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O autor do relato diz no prólogo por que resolveu escrever a narrativa que tem
por protagonista Manuel de Sousa Sepúlveda: «por me parecer história que
daria aviso e bom exemplo a todos, escrevi os trabalhos e morte deste fidalgo e
de toda a sua companhia, para que os homens que andam pelo mar se
encomendem continuamente a Deus e a Nossa Senhora».
2. CAUSAS DO NAUFRÁGIO
Essa política reflectia-se logo a partir da construção dos navios. Eram mal
construídos, utilizavam-se madeiras impróprias, a calafetagem era má, a
fiscalização era nula por parte das entidades. A preparação dos pilotos e até
mesmo dos engenheiros de construção era deficiente. De Itália vinham os
engenheiros e os especialistas que lá não serviam. A manutenção dos navios
quase não existia; depois de uma embarcação sair dos estaleiros, nunca mais
lá entrava para reparações. O carpinteiro de remendos era o fundo do mar.
O galeão grande São João estava demasiado velho. Diz o autor do Relato:
«tardaram muito em ver o cabo por causa das ruins velas que traziam, que foi
uma das causas, a principal, de seu perdimento»; «por o leme ser podre, um
mar que lhe então deu lho quebrou pelo meio e levou-lhe logo ametade».
Estas são algumas das causas remotas da perda do galeão. Uma outra causa
é a carga exagerada que trazia. António Sérgio, a propósito, comenta: «Os
estivadores carregavam conforme mais lhes convinha, ao sabor das espórtulas
de cada passageiro e dono, atulhando o galeão de fardarias em barda»
(Sérgio, 1974: 155).
O narrador do relato explica que, «ainda que a nau levava pouca pimenta, nem
por isso deixou de ir muito carregada de outras mercadorias, no que se havia
de ter muito cuidado pelo grande risco que correm as naus muito carregadas».
O próprio autor fala das razões do naufrágio e abandono do navio: «as razões
que davam para arribar foram que a nau era muito grande e comprida e ia
muito carregada de caixaria e de outras fazendas, e não traziam já outras velas
senão as que traziam nas vergas, que a outra equipação levou um temporal
que lhe deu na Linha, e estas eram tão rotas que se não fiavam nelas».
Sofreram a tempestade por terem partido tão tarde do porto, devido aos ventos
contrários. Na terra do Natal, «eram os ventos tais, que, se um dia ventava
levante, outro se levantava poente».
Face a tão grandes contrariedades, o barco não poderia escapar insane. Tudo
contribuía para a sua perda: a degradação do casco e das velas, certa
ignorância e imprevidência humanas, a cobiça de lucros, o abarrotar de carga e
a tempestade fatal.
3. O FATALISMO
Manuel de Sousa, à luz do autor, é inocente em tudo o que lhe aconteceu, a si,
á sua família e aos seus homens: «como já estava de cima que acabasse este
capitão com sua mulher e filhos e toda sua companhia, nenhum remédio se
podia cuidar a que a fortuna não fosse contrária».
É o fatum que guia os portugueses para a tragédia: «como parece que estava
determinado acabar Manuel de Sousa nesta jornada com a maior parte de sua
companhia, não quiseram seguir o conselho deste reizinho»; «os cegou a sua
fortuna, que não quiseram senão caminhar avante».
A imagem do destino ainda agora, nos finais do século XX, parece absorver a
psicologia de cada um dos portugueses. As expressões «é o destino», «ao
destino ninguém foge» são um lugar comum na boca das nossas gentes.
4. PLANOS E EMERGÊNCIAS
5. AS CLASSES SOCIAIS
O autor chega mesmo a afirmar, numa expressão bastante sui generis, que
Manuel de Sousa estava «maltratado do miolo». Malgrado a doença e vendo-
se roubado pelos cafres, a sua reacção foi a de um homem de senso: «dado
caso que já havia dias que vinha doente da cabeça, todavia sentiu muito esta
afronta».
Após a morte de sua esposa Dona Leonor, não chorou nem disse «cousa
alguma, estando assim com os olhos postos nela». Abriu uma cova e enterrou-
a, «se meteu pelo mato e nunca mais o viram». E assim acaba a história desta
curiosa personagem.
A ganância do lucro que ainda hoje define boa parte dos portugueses está bem
patente nalgumas atitudes dos náufragos do galeão São João. Afirma o autor
que Manuel de Sousa quisera «mandar buscar alguma água, e não houve
quem quisesse ir menos de cem cruzados cada caldeirão». Uma das causas
da perdição do navio, como já vimos, foi a da carga excessiva. Era pela
ganância do lucro que os portugueses atulhavam as embarcações.
CONCLUSÃO