Aula 02: História e Cultura (2018) “História da história cultural”: 4 fases – Clássica,
História social da arte (1930), História da cultura
Ideia da aula: postular temas e problemas
1 – O que é cultura?
2 – Artes x manifestações cotidianas
3 – Zeitgeist: “espírito de uma época”
4 – Aspectos culturais de manifestações econômicas,
políticas (Weber)
5 – Relação da cultura e da sociedade – cultura x
politica x economia. Reflexo?
Texto 1: Peter Burke – O que é História Cultural
História Cultural redescoberta nos anos de 1970 –
desde então vem passando por renovações.
Pergunta: O que historiadores culturais fazem?
Amplo espectro do que se considera como teoria e
prática da história cultual. “Guarda-chuva” que engloba
temas e problemas de pesquisa.
Pergunta – O que é cultura?
Antes associada a manifestações artísticas,
movimentos artísticos – cultura letrada, erudição,
produção intelectual.
HOJE: CULTURA – SITUAÇÕES COTIDIANAS, SENTIDO
AMPLIADO – CULTURA = SOCIEDADE. ASPECTOS DO
VIVER EM SOCIEDADE.
RESULTADO: FRONTEIRAS DO TEMA SE AMPLIARAM.
Atenção, então, o se voltou para o MÉTODO.
Várias vertentes. TERRENO COMUM: SIMBÓLICO e
suas interpretações. Símbolos estão em toda parte, na
arte e na vida comum.
Tradição francesa: IMAGINÁRIO SOCIAL,
MENTALIDADE COLETIVA;
Tradição inglesa: SOCIAL.
Peter Burke: se diz historiador cultural e afirma praticar
diferentes abordagens: história social da cultura
elevada e cultura popular; antropologia histórica,
história da performance. (12)
Capítulo 1 – A grande Tradição:
História cultural não é descoberta nova. Já na
Alemanha, 200 anos antes. Antes disso, 1780, história
das culturas humanas, regiões e nações.
popular (1960) e a Nova história cultural. (16)
Clássica
Ideia: historiador pinta “Retratos de uma época” (1800
a 1950).
A cultura do Renascimento na Itália, Jacob Burckhardt
(1860) e Outono da Idade Média (1919), Johan
Huizinga.
Ambos: amadores de arte, entender obras em seu
contexto histórico. Conexões entre diferentes tipos de
arte. ZEITGEIST – “ESPÍRITO DA ÉPOCA” (Hegel e
outros filósofos). Uma “História da cultura”.
CENTRAL: Ideia se desenvolve na ALEMANHA antes
que ela fosse uma comunidade política, uma nação, ela
era uma COMUNIDADE CULTURAL. (17)
Burckhardt: Se baseava em: ELEMENTOS
RECORRENTES, CONSTANTES, TÍPICOS, PRODUZINDO
“GENERALIZAÇÕES”.
Huizinga (1929): achar PADRÕES DE CULTURA,
descrever SENTIMENTOS característicos de uma época
e suas incorporações em obras de arte. “ideais de
vida”, formas e padrões de comportamento.
Da sociologia à História da arte
Max Weber – A ética protestante e o espírito do
capitalismo (1904) – raízes culturais do capitalismo –
“cultura do capitalismo” – explicação cultural para
mudança econômica. (20)
Norbert Elias: O processo civilizador (1939), usou Mal
estar na civilização (1930), de Freud. Desenvolvimento
gradual do autocontrole sobre emoções nas Cortes da
Europa Ocidental. – Escrever sobre a civilização e não
sobre a cultura.
Ernst Gombrich: “esquemas culturais” – biografias
intelectuais.
A grande diáspora
A partir dos anos de 1930, depois de Hitler no poder.
Cientistas e intelectuais vão para outros lugares,
incluindo EUA.
EUA: cursos sobre CIVILZAÇÃO, mais que sobre
CULTURA. “História das Ideias”.
1

Na Grã-Bretanha: História cultural – Shakespeare. E
depois preocupação com relações entre cultura e
sociedade.
Cultura como expressão ou reflexo da sociedade:
Arnold Hauser, marxista – História social da arte –
cultura pensada a partir de conflitos sociais e
econômicos.
A descoberta do povo
Ideia de “CULTURA POPULAR” já na Alemanha no XVIII.
Canções e contos populares, deixada para o FOLCLORE.
1959 – História social do Jazz, Francis Newton
(pseudônimo de Hobsbawm) – um dos primeiros a
estudar a cultura popular por outro viés.
JAZZ – como negócio e forma de protesto político e
social (historiador econômico e social)
THOMPSON: A formação da classe operária (1963) – o
lugar da cultura no processo de formação da classe –
simbolismos de alimentos, rituais, iconografia, poesia –
ESTRUTURA DE SENTIMENTOS DA CLASSE
TRABALHADORA.
Influência: na “história vista de baixo”.
CAPÍTULO 2 – “PROBLEMAS DA HISTÓRIA CULTURAL”
Problemas dos clássicos
Outono da Idade Média, Huizinga
1 - RECORTE (TENTAÇÃO) usou poucas fontes, usando-
as repetidas vezes. Poderia ter recorrido, por exemplo,
a outros escritores.
2 – Tratar textos e imagens como ESPELHOS DE ÉPOCA
Burckhardt, A cultura do renascimento
1 - Falou do testemunho “involuntário” – dizer e saber
coisas involuntariamente.
2 - Problema: PENSAR QUE ARTE, ROMANCES SÃO
SEMPRE DESINTERESSADOS, livres de paixão e
propaganda.
Ambos: chamados de “impressionistas” – observar
aquilo que nos interessa.
Pergunta: História cultural está condenada a ser
impressionista? História serial? (livros, testamentos,
escritoras, panfletos políticos? – anos 1960)
CRÍTICA MARXISTA: À abordagem “Clássica”:
1 - ela “fica no ar”, falta-lhe base econômica e social –
“Quais são as fundações econômicas do
renascimento?” e da peste negra?
2 – Superestimar HOMOGENEIDADE CULTURAL e
IGNORAR CONFLITOS.
Thompson fala de “noções excessivamente
consensuais”.
Preciso: identificar diferentes culturas, culturas
diferentes de classes sociais diferentes, homens,
mulheres, gerações.
PROBLEMAS DA HISTÓRIA MARXISTA
Cultura é apenas “superestrutura”? algo que teria sido,
hipoteticamente, subestimado por Marx.
Thompson foi criticado por outros marxistas, chamado
de “CULTURALISTA” – por dar ênfase na experiência e
nas ideias (37).
TENSÃO CULTURALISMO X ECONOMICISMO
NOTA: Falar como Thompson vai resolver isso em
artigo sobre Antropologia.
Raymond Williams: chamou base “estrutura-
superestrutura” de muito “rígida” e preferia falar em
“relações entre elementos no modo de vida como um
todo”. Pensava em termos de “HEGEMONIA CULTURAL”
(Antonio Gramsci) – classes dominantes exercem poder
não só pela força, mas por ideias. (38)
Questão central: BURKE – diz que crítica de Thompson
às GENERALIZAÇÕES ameaça jogar história da CULTURA
EM “FRAGMENTOS”.
PERGUNTA: É possível estudar as culturas como um
todo, sem fazer falsas suposições sobre a
homogeneidade cultural?
RESPOSTAS PROPOSTAS:
1 – Estudar tradições culturais
2
2 – Tratar cultura erudita e popular como
“subculturas”, parcial embora não inteiramente
separadas ou autônomas.
Os paradoxos da tradição
Tradição: conhecimentos e habilidades legados por
uma geração para a seguinte. Como muitas tradições
podem COEXISTIR, libera historiadores culturais da
suposição de homogeneidade ou uma “era”.
Problema: Tradição “imóvel”? Signos externos podem
mascarar a inovação da tradição. “CONFLITO INTERIOR
DAS TRADIÇÕES” – DISPUTA INEVITÁVEL ENTRE REGRAS
UNIVERSAIS sempre em transformação.
Cultura popular em Questão
Outra alternativa para fugir da “homogeneidade”
cultural dividi-la entre erudita e popular
Cenário: assim como Zeitgeist e “superestrutura”,
noção de “cultura popular” se tornou fonte de debate.
PROBLEMA: quem é o povo? Quem não é da elite? Há
homogeneidade entre os excluídos? Culturas populares
no plural? Cultura “feminina” x “masculina”? Podemos
pressupor que pessoas de status elevado, riqueza e
poder, são necessariamente diferentes, no que diz
respeito à cultura, das pessoas comuns?
[Livros populares na França XVII lido por todos]
ROGER CHARTIER: DEFENDE QUE É IMPOSSÍVEL
ROTULAR OBJETOS OU PRÁTICAS CULTURAIS COMO
“POPULARES”. (42)
Outra questão: INTERAÇÃO ENTRE CULTURAS.
O QUE É CULTURA:
Termo “cultura” ainda é mais problemático – “história
da cultura” – conceito vago (Burckhardt)
Antes: “Alta cultura” (artes e ciências)
Depois: se ampliou para os lados (ampla gama de
artefatos)
Depois: Olhar antropológico para a cultura
(Malinowski, 1931) – artefatos, técnicas, bens, ideias,
hábitos e valores.
Crescente preocupação ANTROPOLÓGICA com o
cotidiano.
CONCLUSÃO: HISTORIADORES SE APROPRIAM DA
NOÇÃO ANTROPOLÓGICA DE CULTURA. 43
CAPÍTULO 3 – A VEZ DA ANTROPOLOGIA
1960-1990: VIRADA EM DIREÇÃO À ANTROPOLOGIA da
História cultural.
Historiadores: “aprenderam a usar o termo “cultura”
no sentido amplo” + usar termo “cultura” no plural.
Expansão da cultura
“HISTÓRIA CULTURAL DE TUDO”: Psicologia cultural
(impulsos idênticos), ações simbólicas na política,
culturas específicas, do “mérito”, “do jogo”, “do amor”,
“do protesto”, etc.
CONCLUSÃO: “EXPANSÃO DO IMPÉRIO DA CULTURA”
A hora da Antropologia histórica
Marcel Mauss (fenômeno do Dom), Evans-Pritchard
(bruxaria), Mary Douglas (pureza) e Clifford Gertz,
sobre Bali.
Keith Thomas – um dos pioneiros da antropologia
histórica britânica. (Astrologia e feitiçaria) Religião e
declínio da magia, 1971.
Nathalie Zemon Davis – Pureza e Perigo – violência
comunitária da época – “ritos de violência”,
linchamento para purificar a comunidade local da
nódoa da heresia. (50)
Linguistas, Semiótica, influência de Claude Lévi-Strauss.
Le Goff e Emmanuel Le Roy.
Maior influência: Clifford Gertz (EUA) e sua “TEORIA
INTERPRETATIVA DA CULTURA” (51)
CULTURA PARA GEERTZ: “um padrão, historicamente
transmitido, de significados incorporados em símbolos,
um sistema de concepções herdadas, expressas em
formas simbólicas, por meio das quais os homens se
comunicam, perpetuam e desenvolvem seu
conhecimento e suas atitudes acerca da vida” (52)
3
Método: “descrição densa” para entender esses
símbolos. (Brigas de galo em Bali) Interpretação das
culturas – trata as brigas de galo como texto –
“dramatização das preocupações com o status”.
Inspirado em teórico da LITERATURA (Kenneth Burke)
DARNTON: O grande massacre de gatos (1984) – “LER
UM RITUAL” PARA CAPTAR A “ALTERIDADE”, um mundo
diferente do seu, distante. Começa pela risada dos
aprendizes – “nossa incapacidade de perceber a
piada” – para entender cultura e contexto dos
trabalhadores.
INTERESSE HISTÓRICO PELOS RITUAIS: Natalie Zemon
Davis (charivaris), Thompson (rough music, venda de
esposas, etc.)
CENTRAL: O QUE FEZ A ANTROPOLOGIA PARA
HISTÓRIA
Emmanuel Le Roy e Daniel Roche (FRA), Natalie Z.
Davis e Lynn Hunt (EUA), Ginzburg (ITA) se diziam
marxistas e partir da década de 1960 voltam-se para a
antropologia como maneira alternativa de vincular
cultura e sociedade, uma maneira que não reduzisse a
primeira a um reflexo da segunda. 56
Interesse pela cultura popular: aumentou ainda mais a
aproximação dos historiadores com a Antropologia.
Ao microscópio
Na década de 1970 – micro-história, Ginzburg e Levi.
O que foi: reação contra um certo tipo de história
social (métodos quantitativos, tendências gerais).
Reação que foi de encontro à Antropologia. Procurar
rostos na multidão, fugir do DETERMINISMO SOCIAL e
Econômico.
Estudo de caso: ver POSSIBILIDADES DE AÇÃO DO
SUJEITO HISTÓRICO.
O QUEIJO E OS VERMES – Menocchio e uma nova
história da leitura, história vista de baixo, relações
entre cultura popular e erudita.
Pós-Colonialismo e feminismo – dar voz àquilo que
havia ficado invisível na leitura do imperialismo
europeu, incluía história cultural. Orientalismo, de Said
(1978) – estereótipos criados pelo Ocidente.
Feminismo: desmascarar preconceitos masculinos.
CAPÍTULO 4 – “Um novo paradigma?”
Antropologia inspirou autores dos anos 1970 e 1980,
mas há ainda outras inspirações para NOVA HISTÓRIA
CULTURAL
1989 – Lynn Hunt publica A nova história cultural (NHC)
A palavra “nova” para distinguir do que havia sido feito
anteriormente e distinguir da história social. Uma
tentativa de resposta aos desafios colocados acima.
DIFERENÇA: Preocupação com a TEORIA
QUATRO TEÓRICOS:
Mikhail Bakhtin – Norbert Elias – Michel Foucault –
Pierre Bourdieu.
BAKHTIN: teórico da linguagem e da literatura –
Cultura popular na Idade média e no Renascimento
(1965)
Conceitos: “carnavalização”, “destronar”, “linguagem
do mercado”, “realismo grotesco” – RITUAIS DE
DESSACRALIZAÇÃO
Destaca: IMPORTANCIA DA SUBVERSÃO E A
PENETRAÇÃO DA “ALTA” CULTURA PELA “BAIXA”,
especialmente por meio do RISO POPULAR. –
“diferentes vozes que podem ser ouvidas num texto”.
NORBERT ELIAS: sociólogo, interessado em história e
cultura. O processo civilizador (1939)
Conceitos: “Fronteira da vergonha” e “fronteira da
repugnância” que foram expulsando da sociedade um
número cada vez maior de formas de comportamento.
Outro conceito: “pressão social pelo controle”.
Termo: “Civilidade”
Crítica: a) superestima a influência das cortes e
subestima a das cidades; b) suposição que “civilização”
é um fenômeno fundamentalmente ocidental.
FOUCAULT: Filósofo, se Elias enfatizava o autocontrole,
Foucault chama a atenção para o controle sobre o eu,
sobre os corpos exercidos pelas AUTORIDADES. História
da loucura, da clínica, da vigilância, da sexualidade, dos
sistemas intelectuais.
Genealogia (Inspirado em Nietzsche) – traça
“acidentes” e não “evolução” das ideias,
DESCONTINUIDADES CULTURAIS, OU “RUPTURAS”.
MUDANÇA NA RELAÇÃO ENTRE AS PALAVRAS E AS
COISAS, invenção da loucura.
4
Questiona “epistemes” e “regimes de verdade” como
EXPRESSÕES DE UMA DADA CULTURA E, AO MESMO
TEMPO, FORÇAS QUE LHE DÃO FORMA.
Arqueologia: para chegar fundo às estruturas
intelectuais.
A ordem do discurso (1971): aula inaugural no Collège
de France – “estudo do controle do pensamento,
incluindo modos como certas ideias ou temas são
excluídos de um sistema cultural. (75) Loucos,
criminosos, desviantes sexuais.
CENTRAL: A ordem das coisas (1966) – categorias e
princípios subjacentes e organizadores de tudo o que
possa ser pensado, dito ou escrito em um dado
período. Os DISCURSOS DE UM PERÍODO.
Seu conceito de DISCURSO foi fundamental para SAID
em Orientalismo.
CRÍTICA: QUANTOS DISCURSOS HAVIA NA FRANÇA DO
SÉCULO XVIII?
PIERRE BOURDIEU
Diferente de Elias e Foucault, era filósofo que se
transformou em antropólogo e sociólogo, não escreveu
história.
Conceitos: “campo”, a teoria da prática, a ideia de
“reprodução cultural” e a noção e “distinção”.
Campo: literário, linguístico, artístico, intelectual ou
científico – domínio autônomo, independente em uma
determinada cultura, produzindo suas próprias
convenções. [Ideia não atraiu historiadores]
“Reprodução cultural”: modo pelo qual, p.ex.,
burguesia exerce seu poder por meio do sistema
educacional.
“TEORIA DA PRÁTICA”: FUNDAMENTAL, conceito de
“habitus”, que reagiria contra a rigidez da ideia de
regras culturais.
PRÁTICA COTIDIANA: pressupõe improviso sustentado
numa estrutura de esquemas inculcados pela cultura
tanto na mente quanto no corpo.
PRÁTICAS
É um dos paradigmas da NHC.
Exemplos: história da leitura – influenciada pela teoria
de MICHEL DE CERTEAU – ENFATIZA O PAPEL DO
LEITOR (82) – USOS CULTURAIS
Reação dos leitores aos textos, anotações na margem,
sublinhados, cartas escritas pelos leitores; gostos
literários, deslocamentos aparentes com
apresentações teatrais, leitura em voz alta, leitura
privada;
REPRESENTAÇÕES
Michel Foucault criticou historiadores pelo que
chamou de sua “ideia empobrecida do real”, que não
deixava espaço para o que é imaginado.
História da imaginação, história da representação.
Hsitoriadores franceses reagam: Duby e As três ordens
(1978) - imagem medieval dos “três estados”;
imaginário social O nascimento do purgatório, Le Goff
(1981) – ascensão da ideia de purgatório.
Benedict Anderson, em 1983: Comunidades
imaginadas sobre nacionalismo
Representação dos trabalhadores, das mulheres, do
“outro” (SAID) se tornaram foco nos anos de 1980.
História da memória, “memória cultural”, “lugares de
memória”, “memórias históricas”.
Cultura material; Historiadores da Literatura; história
dos alimentos (poder simbólico do açúcar); história dos
hábitos, roupas; habitação; ciência, do corpo;
REVOLUÇÃO NA HISTÓRIA CULTURAL?
Conclusão de Burke: Se ocorreram nas últimas duas ou
três décadas, poucas inovações de método, muitos
novos temas foram descobertos e explorados.
Destaca similaridades recentes e partes da obra de
Burckhardt e Huizinga sendo resgatadas.