiais (adi-
to e créditos adicionais e suplementares cionais, suplementares ou extraordinários), apenas uma (créditos
A fiscalização das finanças do Poder Executivo foi a primeira e extraordinários) pode ser veiculada por meio de MP? A resposta é
mais nobre função do Parlamento, desde o surgimento dessa Insti- simples: porque esse é o único tipo de crédito que só pode ser aberto
tuição, na Inglaterra Feudal. Segundo Rosah Russomano: "a função em situações absolutamente excepcionais.
das Câmaras, pertinentes ao consentimento dos tributos, antecedeu Na verdade, trata-se de uma "matéria típica de medida provisó-
sua função legislativa".263 ria': que "o próprio texto constitucional explicitamente confia" a essa
Dessa forma, a apreciação das leis sobre matéria orçamentária é espécie normativa 264 • Isso porque os créditos extraordinários devem
uma das principais funções do Legislativo, que ficaria sobremanei- ser abertos "para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como
ra esvaziado se o Presidente pudesse, nesses casos, editar medidas as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, ob-
provisórias. servado o disposto no art. 62". Note-se que, em casos tais, apenas a
celeridade das medidas provisórias se mostra compatível com a res-
Outro motivo também milita contra a utilização das MPs em ma- posta rápida a situações de calamidade pública.
téria de orçamentos: a vigência imediata que tais medidas possuem
poderia gerar abusos irreversíveis. Por exemplo: o Presidente edi- O Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de, recente-
taria uma medida provisória conferindo dotação orçamentária para mente, abordar o tema. No julgamento do pedido de medida cautelar
uma determinada ação imediata. Quando o Congresso fosse analisar na ADIn 4048/DF, o Plenário do Tribunal julgou inconstitucional me-
a medida, o gasto já teria sido feito, de forma irreversível. dida provisória que instituía crédito extraordinário. Não por julgar
tal instrumento incompatível para aquela finalidade, mas por consi-
Por isso, o constituinte derivado, acatando a argumentação dou- derar não preenchidos os requisitos constitucionais para a abertura
trinária, resolveu vedar a edição de medidas provisórias em matéria extraordinária de créditos.
orçamentária, exceto em um caso: para autorizar a abertura de crédi-
to extraordinário (art. 167, § 3º). Confira-se um trecho da ementa do julgado, de relatoria do Minis-
tro Gilmar Mendes:
Na verdade, a proibição de medidas provisórias em matéria orça-
mentária deriva também do princípio da estrita legalidade, que rege "(...) LIMITES CONSTITUCIONAIS À ATIVIDADE LEGISLATI-
a matéria, e segundo o qual todos os instrumentos orçamentários de- VA EXCEPCIONAL DO PODER EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE
MEDIDAS PROVISÓRIAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO EX-
vem ser veiculados por meio de lei em sentido formal. Tanto o plano
TRAORDINÁRIO.
plurianual, quanto as diretrizes orçamentárias, quanto o orçamento
anual e os créditos adicionais devem ser autorizados por lei ou ato Interpretação do art. 167, § 3º c/c o art. 62, § 1 º, inciso I, alí-
com força de lei. Por isso a medida provisória, embora tenha força de nea "d", da Constituição. Além dos requisitos de relevância
lei, não pode ser utilizada para veicular matéria orçamentária, EX- e urgência (art. 62), a Constituição exige que a abertura do
CETO CRÉDITOS EXTRAORDINÁRIOS (art. 62, §1º, I, d, c/c art. 167, crédito extraordinário seja feita apenas para atender a des-
pesas imprevisíveis e urgentes. Ao contrário do que ocorre
§3º).
em relação aos requisitos de relevância e urgência (art. 62),
que se submetem a uma ampla margem de discricionarie-
dade por parte do Presidente da República, os requisitos
de imprevisibilidade e urgência (art. 167, § 3º) recebem

263. RUSSOMANO,Rosah, apud TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Consti-


tucional, p. 883. São Paulo: Saraiva, 2003. 264. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., p. 154.

204 205
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

densificação normativa da Constituição. Os conteúdos se- Obviamente, tal medida colheu a todos de surpresa, e foi, inclu-
mânticos das expressões "guerra", "comoção interna" e "ca- sive, responsável por muitas quebras, falências e até suicídios.
lamidade pública" constituem vetores para a interpretação/
aplicação do art. 167, § 3º c/c o art. 62, § 1 º, inciso I, alínea Temeroso de vivenciar novamente tal situação, o legislador
"d", da Constituição. "Guerra", "comoção interna" e "calami- constituinte derivado institui ser proibida a edição de medida pro-
dade pública" são conceitos que representam realidades ou visória "que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança po-
situações fáticas de extrema gravidade e de conseqüências pular ou qualquer outro ativo financeiro". Na verdade, tal medida
imprevisíveis para a ordem pública e a paz social, e que ainda pode, em tese, ser tomada, mas apenas por meio de projeto
dessa forma requerem, com a devida urgência, a adoção de de lei, o que a tornaria inviável, na prática, pois todos retirariam os
medidas singulares e extraordinárias. A leitura atenta e a valores da poupança quando o Presidente apresentasse o projeto de
análise interpretativa do texto e da exposição de motivos Lei ao Congresso Nacional.
da MP n° 405/2007 demonstram que os créditos abertos
são destinados a prover despesas correntes, que não es-
tão qualificadas pela imprevisibilidade ou pela urgência. A 6.5.4.6. Matéria reservada a lei complementar
edição da MP n° 405/2007 configurou um patente desvir- Esta é uma vedação um tanto quanto óbvia, e que já era apontada
tuamento dos parâmetros constitucionais que permitem a pela doutrina antes mesmo da EC 32/01 267 •
edição de medidas provisórias para a abertura de créditos
extraordinários"265. Na verdade, as medidas provisórias têm força de lei (art. 62, ca-
put). É dizer, lei ordinária, pois a lei complementar só é considerada
quando a Constituição se refere a ela expressamente. Ora, se as leis
6.5.4.5. Detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou ordinárias não podem tratar de assuntos reservados a leis comple-
qualquer outro ativo financeiro mentares, como já vimos, o mesmo ocorre com as medidas provisó-
Em 1990, na tentativa de combater a hiperinflação que grassava rias. Trata-se de um verdadeiro silogismo: a) medidas provisórias
(mais de 2000% ao ano), o Presidente Fernan~o Collo~ ~e. Mello têm força de lei ordinária; b) leis ordinárias não podem tratar de
editou um dia depois de assumir o cargo, medIda provlsona que assunto reservado a lei complementar; logo, c) medidas provisórias
bloqu~ava os recursos da poupança, na promessa de restituí-los não podem tratar de assunto reservado a lei complementar.
futuramente, com taxas de juros pré-fixadas. O chamado "Plano
Collor" foi imposto por meio da MP n Q 168, de 15 de março de 1990, 6.5.4.7. Matéria já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo
266
depois convertida na Lei n Q 8.024/90 . Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente
da República
265. STF, Pleno, ADIn 4048-MCjDF, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJe de
Se o Congresso já aprovou um projeto de lei, que depende, ago-
21.08.2008.
266. Cf. CARVALHO, Carlos Eduardo. O fracasso do Plano Collor: erros de exe- ra, apenas da sanção presidencial para se tornar lei, seria um ver-
cução ou de concepção? Disponível em: http:j jww:v.anpec.org.br j~evis~aj dadeiro escárnio com o Legislativo o Chefe de Governo editar uma
voI4jv4n2p283_331.pdf. Acesso em: 03.11.2010. O CItado autor explIca: Os medida provisória sobre esse mesmo tema.
valores em cruzados novos bloqueados ficariam recolhidos no BCB por 18 meses,
recebendo juros de 6% ao ano mais correção monetária, e seriam Ii~erados em Ressalte-se, contudo, que nada impede o Presidente da Repú-
12 parcelas mensais depois de 18 meses. O papel-moeda teve conversa0 Imedzata
para cruzeiros. Nos demais haveres retidos, cada pessoa podza co~verter de Ime-
blica de, ao ver inconstitucionalidade no projeto de lei, apor seu
diato apenas Cr$ 50 mil (pelo câmbio oficial, US$1.300,00; pelo cambIO p~ralelo,
US$ 610,00). Recursos dos tesouros dos três níveis de governo ficaram Izvres do
267. Cf. MARTINS, Ives Gandra da Silva; BASTOS, Celso Ribeiro. Op. Cit., p. 429.
bloqueio".

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206
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

veto (jurídico) e, logo depois, editar uma medida provisória sobre o


cret~, não se. i~agina logicamente que possa adotar; em casos tais,
mesmo tema, só que, desta feita, corrigindo os vícios. Tal situação, medIda provlsoria 271 •
aliás, já se verificou na prática268 • O que não pode é o Presidente, em
vez de analisar o projeto, editar MP sobre o tema. P?~ ~utro la~o, Eros Grau sustenta que, "tratando-se [a medida
provlsona]. de leI que tem vigência imediata, porém provisória, não
Com efeito, o art. 62, § 1 º, IV, veda a adoção de medida provisória pOderr:. ser Implementadas através dela soluções que produzam efeitos
sobre matéria "já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Con- que nao podem ser arredados (Fábio Compara to). Os seus efeitos de-
gresso Nacional e pendente de sanção ou veto". Se a matéria já foi san- vem necessariamente poder ser desfeitos"272.
cionada ou vetada, nada há mais que impeça o Presidente de editar
medida provisória sobre o tema (claro, desde que haja relevância e
urgência, e não exista o intuito de fraudar a Constituição). 6.~.6. Medida provisória pode criar tributos ou majorar-lhes a
abquota?

6.5.5. Vedações implicitas A r~sp~st~ é afirmativa, exceto para aqueles tributos que tenham
de ser mstItmdos por lei complementar (CF art. 154 c/c/ art 62 §
lº,III). , , "
Mesmo com todas essas restrições materiais à edição de medidas
provisórias, a doutrina aponta que o rol de matérias que não podem
A.n:e~ da ~C 32/01, a doutrina majoritária entendia que medidas
ser veiculadas por MP não é taxativo, mas meramente exemplificati-
P,rovIsonas, nao pode~"iam criar tributos ou majorar-lhes a alíquota.
vo: pode haver outras matérias não reguláveis por medida provisó- Ja.naq~~la epoca, porem, o STF considerava possível veicular matéria
ria 269 • tnbutana por meio de MP.
Assim, por exemplo, não pode o Presidente editar medida provi- A citada Emenda, porém, incluiu no art. 62 da Constituição um §
sória em matéria cuja iniciativa é reservada aos demais poderes. Seria 2º, co~ o s:guin~e teor: "Medida provisória que implique instituição
absolutamente ilógico, por exemplo, que a Constituição determinas- ou major?çao de l.mFost~s, exceto os previstos nos arts. 153, I, IL IV, V, e
se ser de iniciativa privativa do Judiciário a criação dos seus cargos, 1~4, lI, so prodUZIra efeItos no exercício financeiro seguinte se houver
mas permitisse ao Presidente dispor sobre a matéria por meio de SIdo c:onvertida em lei até o último dia daquele em que foi editada".
medida provisória. Como adverte Paulo Gustavo Gonet Branco, "ela Com ISSO, passou-se a admitir expressamente que medida provisória
[a medida provisória] atua em terreno impróprio quando dispõe sobre aum~nte a al!quota de um imposto, ou mesmo o institua, desde que:
assunto cuja abertura do debate o constituinte quis subordinar ao juí- a) ha~a r;l~vancia e urgência; b) caso se trate de um imposto sujeito
" zo exclusivo de oportunidade e conveniência de outro poder"270. ao pnn~IplO da a~teriorid~~e g.eral (C.F, art. 150, III, b), que a MP seja
c~nvertJda em leI no exercICIO financeIro anterior à cobrança da nova
Outra vedação implícita citada pela doutrina é a matéria afeta ao ahquota.
decreto autônomo do Presidente da República (CF, art. 84, VI). Com
efeito, se o Presidente pode dispor delas por meio de simples de- Valem, aqui, os ensinamentos de José Levi Amaral Júnior:

268. Cf. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida Provisória e sua conversão
em lei. São Paulo: RT, 2004, p. 219.
269. Cf. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Sarai-
271. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., p. 227.
va, 2010, p. 1299.
270. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Curso de Direito Constitucional. São 272. G~U, Er?s Roberto. Medidas Provisórias na Constituição de 1988. In:
Paulo: Saraiva, 2007, p. 844. C~EVE, Cle~ers?n Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Doutrinas Essenciais: Di-
reIto ConstItucIOnal, volume IV. São Paulo: RT, 2011, p. 459.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

"Com relação à matéria tributária, a Emenda Co~stitu~io?~l imediatamente submetida à análise do Congresso, que dispõe de um
n. 32/2001 espancou qualquer dúvida quanto a admIssIbI- prazo para votá-la, sob pena de ter a pauta trancada, como veremos
lidade de medida provisória no seu trato, a teor do § 2º do (efeito provocar do Congresso Nacional).
art. 62 da Constituição de 1988, acrescentado pela Emenda Porém, deve-se perceber que a vigência da medida provisória
mencionada. Ora, se o § 2º em causa deu especial disciplina é, como seu próprio nome já denota, precária, ou seja, pode cessar
aos impostos a que se refere, é porque o próprio siste~a
a qualquer momento, caso seja rejeitada pelo Congresso Nacional.
constitucional admite - ainda que implicitamente - medIda
. Nesse sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello ressalta que "as
provisória que institua ou majore tn'b u t o"273 .
medidas provisórias são precárias, isto é, podem ser infirmadas pelo
É certo que, para impostos que tenham de respeitar o princíp~~ Congresso Nacional a qualquer momento dentro do prazo em que deve
da anterioridade, a edição de medida provisória soa estranha, Ja apreciá-las, em contraste com a lei, cuja persistência só depende do
que não haveria, então, qualquer ~rgência: ~e.alment~, "nesse q~a.­ próprio órgão que as emanou (Congresso)"276.
dro, será a lei que converter a me~lda pro.vls~na em dlplom,a defInI-
tivo que produzirá efeitos normatIvos e cnara ou aume~ta~a o tnbu-
6.7. Prazos
to. A medida provisória atuará, por disposição do cons~ltUInte, n~s~e
caso, como projeto de leí"274. Mas, se o cons:ituinte denvado admItiU Quanto às medidas provisórias, é preciso destacar a existência
sua utilização, não cabe ao intérprete veda-la. de dois prazos diferentes e que correm em paralelo: a) um prazo
Perceba-se que a cobrança efetiva da nova alíquota (caso se tra~ de vigência, que é de 60 dias, prorrogáveis automaticamente por
te de um imposto sujeito ao princípio da anterioridade) s~ se dara mais 60277; b) um prazo de trancamento de pauta do Congresso, que
no exercício financeiro posterior não a edição da MP, mas a conver- corresponde a 45 dias.
são desta em Lei. Esses dois prazos correm em paralelo, de forma independente.
Por exemplo: MP editada em 2010, aumentando a al~qu,o~a do Têm o mesmo termo inicial: a edição da MP. O término de cada um
ITR (imposto territorial rural, que tem ~e obedece~ ao pnnClpIO da deles produz diferentes efeitos jurídicos: a) escoado o prazo de vi-
anterioridade), só foi convertida em leI em fevereIro de 2011. Re- gência da MP, sem apreciação do Congresso, considera-se que ela
sultado: a nova alíquota só poderá ser cobrada em 2012 (ano pos- perdeu os efeitos: foi tacitamente rejeitada pelo Legislativo; b) es-
terior àquele em que a MP foi convertida em lei). gotado o prazo de trancamento de pauta, a Casa Legislativa em que
a MP estiver tramitando sofrerá o sobrestamento das demais deli-
berações, enquanto não apreciar a MP ("trancamento" de pauta).
6.6. Efeitos
De acordo com Paulo Gustavo Gonet Branco, a medida provisó- Dito de outra forma: o dia da edição da MP é considerado o "dia 1".
ria "produz, ao ser editada, dois efeitos básicos: inova a ordem jurídi- Deve a medida ser imediatamente submetida pelo Presidente à apre-
ca imediatamente, e provoca o Congresso Nacional a deliberar sobre ciação da Câmara, e a partir daí correm paralelamente dois prazos. A
o assunto"27S.
Isso significa que ~ MP tem vigência imediata. Des~e que é publi- 276. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Perfil Constitucional das Medidas Provi-
cada, já passa a obrigar a todos, mesmo antes de aprecIada pelo Con- sórias. In: CLÉVE, Clemerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto (orgs.). Doutrinas
gresso (efeito inovador da ordem jurídica). Por outro lado, deve ser Essenciais: Direito Constitucional, volume Iv. São Paulo: RI, 2011, p. 116.
277. A prorrogação é automática: caso transcorram 60 dias sem que o Congresso
tenha ainda apreciado a MP, "estará automaticamente prorrogada uma única
vez a sua vigência por igual período", providência que "será comunicada em
273. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., p. 221. Ato do Presidente da Mesa do Congresso Nacional publicado no Diário Oficial da
274. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Op. Cit., p. 843. União" (Resolução nº 01/2002 do Congresso Nacional, art. 10, caput e § 1 º).
275. Idem, ibidem, p. 838.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

partir do 4Sº dia de vigência da M ,e~~~i~~- estiver tramitando (Câ-


P t se o prazo de sobresta-
É preciso lembrar; todavia, que tais prazos não correm durante o
mento, Daí em dia~te" a C:~~~d~ua:alisar outras proposições antes recesso do Congresso NaCional. Realmente, o § 4º do art. 62 dispõe
mara ou Senado) fica lmp I t r a Casa fica "com a pauta que o prazo de vigência da MP "contar-se-á da publicação da medida
de votar a MP (na linguagem par, amen al~ndo Só poderá os efeitos provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congres-
d ")278 M s a medida contmua v a , ,
tranca a 120 ,a0 _,
dia e nao 'd a SI'do definitivamente aprecIada
tIVer am so Nacional"279, Não há a mesma previsão quanto ao prazo de tran-
se chegar
pelo o
Congresso: - nesse caso, co nsiderar-se-á tacitamente rejeitada, camento de pauta,
28o
mas entendemos cabível a mesma interpretação,
por analogia , inclusive com o art. 64, § 4º,
Num gráfico:

r 1 'i'
90 120 Com isso, pode ocorrer de uma medida provisória valer por mais
de 120 dias: basta que, durante esse período, haja recesso do Con-
I 3 1° gresso Nacional. No lapso equivalente ao recesso, não contam os 120
dias de vigência (o prazo fica suspenso), a não ser que haja convo-
cação extraordinária do Congresso (que não estará, portanto, em
o 45 120 recesso)281,

p""rn live" 1. . P.~9~' Ademais, é preciso dizer ainda algumas palavras sobre a extensão
do sobrestamento que MP produz se não for apreciada pelo Con-
gresso em até 45 dias,
MP passa a sobrestar as demais deliberaçoes
O art. 62, § 6º, dispõe o seguinte: "Se a medida provisória não for
MP deixa de vigorar apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação,

o MP em vigor
t
120
entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das
Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime
a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que
estiver tramitando",

I ·

MP passa a sobrestar as demais deliberações


279. Vale aqui mencionar a observação feita por Paulo Branco: "Apesar de o § 3
Q
Dia 1: MP está em vigor e não tranca a pauta do art. 62 da Constituição poder levar à impressão de que o prazo máximo da
medida provisória, antes de ela caducar; é de cento e vinte dias, na realidade, a
Dia 46: MP está em vigor, mas já tranca a pauta
medida provisória pode vir a durar bem mais do que isso, aproximando-se de um
Dia 90: MP ainda está em vigor e ainda está trancando a pauta semestre de existência. Isso porque, se o Congresso Nacional estiver em recesso, a
contagem do prazo de eficácia da medida provisória é suspenso". BRANCO, Pau-
Dia 121: MP deixa de vigorar e, consequentement e, de trancar a pauta lo Gustavo Gonet, et ai. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 846.
280. No mesmo sentido: 1) AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op, Cit" p. 236;
" edida rovisória em regime de urgência [após e~: 2) SZKLAROWSKI, Leon Frejda. Processo Legislativo: roteiro prático das
d' 1que Avmda na cPasa I'
278 ' Interessante notar mCl
'adora (Câmara dos Deputados),ja
, medidas provisórias no Congresso Nacional. Disponível em: jus.uol.com.br.
Acesso em: 05.11.2010.
gotados os 45 las, apro a d F d I) trancando-lhe a pauta de dellbera-
. ora (Se na o e era . d'
ingressa na Casa reVlS d tagem de quarenta e cmco las, o A PEC 11/2011, em tramitação no Senado Federal, altera o regime de tramitação
. . N- há uma segun a con . d
ções legIslatIvas. ao _ edida provisória ainda no primeIro lapso e das medidas provisórias, e prevê expressamente que nenhum prazo da MP
que buscad.Ult,~mAaMrAa;:~aJÓ~I~~
sessenta las. ,~osé Levi Mello do. Op, Cit" p. 251.
corra durante o recesso.
281. Idem, ibidem, p. 239.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

sobre quais são as matérias abrangidas pela expressão 'de-


Embora o disposit~vo ~iga"que fiC:h:~~:~~:pa~ ~~o~~~;:e~:~ liberações legislativas' para os fins de sobrestamento da
mais deliber:ções l~glslatIVas , ~e~r:sidente da Câmara dos Depu- pauta por medida provisória nos termos da Constituição;
a interpretaçao, capitaneada ~ef? m sobrestados os projetos de lei entende que, sendo a medida provisória um instrumento
que só pode dispor sobre temas atinentes a leis ordinárias,
tados, Michel Teme.r, de ~u~ so l~~ativas poderiam ser discutidas e
apenas os projetos de lei ordinária que tenham por objeto
ordinária. As demais espe~ldes no . , .a trancando a pauta da Casa matéria passível de edição de medida provisória estariam
votadas mesmo com medi a proVlson
por ela sobrestados; desta forma, considera não estarem
Legislativa. sujeitas às regras de sobrestamento, além das propostas de
André Ramos Tavares analisa a questão em detalhe: emenda à Constituição, dos projetos de lei complementar,
. ,. do ano de 2009 por solicitação do Deputado dos decretos legislativos e das resoluções - estas objeto ini-
"No mlClO ' d C a dos cial da questão de ordem - as matérias elencadas no inciso
Re gis Fernandes de Oliveira, o Presidente a amar
De utados Michel Temer, passou a questionar o ente~- I do art. 62 da Constituição Federal, as quais tampouco po-
.p d' Medida Provisória não votada trancana dem ser objeto de medidas provisórias; decide, ainda, que
dlmento e que a
t da a pauta do Congresso Nacional. Michel Temer passou as medidas provisórias continuarão sobrestando as sessões
aOadotar o entendimento segundo o qual não apenas a vota- deliberativas ordinárias da Câmara dos Deputados, mas não
ão de resoluções estaria liberada, independentem~n~e. da trancarão a pauta das sessões extraordinárias"2B3.
~xtrapolação do prazo para votação de medidas. pr.o~lsor~a~, É de se ter cuidado, porém, que essa interpretação ainda não foi
mas também de propostas de emenda à Constltmçao e eis
referendada pela Corte. O que houve foi a decisão monocrática do
complementares. Relator, Ministro Celso de Mello, que indeferiu o pedido de medida
_ t lo DEM e pelo PSDB, o Ministro Celso cautelar no MS nº 27.931jDF CDJe de 31.03.2009). Aguardemos a
Em açao propos a pe _ d ue 're-
d Mello admitiu a nova interpretaçao, escreven o q decisão definitiva do Plenário do STF, mas adiantemos não concor-
fl:te a arentemente, a justa preocupação com o pr~cesso dar totalmente com a tese esposada pelo ilustre constitucionalista
de ~ro~ressivo (e perigoso) esvaziamento das funçoes le- Michel Temer, hoje Vice-Presidente da República.
gislativas'.
Aliás, embora seja politicamente interessante, tal interpretação
O entendimento de Michel Tem;~ está_ ancorado na cons-
tatação de que medidas provisonas nao podem tratar de
parece, em termos jurídicos, trazer um verdadeiro malabarismo
rvados a leis complementares e emendas cons- hermenêutico para tentar burlar os limites definidos na própria
temas rese - h . motivo Constituição.
titucionais. Nessas hipóteses, portanto, nao aver~a,
ara ue se falasse em trancamento da pauta tam em pa.ra Com efeito, podemos afirmar, com Rodrigo Lago, que:
~ssasqoutras espécies normativas. Apenas o procAess.o legls-
· da lei ordinária deverá merecer a consequenCla cons- "Durante longos anos jamais se cogitou de outra leitura
1at IVO "2B2
titucional do sobrestamento. . desse clarividente texto. Sempre se teve como sobrestadas
todas as deliberações legislativas no momento em que se
róprio Michel Temer, a solução seria a seguinte: tinha ultrapassado o prazo de quarenta e cinco dias para a
Nas paIavras do P . .
"Res onde à questão de ordem do Deputado.Regis de O~I­
. P m uma reformulação e ampliação da mterpretaçao
velra co 283. Cf. LAGO, Rodrigo Pires Ferreira. As medidas provisórias e o trancamento
da pauta da Câmara dos Deputados: a inconstitucionalidade da solução Te-
d Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, mer. Biblioteca Digital Fórum Administrativo - FA, Belo Horizonte, ano 10, n.
282. TAVARES, André Ramos .. c~rTsEoM~R M·chel. Elementos de Direito Constitu- 115, set. 2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.
2010, p. 1295. Cf. tambem. ,I aspx?pdiCntd=69253>. Acesso em: 15 setembro 2011.
ciona}. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 133.

215
214
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

, ~ de uma MP É certo que o tempo não é capaz de A doutrina de Luis Roberto Barroso também trata deste tema,
apreClaçao' t ponto empregando a denominação de "interpretação constitucional evo-
curar a inconstitucionalidade, mas o que se tem n~,s e 't"
é exatamente que longos anos se passaram e o ,ISPO~I IVO lutiva", que se verifica quando há a "atribuição de novos conteúdos
jamais foi lido diversamente do que consta da literalidade à norma constitucional, sem modificação do seu teor literal", Res-
de seu texto,
salta, entretanto, ser legítima a mutação constitucional quando isso
ocorre "em razão de mudanças históricas ou de fatores políticos
O que autorizou a sua nova leitura? Pelo que consi~nado na
e sociais que não estavam presentes na mente dos constituintes"
uestão de ordem resolvida pelo Presidente da Camara, e
(BARROSO, 2009, p. 151),
\ elada pelo voto do Ministro Celso de Mell~, foram o,s
c b~~~s praticados pelo Poder Executivo na adoça0 de medl- É exatamente o que não há no caso das medidas provisórias,
~as provisórias que provocaram a releitura do texto con;- Como amplamente já registrado, os abusos foram praticados des-
titucional. Mas estes abusos não eram novos, ao tempo a de sempre, pelos sucessivos Presidentes da República, como bem
d ,~ E, exatamente o contrano, ' ' com o l'á fOI amplamente
, ' frisou o Ministro Celso de Mello em várias decisões no âmbito do
eClsao't do Em várias ocasiões a doutrina e a lunspru-
d emons ra ' d 'trumento Supremo Tribunal Federal. Nada mudou entre setembro de 2001,
' ' , , egl'straram o uso excessivo esse ms
d enCla la r 'Al" ró quando foi promulgada a Emenda Constitucional nº 32/01, e a data
' excepcional pelo Poder ExecutIVo, las, o p -
normat IVO em que o Presidente da Câmara dos Deputados resolveu a questão de
rio Ministro Celso de Mello ressaltou em seu voto que em
P, ' ortunidades l'á se manifestara sobre essa conduta ordem, Se nenhuma modificação fática houve, não se pode ter como
vanas op t no Su- legítima a mutação constitucional."284,
abusiva do Poder Executivo, o fazendo em seus vo os
premo Tribunal Federal.
6.8. Tramitação
A reiteração destes abusos, an_os depo~s d~ Emendao~~~~~t~C!~~
A medida provisória, uma vez editada, deve ser imediatamente285
I º 32/01 autorizaria a mutaçao constItucIOnal, a P , '
n~ n t -o então prevalecente do artigo 62, §6º, da ConstltUl- submetida pelo Presidente da República à apreciação do Congresso
a mterpre aça , ' 17 Nacional. Antes da EC 32/01, a deliberação cabia ao Parlamento em
ção da República como inconstltucIOna ,
sessão conjunta. Hoje, todavia, a apreciação se dá pela Câmara dos
' _ e a ressalva feita na doutrina de Inocêncio Mártires Coe- Deputados e pelo Senado Federal, isolada e sucessivamente.
Lela s , ' I
lho quanto aoS limites à mutação constltucIOna : Entre as Casas do Congresso, fica claro que a função de Casa Ini-
uma coisa são as leituras que, mesmo n~v~s, ~inda se ciadora caberá à Câmara dos Deputados (art. 62, § 8º), até mesmo
[",1 t ham no espectro dos significados aceltavelS de um por se tratar de ato do Presidente da República (art, 64, caput).
man en , ~ '~es sub-
texto jurídico, e outra, bem distmta, sao as cnaço_
Antes mesmo do encaminhamento à Câmara, porém, a MP preci-
-re tícias de novos preceitos, mediante interpreta~oes q~e
ItP ssam o sentido literal possível dos enuncIados IU- sa ser apreciada por uma comissão mista do Congresso Nacional. A
~í~~~: e acabam por transformar os seus intérpretes em própria Constituição estabelece que a "deliberação de cada uma das
legisladores sem mandato, (MARTINS; MENDES, 2005, p, Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias
dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupos-
154)
tos constitucionais" (art. 62, § 5º). Esse parecer prévio é dado por
mesma ressalva, com outras palavras, é feit,a por Paul~ Gu~- uma comissão mista de Deputados e Senadores, designada, caso a
A B quando afirma que a "nova mterpretaçao ha,
tavo, ~o~:ten~~:~~~r apoio no teor das palavras empregadas pel~
~~:~ti~uinte e.não deve violentar os princípios estruturantes da LeI 284, Idem, ibidem,
285, Isto é, no mesmo dia: Resolução nº 1/2002, do Congresso Nacional, art. 2º, § 1 º,
Maior" (MARTINS; MENDES, 2005, p. 263).

217
216
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

caso, para analisar se a medida provisória preenche os requisitos à Casa Iniciadora, que disporá do prazo de 3 dias para apreciar as
de relevância e urgência (e, nos termos da Resolução 01/2002-CN, emendas senatoriais (art. 7º, § 4º). Com isso, completa-se o prazo
também sobre o mérito da MP e sua compatibilidade financeira). de 45 para o trancamento da pauta (14 dias da comissão mista + 14
Tal comissão já existia antes mesmo da alteração constitucional dias da Câmara + 14 dias do Senado + 3 dias, caso haja emendas
no regime da medida provisória (Resolução nº 1/89 do Congresso para apreciação destas pela Câmara). É dizer: se o Congresso cum~
Nacional), mas, com a EC 32/01, ganhou previsão constitucional. prir todos os prazos regimentais, a MP não precisará entrar em re-
É "integrada por 12 (doze) Senadores e 12 (doze) Deputados e igual gime de urgência, sobrestando as demais deliberações legislativas.
número de suplentes, indicados pelos respectivos Líderes, obedecida,
tanto quanto possível, a proporcionalidade dos partidos ou blocos 6.8.1. Emendas à MP
parlamentares em cada Casa" (Resolução 01/2002-CN, art. 2º, § 2º). Ao contrário do Decreto-Lei, que não podia ser modificado pelo
A comissão mista possui o prazo regimental de 14 dias para Congresso (ou era aprovado em bloco, ou rejeitad0 287), a medida
emitir seu parecer (Resolução 01/2002-CN, art. 5º, caput). Esgota- provisória pode, sim, sofrer emendas no Congresso Nacional, o que
do esse prazo, a MP é remetida à Câmara, mesmo sem o parecer da nada mais é do que a lógica, tendo em vista que a função de legislar
comissão (art. 5º, § 1 º)286. é a atividade típica do Parlamento.
Imaginando-se que haja o parecer da comissão mista (ou esgo- Nos termos da citada Resolução nº 01/2002, do Congresso Na-
tado o prazo de 14 dias sem parecer), sucessivamente, a MP será cional, "somente poderão ser oferecidas emendas às Medidas Provi-
encaminhada à Câmara, que também terá o prazo de 14 dias (art. sórias perante a Comissão Mista", e, ainda assim, "nos 6 (seis) primei-
6º) e, por fim, ao Senado, que dispõe do mesma prerrogativa (art. ros dias que se seguirem à publicação da Medida Provisória no Diário
7º). Interessante notar que, nos termos do art. 7º, § 2º, da citada Oficial da União" (art. 4º, caput e § 1 º).
Resolução, se a Câmara não cumprir o prazo de 14 dias, o Senado Porém, a própria Resolução parece admitir exceções a essa re-
já pode começar a discutir a MP, antecipando-se essa fase, embora gra geral, quando se refere à possibilidade de modificação da MP
só possa votar o ato quando este for efetivamente apreciado pela pelo Senado Federal, em relação ao texto aprovado pela Câmara.
Câmara e remetido à Casa Revisora. P~opomos, então, a seguinte interpretação: as emendas, em regra,
Perceba-se, entretanto, que antes mesmo de se votar o mérito so podem ser apresentadas perante a Comissão Mista. Mas, se hou-
da medida provisória, o Plenário da Casa em que estiver tramitando ver questões supervenientes (percebidas, por exemplo, somente
deve apreciar, em votação separada, o preenchimento dos r~quisi­ quando da discussão em Plenário), é de se admitir a apresentação
tos constitucionais de relevância e urgência (art. 8º, caput). E certo, de emenda mesmo nessa fase. Em qualquer caso, porém, deve ser
ainda, que, se "o Plenário da Câmara dos Deputados ou do Senado guardada a pertinência temática entre a emenda e a medida provi-
Federal decidir no sentido do não atendimento dos pressupostos sória (art. 4º, § 4º).
constitucionais ou da inadequação financeira ou orçamentária da
Medida Provisória, esta será arquivada" (art. 8º, parágrafo único). 6.9. Rejeição
Havendo, no Senado, modificações ao texto aprovada pela Câ- Se a medida provisória for rejeitada pela Câmara ou pelo Sena-
mara, a MP (na verdade, o projeto de lei conversão da MP) retoma do, estará definitivamente arquivada, nos termos que ocorre com

286. O STF recentemente, passou a adotar a tese de que, a partir de agora (decisão 287. Cf. art. 55, § 1º, da Constituição de 1967, na redação da Emenda nº 1, de 1969.
com f~rça prospectiva), é inconstitucional a medida provisória em que não haja No mesmo sentido: MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à
parecer da comissão mista, pois se trata de exigência constitucional (art. 62, § Constituição de 1967, com a Emenda n.l, de 1969, tomo m. São Paulo: RT,
9º). STF, Pleno, ADln 4029/ AM, relator Ministro Luiz Fux, DJe de 26.06.2012. 1973, p.160.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

os projetos de lei. Quanto às MPs, porém, a rejeição pode ser ex- Projeto de Lei Medida Provisória
pressa ou tácita: esta última se verifica quando o Congresso deixa Irrepetibilidade
escoar o prazo de 60+60 dias sem votar o ato. Nesse caso, a medida na mesma sessão Sim Sim
perderá seus efeitos, isto é, será tida como rejeitada tacitamente. legislativa

Previsão Art. 67 Art. 62, § 10


6.9.1. Irrepetibilidade Relativa (pode ser derrubada
Uma vez rejeitada a MP (repita-se, seja de forma tácita ou expres- Caracteristica da com o apoio da maioria abso-
Absoluta
sa), deixará imediatamente de produzir efeitos. Deixará de existir. E irrepetibilidade luta dos membros de qual-
quer das Casas)
mais: a matéria constante da MP rejeitada não poderá ser objeto de
nova medida provisória na mesma sessão legislativa, em hipótese al- Ou, de outra forma:
guma. Confira-se o § 10 do art. 62 da CF: uÉ vedada a reedição, na
mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeita- 1.1. A matéria dele constante pode ser objeto de nova
da ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo". proposição:
1.1.1. Em outra sessão. legislativa? SIM
Trata-se de uma aplicação do princípio da irrepetibilidade que se 1. PROJETO DE
1.1.2. Na mesma sessão legislativa (ano parlamentar)?
aplica aos projetos de lei rejeitados (art. 67), só que muito mais rígi- LEI REJEITADO
1.1.2.1. Em regra: NÃO
da: aqui, a MP não pode ser reeditada na mesma sessão legislativa 1.1.2.2. Existe exceção: SIM (maioria absoluta dos membros
em hipótese alguma. A irrepetibilidade na mesma sessão legislativa é de uma Casa)
absoluta, ao contrário do que ocorre com os projetos de lei, em que 2.1. A matéria dele constante pode ser objeto de nova
se cuida de uma proibição relativa, que pode ser derrubada com o proposição:
apoio da maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas do 2. MEDIDA 2.1.1. Em outra sessão legislativa? SIM
PROVISÓRIA
Congress0 288 . REJEITADA
2.1.2. Na mesma sessão legislativa (ano parlamentar)?
2.1.2.1. Em regra: NÃO
Numa tabela: 2.1.2.2. Existe exceção: NÃO (vedação absoluta na mesma
sessão legislativa)
288. O STF possui precedente em que, no julgamento cautelar de uma ADIn, conside-
rou que a irrepetibilidade se aplica também à medida provisória que foi revoga-
da pelo próprio Presidente da República, por meio de outra medida provisória. ESTUDO DE CASO Nº 5: REEDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA RE-
Confira-se: "A impossibilidade de reedição, na mesma sessão legislativa, de medida
provisória revogada. Tese contrária importaria violação do princípio da Separa- JEITADA E FRAUDE À CONSTITUIÇÃO (MP Nº 377/07)289
ção de Poderes, na medida em que o Presidente da República passaria, com tais
expedientes revocatório-reedicionais de medidas provisórias, a organizar e opera-
Foi rejeitada pelo Senado, no dia 25 de setembro de 207, a Medi-
cionalizar a pauta dos trabalhos legislativos. Pauta que se inscreve no âmbito do da Provisória nº 377, de 18 de junho de 2007. Tal ato, entre outras
fUncionamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e, por isso mesmo, providências, criava a Secretaria Especial de Planejamento de Longo
matéria de competência privativa dessas duas Casas Legislativas (. ..) De outra par-
te, o ato de revogação pura e simples de uma medida provisória outra coisa não
é senão uma autorrejeição; ou seja, o autor da medida a se antecipar a qualquer
deliberação legislativa para proclamar; ele mesmo (Poder Executivo), que sua obra
289. Este estudo de caso se baseia em artigo de nossa autoria escrito sobre a ma-
normativa já não tem serventia. Logo, reeditá-la significaria artificializar os re-
téria: CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Reedição de medida provisória
quisitos constitucionais de urgência e relevância, já categoricamente desmentidos
pela revogação em si. Medida liminar deferida para suspender a eficácia da MP rejeitada e fraude à Constituição: o caso da MP nº 377/07. Jus Navigandi,
397/2007 até o julgamento de mérito desta ação direta de inconstitucionalidade." Teresina, ano 12, n. 1552, 1 out. 2007. Disponível em: <http://jus.uol.com.brI
(STF, Pleno, ADIn 3.964-MC, Relator Ministro Ayres Britto, DJE de 11.04.2008). revista/texto/l0470>. Acesso em: 22 jan. 2011.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Prazo da Presidência da República, com status de Ministério. Com a Secretaria) importaria em desvirtuar a teleologia da norma consti-
rejeição pelo Senado, criou-se a esdrúxula situação de deixar um Mi- tucional que prevê a irrepetibilidade absoluta da MP rejeitada (na
nistro sem Ministério - conseqüência que deveria ter sido ao menos mesma sessão legislativa).
cogitada pelo Executivo, ao adotar a questionável (para não dizer in- Felizmente, porém, a idéia perdeu força no próprio governo.
constitucional) solução de criar uma pasta por meio de MP. Buscou-se, então, a criação da Secretaria por meio de projeto de
O Executivo, considerando indispensável a criação da referida Se- lei, que foi efetivamente apresentado e aprovado, com o nome de
cretaria, buscou, então, uma maneira de fazê-la ressurgir no mundo "Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República"
jurídico. Diante da impossibilidade de simplesmente reeditar a MP (Lei nº 11.754/08, que alterou a Lei nº 10.683/03).
com o mesmo assunto (CF, art. 62, § 10), cogitou-se editar "nova" Me-
dida Provisória, criando um órgão em tudo semelhante ao rejeitado 6.9.2. Efeitos
pelo Senado, apenas com um nome diferente. Além da irrepetibilidade, a rejeição da medida provisória produz
Considera-se fraude à Constituição é trazido pela doutrina para alguns outros efeitos. Primeiramente, a MP deixa imediatamente de
explicar as ações jurídicas que, embora não afrontem diretamente existir no mundo jurídico: não mais produz efeitos, e a legislação que
o texto da Constituição, são com ela, em substância, incompatíveis. existia antes dela volta a valer (é o chamado efeito repristin a tório )290.
Trata-se de manobra ardilosa para violar a Constituição sem que tal Mas e o que acontece com os efeitos que a MP já produziu? Lem-
violência fique patente. Assim, sob a roupagem de constitucionali- bre-se que a medida provisória entra em vigor imediatamente, antes
dade, esconde-se uma medida na verdade incompatível com a nor- mesmo de ser apreciada pelo Congresso. Assim, enquanto tramita
ma fundamental. A partir dessa perspectiva, a fraude à Constituição pelo Legislativo, o ato já está produzindo efeitos jurídicos. E o que
se configura uma das mais insidiosas formas de inconstitucionali- acontece se a MP for; ao final, rejeitada, ou perder a eficácia por de-
dade, seja porque não permite, a priori, a identificação dos defeitos curso de prazo?
que lhe são inerentes, seja porque ataca o cerne da Constituição No regime original da CF, a MP perdia os efeitos ex tunc, de forma
moderna, a parte mais importante, a essência mesma da norma retroativa, devendo o Congresso Nacional regulamentar os efeitos da
fundamental: os valores. rejeição por meio de decreto legislativo. Mera cópia do sistema ita-
No caso em questão, argumentava-se que a Medida Provisória liano, em que o decretto-legge, se rejeitado, perde a eficácia como se
não contrariaria o art. 62, §10, da CF, segundo o qual "É vedada a nunca tivesse existido. Como o Congresso não era muito cioso do de-
reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que ver de editar decreto legislativo para regulamentar os efeitos da re-
tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso jeição, criava-se uma grande insegurança jurídica, pois, se a MP fosse
de prazo". A alegação (a nosso ver, falaciosa) era a de que a Cons- rejeitada, todos os efeitos já produzidos deixariam de existir.
tituição vedava a reedição da mesma Medida Provisória, mas não Atento à grave insegurança jurídica que esse sistema (e, princi-
a edição de uma nova MP, mesmo que essa "novidade" decorresse palmente, a velha omissão do Legislativo em cumprir seus deveres)
de mera modificação acessória, formal, como é o caso do nome da causava, o constituinte derivado alterou o sistema constitucional, por
Secretaria. meio da EC 32/01, que passou a dispor o seguinte:
A intenção de fraude era, porém, patente. Ora, a Constituição Art. 62, § 3º. As medidas provisórias, ressalvado o disposto
proíbe a reedição de MP rejeitada em respeito à autoridade das de- nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não fo-
cisões do Parlamento, que representa, aceite-se ou não, a vontade rem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogá-
popular (art. 1 º, parágrafo único, da CF). Assim, editar a mesma Me-
dida Provisória, sem qualquer modificação, ou com modificações
apenas tópicas, acessórias, irrelevantes (como é o caso do nome da 290. STF, Pleno, ADIn 2984/DF, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJ de 14.05.2004.

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

vel, nos termos do § 7 Q , uma vez por igual período, devendo Essa interpretação é mais lógica, consentânea com o regime
o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as da MP e resguarda de forma mais efetiva o princípio da seguran-
relações jurídicas delas decorrentes. ça jurídica. Concordam com esse ponto de vista Manoel Gonçalves
Ferreira Filho e José Levi do Amaral Júnior. André Ramos Tavares
(...) § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o
parece adotar a mesma interpretação, embora critique a opção do
§ 3 Q até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia
de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e
constituinte derivado z91 .
decorrentes de atos praticados durante sua vigência con- Veja-se a opinião da doutrina:
servar-se-ão por ela regidas. "Relativamente ao modelo originário de 1988, houve uma
importante inversão de lógica. Antes, as relações jurídicas
Logo se vê que a Emenda trouxe algumas alterações relevantes.
decorrentes da medida provisória rejeitada ou caduca por
O texto ficou um tanto quanto confuso, mas pode-se apreender-lhe decurso de prazo desconstituíam-se retroativamente des-
a essência. de a perda da eficácia da medida, exceto se o Congresso
Nacional votasse decreto legislativo preservando-as. Ago-
Rejeitada a medida provisória (ou perdida a eficácia pelo escoa-
ra, 'as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos
mento do prazo, o que equivale a uma rejeição tácita), ele deixa ime- praticados durante' a vigência da medida provisória rejei-
diatamente de produzir novoS efeitos. Quanto aos efeitos já produ- tada ou caduca por decurso de prazo somente serão des-
zidos, a regra geral é que a MP continuará aplicável, a não se: qu~ o constituídas se acaso o Congresso Nacional se manifestar
Congresso, em 60 dias (a contar da rejeição) edite decreto legIslatIvo nesse sentido por decreto legislativo no prazo de sessenta
dispondo de forma diversa. dias a contar do respectivo ato declaratório de rejeição ou
de caducidade; do contrário tais relações são mantidas"292.
Perceba-se que o § 3º dá a entender que, com a rejeição, a MP
perderia os efeitos ex tunc. Mas esse mesmo dis~ositivo re~salva o Um exemplo pode esclarecer a questão. Imagine-se que o Pre-
§ 11, que dá ao Congresso o prazo de sessenta dIas para edItar de- sidente da República edita uma medida provisória conferindo au-
creto legislativo: não o fazendo, a rejeição terá efeitos ex nunc. ?ra, mento de mil reais para os servidores de determinado Ministério.
como poderia a rejeição ter efeitos retroa~vos, mas poder deIx~r Sabe-se, desde já, que o aumento é um ato precário (pode ser der-
de ter essa característica diante da omissao do Congresso? Sena rubado a qualquer momento), embora exista uma expectativa legí-
tima de que vai ser mantido.
ilógico.
Por isso, o mais adequado - segundo entendemos - é considerar Pois bem. Um mês depois da edição da MP, o Congresso a rejei-
ta. E agora? Bem, a partir daí o Congresso disporá de sessenta dias
que a rejeição (expressa ou tácita) da MP pelo C?ngresso produz, e~
para editar um decreto legislativo regulamentando os efeitos da
regra, efeitos ex nunc (de agora em diante, daq~1 pa~a a.f~e~te), a ~ao
ser que o Congresso resolva dar efeitos retroatIVOS a rejeIçaO (efeIt?S rejeição, podendo, inclusive, dar a ela efeitos retroativos (ex tunc),
ex tunc) - para tanto, deverá, em até 60 dias, editar um decreto legIs- com a consequente devolução dos valores pagos a maior. Mas, se o
Congresso não editar o decreto legislativo, o aumento terá sido legí-
lativo específico. timo, durante aquele mês, e os servidores, embora voltem a receber
Dito de outra forma: quando o Congresso rejeita a MP, mas nada
fala sobre os efeitos da rejeição, entende-se que foram ex nunc, isto
291. Cf. 1) FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. São
é, a medida provisória deixou de valer, mas os efeitos já produzi- Paulo: Saraiva, 2007, p. 243; 2) AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Medida
dos se mantêm. Apenas se o Congresso editar decreto legislativo Provisória e sua Conversão em Lei. São Paulo: RT, 2004, p. 257; 3) TAVARES,
dizendo o contrário é que se considerará a rejeição com efeitos André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010, p.
retroativos (ex tunc), quando os efeitos produzidos pela MP serão 1296; 4) BI;\ANCO, Paulo Gustavo Gonet, etal. Op. Cit, p. 850.
292. AMARAL JUNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., p. 259.
desconstituídos.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

o mesmo vencimento de antes da edição da medida provisória, não v~da pela Câmara, mas tenha restado aprovado o mesmo texto o ._
precisarão devolver valor algum. gmal da MP). n
Essa é, como dissemos, a interpretação que deflui do texto cons-
titucional, e também a sufragada pela doutrina que se debruça so- Entendemos que deva ser aplicada aqui a mesma lógica esposa-
bre o tema. Importante citar, porém, que há uma Nota Técnica da da p~lo ;upremo Tribunal Federal quanto às emendas aos projetos
Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados em sentido di- de leI: so alteram a tramitação da MP emendas de conteúdo, emen-
verso. É verdade que o caso não foi de MP rejeitada, mas sim de das q~e a~ete~ a essência do ato normativ0 294. Meras emendas de
medida que foi aprovada com modificações e o projeto de lei de redaçao nao sao relevantes para a tramitação (ver capítulo 2 t' .
1.2.2.4, item b.2). ' OplCO
conversão foi vetado pelo Presidente. Nesse caso, a Consultoria da
Câmara entendeu que aa perda de validade e eficácia da medida provi-
sória acarreta, necessariamente, a insubsistêncía dos atos regulamen- ;erceba-s.e que a MP aprovada integralmente pelo Congresso
tares nela fundados". Embora, repita-se, o caso fosse diferente do que esta au:omattcamente convertida em lei: não existe a possibilidade
de sançao nem veto29S.
aqui se trata, é interessante conhecer essa Nota 293.
Assim, os efeitos da rejeição da MP pelo Congresso são, em regra, E o que acontece se o Congresso rejeitar a MP em parte, mas
ex nunc, a não ser que se edite um decreto legislativo especificando apro,:,ar a outra parte sem emendas em relação ao texto original?
que a rejeição teve efeitos retroativos (ex tunc). Cons!d~ramos que cada parte deve ser tomada de forma autôno-
ma. E dIzer: a parte rejeitada deixará de existir (ver tópico 6.9.2),
6.10. Aprovação m,as a part~ ~provada será automaticamente convertida em lei. Não
A aprovação da medida provisória pode-se dar de duas formas: a) ha, s.alvo hIpoteses excepcionais em que o texto seja indivisível, ne-
com o mesmo conteúdo do ato originalmente editado pelo Presiden- ceSSIdade d~ ;emeter a parte aprovada ao Presidente da República:
te da República (isto é, sem emendas de conteúdo); ou b) com altera- deve, desde la, converter-se em lei.
ções (com emendas de conteúdo). Estudemos essas duas hipóteses.
6.10.2. Aprovação com emendas (de conteúdo)
6.10.1. Aprovação sem emendas (de conteúdo)
Uma vez aprovada a medida provisória sem emendas que alterem Se a. medida provisória for aprovada, na essência, mas o Con-
a essência, o conteúdo do ato originalmente editado pelo Presidente gresso fiz~r emendas (de conteúdo) ao texto originalmente editado
da República, a MP estará automaticamente convertida em lei. Não p.elo PreSIdente da República, a MP não estará definitiva e automa-
é necessário retornar à Presidência para sanção ou veto. A MP foi tlcament~ conver~ida em lei. Não. Nesse caso, a MP se transforma
confirmada, e deixará, então, de existir, para dar lugar à lei objeto de num projeto de leI de conversão (PLV296), que deverá ser encaminha-
sua conversão. do (co~o .qualquer projeto de lei) à sanção ou veto do Presidente
Essa lei deverá ser promulgada pelo Presidente da Casa em que a da Repubhca.
MP foi definitivamente aprovada (geralmente é o Senado, mas pode
ser também a Câmara, caso tenha havido emendas à redação apro-
294. STF, Pleno, ADln 2.238-MC, Relator para o acórdão Ministro Ayres Britto DJe de
12.9.2008. '
295. CF. BRANC~, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Curso de Direito Constitucional São
293. VILELA, Maria Diogenilda de Almeida. Nota Técnica: Efeitos da Medida Pro- Paulo: SaralVa, 2007, p. 847. .
visória nº 82(02 em face do veto integral ao PL de Conversão nº 3(03 e da 296. No Sen~do Federal, é comum a utilização da sigla PLV para designar os projetos
ausência de decreto legislativo disciplinando as relações jurídicas dela
de de lei ,de conversão, pois se reserva a sigla PLC para os projetos de lei oriun-
decorrentes. Brasília: Câmara dos Deputados (Consultoria Legislativa), 2005. dos da Camara dos Deputados.

226
227
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Mas deve ser lembrado que o prazo para sanção ou veto é de 15


6.10:4. Esquema sobre a tramitação da MP dentro do Co
dias úteis (ver Capítulo 3, tópico 1.2.2.1., item c). E enquanto isso, o NacIOnal ngresso
que acontece com a MP? O texto originalmente editado pelo Presi-
dente continua a valer, enquanto o Chefe do Executivo não se mani- CONGRESSO
festar sobre o PLV, sancionando-o ou vetando-o. A partir da sanção NACIONAL
ou veto, o texto original da MP deixa definitivamente de vigorar, e o Comissão
PLV seguirá a tramitação normal de um projeto de lei. Mista CD -+ SF -+
parecer aprovada Cont.
Por exemplo: o Presidente edita uma MP conferindo aos servi-
Publicação
dores públicos federais licença de um dia, na data do aniversário. O no DOU Rejeita Rejeita
Congresso aprova a medida, mas com uma emenda (pouco importa
ser da Câmara ou do Senado) ampliando a licença para dois dias. A
redação original (um dia) continua a valer, e o PLV (projeto de lei de Arquivo Arquivo
conversão) com o prazo de dois dias é encaminhado ao Presidente,
para sanção ou veto. No momento em que o Chefe de Governo san-
cionar ou vetar o PLV, o prazo de um dia deixa de vigorar, e o PLV Não pode ser proposta
de novo na mesma
segue seu destino normal: se foi sancionado, seguirá para promul- sessão legislativa
gação e publicação pelo Presidente da República; se foi vetado, será
devolvido para que o Congresso Nacional aprecie o veto 297.

6.10.5. Esquema sobre a tramitação da MP entre os poderes


6.10.3. Resumo sobre a tramitação da MP
1.1. Deixa de produzir efeitos Converte-se
1.1.1. Em regra: perde a eficácia daqui para a frente Volta para sanção ou veto; +- em projeto de lei de
(ex nunc) MPon'ginal conversão
1. MP REJEITADA,
1.1.2. Excepcionalmente: a rejeição poderá ser ex premance em vigor
tunc, se o Congresso editar decreto legislativo nesse provisoríamnete
com
sentido. emendas
2.1. Sem emendas de conteúdo: está automatica-
mente convertida em lei PRedita -+ Congresso
Nacional -+ Aprovada
2.2. Com emendas de conteúdo: transforma-se em
PLV (projeto de lei de conversão), que segue para a 11-
sanção ou veto do Presidente Publicação
no DOU Rejeita sem
2.2.1. Enquanto isso: continua valendo a redação ori- emendas
ginal da Mp, até que o PLV seja sancionado ou vetado. 11-

Arquivo Converte-se em lei


11-
297. A Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados já emitiu nota técnica no Regra: ~ Se o Congresso editar
sentido de que, vetado o PLV, a MP perde eficácia de forma retroativa (ex tunc). rejeição Dec. Lei: rejeição
Cf. VILELA, Maria Diogenilda de Almeida. Op. Cito opera ex nunc opera ex tunc

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PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS
JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO

da matéria contida na MP revogada. S. O sistema instituído


6.11. Outras questões polêmicas pela EC n Q32 leva à impossibilidade - sob pena de fraude
à Constituição - de reedição da MP revogada, cuja matéria
6.11.1. O Presidente da República pode retirar MP já editada?
s~mente p.oderá voltar a ser tratada por meio de projeto de
Não. O Presidente tem o poder discricionário de editar ou não a leI. 6. Medida cautelar indeferida"299.
medida provisória. Mas, uma vez editada e publicada no Diário Ofi-
cial, deve submetê-la de imediato à apreciação do Congresso. Não
6.11.2. O Presidente da República pode editar um MP revogando
pode mais voltar atrás, retirar a MP, pois estaria usurpando o poder
outra MP?
do Congresso Nacional.
O que o Presidente da República pode fazer é editar outra medi- . Sim~ Essa é a posição do STF, esposada nos julgados acima trans-
da provisória revogando a primeira, e submeter ambas ao Congres- cntos. E de se detalha~ porém, os efeitos dessa MP revogadora.

so Nacional. . Q~ando o Chefe do Executivo edita uma MP, deve submetê-la


Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal: lmedlatame~te à apreci,ação do Congresso. Caso se arrependa do
ato que pratIC?U, podera editar uma nova medida provisória, revo-
"Orientação assentada no STF no sentido de que, não sendo
gando a antenor.
dado ao Presidente da República retirar da apreciação do
Congresso Nacional medida provisória que tiver editado, é- , Mas deve-:e.lem~rar, que mesmo essa nova medida provisória
-lhe, no entanto, possível ab-rogá-Ia por meio de nova me-
e um ato pr.ecano, (~mstavel), que pode ou não ser aceita pelo Con-
dida provisória, valendo tal ato pela simples suspensão dos
gresso ..Asslm, o ~mco efeito que a nova MP produz é a suspensão
efeitos da primeira, efeitos esses que, todavia, o Congresso
poderá ver restabelecidos, mediante a rejeição da medida dos efeitos da pnmeira medida. Nessa hipótese, delineiam-se algu-
ab-rogatória"298. mas possibilidades:

"MEDIDA PROVISÓRIA. REVOGAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1) O Congr~ss~ aprova a segunda medida provisória (revogado-
EFEITOS. SUSPENSÃO DA TRAMITAÇÃO PERANTE A CASA ra): a pnmelra MP está definitivamente revogada. A segunda
LEGISLATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE RETIRADA DE MP DA MP (revogadora) converte-se em lei.
APRECIAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. EMENDA CONS-
TITUCIONAL NQ 32. IMPOSSIBILIDADE DE REEDIÇÃO DE 2) O C~ng~esso rejeita a segunda MP (revogadora): nesse caso,
MP REVOGADA. 1. Porque possui força de lei e eficácia ime- a pnmelra MP volta a produzir efeitos, e deverá ser apreciada
diata a partir de sua publicação, a Medida Provisória não ?~rmalmente pelo Congresso, podendo ser aprovada ou re-
pode ser 'retirada' pelo Presidente da República à aprecia- Jeitada.
ção do Congresso Nacional. Precedentes. 2. Como qualquer
outro ato legislativo, a Medida Provisória é passível de ab- u~ exemplo pode aJudar a esclarecer essa complexa situação.
-rogação mediante diploma de igualou superior hierarquia. I~~gme-se que .0 Presidente da República editou medida provi-
Precedentes. 3. A revogação da MP por outra MP apenas sona (A) confermdo aumento de mil reais aos servidores de um
suspendê a eficácia da norma ab-rogada, que voltará a vigo- determinado Ministério. Contudo, diante das críticas de vários se-
rar pelo tempo que lhe reste para apreciação, caso caduque
to~es da sociedade contra o aumento dos gastos públicos, resolve
ou seja rejeitada a MP ab-rogante. 4. Conseqüentemente, o
editar uma segunda MP (B) revogando a primeira.
ato revocatório não subtrai ao Congresso Nacional o exame

299. STF, Pleno, ADIn 2984-MCjDF, Relatora Ministra EIlen Grade, DJ de 14.05.2004.
298. STF, Pleno,ADIn 1314-MCjDF, Relator Ministro Ilmar Galvão, DJ de 22.09.1995.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Quais os efeitos imediatos da MP-B? Ela suspende imediata- com modificações, a mesma matéria versada pela primei-
mente os efeitos da MP-A (ou, como dizia o Ministro moreira Alves, ra. Do contrário, estar-se-ia ignorando, a um só tempo: a) a
opera uma revogação sob condição resolutiva). A partir daí, a MP-B proibição de reedição de medida provisória; b) o prazo de
irá tramitar normalmente no Congresso, enquanto a tramitação da sessenta dias, porquanto o lapso temporal constitucional-
MP-A fica suspensa (e suspensos, também, os prazos de vigência mente previsto restaria ampliado"301.
e trancamento de pauta). Em outras palavras: enquanto tramita a
MP-B, os servidores ainda não recebem um tostão sequer de au- 6.11.3. O que aconteceu com as medidas provisórias que esta-
mento. vam em vigor quando da promulgação da EC 32/01?
Se o Congresso Nacional aprovar a MP-B, ela transformar-se-á Permaneceram indefinidamente em vigor; "congeladas'; até de-
em lei, e revogará definitivamente a MP-A, que deixará de existir. cisão definitiva do Congresso, por força do art. 2º da EC nº 32/01:
Mas e se o Congresso rejeitar a MP-B? Nesse caso, a MP-A volta "As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação
a vigorar, e deverá ser apreciada normalmente pelo Congresso, vol- desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior
tando a vigorar pelo tempo que lhe restava de vigência. Enquanto as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso
Nacional".
isso, os servidores voltarão a usufruir do aumento, ao menos por
enquanto, pois a MP-A poderá ser aprovada ou rejeitada pelo Le- Dessa forma, as MPs editadas antes de 11 de setembro de 2001
gislativo. (~ata da promulgação da EC 32) e que ainda não tinham sido apre-
E se a MP-A já tivesse produzido alguns efeitos (alguns servido- CIadas pelo Congresso Nacional naquela data permanecerão em vi-
res já tinham recebido o aumento) quando da edição da MP-B, pos- gor até que sejam revogadas por outro ato normativo, ou até que o
Congresso delibere sobre elas definitivamente (o que é politicamen-
teriormente aprovada? Entendemos que, nesse caso, deve-se apli-
te muito improvável).
car a mesma lógica geral das medidas provisórias, isto é: os efeitos
já produzidos ficam mantidos, a não ser que o Congresso nacional Interessante noticiar que Anna Cândida da Cunha Ferraz sustenta
edite decreto legislativo dispondo em contrário. Não enxergamos a inconstitucionalidade do artigo 2º da EC 32/01, por violar a cláusu-
motivo que justifique tratamento diferente 30o . la pétrea da separação de poderes (art. 60, § 4º, III)302.
Advirta-se, porém, que se o Presidente pode editar MP revo-
gando uma MP anterior, não pode fazê-lo para apenas modificar 6.12. As alterações propostas na PEC 01/2011
pontualmente uma primeira medida, pois estaria, em verdade, en-
gendrando um mecanismo de fraude à Constituição para manter a Tramita no Senado Federal Proposta de Emenda à Constituição
MP original em vigor por prazo maior que o constitucionalmente (PEC 11/2011) que prevê a alteração do rito das medidas provisó-
rias.
estabelecido.
Veja-se o que diz a respeito José Levi do Amaral Júnior: De acordo com essa PEC, o prazo de vigência das MPs passaria a
ser de cento e vinte dias, diretamente, e não mais 60 dias, prorrogá-
"Não é póssível, no sistema da Emenda Constitucional n. veis automaticamente, como acontece hoje.
32/2001, a revogação de medida provisória nova em cur-
so por uma medida provisória subseqüente disciplinando,
301. AMARAL JÚNIOR, José Levi Mello do. Op. Cit., p. 305.
302. FER~Z, Anna Cândida da Cunha. Medidas Provisórias e Segurança Jurídica.
300. No sentido do texto: BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, et aI. Curso de Direito In: CLEVE, Clemerson Merlin; BARROSO, Luís Roberto. Doutrinas Essenciais:
Constituciona:I. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 851 Direito Constitucional, volume IV, São Paulo: RT, 2011, p. 444.

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JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO
PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS ESPECIAIS

Além disso, o prazo de trancamento de pauta da:, med.idas p~o­ 7. DECRETOS AUTÔNOMOS
visórias passaria a ser de 45 dias para cada Casa, e nao maIS 45 dIas
contínuos e improrrogáveis. Como já dissemos, os decretos autônomos não se submetem
,
Entendemos que ambas as mudanças são extremamente saluta- propriamente, ao processo legislativo, pelo simples fato de que são
res. elaborados pelo Presidente da República, sem a participação do Con-
gresso Nacional.
A primeira, porque torna mais prático o prazo. de vigência: já q~e
o Congresso nunca aprecia a MP no prazo de 60 dIas, e a prorr~gaçao Todavia, optamos por estudá-los brevemente, já que se enqua-
do prazo é automática, melhor prever o lapso total de 120 dIas, de dram na categoria dos atos normativos primários (atos com força de
lei).
uma vez.
A segunda proposta de alteração também é muit~ importante, já O artigo 84, inciso IV, segunda parte, da CF, prevê a competência
que, se for aprovada, acabará com a distorção qu~ eXIst~ ~tu~lment~: do Presidente da República para expedir decretos e regulamentos
como o prazo é de 45 contínuos, o Senado "paga pela m~:Cla da Ca- para a fiel execução das leis. Aqui temos a competência presidencial
mara. Com efeito, muitas vezes a Câmara dos Deputados Ja entrega a para a edição de decretos regulamentares - decretos que regulamen-
tam, isto é, especificam e esmiúçam o conteúdo de uma lei. São atos
MP ao Senado com o prazo de 45 dias esgotado, isto é, a medida pro-
infralegais, secundários e dependentes. Não podem inovar o ordena-
visória já chega ao Senado trancando a pauta, o que inviabiliza - ou,
mento jurídico. Não podem ser contra legem nem praeter legem, mas
no mínimo, dificulta - os trabalhos legislativos daquela Casa.
apenas secundum legem (não podem contrariar nem completar as
No próprio Senado Federal, foi apresentado um substitutivo, com leis, mas apenas esmiuçá-las).
algumas alterações relevantes.
Já o inciso VI do mesmo artigo prevê a figura dos decretos autô-
Além de incorporar essas duas alterações já citadas, o substituti- nomos. Tal espécie normativa foi criada, no ordenamento brasileiro,
vo vai além: estabelece que a rejeição da MP pela comissão mista de com a EC 32/01. A redação original do dispositivo previa a compe-
Deputados e Senadores dispensa a apreciação ~o Plenár~o das Ca~as, tência de dispor; mediante decreto, na forma da lei (...). A EC 32/01
transformando automaticamente a MP em projeto de leI sob regIme retirou a expressão "na forma da lei" e instituiu a possibilidade de o
de urgência. Presidente da República editar decretos com hierarquia e força de
lei.
Trata-se de uma inovação interessantíssima (pois assim o é qual-
quer tentativa de frear a exorbitância de MPs que nos assola). O te- Há setores da doutrina que consideram que a criação desse tipo
mor que temos é que, mesmo com essa mud~nça, o Co.n~r~sso con- de decreto foi inconstitucional, pois isso teria violado a separação
tinue sem exercer o poder de rejeitar as medIdas provIsonas, o que de poderes e o princípio da legalidade. Porém, a doutrina majoritá-
não mudaria, efetivamente, muita coisa. ria de Direito Constitucional considera válida essa criação.

Outra proposta interessante que consta do substitutivo é a expli- O STF também possui um obter dictum (dito de passagem) no
citação de que nenhum prazo corre durante o recesso (hoje, como qual considera constitucional essa espécie de decreto (ADIn 3.254,
Pleno, Relatora Ministra Ellen Gracie).
vimos, só há previsão expressa nesse sentido em relação ao prazo de
vigência). Os decretos autônomos só podem ser utilizados em duas hi-
Enfim: aguardemos para ver se a PEC será aprovada, como que- póteses TAXATIVAMENTE previstas na CF: a) para dispor sobre a
rem vários membros do Congresso, ou se será mais uma boa ideia organização da Administração Pública Federal, desde que isso não
condenada a mofar nas gavetas do Congresso. cause aumento de despesa (pois essa matéria só pode ser tratada
por lei, por ter reflexos orçamentários) nem criação ou extinção de

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