Nutrologia
Vitamina B1
Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo — Escola
Paulista de Medicina (Unifesp-EPM), Centro Cochrane do Brasil
A vitamina B1 ou tiamina é uma vitamina hidrossolúvel es-
sencial para o metabolismo dos hidratos de carbono através da
suas funções coenzimáticas. Essas ativam as enzimas que con-
trolam os processos bioquímicos entre os quais a decomposição
da glicose em energia. A tiamina também desempenha papel na
condução dos impulsos nervosos e no metabolismo aeróbico.
O homem depende da ingestão de alimentos para suprir as
suas necessidades em tiamina, que existe em muitos alimentos
em pequenas quantidades. Dentre as inúmeras fontes de vita-
mina B1 temos a levedura de cerveja seca, a carne (porco, cor-
deiro, vaca), aves, cereais de grão inteiro, leguminosas etc. Nos
grãos de cereais, a tiamina é removida durante a produção da
farinha branca e também do arroz integral para produzir o arroz
branco. Por ser hidrossolúvel, um pouco menos da metade da
tiamina é perdida durante o processo de cozimento dos alimen-
tos e quantidades consideráveis são perdidas na água resultante
do processo de descongelação dos alimentos. Para não haver
perda total da tiamina a água do cozimento deve ser reaprovei-
tada em molhos.
Pequenas deficiências de vitamina B1 podem ocorrer em
consequência de falha na alimentação, por distúrbios digesti-
vos transitórios que impeçam sua absorção e por doenças que
aumentem a necessidade de tiamina. Essa falta pode gerar quei-
xas subjetivas diversas como astenia, irritabilidade e parestesias
combatidas por meio de uma alimentação especial rica em vita-
mina B1 ou por meio da reposição de suplementos vitamínicos
que geralmente têm uma pequena quantidade de tiamina.
As grandes deficiências ocorrem em um tempo mais longo e
são geralmente por déficits nutricionais, com ou sem a presença
de alcoolismo, gerando distúrbios somáticos e psíquicos inten-
sos. A doença, quando instalada, é conhecida pelo nome de
beribéri. Existe comprometimento dos nervos periféricos com
distúrbios da sensibilidade, diminuição da força muscular e até
paralisias. Pode haver um comprometimento cardíaco, levando
a insuficiência cardíaca congestiva. No sistema nervoso central,
podemos ter a encefalopatia de Wernicke-Korsakoff, que se ca-
racteriza por depressão amnésia e demência, e pode ser reversí-
vel se tratada a tempo.
I
Médico, mestre e doutor em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Médico pesquisador do Centro de
Pesquisas em Revisões Sistemáticas do Centro Cochrane do Brasil. E mail: hernani.jr@uol.com.br
II
Médico, mestre e doutorando em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). E-mail: docandre.lemos@gmail.com
Diagn Tratamento. 2010;15(2):69-70.
Hernani Pinto de Lemos JúniorI
André Luis Alves de LemosII
Diante do exposto, entendemos que a prescrição de tiamina
pode ser realizada em dois extremos: casos leves de déficit tran-
sitório em forma de complexos vitamínicos que contêm peque-
na quantidade de vitamina B1, e casos graves de beribéri em
que a prescrição é obrigatória e exige doses plenas de tiamina.
Procuramos na literatura dados que nos permitissem estender
a prescrição de tiamina a outras doenças. Encontramos na Co-
laboração Cochrane uma revisão sistemática1 que objetivou ve-
rificar se a suplementação de tiamina teria algum efeito na do-
ença de Alzheimer. Como ela tem um efeito benéfico em deter
a progressão da demência na síndrome de Wernick-Korsakoff,2
alguns autores sugeriram que ela poderia ter esse mesmo be-
nefício na doença de Alzheimer.3-5 Isso teve fundamento em
um estudo experimental in vitro em tecido animal onde foi en-
contrada uma ligação entre tiamina e a liberação pré-sináptica
de acetilcolina.6 A tiamina se ligaria a receptores nicotínicos e
teria uma atividade anticolinesterase. Os efeitos colinérgicos
da tiamina poderiam ser benéficos em pacientes com a doença
de Alzheimer porque geralmente é aceito que memória e algu-
mas funções intelectuais são mediadas através de acetilcolina.
Essa revisão sistemática encontrou três estudos com medidas
de desfecho diferentes e não foi possível fazer uma metanálise.
Um estudo dessa revisão7 comparou tiamina com placebo na
doença de Alzheimer e não encontrou evidências de melhora
em uma escala mental aplicada8 (Mini Mental State Examina-
tion, MMSE) no terceiro, sexto, nono e décimo segundo mês
do tratamento. Os autores concluíram que não há nenhuma
evidência segura para fundamentar a decisão de usar tiamina
no tratamento dos pacientes com a doença de Alzheimer.
As vitaminas podem prevenir efeitos indesejáveis das drogas
antiepilépticas que podem ser de duas a três vezes maiores em
recém-natos nascidos de mães com epilepsia quando compara-
dos com a população em geral.9 Uma revisão sistemática10 da
colaboração Cochrane focou esse aspecto e procurou verificar
a efetividade das vitaminas como coadjuvantes no tratamento
da epilepsia. Nessa, somente um estudo randomizado e duplo-
cego11 foi realizado com tiamina. Os resultados indicam que,
em epiléticos tratados cronicamente com difenil-hidantoína, a
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suplementação de tiamina por seis meses melhora as funções
neuropsicológicas, como análise visual espacial, velocidade vi-
sual motora e habilidade verbal. Não houve uma descrição do
método neuropsicológico utilizado.
A cólica menstrual é uma ocorrência ginecológica comum e
seu tratamento habitual é com anti-inflamatórios não hormo-
nais e contraceptivos orais que reduzem a contratilidade uteri-
na. Como a falha no tratamento com anti-inflamatórios é em
torno de 20% a 25% e muitas mulheres não querem ou não po-
dem tomar hormônios, uma revisão sistemática da Cochrane12
procurou terapêutica alternativa para tratar a cólica menstrual
com ervas e suplementos vitamínicos. Somente um estudo com
tiamina foi incluído nessa revisão sistemática13 e mostrou que a
vitamina B1 foi mais efetiva que o placebo e a combinação de
magnésio e vitamina B6 em reduzir a cólica menstrual, na dosa-
gem de 100 mg/dia (odds ratio de 14,74, intervalo de confiança
de 10,07 a 21,58).
Concluímos que, em pessoas hígidas, a vitamina B1 contida
nos alimentos é fornecida pelos hábitos alimentares do dia a dia
e que é um coadjuvante dispensável sob a forma de comprimi-
dos. Em pessoas não hígidas com doenças crônicas que levem a
carência de tiamina, é essencial sua reposição em forma de me-
dicamento por via oral ou parenteral. Em outras doenças sem
carência de tiamina, há necessidade de mais estudos com boa
qualidade metodológica para viabilizar a indicação do seu uso.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Centro Cochrane do Brasil
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Vila Clementino — São Paulo (SP)
CEP 04039-001
Tel./Fax. (11) 5575-2970/5579-0469
E mail: cochrane.dmed@epm.br
Fontes de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
RESUMO DIDÁTICO
1. Vitamina B1 é essencial para o metabolismo dos hidratos de carbono.
2. O homem depende da ingestão de alimentos para suprir suas necessidades de tiamina.
3. Pequenas deficiências de vitamina B1 podem ser repostas através de alimentação adequada.
4. Grandes deficiências de tiamina ocorrem no alcoolismo e grandes déficits nutricionais.
5. Carência crônica de tiamina pode levar a insuficiência cardíaco-congestiva.
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Data de entrada: 23/3/2010
Data da última modificação: 12/4/2010
Data de aceitação: 12/4/2010
Diagn Tratamento. 2010;15(2):69-70.