Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
Aula 10
coleÇão
História
Essencial da
Filosofia
por OlâYo de Çârvalho
Bditor
Ê&on Mâísôl de OlivôiG Filho
Aoielo Grán o
Môniqlre Sehê.kêis e Dâgrnar Sizzolo
Da8qi Design
2d lleYisôo
q@iquu mAo ou foÍm,;eia êtâ lletiônicu 0ü ,nuú[nl Íoro0óL , !n'vçáo otr qualqdti delo.
Santo Agostinho
Aula 10
(oleção
História
Essencial da
ffi
2004
Coleçáo História Essencial da Filosofia
Santo Agostinho - Aula 10
por Olâvo de Carualho
Alguns aqui dcvem tcr acompanhàdo um.l exiensâ análise que fiz
accrca de lfcscartes. mostrando que, quando ele alirma que a consciência
que o eu pen§ên1e tem de si mesmo ó a primeira dâs ce ezâs.
ele está
rcdordâmenle cnSanado, pois não examinou com suficicnte âtenaáo o
processo interiorem que embarcou pêÉ poder chegar â estaconclusão.
Em primeiro lugar, para que o eu pensante pudesse chegar auma conclu-
sáo â rcspeito de suâ própriâ exisiência baseado no fato de quc pensâ,
ele precisâria ter permanecido o rncsmo ao longo de lodo esse erame.
Portanto, a continuidâde do cu no tempo já cstáprcssupostâ no erame
que, DcscaÍtes fez. e elc náo pcrcebe isso em ncn huDr nromento. pensa
qu€ quando descobre a certcza do cu pensante, esta setá ofundamento
detudo. Náo percebe que ela iá estábaseadanunu ceÍezaânte otque
8
da continuidadc do e no tempo.
Assirn, escavando, escavando, encontrei oito certezas prcliminares
(luc já eslâvam pressupostas no raciocínio que Descartes fez. E por que
clc câi neste engano? É porque o e alo qual ele estáfalando náo é o eu
11irl \unrdnu.<oeu nlo\olico. eo,ucognilr\uàocnar. EuPr, naoc..r'
eu do qual você fala todos os diâs. mas o que examina filosoficamente,
() eu considerâdo como sujeito do ptocesso de conhccimento apenâs.
Ilntão, todo o exâme que Descates faz, por elegantc que sejâ, êcaba
tcndLr uma série dc rombos iustamente por causa disto: porque o "eu
lilosófico" náo coincide enâtanente com o "elr cxistcncial", mas carega
consigoumasé edecertezasquees1áonocuexistencial.Quandopensa
que ele, o ego filosófico, está lundamentando, dando os princípios dâ
cedeza do cu cxistenciâ], é o contrátioi ele estáfundado, está assentado
nu a.cri. d( ríne/r{ que lazem pafl edn cu c\isr(ncidl. L e\xtdmenle
csse o efio que Santo Agostinho, quase mil e duzentos anos antcs dc
Descartes. nâo comete.
lAluno:Er.l
Entáo, é esse mesmo. Náo ó o "eu filosófico", é o "eu existenciâI",
âquele cuia história você contâ.
Ora, o eu do quâl fala Santo Agostinho náo é o eu abstralo, o eu
filosófico. É o eu que conta a sua históriâ. Por que ele íaz isso? Porquc
tem o hábito da confissà(]:é o eu qüe contaos seus pecados. Enl ncnhüm
momento esse eu pode ser considerado apenas o sujeito do prccesso
cognitivo,porqueeletambôm jáésujeitodâssuasações.éoresponsável
noral por suas aqóes. etc. EntAo, quando Santo Agostinho diz que a
primeira e arais fundâmcntal das ccrtczas é a certezâ que a alma tem
de sua própria cxisiência, ele nào está ialando de um eu hipoiético, elc
csiá lãlando do e, real.
No meu entender, essa análisc tcm um alcance imensâmente maior
que a de Dcscârtcs. Por quê? Descartes, quando chega à conclusão dc
quc a únicacoisâ certà éâ certezâ que o eu cognosccntc, ocu pcnsânte,
tern de si mesmo enquanto sujeito do ato dc pcnsar; quando ele diz
isso cria'se um problcma que é o seguinle: como é que desta ccrtcza.
quc é puramente subjetiva, se vâi coÍseguit tirar outras ocrtczas que
sejâm âpiicáveis âo conhecinenio do mundo cxtcrior, âo mundo dâs
cjências, etc.? Sc clc eÍá buscando um lundamento para as ciências.
e o único fundâmento que encontra é puramente subjctivo, náo existe
salto possivel desse subjeiivo para o objetivo.
(...isso está naqüela âpostila. DesLaftes e a psicologia rla dú ida, qre
está na. mil],ha homepaEe. SugiÍo que leiam, porque náo acho possível
cntcndü Santo Agostinho, exceto e comparaÇáo. Sânto Âgostinho é
muito ântigo- escÍeve Dum estilo muito rcbuscâdo para o nosso padráo
aiual, e uma boa nrâneirâ de enlendê lo é compârar o quc cle está fa
zcndo com o que Descartes [ez.)
,Acontece que flescades, primeiro, se l'echa num solipsismo ("eu
consigo mcsmo, falando apcnas consigo mesmo e náoreconheccndo mâis
nada", quer dizer,:r total solidáo) e, em seguida, dcntro desse solipsismo,
encontrâ uma base de certeza: tudo podc ser duüdoso, mas tem uma
coisa qüe náo ó; ou scja, o eu, enquantlr pensa, ele eriste. Muito bem.
vocô cncontrou â primeiÍa e mais flrndamcntal das certezas. Inas daí,
como é que làz para extrair desta alguma certeza em relaçáo à tísica. à
âslronomia, à moral, ctc.? Náo iem saída para o mundo cÍtcrior!
Eleteriâ que licar Iechado nestasuaccl1eza subjetivâ edizer:"Olha,
â única certeza que existe é dc ordcm subjetiva, e o rcstante dos conhc-
l0
rirnortos continua iâo inceúo quanto no momento em que e1r comecei
(,slLr nnálise". lsso é o que ele tedâ que lãzer Para cscapâr disso, o que
clc lãz! Apcla à noção de Deus. Enlào diz: "Existe unl Dcus bom. Foi
l)cus quc botou o mundo na minha üente, que n1e mostrâ o mundo as-
sim como é, e Deus náo iâ me enganar. náo ia fazer uma mâldade dessa
c{)Irigo, me enchendo a cabeça de engano. Então, portanto, â gamntia
Llo conhccimento é Deus".Isso qlrer dizer que ele enoontra um padrão,
unr critório dc ccrtcza, que é o eu, mas em seguida eie tem que apelâr
um ouiro objeto de certeza, que é Deus.
l- qual era a ,igdqro do cgú rum Dcusl N(nhurnà. f apcnas a lc quc
clc tem. Isso qüer djzer que o padráo de certeza que Descârtes encon-
trâ em última anáiisc ó. por um lâdo, a certeza subjeliva do ego e, por
outro, â ceftezaobjetivâ sustentada na fó. Isto "saídadeleâo, chegada
é
ll
minha história, c posso asscgurar que não lembro de ter me criado a
mim meirnu. NJo lui eu que me pu. nâ r\isrinL ia. ncm suu (u quí me
isso, nem percebe isso. Está acrcditando que a certeza que o cu tcm de
si ó o tundâmento. Náo, o tundamento já está dado antcdormente, é a
continuidade no tempo. A certeza que o eu tem de si mesmo é apcnas
unra conclusáo que ele tira dcssa continuidade, e ela é ncccssáriê parâ
llue ele chegue a cssa conclusáo.
orâ, em Santo Agostinho a consciênciâ que o eu tenl de si mesmo
sc identifica com o fato dc clc assumir responsabilidade por suâ con-
linuidade no tempo; portanto, a Ésponsabilidadc por sua história, â
rcsponsâbilidade por seus atos. Náo existe um "eu atomí§tico" solto
Io rcmpu: \o e\ isle essc cu rcmpural. hind'i(o. que a o mcsrnu quc ru
já erâ quando pequcnino.
É como se Descaúes lalasse de um eü vazio. o ?tl de Descades é
l3
porque é o pÍimeiro que mostrâ que csia capacidadc quc tcmos dc nos
rcconhcco como sujcitos de nossos atos, e náo só dos atos cognitivos,
é â base de toda ceftezâ que possamos tcr Náo é a base objeiiva da
cedeza, mas a base subjeliva usando âquelâ lãmosa distinçáo dc
Aristóietes entre o que é o mais certo ou o mais verdadeiro em si, oü o
que é o mais certo e o mais verdadeiro parâ nós. A ordcm da hicrarquia
objctiva das certezâs náo é a ordem subjetivâ, ou seja, náo é a ordem
cronológica da minha aquisição das ccÍczâs.
l4
hIIrrâ ocupa um lugâr importante, mas modesto.
lri cnr Santo Agostinho náo tcrn mais esta... Você náo pode esquecer
rt ( sanlÍ) Agostinho vive numa era de caos, estava tudo desabando;
(,rllio náo há mais estâ ordem. A idéia do Cosmos como totalidade or-
mdâ aparcciâ para os filósofos grego! refletida nê ordem cívicâ, na
(l(
lAluno: Mas chega a s cutiosa e até íLóEica, polque toda aez que
a Ee te esluda llistóia da hte, Hístóia do pefisafiefito ocidentaL,
senprc ouüe ÍaLar, pelo me os praticamente, que a Antíguídade tetia
sidô ufi período em que se coLacaria o home (...) como ser liberto,
e daí üai se (...).1
Mais ou mcnos. Esses sáo estereótipos que selvemparavocê câ m-
bâr certâs épocas. Mas esses cstcreótipos só tên funçáo mnemônica,
é só paÍa você recordar Na verdâde, nada é assim. Mas nada, nada é
15
cles? Sótocles, quando escrevia uma peça, colocava a regra da ordem
cósmica tal con1o se refletia na ordem dapolis. Era isso que e1e lazia.
Mas, e Diórgenes, ele náo em dâ Àntiguidade também?
E se vocêvâidizer que "no tempo dc Platáo", por exemplo, no tem-
po de Platâo estâ ordem da polis iá náo era a mesma de antigamentc,
iá cra problemáiica. Mas a desordem da polis náo íoi suficiente para
que Platáo ou Aristóteles chegassem a duúdar da ordem cósmica. Ao
contÍário, a ordem cósmica continuou existindo para cles. Podiâ hâvêr
lá três ou quairo gregos para os quâis nâo existisse ordem cósmica
âlgurÍa, como, por exemplo. Epicuro- Epicuro é üm contcmporâneo de
Aristótelcs. Como é que ele via o mundo? Como um aglomerado. um
amontoâdo deátomos quevoavam aesmo sem nenhunâ ordcm extema
e levados apenas por seu instinio, por seu desejo, o que ele chamava
a sua "inclinaçáo", cliráme,r. quer dize! lrescura, no fim das contas:
'Ah, vou para aqueles lados. Por quô? Porque me deu na câbeça. Vou
pàrâ cá, vou Para lá...".
Mesmo a idéia da orden cósmica, náo é o "homem antigo" que
acreditâva. Algu n s homens ânligos acÍeditavam nisso, e outros viam de
n1âneiracompletanenle diferente. O que podemos dizer é que. na época,
os mais inteligentes, os mais poderosos intelcctualmente acreditavam
na ordem cósmica, e que uns tjpos esquisitos náo acreditavam. Mas
pode haver outras épocas em quc os tipos mais talcntosos náo vejâm
oÍdem algunâ; pode acontccer isso laÍnbém. Mas nada desse negôcio
dc acredilâr.
O "homem antigo", o "homem medieval", isso tudo sáotiposideâis.
Tipo idcal éumpersonagcm quevocêinventa para seNirde unidadede
medidâ para depois você comparar com a realidade. Mas você tem que
sâber que foi você que inventou. O problema é que, sc a gente inventa
um tipo ideâI, acaba tomando-o por real. Então acredita quc cÍstiu
um "homem antigo", um "homem medieval", e que ele pensava assim,
rrsiIr.. lsto úcomo aquclas bobagens comoaMârilenâChauíescreve:
"'litrkrs (,s grogos acreditâvam no eterno rctornor'. Mas que estupidez é
|s!rl I)Í)dia lcr um ou dois que acreditavâm, mâs, ccrtamcnte. primeiro,
r s.rlxn-a não fcz o recenseamento; segundo, eu encontro vários pcn-
srrrcnlo§ lá que não conferem com isso.
histódaé sempre mâis coüplicâdâ do quc a gcnte imagina. Quando
^ conta â nossa história: a gente gosta de contá-]a com todos
r ge|tc os
,hr,rllr,*r,omrndasã.conrÍadicoes pârd quc ir pes,ud\ niú noç \,,n-
lirndâ . I quando â gente olha â história dos ouiros, sempre simp]ilica
r csqucmatiza. que é para poder fald mâl do sujeito mâis facilmente
lslo violâ o2, mandamento: vamos conceder aos outros â mesmâ análisc
vagarosa e cuidadosa que conccdcmos a nós mesmos. Pessoas capâzes
(lc passar aÍos num divá de psicânàlista contando todâs âs confusiles
d.lsua mente, olham o outro e simpiificânl, botarn um carimbo. Mas
sc o outro é ião simples assim, por que você há de ser táo complicado?
Acho que ele é iáo complicâdo quanto você.
Vcmos aí que, em pleno período ântigo, sc bcm quc já no final do
Impório Romano, tem um süjeito que coloca a âlma humana no ccntro
dà cogiiaçAo filosófica. Por quê? Porquc nada mais é certo. Certo. pârâ
clc: "Bom, a fé cÍislá é certâ". Mâs o problema nâo ó esse, o prcblema
ó: como é que nós chegamos lá? Â cefiezâ objetiva da fó náo resolve o
problemâ dâ cefteza subjetiva- Vocô pode saber que uma coisa é certa,
c continua duvidando, daí â necessidade da buscâ da certeza subjetivâ.
() que Agostinho faz? Tenta reorganizar o conjuntodos conhecimentos
elll vista da ordem internada sua púpda âlma. E o que é isto? É a busca
Ja unidadc do cunheL im(nro na unidadc da (onsciência e vice v(rrd.
Ou seja. isto é Filosolia no sentido mais puro, é exatamente o projeto
socrático, só que feito num ouiro contexto, â pârtir dc outros dados.
Onde quer que você veia filosofia de fato, é islo que você vê: um
sujeito que lenta ou reorganizar sua alma à luz da ordem dos conhe-
1i
cjmentos ou vice-vcrsa; c que, de ce o modo, constrói â ordem do
conhecimcnto à medid:r que constról a si mesmo; e [ãz as duas coisas
náo invcntandLr. mâs descobrindo.
ls
.! t. ,r t,irlrvra dc Deus, senâo qualqucr um pode chegar e dizer "Nâo,
,rr,,ttDi r r t)âl vra de Deus '. lêm que tcl un motivo de credibilidade
,tI' rr(lLr/a vocô â acciiâr que aquilo é a pâlavra dc Dcus, entáo âcÍeditâ
r,' rr.sl,, por confiânça. Mas scmpre tem essas duas etapas. Basta dar
, :,rr crt)licnção paravocê ver que a fé não rcsolve o problema cognilivo.
l!, t)rinrciro, porque ela nAo trâz explicaÇõcs sobre todas as coisas,
11.
r,r§ s(l sobrc âlgumâs; segundo, porque e]â própria traz problernas
20
i:
\ac4i.i . Ciên.tu e PoLítica ,ras d.aca.s São Paúlo Culirix, I 936.
,lrl,, ( r [r rcli,]iosâ é que imaginâ que e]â é um negócio que bâixou sobre
v,! r c rciLlnrou tudo. Ao coÍ{rário, criou um problcma. Sáo problcmas
i (llrvi(lls que o suieito que cstá fora dcssc âmbito rcligioso náo pode
rrr llr ir)âginar É chro que os que imaginâm â 1é como um repouso,
,-{., r(.r urr.r\iüo irleali/dda. lipoWall Diinoy. da rc Lpro\inciano.
z1
mccânica, daqucla purâ iustâposição de talores queDescartes fará.Isso
queÍdizerque, enire Santo AgostinhoeRcné Dcscartes. existe urn recuo
lbrmidável! Descartcs náo alcanaa o grau dc complexidade dâ análise
qüe Sâirto Agostinho faz. Sânto Ágostinho está lêlando de urra alma
rcal quc se confronta realmente corn as suas inccrtczas c que teln que
darconia de suapÍópria exisiênciâ. Dcscartcs náo, cle isolà iudo isso e
1ãz uma merâ ânálise dc conccitos. E, pior, âcrediitl que está coniândo
ümâ história rcal. Acrcdita qre sras lÍeditações melalisícl7sr sáo uma
auiobiogrâÍia interio( quêndo náo sáo, rnas âpcnâs uma descriçáo de
üm raciocínjo esquemáiico. Isso ó o mcsmo que dizer: llescaÍtes não
Li.ha consciêrc ia do quc sc pâssava na sua almâ: ele se conheciâ muito
mâI, c tinha uma visáo de si nruito mecânicâ c csqucmática; deixou es
cap o personagem vivo qüelinha dcntrodc si. Compdrâdo com Sanio
é unra perda absolüiamcntc lbrmidável.
^gosljnho,
Agô,trnhn. pnrr\cmplu prr((br(l"r.rmcnrr auc quur
".onscicr.ia
âlma ten de si é problenraiizada, pelo làto dc qrc cxistem nela coisas que
c[â1t2, quc recorda e que náo qücr rccordar Ele sabeque a consciência
que a âlma te dc si nunca é tdalmente iranslúcida, como Dcscârtes
pretcndc que scjâ a consciênciê do eu pensantc. Pcrccbe, por exemplo,
que cm suas memórias, em suâs rccordaçócs, cxistem partes que são
hunilhanles e que ele prcl'cririâ náo ver e sáo jllsta ente essas quc
Tcn alguns c.pílulos das ab,?/issóes cnl que ele conla
ele vai invcstigar.
os pcnsâmcntos nlalignos que tinhâ iá no bcrcinho. Ele diz: "I'lu. corno
cdânçâ de berço, já es1âva tramândo âlgunla, cu me lembro disso".
Como J,od€ríâmos isolâr a autoconsciência !la âlina dcssas cxpcriên
cia' qu( .á,r u prúfriu r(. i.lo dr r tdr da a ln ra. qu( .áu ài iuJr ,(oe.. a
sua exisiência no tempo? Isso quü djzcr que a alnrà dâ qüal lala Santo
Agosijnho é a alma biográfica, a almâ que existe no tempo, a alma real.
Isso já é umâ idéiâ que, diríanros, é escandalosamcnte moderna, tânto
que levará séculos parâ ererceralgun cfcito. Àcho que aquiio pâirou cm
r. Dt \. qR r\ , - ." ,-.,.,- .,
'. li]ntrs.2000
Níânins "
72
, r,rr frhcÇa rlos ouvintes, que nem entendiarn direito a inportância
(LrL
, ,, tIc
, (sl.rvân lendo. I_loje, sahemos que isso é básico. Hoje, sabcmos
,11 L irtuelc quc não iem consciência de si. de sua posição cxistencidl
,rirL llrnbam náo ierá umâ visáo real dc' nundo objctivo. Hoje, pârê
ri's. islo ú bâstante claro. se beür quc licqúentenrente se pedc. c no
, r'o Lrxdcrno se perdeu müitas veze§.
( (rn cía descoberta, Agostinho é levado a uma outrâ descoberla
.LirÍkr pioÍ: que o mundo reâl tem náo apenas umâ ordem estática, corrro
rL (lesrrcviâm os gregos. Ínas uma oonstituiçáo iempoÍal histórica. Por
r llc clc dcscobriu isso? É claro, porque se descobriü quc a estruturâ de
\ur rlma é a estrutura de uma hisiória, de uÍrâ narrativâ, de unr dramâ
(l! .ruioconstituiçáo no lempo; cntáo nadâ mais naluÍal qüc clc olhasse
1) nrundo irteiro sob a catcgoria do tempo e da hisiória. Náo que isso
riao tivesse toialmcntc prccedentes, pois no mundo iudâico já se linhâ:
. a visão quc os judeus linhâm dâ hisiória. que sevê na Bíblia. A visáo
,tu, ,,' jrd(us rênr dá ,calrdadc c dí urnd hi.rorid I ã nisluria dú,tui:
lr..urn ür"nra .n qucd' un drr-nr coleli\o L,, J_àmà du Lliilopo
rnLre um povo e seu Deus: Deus mânda lãzer certas coisas, o povo
n:io 1ã2. clâí as coisas comcçam a dar enâdo, ele náo lcmbm por que.
(laí lem que reexaminar tudo, lem que voliar atrás, reconeqàr iudo .
Náo é assim?
vê exatamcntc a mesllla coisâ dentÍo dâ almâ do indiví
^gostinho
duo e deniro da história, hislória não de u povo, mas dâhumanidade.
Claro quc sua visáo de "humanidadc' é circunscrila ao universo dc
dâdos que ele linha. âbrangcndo, portanto. iudelrs,Impório Romano, â
novê situaÇáo âli; cxclui povos ilteiros, qrc clc nem sabia que e\isiiâirr.
Entâo. como visáo da Hislória Univcrsal, ela só vale simbolicamcnic,
porque não é u nra H istóriâ Universal subslân ciadâ por dados universais.
É uma história pârcial que pr€iende scr univcrsal no simbolismo do
scu conteúdo. E esse contcúdo a a da perene disputa cntrc os làtores
23
(l( ol1lc'r cspirilu.rl,
os lãiorcs interiores dà constituiçáo humana e â
consiiiuiçao cxicrnâ dâ sociedade. É o quc Agostinho chârna ,A cidade
dos lurrrrcns", quemais tarde se traduzirá mateiiâl en !e cono â disputa
t rlr, ,, f\lrJu
J lgrL i.. ou Cri\lo e Ce.àr. rnmo qucrrdm.
H
Vcjâ quc lodas as aiividades humanas, todas elas inplicam ünr jogo
dcsses dois lãtorcsr a inspiraçao interna, aquilo que ven1 do espírito,
qrc cria reàlmenie as situaçÕes, e depois â sua cstruturação material
cnl tÍrrro. Cada êtividade humanâ tem esses dois lados, um lado que
é cÍiâdor e outro quc ó entrópico. Ele se cstrutura a pariir dâquilo quc
veio da inspirâçào. mas, em seguida, sulbca o qüe veio do elpirito.
Agostinho sinbolizâ isso como â "cidade de ileus ' c a "cidade dos ho
nen!". No fundo, ó a mesnla cidâde. Matcriâlmenle làlando, é â mesma,
mas é con1o se fosscm dois planos dà rnesma reâlidade. Náo sâo duas
cidades jlrslâpostas, porque, se lc,ssem justapostas, seria âpenâs um
tipo idcal, e Agostinho náo está falando de um tipo idcal. Emborâ ele
esquematizc, cmbora esleja criândo um sínbolo, náo é um tipo ideall
eslá tàlando deumarcalidadeque de lãto acontcce. Talvez náo aconteçâ
cxâiamenle do jeito que elc a descrevell, mas bâsicâmcnte isto é uma
verdâde pcrmanente.
Agostinho cntla então nâ Llistória dâ Filosofia. [ntra, primeiro,
como o sujeilo que dcscohtc o lundamefiLo subjetiao da cetíeza. Ele à
dcscobre não só como tundamcnto cognitivo. n1as também conro fun-
dânento moral. A alma âdquire a ceÍcza de si mesrna, mas a adquirc
se assume a sua própria história, se assune o scu ârraiganento num
conjunto de condiçôes reais que implica um lundo quc a sustenia e
que é, por sua vez, ilvisível. É o quc podcriamos identiEcar até corn
o lamoso ápelro dc Anaximandro: eiste aquclc fundo desconhecido
desde o qual você emerge, que é o fundamento dâ sua cxistência e que
1ãz partc dcla também, pois, se â ahna se interrogâ sobre este fundo,
entáo essa intcflogação está dentro de]â, é urn constituinte dela.
z+
também enLra na História da Filosofia como o individuo
^!ostinho
,lU( rcâlr entedescobrc cxplicitàmeúeadime sáo histótica da rcalid4-
íir'. llssâ dimcnsáo já cstavâ implicâda, de algum modo, seja no Antigo
li stâmcnio, sc'ja na Revelaçáo Cristá, qüando Cristo prometc quc vai
(.f rl)()ra nras vai volt dcntro dc certo tcmpo. E hâverá uma consuma-
iiiro dos tcmpos - nâo se sabe quando, mâs haverá. PoÍtanto, estamos
(li rrtro de umâ dimensáo iemporal, nao de uma estrutura mcramcnte
cslática. Notebem, issonãoquerdizerqueos grcgos acrcditavamnuma
rsliülura cstática ou no etemo retorno, nenl que os cÍistãos acreditavam
rr dimcnsâo histórica. Simplesmenteos gregos náo seocuparam disso,
p()rqlrenãoerao assuntono momento. Ma§ é cvidcntc qucofato de un1
llklsoio náo tcr lãlado de alguma coisa náo qüer dizer que ele íegâsse a
cxistôncia; elesimplesmenteráosepreocupoü cornopÍoblema, porquc
)ráo csiava no repertódo das questÕes ali.
PâmAgostinho, a questáo hisiórica aparccc por dois lados: apaÍece
primciro por esta sua consciéncia do eu histórico. A consciência do
cu histórico surye do quê? Da mutaçáo que ele nresmo passa no meio
da vida. quando ele se converte ao cristianismo. Sua conversáo náo
lii como aquclas do Novo Testâmento: lesus âparecia paÍa o suieito e
instantâneâmente virâvà sua vida de cabeça para baixo; clc comcçava
outra vida e nao tinha nem tempo dc pcnsar na antigâ. Nâo lbi assim.
Àqueles pescadorcs quc resus Crisio colheu, ele inslantaneame.te os
modificou; e eles começam uma nova vida â pariir daquele instantc.
O processo da conversáo de Agostinho ó enormcmlrnic pmblemático,
se estende ao longo dc muitos ânos. com muitos conllitos interiores.
EIc tcm uma histí)ria. À subslância
e,l de Agostinho ó história.
desse
É somente a história da conversáo? Náo, a história dâ conversáo se
dá quando ele já eÍa homcm adulto, csiá vivendo isso como âdulto. À
conversâo implicava umâ tomada de consciência retroativa deloda a sua
vidâ anterio! poÍánto, aconsciência dos pecados: 'A minha conversâo
f,,fr(\'oll llor . iras 0s eus pecados comcçâram Iá para irásr'. Ele
r,slr vivur(lo unra história c oela lenr que iniegrar â narrativa dc uma
lrisl(r'ir rn(ori(n: que comcça no bercinho. E anies? Agostinho laiou:
'Arlcs do bcrcinho eu nio sei, mas, quc tcm algltma coisa âtrás, tem,
Itr,i rr ndo ,I.BiJ,,.,àda { ,rào I( lil Jí rnim nr
Zt)
, | ,r)rL lrmbÚ . Quando você se lêcha para esle fundo, quândo náo
,1r,r rrrais sabcr dele. lechou-se só naquilo que constiiLri você mcsmo
L,rl rorro vocô cslá: lêchou-se no mcsmo. "Mesmo", en grcgo, ó ldios,
)i
porquc clc sabe que o Íundamento dclc cstá ali. naquilo que lbi esque-
(iJu e
"li rn,{rn,, q.i. cça o mais prsriu!u. },r ruirn quc tdreça L
por isso que Agostinho vai sondâr desde as suâs púneirâs mcmóriâs,
o quc cle pensava quando estâva no bcrcinho. Àli ele cstavâ prórimo
dlr mistério. Por quô? Porque iirha inventâdo pouca coisa, não linhâ
muita biogrâtia das suas aaõcs, rão iinhâ nuiias açôcs a contar; erâ
constiiüído de u pequeno repcrtório de açóes cornetidÍrs c de uma
grandc prcscnÇa do furdo.
É o que se busca, por cxcmpio. nas làmosas regressôcs clc mcmória.
Só quc cssâs Íegressóes sáo iêitas dc tâl nrodo que, eln vcz dc você
petlclrat no ápeircn, penetrê numa outra cxjsiôncia igual a estâ. Sc
você sai de unl círculo dc iclioticc pâra ir par.r outro circulo dc idioticc.
c ouiro, e outro, você rccua no tcmpo sem nuncâ sâir de deltro dc si
mcsmoi cntão isso é urna celebrâçâo da idioticc. evideniemente. Você
nuncâ chega no fundamento dâ existência, nuncâ vê o fundanrenio .h
cxistênciâ; vé ouira existência, c outra, e o0ila. sempre iguàI. lá ó unr
idida ncssâ exisiência e lbj na anterior tambénr, nâ outm. nâ ouira, nâ
outra... Podem scr mil cxistências iguâizinhâs, conÍituídas do inesmo
círculo de prelrcupâçócs corriquciras que você tem ncstâ é pdsão
subjctiva total e deiinilivà. nào tem mais jciio. Isio quer ^í que a
dizer
dilcrença cntrc cstavida e o seu passâdo !e torna apcnas ümâ dilerença
crcnológicà, porque âtrás dcla tcm outr:r vidtr iguâlzirhaâ cstâ. só isso.
Dá para percebeÍ cono islo é absurdo. É nccessário que, por bàixo destâ
vidâ, cxista náo outm igualzinhâ, mas algo enorncmcnic diierente qLre
anlerior; se vocô iá c burro nesta vida. imâgina na outral Isto náo vai
resolver nada. somar o üúmeÍo de vidas lráo vâi melhorâr nada. O
negócio é sc abrjr qu.rliiâtlvamcntc para uma outra dimensáo, qlre é a
dimensào do tundamcnto real do qllal você emcrge.
Se o sujeiio quiscssc mesmo se abrir para isto, era só olhâr cm
volia e lenrbrar quc cstá dentro de um univcrso l'ísico que o 1rânsccndc
cnormcmenle. Eru só ele pcnsar nisso. Mas às vezcs náo adiania. Você
poderia sâir nufi sentido cspâciâI, como saíram Plâtâo e Àristóleles;
tentar olhar a ord€Ill carsrnica e ver que você ó apcnas um elemento
dentro dela. Ou pode làzer con)o Agostinho. que recua aló o começo
da vida c diz: 'Ela começou cm algum ponto, e anies que cu cstivesse
1á, algo nle lundamentava".
Essas descobertas dc Agostinho sao absolutâmcnte lundameniais.
Aquilo quê dcixou de ser explorado pck» gregos, ele vai lá e dcscobre
imagcm móvel. EnlAo você eslá dentro da imagem móvcl. rnas eÍá
dcntro da etcrnidade âo mesmo tempo. Está dentro da etcrnidade' que
ó arealidade, e está dcntro da imagem ao mesmo iempo, âssim como n
imagom que está sendo proietadâ natela de um cineina está rcalmenÍe
deniro do cinemâ. Êntáo você pode passar de uma dimensáo para oütra'
poÍque. na \crdâde. uma (\lá denlro dd outra.
Com a queda do Impéio Romano, comcçâ Lr que chamamos pro_
priamcnte a Idade Média- Nossa medidâ de Idade Média vai desde
a dissoluçAo do Império Româno do Ocidente até a lanrosa tomada
cle Constantinopla pelos iurcos, em 1455. Acontece que a tomada de
Constantinopla pclos turcos é o fim do Império Romano do Orienle. O
qlle chamamos dc ldade Módia é, entáo, todo o tempo de durâçáo do
Império Rornano, tal como identificado com o Impédo do Oriente. E
csse império do Orjente, esse Oriente começâ cm Ateras, que sob oütro
aspecto, ó o coraçáo do Ocidentc. Enláo se subeniendc que, Oricnte
e Ocidente são maneiras de dizcr: esse Oricnte era extremâmentc oci-
.lental. e ele se tornâ mais oriental por um fatot muitíssimo esquisiio
que acontecc na época.
Acontece que, enquânto no mundo latino um Santo Àgostinho
esiava claborando csta filosofia platônica e teniando inie$á_la com o
crGtianismo. no mundo oriental. ou seia, no rnundo bizaniino, ocoÍria
um processo completamcnte djlercnte. Em primeiro lugar. enquanto o
.tl
lIrt[r r) tn, Ir n, d() O.idenie vjrâva uma bâguncà,
o do Orienie sc es
inrlur|va l)r.ccisamcntc rDrnonlcntoem qllcos nobtcs,
os aristoclatas,
cslavxm âbandonândo as cidades, fugindo pâra
o cànrpo, cadâ uft sc
icclando em scu ]eudo c instituindo àli âs lcis quc
bem entcndessem
porquc náo haviâ rnais ]ei alguma fio lIpério
, Bizantino cstava se
fonnando uma ailtocràcia uluito organirada,
uln Esiâdo muito oryân!
zado, com ]cis c u râ hierârquia qlrc rlurou um
tempáo. Bâsta isso para
sc ver que o cenário crâ complctâmcnie diierenle
No Ocidente, o que veio a lbmrar â arislocraci tal
conro a conhc
ce1l1os é a misiu€ dc duâs coisas: o resíduo
dâ ântigâ nobrcza romanâ
que sobrou c â nova nobrcza quc se formou pclas
invâsítcs bárbaras. E
esta novâ nobrezâ se câractcriza por sua ú1dole
cnciusivâmenic rnilirár
suâ única ocupação digna era a guerra. Dos
assüntos actministrativos
c estatais ninguém sc ocupava, porquc náo eristia gstadoi
e a admi-
nislraçáo crâ muiio sirplcs, com.r a àdministraçáo
de urna fâzenda
O Esi.rdo não e\istia, c as poucas tarcfâs adniinistrativâs
neccssárias
à vidâ civil, a Igreja ia âssumindo. A Igrejâ
csrava conltnuamentc ior-
nrando pcssoâs letradas que, âlém de transmitirem
a dolltrina crjstá c
dc cnsinarcm as pcssoas ê lcr e a escrêver, ainda
excrcjânr, de vez cm
qlrand0, âs lunÇócs de ca[ório.
IssLr quer dizer que, no Ocidente, sc torma um clcro que dcsde o
inído cstá centmdo nâ atividade intctectuai lcirudâ, ao lado
de uma
aristocracia guerrcirâ que sc recusa tcrnlillanrementc
a aprenclcr a lcr
Por excmplo, quando Carlos Magno consenie
em aprc der :! lcr ele iá
r(m,ri.rroclrntô,àrn\.1cun\.ntL p."ri.",",.nr- p"r r,,,,.,,t..a,,,nong"
quc ele havia chamaclo para organizár a educaçáo
âli. Durânrc
^lcuino,
sóculÍrs, a edu caçâo no Ocidcn te só visa a dois lipos dc pes$as:aquelcs
que de âlgum modo visam áo clero {r as mulhcres.
Portanto. quando vocês ouvircDr uma líder leministâ
dizer qlre âs
nlulhercs ibran cxcluÍdas dâ educaqáo, era cxâtarnentc
o contrário: ent
.12
qualquer escola que se chegassc, melade erâlüturrJ pâdrc. a outrâ metade
erâ nulhcr E os homcns? Nao ianr parâ lá por nada deste mundo. Se
Lr câra achâva que tinha de ser gücrreiro, fãlavam: "Vocêvai ser padre?
Náo? Entao por que você qucr âprendeÍ â lcr?". fjra exatamcnte isto.
Sc o suicito náo quer scrpâdrc, nas quercsludar, é porque deu algumâ
.disâ.rradrÍele Era exatamentc assin. Eàs muihcre§? Diziam: "Elâs
lônl que aprendcr a ler porquc dâí decoram aqucles poeÍras, lêem pâra
nós, tocam música para nós". PaÍa clcs, as nulheres iinham tunçóes
dc cntreienirrento c de educaÇão também Llas ó que váo educâr âs
criânças. Educarn ês cÍianças c representam um elemento suâvizâdor
dos cosiumcs: i\genle está o tenpo todo cm guerra;quando chegâ em
casa, tcm que ter um negócio 'nclhorzjnho"'. Essc mundo "melhorzi_
nho" cra orgânizado pelâs ulhcrcs.
:l:l
-.
ÍAtüt1o: (. .) a história de fiul.hercs lercm que sabet l.et paru poàet
bltnsmitír a reliEiAa (. ). Isto silniÍiul qúe pt a assimiLat essas ttu:ldi
ções íto é plecisa sabü Let mas pata lrunsmiÍi-las é preciso sabet?l
Era pÍeciso. sim, porque a nobreza nunca assimilou.
É no processo de passar algo dâ tradição que algumas acabam se
dcsiâcândo. poÍque qlcrcm aprender a ler, e outras nâo. âqüele
^gora,
mínino você podc aprender sem saber ler. Mas o clo de clrntinuidâdc
é dâdo pclas mulhcrcs por uin lâdo, â Isrcj os monges, os padres
cj por outro lado, as mulhcres stro o elo de continuidadc. Elas tân â
mcmóri.r do pâssâdo, os homens nio. estáotodos só qucrcndo saberdc
guerÍa, dc bagunqâ. lsso queÍ dizer quc â função leirada lica âssociadâ à
Igrcja c, porlânb, a urna organização que é disiintâ do podertenPoral
O podcr lenrporal ó dc úrdole guerreira.
No lmpório dc Bizâncio aconlece exatamcnte o contrárilr:.r coÍlc cstá
organizâdissima, existe um Esiado orgaDizâdo, e o EÍâdo prccisa de
funcionários qualificados. Qucr dizer que o ensino ali ó cstâtal. E o que
sc cnsina? As tradiçõcs antigâs: retórica, filosofia, ctc. Por outÍo lado,
o el€mcnto rcligioso ficâ à margem do cnsino. A religião sc transmite
nos mostejros e nâs igrcjas, c náo é integmdâ no cnsino lctrêdo. O que
âconiece? Acontcccque algo como o nosso famoso conllito en lÍe Igrciâ
e l,lsiado, quc perpâssâ ioda a hisiória da ldade N4édia ocidental, náo
aconteceporlá. Mâs tambóm nâo aconiece Lr Írâ co isâ caractcrística que
vai definir toda â ciapa scguinte, qlre é a Idadc Módia propriameüle diia:
o desenvolvimcnto da teologia no sentido cnl que nós aenlendcmos no
ocidcnte, como leologlâ racional.
O que éteologia racionêl? Éâ explicitâçáo dniláli.a do cLrnteúdo dafó
üa suâ prova dialética e suaadiculaçáo c dcicsa dialéticí. Os pâdrcs da lgre-
ja ocidcntal desenvolveÉo os inúrumentos lógicos e d ialóticos hcdêdos da
filosoLia gregâ para cxpor c delendeÍ a té cristá nos scus tcrmos. QLlandosc
chegaràópooa das grândes sümas dc Al.xandre de FÍâles, de SanioAlbcÍo,
34
.r
(l( srnlo lbmás de Aqu ino. se Íerá o c.,roanento dcssa teologiâ ocider tal,
,)rr scjâ, unra toial organizaçào racional do conteúdo dâ fé cxplicitado em
{lircussa)cs diâlóticas. Isso é câracteístico da Igreja ocidental. Vcnx}s quc
so r lgreja Caiólica Romana tem isto é a única rcligião do mu ndo que rem
isso , a total erplicitaç,ro e ordcnaçáo dialóticâ do conteúdo da ló. Isio â
Igrcja Oricntâl nunca aconieceu. Por quê? Porque a atividade dc cnsiro
rdigioso esiava à rnargcnr da atividade letràda c filosóficâ.
tslo quer dizer quc os filósofos ditos orientais cram grcgos, nâ
vcrdade quc continuam nesse período. clcs tâ bém náo terào csta
prcocupação intcgradora c organizadora quc sc vô no Ocidente. No
()cidente, como o problcrnâ básico era arliculâr dois lcgados dilerentes
o lcgâdo cristáo e o legado greco,romano sob a lorrna dâ explicitaÇáo
lialética da doutrina -. a doul na tinha quc dar conta de tudo isto.
linha que hâmlonizar tudo isto em iunçáo dc principios cornuns. É r.rnr
cslbrço unificador ft)nstro.
Bsse esl'orço unificador criaÍá entáo construçócs intelecluais que se
assemeihêm estrutumlncntc à dâ ârquiteturá quc loi dcscnvolvida, que
a â ârquitetuÍa góiica. Existc um Llmoso livro do Erwin Panofskv que
tl\aÍna Atquitetun gótica e Escol.áslico,a no qral clc mostrâ que â estru-
iurâ lógica dos trâtados cscolásiicos. a esirutura lógica das sumês. é a
mcsma estrulura em lriângulo quc scvô nâs caledüis góticas. quc parccen
organizadas dcsdc cimâ, não desde baixo. Elas vão por ün processo dc
ramil'icâçAo, qu€r dizc! â arquiletuÍa góticê é como um diagrâma qüe,
pârtindo de um ponto, vai sc sübdividindo, subdividindo. subdividindo.
âté ch€garcm baixo. Ele niostraque essa cstruiura é ldên tica à das sumas
cscoláslicas. l{á un1 csl'orço dc unificação e deorganizaçâo morstro, por
quc se iin hâ que ab.rrcâr o universo inteirc d as ciênciâs, ounivcrco inteiro
do conhecimcnto humano. Subnetidoaquê? Aos mesmos princípios quc
emm os pÍincípios da 1é, e articülados náo como contcúdo de fé âpenas,
rnas como doulrina djaleiicamentc cxpoía e discutidâ.
i ,i,p.r.,.'r i- 1.r. ó'. ddofjd, ,J,,
hlosoha e reôloAia un klJJe N1ódiâ Sáo Paulo N,târlirÁ FonLes. lgqt
lS
Nâda disso aconteceü no nründo bizâniino Isso quer dizer que os
filósolos de lá náo iinham que fazeruln cslbrçotáo grardc de unificação
Eles se caracierizavam nÂis como herdeiros c transmissores dc ântigas
aÍes dialética. L6gicâ, retóricâ c deciênciâs àniigas. Flntão oi\lósoio
eÍa mais ünr tipo eclóiico que sabia um montáo de coisas: sabia lógica'
rctórica. astronomia. sabiâ isso e mais âquilo, c nunca houvc a neces_
sidacle de arlicul a doutrinâ da fé num cdilicio único
Aitlda ircmos clelalhar um pouco nrais isso, ntês essadistinção básicâ
lêirâ c pedi um bile. daí clâs disscram: "Náo, náo comcnros câIne às
sextâs ieims". Você iáviu iornalisiâ preocupâdo coÍn isso no Brasil'l Isto
i qJJ.c ir rp(n.J\cl.tr io'nali.rr l'.oc.rp.tJu
sextas-teiras náo existe; é a pessoa nuis indifcrente à rcligiAo quc há, e
das quâ|rc mcninas. rcnhunrâ conreu câmc.
lsio tanrhóln viconl mcLrs próprios olhos. uDr câsâncntLr na lgrejâ
( ), L,{l,xâ ltomena. lbdo mlrndo lica de pé e as pessoas entra r. sâem,
i ,, )r(1rc li1 olicilndo o rilo de câsarrenio. Quanrlo cntrava âlguóm, o
,,rrlre parava c tàlava. É um ncgócio muiro Drâis irlbmul. rigidrz do
rio oridcntâl icm a ver tambérn conr a
^
cstruturaq,ro lógica da dolrtrlna.
, ri inlornralidâctc do rito orienlal tcnr a vcr juíamclric com a infornra-
' rdtQnu lilúnür: a lho disslca dr Uft)n o .rtll lii.l Nrdtr {lr Sn.r
Prnr.rl. lLrl srr)au. PI ina L9!l t7
Mas aconteceu unl tercejro fator conplicante: o Iegado da filosolia
grcqa acabou sendo absorvido pelo Estado bizaniino como elemento para
pâssado râs escolâs, nâs quais sc cultivará en1âo â vida intclectual e'
sobrctudo. avidalilosóficâ, ou scia, abusca da unidade do conhecirncnt''
na unidadc dâ consciência c viue v{rrsa, corno o aspecto inieleciual da
ÍAlrno: Í
ifiercssanÍe colocal que, de fianeia básica, essa queslao
de e te del a disp la (...) oral, laz plifieírc a base hoíe peLa í ensa
hoÍtestidade que se üê nesse peiodo ( --) lem a fianeia co a eLes
cameÇatutfi a rcÍulaf a toloc\çao do outto di2e do. "NeEo" (...)l
Nunca houve, ao longo dâHistória,üm pcriodo dc naioÍ honestidadc
inlelectual do qüc esse âí. Nunca
lAlnro: Inctusiae começarutn a rcÍutar o autto...l
Porque a gente náo plde esquecer que o exercício dâ filosolia cla uma
prática dc sântidadel A pcssoa náo estâva bincando' Por excmplo, sc
você demonsimsseunâ imensa habilidadc intelectuâl' masfalhasse um
pouquinho nâ câridade cristá, as pes$ês per'cheriâm imediâtamenie'
Vcja que o cnsino na época crâ orgânizâdo dc modo quc lãziao cstudioso
sc deLlicarà büsca da verdade com o emPcnho de qücm estava arriscândo
4l
lAluno: Mas os /ilósolos ix1(tgitd\am isso 11o plona ddconsciência
iníJiüiclual. o hanú1 discutit onsiEo lnesmo? l
Não. Discutia co seus amigos na praçâ pública.
É claro que o mesrno pr0cesso era rcpclido intcriormente Você la
zer isso absolutancnte soTinho ó impossívcl, âssim como ó impossívcl
você aprcndcr a tàlar sozinho Élxisle um trcinâmento qLLc é coleiivo, e
aos poucos o individuo vai conseguindo nlonlar â discussão dialética
dcntro dc si csmo. con1o SanLo Tomás de Aqrino Se você vô a SÍmd
??ológlcd, clâ é âssirn: coloca un1â pcrguntâ. daí colocâ uma séric dc
rcspostâs possíveis. daicoloca os a€umcnlose lavor dc câda rcsposla.
dcpois coloca as obicq(')es a cadâ uma. e depois vâi resolvendo uma poÍ
un1â. O quc é isso'? ll a estruturâ de unra disclrs!áo. disprl4Íio escola(
só que agorâ internalizada. Ele eslá Íãzcndo clrnsigo nlcslno lsso quer
dizcr que a conslruçáo dâ aimâ individual é sirnilâr à constrrçâo do
sistema pedagógicl).
.14
rnas pârâ cle é assiú quc vai viver â vidâ cristã: vai buscar a vcrdade
rqui até as últimâs conseqüências. com totâl responsabiiidâde do qlle
lsso qucr dizer que o suicito, anles de enLLnci Lrma idéia, tinha
qrc trabalhâr muito nclâ. Mlrito. muito. Nào havia umâ prolil'eraç:lo
dc opinióes. Havia ccrtâs correntcs, Inâs que relletiam... Quêndo hai'ia
incompaiibilidade cte dLras corIentes. é porquc hâvia uma dil'iculdade
rêâl de rcsoh.er o pÍoblcmâ. náo porque simplcsncnte u gostou disso,
o outro goíou daqriloL poquc dc fato a coisâ ó cnctcncada. Quan-
E
clo suÍge, por exemplo, o problcma dos universâis "os leÍlnos gcrâis
cxpressâm coisâs quc cxistcm realn1ente ou apenas unra âglomcrâçáL)
rncntai de entes singulâres?" . isto nào é tãcil de l,ocô rcsolver; eniáo
surge discussão:uns acham quc silll. outros acham quenáo. Mas quân_
do se pcrpassâm as discussÕcs, vê se que a qucstão náo está r{râIncnte
rcsolvida. Quando formênl lacções, é porquc náo delr para rcsolver â
queslao. apcsar dos melhores csforEos. Ninguóm cstavâ levantando
opinioes porque sim. No curír de uma jnvesiigaçâo, chegou'se â ccrtos
blocos dc problemas quc náo pudeÍanr scr rcsolvidos. en1áo sc tcm que
opiar': "Lu acho isso, o ouiro âchâ aquilo".
45
humildadc. de uma dcvoçáo exemplar Estavânr fazendo o melhor pos-
sívcl. É por isso que, por exemplo, se o sxicito chegâva a delendcr unlâ
pos içáo heÍética. às vezes ó porque náo tinhâ havido os neios d ialélicos
crrado, poquc â IgÍeja diz que sim, embora cu nào consiga enxcrgar
assim". Isso seria âdmissível. Entâo, náo ó ump/o /ormd.
se o cara cstá cello. ele vâi prov que eslá ccrto, c dai ele l]hcgâ aqui
"É verdadc isto qUe vocô lalou. Entâo. pronlo. pâssamos
a pensar assim" Vcj.r, os conc,lios craln exatamcntc isto Os concílios
sao urrâ longa e cornplexíssimâ fixâçio do dogma. Sar dcpois dc cxaus
tivas discussóes dizcm: "Bonl, agora chcgâmos à conclüsáo de que o
nesócio ó assim... .
+8
lAluno: .)4 sela, 4í nào seria uma ameaÇa da oultu
porque ent
assim. assirn, assil ' , mas, sc colrcÇâ â tnsirâr isso cotüo doutrilxL da
Igrcja. cntâo sc âuturoncou Pttpal O prohlcma (r'n â hcrcsiâ ó cstc: não
ó que o sujeito tcm Lr â opinião difcrenle, nàoi é quc cle adota por sua
própria contâ, a(luilo corro opinião dâ Igrcjâ, cntào elc cstá qucbrarclo
r rr,,:,lrrJ. rlJ l! r' 4 . r, -L]ánd', utrrrr. ' l. . rrrrr , r"J i'rr'1rit^'
o coisa quc
ÍA1úo: Untàa, na medi(lll en que ele altnlasse aLeut
Íosse canttátia à douítirulgercll, fias afitnasse úquilo
ca]lto posiçci.:)
pes:;aal e 0o como 0 posiçàa d4 lqteia, isso era utno coisa.- l
Isso náo sócrâ accitávcl, como crao tecido davidâ mesmo; eles vivian
ncssc iipo de discussóes. S,ro bilhoes de queíóes que esiáo ai abcrtas,
prâlicamenle tudo em âberto. Aos poucos é quc, nos concilios, vâi se
fechando. Depois dc muitas c nruitâs gcraçôes dc discussão, dizenr:
"Bom. âgora nós já chegamos a uma conclusao". E se é um ncgócio quc
arriscâ cÍiar a guerra, criâr problcrrâ mcsmo, podc-sc apelâr à âutoridade
do Pâpa, cnráo o Papã dccidc.
Conro ó que clc dccide? Ele se tranca, rezâ, c{nrversâ com Deus...
V.rcês sÂben, hoje o Papâ 1àz isso: 'Ah, tcm uma dúvidâ, nirguém con
segue resolvcr, ninguóm sabc como é que é? Enlaro eu vou perguntar
para Dcus conlo é que é". O que laz? Lle se deita no cháo da Igrcia dc
Sáo Pedro e lica lá rezando âtó achar a soluçâo. Chcga a 6car dias âli.
Lssa é a uma solução mística: "Nós náo sâbemos, hunlânamente náo
cncontrâmos, mas tcm un sujeito que está encàÍÍegâdo disto, c quc
Deus promeicu que, enr câso dc dúvida, dirá para ele".
Se vocô náo âccitâ cssa rcgra do jogo, cn1áo nâo aceitâ o Papa, está
Iorâ da lgrcjal Mas isto âí é em último caso. Se já houve dez concÍlios
c náo se rcsolveu nadâ. então continuâm a discussáo. Sc cstá dândo
brigâ, entáo se dizr "Bom, ailora apela para o Papa". lrntão há essas
duas soluçócs: o Papâ e o concílio. O (oncílio é demoradíssinro, cntáo
às vczcs o Papa tem que resolver, mas náo por sua opiniáo pcssoal. Ele
ten1 que buscar a rcsposta cm Dcus.
50
A outta peryunta qüe eu ti ha é a seguinte: se a lgreia,
^]üno
dk n de ser (...), também eÍa uma lEteia apan:tío eslaLaL. o ptobleÍna
Nâo, ela náo cra un aparato eslâ1ali clâ cxercia funçôes àdminis-
trulivas paraestêiais.
I uneócs adminísttlliüas...
|Llüro: Co eto, fias se ela etercia uma l çao kmpatul ista nào
cria essa estrul ra uma tensao? (...))
Claro que criâl É evidentc que cria, mas náo llo scntido enr quc
criaria hoje. Porque. hoje, sc o suieito tcm uma idÉiâ c vocé olercccu
um empÍego pâra ele, elc iá eslá com um problema imediaiamcntc. A
ruptura cntre as crcnEas e os intcresses virou umâ coisa nonnal parâ
Ilós. mas, ceflamcnte. nessaópoca nio era assin Aléquc issochegâssc
a scr conllitivo. era muito tcmpo Veia você, náo se adniiia, na ópoca,
que existissc um domÍnio prolaro de direito próprio; 1udo, de certo
Inrpériotambé . o
modo. cstá inclüído na sociedadc sâgrada, o rci e o
impcrador é sâgrâdo pelo Pâpa, entáo clc também cstá investido de
autoridade divinâ secundária as cstá.
Bom, daí surge o problema. Elc diz: "Bom, csperâ aí, autoridâde se-
cundária, mas, a pârtir do momenio eln qucvocê me sagrou inperâdor,
agorê náo é mais com vocô que eu convcrso, agora ó com DeÜs. Agora
eu §ou impcrâdox náo vou perguntar para vocô conlo é que dcvo goveÍ
nâf'. Surse aí um probleÍrâ gravíssimo: o inperàdor está vinculâdo à
5l
autoridàde papal tllr ele ó uma iolrtc dc direilo próprio? Por cxcnplo, a
monaquiâ Írâncesa tona esir scgundí liireÇáo c dir:"Náo. o i perador
tLpârtirdonroncnto en1 qu c clc é sagÍado. llcus o inspiral ' Lnráo pode
dia seguintc. ou. cntào. 'rrÍis o fuzilârrcs''. Iror qlrô? Porquc tcnr prcssâ
pam rcsolvei as coisas.
Nao se csqucqâ quc â Íormaqáo da lgreia foi nrujlo lcnta. Nenlrum
grupo lrurnâno tinha mcios dc açáo paú sacudir a§sirü, â Euroira ilrtcirâ.
únruILi, inl.jr', \a,,.i,lr'r'Scnz.*(ur ratu'lrr\'r'i.'r''rrrr'i ''in'.'!
rcgionalquc IIâ cidadcvizinhaningüónr trcm ll"!x (âh'rÍIr EnlÀo
'ão
lra\ iu , *â tr . J .'.\r ur,\'nJiJ q r' ',r uepi\.
5.1
Mais iarde, no Ocidentc, quando se fornra unu arisiocrâcia iá
ctidí â letradâ. âcontcce a mesma colsa: a aristocracia comcça a
trnnar posiÇáo nâs qucstóes roLigiosas. A Rcn má ó frDn' disio unla
discussáo religiosa que saiu dc denlro do âmbito do clero c ganhou a
adcsáo da aristocracia. Isso seda diticílimo rlc sc lazer durânte â ldade
Média. Às vczes podia âié:rcontccer, mirs náo coú esta ânplitudc, com
esia grâvidâde. Primeiro porque a aristocrâcia cstavâ Íadicâlnentc
dcsinteressarLâ dcssas qrlcslôes. Enl geral, §eguia a lgreia. F- iâmbém
porque estâ ârislocraciâ, sendo dc lormaÇáo bárbara. conservavâ uma
espécic de lernor anccstÍal corno se fossc âos druidas. Os padrc§ erâm
os rcmânesccntcs alos druidês. Tinhâ rnedol Erâ unr lemor irracionâI.
mâs iinha cste lundo. Entáo. â ligação da âristocrâcia conr o clcro eÍa
n1ais dcsse tipo mágico do quc outrâ coisâ.
A pârtjr da hora e
quc os aristocraias comcçanr a ler livros, comc
çam a tcr suas opiniócs. Isso náo quer dizer que IIâ ldade Módia não
pudcsse aparcccr um ou outro ariíocrata letrâdo; claro quc podia. mas
a classe como tâl era fcita de ânallabclos. Acho que lbi hollível. nuncâ
dcvirm ier cnsinâdo os ârislocratas â ler. o sujeito (]stá âflrado até os
dentcs, âinda vou cnsiná-lo lerl Claro, cIa Inelhor âssiln: "olha. 4Lri eu
a
^pariirdahorâenr
surge uma filosofia horroÍosa. corneçâ Dcscaícs. I Iurnc, etc ,
Quândo
há uma filosofia tào tosca c táo imbccil, se corrpârada com o nível âl_
cançêdo ân1cs...l_oi uflr vcrdadeiro dcsâslre lllosófico. Il o quc eu châmo
a "paÍalâxc'. Pâralaxc ó Lr següintc: o suieito está vendo uma coisa na
suâ vida real, ncntal elc vê oxlm, c cscrevc sobre esia,
âs na suit lela
âcrcalitâ nestâ. Isso quer dizcr que clc esiá construindo uma obÍa dc
5.1
ii(çio, porque só náo é licçáo âquilo que ve ros desde a nossa pessoa
rcal; poriânh, o qüc assumimos intciramcntc. Sc é uma coisa quevis-
lLÍnbro só numa tclinha mcntâI, princiro, cu náo vcio aquilo o tenpo
t(ido. só vejo quândo penso naquilo; segundo, pàra eu me transportar
pàra aquele mundinho, preciso cntrar num cstado dc cspírito cspccial.
exaiamcntc o mcsmo cm quc cntro quando vou assistir a uDra pcçâ de
tcâtro ou sejâ, concedo uma crcdibilnhde lenporáriâ r âlgo que sei
55
Por outro lado, ten1 se o agravímenio extrcno disso, que chegâ ao
desconsirrcionis o, quando Jacqucs Derrida diz quc nm iexto nào §e
relêre a nâda Iorâ do tcxto. só sc rclitre a ortro teflo, quc sc relêre a
oütro tcxto, que sc relere a outro texto. . É olaro que, rum icxto. locô
sempre encontra retêrÔncia aolrlro, a outro. à Lrutroi scnPre, clâro. Mas
àco lccc que. paravocôler o primciro texio, como é quevocê 1ãz? Você
só pode ler mcdianle a idéiâ dc umâ relerônciâ cxterna quc náo é iexto.
porque §elrão, pârà ler o primeiro texto, você iá teria quc ter lido todos
os iextos. lsso qucr dizer que Jacques DerÍida pode âprescrrtar csiâ te-
oria na Univcrsidade. cscrevcr um montc... Mâs nio podc lcr um úrico
livro baseado cm sua teoria. Ele.ao podc praiicar â tcoriâ no scü at.'
de leitura, é inpossívcl. a alionaçào. a rupturâ cntre o suicito real e
^í
ocu rilu\uli.orhcgr,u ruma\inr,, .hegôu "opdrú\i.no
É clârc q c o sujeito esrá oompletalnenic loucoquando diz unrâ coisa
dcssàsi Só quc é !mâ loucura soclâlmcnte âdnriiidâ. Por qué? Porque se
losóficoJ' invost idos dos seus cargos. en1áo lá clcs podem dizcr abestcira
fi
qu\ qui.(r!r r. ( quJl JL, \"o Dard f'r'J elc! \"lidrn J \er nt sn'rt ror.r âr\.
Quer rlizer, nax criârnos unr tcal nho mentâI... ljoneça conl o teatrinho
mentâlde Descades, deMaquiàvel, ctc., e lermina com unl teairc montado
com dinheiÍo público pâra as pcssoas brincarcn dcssà coisa.
Por exemplo, onlem eu cstavâ ialando do iivro do István Mészáros,
Paru além ào .upilal,t ün livro de il páginâs. O süjcito começa dizcn-
do o seguinte: "Olha, o capltalismo é um regimc totàlitáÍio, porque ele
obrigou lodo mundo produzir ou perccer, todo nlundo cstá cnvolvido
zr
5ri
lô umAristóteles, iem a scnsaçio exâtâmcntc conlrátia... Não é assinr?
Aristóteles ou sanio Tomás de Aqüino, olr o própdo Lcibniz...
Quando LcibDiz diz para vocô: "Olha, erhüm obieto real podc se
reduzirâ pcso e medldâ", vocêjá náo sabc disso? Todo mundo sâbcl Ele
csiá lãlardo desdc suâ experiênciâ rcal M.Ls qüando Espinosâ chegâ c
diz: "Olha. o conhccjriento por cxpcdênciâ náo cnsina nadâ: nâdâ; o
qüe está na crperjênc iâ é tu do bobagem, sócxisic aqul âdeduÇáo purâ",
vocô sabe que elc cstá nalüco (
). Você accil.t â prcorissa e conlinua
raciocnrando. vô? E, lá para adianic, ele crioü uma construção táo bo
nilâqücvocêficaextasiado. Cornoobrâdcartcâquiloéum símboloda
reâlidade. e conro tâl cla luncionâ VocÔ lcr Espirlosa ou lcr Descàties
é Lrmà erpcriôncia esiética; clc nào vai lãlar nâdâ da realidâdc. mas
ântes vâi, dc cerlo modo. cnriquecer sua cxpcriancia e âirâ\rós daquilo
vocô rcparará ern aspcctos alâ realidâdc que náo conhecia antes. llntáo,
rão se podc dizer que [oi tüdo tcmpo perdi.lo Só fica perdido sc você
Todo esse pcssoâl scntiu o problema ceÍ1o, mâs. cn1 vez de e\arniná
lLr coú lodo o cuidado... Por exernplo. vcio con1o üm Rosefizwcig ou
Lrm Unâmuno podc an ter dcscobcÍo a solução se quisesse . mas o
desespeÍo era tarnanho, o desespero que sâía de dentro dâquilo eratáo
grandc, quc clcs apelârâÍn Rosenzweig o que Lêz? Disse: "Olhà, nâo
qucroDrais sâbcr dcsta coisâ, vou voltâr pâra a sinagoga .". Isso é deses
pero 1o1al. lsto náo é umâ soluçáo. Outrospartcm pâra â iracnmalidadc
tÍÍal, mas issotamhónr náoéumê soluçáo. A slrluEáo é aseguinte:você
está conr um problcma nâ máo: o pmhlemaéque a lilosolia lIe prcndeu
dentro de unla caixa prctâ, cntâovocô tcm qucvcr como ó qrc montarâm
cssâ câixa prc1a, corro é que ela loi rontada peça por pcça: e daí você
âprcnde a dcsmontarl É criatamcntc isso que eu estotl tentando lãzeÍ
hú dez ânos. Estou tcntando náo, âcho quc iá conscguii dcscobri a
chavc do negócio Sei onde é que a coisâ virou mesmo umâ arnudjlhâ:
virou iustamcntc na horâ cm que a responsabilklade pessoal do lilósolb
virou uma coisa e a sua rcsponsabilidadc iniclcciual virou outrâ. Ai é
tudo mcnllrâ, prssa a ssr tudo mcntira, ó tudo ficcional.
É a furnosa pcrgunta quc fiz sobre Maquiavel: Mâquiavel clescreve
o principe c diz: "Olha, o principc dcvc subir na vidâ alcanÇar todo o
poLlereDralar lodos aqueles queoajudârâm". Masqucm o ajudou mâis
do quc o sujcito quc cscrcvcu o Ínanuâl para ele lazer isso? Se seus
ensinâmcrltos fosscm aplicados. clc scria â primcirâ vítimâr "Maiarnos
Mêquiâvel e queimàmos lodos os exenplarcs do iivro parâ ninguénr
cntcndcr". E cstâ pcryuntâ náo lhe ocorre !lm único omeirtol lile está
filosolando nurn príncipe hipotótico nunr palácio hipotético dc invcnÇáo
dele, nras no qual ele, Maquiavel. náo cstá lá. circunslância política
quc clc dcscrcve não ó aquela que o envolve. é^Lrma quc cle inveDlou.
Êntão, é claro que csse príncipc dc Mâquiavcl náo cxistia. náo vcio a
§,
Dados Inlei'â.ionais de CatâlôgâÇáo na publicacão (Ctpl
(Câmar BÉsileira do Livrô. SP Brasil)