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Marchesan IQ. Definição e tratamento das alterações de fala de origem fonética.

In:
Cézar AM, Maksud SS. Rio de Janeiro: Revinter; 2015. 2ª Edição Cap 6 p.73-100

Definição e tratamento das alterações de fala de origem fonética

Irene Queiroz Marchesan

Doutora em Educação pela UNICAMP


Especialista em Motricidade Orofacial
Diretora Clínica do CEFAC – Saúde e Educação
“Morte e vida estão nas mãos da língua”.
Provérbio

Esse capítulo tem a intenção de expor o que é a fala do ponto de vista de diferentes autores e
como suas alterações interferem na vida do ser humano. Para isso recorri a diferentes teorias
e pesquisas além de relatar alguns casos verídicos mostrando a complexidade desse
aparentemente simples ato – falar.

Falar é exprimir o que vai à mente por meio de palavras; é proferir; é dizer. Ao falar
manifestam-se idéias acerca de algo. Ao conversar, discursar, dialogar, entrevistar, anunciar,
ensinar, pregar e tantas outras ações, usamos muitos meios, desde a emoção, gestos e até a
fala. Falar, assim como escrever, coloca o indivíduo em contato com o mundo. A fala,
juntamente com gestos, expressões faciais, movimentos corporais, escrita, desenho,
sentimentos, compõe a comunicação humana.

Ainda que a grande maioria dos seres humanos possa produzir todas as palavras de forma
livre e com facilidade, e ainda que se tenha a certeza de que as palavras estão sempre à
disposição, muitas vezes se esquece que a comunicação oral é, provavelmente, a capacidade
mais importante e mais complexa de todas as potencialidades que o ser humano possui
(WEISS et al., 1980).

Por exemplo, um profissional, para ser bem sucedido, deve ter conhecimento técnico,
capacidade de liderança e poder de comunicação. Na comunicação, estão incluídas a
capacidade de oratória, a precisão da articulação da fala, a fluência, a impostação vocal, a
clareza de idéias, a coesão do pensamento, dentre outros atributos (SILVA, 2008).

Afinal, o que é comunicação? Segundo o dicionário Michaelis (2007), comunicação é o


substantivo feminino que significa a ação, efeito ou meio de comunicar. Também significa um
aviso, informação, participação, transmissão de uma ordem ou reclamação. Para a Sociologia
é o processo pelo qual idéias e sentimentos se transmitem de indivíduo para indivíduo,
tornando possível a interação social.

Rodrigues (2005) faz uma avaliação interessante ao dizer que se comparássemos a


comunicação a um órgão do corpo humano, certamente ela seria o coração a que bombeia o
conhecimento que temos para a nossa vida profissional. Uma boa comunicação faz a
diferença no mercado de trabalho.

Penteado (1986) comenta:


O que dizemos e como dizemos constrói nossa reputação, forma impressões e
influencia nossas relações com os outros. Aprender a falar faz parte da arte de viver
bem. São as impressões dos outros que formam a nossa imagem, contribuindo para
sermos aceitos ou rejeitados pelos grupos humanos. É falando que a personalidade se
revela. Certo ou errado, somos julgados pela maneira como falamos, através da qual
as pessoas tiram conclusões sobre a nossa formação, condição social e até mesmo a
nossa capacidade mental. A palavra é a forma de expressão da personalidade. Muitos
se preocupam mais com a aparência, as roupas, as maneiras, o conjunto. Mas se
desejamos impressionar favoravelmente os outros, a impressão que mais se fixa é o
modo pelo qual falamos (p. 257).

Um exemplo dessa importância da fala/comunicação é encontrado na dissertação de Silva


Santos, realizada em 2006. O autor analisou o julgamento da expressividade de políticos em
contexto de debate televisivo e concluiu que o candidato preferido pelos possíveis eleitores
falou pausadamente, de maneira clara e objetiva, usando gestos equilibrados, de forma que
seu modo de expressão fosse considerado como agradável e transmitisse credibilidade.

Em relação a alterações da comunicação em geral, Perkins observou a seguinte prevalência


em um estudo de 1971: 75% são alterações da articulação da fala; 19,7% da linguagem; 13%
são gagueira e 9,4% da voz.

O estudo da fala cabe às “Ciências da Fala” que congrega diversos campos de conhecimento,
tais como a Lingüística, a Comunicação e Semiótica, a Engenharia, as Ciências da
Computação, a Física, a Matemática, a Medicina e a Fonoaudiologia (GREGIO, 2006).
Normalmente quem procura estudar e compreender as alterações da fala são os
fonoaudiólogos.

A busca por entender o processo da fala levou o engenheiro Dudley em 1939 a analisar o
processo de produção da fala.

Pode-se definir a produção da fala como o som irradiado na boca, resultado da modificação
de uma fonte sonora por um filtro acústico variável (Albano, 2002).

Para Gregio (2006) a fala é linguagem e som; é o ato motor que expressa a linguagem.
Estudar a produção normal da fala é fundamental para poder compreender as alterações da
fala, assim como para poder diagnosticar e tratar de forma correta indivíduos que procuram a
ajuda do profissional que, tecnicamente, o levará a se comunicar melhor.

De acordo com Madureira (2006), a fala varia em razão de diferentes fatores, a maioria
relacionada ao falante: idade, sexo, escolaridade, grupo social, região de origem, condições
físicas e psíquicas, personalidade, atitude, emoção e cansaço. Também pode variar devido
aos estilos de fala e à co-produção dos sons na cadeia da fala, além dos aspectos de
natureza lingüística.

A fala, para Milloy (1997), é um aspecto da linguagem representado pelo uso de sinais
produzidos pela expiração, fonação, articulação e ressonância, cuja comunicação se dá por
meios acústicos e auditivos. Para o autor, a fala é a produção física da linguagem. Para
compreender a produção da fala devem ser consideradas: a parte motora - neurofisiológica e
neuromuscular, e os componentes da respiração, fonação, ressonância e articulação.
Interferem na aquisição e produção da fala propriamente dita os distúrbios genéticos,
estruturais e neurológicos.

Nos desvios estruturais, pode estar afetado algum dos componentes anatômicos do trato
vocal que é responsável pela fala, tais como língua, lábios, palato, faringe e laringe. Um bom
representante de alteração de fala causada por alteração estrutural são as más formações de
palato que causam as fissuras, muitas vezes envolvendo os lábios também. São também
considerados como desvio de estrutura aqueles que envolvem o sistema neurológico
causando as disartrias, por exemplo, (MARCHESAN, 2005a).

Ainda para Gregio (2006), os exames realizados por imagem de ressonância magnética
possibilitam estudar o trato vocal e a produção dos sons da fala sem oferecer riscos à saúde
do falante, devido a ausência de radiação, permitindo ainda a adequada visualização dos
tecidos moles (músculos) envolvidos na produção da fala. Os estudos por meio da
ressonância magnética datam da década de 1980.

Para produzir fala é necessário um sistema complexo que requer a contração coordenada de
muitos músculos existentes na língua, lábios, palato mole, mandíbula, laringe, faringe, assim
como dos músculos que desempenham a função da respiração. Os músculos são controlados
pelo sistema nervoso. O controle motor é realizado pelos neurônios motores inferiores que
conectam o sistema nervoso central, encéfalo e medula espinhal com as fibras musculares
esqueléticas. Os neurônios motores inferiores originam-se na medula espinhal (para músculos
situados fora da região da cabeça) ou no tronco encefálico (para músculos da região
craniana). Para que a fala seja realizada de maneira adequada é necessário que o córtex
cerebral, os núcleos da base do cérebro, o cerebelo, o diencéfalo, o tronco encefálico, a
medula espinhal e os nervos periféricos estejam íntegros. Se houver dano no sistema nervoso
central ou periférico que estão relacionados à atividade motora, ocorrerão alterações de fala
de origem neurológica, chamadas de apraxias (para lesões corticais) ou disartrias (para
lesões nas outras regiões citadas).

Existem doze pares de nervos cranianos que têm seus núcleos situados ao longo do tronco
encefálico, com exceção dos nervos olfativo, ótico e vestibulococlear que são unicamente
sensitivos. Alguns nervos cranianos têm funções sensoriais e motoras, outros só funções
sensoriais e alguns só funções motoras. Como os nervos cranianos, designados pelos
numerais romanos, são responsáveis pelo controle da maioria dos músculos que compõem o
mecanismo da fala, faremos um breve resumo das características e conexões periféricas dos
doze pares.

O I Olfatório tem como função o olfato; o II Ótico a visão; o III Oculomotor inerva os quatro
músculos oculares extrínsecos e o elevador da pálpebra; o IV Troclear inerva o músculo
ocular extrínseco; o V Trigêmeo tem uma raiz motora que inerva os músculos da mastigação
e o tensor do tímpano e uma raiz sensorial que dá a sensibilidade geral craniofacial; o VI
Abducente inerva o músculo ocular extrínseco; o VII Facial tem a raiz motora que inerva os
músculos da expressão facial e o estapédio e a raiz intermediária (nervo intermediário) que
faz a inervação parassimpática das glândulas salivares submandibulares e sublinguais, além
do paladar e dos dois terços anteriores da língua; o VIII Nervo vestibulococlear que é dividido
em nervo vestibular – equilíbrio, e o nervo coclear – audição; o IX Glossofaríngeo inerva o
músculo estilofaríngeo, faz a inervação parassimpática da glândula salivar parótida e a
sensação da faringe e paladar do primeiro terço posterior da língua; o X Vago inerva os
músculos laríngeos e faríngeos e o elevador do véu palatino, faz ainda a inervação
parassimpática da víscera abdominal superior e da víscera torácica; o XI Acessório na porção
craniana se junta ao vago para suprir os músculos da laringe e faringe e a porção espinhal
que inerva os músculos trapézio e esternocleiodomastoídeo, por último o XII Hiplogosso que
inerva todos os músculos intrínsecos e os extrínsecos da língua.

Como pudemos ver, os nervos V Trigêmeo, VII Facial, IX Glossofaríngeo, X Vago, XI


Acessório e XII Hipoglosso são vitais para a produção da fala (MURDOCH, 2005).

Além do sistema neurológico, precisamos compreender os demais mecanismos que permitem


a existência da fala, compreender que a fala é um sistema dinâmico e complexo em que estão
envolvidas a produção e a percepção dos sinais da fala.

Para Weiss et al. (1980), a respiração, fonação, ressonância e a articulação constituem o


processo primário envolvido na produção da fala. Esses processos e o sistema nervoso
precisam interagir de forma sinérgica para que a fala possa acontecer de forma considerada
normal.

O sistema da fala, segundo Mysak (1988), é composto por seis sistemas: receptor,
transmissor, integrador de ordem superior, integrador de ordem inferior, efetor e sensor. Cada
um desses sistemas é inter-relacionado e interdependente e contém seus próprios
subsistemas. Esses sistemas são responsáveis pelas funções de recepção, percepção,
compreensão, formulação, produção, controle e monitoramento da fala.

Camargo et al. (2008) esclarecem que a fala é uma função adaptada que utiliza os aparelhos
respiratório e digestório. O aparelho fonador utiliza as vias aerodigestivas superiores. A fala
engloba os mecanismos: 1) neurolinguísticos (programação e processamento da fala); 2)
aerodinâmico (movimentação da corrente de ar para a produção dos sons da fala); 3)
fonatório (movimentação das pregas vocais); 4) articulatório (movimentação dos
articuladores); 5) acústico (formação de fontes e filtros no aparelho fonador e radiação no ar);
6) auditivo (recepção e decodificação dos sons pelo aparelho auditivo). Essas estruturas
mudam de função continuadamente – respiração, deglutição e fonação.

O aparelho respiratório participa na produção da fala por meio do controle do fluxo aéreo
expiratório, gerando a corrente de ar egressiva que é a base da geração das fontes de ruído e
de sonoridade. A sonoridade das vogais é produzida na laringe pela vibração das pregas
vocais. O aparelho digestório contribui com os articuladores ativos (lábios, língua, mandíbula e
palato mole) e passivos (dentes, palato duro e parede posterior da faringe) mais os
ressoadores (cavidades oral, nasal, faríngea e labial). Os ressoadores modificam o som
produzido na glote, sendo possível a articulação de diversos segmentos consonantais e
vocálicos (GREGIO, 2006).

Os distúrbios da fala têm caráter bastante individualizado e o aparelho fonador mostra sua
grande plasticidade diante de condições que impõem dificuldades na produção e/ou
percepção do sinal de fala. Esta reflete o resultado de complexos processos nos planos
lingüístico, fisiológico, acústico e perceptivo (CAMARGO, 2004).

Fonética e Fonologia

A Fonética estuda os sons como entidades físico-articulatórias isoladas, descreve os sons da


linguagem e analisa suas particularidades articulatórias acústicas e perceptivas. A unidade da
Fonética é o som da fala ou o fone. A Fonologia estuda os sons do ponto de vista funcional
como elementos que integram um sistema lingüístico determinado e estuda as diferenças
fônicas intencionais, distintivas, isto é, sons que se vinculam a diferenças de significação. A
unidade da Fonologia é o fonema. A Fonética se distingue da Fonologia por considerar os
sons independentemente de suas oposições paradigmáticas e sintagmáticas (CALLOU &
LEITE, 1990).

Para Yavas et al. (1991), a Fonética é a ciência que estuda as características dos sons
produzidos pelos órgãos vocais, especialmente quando utilizados para a fala. O estudo do
som sob o enfoque fonético engloba tanto o aspecto articulatório (conjunto de movimentos
produzidos pelos órgãos vocais para a realização de um som), como o aspecto acústico
(conjunto de características físicas dos sons da fala). Os segmentos fonéticos são
graficamente representados entre colchetes, exemplo [b] e são chamados de fones. A
capacidade fonética é a capacidade de produzir os sons da fala e a capacidade fonológica é a
capacidade de empregar um som com valor contrastivo.

Ao se relacionar a fonética e a fonologia, surgem contribuições relevantes baseadas em


modelos auditivos, que explicam as modificações do trato vocal para alcançar diferentes alvos
auditivos, e em modelos motores, que pressupõem a existência de gestos articulatórios como
alternativa aos traços distintivos (ALBANO, 2001).

Para esta autora, (2008), o gesto articulatório é uma unidade de análise abstrata, ao mesmo
tempo, fonética e fonológica. Ela difere do segmento fônico do tamanho do fonema por ter
uma natureza temporal e, portanto, uma duração necessária.

Os modelos teóricos que abordam a fala como um sistema dinâmico permitem observar que,
partindo do ponto de vista da percepção ou da fisiologia, é proposto um vínculo entre a
fonética e a fonologia para explicar e contemplar todos os processos da fala. Considerar a
relação entre as esferas de produção e percepção, bem como a variabilidade da fala,
configura-se relevante para a clínica de fala na Fonoaudiologia, ao fornecer subsídios para
melhor compreensão dos fenômenos da fala (GREGIO et al., 2006a).

Como vimos até o momento, a fala é algo muito complexo. Classicamente dividida em quatro
fases – respiração, fonação, articulação e ressonância, considerando-se também o papel da
audição e de todas as outras vias de feedback. Porém, podemos estudar cada um desses
aspectos separadamente, tanto do ponto de vista da normalidade, como das alterações.
Podemos verificar qual é a interferência de cada um deles na fala, principalmente na presença
de alterações, sem, no entanto, desconsiderar a interligação e a ação de uma fase ou sistema
sobre o outro.

Neste capítulo, estamos mais voltados para a interferência dos articuladores na produção da
fala, principalmente diante de alguma alteração estrutural ou funcional que os impossibilite de
exercer seu papel na produção da fala de forma adequada.

É notória a infinda capacidade do ser humano de usar compensações. Na presença de


alterações articulatórias, o uso de adaptações e/ou de compensações pode permitir que a fala
aconteça. Em nossa experiência clínica observamos que existem dois tipos de
compensações, uma para disfarçar o problema existente e outra utilizada para tentar melhorar
a produção da articulação. As compensações mais freqüentes são as utilizadas para disfarçar
ou esconder o problema, como por exemplo, diminuir a abertura da boca; falar mais depressa;
falar mais baixo; falar com a cabeça voltada para baixo; não olhar nos olhos do interlocutor. Já
as compensações mais utilizadas na tentativa de melhorar a produção da fala são: mover a
mandíbula para uma das laterais ou para frente; fazer movimentos de língua não usuais
durante a produção do fone alterado; utilizar movimentos de lábios atípicos e, em alguns
casos, movimentar a cabeça.

Essa extraordinária capacidade de produção de fala na vigência de importantes alterações do


aparelho fonador, ou mais precisamente, de mutilações nos órgãos da fala, tem servido de
base para a reflexão de teóricos sobre essa faculdade humana tão complexa (CAMARGO,
2004).

Cada pesquisador da fala procura esmiuçar algum ponto, estudá-lo com maior profundidade e
mostrar os porquês das “falhas” no produto final, a fala. Sabemos que falhas no sistema
nervoso causam as disartrias e apraxias e que falhas estruturais levam, por exemplo, a
fissuras. No entanto, poucos estudos focam os pequenos problemas estruturais que causam
pequenas alterações na fala, mas que, apesar de ‘pequenas’, são desastrosas para o falante
por colocarem em risco sua comunicação.

Queixas de problemas durante a fala, como chiado, cuspir, maxilar que estala, língua que
aparece, pronuncia inadequada de algum fone, principalmente do vibrante simples alveolar (r),
são extremamente comuns nos consultórios de fonoaudiólogos. Esses pacientes, crianças e
adultos, entendem como possíveis causas de seus problemas articulatórios: “a língua presa”;
“a boca muito fechada”; “a língua mole”; “muito cuspe na boca”, e outros. Eles também
relatam a interferência dessas pequenas alterações na sua vida, como o complexo; a
dificuldade de se relacionar; a dificuldade de arrumar emprego; a discriminação que sofrem;
as gozações sistemáticas; o isolamento que eles mesmos se impõem nos grupos, falando o
mínimo possível, e o pior de tudo, “a falta de credibilidade sobre o que falam” que sentem por
parte do outro ao falarem com ’erros’. Alguns adultos que não falam com a chamada “dicção
correta”, mesmo em cargos importantes, sentem que o que dizem perde força, apesar deles
estarem ‘corretos’ no assunto tratado. Essas pessoas relatam vários problemas profissionais e
pessoais por possuírem pequenos problemas de fala.

É interessante que esses pacientes afirmam que não são tratados como “doentes”, já que o
problema não é grave nem escancarado, porém são tratados como “diferentes” e “incapazes”
de falar bem, pois, não há uma causa aparente e o problema nem é tão grave assim. Eles
referem os comentários das pessoas de que eles falam como se tivessem má vontade de falar
corretamente. Ouvem frases do gênero: “abre a boca para falar”; “fale mais devagar”; “fale
mais alto”; “fale melhor”; “é difícil entender você”; “o que você falou?”; “não entendi” e assim
por diante. Ouvir isso todos os dias os leva a falar menos, a não se colocarem, a se tornarem
“tímidos” e fechados.

Marchesan (2005) pesquisou quais seriam as alterações mais freqüentes entre adolescentes
e adultos com alterações de fala. Encontrou 50,6% de alterações nos fones [s] e [z],
caracterizadas por distorções; 30,9% de distorções no flape alveolar (vibrante simples
alveolar) e 18,5% de imprecisões. Oliveira et al. (2005) procuraram identificar as principais
alterações de fala que levam o adulto a buscar fonoterapia, e verificar se o problema interfere
em sua vida pessoal e/ou profissional. Como resultados encontraram que as alterações de
fala de origem fonética mais freqüentes ocorreram nos fones [s] e [z] (44%), seguidas das
alterações do flape alveolar (vibrante simples alveolar) (28%). Os demais (28%) apresentaram
imprecisões articulatórias na fala como um todo. Observaram ainda que as alterações de fala
são percebidas pelo falante e interferem mais no trabalho, do que na vida social. Apesar disso
são poucos os adultos que buscam por fonoterapia. Provavelmente isso ocorre porque os
benefícios desse trabalho são pouco conhecidos .

Oliveira et al. em 2007 procuraram verificar qual era o índice de adesão à fonoterapia em
adultos que buscaram tratamento por alterações de fala de origem fonética. Sua conclusão foi
que esse percentual ainda é baixo e a grande maioria que buscou tratamento fonoaudiológico
para os problemas de fala iniciou o processo de terapia só quando a interferência do problema
prejudicava o trabalho. Apenas pouco mais da metade dos pacientes foi até o final do
tratamento, alguns se sentem satisfeitos com resultados parciais e interrompem o processo
terapêutico por conta própria. Por outro lado, nem todos os adultos tiveram condições de
terminar a fonoterapia por causa de compromissos com o trabalho profissional e
evidentemente privilegiaram seu meio de sobrevivência.
Como vimos, queixas aparentemente simples podem revelar a complexidade da integração e
coordenação dos processos da fala e a singularidade das manifestações (GREGIO et al.
2004). Normalmente apenas os adultos com alterações de fala de origem neurológica
procuram ajuda e são tratados pelo fonoaudiólogo. Além disso, existem alterações de fala que
“aparentemente” não são tão graves, mas que interferem fortemente em vários aspectos da
vida do sujeito que apresenta a alteração.

Na seqüência deste capítulo, relataremos alguns casos de alterações de fala em adultos.


Nosso objetivo é enfatizar que essas alterações não costumam ser observadas,
diagnosticadas e tratadas como deveriam ser.

1. Mulher, de 68 anos de idade, com a queixa de falar com dificuldade. Foi encaminhada pelo
dentista para verificar se o fato de falar com dificuldade tinha relação com os dentes. O
problema já se apresentava há mais ou menos um ano e meio. Já havia consultado mais de
um médico e também um dentista, não tendo sido detectado nenhum problema. Mas ela
observava que estava piorando e estava ficando difícil conversar. Sua queixa era que a boca
parecia que ficava meio dura. A amiga, que veio junto para a entrevista, pôde confirmar que,
de fato, a fala havia mudado. As pessoas diziam que a piora na fala era devida ao
envelhecimento. A paciente dizia que, apesar da idade, não se sentia tão velha assim para
estar falando com tanta dificuldade. Conversamos sobre seu trabalho, sua aposentadoria e o
que fazia no momento atual. Indagamos sobre possíveis doenças e seus tratamentos além de
fatos que pudessem interferir de alguma forma na fala. A paciente contou diversos episódios
de sua vida, entre eles, que sofreu um sério acidente de carro que resultou na morte de
pessoas queridas. Após o acidente, ficou deprimida e começou a tomar antidepressivo. Este
fato ocorrera havia três anos e, embora a paciente não parecesse mais estar deprimida,
continuava tomando o medicamento.
Durante o exame, observamos que ela usava uma prótese fixa parcial razoavelmente
adaptada e que a dificuldade com a fala parecia basicamente relacionada à diminuição da
quantidade de saliva. Sabemos que algumas medicações antidepressivas podem interferir na
produção da saliva. De fato, isto se confirmou. Depois que a fonoaudióloga conversou com o
médico da paciente a dosagem do medicamento foi reduzida até a retirada completa, sendo
então resolvido o problema da fala.
O relato da paciente nos mostra seu sofrimento: “Eu era uma mulher com muita energia, que
saia sempre com minhas amigas, que jogava buraco três vezes por semana. Durante o jogo, eu
e minhas amigas conversávamos bastante. Fui professora durante toda a vida tendo falado
muito e trabalhado até depois da minha aposentadoria e, hoje, não presto para mais nada. Vou
falar e minha boca fica dura, faço uns estalos esquisitos durante a conversa. As pessoas ficam
me olhando com uma cara estranha como se, além de não me entenderem direito, tivessem pena
de mim. Eu fico cansada de falar. Não tenho mais agilidade na conversa. Às vezes, estou
empolgada participando de um assunto, quero dar palpites, mas sinto que atrapalho, pois
demoro muito e a boca fica assim, meio que grudando. Será que se eu mudar de dentista ou
talvez de prótese isso melhoraria? Quem sabe uma dentadura resolve? Afinal, você acha que
isto vai sarar?”
Além de constatarmos o grande sofrimento desta pessoa, observamos seus interlocutores,
inclusive profissionais, abordarem este pequeno drama como se fosse apenas um problema
de velhice, algo tido como natural e, assim sendo, não deram a devida atenção. Percebemos
que nenhum grande esforço havia sido feito para detectar possíveis causas da mudança de
sua fala.

2. Mulher, de 62 anos, encaminhada por um dentista porque a fala estava ficando


“atrapalhada” logo após a troca da prótese superior. No início, o dentista disse que era uma
questão de “acostumar” e que, em breve, isto estaria resolvido. Após seis meses, a paciente
não só não havia se acostumado, como havia piorado. Veio à consulta em nosso serviço de
fonoaudiologia acompanhada do marido que permaneceu a seu lado todo o tempo. Dentre as
provas aplicadas, solicitei que falasse com e sem a prótese para que tivéssemos uma
comparação se a fala se modificaria nestas duas situações. A fala, com e sem a prótese, não
se modificou. A prova foi simples e nos deu pistas que nos levaram a outros procedimentos
para a identificação da causa. Observamos que, além da fala, a voz também se modificara,
tornou-se mais grave. Além disto, a deglutição apresentava maior dificuldade e nos últimos
meses, apareceram engasgos freqüentes. O marido, muito presente em sua vida, pôde
detalhar aspectos de sua alimentação, confirmando os dados da paciente. A suspeita recaiu
sobre algum problema neuromuscular específico. Vale lembrar que a linguagem da paciente
estava normal. Frente aos achados clínicos, ela foi encaminhada para um neurologista.
Infelizmente, os dentistas, assim como muitos fonoaudiólogos, não estão preparados para
identificar casos como este. Outro problema é que existe uma tendência de não se valorizar
as queixas quando são colocadas novas próteses: espera-se que haja um ajuste ‘da boca à
prótese’. Esta senhora tinha esclerose lateral amiotrófica, doença que a levou à morte em um
ano e meio. Apesar desta doença não ter cura, como o fonoaudiólogo detectou o problema
precocemente, houve a possibilidade de se orientar a paciente em relação à sua alimentação,
o que lhe permitiu permanecer sem a sonda de alimentação por mais tempo e desta forma
desfrutar da companhia de sua família durante as refeições até praticamente dois meses
antes de sua morte. Também foi realizado um programa alternativo de comunicação para que
ela pudesse manter por mais tempo a “fala” com seus familiares (MARCHESAN, 1998).

3. Mulher, de 54 anos, balconista de uma loja de shopping. Queixa: risco de perder o


emprego, pois, quando falava expelia saliva e apresentava projeção anterior da língua. O
dono da loja entendeu que não seria interessante para seu negócio manter um funcionário
que “cuspisse” nos clientes. A partir da ameaça de perder o emprego, ela passou a falar com
a boca mais fechada, evitando a saída da língua e da saliva. Esta técnica, adotada
intuitivamente, fez com que sua fala ficasse imprecisa e comprometeu sua naturalidade nas
vendas. A pergunta era: se antes ela falava bem, o que provocou este problema? A partir da
anamnese soubemos que, meses antes, para melhorar sua estética, a paciente consultou um
dentista que colocou um aparelho expansor superior móvel. Este aparelho, aparentemente,
criou um desequilíbrio oclusal e abriu sua mordida anterior. Esta abertura fez com que a
língua escapasse com grande facilidade e o controle da saliva ficasse mais difícil.
Não nos cabe entrar no mérito do trabalho e das técnicas ortodônticas, gostaríamos apenas
de discutir o modo como alterações de fala podem surgir até em função da colocação de
aparelhos dentários. Hoje em dia, é cada vez mais comum adultos, e mesmo idosos,
utilizarem estes aparelhos na tentativa de resolução de antigos problemas. É muito importante
que o fonoaudiólogo, solicitado a melhorar a fala do paciente, compreenda os objetivos dos
diferentes tipos de aparelho e, se necessário, discuta o caso com o dentista para saber o que
está acontecendo, se o observado é esperado ou não e quanto tempo o paciente ficará
daquele jeito. Quando a comunicação com o outro profissional for difícil, sugerimos orientar o
paciente para que ele mesmo procure se informar sobre o que está ocorrendo e descobrir se
aquela situação em que se encontra é temporária ou definitiva.
No caso específico desta senhora, após uma conversa com o dentista, houve uma
modificação na aparatologia utilizada, isto diminuiu sensivelmente o problema. Além disso,
fizemos contato com o dono da loja e mostramos as vantagens da utilização do aparelho por
sua funcionária que, ao investir na própria aparência, estaria melhorando o nível da loja. Tudo
seria uma questão de tempo. Em seguida, trabalhamos com a paciente o posicionamento
mais adequado da língua a fim de facilitar sua adaptação às modificações ortodônticas. Isto
fez com que, a partir da compreensão e conhecimento do processo mecânico da fala, a
paciente pudesse ter um melhor controle da saliva e de sua pronúncia.
O papel do fonoaudiólogo, neste caso, não foi, inicialmente, de atuar diretamente na fala, mas
sim de compreender o que era ou não possível fazer e de ter uma atuação precisa junto ao
dentista e ao patrão.

4. Homem, de 49 anos, alto cargo em um banco estatal. Sua queixa era que, após ter se
submetido a um implante total superior, passou a falar bastante assobiado. Dentre suas
atividades, dirigia muitas reuniões, inclusive internacionais, tendo que falar bastante e se
expor muito. Ele nos contou que seu rendimento nessas reuniões havia diminuído muito, pois,
todos observam sua nova forma de falar e tentavam descobrir o que ele fazia para assobiar
tanto – até lhe deram um apelido. Para controlar os problemas, este homem passou a fazer
apresentações usando mais o flip charter, falando de costas para o público e escrevendo
muito enquanto falava. No entanto, o falar de costas causou um novo problema: ele perdeu o
controle do que estava acontecendo na sala. Uma outra medida para diminuir os assobios
durante a fala, foi contrair o orbicular da boca sobre os dentes por onde o ar escapava. Isto
fazia com que o controle de saída do ar fosse razoável, mas ele ficava o tempo todo contraído
e fazia uma espécie de careta ao falar. Este homem chegou até nós, indicado pelo dentista
que havia dado por encerrado o trabalho odontológico e afirmou que o problema da fala seria
solucionado pelo fonoaudiólogo. Ao examiná-lo, observamos que os dentes implantados
estavam muito bonitos, mas era possível ver, sob o lábio superior, espaços entre os dentes.
Por este espaço ocorria a saída do ar durante a fala e o conseqüente movimento do lábio
superior. De fato, era bastante estranho e toda a atenção ficava voltada para este fenômeno e
nós quase esquecêssemos do conteúdo da conversa. Quando o paciente tentava controlar o
movimento do lábio superior, contraindo-o fortemente contra os dentes, o ruído de saída do ar
diminuía, mas a boca tornava-se muito tensa e sem os movimentos naturais utilizados na fala.
Parecia uma máscara.
Este caso foi muito difícil, pois, na verdade, o trabalho era totalmente dependente do ajuste do
dentista. O problema anatômico era importante e a função estava alterada por isso. O
diagnóstico sempre é fundamental. Ao invés de trabalhar imediatamente na tentativa de
corrigir o problema de fala tivemos que mostrar ao paciente, com muito tato, que o problema
era decorrente do tratamento dos dentes e que a fala estaria irremediavelmente
comprometida se não houvesse a correção dos espaços. Pudemos iniciar o trabalho com a
conscientização do paciente de como são produzidos os sons da fala e quais seriam suas
possibilidades a partir daquela nova forma. O próprio paciente chegou aos limites daquilo que
seria possível para ele, compreendeu os por quês das falhas e buscou alternativas para
possíveis melhorias.

5. Homem de 45 anos, excelente vendedor durante toda a vida e na iminência de perder o


emprego por estar falando mal. Isto havia começado após a colocação de prótese total
superior e inferior. O medo de que a prótese caísse durante a comunicação fez com que ele
falasse mais devagar. No tipo de venda em que ele trabalhava era imprescindível falar rápido,
pois, o cliente deveria comprar por impulso, sem ‘ter tempo para pensar’ e dizer não.
De fato, muitas vezes, após a colocação da prótese, seja parcial ou total, há modificações na
forma de comer e de falar, observa-se uma diminuição dos movimentos naturais mais amplos
de mandíbula durante a fala, o que faz com que diminua a precisão dos pontos articulatórios.
Porém, estas modificações são absorvidas com o tempo de uso. Todos, incluindo o usuário,
se acostumam com as mudanças ocasionadas pela introdução da prótese e, mesmo que elas
piorem a forma de falar, ou de comer, são tomadas como inevitáveis. Se o profissional que
coloca a prótese tiver uma observação mais particularizada da adaptação do paciente, no
sentido de avaliar a compreensão de suas explicações e até de supervisionar um treino de
uso, poderíamos ter funções mais adequadas e diminuição de problemas, principalmente na
fala e na alimentação.
Neste caso, orientou-se o paciente como falar com a prótese e solicitou-se a seu dentista a
revisão dos ajustes de modo a aumentar a fixação da prótese na cavidade oral. A fala
melhorou e o paciente pôde retomar sua confiança durante as vendas.

6. Mulher, de 61 anos, com a queixa de estar falando mal nas situações de comunicação na
igreja em que auxiliava o padre nas missas de domingo. Isto havia começado havia mais ou
menos 18 meses e estava piorando. As pessoas a princípio quase não percebiam, mas
ultimamente, já havia comentários das amigas e dos parentes próximos. Acima de tudo, ela
própria, nitidamente, notava que a sua fala estava a cada dia pior. Coincidentemente, isto
aconteceu após o casamento de seu último filho. A paciente já havia procurado um
fonoaudiólogo que apontou como causa do problema da fala a solidão da paciente após a
saída dos filhos de casa. Em função de tal diagnóstico, esta paciente havia sido enviada para
uma psicóloga que a tratava havia um ano. Quando ela chegou em nossa clínica, realizamos
um exame acurado da motricidade orofacial e percebemos que, além da imprecisão
articulatória, havia também uma imprecisão dos movimentos isolados dos órgãos
fonoarticulatórios. Encaminhada para exame neurológico foi detectado um tumor cerebral. A
paciente foi para cirurgia sendo tratada, posteriormente, das seqüelas de fala.
A imprecisão de pontos articulatórios apresentada no exame inicial associada à história de
aumento progressivo das dificuldades, assim como à inabilidade em relação aos movimentos
isolados alterados, foram indicativas de que, muito provavelmente, existia um problema
neuromotor em curso. Mesmo que possa existir um desconforto emocional concomitante à
queixa, devemos estar sempre alertas. A fala, os movimentos orais, a deglutição e a voz de
um indivíduo adulto, quando se modificam sem causa física evidente deve sempre nos levar a
uma indicação precisa e rápida de avaliação neurológica. A habilidade de se fazer um
diagnóstico precoce, nestes casos, pode salvar uma vida ou levar a cirurgias menos extensas
com menores seqüelas.

7. Homem de 50 anos, descendente de japoneses, com a queixa de falar errado palavras com
[l] e [r]. Trabalhou durante 22 anos como caixa de banco. Algumas pessoas, em alguns
momentos de sua vida, haviam comentado que ele trocava letras ao falar. Isto não teve
nenhuma interferência durante sua juventude. No momento em que procurou ajuda isto tinha
se tornado um peso, pois, por falar errado, queriam colocá-lo em outra função dentro da
empresa: qualquer função que não lidasse com o público. O mais interessante é que, embora
as pessoas fizessem comentários a respeito de sua fala, ele não percebia nem sabia
exatamente qual era seu erro. Ele nos contou que diziam que não sabia falar “cliente”,
“problema”, e outras coisas assim. Não havia percebido, até aquele momento, a consistência
da troca. Como muitos japoneses, ele fazia a clássica troca entre [l] líquido lateral e [r] líquido
vibrante simples, ou vice-versa; tais sons não são diferenciados entre si na sua língua natal,
desta forma, qualquer um que se use parece correto. A pergunta era: “Por que só agora isto
se tornara um problema? Seria um maior cuidado da empresa com o modo de falar de seus
funcionários?” Fomos até a empresa para observar in loco o problema e tivemos a
oportunidade de conversar com seus superiores. No banco trabalhavam muitos japoneses e
descendentes de japoneses. Muitos outros funcionários apresentavam a troca em questão.
Nosso paciente, de fato, sempre apresentou tal troca sem que isso causasse problemas
dentro da empresa. Porém, meses antes havia sido introduzida no banco uma nova política de
captação de clientes, de modo que a apresentação do espaço físico e a aparência dos
funcionários se transformaram em uma das metas a serem alcançadas. Com isso a empresa
passou a exigir melhoria de padrões considerados inadequados.
Lembramos que é bastante difícil corrigir estes pequenos desvios fonéticos na idade adulta
quando não há perda significativa da inteligibilidade de fala. Aliás, não é tão difícil modificar,
mas é bastante complicado automatizar novas formas de fala. Temos observado que existem
poucas possibilidades de fixar novos padrões de fala em adultos. Este paciente tinha 20 anos
de casa e 50 anos de idade. De forma geral, pessoas com muitos anos de trabalho, e já mais
idosas, têm seus hábitos enraizados e as mudanças são mais difíceis de serem absorvidas.
Isso sem contar que a fala é um processo que, após ser aprendida, ocorre de forma
automática. A fala passou a ser uma razão concreta para justificar a troca de cargo e, no seu
lugar, ser colocado alguém com perfil mais jovial e dinâmico.
Trabalhamos os aspectos detectados e a própria apresentação frente ao público. O desejo de
permanecer no cargo, aliado ao desejo de mudar para melhor, levou este indivíduo a superar
a crise. O mais interessante é que sua comunicação mudou de uma forma geral, incluindo
novas posturas, mudanças na voz, um maior cuidado com as palavras utilizadas e, até
mesmo, com a roupa a ser utilizada no trabalho. É evidente que não eliminamos a troca. Ele
aprendeu qual era esta troca, porque ela ocorria, como lidar com ela e até identificá-la nos
colegas. Procurava não usar palavras como “cliente” e, se isto acontecia, estava consciente
para, em situação controlada, emitir os grupos consonantais com [l] e [r] de forma correta. O
que fez com que sua comunicação melhorasse de uma maneira geral foi a compreensão do
problema como um todo e a segurança que isso lhe proporcionou.

8. Homem de 36 anos, bom emprego, culturalmente diferenciado, com a queixa de querer


falar de forma mais comum durante o trabalho e continuar falando como ele já falava no resto
do tempo. Era homossexual e apresentava uma maneira típica de falar que o identificava junto
ao grupo de homossexuais a que pertencia. No entanto, esta forma de falar um pouco mais
afeminada e com discreta projeção da língua para anterior o incomodava bastante no seu
trabalho, já que não queria ser identificado em sua opção sexual nem discriminado neste
local.
O trabalho de modificação de produção da fala quando não existe problema anatômico ou
funcional real é bastante simples e pode ser realizado em pouco tempo. Foi realizado um
trabalho vocal para a voz ficar mais grave e um trabalho com a língua no sentido de levá-la
mais para a parte posterior da boca para evitar a projeção. O que foi mais importante nesse
trabalho fonoaudiológico é que o indivíduo pôde aprender a controlar a fala de forma a usar o
padrão que achasse melhor no momento adequado. O tempo de terapia foi bastante curto,
cerca de três meses com uma sessão por semana.

Como última ilustração relatarei o caso completo de um adolescente e sua longa história de
alteração de fala. Procurarei mostrar como a anamnese e o exame clínico, quando realizados
de forma criteriosa, associados a exames complementares, podem levar a diagnósticos mais
precisos e possíveis soluções do problema.

9. Menino adolescente de 15 anos nos procurou por falar errado, já havia se submetido a
fonoterapia, sem resultados positivos. Aos 4 anos e meio de idade, a escola solicitou
avaliação fonoaudiológica por problema de fala. A fonoaudióloga iniciou a terapia aos 5 anos
e informou que seria necessário fazer cirurgia do frênulo da língua. Como não havia sido
diagnosticado anteriormente nenhum problema nesse sentido, a mãe se sentiu insegura com
a indicação da fonoaudióloga e procurou um dentista que, após inspeção visual, disse não
haver necessidade de cirurgia. Na anamnese soubemos que o paciente havia tido dificuldade
para mamar no peito. A dificuldade da pega do peito é bastante citada na literatura como um
dos indícios de alteração do frênulo da língua. Fez fonoterapia até os 9 anos. Parou por um
ano e retornou aos 11 anos porque a fala ainda não estava boa. Pelo fato do problema da fala
não ter sido resolvido, foi avaliado por um neuropediatra, com suspeita de déficit de atenção.
Tomou ritalina por dois anos. Como não melhorou, mesmo com o medicamento, consultou
outro neurologista que indicou, além de outra fonoaudióloga, uma psicóloga e também terapia
ocupacional. Nenhum desses profissionais entendeu que seria necessário realizar cirurgia do
frênulo. Além da contra-indicação da frenectomia pelos profissionais, até os conhecidos dos
pais os desaconselhavam à realização de qualquer cirurgia.
Em nosso exame clínico, aplicamos o protocolo de avaliação de frênulo da língua e
observamos os seguintes problemas: lâmina da língua assimétrica, altura aumentada e sulco
longitudinal mais profundo. Foram observadas marcas de dentes em ambas as laterais, mais
visíveis do lado direito. O frênulo da língua estava conectado à frente da metade da face
póstero-inferior da língua e era curto. Ou seja, o paciente tinha uma alteração de frênulo, tanto
no ponto de fixação anteriorizada, como na diminuição do comprimento. Com relação aos
movimentos realizados pela língua a partir de nossa solicitação, ocorreram os seguintes
problemas: ao protrair e lateralizar a língua, observou-se na face inferior, do terço anterior, um
sulco que marcava a divisão das duas metades da língua. Quando realizou os movimentos
alternados, de elevar e abaixar a língua na papila incisiva, manteve a boca mais fechada para
poder realizar esta prova. No movimento de elevar e abaixar a língua tocando o lábio, superior
e inferior, observamos a participação do lábio superior para facilitar o movimento da língua.
Os movimentos de língua de elevação fora da boca e de lateralização dentro e fora da boca
foram realizados de forma aproximada. Quando a língua tocou as comissuras dos lábios à
direita e à esquerda, a mandíbula se deslocou junto para facilitar o movimento. Os estalos
com a ponta e com o corpo da língua foram realizados com a ajuda dos movimentos da
mandíbula. A sucção da língua no palato foi realizada de forma aproximada. Não conseguiu
vibrar a ponta da língua e, durante a emissão do som [ta] que necessita da elevação da ponta
da língua de forma repetida, a velocidade de emissão foi menor do que o esperado para sua
idade.
Como se observou, todos os movimentos da língua foram realizados com dificuldade e
compensados por outras estruturas. Isto aponta para a existência de alguma dificuldade de
ordem anatômica específica, uma vez que não havia alterações dos movimentos realizados
pelos lábios, bochechas ou mandíbula. Também lembramos que não existiam suspeitas ou
indícios de alterações neurológicas, a língua foi a única estrutura que apresentou dificuldade
nos movimentos solicitados. O tônus da língua e da musculatura supra-hióidea estava
diminuído. Foram realizadas três medidas da distância interincisal máxima ativa, cuja média
foi de 53,02 mm, e três medidas da distância interincisal máxima ativa com a ponta da língua
na papila incisiva, cuja média foi de 23,22 mm. A relação entre estas medidas foi de 43,8%, o
que também aponta para alteração de frênulo, já que a normalidade é considerada acima de
60%.
Na avaliação da produção da fala não foram encontradas omissões nem substituições em
nenhuma das três provas aplicadas (fala espontânea, contagem e nomeação de figuras). No
entanto, ocorreu distorção do fone vibrante simples alveolar [r] na posição de coda (porta,
carne, mar), na posição de ataque (arara, siri, coro) e nos grupos consonantais compostos
com este som (trator, dragão, presente). Estas distorções afetavam a precisão articulatória da
fala como um todo. Durante a fala ainda foram observadas menor abertura da boca e posição
de língua baixa na cavidade oral. Provavelmente isso ocorria como uma compensação, pelo
fato do frênulo não permitir que a ponta da língua se elevasse de forma adequada,
principalmente durante a produção dos fones linguodentais. A língua ocupava uma posição
em assoalho já que o frênulo dificulta uma posição mais alta. A boca mais fechada e a língua
no assoalho prejudicavam a produção da fala, dificultando a correta inteligibilidade do que se
fala.
Para complementação do diagnóstico clínico solicitou-se eletromiografia de superfície do
músculo supra-hióideo e análise acústica da fala. Foram realizadas fotos da língua e filme da
fala do paciente.
Ao examinarmos o frênulo dos pais do adolescente constatamos que o frênulo da mãe,
embora menos alterado, também fugia dos padrões de normalidade. Sabemos que muitos
casos de frênulo lingual alterado são de origem hereditária e nesse caso comprovou-se a
hereditariedade. Também fotografamos a língua e fizemos uma análise acústica da fala de
sua mãe.
No exame de eletromiografia do paciente e na prova de deglutição, observou-se pouco apoio
de terço anterior de língua para ejetar o bolo alimentar. Na análise acústica da fala e na prova
de análise perceptivo-auditiva, observou-se que o paciente não produzia o som [r] na posição
de ataque (início de sílaba) e distorcia o mesmo nas posições de encontro consonantal e coda
(final de sílaba). Ocorriam ajustes supralaríngeos de mandíbula fechada e ajustes laríngeos
modais. Na análise descritiva dos dados acústicos foi constatada nos sons líquidos a ausência
sistemática do vibrante simples alveolar na posição de ataque (início de sílaba) e encontro
consonantal. O som vibrante simples alveolar em posição de coda (final de sílaba) foi
representado de forma inadequada o que confirmou os achados clínicos.
Nas fotos observou-se com nitidez o sulco longitudinal da língua acentuado, assim como as
marcas de dentes. Também se observou a ponta da língua em forma de coração. Foi visível
ainda o frênulo curto e anteriorizado. Na foto da elevação da língua, observou-se que esta
tracionava a musculatura supra-hióidea para alcançar o arco superior. Nas fotos do frênulo da
língua da mãe do paciente observou-se que o mesmo era anteriorizado e a ponta também
formava um ‘coração’ nas tentativas de elevação ou protrusão.
No filme da fala do paciente, foi possível observar as alterações de fala citadas anteriormente
e a língua mais baixa na cavidade oral, com as laterais aparecendo durante a produção de
alguns sons.
Concluiu-se que o paciente apresentava alterações de postura e de mobilidade da língua,
alterações na fala e mandíbula mais fechada durante a produção da fala, compatíveis com
alteração de frênulo da língua.
Nossa indicação inicial foi de frenectomia para facilitar os movimentos da língua para que as
funções de mastigar, deglutir e de produção da fala pudessem se adequar ou melhorar. A
frenectomia também permitiria o melhor posicionamento da língua dentro da cavidade oral
durante a fala e provável postura de repouso. Sugestão de procedimento: frenectomia com
reavaliação fonoaudiológica após um mês para determinar a necessidade ou não de nova
fonoterapia.
O que pensar sobre casos como esses?
Poderíamos seguir com inúmeros outros casos. Mas acredito que esses exemplos já nos
mostram como quadros diferentes, que aparentemente nada têm a ver um com o outro,
podem ter como causa uma única razão: alterações dos órgãos que produzem a fala, as
funções de mastigar, engolir ou respirar. As razões destas alterações podem ser as mais
diversas possíveis conforme já descrito por Marchesan (2004b).

Estes exemplos também nos mostram muitas queixas, aparentemente simples, que
freqüentemente não são significativas para os profissionais da Área da Saúde de uma forma
em geral e acabam por serem interpretadas como “bobagens” do paciente. Poucos são os
clínicos que dão atenção a esses casos. A maior parte acha que o tempo solucionará ou que
o paciente se acostumará com o problema. Também entendem que, não sendo quadros tão
graves, não necessitam de maior atenção e muito menos de terapia.

Outra dificuldade para as ações terapêuticas em casos de problemas relacionados com as


estruturas dos articuladores da fala, é a conduta de fonoaudiólogos que colocam o paciente
em tratamento mesmo sem saberem como resolver o caso ou qual abordagem seguir. Tudo
isso tende a aumentar a crença de que esses casos não precisam de terapia, pois, não
continuam sem solução. Há também os profissionais que, por não conhecerem a anatomia e
fisiologia dos órgãos que produzem a fala e as funções orais e por não saberem tratá-las,
acham que isto não faz parte dos problemas da Fonoaudiologia e encaminham esses
pacientes para outros especialistas. A terapia psicológica é para onde mais se encaminham
esses pacientes, pois, se imagina que estes acontecimentos são fruto de alterações
emocionais.

Observa-se, ainda, que muitos desses pacientes quando procuram o médico ou o dentista
não são ouvidos com atenção e suas queixas acabam sendo colocadas no rol da variação da
“normalidade” ou da idade mais avançada. Esta atitude é interessante porque, em geral,
vamos ao médico por estarmos resfriados ou por dor nas costas ou porque apareceu uma
pequena mancha no rosto e ficou feio e assim por diante. Ou seja, não é só por problemas
graves que procuramos ajuda. As enfermidades simples também nos levam a procurar
tratamento médico. Por que razão isto não ocorre na Fonoaudiologia? Será que a queixa só é
importante quando se atende crianças? Será que só as queixas graves são passíveis de
atenção? Ou será que o fonoaudiólogo não está preparado para cuidar desses assuntos?

O fonoaudiólogo, por sua vez, foi ensinado a trabalhar com grandes alterações e patologias
consideradas graves. Pequenos problemas, coisas comuns do dia a dia não parecem
importantes nem mesmo relevantes. Poucos de nós, fonoaudiólogos, médicos ou dentistas,
damos ouvidos para queixas do tipo: “não poder comer empadinhas”; “fazer barulho ao tomar
café”; “não poder rezar mais a missa no púlpito em sua paróquia” ou “não poder comer mais à
mesa com sua família”. Com tanta coisa importante acontecendo, quem iria se preocupar com
estas ‘minúcias’? É claro que também sabemos que são problemas ‘menores’, que não
representam risco para a vida.

Mas, e a pessoa que apresenta esses problemas? Será que tais pessoas também acham que
são problemas insignificantes e que não merecem ser tratados? Alguns de nossos exemplos
mostram que ‘pequeno’ não é sinônimo de ‘insignificante’.

E mais, será que esses problemas são sempre sem risco para a vida? Ou será que um
engasgo aqui outro ali não poderiam levar a uma pneumonia que, por sua vez, poderia
provocar a morte do indivíduo? Mesmo que o problema não leve à morte, podemos ter em
mente que a qualidade de vida deve ser sempre a melhor possível. Se, com ações simples,
nós podemos devolver a estes indivíduos uma melhor condição de vida, por que não fazê-lo?

Os distúrbios da comunicação, gerados por alterações nos órgãos que produzem a fala ou as
funções orais são, em geral, de fácil tratamento e, quando bem cuidados, geram bem estar
físico e emocional para os pacientes. A Fonoaudiologia, como outras Ciências, tem
especificidades de conhecimento. Porém, nada deve ser visto ou estudado separado do todo.
O aprofundamento em cada uma das especificidades em muito auxilia na superação dos
problemas com maior habilidade e rapidez.

O que fazer?

As interferências de origem músculo-esqueletais (ocasionadas por alterações nos músculos


ou ossos que produzem a fala) que mais freqüentemente causam alterações de fala são as
seguintes: alterações estruturais da face; alterações de dentes e/ou da oclusão dentária;
disfunções temporomandibulares; tonsilas hipertróficas; aumento ou diminuição da saliva;
próteses dentárias mal construídas ou mal ajustadas; alterações do frênulo da língua e
alterações da língua sejam elas de forma, ou de tônus. Além disso, temos também as
alterações de fala que são decorrentes de alterações de outras funções orofaciais, como a
respiração, a mastigação ou a deglutição (MARCHESAN, 2002; MARCHESAN, 2004;
MARCHESAN, 2004a).

Com o intuito de corroborar os achados clínicos do funcionamento dos articuladores durante a


produção da fala, lança-se mão de exames objetivos, como a ressonância magnética, as
radiografias, o ultra-som, a eletromiografia de superfície, a articulografia e a análise acústica
da fala, entre outros. Um exemplo bastante interessante são os estudos de análise acústica
de Gregio et al. (2005) e de Gregio et al. (2006), elaborados com a finalidade de observar o
posicionamento da língua na cavidade oral em pacientes respiradores orais.

Na avaliação clínica de alguns respiradores orais, observa-se que a língua ocupa uma
posição mais posterior na cavidade oral e fica com o dorso elevado. Nas duas avaliações de
Gregio et al. (2005 e 2006), os achados indicaram posicionamento de dorso de língua elevado
na fala. Esses dados auxiliaram muito a investigação e o diagnóstico, assim como uma
adequada conduta terapêutica.

Além de exames objetivos na atuação clínica, é necessário um maior número de pesquisas


científicas para se compreender melhor os achados clínicos. Ainda em relação ao
respiradores orais, clinicamente se observa a alta ocorrência de fala distorcida, que pode ser
justificada pela diminuição do tônus da língua e seu mau posicionamento na cavidade oral.
Também observa-se acúmulo de saliva na cavidade oral que força o paciente a falar com a
boca mais fechada para evitar que a saliva seja expelida. Em casos mais graves a língua fica
alargada e a musculatura supra-hióidea tem o tônus diminuído. Normalmente, esses
pacientes produzem os fones linguodentais com o terço anterior da língua voltado para baixo.
Vários desses aspectos dificultam a produção da fala de forma adequada. Junqueira et al.
(2006), ao avaliar 137 crianças respiradoras orais, encontrou que 30% dessas crianças tinham
algum distúrbio articulatório, sendo que 75% apresentaram a fala distorcida, 34%
apresentaram trocas e 24% omissões. Isto evidencia a precisão dos achados clínicos.

Esta relação achado clínico-dado científico também é constatada em pacientes com alteração
do frênulo da língua. Clinicamente encontram-se com freqüência boca entreaberta, alterações
oclusais e periodontais, dificuldade nos movimentos realizados pela língua, assim como
postura baixa da língua na cavidade oral. As funções de mastigar, deglutir e a produção dos
sons da fala podem estar alteradas. As alterações de fala mais comumente encontradas são
as distorções do flape alveolar (vibrante simples alveolar) e dos fones [s] e [z]. Ainda durante
a produção da fala observa-se a ocorrência da diminuição do espaço entre maxilares,
aumento da salivação, movimentos mandibulares excessivos de lateralização e
anteriorização, o que pode gerar imprecisão da fala. A amamentação e a fala são as
alterações mais freqüentes quando o frênulo da língua se encontra alterado (MARCHESAN,
2003).

Como se observa uma forte tendência de alteração do frênulo lingual e distorção na fala,
principalmente relacionada ao flape alveolar, Marchesan et al. (2006a), procuraram
caracterizar qual seria o fone mais freqüentemente alterado em um grupo de sujeitos com
alteração do frênulo da língua. Encontrou-se 82,1% do grupo com distorção no flape alveolar
(vibrante simples alveolar).

Também, para caracterizar melhor os problemas de fala nos sujeitos com alteração de frênulo
da língua, Cukier-Blaj et al. em 2007 descreveram, por meio da análise acústica, os sons
líquidos em posição de ataque e encontro consonantal e os sons vocálicos e os consonantais
plosivos e fricativos. Os resultados permitiram concluir que os falantes com alterações de
frênulo de língua apresentaram inadequados padrões acústicos da produção do líquido lateral
[l] e do flape alveolar (vibrante simples alveolar). Os dados indicaram que esses pacientes
apresentam dificuldades em realizar movimento preciso de ponta/lâmina de língua para a
produção dos sons líquidos. Os dados acústicos indicaram ainda alterações na produção de
sons vocálicos e consonantais plosivos e fricativos. Esses trabalhos também corroboram os
achados da clínica em casos de alteração de frênulo da língua.

Associados a distúrbios de fala podem-se encontrar reações ou sentimentos negativos, tanto


no falante, como em quem ouve uma fala com distorção. Poderíamos citar alguns sentimentos
ou reações comuns por parte de quem ouve uma fala apresentando inadequações:
impaciência, rejeição, gozação, imitação, dificuldade de compreensão, gerando confusão,
embaraços e pena. Por sua vez, quem fala errado também apresenta sentimentos ou reações
que podem gerar dificuldades no convívio social como: ansiedade, auto-estima baixa,
sentimento de exclusão, desconforto, insegurança e frustração.

Crianças que falam com erros tendem a ser mais tímidas e menos falantes do que outras
(LINDSAY & DOCKRELL, 2000). Adultos que cometem erros ao falar se sentem inseguros
para buscar empregos ou novas posições no seu emprego. Às vezes a fala é apontada até
como causa de dificuldade para novos relacionamentos, principalmente os amorosos.

Ao conversar com adultos que sempre falaram ‘errado’ e que foram excluídos ou se auto-
excluíram dos grupos a que pertenciam, podemos ter uma idéia mais precisa do que é “falar
errado”, mesmo quando a alteração pareça ser pequena para nossos ouvidos. Relatos destes
pacientes nos mostram a importância da correção o mais precoce possível. Dificuldades de
encontrar emprego, não por falta de competência, mas acima de tudo pela sensação de
serem “menos”, já é um bom ponto de partida para que se preste a máxima atenção, mesmo
nos pequenos desvios encontrados na fala. Muitas vezes, estamos acostumados a nos
preocupar apenas com as omissões ou substituições, pois, estas parecem ser mais
perceptíveis dos que as distorções e imprecisões articulatórias. Porém, são as distorções e
imprecisões que mais interferem no dia a dia do sujeito. Quando existe uma omissão ou
substituição, em geral, a solução do problema é mais simples, mas quando aparecem sons
distorcidos, é um sinal de que o indivíduo percebeu que o som não estava sendo produzido
adequadamente, tentou uma aproximação do correto, provavelmente com esforço, e, no
entanto, por mais que tentasse não conseguiu atingir a produção correta do som. As
imprecisões são piores, pois, elas não atingem um som ou um grupo de sons, freqüentemente
elas prejudicam a fala como um todo.

Independente de qual é a alteração encontrada, a correção deve ser realizada o mais


precocemente possível, para que padrões errados não sejam fixados, o que dificulta não só a
correção e instalação de um novo padrão, mas acima de tudo, dificulta a automatização da
maneira correta de falar.

A terapia de fala, quando as causas da alteração provém de problemas dos músculos ou


ossos da face, pode não ter o sucesso esperado, pois, a cura seria dependente da correção
da causa, o que nem sempre é possível. Melhoras são sempre esperadas e o sucesso da
terapia pode ser considerado quando ocorrem modificações e quando o sujeito reconhece a
melhora e entende que está mais apto para enfrentar as situações diárias. Muitas vezes este
tipo de terapia envolve a atuação de uma equipe multidisciplinar além do trabalho ‘apenas’ do
fonoaudiólogo. É preciso que o dentista resolva os problemas dentários, o médico resolva os
problemas respiratórios que estão interferindo na fala para então, se necessário, iniciarmos a
fonoterapia.

Trabalhar com a correção da fala, com crianças ou com adultos é extremamente gratificante.
O paciente, ao melhorar ou eliminar o problema, fica visivelmente feliz e mais confiante em
suas atitudes. A fala é a melhor forma de comunicação, é com a fala que construímos ou
destruímos relações. O poder da fala é imenso e estar privado deste poder é terrível. Nunca
devemos considerar como problema menor as pequenas alterações de fala, assim como
nunca devemos considerar como impossíveis de serem resolvidas as grandes alterações de
fala. Tanto problemas pequenos, como grandes, podem ter para o paciente significados
totalmente diferentes daquela impressão e julgamento que fazemos sobre sua alteração.
Tentar sempre uma modificação do padrão encontrado, ter metas no tratamento e considerar
toda e qualquer mudança como positiva, são fundamentais para um caminho melhor
estruturado e, certamente, de final feliz.

Referências Bibliográficas

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