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Rizoma: experiências interdisciplinares em ciências humanas e ciências sociais aplicadas, v. 1, n.2, p. 178-190, Abril,
2017.
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Introdução
Conforme Nunes et. al. (2007), a partir da Reforma Psiquiátrica Brasileira, o
cuidado em saúde mental é preconizado na Atenção Primária à Saúde, de modo que a
maior parte dos problemas em saúde mental pode ser resolvido nesse nível de
assistência, com os princípios da universalidade, integralidade, descentralização e
participação social, enfatizando a prática preventiva e promocional em saúde,
fomentando, assim, uma rede integrada de assistência ao portador de transtorno mental.
Para a Organização Mundial da Saúde, o conceito de saúde se define em um
estado completo de bem estar biopsicossocial (físico, mental e social) (OMS, 2016).
Pensada dessa forma, a boa qualidade de vida do sujeito não provém somente do
cuidado médico, da atenção dos profissionais para com as patologias do indivíduo, mas
também, e principalmente, da própria atuação deste frente ao cuidado de si. O que nos
leva a um questionamento: como associar o cuidado de si com práticas em saúde
oferecidas pela Atenção Primária à Saúde?
Pensado pelo viés de prática integrativa, o yoga se mostra como uma alternativa
bastante oportuna na promoção da saúde mental, bem como na prevenção e recuperação
do sujeito em sofrimento psíquico. Para Kupfer (2016), embora haja várias formas de se
definir o yoga, este teria surgido com o propósito de oferecer crescimento pessoal,
trouxe uma visão especial sobre o ser humano, harmonizando o corpo e a mente. Yoga é
união e aplicação, KUPFER (2013) “um caminho que conduz o ser humano à
compreensão de si mesmo”.
Tomando o conceito de união trazido por Kupfer para “traduzir” a palavra yoga,
entende-se que se trata de unir, equilibrar corpo e mente, de modo que a dualidade
existente se funda em um mesmo caminho. Não obstante, também podemos tomar o
conceito de união para expressar a prática do yoga de forma a se atrelar aos princípios
de integralidade e universalidade propostos pela Atenção Básica em Saúde, fomentando
práticas educativas para os usuários da saúde pública. Isso significa dizer que o bem
estar do sujeito está diretamente vinculado ao modus operandi ao qual ele vive.
Muitas são as benfeitorias oferecidas pela prática do yoga, quais sejam:
direcionamento ético do cuidado de si, desenvolvimento de habilidades sociais a partir
do conceito de não-violência (contra si, contra o outro e contra o mundo), maior
capacidade de reconhecer em si determinada dificuldade, maior capacidade de
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Kupfer (2016) diz que o yoga não se fecha em um conceito teórico, pois algumas
pessoas trazem a definição de arte ou ciência; outras entendem como um exercício e/ou
técnica; outras ainda, como doutrina ou religião. No entanto, o yoga surgiu como uma
visão ímpar ao ser humano e seu papel na ordem das coisas, onde grande parte desse
papel é o crescimento pessoal. Para o autor o yoga seria um meio e um fim
simultaneamente, uma vez que tudo o que fazemos visa conseguir algo e, para o yogi , a
liberdade seria o objetivo supremo. Quando Kupfer (2016) fala em se libertar, está se
referindo aos condicionamentos e crenças nocivos, às dificuldades para o crescimento,
aos empecilhos para a plenitude e realização do autocuidado.
A partir dos conceitos e representação que o yoga oferece podemos entender que
é uma prática que visa o olhar-para-si, o reconhecimento das dificuldades, a aceitação
da condição que o sujeito vivencia. É uma atividade física, mas também mental; é uma
atividade de meditação, mas também de racionalização. É uma alternativa ao modelo
biomédico para a promoção e para o tratamento de saúde mental.
De acordo com Streeter (apud Schulz, 2016), a prática de yoga diminui
significativamente os sintomas de depressão, pois os resultados de sua pesquisa
mostraram um aumento dos níveis de ácido gama-aminobutírico (GABA), substância
química que possui efeito calmante. Para Brown (apud Schulz, 2016), a prática de
respiração controlada pode oferecer mudanças na resposta do sistema nervoso
autônomo, ajudando a reduzir sintomas associados à ansiedade, depressão, déficit de
atenção, entre outros.
Segundo Cope (apud Walton, 2011), o yoga oferece uma forma de treinar a
atenção e a autorregulação da consciência, visando atender a demanda de pensamentos,
sentimentos e experiências, de modo a conviver com tais fatores sem julgamentos. Para
Walton (2011), a reação aos pensamentos é o que produz os problemas, e a prática
regular de yoga contribui para a aceitação, para um melhor discernimento da situação,
pois a ideia de entender os pensamentos invasivos/negativos de forma imparcial é o que
fomenta a meditação.
Walton (2011) ainda fala sobre o dualismo mente-corpo, onde, para os yogis,
tais fatores estão interligados de todas as formas, sendo a mente uma forma sutil do
corpo, e o corpo uma forma grosseira da mente. Dessa forma, sempre que estimulamos
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No Brasil o yoga foi inserido no Sistema Único de Saúde (SUS) no ano de 2011,
a partir da portaria 719, de 07 de abril do referido ano, quando foi criado o Programa da
Academia de Saúde, que surgiu com o objetivo de promoção da saúde e produção do
cuidado, a partir de práticas corporais e atividades físicas (Brasil, 2011). No entanto, o
yoga ainda é uma prática pouco difundida no âmbito da saúde pública, embora esta
prática milenar já tenha se mostrado eficaz em várias situações, como cita Vorkapic
(2012) quando apresenta um estudo onde 17 sujeitos mostraram redução significativa
dos níveis de ansiedade relacionada a ataques de pânico quando tratados com
iogaterapia.
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estar, fazendo com que o sujeito estabelecesse uma boa relação com o outro e com o
meio onde vivia.
Mas como desenvolver uma prática intimista de tamanha complexidade em uma
sociedade altamente volátil? Para Foucault (1985), a prática da medicina romana via no
meio externo elementos tanto positivos quanto negativos para a saúde do sujeito, sendo
necessário que este desenvolvesse a habilidade do cuidado de si, para que assim tivesse
condições de identificar os elementos nocivos. O autor ainda fala sobre a prática do
regime, onde o indivíduo pudesse se valer de noções básicas de medicina, a fim de que
pudesse ser seu próprio conselheiro de saúde. Segundo Foucault (1985, p. 107):
reconhece-se aí, facilmente, um dos princípios essenciais da prática de si: amar-se para tê-lo
sempre a mão (o sujeito), de um discurso prestimoso cedo aprendido, frequentemente repetido, e
regularmente meditado. O logos médico é desses ditando a cada instante o bom regime da vida.
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Metodologia
Este estudo conta com um método de abordagem cartográfico sobre o processo
de promoção de saúde mental a partir das contribuições da prática do yoga como
atividade integrativa e uma ferramenta ética do cuidado de si. A cartografia é um
método desenvolvido por Deleuze e Guatarri (2005), para contrapor os métodos
modernos de pesquisa que, segundo os autores, visa acompanhar um processo em
produção. A cartografia possui um caráter essencialmente qualitativo.
Para Costa (2014), a cartografia enquanto metodologia nos ajuda a pensar nas
perguntas que ela pode oferecer, tirando o foco do mundo das essencializações, ou seja,
oferecendo perguntas que direcionam ao processo, à criação, à composição de
determinada realidade. O autor ainda fala que, para cartografar é necessário o
pesquisador estar no território, isto é, estar em movimento, afetando e sendo afetado
pelo que cartografa.
Neste caso se considerou usar o método cartográfico de pesquisa pelo fato de
que, assim como tal abordagem é um processo, a prática do yoga também o é, haja vista
que, conforme Barros et. al (2013), o yogi sofre vários atravessamentos, que vão desde
os benefícios físicos, filosóficos, sociais, até o momento da cultura do eu, onde aprende
a prática da não violência (desenvolvimento da cultura de paz), bem como a reeducação
de hábitos nocivos à saúde.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, exploratória e de natureza básica, usando-
se de procedimento bibliográfico, para que assim possa oferecer uma alternativa para a
promoção de saúde mental, bem como uma possibilidade para a recuperação do sujeito
em sofrimento psíquico.
A seleção bibliográfica visou buscar materiais que apontassem a prática do yoga
como uma ferramenta integrativa na promoção de saúde mental, utilizando como
estratégia a combinação entre as palavras yoga, saúde mental, autocuidado e
autoconhecimento, priorizando trabalhos mais recentes na área. O material que
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Discussão e Resultados
Conforme Faria (2015), as repercussões da prática do yoga para a saúde mental
mostram resultados positivos no que se refere à redução do estresse, da ansiedade e dos
sintomas de depressão, bem como uma melhora significativa na qualidade de vida, além
dos benefícios físicos mensurados a partir da atenuação gradual de dores de cabeça e
costas. Levando em conta que o yoga é um estilo de vida que busca desenvolver o
sujeito nos níveis físico, mental e espiritual
[...] a abordagem do yoga reconhece que a raiz dos problemas mentais se encontra em todos os
níveis da existência humana: físico, mental e espiritual; e somente quando esses três níveis são
considerados pode-se conseguir saúde mental duradoura (Faria, 2015 apud Sarkar, 2004, p.64).
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2008b apud Foucault, 1995a). Essa seria a premissa para a ética do cuidado de si. O
autor nos traz a ideia, a partir de Foucault, sobre como nos reconhecemos enquanto
sujeitos através da sexualidade. Não obstante, aqui podemos fazer uma ponte com tal
conceito, de modo que a prática do yoga também favorece que nos reconheçamos
enquanto sujeito, uma vez que se trata de uma atividade introvertida.
A medicina na época do império romano passava orientações às pessoas de
modo que elas soubessem qual a melhor hora para o banho, o que era bom comer, que
roupas utilizar em diferentes estações do ano, ou seja, era uma prática que deveria ser
aprendida pelo sujeito e seguida pelo resto de sua vida. Trata-se, portanto, de fomentar
no sujeito a necessidade e capacidade de se autoavaliar (Soler, 2010 apud Foucault,
1985). Não diferente, a prática do yoga segue um modelo bastante similar, no que diz
respeito ao praticante não somente se utilizar dela no momento da atividade, mas
estendê-la para o seu dia-a-dia.
O cuidado de si tomado no campo da ética nos mostra a necessidade do
compromisso consigo mesmo, da importância de saber o que se deve ou não fazer em
detrimento do bem estar biopsicossocial. Isso nos aponta a relevância em aprender o
cuidado de si com a prática do yoga voltado para a prevenção e promoção da saúde
mental.
Considerações Finais
Embora o yoga não se aplique de maneira absoluta em casos de recuperação,
bem como não são todas as pessoas que conseguem se identificar com a prática, – para
promoção de saúde – a partir dos estudos pesquisados ficam evidentes os benefícios do
yoga enquanto práxis na promoção de saúde mental, além de se mostrar uma ótima
ferramenta para o desenvolvimento do autocuidado e do autoconhecimento.
Após uma revisão bastante sistematizada sobre a literatura e pesquisas existentes
no campo do yoga como ferramenta auxiliadora na promoção de saúde mental, de uma
maneira geral, podemos constatar os ganhos na qualidade de vida do sujeito praticante,
desde as mudanças no padrão de pensamento até suas ações em prol da saúde.
Com o nosso estudo também demostramos que – representando uma prática
promocional, mas também preventiva e de recuperação – o artifício do yoga corrobora
para o cuidado de si. Como uma atividade educativa, direciona o sujeito à consciência
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Referências
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Ribeirão Preto.
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Curriculum resumido
Álvaro Lemes da Rosa é psicólogo formado pela UNIFACVEST e pós- graduado em
saúde mental pelo UNICENSUPEG.
E-mail: lemesalvaro@gmail.com
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Como citar:
Rosa, A. L. Miranda, A.V.S. (2017). O Yoga como Prática Integrativa na Promoção de
Saúde Mental: uma ferramenta ética para o cuidado de si. Rizoma: experiências
interdisciplinares em ciências humanas e sociais aplicadas. 1 (2), (pp.119-126).
Rizoma: experiências interdisciplinares em ciências humanas e ciências sociais aplicadas, v. 1, n.2, p. 178-190, Abril,
2017.